Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1778/14.0TBBCL-D.G1
Relator: MARIA JOÃO MATOS
Descritores: ACÇÃO EXECUTIVA
INCIDENTE DE INTERVENÇÃO DE TERCEIROS
LEGITIMIDADE
GARANTIA REAL
CASO JULGADO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/21/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
SUMÁRIO
(da responsabilidade da Relatora - art. 663.º, n.º 7 do CPC)

I. O credor que pretenda fazer valer a garantia real do seu crédito terá sempre que demandar na execução o terceiro (quanto à dívida que se executa) proprietário do bem sobre a qual foi constituída; e, por isso, terá que apresentar o título executivo de que decorre a constituição ou reconhecimento da dívida, e o título material de constituição da garantia no património do dito terceiro.

II. Tendo o credor instaurado acção executiva apenas contra o devedor, e não simultaneamente contra o terceiro proprietário do bem dado em garantia, pode depois fazer intervir este por meio de incidente de intervenção principal provocada, quando pretenda exercitar nessa mesma execução a garantia real do seu crédito.

III. O caso julgado forma-se nos precisos limites e termos em que se julga; e, no que diz respeito ao caso julgado formal, sobre a concreta questão processual apreciada (pelo que, alterando-se os pressupostos fácticos da sua apreciação e decisão, o que em conformidade se ajuíze consubstancia nova e inédita decisão).

IV. O caso julgado formal constituído sobre prévia decisão que julgue um executado parte ilegítima, por não figurar como devedor no título executivo e não ter sido justificada a sua demanda no requerimento executivo, não obsta a que seja depois deferida a sua intervenção principal provocada nos autos, por se ter conhecido a sua qualidade de actual proprietário do imóvel dado em garantia da quantia exequenda (uma vez que, tratando-se embora da aplicação do mesmo direito processual - pertinente à legitimidade passiva em processo executivo -, reporta-se a mesma a uma nova realidade fáctica).
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2.º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.
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I – RELATÓRIO

1.1. Decisão impugnada

1.1.1. C. C. (aqui Recorrido), residente na Travessa …, n.º …, em …, na Trofa, propôs uma acção executiva para pagamento de quantia certa, contra A. C., residente na Rua …, em …, em Barcelos, J. B., residente na Rua …, em …, Espanha, e M. P. e mulher, A. M. (aqui Recorrente), residentes na Rua …, em …, Barcelos, para haver dos mesmos o pagamento coercivo da quantia de € 114.744,88 (sendo € 78.000,00 a título de capital, e o remanescente a título de juros de mora).

Juntou para o efeito, como título executivo, uma escritura pública de constituição de hipoteca, onde o 1.º Executado (A. C.), actuando «na qualidade de procurador» e intervindo «em representação do» 2. º Executado (J. B.), declarou que, «para garantia do integral pagamento da quantia de setenta e oito mil euros, que o seu representado deve ao segundo outorgante [aqui Exequente], constitui HIPOTECA voluntária, a favor do segundo outorgante».

1.1.2. Em 17 de Julho de 2014, foi penhorado o imóvel objecto da hipoteca invocada nos autos, constando do respectivo auto como «Executado(s)» «J. B., A. M., A. C. e M. P.».

1.1.3. Em 25 de Setembro de 2017, foi proferido despacho, absolvendo o 1.º Executado (A. C.), o 3.º Executado (M. P.) e a 4.ª Executada (A. M.) da instância executiva, por ilegitimidade respectiva, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(…)
Pela análise do supra identificado título executivo concluímos, desde logo, que os executados M. P. e A. M. não constituíram, nem tampouco reconheceram qualquer obrigação para com o exequente C. C..
Com efeito, nenhuma intervenção tiveram na referida escritura pública.
Restam os executados A. C. e J. B..
Quanto a estes, verificamos que o referido A. C. não agiu por si, mas sempre na qualidade de procurador e, portanto, em representação do aludido J. B., qualidade essa que, certamente, terá sido verificada pelo S. Notário (…).
Deste modo, por via da referida escritura pública, apenas o executado J. B. assumiu a sua qualidade de devedor perante o exequente C. C., seu credor.
(…)
A ilegitimidade singular é uma excepção dilatória insuprível e de conhecimento oficiosos (cfr. artigos 258.º, do Código Civil e artigo 30.º, 53.º, n.º 1, 278.º, n.º 1, alínea d), 576.º, n.ºs 1 e 2 e 577.º, alínea c), estes do Código de Processo Civil.
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Termos em que se absolvem da presente instância executiva os executados A. C., M. P. e A. M..
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Em conformidade, indefere-se parcialmente o requerimento executivo (cfr. artigo 726.º, n.ºs 1, 2, alínea b) e 3, do Código de Processo Civil.
(…)»

