Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2743/17.0T8GMR.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: EXECUÇÃO DE SENTENÇA
RECURSO COM EFEITO DEVOLUTIVO
TRÂNSITO EM JULGADO PARCIAL
EFEITOS SOBRE A EXECUÇÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/03/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário ( elaborado pelo Relator):

I- A atribuição a um recurso de efeito meramente devolutivo significa que é possível executar a decisão recorrida na pendência do Recurso, mas a decisão do Tribunal ad quem irá repercutir-se na decisão que entretanto tenha dado origem à acção executiva (art. 704º do CPC)

II- Assim, se a decisão final revoga totalmente a decisão exequenda, a execução extinguir-se-á; se a decisão final revoga parcialmente a decisão exequenda, mantendo parcialmente a condenação do executado, a execução modificar-se-á, isto é, a execução prosseguirá quanto à parte que não foi revogada.

III- No entanto, quando a decisão do Tribunal ad quem não seja definitiva (2ª parte, do nº 1 do art. 704º do CPC), ou seja, quando se trate de decisões intermédias objecto de recurso para o Tribunal Superior (necessariamente com efeito devolutivo, atento o disposto no art. 676º do CPC), podem surgir duas situações: a. a execução suspender-se-á quando a decisão intermédia tiver revogado totalmente a que estava a ser executada; b. ou modificar-se-á quando a decisão intermédia tiver revogado parcialmente a que estava a ser executada.

IV- Deste regime legal resulta, assim, que se tiver sido instaurada uma acção executiva na pendência de recurso com efeito devolutivo, essa execução, por natureza provisória, sofrerá as consequências da decisão que a causa venha a ter nas instâncias superiores

V- Em caso de efectivação de penhora de conta bancária, podem existir pagamentos parciais à exequente, independentemente da aceitação, por parte desta, desse cumprimento parcial, sendo certo, aliás, que esse pagamento é imposto pelo Legislador ao Agente de execução (nº 13 do art. 735º do CPC).

VI- A competência (de entrega do dinheiro penhorado) incumbe, em primeira linha, ao Agente de execução, conforme decorre expressamente do citado nº 13 do art. 780º do CPC, só podendo o Tribunal intervir no caso de as partes reclamarem da decisão do Agente de execução (cfr. art. 723º do CPC), ou em sede de controlo geral da sua actuação.

VII- Tendo sido dada à execução, uma sentença de que foi interposto recurso recebido com efeito meramente devolutivo, enquanto tal recurso estiver pendente não pode, em princípio, o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução (artigo 704º, nº 3 do CPC).

VIII- A razão de ser da exigência de prestação da caução nestes casos é garantir a satisfação dos eventuais danos e prejuízos que possam vir a ser causados ao executado em virtude da execução provisória da sentença e da eventual reversão da decisão na Instância Superior.

IX- Nos casos em que não tenha sido interposto Recurso por parte da Ré/Executada, a entrega do dinheiro penhorado que coincida com o montante mínimo já definitivamente fixado no Acórdão do Tribunal da Relação não implica para a executada qualquer risco, pois que esta, não tendo apresentado Recurso, não tem a expectativa de reverter essa condenação.

X- Nesta conformidade, tendo em conta a razão de ser subjacente à prestação de caução, e não se verificando no caso concreto que esses interesses da Executada possam ser prejudicados, entende-se que a entrega à Exequente daquele montante mínimo (já definitivo) pode ser efectuada, sem que, para o efeito, esta tenha que prestar caução (que nenhuma utilidade poderia ter, pois que não existe o risco de a situação ser revertida por efeito dos recursos ainda pendentes).”
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.

Recorrente(s): - NP, S.A. e TR. – Gestão de bens móveis e imóveis, S. A.;
Recorrida: - X Companhia de Seguros, S. A.;
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Os presentes autos dizem respeito a uma execução instaurada pelas Recorrentes contra a Executada, cujo título executivo é a sentença proferida em 7 de Abril de 2016, de que a Executada interpôs recurso de apelação- a que foi fixado efeito meramente devolutivo-, sentença de que as primeiras também interpuseram recurso de apelação, igualmente com efeito devolutivo.
Mostra-se junto a fls. 2 e ss. o requerimento inicial executivo da aludida decisão condenatória, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
No dia 28 de Abril de 2017, à Executada foi penhorado o depósito bancário no valor de 7.744.212,44 €, referente a 7.375.440,42 € de dívida exequenda, e a 368.772,02 € de despesas prováveis- fls. 96.
Por carta registada datada de 28 de Abril de 2017, a Executada foi citada para a execução e para, querendo, no prazo de 20 dias, deduzir-lhe embargos de executado- fls. 97.
No dia 17 de Novembro de 2017, a Executada apresentou na presente execução o requerimento junto a fls. 98 e ss., onde formulou o seguinte pedido: “ Nestes termos deverá a execução ser modificada nos termos do artigo 704º, nº 2 do CPC, sendo ordenado ao agente de execução que proceda à adjudicação às exequentes NP e TR. respectivamente das quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30, o que se requer para efeitos de pagamento e cessação da contagem de juros nos presentes autos ”.

Com esse requerimento, a Executada juntou certidão, emitida em 6 de Novembro de 2017, do acórdão entretanto proferido no dia 14 de Setembro de 2017 pelo Tribunal da Relação de Guimarães de onde consta, além do mais, o seguinte:

“Certifica-se, ainda, narrativamente, que a notificação do acórdão acima identificado foi notificado, por carta registada, em 15/09/2017, presumindo-se esta feita no dia 18/09/2017. Por fim, certifica que, até ao momento em que esta certidão me foi solicitada, apenas constam dos autos os requerimentos de interposição de recurso para o S.T.J., por parte da recorrida NP, S.A., apresentados em 18/10/2017 (Recurso de Revista interposto quanto à parte decisória da alínea c) do referido acórdão) e em 23/10/2017 (Recurso de Revista excepcional), encontrando-se os autos a aguardar o decurso do prazo do contraditório ”.
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No dia 30 de Novembro de 2017, as Recorrentes, pelo requerimento junto a fls. 225 e ss, que aqui se dá por integralmente reproduzido, vieram exercer o respectivo direito ao contraditório àquele pedido da Executada, formulando a seguinte conclusão: “ Assim, por causa dos onze fundamentos expostos e invocados, requer-se a V. Exª. que o pedido do requerimento da executada seja indeferido”.
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Sobre o Requerimento apresentado pela Executada recaiu então a seguinte decisão proferida em 20.12.2017:
“Atento o teor do douto Ac. TRG, a executada terá de pagar, pelo menos, às exequentes NP e TR., respectivamente, as quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30.

Note-se que este pedido formulado pela executada em nada contende com os direitos processuais, na sua visão mais vasta e absoluta, das exequentes porquanto, a vingar a tese das exequentes num putativo recurso de revista, no mínimo, estas quantias já são devidas pela executada.

Mas mesmo que assim não fosse, a única prejudicada com o pedido de adjudicação seria obviamente a executada/requerente desse mesmo pedido de adjudicação, por pagamento indevido, o que, manifestamente, não é o caso.
Neste contexto, e considerando o pedido formulado pela própria executada no sentido de, desde já, serem adjudicadas estas quantias a estas exequentes, determino a notificação da AE para proceder em conformidade com este pedido da exequente.
Prazo: 5 dias.
Remeta requerimento da exequente à AE. (nesta parte corrigido a fls. 231 passando a ler-se “Remeta requerimento da executada à AE”).
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É justamente desta decisão que as Recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“SÍNTESE CONCLUSIVA

- A decisão impugnada, para além de ter sido “ ocultada ” às recorrentes por não lhes ter sido notificada, apesar de terem contraditado o respectivo pedido formulado pela executada, não contém especificação dos fundamentos de facto e de direito que a tenham justificado, pelo que por força do disposto no nº 1 do artigo 154º e na alínea b) do nº 1 do artigo 615º, ambos do Código de Processo Civil, ex vi nº 3 do seu artigo 613º, impõe-se que seja declarada nula e de nenhum efeito.
- A decisão impugnada, na sua determinação ao agente de execução para proceder em conformidade com o pedido da executada de adjudicação às exequentes, aqui recorrentes, respectivamente, das quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30 para efeitos de pagamento e cessação da contagem de juros na execução, violou o disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 704º, no artigo 628º, no nº 2 do artigo 716º, no nº 1 do artigo 719º, no nº 1 do artigo 53º, no nº 2 do artigo 574º, no nº 1 do artigo 551º e no nº 3 do artigo 732º, todos do Código de Processo Civil, pelo que se impõe que seja revogada.“
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Foram apresentadas contra-alegações pela Recorrida/Executada, onde pugna pela improcedência do Recurso, apresentando as seguintes conclusões:

“CONCLUSÕES:

I A previsão do n.º 3 do artigo 704.º do CPC é instituída em benefício do executado visando a sua protecção em caso de redução do valor de condenação fixada em decisão pendente de recurso.
II- A executada aceitou a condenação de que foi objecto, aceitação essa implícita na omissão de recurso da decisão proferida pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães.
III- Em face da proibição de reformatio in pejus a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães corresponde ao valor mínimo de condenação da Executada.
IV- É inequívoco o trânsito em julgado parcial da decisão no que concerne in limine à executada TR. em face da inexistência de recurso quanto à indemnização arbitrada a esta.
V- Não foi atribuído efeito suspensivo ao recurso interposto pela Exequente NP.
VI- Atentas as conclusões antecedentes, resulta claro ser isento das criticas que lhe são apontadas o despacho proferido pelo Tribunal a quo que ordenou a adjudicação às exequentes NP e TR. respectivamente das quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30, calculadas [considerando (i) o teor do acórdão junto como doc.1, (ii) a circunstância da data da citação da executada no processo 476/07.5TCGMR ter ocorrido no dia 20/09/2007 e (iii) a data em que chegou ao termo o prazo de recurso por parte da ora executada], requerida pela Executada ora Recorrida.
VII-São claras as razões pelas quais, inusitadamente é recusado pelas executadas o pagamento de mais de € 7.000.000,00 (dos quais mais de metade correspondem a juros) requerido pela Executada”
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Tendo sido arguida a nulidade da decisão sob recurso, pronunciou-se o Tribunal Recorrido sobre tal nulidade, defendendo que a mesma não foi cometida.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, as Recorrentes colocam a(s) seguinte(s) questão(ões) que importa apreciar:

1. Nulidade da decisão por omissão de fundamentação de facto e de direito (art. 615º, nº1, al. b) do CPC).
2. Ilegalidade da decisão por violação do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 704º, no artigo 628º, no nº 2 do artigo 716º, no nº 1 do artigo 719º, no nº 1 do artigo 53º, no nº 2 do artigo 574º, no nº 1 do artigo 551º e no nº 3 do artigo 732º, todos do Código de Processo Civil
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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Como factualidade relevante interessa aqui ponderar apenas os trâmites processuais e o teor da decisão proferida que se transcreveu na integralidade atrás (e que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais).
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Comecemos pela primeira questão atrás enunciada.
Defendem as Recorrentes que a decisão é nula por falta de fundamentação de facto e de direito (art. 615º, nº 1, al. b) do CPC).
Alegam que a decisão em recurso porque não contém especificação dos fundamentos de facto e de direito que a tenham justificado, é nula por omissão de fundamentação de facto e de direito.

Vejamos se assim é.
O vício que as Recorrentes apontam à decisão é a nulidade a que alude a al. b) do art. 615º do CPC.
Como é sabido, uma coisa é a falta de fundamentação da decisão da matéria de facto, outra coisa é a nulidade da sentença quando não especifique os fundamentos, de facto e de direito que justificam a decisão (al. b) do citado artigo 615.º nº 1 do CPC).
A nulidade decorrente da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607º, nº 3 do CPC, que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Como é entendimento pacífico da doutrina, nestes casos só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º. A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade (1).
Portanto, para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão (2).
Nessa medida, trata-se de uma situação que não se verifica, no caso concreto, quanto à questão que aqui é colocada.
Na verdade, quanto à decisão aqui posta em causa, verdadeiramente não existem factos que possam consubstanciar a conclusão de direito a que aí se chegou (ou seja, a constatação de que o requerimento da Executada formulado no sentido de, desde já, serem adjudicadas as quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30 às Exequentes merece deferimento pelas fundamentos nela mencionados).
Na verdade, o facto que pode ser relevante para esse efeito é o indicado pelo Tribunal Recorrido (ou seja, o seguinte facto: ““Atento o teor do douto Ac. TRG, a executada terá de pagar, pelo menos, às exequentes NP e TR., respectivamente, as quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30.”)
Nessa medida, quanto à omissão da fundamentação de facto entende-se que a arguição das Recorrentes não tem aqui qualquer campo de aplicação.
Por outro lado, importa dizer que as Recorrentes também não têm razão quando invocam a falta de fundamentação de direito.
Desde logo, porque, como se referiu, só se pode entender que a decisão recorrida se encontra viciada por falta de fundamentação no sentido aqui exigido, quando se constata existir total ausência de fundamentação- o que não é seguramente o caso concreto da decisão aqui questionada.

Importa dizer que, quanto à arguição deste vício de nulidade, à excepção dos actos meramente ordenadores do processo e dos despachos de mero expediente, compete, efectivamente, ao juiz fundamentar todas as decisões tomadas: art. 154º, nº 1 do CPC (“As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre justificadas”).
Mesmo que o CPC não o referisse, essa necessidade de fundamentação resultaria por imposição directa do art. 205º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa (CRP): “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.
Será esta fundamentação que assegura ao cidadão o controlo da decisão e permitirá ao Tribunal de recurso a sindicância do bem ou mal julgado.
Essa fundamentação deve ser expressa e, ainda que sucinta, deve ser suficiente para permitir o controlo do acto.
Ora, compulsado o teor da decisão aqui posta em crise, não há dúvidas que o Tribunal, ainda que de uma forma sucinta, fundamenta a sua decisão, pelo não se verifica o vício de falta de fundamentação que as Recorrentes invocam.
Não pode, pois, o presente Tribunal reconhecer o vício imputado à decisão pelas Recorrentes.
De qualquer forma, mesmo que se reconhecesse a eventual nulidade da decisão, por falta de fundamentação de direito, sempre tal nulidade poderia/teria de ser suprida pelo presente Tribunal- que aqui interviria como Tribunal de Substituição (cfr. art. 665º do CPC) (3) - uma vez que dispomos de todos os elementos que nos permitem pronunciar sobre a questão enunciada.
Improcede a nulidade invocada.
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Avancemos agora para a segunda questão que é colocada pelas Recorrentes e que contende, como se referiu, com a alegada violação dos seguintes preceitos legais:

-nºs 1 e 2 do artigo 704º, no artigo 628º, no nº 2 do artigo 716º, no nº 1 do artigo 719º, no nº 1 do artigo 53º, no nº 2 do artigo 574º, no nº 1 do artigo 551º e no nº 3 do artigo 732º, todos do Código de Processo Civil

Entendem as Recorrentes que:

I) Não estão verificados os requisitos legais que permitem modificar os termos da execução inicialmente instaurada, uma vez que decorre da certidão judicial junta que o Acórdão da Relação de Guimarães não é uma decisão definitiva.

Fundamentos:

A)- Lê-se na primeira parte do nº 1 do artigo 704º do Código de Processo Civil: “ A execução iniciada na pendência de recurso extingue-se ou modifica-se em conformidade com a decisão definitiva comprovada por certidão ”.
Logo, a mencionada certidão, junta pela executada e referida supra, não é certidão de decisão definitiva, porque atesta que do acórdão de 14 de Setembro de 2017 do Tribunal da Relação de Guimarães foram interpostos dois recursos para o Supremo Tribunal de Justiça; um em 18 de Outubro de 2017 de revista normal, e outro, em 23 de Outubro de 2017, de revista excepcional;
B)-Lê-se no artigo 628º do Código de Processo Civil: “ A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação”.
Logo, a(s) decisão(ões) condenatória(s) daquele acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, certificada(s) pela dita certidão, não transitou(aram) em julgado, nem as da sentença de 7 de Abril de 2016, referida supra.
C)-Lê-se na segunda parte do nº 2 do artigo 704º do Código de Processo Civil: “ As decisões intermédias podem igualmente suspender ou modificar a execução, consoante o efeito atribuído ao recurso que contra elas se interpuser ”.
Logo, a(s) decisão(ões) daquele acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, certificado pela referida certidão, é (são) decisão(ões) intermédia(s).
E, apenas, “ consoante o efeito atribuído ao recurso que contra elas se interpuser ”, no caso, àqueles recursos interpostos nos dias 18 e 23 de Outubro de 2017, e a cujo(s) efeito(s) a mencionada certidão não certifica que tenham sido atribuídos.
Logo, essa certidão nem sequer serve para suspender ou modificar a execução, instaurada em 7 de Abril de 2017 pelas recorrentes contra a executada e referida supra.
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D)- Lê-se no nº 3 do artigo 704º do Código de Processo Civil: “ Enquanto a sentença estiver pendente de recurso, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução”- o que, por óbvio, é aplicável a acórdãos das Relações.
Logo, às Recorrentes pelo valor do depósito bancário, referido supra, nenhuma das quantias de € 2.281.781,00 e de € 4.889.950,30, que a decisão impugnada determinou ao agente de execução adjudicar, respectivamente, às recorrentes NP, S.A. e TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A., pode ser adjudicada ou paga sem que estas prestem caução(ões).
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II) Não estão verificados os requisitos que permitem a liquidação (parcial) antecipada da execução. Essa liquidação só é efectuada a final e quem tem competência para a efectuar é apenas o Agente de execução (e não o Tribunal, nem a executada).

