Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
2154/17.8T8VRL.G1
Relator: ALEXANDRA ROLIM MENDES
Descritores: FACTOS ESSENCIAIS
PRINCÍPIO DISPOSITIVO
SERVIDÃO PREDIAL
MUDANÇA DE SERVIDÃO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/06/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1 - Nos termos do disposto no art. 5º nº 2 do C. P. Civil, o juiz apenas pode considerar factos que não tenham sido alegados pelas partes quendo os mesmos são instrumentais que resultem da instrução da causa; quando tais factos sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; quando sejam notórios ou quando o tribunal deles tenha conhecimento por virtude do exercício das suas funções.

2 – Tendo o juiz recorrido à utilização de factos essenciais para a decisão da causa e não alegados, incorreu numa violação do princípio do dispositivo.

3 - Deste modo, tal segmento da decisão é nulo, por aplicação do disposto no art. 615º, nº 1 – d) do C. P. Civil, por consubstanciar a apreciação de uma questão não colocada por qualquer das partes, nomeadamente, pelos Réus a título de exceção.

4 - A mudança de uma servidão deve trazer sérias e reais vantagens para o dono do prédio serviente e não deve prejudicar os interesses do prédio dominante: estes devem ser dignos de ponderação e não meros caprichos ou pura comodidade.

5 - A ponderação dos interesses em jogo deverá ser feita casuisticamente, observando um critério de proporcionalidade.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

Relatório:

Nos presentes autos, F. S. e M. S., residentes em …, Alemanha, instauraram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra J. P. e a esposa MARIA, residentes na Rua do …, Vila Real, peticionando, a final:

“ (…) a. Reconhecer que os AA. são donos e legítimos proprietários do prédio rústico identificado em 1º;
b. Declarar a mudança da servidão, reconhecida no âmbito do processo Comum nº 412/14.2TBVRL e referida nos artigos 7º e 8º para a extrema nascente do prédio dos AA. identificado em 1º;
c. Declarar que a referida servidão é constituída por uma largura de 2 (dois) metros e comprimento de cerca de 60 (sessenta) metros;
d. Condenar os RR a reconhecer tal mudança de servidão.
e. Condenar os RR, na passagem pelo terreno dos AA., a utilizar esta servidão de passagem;
f. Condenar os RR. a abster-se de passar pela anterior servidão (…)”

Para tanto, alegam que são proprietários do prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, beneficiando para tanto da presunção registral da dominialidade e que no processo n.º 412/14.2TBVRL foi reconhecida a constituição por via de usucapião de um direito de servidão de passagem em benefício do prédio rústico sito na mesma freguesia, inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, a onerar o imóvel que lhes pertence, mas advogam que estão agora verificados os pressupostos para ser ordenada a mudança de servidão, na sequência da abertura de um caminho alternativo que promoveram.
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Os réus ofereceram contestação na qual refutaram que estejam reunidos os pressupostos para o decretamento da peticionada alteração da servidão de passagem, concluindo pela improcedência da ação e pela respetiva absolvição do pedido.
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Foi proferida sentença que julgou a ação nos seguintes termos:

Em face do exposto, nos presentes autos de acção declarativa, sob a forma de processo comum, decide-se:

a) Declarar a coberto do caso julgado material formado no processo n.º 412/14.2TBVRL a dominialidade pelos autores F. S. e M. S. do prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (...) e inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º;
b) Autorizar o pedido de mudança do sítio por onde se desenvolve o direito de servidão de passagem reconhecido no processo n.º 412/14.2TBVRL aos réus J. P. e MARIA, a onerar o prédio identificado em a) e em benefício do prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (...) e inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, para o troço indicado no facto provado n.º 9, desde que os autores F. S. e M. S. retirem as pedras e procedam à limpeza da vegetação espontânea existentes nesse trato de terreno;
c) Condenar os réus J. P. e MARIA a reconhecer o decidido em b);
d) Após trânsito em julgado e verificada que se mostre a condição aposta em b), declarar cessado o direito dos réus J. P. e MARIA transitarem pelo troço identificado no facto provado n.º 8 da sentença proferida no processo n.º 412/14.2TBVRL, no exercício do direito de servidão de passagem reconhecido nessa decisão judicial.