1.1.4. Em 27 de Fevereiro de 2018, foi proferido despacho, no apenso de embargos de executado (antes deduzidos por A. M.), declarando os mesmos extintos por inutilidade superveniente da lide, lendo-se nomeadamente no mesmo:
«(...)
Nos autos principais, no dia 25 de Setembro de 2017, proferiu-se decisão que, entre o mais, absolveu da instância a aqui embargante/executada A. M. (cfr. referência n.º 154693709).
Esse despacho mostra-se já transitado em julgado.
(…)
No caso vertente, por força da decisão proferida nos autos principais, que absolveu a embargante/executada A. M. da instância, torna-se inútil o prosseguimento do presente apenso.

Nestes termos, ao abrigo do disposto no artigo 277.º, alínea c), do Código de Processo Civil, determina-se a extinção da instância de que os presentes autos constituem apenso, por inutilidade superveniente da lide.
(…)»

1.1.5. Em 06 de Junho de 2019, A. M., tendo sido notificada «em 03/06/2019 (…) pelo Sr. Agente de Execução para se pronunciar qual a modalidade da venda pretendida quanto ao imóvel penhorado nos autos e que é sua propriedade», veio requerer a «anulação de todos os atos praticados contra a aqui executada e seu marido, após a decisão proferida nos autos em 25/09/2017» e «o cancelamento da penhora registada através da AP. N.º 1196 de 17/07/2014», por ambos terem deixado «de ser parte na presente execução», defendendo que por essa razão «não poderá seguir a presente execução quanto ao bem que é sua propriedade».

1.1.6. Em 9 de Setembro de 2019, foi proferido despacho, convidando o Exequente a promover a intervenção principal provocado dos terceiros proprietários do imóvel hipotecado, lendo-se nomeadamente no mesmo:

«(…)
Por requerimento de 06.06.2019, com a refª 875159, veio a referida A. M. pugnar pela anulação de todo os atos praticados contra a aqui executada e seu marido, após a decisão proferida nos autos em 25/09/2017, bem como requerer o cancelamento da penhora registada através da Ap. N.º 1196 de 17/07/2014 que recaiu sobre imóvel da sua propriedade.
(…)
Compulsado o requerimento executivo, é manifesto que, contrariamente ao ora alegado pelo executado, este não justificou a legitimidade passiva dos primeiros Executados A. M. e marido (…).
Em momento algum, no requerimento executivo o Exequente referiu que os então Executados A. M. e marido se tratavam dos actuais proprietários do imóvel objecto da hipoteca. Daí que o MMº tenha (…) conhecido da ilegitimidade passiva e absolvido os Executados A. M. e marido da instância, pois que reza o artigo 53.º, do C.P.C. que a execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor.
Sucede, porém, que esta regra da legitimidade em matéria executiva possui os desvios previstos no artigo 54.º, do mesmo texto legal.
Diz tal normativo, no seu n.º 2, que a execução por dívida provida de garantia real sobre bens de terceiro segue directamente contra este, se o exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor.
(…)
Nestes casos, pois, a legitimidade passiva alarga-se a terceiros, que não figuram no título executivo.

No caso em apreço, é líquido estarmos ante uma execução por divida provida de garantia real (hipoteca), sendo que o imóvel hipotecado não pertence já ao executado mas à Requerente A. M. e Marido - crf. Certidão permanente de fls. 45-47.
Uma vez que o credor hipotecário tem o direito de ser pago pelo produto dos bens hipotecados com preferência sobe os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo (artigo 686.º, n.º 1, do C.C.), a acção executiva, sob pena de ilegitimidade, tem de ser proposta necessariamente contra o proprietário do bem 8arts. 735.º, n.º 2 e 818º do CC), como resulta do artigo 54.º, n.ºs 2 e 3, do C.P.C..
(…)
O que significa, volvendo à hipótese em apreço, que para que a Execução possa prosseguir relativamente ao imóvel hipotecado o Exequente terá de chamar à demanda os proprietários do imóvel, nos termos do disposto no art.º 54.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.