E)- Lê-se no nº 2 do artigo 716º do CPC: “ Quando a execução compreenda juros que continuem a vencer-se, a sua liquidação é feita a final, pelo agente de execução, em face do título executivo e dos documentos que o exequente ofereça em conformidade com ele ou, sendo caso disso, em função das taxas legais de juros de mora aplicáveis ”.

Logo, na execução, instaurada pelas Recorrentes, é só da competência do respectivo agente de execução, V. P., fazer a liquidação dos juros que continuem a vencer-se; só a final, e só às Recorrentes cabe competência para lhe apresentar documentos em conformidade com o respectivo título executivo, dado à execução, e que é a sentença da primeira instância, proferida em 7 de Abril de 2016, pelo que é apodíctico que nem a Executada tem competência para liquidar juros de quantias executadas, nem o Tribunal a tem, e que a decisão impugnada implicitamente admitiu ao deferir o pedido da executada.
F)- Lê-se no nº 1 do artigo 719º do Código de Processo Civil: “ Cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídos à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, citações, notificações, publicações, consultas de bases de dados, penhoras e seus registos, liquidações e pagamentos”.
Logo, não cabe ao Tribunal determinar ao respectivo agente de execução, V. P., que proceda em conformidade com aquele pedido da executada, de adjudicação às recorrentes, respectivamente, das quantias de € 2.281.781,00 e de € 4.889.959,30, para efeitos de pagamento e cessação da contagem de juros, por ser evidente, que é só da competência desse agente de execução efectuar pagamentos, e só quando seja na execução confrontado com certidão de decisão(ões) definitiva(s), que na execução inexiste.
G)-Lê-se no nº 1 do artigo 53º do Código de Processo Civil: “ A execução tem de ser promovida pela pessoa que no título figure como credor e deve ser instaurada contra a pessoa que no título tenha a posição de devedor ”.
Logo, a Executada não tem legitimidade para promover pelo seu requerimento, referido supra, a execução pelas decisões condenatórias contra si produzidas pelo mencionado acórdão de 14 de Setembro de 2017 do Tribunal da Relação de Guimarães, nem o Tribunal tem legitimidade para tal, e que foi o que a decisão impugnada fez.
H)- Pela leitura atenta da sentença, dada à execução como título executivo, verifica-se que a Executada está a ser executada por decisões condenatórias, em que por ela foi condenada, a título do pedido subsidiário:

- Pelas decisões condenatórias das quantias de 611.208,53 € e de 780.554,56 €, à recorrente NP, S.A., e
- Pela decisão condenatória da quantia de 2.551.650,00 €, à recorrente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A.
E pela leitura atenta da mencionada certidão daquele acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, verifica-se que a Executada, pelas suas decisões condenatórias, também foi condenada, a título do pedido subsidiário:

- Pelas decisões condenatórias das quantias de € 621.780,00, € 25.305,76 e de € 558.525,58, à Recorrente NP, S.A., e
- Pela decisão condenatória da quantia de € 2.568.110,00, à Recorrente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A.
Ora, aquela certidão, junta pela Executada e referida supra, relativamente aos recursos de revista, interpostos nos dias 18 e 23 de Outubro de 2017, e que ela certifica que foram interpostos, não certifica se os mesmos contendem ou não com o pedido principal, e se têm ou não consequências no pedido subsidiário, ambos deduzidos na acção declarativa e que nela, de folhas 2433 a 2441, foram alterados, como resulta da leitura das primeiras três folhas da certidão daquele acórdão de 14 de Setembro de 2017 do Tribunal da Relação de Guimarães.
Logo, essa certidão carece de valor probatório para o Tribunal determinar àquele agente de execução, que adjudique às Recorrentes NP, S.A. e TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A., respectivamente, as quantias de € 2.281.781,00 e € 4.889.959,30, para efeitos de pagamento e cessação da contagem de juros, que foi o que a Executada pediu e que a decisão impugnada determinou.

III). Os juros, quando forem liquidados, têm de ser liquidados até efectivo pagamento e às taxas alegadas pelas Recorrentes no requerimento inicial da execução.

I)- Pela leitura atenta do requerimento, referido supra da Executada, verifica-se que:

- Liquidou juros até ao dia 23 de Outubro de 2017.
- Utilizou as taxas de juros de 7,5%, 7,25%, 7,15%, 7,05%, 7,05%, 7% e 7%, relativamente, aos períodos de 1 de Julho de 2013 a 31 de Dezembro de 2013, de 1 de Janeiro de 2014 a 30 de Junho de 2014, de 1 de Julho de 2014 a 31 de Dezembro de 2014, de 1 de Janeiro de 2015 a 30 de Junho de 2015, de 1 de Julho de 2015 a 31 de Dezembro de 2015, de 1 de Janeiro de 2016 a 30 de Junho de 2016, de 1 de Julho de 2016 a 31 de Dezembro de 2016, de 1 de Janeiro a 30 de Junho de 2017.
Sucede que a Executada foi condenada a pagar juros até efectivo pagamento; na execução as Recorrentes liquidaram juros, relativamente, àqueles mesmos períodos de tempo, respectivamente, às taxas de 8,50%, 8,25%, 8,15%, 8,05%, 8,05%, 8% e 8%, e a Executada não deduziu oposição, por embargos, à execução, como decorre dos factos supra.
Logo, os juros, quando forem liquidados, têm de ser liquidados até efectivo pagamento e às taxas, alegadas pelas Recorrentes no requerimento inicial da execução, face ao disposto no nº 2 do artigo 574º, no nº 1 do artigo 551º e no nº 3 do artigo 732º, todos do Código de Processo Civil.
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Aqui chegados, importa, pois, que o presente Tribunal se pronuncie sobre cada um dos fundamentos apresentados pelas Recorrentes.
Comecemos por analisar a argumentação que contende, no fundo, com os requisitos da exequibilidade da sentença (que constitui o título executivo), nomeadamente, quando daquela- como sucedeu no caso concreto- tenha sido interposto recurso (com efeito meramente devolutivo).
Esses requisitos legais estão previstos nos nºs. 1 e 3 do art. 704º do CPC.
Defendem as Recorrentes que não estão verificados os requisitos legais aí previstos- que permitiriam modificar os termos da execução inicialmente instaurada-, uma vez que decorre da certidão judicial junta que o Acórdão da Relação de Guimarães não é uma decisão definitiva.
O Tribunal Recorrido teve diferente entendimento, pois que, conforme decorre da fundamentação que apresenta, considerou que “o pedido formulado pela executada em nada contende com os direitos processuais, na sua visão mais vasta e absoluta, das exequentes porquanto, a vingar a tese das exequentes num putativo recurso de revista, no mínimo, estas quantias já são devidas pela executada. Mas mesmo que assim não fosse, a única prejudicada com o pedido de adjudicação seria obviamente a executada/requerente desse mesmo pedido de adjudicação, por pagamento indevido, o que, manifestamente, não é o caso”.
Desta argumentação parece decorrer a ideia de que a sentença, no que concerne às quantias objecto do pedido de liquidação, teria (parcialmente) transitado em julgado (porque dessa parte da condenação não foi interposto Recurso).

Por outro lado, parece também poder extrair-se a ideia de que, ao efectuar o pedido de adjudicação às Exequentes daquelas quantias, a Executada estaria a prescindir da exigência de prestação de caução prevista como regra geral para o pagamento da quantia exequenda ao exequente (ou a qualquer credor) na pendência de Recurso (nº 3 do art. 704º do CPC)
Cumpre decidir.
Nos termos do art. 10º, nº 5 do CPC toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da acção executiva.
No caso concreto, o título da acção executiva é a sentença condenatória dada à execução (art. 703º, nº 1, al. a) do CPC).