Inconformados vieram os Réus recorrer formulando as seguintes Conclusões:

1. O artigo 1568º, nº1, do Código Civil impõe a verificação de dois requisitos para que seja legitima a mudança de servidão : Por um lado que ela se mostre conveniente ao proprietário do prédio serviente, e por outro lado que não prejudique os interesses do proprietário do prédio dominante;
2. A justa ponderação dos interesses dos donos dos dois prédios passa obrigatoriamente por um critério de proporcionalidade entre a necessidade ou conveniência da diminuição do encargo sobre o prédio serviente e o prejuízo que a mudança de servidão possa acarretar para o prédio encravado. O que conta são os interesses dignos de ponderação, não os meros caprichos ou a pura comodidade dos interessados;
3. Assim, a “vantagem” dos Autores relatada pelo Tribunal a quo, desacompanhada de outra factualidade, não se apresenta relevante, nem muito menos de natureza ou cariz fundamental, pois que não ficou provado, contrariamente ao alegado que a manutenção do anterior caminho de servidão (o atual e sempre existente) inviabilizasse a exploração pastorícia do prédio, o seu cultivo, ou mesmo a possibilidade de aí construírem;

Aliás,
4. Para além de não ter resultado provado qual a extensão ou área ocupada do prédio rústico dos Autores com o atravessamento longitudinal na orientação poente-nascente, muito menos resultou provado que esse atravessamento divide o prédio rústico dos AA. ou que inviabilize ou sequer dificulte qualquer tipo de exploração, nomeadamente de pastorícia ou de construção;

Por outro lado,
5. No confronto e ponderação dos interesses de Autores e Réus a questão da distância dos caminhos aventada pelo Tribunal a quo revelasse pouco significativa e pouco mais que irrelevante, pois que o facto do caminho atual dispor mais de 22 (vinte e dois) metros de cumprimento, isso implicará escassos segundos para o percorrer, e consoante o meio de transporte utilizado; Até porque a factualidade considerada provada nem sequer anuncia com que frequência os Réus fazem uso do atual caminho de servidão, sendo certo que há prédios onde os proprietários se deslocam quase diariamente e outros a que raramente se deslocam, tudo dependendo, para além do mais, das culturas que neles existam;
Numa outra perspetiva,
6. O que a factualidade revela de forma objetiva, e no essencial, é que um dos caminhos (o existente há mais de 50 anos) situa-se na extrema poente do prédio rústico dos AA., e o outro (o proposto) passaria para a extrema nascente;

No entanto,
7. O existente a poente configura ser plano, enquanto que o proposto a nascente desenvolve-se num percurso sinuoso, de pendente descendente e com solo irregular, e com pedras e vegetação que impede o respetivo trânsito;

Aliás,
8. À data da inspeção judicial ao local o Tribunal a quo pôde constatar não apenas a sinuosidade e sentido descendente do troço a nascente em questão, mas também que o respetivo solo se apresentava irregular, com pedras e vegetação espontânea que obstava ao trânsito nesse troço, o que conduz à inevitável conclusão de que inexiste o caminho na extrema nascente, tal como proposto pelas Autores, e porque não apto aos fins de caminho e de transito de pessoas e bens a que eventualmente se poderia destinar;
9. Não se pode deixar de considerar como relevante o prejuízo dos Réus, de verem mudado o caminho plano de que dispõem há mais de 50 anos, para um outro sinuoso, de pendente descendente, e onde atualmente nem sequer é possível processar qualquer trânsito por virtude de pedras e vegetação existente;
10. Neste enquadramento, e se a verificação dos requisitos consignados no art.º 1568º do Código Civil previstos para a verificação da mudança de servidão, impõe a justa ponderação dos interesses dos donos dos dois prédios num critério de proporcionalidade entre a necessidade ou a conveniência da diminuição do encargo e o prejuízo que essa mudança possa acarretar, o certo é que a factualidade considerada provada, e que há de sustentar a decisão final a proferir, é tendente à conclusão que essa proporcionalidade não se verifica, assim não se encontrando preenchidos os respetivos requisitos.
11. E porque assim não decidiu o Tribunal a quo violou o preceituado no art.º 1568º, nº1 do Código Civil.

Por outro lado,
12. No que reporta às alíneas b) a d) do dispositivo da sentença final proferida, quer a doutrina quer a jurisprudência debatem-se com aquilo que é uma sentença condicional, ou seja aquela que só impõe a sua eficácia à posterior verificação de um evento futuro e incerto, e com a sentença de condenação condicional, sendo esta a que decide que ao demandante assiste certo e determinado direito, mas cujo atinente exercício está sujeito a um evento futuro e incerto.

Assim,
13. Nos termos do preceituado nos arts. 615º, nº 1, al. d) e 609º do Código de Processo Civil, o juiz há de pronunciar-se apenas sobre as questões que as partes lhe tenham conferido para a sua apreciação e julgamento, sendo que não pode a sentença exteriorizar efeitos jurídicos que as partes não abordaram no desenvolvimento da lide, nem impor controvérsias que os autores ou Réus omitiram nos articulados.

Ou seja,
14. Não sendo tolerado que o Julgador reconheça o direito ao autor, mas só o consigne desde que surja determinado e hipotético circunstancialismo jurídico – factual a condicionar os efeitos da sentença que o legitima (sentença condicional), já é aceitável que o Juiz sentencie no sentido de que a parte tem o direito por ela rogado na ação, mas apenas desde que ocorra estabelecida conjuntura, que enumera, para que ele se concretize (sentença de condenação condicional);
15. No caso concreto, estamos perante uma sentença cuja eficácia se subordina a um evento vindouro na parte do disposto em que se refere “desde que os Autores F. S. e M. S. retirem as pedras e procedam à limpeza da vegetação espontânea existentes nesse trato de terreno”.