Termos em que, se convida o Exequente a promover a intervenção principal provocada dos terceiros proprietários do bem hipotecado, no prazo de 10 dias, sob pena de não o fazendo, se ordenar o levantamento da penhora realizada sobre esse mesmo bem.
(…)»

1.1.7. Correspondendo o Exequente (C. C.) ao convite formulado, em 08 de Dezembro de 2019 foi proferido despacho, deferindo o incidente de intervenção principal provocada por ele deduzido, lendo-se nomeadamente no mesmo:

«(…)
Quanto ao pedido de intervenção principal provocada
Atentos os argumento expendidos no nosso anterior despacho, admito a intervenção principal provocada dos requeridos, terceiros proprietários do bem hipotecado, na qualidade de Executado(a)(s).
Notifique e cite.
(…)»
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1.2. Recurso

1.2.1. Fundamentos

Inconformada com esta decisão, a Interveniente Principal provocada (A. M.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que lhe fosse dado provimento e se revogasse o despacho recorrido, anulando-se todos os actos praticados contra si e o marido, após a respectiva absolvição da instância executiva.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis):

i. Em 02/07/2014 o Apelado/Exequente intentou Execução contra a aqui Apelante e seu marido M. P., nos termos do artigo 54º n.º 2 do CPC.

ii. A Apelante em 23/05/2016 deduziu embargos de Executado, sob o processo n.º 1778/14.0TBBCL-B, que correram termos por apenso aos autos de Execução.

iii. Em 25.09.2017 foi proferido nos autos de Execução Despacho que absolveu a Apelante e marido da Instância Executiva por serem partes ilegítimas.

iv. Por despacho de 27/02/2018 proferido nos autos de embargos de executado, apenso B, foi determinada a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, nos termos do artigo 277, alínea e) do CPC, face à absolvição da aqui Apelante e marido no processo de execução.

v. Tais despachos encontram-se devidamente transitados em Julgado, nos termos do artigo 628º do Código Civil.

vi. Aos 03/06/2019, em clara ofensa ao despacho proferido em 25/09/2017 veio o Sr. agente de Execução nomeado nos autos, notificar a Apelante e seu marido, na qualidade de executados, para se pronunciarem sobre a modalidade da venda pretendida quanto ao imóvel penhorado nos autos que era e é propriedade dos mesmos.

vii. Face a tal notificação do Sr. Agente de Execução, a aqui Apelante através de requerimento apresentado nos autos de Execução em 06/06/2019 com Ref.ª 32660924, veio arguir a nulidade de todos os atos praticados nos autos após a decisão proferida em 25/09/2017, contra ela e seu marido.

viii. Na sequência de tal requerimento veio o tribunal “a quo” em 09/09/2019 proferir douto despacho convidando o Exequente a promover a intervenção principal provocada da aqui Apelante e seu marido.

ix. Fundamentando a MMª juiz que no seu entender o anterior MMº Juiz conheceu da ilegitimidade passiva da Apelante e marido por estes não figurarem como proprietários do imóvel objeto da hipoteca no requerimento executivo.

x. Por despacho proferido em 08/12/2019 o tribunal “a quo” decidiu admitir a Intervenção principal provocada da Apelante e marido na qualidade de Executados, por serem os proprietários do imóvel penhorado.

xi. Não pode o tribunal “a quo” dar sem efeito um despacho transitado em julgado, chamando novamente à execução os Executados que foram absolvidos da instância por despacho anterior devidamente transitado em julgado, atento o disposto no artigo 613º CPC.

xii. Nos termos do disposto 614º do CPC, tal despacho só seria passível de retificação em caso de erro de escrita cálculo ou inexatidão, o que manifestamente não acontece no presente caso.

xiii. Constituindo o despacho proferido em 25-09-2017 decisão coberta pelo caso julgado formal e consequentemente tendo força obrigatória dentro do processo.

xiv. Terá o mesmo, Venerandos Desembargadores, que prevalecer sobre todos os atos que foram posteriormente praticados no processo que o contrariam ou que foram praticados à revelia do que nele foi decidido, prevalecendo, nomeadamente, sobre o despacho posteriormente lavrado em 08-12-2019 que deu aquele sem efeito, o que se requer.

xv. Violou assim, o douto despacho, entre outros, o disposto nos artigos 613º, 614º, 620º, 580º e 581º todos do CPC.
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1.2.2. Contra-alegações

O Exequente (C. C.) contra-alegou, pedindo que o recurso fosse considerado improcedente, e o despacho recorrido fosse mantido na íntegra.

Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui se reproduzindo as respectivas conclusões ipsis verbis):

I - Ora, ao contrário do que pretende a recorrente, o referido despacho, ao admitir a intervenção principal provocada dos terceiros proprietários do bem hipotecado, chamando-os à demanda, procedeu a uma aplicação adequada do Direito e das orientações Jurisprudenciais, não merecendo assim qualquer reparo.

II - As alegações apresentadas pela Recorrente, quer de direito quer de facto, carecem de fundamentação no seu todo, o que nos leva a crer que a interposição deste recurso serviu somente para protelar o desfecho da ação, adiando uma decisão perfeitamente justa.

III - Pelo que como já decidido pela juiza a quo assiste toda a razão ao recorrido.