Dispõe o art. 704º do CPC, na parte aqui aplicável, que a sentença só constitui título executivo depois do trânsito em julgado, o que se verifica logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou reclamação, nos termos dos artigos 615º e 616º do CPC (art. 628º).
Transitada em julgado, a decisão sobre a relação material controvertida passa a ter força obrigatória dentro do processo (art. 619º do CPC), constituindo a sentença caso julgado nos precisos limites e termos em que julga (art. 621º do CPC).
Ora, fundando-se a execução em sentença, dispõe o art. 729º do CPC que a oposição só pode ter algum dos fundamentos que vêm concretamente especificados nas várias alíneas do seu nº 1, entre os quais se conta a inexistência ou inexequibilidade do título (al. a)).
Entende-se que inexiste título se não há sentença, ou se a execução não se conformar com o título (neste caso tudo se passa como se não houvesse título) (4).
E não há sentença quando não existe parte decisória ou conclusão, ou “quando falta o poder jurisdicional do órgão ou entidade que a profere” (5).

Por outro lado, entende-se que o título é inexequível se a sentença não for condenatória, se não tiver transitado em julgado e ao recurso tiver sido fixado o efeito suspensivo, ou, tendo havido condenação genérica nos termos do art. 609º, nº 2 do CPC, e não dependendo a liquidação da obrigação de simples cálculo aritmético, não se tiver procedido a liquidação no processo declarativo (art. 704º do CPC).

Como escreve Amâncio Ferreira (6), “a al. a) contempla não só a hipótese de não haver título para servir de base à execução, como também a de, havendo-o, ele não preencher os requisitos de exequibilidade em conformidade com as exigências dos arts. 46º e segs. (actuais, arts.703º e ss.)”.

No fundo, e como refere Rui Pinto (7) a inexequibilidade coincide com “a não verificação dos pressupostos dos arts. 703º a 708º do CPC (…). Assim, “será inexequível a sentença que:

a. Não contenha uma ordem de prestação ou condenação;
b. Não esteja assinada pelo Juiz;
c. Esteja pendente de recurso com efeito suspensivo (arts. 704º, nº 1 e 647º, nº2 a 4 do CPC)
d. Tenha sido revogada em recurso, ordinário ou extraordinário;
e. Sendo estrangeira não tenha sido revista e confirmada pela Relação (arts. 978º, nº1 e 979º do CPC) ou não obedeça aos arts. 38º e ss. Reg. (CE) 44/2011…”.
*
Aqui chegados, e revertendo para o caso concreto, constata-se que o título dado à execução é uma sentença condenatória, não transitada em julgado, por dela ter sido interposto Recurso, com efeito meramente devolutivo (seja, quanto à sentença de primeira instância; seja quanto ao Acórdão da Relação entretanto proferido – embora a certidão judicial junta não esclareça totalmente esse ponto, a verdade é que o efeito atribuído ao Recurso de Revista (ou excepcional) só poderá ser devolutivo – art. 676º do CPC).

Como decorre do exposto, o facto de ao Recurso interposto ter sido atribuído efeito devolutivo, não impediu que a decisão condenatória proferida se tornasse exequível e, nessa medida, não há dúvidas que as Exequentes podiam ter instaurado a presente execução nos termos em que o efectuaram.

Com efeito, a decisão condenatória só não seria exequível se a mesma estivesse pendente de recurso com efeito suspensivo (cfr. arts. 704º, nº 1 e 647º, nº 2 a 4 do CPC).

Como é sabido, o efeito suspensivo do recurso consiste em a eficácia do despacho recorrido se manter suspensa, neutralizada, até à decisão final do recurso.

Se ao recurso for atribuído efeito devolutivo - como foi no caso em apreço - a decisão é imediatamente exequível, ou seja, a decisão recorrida valerá, enquanto título executivo até ao seu trânsito em julgado (8).

Também partilha esta posição Amâncio Ferreira, quando refere que “Tendo o recurso efeito meramente devolutivo, passam-se as coisas no que concerne à eficácia da decisão, quer no que toca ao andamento do processo, como se o recurso não tivesse sido interposto” (9).

Um outro tanto já não sucede quanto aos efeitos que poderão ser produzidos pelas decisões que as Instâncias Superiores venham a proferir.

Na verdade, independentemente de a decisão condenatória proferida ser exequível, apesar de não ter transitado em julgado, a questão que se coloca, de seguida, é, pois, a de saber quais são os efeitos que poderão ser produzidos no pedido executivo (no objecto da execução) pelas decisões que vierem a ser proferidas em sede de recurso (nomeadamente, no caso de as mesmas alterarem o conteúdo da decisão recorrida).

Ora, a resposta a esta questão encontra-se justamente na primeira parte do nº 1 do artigo 704º do Código de Processo Civil.
Na verdade, pode-se ler aí que: “ a execução iniciada na pendência de recurso extingue-se ou modifica-se em conformidade com a decisão definitiva comprovada por certidão”.

Ora, a questão que as Recorrentes levantam no presente Recurso contende com a alegada inexistência de decisão definitiva (e logo, também, com a falta de comprovação por certidão judicial dessa definitividade).

Defendeu, no entanto, o Tribunal Recorrido, como já se referiu, que “quanto às quantias objecto do pedido de liquidação, (a decisão condenatória) teria (parcialmente) transitado em julgado”:

-porque da condenação não foi interposto Recurso pela Autora, TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A. (na parte a esta respeitante), nem pela Ré;
-porque, mesmo tendo em conta os Recursos interpostos pela Autora NP, S.A., a condenação estabelecida será correspondente, no mínimo, às quantias aí fixadas, porque não foi interposto Recurso pela Ré.
Procuremos responder à questão atrás formulada.
Como já se referiu, a atribuição a um recurso de efeito meramente devolutivo significa que é possível executar a decisão recorrida na pendência do Recurso, mas a decisão do Tribunal ad quem irá repercutir-se na decisão que entretanto tenha dado origem à acção executiva.
É o que decorre do citado art. 704º do CPC.

Assim, se a decisão final revoga totalmente a decisão exequenda, a execução extinguir-se-á; se a decisão final revoga parcialmente a decisão exequenda, mantendo parcialmente a condenação do executado, a execução modificar-se-á, isto é, a execução prosseguirá quanto à parte que não foi revogada.
No entanto, quando a decisão do Tribunal ad quem não seja definitiva (2ª parte, do nº 1 do art. 704º do CPC), ou seja, quando se trate de decisões intermédias objecto de recurso para o Tribunal Superior (necessariamente com efeito devolutivo, atento o disposto no art. 676º do CPC), podem surgir duas situações:

a. A execução suspender-se-á quando a decisão intermédia tiver revogado totalmente a que estava a ser executada;
b. Ou modificar-se-á quando a decisão intermédia tiver revogado parcialmente a que estava a ser executada.
Deste regime legal resulta, assim, que se tiver sido instaurada uma acção executiva, na pendência de recurso com efeito devolutivo, essa execução, por natureza provisória, sofrerá as consequências da decisão que a causa venha a ter nas instâncias superiores (10).

Ou seja, se a decisão intermédia (a proferida pelo Tribunal da Relação) for objecto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, a execução “… suspender-se-á ou modificar-se-á, consoante a decisão da 2ª Instância for total ou parcialmente revogatória da anterior, se ao novo recurso for atribuído efeito meramente devolutivo…” (11).

Assim, nestes casos, “o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação tem de ser cumprido, ainda que de forma provisória. Nesta conformidade, se o acórdão da Relação revogou a sentença proferida pelo tribunal de primeira instância, que fora executada provisoriamente, a execução suspende-se até que seja proferida uma decisão definitiva pelo Supremo Tribunal de Justiça; por sua vez, se o acórdão do Tribunal da Relação modificou a decisão do Tribunal de Primeira Instância, a execução tem de ser modificada (para mais ou para menos), em conformidade com esse acórdão (…)
(Finalmente) Uma vez proferida uma decisão definitiva pelo Supremo Tribunal de Justiça, o destino da execução fica dependente do sentido dessa decisão…” (12).

Aqui chegados, importa reverter para o caso concreto, tendo em conta o explanado- (resposta aos pontos I), als. A) a C)).

Ora, tendo em consideração o estado do processo, julga-se que importa aqui fazer uma distinção entre duas situações.

Ou seja, entre aquela em que se encontra a pretensão da Exequente/Recorrente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A. por contraponto com a da Exequente/Recorrente NP, S.A..

Na verdade, conforme resulta da certidão judicial junta e do Acórdão da Relação entretanto proferido- e como bem refere o Tribunal Recorrido-, quanto à condenação respeitante aos pedidos formulados pela Autora TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A., na ausência de interposição de recursos (cujo prazo, segundo informa a certidão, já havia decorrido na data em que foi elaborada a certidão judicial), não há dúvidas que a decisão condenatória proferida transitou em julgado nessa parte, pelo que as modificações operadas por essa decisão do Tribunal da Relação (que não é, assim, intermédia) tornaram-se definitivas.