Ora,
16. A factualidade, e respetiva possibilidade e eventualidade, inerente à realização de trabalhos futuros no troço a nascente indicado pelos autores para efeitos de mudança da servidão, e para o concreto efeito de o tornar transitável, não foi minimamente alegada, nem resulta dos temas da prova, da instrução e/ou da prova produzida em audiência;

Além disso,
17. O descrito facto condicionante exigiria ulterior verificação judicial, prejudicando irremediavelmente a definitividade e certeza da composição de interesses realizada na ação;
18. Nesta parte, e no que se reporta às suas alíneas b) a d) a sentença (dispositivo) viola o preceituado no al. e), do nº1 do art.º 615º, do Código de Processo Civil, assim gerando a respetiva nulidade que aqui se invoca, pois que por gerar uma inadmissível incerteza na decisão, configura uma sentença condicional, impondo a sua eficácia ou procedência à posterior verificação de um evento futuro, incerto e eventualmente conflituoso, ou seja, o facto condicionante exigiria ulterior verificação judicial, prejudicando irremediavelmente a definitividade e certeza da composição de interesses realizada na ação.

E, assim, Vossas Excelências revogando a sentença de que se recorre e declarando a ação totalmente improcedente e/ou ferida de nulidade, farão a costumada
JUSTIÇA.
*
Os Autores contra-alegaram formulando as seguintes conclusões:

1. A factualidade provada subsume-se estatuído no art. 1568 n.º1 do C. Civil.
2. Uma vez que é conveniente aos AA., já que lhes é menos oneroso permitindo-lhes tirar uma maior rentabilidade do seu prédio, uma vez que deixa de dividir o prédio em 3 ficando com uma área maior disponível para produzirem o que tiverem por conveniente e ainda porque lhe possibilitará vedar o prédio, impedindo a sua constante devassa por terceiros.
3. Sendo, por isso, inegável que têm os AA. o direito de verem reconhecida a mudança da servidão de passagem existente.
4. Para além de ser o trajeto mais curto e mais largo entre o prédio dos RR. e a via pública, será aquela que menores prejuízos ocasionará aos AA..
5. A sentença recorrida trata-se de uma sentença de condenação condicional.
6. O que a sentença recorrida decide é fazer depender de determinada condição a efetivação do direito, é uma decisão em que se reconhece que ao demandante assiste certo e determinado direito mas cujo atinente exercício está sujeito a um evento futuro e incerto.
7. Pelo que se trata de uma sentença de condenação condicional e, nessa medida, admissível no nosso ordenamento jurídico
8. Tendo, pois, sido operado “in casu” o adequado consuetudionário jurídico, nenhuma censura ou reparo merece a decisão recorridaque, por isso, deverá ser mantida nos seus precisos termos.
Assim decidindo, far-se-á uma vez mais a costumada e devida JUSTIÇA
*
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Questões a decidir:

- Analisar se a sentença enferma de nulidade
- Analisar se se verificam os pressupostos necessários à mudança da servidão.
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*
Nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

A matéria considerada provada na 1ª instância é a seguinte:

1 - J. P. e MARIA instauraram ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra F. S. e M. S., a qual correu termos neste Juízo, sob o n.º 412/14.2TBVRL, deduzindo a final os seguintes pedidos:

“(…) declarar-se que os autores são os legítimos proprietários dos prédios rústicos identificados no artigo 1º desta petição inicial e, consequentemente, condenarem-se os réus ao reconhecimento deste direito de propriedade;
que se declare, e que os réus sejam condenados a reconhecer, que sobre o seu prédio rústico identificado no artigo 12º desta petição inicial, está constituída por usucapião uma servidão de passagem a pé e com veículos motorizados, a favor dos prédios rústicos de que os autores são proprietários identificados no artigo 1º desta petição inicial, sendo que aquela servidão se concretiza no direito de transitar sobre uma parcela de terreno do prédio rústico dos réus, com cerca de 200m2, nos termos vertidos nos artigos 17º a 29º desta petição inicial, que aqui se dão por reproduzidos; declarar-se que os réus esbulharam os autores da posse de tal servidão de passagem, devendo por consequência ser condenados a no prazo de dois dias restituir-lhes aquela posse plena, assim por aí permitindo o regular trânsito apeado e carral, e a retirar tudo o mais de forma a deixar a parcela de terreno em questão livre e desimpedida; condenar-se os réus a pagarem aos autores uma indemnização pelos prejuízos causados a título de danos não patrimoniais no montante de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) acrescido de juros legais vencidos e vincendos, à taxa legal, e desde a citação; (…) subsidiariamente, que se declare, e que os réus sejam condenados a reconhecer que a servidão de passagem a que se reporta o pedido formulado sob o número 2 antecedente foi constituída por “destinação de pai de família”, nos artigos 32º a 34º desta petição inicial; (…) subsidiariamente, que se declare, e que os réus sejam condenados a reconhecer, que o prédio rústico de que os autores são proprietários identificados no artigo 1º desta petição inicial, está encravado por não terem acesso direto através de vias públicas, e que, em consequência, sobre o prédio rústico dos réus identificado no artigo 12º desta petição inicial, se determine a constituição de uma servidão de passagem a pé e com veículos motorizados, em benefício de prédio encravado, a favor do identificado prédio rústico de que os autores são proprietários, sendo que a mesma se concretiza no direito de transitar por uma parcela de terreno do prédio rústico dos réus, com cerca de 200m2, nos termos vertidos nos artigos 17º a 29º desta petição inicial, que aqui se dão por reproduzidos”.
2 - Em 19/10/2015 foi proferida sentença, transitada em julgado, na qual se decidiu:

“(…) Em face do exposto, julgam-se parcialmente procedentes os presentes autos de ação declarativa, sob a forma de processo comum, e, consequentemente, decide-se:

a) Declarar que os autores J. P. e MARIA são proprietários do imóvel identificado no facto provado n.º 1, condenando-se os réus F. S. e M. S. a reconhecê-lo;
b) Declarar que a favor do prédio identificado no facto provado n.º 1 se encontra constituída, por via da usucapião, uma servidão de passagem, a onerar o prédio identificado no facto provado n.º 4, nos termos supra descritos, condenando-se os réus F. S. e M. S. a reconhecê-lo e a absterem-se de quaisquer atos de turbação desse direito;
c) Julgar improcedentes os demais pedidos formulados pelos autores J. P. e MARIA, a título principal, absolvendo-se em conformidade os réus F. S. e M. S. de tais pretensões (…)”.

3 - Na sentença consideraram-se provados os seguintes factos:

“(…) 1. O direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (...) e inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, encontra-se registado a favor dos autores, mediante a apresentação n.º 16 de 03/12/2004, por sucessão hereditária de José e T. P. (…)
2. Na matriz predial relativa ao prédio indicado em 1 constam os seguintes elementos (…):
• área: 740 m2;
• confrontações: norte com João, do sul com F. S., do nascente com A. O. e do poente com D. R.;
• descrição: pinhal.
3. Os autores, por si e pelos seus ante possuidores, fruem do prédio indicado em 1, ininterruptamente, aí plantando e cortando pinheiros para obtenção de lenha que utilizam em benefício próprio ou para venda, limpando e roçando o mato para obtenção de lenha e estrume, procedendo ao seu granjeio, e nele introduzindo as transformações e melhoramentos que muito bem entendem, pagando a respetiva contribuição predial e colhendo os seus frutos, e, fazem-no, há mais de cinquenta anos, à vista de toda a gente, e na certeza de exercerem um direito próprio e de não lesarem direitos alheios, sem a mais pequena oposição ou contestação de quem quer que fosse (…)
4. O direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (...) e inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, encontra-se registado a favor dos réus, mediante a apresentação n.º 677 de 03/09/2012, por compra a M. E. (…)
5. Na matriz predial relativa ao prédio referido em 4 constam os seguintes elementos (…):
• área: 2240 m2;
• confrontações: norte com estrada, do sul com José, do nascente com João e do poente com J. C.;
• descrição: pinhal.
6. O prédio indicado em 1 (…):
• não tem qualquer comunicação ou acesso directo através de vias públicas;
• confina com o imóvel indicado em 4 do lado poente
• a via pública mais próxima é a estrada indicada em 7.
7. O prédio aludido em 4 confronta pelo seu lado norte com a estrada municipal que liga a localidade de ... à cidade de Vila Real. (…)
8. Desde há mais de 50 anos e até há 7/8 anos, os autores, por si e pelos seus ante possuidores José e T. P., bem como as pessoas que contratam para ajudarem no granjeio do imóvel, acediam ao prédio identificado em 1, a partir da estrada municipal referida em 7, por um trato de terreno situado na extrema poente do prédio aludido em 4, com uma extensão de 100 metros e uma largura média de cerca de 2 metros, quer a pé, quer com animais, quer com o recurso a carros de bois, para fruírem daquele imóvel e aí recolherem mato e lenha, que transportavam pelo indicado trato de terreno, sempre que entendiam e fosse necessário, ao longo de todo o ano, encontrando-se o solo devidamente alisado e demarcado no terreno, mercê das sucessivas passagens de trânsito apeado e carral, fazendo-o na convicção de exercerem um direito de passagem próprio, à vista de toda a gente e sem qualquer oposição (…)
9. No dia 13/02/2014, com o recurso a maquinaria, os réus mandaram proceder à colocação de duas pedras de grande dimensão no início do trato indicado em 8, com pesagem superior a uma tonelada, e na parte confinante com a estrada municipal (…)
10. Em 27/12/2013 tinham sido colocadas duas pedras de grandes dimensões no local referido em 9, as quais foram removidas pelos autores (…)
13. O direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º … e inscrito na matriz predial sob o artigo ...º, encontra-se registado a favor de M. I., mediante a apresentação n.º … de 08/10/2009, por compra a F. R. (…)
14. Na matriz predial relativa ao prédio referido em 13 constam os seguintes elementos (…):
• área: 1160 m2;
• confrontações: norte com F. S., do sul com João, do nascente com J. L. e do poente com J. B.;
• descrição: pinhal.
15. O direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º … e inscrito na matriz predial sob o artigo ...º, encontra-se registado a favor de A. F. e M. I., mediante a apresentação n.º 16 de 05/08/1999, por doação dos réus (…)
16. Na matriz predial relativa ao prédio referido em 15 constam os seguintes elementos, com relevo para os presentes (…):
• área: 880 m2;
• confrontações: norte com José, do sul com F. R., do nascente com M. T. e do poente com D. R.;
• descrição: pinhal.
17. Os prédios identificados em 14 e 16 não confinam com a via pública (…)”
4 - Na sentença consta a seguinte fundamentação, no que ora releva:
“(…) Conforme vimos, os autores vieram peticionar o reconhecimento de uma servidão de passagem a onerar o prédio rústico do artigo (...).º, em benefício do prédio rústico do artigo (...).º, constituída por via da usucapião, e, subsidiariamente, por destinação do pai de família ou por via coativa.