IV - Não ofendendo de modo algum o douto despacho recorrido o alegado caso julgado em virtude de existência de despachos contraditórios proferidos sobre a mesma questão concreta da relação processual.

V - E muito menos violadas as normas referentes aos artigos 613º, 614º,620º, 580º e 581º do CPC.
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II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR

2.1. Objecto do recurso - EM GERAL

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635.º, n.º 4 e 639.º, nºs. 1 e 2, ambos do CPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC).

Não pode igualmente este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de prévias decisões judiciais (destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação).
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2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar

Mercê do exposto, uma única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal ad quem:

· Questão Única - Fez o Tribunal a quo uma errada interpretação e aplicação da lei, ao admitir o incidente de intervenção principal provocada deduzido pelo Exequente, por desse modo se violar caso julgado formado sobre uma decisão anterior ?
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III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Com interesse para a apreciação da questão enunciada, encontram-se assentes nos autos os factos elencados em «I - RELATÓRIO» (relativos ao seu processamento), que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
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IV - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

4.1. Legitimidade na execução

4.1.1.1. Legitimidade na execução - Em geral

Lê-se no art. 817.º do CC que, não «sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento e de executar o património do devedor, nos termos declarados neste código e nas leis do processo».
De forma conforme, lê-se no art. 735.º, n.º 1 do CPC que estão «sujeitos à execução todos os bens do devedor susceptíveis de penhora que, nos termos da lei substantiva, respondem pela dívida exequenda».
.Logo, terá legitimidade activa e passiva para demandar e ser demandado na execução, respectivamente, «o credor» e «o devedor», titular do património responsável pela dívida.

Mais se lê, no art. 53.º, n.º 1 do CPC, que a «execução tem de ser promovida pela pessoa que no título executivo figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha aposição de devedor».
«Apela-se, assim, à literalidade do título executivo, seja ele sentença, contrato, título de crédito ou qualquer outro. Num certo sentido, a legitimidade singular executiva apura-se por confronto entre o título executivo e as partes da causa» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 278, com bold apócrifo).
Compreende-se, por isso, que se afirme «que uma pessoa pode aparecer no título na posição de credor ou de devedor sem que seja realmente titular de um direito de crédito ou sujeito de uma obrigação. Apenas o título executivo faz presumir a existência de um crédito e de uma dívida» (Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 12.ª edição, Almedina, Janeiro de 2010, pág. 74, com bold apócrifo).
«Daqui resulta que há ilegitimidade singular na ação executiva se o exequente ou o executado, apresar de partes processuais, não são os sujeitos do título executivo». Já se a dívida exequenda não existe efectivamente, «isso não tolhe a legitimidade inicial das partes, sendo já do domínio da procedência da pretensão do autor, executiva» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 293).
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4.1.1.2. Legitimidade de terceiro proprietário de bem hipotecado ao pagamento a quantia exequenda

Lê-se, no art. 818º do CC, que o «direito de execução pode incidir sobre bens de terceiro, quando estejam vinculados à garantia do crédito, ou quando sejam objecto de acto praticado em prejuízo do credor, que este haja procedentemente impugnado».
De forma conforme, lê-se no art. 735.º, n.º 2 do CPC que, nos «acasos especialmente previstos na lei, podem ser penhorados bens de terceiro, desde que a execução tenha sido movida contra ele».
Será, nomeadamente, o caso do proprietário de bem hipotecado em garantia do cumprimento da obrigação exequenda (1), face ao disposto no art. 686.º do CC (onde se lê que a «hipoteca confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo»).
Precisa-se que este «terceiro garante tanto pode ser quem prestou a garantia inicialmente, como quem tenha, posteriormente, adquirido a coisa onerada» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 278) (2).
Logo, poderá ter legitimidade activa na execução quem nela não seja devedor (mas apenas terceiro garante do cumprimento da obrigação).

Mais se lê, no art. 54.º do CPC, que a «execução por dívida provida de garantia real sobre os bens de terceiro segue directamente contra este se o exequente pretender fazer valer a garantia, sem prejuízo de poder desde logo ser também demandado o devedor» (n.º 2); e, quando «a execução tenha sido movida apenas contra o terceiro e se reconheça a insuficiência dos bens onerados com a garantia real, pode o exequente requerer, no mesmo processo, o prosseguimento da acção executiva contra o devedor, que é demandado para completa satisfação do crédito exequendo» (n.º 3).
Dá-se, assim, legitimidade passiva a quem não é devedor na relação de dívida, mas que tem um interesse directo em contradizer, já que «há um desdobramento subjectivo ente a titularidade da obrigação e a responsabilidade patrimonial pela mesma». O terceiro garante é titular de uma posição jurídica activa que será extinta pela execução. «Em termos simples: o credor tem direito a ser pago pela dívida, mesmo à custa de terceiro que não lhe possa opor um direito incompatível. Mais do que se executar o devedor, executa-se um património» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 294).