Nessa medida, tem que se entender que a execução ter-se-á de considerar modificada em função do teor da decisão final proferida em sede de recurso (transitada em julgado), quanto a esse segmento da decisão condenatória que aqui constitui o título executivo- cfr. art. 704º, nº 2 do CPC.

Já o mesmo não sucede, quanto à condenação respeitante aos pedidos formulados pela Autora NP, S.A., pois que da decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães foram interpostos Recursos (de revista e excepcional), e, nessa medida, trata-se de uma decisão intermédia que, apesar de modificar a execução nos termos que decorrem da decisão, ainda não é definitiva.

Nessa medida, independentemente da modificação operada pela decisão Tribunal da Relação- que, como se referiu, tem por efeito que a execução tem de ser modificada provisoriamente (para mais), em conformidade com o que ficou decidido- a verdade é que essa decisão é intermédia, pelo que só com a decisão definitiva do Supremo Tribunal de Justiça, o destino da execução ficará definido.
Destas distinções, resulta, pois, que o enquadramento jurídico que deve ser dado às duas situações deve ser também diferente.

Antes de entrarmos nessa diferenciação, importa, no entanto, esclarecer um ponto prévio relativamente ao Requerimento apresentado pela Executada/Recorrida.

Decorre do mesmo que a Executada pretende o seguinte:

- Que a execução, em face da decisão do Tribunal da Relação, seja modificada nos termos do art. 704º, nº 2 do CPC, sendo ordenado ao agente de execução que proceda à adjudicação às exequentes NP e TR., respectivamente, das quantias de 2.281.781 € e de 4.889.959,30 €, requerimento que apresenta “para efeitos de pagamento e cessação da contagem dos juros nos presentes autos…”.

Ou seja, face à modificação operada pela decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, a Recorrida/Executada parece pretender proceder ao pagamento voluntário da execução, tendo subjacente a ideia de que, com esse pagamento, a contagem dos juros de mora cessará.

Como é sabido, o pagamento voluntário da execução está previsto no art. 846º, nº 1 do CPC.

Pode-se ler neste preceito legal que “em qualquer estado do processo pode o executado ou qualquer outra pessoa fazer cessar a execução pagando as custas e a dívida…”.
Decorre desta previsão legal, assim, que o pagamento voluntário da obrigação exequenda pode ser efectuado pelo executado ou qualquer outra pessoa (13).

Trata-se da situação que a Doutrina costuma designar por “remição da execução” (14).

Ora, este procedimento de pagamento voluntário “…é de aplicar sempre que alguém, incluído o executado, quer pagar integralmente (itálico no original) a quantia exequenda, libertando a execução os bens do devedor ainda não vendidos ou adjudicados…” (15).

Na verdade, esta faculdade do executado de requerer a remição da execução só pode ser requerida, neste âmbito (judicial), se pretender a liquidação de toda a sua responsabilidade.
Não pode, assim, o executado pretender, judicialmente, a remição parcial da execução.

Com efeito, o citado preceito legal tem apenas aplicação aos casos em que se pretenda a cessação (total) da execução pelo pagamento voluntário (v. a epígrafe do art. 846º do CPC e a própria integração na secção VII (Extinção da execução e anulação)).
Só nesses casos é que o executado pode requerer a liquidação preliminar das suas responsabilidades (art. 846º, nº 3 do CPC) e, subsequentemente, após a sustação da execução, a liquidação final de toda a sua responsabilidade (art. 846º, nº 4 do CPC; cfr. também o art. 847º do CPC), com a consequente extinção da instância executiva.

Nesta conformidade, em princípio, o executado não pode requerer, por esta via, o pagamento voluntário parcial da quantia exequenda, pois que, conforme resulta do exposto, o campo de aplicação deste preceito legal é apenas o pagamento voluntário total das responsabilidades do executado.
Esta solução processual encontra-se, aliás, em sintonia com as regras substantivas estabelecidas no Código Civil.
Na verdade, nos termos do nº 1 do art. 763º do CC “a prestação deve ser realizada integralmente e não por partes, excepto se outro for o regime convencionado ou imposto por lei ou pelos usos”.

Como esclarecem A. Varela/ P. Lima, “estabelece o nº 1 a regra de que ao devedor cumpre realizar a prestação, por inteiro e não por partes. É um aspecto apenas da regra da pontualidade, de recorte mais amplo, segundo a qual a prestação deve ser efectuada no tempo, lugar e modo próprios… Deste princípio resultam consequências importantes. Se, por exemplo, o devedor oferece uma parte da prestação e o credor não a aceita, não se verifica a mora accipiendi em relação à parte da prestação recusada, mas a mora solvendi em relação a toda a prestação…” (16)
.
Como se referiu, esta regra geral tem as excepções mencionadas na parte final do preceito legal.

Nessa medida, só será de admitir a cumprimento parcial da prestação quando for esse o regime convencionado (17) tal for imposto por lei ou pelos usos (18).

Concluem, finalmente, aqueles autores que o legislador não consagra “…o dever de o credor aceitar a parte não litigiosa da obrigação quando, estando em parte vencida, o devedor conteste a parte restante do crédito. Quer haja, quer não haja contestação, mantém-se o princípio do cumprimento integral…” (19).

Aqui chegados, pode-se, assim, concluir que, quer através das regras processuais aplicáveis, quer pelas regras substantivas, o executado só poderá, neste âmbito da remição da execução, requerer o cumprimento parcial das suas responsabilidades, se o exequente o aceitar.

Nessa medida, o oferecimento do cumprimento parcial da dívida exequenda (mesmo que esta assuma, em parte, carácter litigioso) só poderá obstar à contagem dos juros de mora (mora solvendi) se o exequente não recusasse esse cumprimento (cfr. art. 763º do CC).
Efectuado este enquadramento geral, importa atender, no entanto, a uma outra perspectiva de análise da pretensão da executada/recorrida.

Na verdade, se bem se entende o requerimento da Executada (e a decisão recorrida), além das regras da remição da execução, importa aqui também considerar a aplicação das regras processuais relativas à penhora de depósitos bancários (art. 780º do CPC).

Com efeito, conforme resulta dos autos, mostra-se penhorado (o saldo de) um depósito bancário no valor de 7.444.212,00 € para pagamento da dívida exequenda de 7.375.440, 42 € e das despesas prováveis de 368.772, 02 €.

Ora, como se referiu, o requerimento da Executada pretende que se “proceda à adjudicação às exequentes NP e TR., respectivamente, das quantias de 2.281.781 € e 4.889.959,30 €” para efeitos de pagamento e cessação da contagem dos juros nos presentes autos.
E nesse sentido (da aplicação daquelas regras), parece também apontar a decisão aqui posta em crise.

Embora nem a Executada, nem o Tribunal, apontem o fundamento legal “da adjudicação” pretendida (pela Executada) e ordenada (pelo Tribunal Recorrido), julga-se que tal “adjudicação” poderá decorrer do disposto no nº 13 do art. 780º do CPC, em conjugação com o que também se estabelece nos arts. 795º e ss. do CPC, e, em especial, no art. 798º do CPC.

De facto, pode-se ler naquele primeiro preceito legal que “Findo o prazo de oposição, se esta não tiver sido deduzida, ou julgada a oposição improcedente, o agente de execução entrega ao exequente as quantias penhoradas que não garantam crédito reclamado, até ao valor da dívida exequenda, depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º”.
Decorre deste preceito legal que “as quantias penhoradas ficam indisponíveis até ao termo do prazo previsto para a dedução de oposição do executado, ou, no caso contrário, até ao trânsito em julgado da decisão que sobre ela recaiam, após o que deverão ser entregues ao exequente, retendo o agente da execução o montante relativo às despesas de execução calculado nos termos do nº3 do artigo 735º” (20).

Nesse sentido aponta, também, o citado art. 798º do CPC, quando refere que, nestes casos de penhora de depósito bancário em dinheiro, “o exequente… é pago do seu crédito pelo dinheiro existente…”.
Não há dúvidas, assim, que o legislador, nestas situações, admite, a título excepcional, o pagamento parcial do crédito exequendo, independentemente da aceitação do exequente, sendo esta, pois, uma das situações ressalvadas na parte final do nº 1 do art. 763º do CC.

Aliás, esta conclusão decorre, também, do facto de o legislador ter admitido a existência de “execuções parcialmente inviáveis” (cfr. epígrafe do art. 797º do CPC), pois que neste preceito legal refere-se que “decorridos três meses sobre o pagamento parcial sem que tenham sido identificados outros bens penhoráveis, aplica-se o disposto no art. 750º”.