Diz-nos o artigo 1543.º do Código Civil que a servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente o prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia.

As servidões prediais podem ser constituídas por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família (artigo 1547.º, n.º 1, do Código Civil). Porém, as servidões legais (ou coativas), sendo suscetíveis de serem coativamente impostas, podem ainda ser constituídas por sentença judicial ou por decisão administrativa (artigo 1547.º, n.º 2, do Código Civil), na falta de constituição voluntária .

No caso “sub iudice”, perante a materialidade descrita no facto provado n.º 8, afigura-se que os atos materiais aí descritos integram o “corpus” possessório, presumindo-se ainda o “animus possidendi” dos autores, em alinhamento com o que decorre da factualidade provada, mostrando-se assim evidenciada a sua posse, que se apresenta pública e pacífica – cfr. artigos 1252.º, n.º 2, 1261.º, n.º 1 e 1262.º, do Código Civil.

Quanto ao prazo exigível para a aquisição do direito real, tendo os autores, perante a materialidade narrada no facto provado n.º 8, logrado ilidir a presunção de má fé da sua posse, por não ser titulada, este situa-se nos 15 (quinze) anos (cfr. artigos 350.º, n.º 2, 1259.º, n.ºs 1 e 2, 1260.º, n.ºs 1 e 2 e 1296.º do Código Civil), o que não constitui um obstáculo ao deferimento da pretensão dos autores, pois ficou provado o exercício da posse, por estes e ante possuidores (cfr. artigos 1255.º, 1263.º, al. c), e 1264.º, n.º 1, do Código Civil), de forma contínua, por mais de 40 anos.

Todavia, apenas podem ser constituídas por usucapião as servidões aparentes, isto é, aquelas que se revelam por sinais visíveis e permanentes – cfr. artigos 1293.º, al. a) e 1548.º, n.ºs 1 e 2, do Código Civil.

A visibilidade dos sinais pressupõe que estes permitam a apreensão a qualquer pessoa do exercício da servidão e a exigência da sua permanência prende-se com o conteúdo desse exercício, pois o exercício de uma servidão não contínua (v.g. servidão de passagem), isto é aquela que não se exerce permanentemente, de forma independente face à ação humana, não é idêntico ao de uma servidão contínua (v.g. servidão de aqueduto), sendo certo que ambas admitem a sua constituição por via da usucapião, desde que sejam aparentes .

Ora, “in casu”, este requisito também se verifica, pois o solo do trato de terreno apresenta-se devidamente alisado e demarcado no terreno, mercê das sucessivas passagens de trânsito apeado e carral.

Deste modo, conclui-se existir na esfera jurídica dos autores um direito de servidão de passagem, constituído por via da usucapião, enquanto proprietários do prédio do artigo (...).º, ainda que, quanto ao seu conteúdo, restringida aos caracteres presentes no facto provado n.º 8 (cfr. artigo 1564.º do Código Civil).