Compreende-se que se afirme que, face à natureza disponível das garantias reais (3), o credor pode optar por várias vias de satisfação do seu crédito; e, por isso, «o artigo 54º nº 2 surge como uma noma de legitimação passiva do terceiro e não como uma previsão de litisconsórcio necessário desse terceiro com o devedor» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 288).
«Nas palavras do preâmbulo do DL n.º 329-A/95, de 12 e Dezembro, “cumpre ao exequente avaliar, em termos concretos e pragmáticos, quais as vantagens e inconvenientes que emergem de efectivar o seu direito no confronto de todos aqueles interessados passivos, ou de apenas algum ou alguns deles, bem sabendo que se poderá confrontar com a possível dedução de embargos de terceiro por parte do possuidor que não haja curado de demandar”» (Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, 12.ª edição, Almedina, Janeiro de 2010, pág. 77).

No entanto, se o credor pretender fazer valer a garantia, terá sempre que demandar na execução o seu proprietário. «No plano «documental, deve apresentar o título executivo de que decorre a constituição ou reconhecimento da dívida, e o título material de constituição da garantia no património de terceiro», sendo este último que «assegura a legitimidade complementar do terceiro».
Logo, o «que o exequente não pode é de início demandar apenas o devedor e executar ao mesmo tempo a garantia: isso é ilegal em face do artigo 735º nº 2. Ou não exerce a garantia ou se a exerce deve demandar o garante.
Qual a consequência neste caso? Não pode ser a ilegitimidade do próprio devedor, pois que o artigo 54º nº 2 dá legitimidade ao terceiro, mas não a retira ao devedor. A consequência da execução do bem do garante, sem se demandar o terceiro, é, obviamente a ilegalidade subjectiva da penhora (4), impugnável em embargos de terceiro e em ação de reivindicação» (Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, págs. 288-289, com bold apócrifo).
Vem ainda a jurisprudência defendendo que o «facto de o credor ter instaurado acção executiva apenas contra o devedor não constitui obstáculo a que seja requerida a intervenção principal provocada do titular do bem hipotecado, se o credor pretender exercitar nessa mesma execução a garantia real do seu crédito».
Pondera-se nesse sentido o «facto de esse incidente estar regulado na parte geral do CPC»; de essa intervenção se encontrar «expressamente assegurada para determinadas situações como as reguladas nos arts. 741º, nº 2, e 742º, nº 1 (incidente de comunicabilidade suscitado pelo exequente ou pelo executado) ou no art. 745º, nº 2, do NCPC (penhorabilidade subsidiária)»; e de diversos «autores, entre os quais Lebre de Freitas (Acção Executiva, 2ª ed., págs. 115 e segs. e 105 e 106)», advogarem «a admissibilidade do incidente de intervenção provocada, seja para suprir a eventual preterição de litisconsórcio necessário activo ou passivo, seja para permitir a demanda sucessiva de outros condevedores» (Ac. do STJ, de 16.01.2014, Abrantes Geraldes, Processo n.º 1626/11.2TBFAF-A.G1) (5).
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4.1.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que o Exequente (C. C.) propôs a acção executiva dos autos principais contra A. C., J. B., M. P. e mulher, A. M., juntando como título executivo uma escritura pública de constituição de hipoteca; e nesta figuravam unicamente o 1.º Executado (A. C.), na exclusiva qualidade de procurador do 2.º Executado (J. B.), que aí se declarava devedor para com o Exequente (C. C.), da quantia de € 78.000,00, garantindo o seu pagamento precisamente com a constituição de uma hipoteca sobre imóvel seu.
Mais se verifica que, no requerimento executivo, o Exequente (C. C.) afirmou ainda que «os executados venderam o imóvel a terceiros», sem que porém os identificasse, nomeadamente fazendo-os coincidir com os 3.º e 4.ª Executados (M. P. e mulher, A. M.).
Compreende-se, por isso, que o Tribunal a quo, em momento posterior, tenha ajuizado serem o 1.º Executado (A. C.) e os 3.º e 4.ª Executados (M. P. e mulher, A. M.) partes ilegítimas nos autos principais, absolvendo-os da instância executiva, aquele por figurar no titulo executivo apenas como procurador do 2.º Executado (J. B.), e estes por nele não figurarem de todo, nem por outro modo ter sido justificada a respectiva demanda.