Aqui chegados, e concluindo-se, pois, que:

- Em caso de efectivação de penhora de conta bancária, podem existir pagamentos parciais à exequente, independentemente da aceitação, por parte desta, desse cumprimento parcial;
- E que esse pagamento é, aliás, imposto pelo Legislador ao agente de execução (nº 13 do art. 780º do CPC)
… não há dúvidas que, em princípio, no caso concreto, a quantia penhorada deve ser entregue às Exequentes nos termos dos citados preceitos legais.
Destas considerações decorre, assim, a improcedência dos argumentos das Recorrentes, que contendiam com a ideia de que tal entrega do dinheiro depositado dependia da sua iniciativa (ponto II e als. E), F) e G)).

Por outro lado, não tendo o Sr. Agente de execução procedido, de imediato, à entrega às Exequentes das quantias depositadas na sequência da penhora de conta bancária, conforme lhe era imposto pelo citado nº 13 do art. 780º do CPC, nada impedia que a Executada requeresse o cumprimento de tal preceito legal, nem que o Tribunal ordenasse esse cumprimento, pois que tais condutas cabem na imposição legal de controlo da actividade do Agente de execução- cfr. art. 723º, nº 1, als. c) e d) do CPC (preceito legal a que, mais à frente, regressaremos) (21).
*
Feitas estas considerações, voltemos, então, à referida diferenciação de situações, tendo por adquirido o que se acaba de explanar quanto à possibilidade de pagamento parcial da quantia exequenda.
Comecemos pela primeira situação, correspondente ao segmento da execução (cumulada- art. 710º do CPC) relativo à condenação, transitada em julgado, respeitante aos pedidos formulados pela Autora TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A..

Na ausência de interposição de recursos (cujo prazo, segundo informa a certidão, já havia decorrido na data em que foi elaborada a certidão judicial), não há dúvidas que a decisão condenatória proferida transitou em julgado nessa parte, pelo que as modificações operadas pela decisão do Tribunal da Relação (que não é, assim, intermédia) tornaram-se definitivas.

Ora, por assim ser, quanto a este segmento da decisão fica prejudicada a argumentação das Recorrentes que contendia com a ideia de aplicar o disposto no nº 3 do artigo 704º do Código de Processo Civil, preceito legal que imporia que a exequente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A. não pudesse ser paga, sem prestar caução.

Com efeito, pode-se ler neste preceito legal que: “ Enquanto a sentença estiver pendente de recurso, não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução”.
Sucede que, no que concerne ao segmento da decisão respeitante aos pedidos formulados pela Autora/Exequente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A., a decisão proferida pelo Tribunal da Relação transitou em julgado.
Nessa medida, a questão levantada não merece acolhimento, já que a sentença (o Acórdão) já não está pendente de recurso, não estando, pois, verificados os pressupostos que impediriam a entrega (a “adjudicação”) da quantia penhorada (e até o pagamento total da quantia exequenda- cfr. art. 846º do CPC) sem prestação de caução.

Logo, não há dúvidas que, em cumprimento do disposto no nº 13 do art. 780º do CPC, pode ser entregue à referida exequente “…as quantias penhoradas até ao valor da quantia exequenda, depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC…”, montante esse que deve ser calculado pelo Sr. Agente de execução, sem prejuízo de ulterior reclamação que, eventualmente, venha a ser deduzida quanto a essa liquidação (cfr. art. 723º, al. c) do CPC).
Improcede, pois, esta argumentação da Recorrente (relativa à prestação de caução) quanto a este segmento da decisão, transitado em julgado (ponto I), al. D)).
No entanto, julga-se que as Recorrentes têm razão quando se insurgem quanto ao (eventual) acolhimento por parte do Tribunal Recorrido dos cálculos efectuados pela Executada.
Na verdade, e conforme decorre do exposto, o legislador não incumbiu ao Tribunal (nem à Executada) o cálculo do montante que deve ser entregue à Exequente no âmbito da penhora de conta bancária.

Com efeito, tal competência (de entrega do dinheiro penhorado) incumbe, em primeira linha, ao Agente de execução (conforme decorre expressamente do citado nº 13 do art. 780º do CPC), só podendo o Tribunal intervir no caso de as partes reclamarem da decisão do Agente de execução (cfr. art. 723º do CPC) ou em sede de controlo geral da actuação do Agente de execução.

Nessa medida, julga-se que o Tribunal Recorrido deveria ter aguardado que o Agente de execução praticasse o referido acto de entrega do dinheiro (pagamento), pois que a ele lhe incumbe efectuar “todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, … liquidações e pagamentos” (art. 719º do CPC- repartição de competências).

Nesta conformidade, importa alterar a decisão proferida, e determinar, antes, que o Sr. Agente de execução seja notificado para proceder à entrega à Exequente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A. de parte das quantias penhoradas até ao valor da quantia exequenda (correspondente à condenação transitada em julgada), depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC, montante esse que deve ser calculado pelo Sr. Agente de execução.
*
Aqui chegados, importa verificar se igual conclusão pode ser atingida quanto à parte da decisão (do Tribunal da Relação) que se pronunciou sobre os pedidos formulados pela Autora/Exequente/Recorrente NP, S.A..
Ora, quanto a este segmento da decisão, não há dúvidas que foi interposto Recurso, com efeito devolutivo, pelo que tal decisão não transitou em julgado.
A questão levantada pelas Recorrentes tem, assim, nesta situação pertinência.
É que é pacífico que tendo sido dada à execução uma sentença de que foi interposto recurso recebido com efeito meramente devolutivo, enquanto tal recurso estiver pendente não pode o exequente ou qualquer credor ser pago sem prestar caução, como se prevê no artigo 704º, nº 3 do CPC (22).

Importa, assim, saber se, de igual modo, pode ser ordenado ao Sr. Agente de execução que entregue à exequente NP, S. A. as quantias penhoradas até ao valor da respectiva quantia exequenda (tendo o Tribunal Recorrido restringido, no entanto, tal “adjudicação” ao montante mínimo fixado pelo Acórdão da Relação que se mostra incontestado pela Ré).

O entendimento do Tribunal Recorrido foi o de que, ao efectuar o pedido de adjudicação à Exequente daquelas quantias, a Executada estaria a prescindir da exigência de prestação de caução prevista como regra geral para o pagamento da quantia exequenda ao Exequente na pendência de Recurso (nº 3 do art. 704º do CPC).
É essa também a posição da Recorrida/Ré.

Cumpre decidir.
A questão, a nosso ver, resolve-se em função da razão de ser da prestação de caução.
Ora, a razão de ser da exigência de prestação da caução nestes casos é “garantir a satisfação dos eventuais danos e prejuízos que possam vir a ser causados ao executado em virtude da execução provisória da sentença. De facto, se assim não fosse, corria-se o risco de o executado obter provimento no recurso, isto é conseguir alterar ou revogar a sentença condenatória, mas já não encontrar bens suficientes que lhe permitissem ser reembolsado depois de estes terem entretanto, obtido pagamento na execução” (23).

Sucede que, no caso concreto, como bem defendeu o Tribunal Recorrido, não existe este risco, pois que só foi autorizada a entrega da quantia penhorada até ao montante que resulta da condenação determinada no Acórdão da Relação de Guimarães entretanto proferido.

Na verdade, não tendo sido interposto Recurso dessa condenação por parte da Ré/Executada, esse montante corresponde ao valor mínimo da sua condenação, ou seja, a entrega do dinheiro penhorado que coincida com esse montante mínimo não implica para a Executada qualquer risco, pois que esta, não tendo apresentado Recurso, em princípio, não tem a expectativa de reverter essa condenação (e a Recorrente NP, S. A., por seu lado, sabe que, independentemente do acolhimento dos Recursos entretanto interpostos, no mínimo terá direito a receber aquele montante).

Nesta conformidade, tendo em conta a razão de ser subjacente à prestação de caução, e não se verificando no caso concreto que esses interesses da Executada possam ser prejudicados, entende-se, tal como o Tribunal Recorrido defendeu, que a entrega à exequente daquele montante mínimo (já definitivo) pode ser efectuada, sem que, para o efeito, esta tenha que prestar caução (que, como decorre do exposto, nenhuma utilidade poderia ter, pois que não existe o risco de a situação ser revertida por efeito dos recursos ainda pendentes).

Improcede, pois, esta argumentação das Recorrentes (relativa à prestação de caução) também quanto a este segmento da decisão já definitivamente fixado (ponto I, al D)).
No entanto, julga-se que as Recorrentes têm razão quando se insurgem quanto ao (eventual) acolhimento por parte do Tribunal Recorrido dos cálculos efectuados pela Executada (nomeadamente, quanto à liquidação dos juros de mora).
Na verdade, e conforme decorre do exposto, o legislador não incumbiu ao Tribunal (nem à Executada) o cálculo do montante que deve ser entregue à Exequente no âmbito da penhora de conta bancária.