Consequentemente, fica prejudicada a apreciação da verificação dos pressupostos para ser reconhecida a eventual aquisição do direito de servidão por destinação de pai de família, ou para ser constituída coativamente uma servidão legal de passagem – cfr. artigo 608.º, n.º 2, do C.P.C. (…)

5 - O direito de propriedade relativo ao prédio rústico sito na freguesia de (...), concelho de Vila Real, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º (...) e inscrito na matriz predial sob o artigo (...).º, encontra-se registado a favor dos autores, mediante a ap. n.º 677 de 03/09/2012 (por compra a M. E.).
6 - Na matriz predial relativa ao prédio do artigo (...).º constam os seguintes elementos, no que ora releva:
· área: 2240 m2;
· confrontações: norte com estrada, do sul com José, do nascente com João e do poente com J. C.;
· descrição: pinhal.
7 - Na sua parte final o troço identificado no facto provado n.º 8 da sentença pressupõe o atravessamento longitudinal do prédio do artigo (...).º, na orientação poente – nascente.
8 - O troço identificado no facto provado n.º 8 da sentença apresenta-se sensivelmente plano.
9 - Os autores procederam à abertura de um troço que se inicia na extrema nascente do prédio do artigo (...).º, na confinância com a via municipal que liga a localidade de ... à cidade de Vila Real, o qual se desenvolve num percurso ligeiramente sinuoso e de pendente descendente, por uma extensão de cerca de 73 metros e com uma largura média de cerca de 2,50 m (variando entre 2,30 e 2,70m), até se alcançar o prédio do artigo (...).º.
10 - (…) o solo desse troço foi aberto com recurso a máquinas, mas apresenta-se irregular, com pedras e vegetação espontânea, o que dificulta o trânsito de veículos nesse percurso.
11 - Quer no prédio do artigo (...).º, quer no prédio do artigo (...).º, existem matas com pinheiros.
12 - A alteração do troço a utilizar pelos réus poderá permitir que os autores vedem a parte restante do prédio do artigo (...).º.
13 - Os autores procederam recentemente à limpeza da mata e ao corte de alguns dos pinheiros no prédio do artigo (...).º, na sequência da alteração das regras relativas à prevenção dos incêndios florestais.
14. (…) quando até aí não tinham efetuado intervenções de monta no prédio do artigo (...).º.
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Matéria de facto não provada:

1. A alteração do troço a utilizar pelos réus poderá permitir que os autores possam construir no prédio do artigo (...).º, o que até aí não era possível.
2. (…) e poderá permitir que os autores se dedicam à atividade de pastorícia.
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Da invocada nulidade da sentença recorrida por violação do disposto no art. 615º, nº 1 – d) , do C. P. Civil.

No caso, os Recorrentes consideram que a decisão recorrida violou a disposição acima mencionada por a mudança da servidão ter ficado condicionada à retirada, por parte dos Autores, das pedras e limpeza da vegetação espontânea existentes na faixa de terreno por onde os Autores pretendem passe a situar-se a servidão.

Verifica-se existir excesso de pronúncia, gerador da nulidade prevista no art. 615º, nº 1 – d), 2ª parte do C. P. Civil quando o juiz conhece de questões de que não podia tomar conhecimento, ou seja, quando conheça de pedidos ou causas de pedir não invocadas ou exceções na exclusiva disponibilidade das partes (1).

Esta nulidade resulta da violação do disposto no art. 609º, nº 1 do C. P. Civil, que refere que o juiz não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir.

O referido normativo consagra um dos princípios que enformam o direito processual civil e que é o princípio do dispositivo que impede o juiz de extravasar o que lhe foi pedido pelas partes. O objeto da sentença tem que coincidir com o objeto do processo.

Paula Costa e Silva (2) refere que o princípio do dispositivo determina que o tribunal se encontra vinculado, no momento do proferimento da decisão, ao decretamento das consequências que o autor no ato postulativo lhe requera, não podendo decidir-se por um maius ou por um aliud.

Ora, no caso, tal como referem os Réus, a realização de trabalhos futuros no troço indicado pelos Autores para a mudança da servidão, não foi alegada, nem resulta dos temas de prova.

É certo que a existência de pedras e vegetação no dito troço resulta da perícia realizada no âmbito destes autos, o que levou o Sr. Juiz a consignar tal matéria nos factos provados (v. ponto 10), contudo, tal matéria não poderá servir de fundamento factual à solução decretada, de condicionar a alteração da servidão à remoção de tais obstáculos, uma vez que essa factualidade não foi alegada e constitui matéria de exceção ao direito que foi reconhecido e, enquanto matéria de exceção, os factos respetivos são nucleares. Na verdade, os factos que fazem concluir pela existência de obstáculos ao trânsito de veículos pelo caminho por onde se pretende instalar a servidão, não são factos meramente instrumentais, nem complemento ou concretização dos que as partes tenham alegado, em ambos os casos quando tais factos resultem da instrução da causa.

Ora, nos termos do disposto no art. 5º nº 2 do C. P. Civil, o juiz apenas pode considerar factos que não tenham sido alegados pelas partes quando os mesmos são instrumentais que resultem da instrução da causa; quando tais factos sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; quando sejam notórios ou quando o tribunal deles tenha conhecimento por virtude do exercício das suas funções.

Quanto aos factos instrumentais, para Castro Mendes (3), são "os que interessam indiretamente à solução do pleito, por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes".

Teixeira de Sousa refere-se-lhes como sendo "os que indiciam aqueles factos essenciais" (4).