Esta sua decisão não foi objecto de qualquer impugnação, nomeadamente por parte do Exequente (C. C.); e, desse modo, transitou em julgado.
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4.2. Caso julgado

4.2.1. Conceito - Âmbito

Lê-se no art. 619.º, n.º 1 do CPC que, transitada «em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º».
Mais se lê, no art. do 628.º do CPC, que uma decisão judicial «considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação».
Quando assim seja, segundo o critério da eficácia e nos termos dos arts. 619.º,n.º 1 e 620.º, n.º 1, ambos do CPC, terá força obrigatória: dentro do processo e fora dele, se for sentença ou despacho saneador que decida do mérito da causa (caso julgado material); ou apenas dentro do processo, se for sentença ou despacho que haja recaído unicamente sobre a relação processual (caso julgado formal).

Melhor precisando o caso julgado formal, enfatiza-se que «as decisões de forma desfrutam de força vinculativa de caso julgado apenas dentro do processo», excepto no caso previsto no n.º 1 do art. 101.º do CPC (Remédio Marques, A acção declarativa à luz do Código revisto, Coimbra Editora, pág. 646).
Logo, a questão só se levanta se existir uma primeira decisão proferida (de forma) no mesmo processo em que venha ser proferida uma segunda com o mesmo objecto. Compreende-se, por isso, que se afirme que o caso julgado formal «só é vinculativo no próprio processo (e respectivos incidentes que correm por apenso) em que a decisão foi proferida, obstando a que o juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida - mas não impede que a mesma questão processual seja decidida em outra acção, de forma diferente pelo mesmo tribunal ou por outro tribunal» (Remédio Marques, A acção declarativa à luz do Código revisto, Coimbra Editora, pág. 644) (6).

Mais se lê, no art. 625.º do CPC que, havendo «duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar» (n.º 1); e é «aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual» (n.º 2).
Logo, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar, e ainda que estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta (7).
Reforça-se, assim, com este artigo, a ideia de que o caso julgado formal previsto no 620º do CPC se refere à vinculação do Tribunal ao julgamento que fez sobre uma questão concreta da relação processual. Compreende-se, por isso, que se afirme que existe «violação do caso julgado formal, previsto no art. 620º, do Código de Processo Civil, quando o Tribunal, no mesmo processo, com as mesmas partes e reportando-se aos mesmos factos, verificados e atendidos já na primeira decisão, volta a decidir a mesma questão, nesse mesmo contexto processual, de forma diversa», outro tanto não sucedendo em hipótese inversa (Ac. da RG, de 17.05.2018, José Flores, Processo n.º 1053/15.2T8GMR-C.G1).
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Do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais (distintos, mas provenientes da mesma realidade jurídica): um negativo (excepção dilatória de caso julgado), de impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida, isto é, impedindo que a causa seja novamente apreciada em juízo; e um positivo (força e autoridade de caso julgado), de vinculação do mesmo tribunal e, eventualmente de outros (estando em causa o caso julgado material), à decisão proferida (8).
Logo (e face aos arts. 576.º, n.º 1 e n.º 2, 577.º, al. i), 580.º e 581.º, todos do CPC), a excepção dilatória de caso julgado pressupõe o confronto de duas acções (uma delas contendo uma decisão já transitada em julgado), e a tríplice identidade entre ambas de sujeitos, de causa de pedir e de pedido; e visa o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, por forma a evitar a repetição de causas.
Já a força e autoridade de caso julgado decorre de uma anterior decisão que haja sido proferida, designadamente no próprio processo, sobre a matéria em discussão, e prende-se com a sua força vinculativa; e visa o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (podendo funcionar independentemente da tríplice identidade exigida pela excepção) (9).
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O caso julgado é, então, um instituto com raízes no direito fundamental, constitucional, intimamente ligado ao princípio do Estado de Direito Democrático, por ser uma garantia basilar dos cidadãos onde deve imperar a segurança e a certeza; é hoje um valor máximo de justiça, aliado ao princípio da separação de poderes (Miguel Pimenta de Almeida, A intangibilidade do Caso Julgado na Constituição (Brevíssima Análise), pág. 18, disponível em http://miguelpimentadealmeida.pt/wp-content/uploads/2015/06/A-INTANGIBILIDADE-DO-CASO-JULGADO-NA-CONSTITUI%C3%87%C3%83O.pdf).
«O fundamento do caso julgado reside, por um lado, no prestígio dos tribunais, o qual “seria comprometido em alto grau se mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente” e, por outro lado, numa razão de certeza ou segurança jurídica (10), pois “sem o caso julgado estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa. (…) Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu”.
“Se assim não fosse, os tribunais falhariam clamorosamente na sua função de órgãos de pacificação jurídica, de instrumentos de paz social”» (Ac. da RG, de 17.05.2018, José Flores, Processo n.º 1053/15.2T8GMR-C.G1, citando inicialmente Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 306, e depois Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 705).
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4.2.2. Caso concreto (subsunção ao Direito aplicável)