Com efeito, tal competência (de entrega do dinheiro penhorado) incumbe, como já se referiu, ao Agente de execução (conforme decorre expressamente do citado nº 13 do art. 780º do CPC), só podendo o Tribunal intervir no caso de as partes reclamarem da decisão do Agente de execução (cfr. art. 723º do CPC) ou em sede de controlo geral da actuação do Agente de execução.

Nessa medida, julga-se que o Tribunal Recorrido deveria ter aguardado que o Agente de execução praticasse o referido acto de entrega do dinheiro (pagamento), pois que a ele lhe incumbe efectuar “todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, … liquidações e pagamentos” (art. 719º do CPC- repartição de competências).
Nesta conformidade, importa alterar a decisão proferida, e determinar, antes, que o Sr. Agente de execução seja notificado para proceder à entrega à exequente NP, S. A. de parte das quantias penhoradas até ao valor da quantia exequenda (correspondente à referida condenação mínima), depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC, montante esse que deve ser calculado pelo Sr. Agente de execução.
*
Finalmente importa entrar na última parte da argumentação das Recorrentes.
Quanto ao ponto II), al H), julga-se que a argumentação apresentada pelas Recorrentes não é totalmente compreensível.
De qualquer forma, mesmo que se atenda à eventual ponderação em sede de recurso dos pedidos que haviam sido formulados a título principal- parece que será esse o argumento- a verdade é que da eventual procedência dos Recursos interpostos, na ausência de Recurso da Ré, não poderá resultar um valor inferior àquele em que aquela foi condenada no Acórdão da Relação de Guimarães (pensa-se que as Recorrentes certamente não defenderão isso).

Daí que esta argumentação não chega a pôr em causa o que atrás ficou dito, quanto à possibilidade de ser entregue à exequente NP, S. A. o montante mínimo em que a Ré já se mostra condenada em termos definitivos por força da referida decisão do Tribunal da Relação de Guimarães.

Improcede, pois, esta argumentação.
Os últimos argumentos (Ponto III, al. I)) contendem com a impugnação da liquidação efectuada pela Executada e que teria sido acolhida pelo Tribunal Recorrido na decisão aqui posta em crise.
Importa aqui voltar ao que já ficou referido atrás, quanto à competência que se mostra atribuída ao Sr. Agente de execução.
Com efeito, como aí ficou referido, o legislador não incumbiu ao Tribunal (nem à Executada) o cálculo do montante que deve ser entregue à Exequente no âmbito da penhora de conta bancária.
Na verdade, tal competência (de entrega do dinheiro penhorado) incumbe, em primeira linha, ao Agente de execução (conforme decorre expressamente do citado nº 13 do art. 780º do CPC).
É que, “de acordo com a repartição de competências prevista (…no art. 719º do CPC…), cabe ao agente de execução efectuar todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz”.

Assim, “no nº 1, ao estabelecer a repartição de competências entre o juiz, o agente de execução e a secretaria, o legislador pretendeu afirmar, de forma inequívoca, que o principal órgão da execução é o agente de execução e que todos os outros intervenientes apenas dispõem das competências expressamente previstas na lei…” (24).

Com efeito, “muito embora o juiz tenha conservado os seus poderes de controlo e de supervisão da acção executiva- poderes esses que viriam a ser mitigados na reforma da acção executiva de 2008 e parcialmente recuperados no Novo CPC-, a verdade é que a generalidade das diligências executivas passou a ficar a cargo do agente de execução, verificando-se, consequentemente, uma “desjudicialização do procedimento” “ (25).
De qualquer forma, o núcleo essencial das atribuições do juiz no âmbito da acção executiva está regulado no art. 723º do CPC, nelas não estando incluídas a competência de proceder à entrega dos montantes penhorados, nem a de proceder à liquidação dos respectivos montantes, tendo em conta o valor da quantia exequenda (art. 719º, nº1 do CPC; cfr. nº 13 do art. 780º do CPC).
Esta competência está expressamente atribuída ao Agente de execução (26).
Nessa medida, julga-se que o Tribunal Recorrido deveria ter aguardado que o Agente de execução praticasse a referida liquidação e entrega do dinheiro penhorado, pois que é a ele que lhe incumbe efectuar “todas as diligências do processo executivo que não estejam atribuídas à secretaria ou sejam da competência do juiz, incluindo, nomeadamente, … liquidações e pagamentos” (art. 719º do CPC- repartição de competências).

Nesta conformidade, incumbe ao Sr. Agente de execução o cálculo desses montantes penhorados, cuja entrega deverá ser efectuada às Exequentes, tendo em conta o valor da quantia exequenda (juros de mora, incluídos) (correspondente às condenações transitadas em julgado nos termos expostos e com vencimento de juros de mora até ao momento em que a entrega/pagamento se efectue), depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC.
Decorre desta conclusão que a questão levantada pelas Recorrentes – de saber se os juros de mora foram ilegalmente contabilizados- fica prejudicada, porque, como se referiu, não incumbia ao Tribunal (nem à Executada) proceder a essa liquidação, devendo antes ser o Sr. Agente de execução a efectuar essa liquidação- repartição de competências que, como se disse, não foi cumprida (cfr. art. 719º do CPC).
Aliás, não é claro que o Tribunal Recorrido na decisão recorrida tenha acolhido os cálculos efectuados pela Executada.

Na verdade, o que o Tribunal Recorrido determinou foi “a notificação da AE para proceder em conformidade com o pedido da executada”, ou seja, deferiu o pedido de entrega/adjudicação do dinheiro penhorado (penhora de conta bancária) às Exequentes.
Cumpre esclarecer que, dentro destes limites, tratava-se de decisão cuja competência se encontrava atribuída ao Tribunal, pois que, nos termos da al. d) do nº 1 do art. 723º do CPC “compete ao Juiz decidir outras questões suscitadas… pelas partes…”.

Assim, se se entender que a decisão proferida se manteve dentro destes limites (e não se chegou a pronunciar sobre a liquidação e valor da entrega do dinheiro penhorado) nenhuma crítica mereceria
Nessa medida, a questão da ilegalidade da liquidação dos juros de mora, em bom rigor, tratar-se-ia de uma questão nova (27), insusceptível de ser conhecida pelo presente Tribunal, pois que ainda terá que haver pronúncia do Tribunal Recorrido sobre a eventual reclamação que venha a ser interposta da liquidação que o Sr. Agente de execução venha a efectuar da entrega do dinheiro ordenada (respeitante à penhora de conta bancária- nº 13 do art. 780º do CPC).
Improcede, pois, esta argumentação (Ponto III), al. I)).
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Uma última nota, para referir que, independentemente de tudo o que aqui ficou dito, sempre a Executada/Recorrida podia, para o efeito pretendido (sustar a contagem dos juros de mora), socorrer-se da figura da consignação em depósito, figura que se encontra expressamente prevista no art. 924º do CPC como incidente da execução.
Lê-se nesse preceito legal que “estando pendente acção ou execução sobre a dívida, e tendo já sido citado para ela o devedor, se este quiser depositar a quantia … que julgue dever, há de requerer por este processo, que o credor seja notificado para receber, por termo, no dia e hora que forem designados, sob pena de serem depositados…”.

Assim, o executado pode requerer no próprio processo executivo que o exequente seja notificado para receber a quantia que julga dever em quantidade diversa daquela que lhe é exigida.

Uma vez efectuada essa notificação, o exequente pode tomar uma das três atitudes previstas no art. 924º do CPC:

-Al. a) Receber a quantia depositada, sem reserva alguma;
-Al. b) Recebê-la com a reserva de que se julga com direito a maior quantidade;
-Al. c) Não se apresentar a recebê-la no dia e hora marcados pelo Juiz.

No primeiro caso, a execução finda.
No segundo caso, a execução continua mas só pela importância em litígio.

No último caso, o executado depositará a quantia oferecida e efectuado o depósito, a eficácia deste depende do que vier a ser a decisão final (28).

Ora, a importância da eventual dedução deste incidente resulta do facto de dele poder advir, pelo menos, um efeito relevante que vai ao encontro das preocupações da Executada.

Na verdade, a consignação em depósito “produz efeitos sobre a obrigação…”, nomeadamente, porque “… durante o decurso do processo… a dívida deixa de vencer juros, sempre que se verifique que o executado tinha um motivo legítimo para proceder à consignação” (29).

Ora, importa dizer que se convocam aqui estas considerações porque se julga que existe alguma proximidade com a situação dos presentes autos.

Na verdade, a solução defendida- da admissão da entrega imediata das quantias penhoradas- acaba por encontrar alguma semelhança com aquela que resulta do incidente de consignação em depósito prevista no citado art. 924º do CPC.

Ou seja, as Exequentes ao receberem as quantias penhoradas na medida das respectivas quantias exequendas (já definitivamente fixadas nos termos expostos) como que aceitam uma consignação em depósito, prosseguindo a execução apenas pela importância alegadamente em litígio, e que ainda se mostra em discussão nos Recursos interpostos do Acórdão da Relação de Guimarães (e que contendem apenas com a eventual alteração para mais da condenação, no que concerne ao segmento da decisão que diz respeito às pretensões da Recorrente NP, S. A.).

O efeito dessa admissão é exactamente o mesmo, ou seja, a partir da entrega do dinheiro a parte correspondente da dívida exequenda, vencendo juros de mora até essa efectiva entrega, deixa de vencer juros de mora a partir desse momento- que é o que, no fundo, a Executada pretende com o requerimento que apresentou.
Nesta conformidade, e por todo o exposto, também por aqui se pode concluir que a solução encontrada assenta em boa justificação legal, até pelo recurso a esta argumentação retirada do incidente de consignação em depósito (art. 924º do CPC).
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Por todo o exposto, julga-se, assim, que o Recurso merece parcial procedência, mas apenas quanto às referidas alterações introduzidas na decisão recorrida, e que contendem com a competência para a liquidação e pagamento/entrega das quantias penhoradas às Exequentes.
No mais considera-se que não houve, pois, qualquer ofensa dos preceitos legais invocados pelas Recorrentes.
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III- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar parcialmente procedente a apelação, e em consequência, decide-se alterar a decisão recorrida nos seguintes termos:

a)- determinar que o Sr. Agente de execução seja notificado para proceder à entrega à exequente TR. – Gestão de Bens Móveis e Imóveis, S.A. de parte das quantias penhoradas até ao valor da quantia exequenda (correspondente à condenação transitada em julgada), depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC, montante esse que deve ser calculado pelo Sr. Agente de execução.
b)- determinar que o Sr. Agente de execução seja notificado para proceder à entrega à exequente NP, S. A. de parte das quantias penhoradas até ao valor da quantia exequenda (correspondente à referida condenação mínima definitivamente fixada), depois de descontado o montante relativo a despesas de execução referido no nº 3 do art. 735º do CPC, montante esse que deve ser calculado pelo Sr. Agente de execução.
No mais, julga-se improcedente o Recurso.
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Custas pelas Recorrentes e pela Recorrida na proporção de 3/4 e 1/4.
Notifique.
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Guimarães, 3 de Maio de 2018

Pedro Alexandre Damião e Cunha
Maria João Marques Pinto de Matos
José Alberto Moreira Dias



1. Neste sentido, v. Alberto dos Reis, in “CPC Anotado”, vol. V, pág. 140 e Antunes Varela, in, “Manual de Processo Civil”, pág. 669.
2. Cfr. Antunes Varela, obra citada pág. 670.
3. Abrantes Geraldes, in “Recursos no NCPC”, pág. 289 “… a anulação da decisão… não tem como efeito invariável a remessa imediata do processo para o tribunal a quo, devendo a Relação proceder à apreciação do objecto do Recurso, salvo se não dispuser dos elementos necessários. Só nesta eventualidade se justifica a devolução do processo para o tribunal a quo…”.
4. V. o Prof. Alberto dos Reis, in “CPC Anotado”, Vol. I, pág. 201.
5. Miguel Teixeira de Sousa, in “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, pág. 217.
6. In “Curso de Processo de Execução” pág. 180
7. In “Manual da acção executiva e do despejo”, págs. 401 e 402. No mesmo sentido, Marco Gonçalves, in “Lições de Processo civil executivo”, págs. 58 a 64.
8. V. por exemplo os acs. da RL de 08.11.2007 (relator: Salazar Casanova) e de 22.1.2008 (relator: Maria José Simões), in dgsi.pt.
9. “Manual dos Recursos em Processo Civil”, pág. 178.
10. Cfr. Gonçalves Sampaio, in “A acção executiva e a problemática das execuções injustas”, págs. 51 e 52.
11. Lebre de Freitas, in “A acção executiva – à luz do CPC de 2013” (6ª edição), pág. 51.
12. Marco Gonçalves, in “Processo civil executivo”, págs. 61 e 62.
13. Este terceiro pode ser ou não interessado no cumprimento da obrigação, conforme o nº 1 do art. 767º do CC. Aparentemente nem o executado, nem os credores se podem opor a este pagamento como decorreria do nº 2 do mesmo artigo e do art. 768º do CC- v. Rui Pinto, in “Manual da Execução e do Despejo”, pág. 984; no mesmo sentido, A. Varela/ P. Lima, in “CC anotado”, Vol. II, pág. 11.
14. V., por todos, Lopes-Cardoso, in “Manual da acção executiva”, pág. 626 que explica que o CPC, “na esteira de tradição velhíssima, chamava ao acto de pagar a dívida e as custas, remir a execução; o art. 916º do Código de 1939, fonte imediata do preceito actual, substituiu o verbo “remir” pela expressão “fazer cessar”. Todavia não se vê inconveniente, e até se encontra vantagem, em continuar a adoptar a denominação tradicional, abandonada pela Lei de 1939…”.
15. Lopes-Cardoso, in “Manual da acção executiva”, pág. 627.
16. In “CC anotado”, Vol. II, pág. 5.
17. V. por exemplo, as situações de acordo das partes para pagamento da dívida exequenda em prestações na acção executiva- arts. 806 e 810º do CPC.
18. Os referidos Profs. dão como exemplo as obrigações incorporadas em letras de câmbio (LULL- art. 39º) ou em cheques (LUCH) - art. 34º) para as quais se prescreve expressamente que o portador não pode recusar qualquer pagamento parcial, ou no caso do nº 2 do art. 784º.
19. In “CC anotado”, Vol. II, pág. 7.
20. Virgínio da Costa Ribeiro/Sérgio Rebelo, in “A acção executiva anotada e comentada”, pág. 412. Segundo Marco Gonçalves, in “Lições de processo civil executivo”, pág. 362: “neste caso em concreto, verifica-se uma “execução directa”, na medida em que o credor obtém a satisfação imediata do seu direito de crédito através da entrega do próprio dinheiro penhorado, sem necessidade de se proceder a qualquer venda”. No mesmo sentido, Rui Pinto, in “Manual da execução e despejo”, pág. 997.
21. Como referem Virgínio Ribeiro/Sérgio Rebelo, in “A acção executiva anotada e comentada”, pág. 221 “para além dos casos expressamente referidos (no art. 723º do CPC e noutros preceitos legais do processo executivo) ainda que actualmente inexista norma prevendo o poder geral de controlo, essa circunstância não obsta a que o Juiz possa interferir nos actos praticados pelo agente de execução, no caso de ter sido praticado alguma ilegalidade…”.
22. Podendo o incumprimento deste preceito legal, implicar, inclusivamente, a responsabilização civil do Solicitador de execução que infrinja esta regra legal. V. o ac. da RL de 4.6.2013 (relator: Gouveia Barros), in Dgsi.pt.
23. Marco Gonçalves, in “Lições de processo civil executivo”, pág. 62 e 63. Esclarece ainda este autor que “este regime tutela igualmente os interesses do comprador que adquira um bem em sede executiva, na medida em que acautela, em caso de modificação ou extinção da execução, a eventual restituição do preço e das despesas com a compra que este tenha suportado”- situação que não é aplicável ao caso concreto.
24. Virgínio Ribeiro/Sérgio Rebelo, in “A acção executiva anotada e comentada”, pág. 206.
25. Marco Gonçalves, obra citada, pág. 31.
26. Rui Pinto, in “Manual da execução e despejo”, pág. 121: “Actos executivos do agente de execução são para o efeito do art. 719º do CPC os actos de realização material da pretensão da realização coactiva da prestação, na sequência ou não de um acto decisório, incluindo os respectivos actos decisórios. Trata-se, entre outros, dos actos de: (…) c) pagamento, nas suas diversas modalidades- entrega de dinheiro (cf. Art. 798º do CPC) (…);
27. Como é sabido, os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais (art. 627.º do CPC), através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões já proferidas que incidam sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, e não criálas sobre matéria nova, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas, salvo quanto às questões de conhecimento oficioso- v., por ex., o ac. da RC de 14.12.2006 (relator: Azevedo Mendes), e o ac. do STJ de 14.11.2016 (relator: Ana Luísa Geraldes), in dgsi.pt.
28. V. Lopes-Cardoso, in “Manual da acção executiva”, pág. 634 e 635.
29. Menezes Leitão, in “Direito das Obrigações”, 6ª edição, Vol. II, pág. 196.