Lopes do Rego (5) diz que "factos instrumentais se definem, por contraposição aos factos essenciais, como sendo aqueles que nada têm a ver com substanciação da ação e da defesa e, por isso mesmo, não carecem de ser incluídos na base instrutória, podendo ser livremente investigados pelo juiz no âmbito dos seus poderes inquisitórios de descoberta da verdade material".

Os factos complementares ou concretizadores são aqueles que especificam e densificam os elementos da previsão normativa em que se funda a pretensão do autor - a causa de pedir - ou do reconvinte ou a exceção deduzida pelo réu como fundamento da sua defesa, e, nessa qualidade, são decisivos para a viabilidade ou procedência da ação/reconvenção/defesa por exceção. (v. Ac. R. C. de 23/2/2016 in www.dgsi.pt )

Paulo Pimenta, na sua comunicação “Temas de Prova” (6), explica que os factos “nucleares” constituem o núcleo primordial da causa de pedir ou da exceção, desempenhando uma função individualizadora ou identificadora

Ora, como acima foi dito, a intervenção oficiosa do tribunal subsequente à instrução da causa só poderá ter por objeto factos instrumentais ou factos essenciais mas que sejam complementares ou concretizadores de outros alegados pelas partes, pois que quanto aos factos essenciais “nucleares” que constituem a causa de pedir ou nos quais que se baseiam as exceções, continua a manter-se sem restrição o princípio do dispositivo.

No caso, tal como acima se disse, os factos em análise não são factos instrumentais, nem complementares ou concretizadores, pelo que, em observando o disposto no art. 5º do C. P. Civil, não podia o tribunal, oficiosamente, recorrer à sua utilização para a decisão da causa e ao fazê-lo incorreu numa violação do princípio do dispositivo.

Deste modo, tal segmento da decisão é nulo, por aplicação do disposto no art. 615º, nº 1 – d) do C. P. Civil, por consubstanciar a apreciação de uma questão não colocada por qualquer das partes, nomeadamente, pelos Réus a título de exceção.

Declara-se pois, a nulidade da sentença na parte em que condicionou a modificação da servidão à retirada, por parte dos Autores, das pedras e limpeza da vegetação espontânea existentes na faixa de terreno por onde os Autores pretendem passe a situar-se a servidão.

Tal nulidade é apenas e tão só de tal segmento da decisão (v- art. 195º, nº 2 do C. P. Civil).
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Em face da declaração de nulidade do segmento da decisão que condicionou a modificação da servidão à retirada, por parte dos Autores, das pedras e limpeza da vegetação espontânea existentes na faixa de terreno por onde os Autores pretendem passe a situar-se a servidão, desnecessário se torna analisar a questão suscitada no recurso de a decisão recorrida ser uma sentença condicional e portanto não permitida pelo nosso ordenamento jurídico.
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Analisemos agora se se justifica a modificação da servidão pedida pelos Autores.

Servidão predial é o encargo imposto num prédio em proveito exclusivo de outro prédio pertencente a dono diferente; diz-se serviente prédio sujeito à servidão e dominante o que dela beneficia (cfr. Art. 1543º do C. Civil).

O direito de servidão predial é um direito real de gozo sobre coisa alheia, mediante o qual o proprietário de um prédio tem a faculdade de se aproveitar das utilidades de prédio alheio em benefício do aproveitamento das utilidades do primeiro (7).

Como é sabido, as servidões, no que respeita à sua natureza e constituição, podem ser voluntárias ou legais. As servidões voluntárias constituem-se por contrato, testamento, usucapião ou destinação do pai de família (1547º, nº 1); as servidões legais são aquelas que, na falta de constituição voluntária, por aqueles meios, podem ser constituídas por sentença judicial ou, sendo caso disso, por decisão administrativa (1547º, nº 2).

No caso a existência da servidão em causa nos autos, foi reconhecida por sentença judicial, proferida em 19/10/15, no processo 412/14.2TBVRL, do juízo local cível de Vila Real.

A mudança da servidão está prevista no art. 1568, nº 1 do C. Civil que dispõe que o proprietário do prédio serviente não pode estorvar o uso da servidão, mas pode, a todo o tempo, exigir a mudança dela para sítio diferente do primitivamente assinado, ou para outro prédio, se a mudança lhe for conveniente e não prejudicar os interesses do proprietário do prédio dominante, contanto que o faça à sua custa; com o consentimento de terceiro pode a servidão ser mudada para o prédio deste.

Assim, a mudança de servidão deve trazer sérias e reais vantagens para o dono do prédio serviente e não deve prejudicar os interesses do prédio dominante: estes devem ser dignos de ponderação e não meros caprichos ou pura comodidade (8).

A ponderação dos interesses em jogo deverá ser feita casuisticamente, observando um critério de proporcionalidade.

Conforme se refere no Ac. da Relação do Porto de 19/11/2002, a justa ponderação dos interesses dos donos dos dois prédios passa obrigatoriamente por um critério de proporcionalidade entre a necessidade ou conveniência da diminuição do encargo sobre o prédio serviente e o prejuízo que a mudança de servidão possa acarretar para prédio encravado (9).

No caso, os factos provados com relevância para aferir da conveniência de uns e da inexistência de prejuízo para os outros, são os seguintes:

- o troço de terreno por onde se desenvolve a servidão reconhecida no mencionado processo situa-se na extrema poente do prédio dos ora Autores, com uma extensão de 100 metros e uma largura média de cerca de 2 metros, quer a pé, quer com animais, quer com o recurso a carros de bois, para fruírem daquele imóvel e aí recolherem mato e lenha, que transportavam pelo indicado trato de terreno, sempre que entendiam e fosse necessário, ao longo de todo o ano, encontrando-se o solo devidamente alisado e demarcado no terreno, mercê das sucessivas passagens de trânsito apeado e carral;
- Na sua parte final o mencionado troço pressupõe o atravessamento longitudinal do prédio do artigo (...).º (prédio dos ora Autores), na orientação poente – nascente.
- Tal troço identificado apresenta-se sensivelmente plano.
- Os autores procederam à abertura de um troço que se inicia na extrema nascente do prédio do artigo (...).º (prédio dos ora Réus), na confinância com a via municipal que liga a localidade de ... à cidade de Vila Real, o qual se desenvolve num percurso ligeiramente sinuoso e de pendente descendente, por uma extensão de cerca de 73 metros e com uma largura média de cerca de 2,50 m (variando entre 2,30 e 2,70m), até se alcançar o prédio do artigo (...).º (prédio dos ora Autores).
- O solo desse troço foi aberto com recurso a máquinas, mas apresenta-se irregular, com pedras e vegetação espontânea, o que dificulta o trânsito de veículos nesse percurso.
- Quer no prédio do artigo (...).º, quer no prédio do artigo (...).º, existem matas com pinheiros.
- A alteração do troço a utilizar pelos réus poderá permitir que os autores vedem a parte restante do prédio do artigo (...).º.

Analisando estes factos, verificamos que relativamente à conveniência da alteração para os Autores, apenas se provou que a modificação poderá permitir-lhes que vedem a parte restante do seu prédio. No que concerne ao prejuízo para os ora Réus, vemos que o novo traçado é ligeiramente sinuoso e de pendente descendente e apresenta-se irregular, com pedras e vegetação, que dificultam o trânsito de veículos, sendo, no entanto, mais curto cerca de 7 m.

Ora, quanto ao argumento dos Autores no sentido de que não podem vedar o seu prédio caso a servidão não seja mudada de local, não pode o mesmo consistir na única vantagem na requerida alteração, pois poderão sempre vedar o seu terreno desde que facultem aos Réus a possibilidade de acesso à servidão sem dificuldade (porque, por exemplo, uma parte da vedação é facilmente amovível, ou porque lhe foi entregue uma chave do portão de acesso), não podendo o proprietário do prédio dominante invocar o incómodo que lhe causa a abertura de um eventual portão (10).

Por outro lado, a mudança da servidão apresenta desvantagens para os Réus, já que em vez do solo plano e alisado do caminho atual, aqueles teriam um percurso ligeiramente sinuoso, de pendente descendente e irregular. No entanto, entendemos que estas circunstâncias, só por si, não seriam óbice à alteração da servidão, contudo, provou-se ainda que o novo troço tem pedras e vegetação (bem visíveis nas fotos juntas ao relatório pericial), que dificultam o trânsito de veículos e que por isso impediria os Réus de o utilizar na sua plenitude.

Deste modo, considera-se que a alteração da servidão não observa os requisitos previstos no art. 1568º, nº 1 do C. Civil, pelo que não deve a mesma ser alterada.
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DECISÃO:

Pelo exposto, acorda-se nesta secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães em julgar procedente a apelação, revogando-se a decisão recorrida e, consequentemente, não se concedendo aos Autores o direito a mudarem a servidão identificada nos autos.
Custas a cargo dos Recorridos.
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Guimarães, 6 de dezembro de 2018

Alexandra Rolim Mendes
Maria de Purificação Carvalho
Maria dos Anjos Melo Nogueira

1. v. Lebre de Freitas e outros, Código de Processo Civil ano, Coimbra edit., 2001, II vol., pág. 670
2. in Acto e Processo, pág. 583
3. in Direito Processual Civil, 1968, 2º, pág. 208
4. in Introdução ao Processo Civil, 1993, pág. 52
5. In Comentário ao Código de Processo Civil, pág. 201
6. disponível em http://www.cej.mj.pt/cej/recursos/ebooks/ProcessoCivil/Texto_comunicacao_Paulo_Pimenta.pdf
7. V. Lições de Direitos Reais, Quid Juris, pág. 421
8. v. A. Santos Justo, Direitos Reais, Coimbra Editora, pág. 423
9. In www.dgsi.pt
10. V. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, vol. III, pág. 670-671