Concretizando, verifica-se que, tendo o agora exclusivo Executado (J. B.), único devedor, alienado o imóvel que antes hipotecara para garantia do cumprimento da sua dívida, e pretendendo o Exequente (C. C.) fazer pagar a mesma por conta daquele bem, não se encontram porém nos autos os seus actuais proprietário, M. P. e A. M..
Mais se verifica que, constatando-o, o próprio Tribunal a quo convidou aquele a fazer intervir estes, por meio da dedução do pertinente incidente de intervenção principal provocada, conforme se crê que, em abstracto, o poderia fazer.
Com efeito, concorda-se com aqueles que defendem que a «instância processual, conquanto regulada pelas normas de processo civil, não carece de ser “regulamentada” em todos os seus pormenores. Expostas no direito positivo as linhas mestras da tramitação processual e enunciados os pressupostos processuais inderrogáveis, deve admitir-se com naturalidade a manutenção da instância (maxime da instância executiva) quando se verifiquem aquelas condições basilares, privilegiando a realização efectiva dos direitos substantivos subjacentes, sem sobrevalorização de aspectos de natureza processual» (Ac. do STJ, de 16.01.2014, Abrantes Geraldes, Processo n.º 1626/11.2TBFAF-A.G1).
Pondera-se ainda que, sendo «o único fim do processo (…) a obtenção da tutela judiciária pretendida pelas partes que para isso recorreram a tribunal», «quando o tribunal esteja na presença de uma situação duvidosa deve dar prevalência àquela que, respeitando os direitos das partes, melhor contribua para a realização do direito» (Ac. da RL, de 04.04.2019, Isoleta Almeida Costa, Processo n.º 16847/16.3T8LSB-8).
Logo, «não tendo o exequente/credor hipotecário demandado inicialmente os garantes, pode ainda fazê-lo na pendência da execução primitivamente instaurada apenas contra» o executado outorgante de confissão de dívida garantida «por hipoteca, através do incidente de intervenção principal provocada, de modo a que o bem hipotecado, propriedade daqueles terceiros cujo direito de propriedade foi adquirido posteriormente à data da constituição da hipoteca mas antes da dedução da acção executiva, possa responder pela dívida provida de garantia real» (Ac. do STJ, de 18.01.2015, Gregório Silva Jesus, Processo n.º 2482/12.9TBSTR-A.E1.S1).
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Contudo, reagiu a Recorrente (A. M.), terceira actual proprietária do bem hipotecado, defendendo que, tendo sido antes demandada nos autos, e julgada parte ilegítima nos mesmos (com a sua inerente absolvição da instância), não poderia agora ser suscitada a sua intervenção nos mesmos, por a tanto obstar o caso julgado formal constituído sobre a prévia decisão proferida sobre a sua ilegitimidade.
Dir-se-á, porém, que o caso julgado se forma nos precisos limites e termos em que se julga (art. 621.º do CC); e, no que tange ao caso julgado formal, sobre a concreta questão processual apreciada.
Ora, o que foi unicamente apreciado e decidido nos autos foi a ilegitimidade dos antes 3.º e 4.ª Executados (M. P. e A. M.) por falta de referência dos mesmos no titulo executivo, bem como por falta de justificação da sua demanda no requerimento executivo.
Alterando-se os pressupostos fácticos dessa apreciação e decisão (isto é, sendo agora conhecida e comprovada a sua qualidade de actuais proprietários do imóvel hipotecado para garantia da quantia exequenda), o que em conformidade se ajuíze consubstancia nova e inédita decisão (de aplicação do mesmo direito processual - pertinente à legitimidade passiva em processo executivo - a nova realidade); e, assim, inexiste qualquer anterior caso julgado formal que obste à sua prolação.
Por outras palavras, a decisão proferida a propósito da ilegitimidade passiva de M. P. e A. M. só é definitiva e imperativa nos exactos termos em que foi proferida, isto é, apenas impediria a dedução e admissão do incidente de intervenção principal provocada em causa se se tivessem mantido inalterados os respectivos pressupostos (não tanto a omissão dos Intervenientes Principais no título executivo - definitiva -, como a falta de indicação nos autos de qualquer justificação para a respectiva demanda).
Já assim não sucede quando a sua legitimidade é aferida em função de uma nova realidade; e, por isso, necessariamente não ponderada naquela outra decisão (assim insusceptível de ser contraditada, ou reiterada, por aquela outra, posterior).
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Deverá, por isso, decidir-se em conformidade, pela total improcedência do recurso de apelação interposto por A. M., confirmando-se integralmente o despacho recorrido.
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V - DECISÃO

Pelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto por A. M. e, em consequência, em

· Confirmar integralmente o despacho recorrido (que admitiu a intervenção principal provocada dos terceiros actuais proprietários do imóvel hipotecado para garantia do cumprimento da quantia exequenda).
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Custas da apelação pela respectiva Recorrente (art. 527.º, n.º 1 e n.º 2 do CPC).
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Guimarães, 21 de Maio de 2020.

