Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
4013/09.9TBGMR-A.G2
Relator: MARIA LUÍSA RAMOS
Descritores: APOIO JUDICIÁRIO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Tendo já sido definitivamente deferida ao requerente pela entidade competente - Instituto de Solidariedade e Segurança Social - Centro Distrital de Segurança Social, a protecção jurídica requerida a tal entidade, beneficiando já este de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, desde a data da decisão, e, não decorrendo, nomeadamente, do artº 18º- nº2 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (LAJ), quaisquer efeitos de ineficácia ou de invalidade do apoio judiciário concedido, e em vigor, deve tal benefÍcio ser considerado nos autos.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

A. Oliveira, Exequente nos autos de processo de execução em curso, notificado do despacho judicial de 11/10/2017, o qual considerou ineficaz o pedido de benefício de apoio judiciário apresentado pelo Exequente, e indeferiu o seu requerimento de dispensa do pagamento das custas de parte, uma vez que beneficiava de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça, inconformado veio do mesmo interpor recurso de apelação.

O recurso foi recebido, como recurso de apelação, com subida nos autos e com efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes conclusões:

1. A. OLIVEIRA, Exequente nos autos à margem melhor identificados, não se conforma com o douto despacho prolatado em 11-10-2017, o qual considerou ineficaz o pedido de benefício de apoio judiciário apresentado pelo Exequente, e indeferiu o seu requerimento de dispensa do pagamento das custas de parte, uma vez que beneficiava de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça;
2. Em 15/10/2009, o aqui Recorrente intentou ação executiva para pagamento de quantia certa contra M. Silva, com o valor de € 10.762,15 (dez mil setecentos e sessenta e dois euros e quinze cêntimos), à qual foi atribuída o nº de processo 4013/09.9T9GMR;
3. Aquando a instauração da referida ação executiva, o aqui Recorrente efetuou o pagamento da competente taxa de justiça no valor de € 25,50 (vinte e cinco euros e cinquenta cêntimos) e, ainda, do valor de € 153,00 a título de pagamento de honorários da Fase 1 ao Agente de Execução;
4. Na sequência da oposição à execução apresentada pela Executada, o aqui Requerente, em 24/03/2010, apresentou a contestação àquela oposição, efetuando o pagamento da quantia de € 229,50 a título de taxa de justiça devida pela aludida contestação;
5. Porém, e uma vez que o Requerente subsequentemente começou a ter dificuldades em continuar suportar as despesas inerentes aos presentes autos, requereu, em 12/01/2011, a proteção jurídica na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, proteção jurídica esta que veio a ser DEFERIDA em 28/02/2011, por despacho que não foi objeto de impugnação por nenhum dos sujeitos processuais com legitimidade para o efeito, formando assim caso julgado;
6. Porém, o Tribunal a quo, infundada e intempestivamente, considerou agora ineficaz a proteção jurídica concedida ao aqui Recorrente, fazendo tábua rasa da decisão de concessão de apoio judiciário proferida pela Segurança Social, depois de verificados todos os pressupostos de facto e de direito, o que ocorreu já há cerca de 6 anos atrás e sem que tivesse sido aquele decisão impugnada e sem que se verifique qualquer vício formal ou material, indeferimento o requerimento de dispensa do pagamento das custas de parte, apresentado pelo recorrente - que o não carecia de ter apresentado porque era a secção que deveria oficiosamente verificar a concessão do beneficio em causa - uma vez que beneficiava de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça;
7. Se os serviços de Segurança Social - ou qualquer sujeito processual - tivessem quaisquer dúvidas quanto ao preenchimento dos requisitos formais e quanto à verificação de situação económica susceptível de ver atribuído o benefício, naturalmente, não defeririam o pedido de proteção jurídica - ou impugnariam essa concessão -, sendo certo que aquele instituto, ou qualquer sujeito processual, nunca questionou, sequer, a oportunidade do pedido, nem a existência de qualquer alteração económica superveniente que justificasse a .
8. Ora, no douto despacho que ora se recorre, o Tribunal a quo considerou que o pedido de proteção jurídica deve, agora e sem que fosse requerido o cancelamento, nos termos do n.º 3 do artigo 10º, da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, ser considerado ineficaz, uma vez que entende que o aqui Recorrente não alegou nem demonstrou que se encontrava em situação de insuficiência económica superveniente.
9. Porém, não é isso que resulta dos autos e sempre se diga que se essa insuficiência económica superveniente não fosse devidamente demonstrada, os serviços de Segurança Social não teriam naturalmente deferido o pedido de proteção jurídica ora em apreço e o Ministério Público, ou a parte contrária, teriam certamente impugnado aquela decisão ou teriam requerido o cancelamento da mesma, o que não veio a acontecer, conformando-se todos com a decisão.
10. Acresce, reitere-se, que, após ter proferido tal decisão, a mesma não foi posta em crise em nenhum momento, nomeadamente, não foi alvo de impugnação judicial, bem como não foi posteriormente cancelada nos termos do nº 1 artigo 10º da Lei de Acesso ao Direito.
11. Acresce ainda que, se a proteção jurídica em apreço for, efetivamente, considerada ineficaz, o aqui Recorrente terá de despender avultadas quantias no pagamento das custas processuais no âmbito dos presentes autos, quantias essas que não dispõe, frustrando-se, assim, não só a segurança jurídica que deveria existir e as legítimas expectativas criadas no que concerne ao deferimento da aludida proteção jurídica que lhe permitiu continuar a litigar.
12. Naturalmente, se o Recorrente requereu a proteção jurídica após a primeira intervenção processual, é porque da mesma carecia, razão pela qual a requereu, instruindo o competente requerimento com os documentos atestativos da sua situação económica, tendo sido proferida, reitere-se decisão de DEFERIMENTO, que não foi impugnada, nem cancelada.
13. Assim, salvo o devido respeito e melhor opinião, não podia, nem devia, o Tribunal a quo, sem fundamento de facto e de direito, vedar o acesso ao benefício de apoio judiciário concedido por despacho, ao aqui Recorrente há 6 (seis) anos atrás, em violação do caso julgado, e ignorando que a competência para essa concessão e cancelamento é dos Serviços de Segurança Social, declarando ilegalmente a ineficácia do pedido de benefício de apoio judiciário apresentado pelo Exequente e indeferindo o pedido formulado pelo exequente.
14. Disposições violadas: As disposições referidas supra, nomeadamente os artigos 1º nº 1, 7º nº 1, 8º nº 1, 10º nº 1 e 18º nº 2 da Lei 34/2004 de 29 de Julho (com as respetivas alterações) e, ainda, o nº 1 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa e artigo 620º do Código de Processo Civil, e as demais disposições que V. Exias suprirão.

Não foram proferidas contra – alegações.

O recurso veio a ser admitido neste tribunal da Relação na espécie e com os efeitos e regime de subida fixados no despacho de admissão do recurso na 1ª instância.
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Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
Questão a decidir: reapreciação da decisão recorrida que indeferiu o requerimento de fls. 473vº apresentado nos autos pelo exequente/apelante

FUNDAMENTAÇÃO – DE FACTO E DE DIREITO

I. A factualidade a atender é a que resulta do relatório supra.
II. Nos termos do art.º 1º da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, o sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a assegurar que a ninguém seja dificultado ou impedido, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos, o conhecimento, o exercício ou a defesa dos seus direitos.
A protecção jurídica pode ser requerida pelo interessado na sua concessão ( art.º 19º-alínea. a) da citada Lei ), e, a decisão sobre a concessão de protecção jurídica compete ao dirigente máximo dos serviços de segurança social da área da residência ou sede do requerente ( art.º 20º ).
Dispõe o art.º 24º-n.º1, da Lei n.º 34/2004, que o procedimento de protecção jurídica na modalidade de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite, não tendo qualquer repercussão sobre o andamento desta.
O apelante, no uso da legal faculdade que lhe é conferida por lei, no âmbito da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, que prevê e regulamenta as normas de acesso ao direito e aos tribunais, requereu e viu-lhe deferida pela entidade competente - Instituto de Solidariedade e Segurança Social - Centro Distrital de Segurança Social, a protecção jurídica requerida a tal entidade, decisão esta já definitivamente proferida em 28/2/2011.
Veio ora nos autos de execução em curso em que é exequente, o apelante formular o pedido constante do requerimento de fls.473vº, no sentido de ser dispensado do pagamento das custas de parte com o fundamento de que litiga com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça.
Tal requerimento veio a ser indeferido pelo despacho recorrido, com o seguinte fundamento: “ Compulsados os autos, e conforme resulta da douta promoção da DM do MP, o pedido de apoio judiciário em apreço foi apresentado pelo exequente após a prática do primeiro ato. Acresce que, o exequente, como muito bem salienta a DM do MP, não instruiu esse seu pedido (superveniente) com a alegação de que essa sua (suposta) insuficiência económica é superveniente à prática do primeiro ato no âmbito do processo de execução.- cfr. artigo 18.º, n.º 2, da LAJ(...), não resultando do pedido de benefício de apoio judiciário apresentado pelo exequente já no decurso do processo de execução que essa sua insuficiência económica é posterior à prática do primeiro ato processual por si praticado, apenas nos resta concluir, como muito bem salienta a DM do MP, que esse seu pedido, apesar de sufragado pelo I.S.S., é absolutamente ineficaz nos presentes autos”.
Ora, por um lado, o exequente/apelante viu-lhe já deferida pela entidade competente - Instituto de Solidariedade e Segurança Social - Centro Distrital de Segurança Social, a protecção jurídica requerida a tal entidade, decisão esta já definitivamente proferida em 28/2/2011, beneficiando de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, e, por outro, não decorrem da norma aplicada pelo Tribunal “ a quo “, designadamente do artº 18º- nº2 da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho (LAJ), quaisquer efeitos de ineficácia ou de invalidade do apoio judiciário concedido, e em vigor, nomeadamente em virtude da falta de alegação nos autos de processo da verificação de superveniência de insuficiência económica, sendo que nos termos do nº3 do citado preceito legal tal alegação tem em vista, tão só, a possibilidade de o requerente obter a suspensão do prazo de pagamento da taxa de justiça e demais encargos devidos e até á decisão definitiva do pedido de apoio judiciário por entidade autónoma nos termos do artº 24º-nº 4 e 5, situação esta que se não coloca no caso em apreço, tendo já sido proferida a decisão e com efeitos desde a data da concessão do apoio judiciário, concretamente 28/2/2011.
Concluindo-se, nos termos expostos, pela procedência do recurso de apelação, revogando-se a decisão recorrida, devendo o Tribunal “ a quo “ apreciar o requerimento em referência considerando o apoio judiciário de que beneficia o apelante.

DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Tribunal em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida, devendo o Tribunal “a quo“ apreciar o requerimento em referência considerando o apoio judiciário de que beneficia o apelante.
Sem custas.
Guimarães, 15 de Março de 2018

Maria Luísa Ramos
António Sobrinho
Jorge Teixeira