O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos

Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos;
1.º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias;
2.º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.


1. Neste sentido, Ac. do STJ, de 14.10.2002, Fonseca Ramos, Processo n.º 0251037, in www.dgsi.pt, como todos os demais citados sem indicação de origem.
2. No mesmo sentido, José Lebre de Freitas, A Acção Executiva Depois da reforma da reforma, 5.ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2009, pág. 125, onde se lê que pode «acontecer que a garantia real dum crédito incida sobre bens de terceiro, ou porque já assim tenha sido constituída, ou porque, constituída embora sobre bens do devedor, este os tenha posteriormente alienado, em data anterior à propositura da acção executiva». Na jurisprudência, Ac. do STJ, de 16.01.1991, Prazeres Pais, Processo n.º 002690.
3. Precisa-se, porém, que a renúncia do credor à garantia só pode ter lugar pelas formas indicadas na lei civil, não servindo para o efeito a mera proposita da acção em que a garantia não seja invocada. Neste sentido, José Lebre de Freitas, A Acção Executiva Depois da reforma da reforma, 5.ª edição, Coimbra Editora, Maio de 2009, pág. 125; e Rui Pinto, A Ação Executiva, 2018, AAFDL Editora, Junho de 2018, pág. 781.
4. No mesmo sentido, Ac. do STJ, de 14.10.2004, Araújo de Barros, Processo n.º 04B2771.
5. No mesmo sentido, Ac. da RL, de 25.10.2012, Magda Geraldes, Processo n.º 26999/09.3T2SNT-B.L1-2, Ac. da RP, 15.04.2013, CJ, Tomo II, pág. 188, Ac. da RG, de 12.11.2013, Ana Cristina Duarte, Processo n.º 750/10.3TBFLG-B.G1, Ac. do STJ, de 18.01.2015, Gregório Silva Jesus, Processo n.º 2482/12.9TBSTR-A.E1.S1, e Ac. da RL, de 04.04.2019, Isoleta Almeida Costa, Processo n.º 16847/16.3T8LSB-8.
6. No mesmo sentido, Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, pág. pág. 704, onde se lê que «o caso julgado formal tem força obrigatória apenas dentro do processo, obstando a que o Juiz possa na mesma acção, alterar a decisão proferida, mas não impedindo que, noutra acção, a mesma questão processual concreta seja decidida em termos diferentes pelo mesmo Tribunal ou por outro entretanto chamado a apreciar a causa».
7. Fica paralisada a eficácia decisão contraditória proferida em segundo lugar, conforme Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, pág. 196, não sendo contudo pacífica a qualificação do vício de que padece.
8. Neste sentido, Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, págs. 92-93.
9. No mesmo sentido, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, págs. 713 e 714, onde nomeadamente se lê que, seja «qual for o seu conteúdo, a sentença produz, no processo em que é proferida, o efeito de caso julgado formal, não podendo mais ser modificada (…). Mas, quando constitui uma decisão de mérito (“decisão sore a relação material controvertida”), a sentença produz também, fora do processo, o efeito de caso julgado material: a conformação das situações jurídicas substantivas por ela reconhecidas como constituídas impõe-se, com referência à data da sentença, nos planos substantivo e processual (…), distinguindo-se, neste, o efeito negativo da inadmissibilidade duma segunda acção (proibição de repetição: excepção de caso julgado) e o efeito positivo da constituição da decisão proferida em pressuposto indiscutível de outras decisões de mérito (proibição de contradição: autoridade de caso julgado)». Ainda Miguel Teixeira de Sousa, «O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material», BMJ, n.º 325, pág. 49, onde se lê - com bold apócrifo - que «a excepção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior», enquanto que «quando vigora como autoridade e caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de acção, a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição do processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior».
10. O art. 2502.º do CC de Seabra, de 1867, afirmava cristalinamente que o caso julgado é o facto ou o direito, tornado certo por sentença de que não há recurso. O art. 580º, n.º 2 do CPC dispõe hoje no mesmo sentido, quando afirma que tanto a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior».