Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1516/16.2T8BCL.G1
Relator: ALDA MARTINS
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
TEMPO INDETERMINADO
SUBSÍDIO DE DESEMPREGO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 07/11/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I – É de considerar celebrado por tempo indeterminado, nos termos do art. 147.º, n.º 1, als. b) e c) do Código do Trabalho de 2009, o contrato de trabalho a termo em que não se indicaram de modo suficientemente preciso as razões que justificaram a aposição do termo e ou estas não foram demonstradas pelo empregador.

II – Enferma do primeiro vício aludido o contrato de trabalho pelo prazo de seis meses em que consta a seguinte cláusula para justificação da aposição de termo: “A celebração do presente contrato enquadra-se na situação prevista na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º da Lei n.º 7/2009 de 12 de Fevereiro, pelo facto da empresa prever um acréscimo excepcional da actividade, levando à necessidade de reforçar o pessoal para assegurar todos os serviços a efectuar, sem garantias que se prolongue para além desse prazo”.

III – A alínea c) do n.º 2 do art. 390.º do Código do Trabalho de 2009 prossegue um evidente interesse público, sob pena de o trabalhador ficar duplamente ressarcido e de a segurança social ficar injustificadamente desfalcada, sendo, por isso, matéria de conhecimento oficioso, pelo que deve o tribunal determinar na sentença o desconto do eventual subsídio de desemprego auferido no montante devido ao trabalhador e a sua entrega à segurança social.
Decisão Texto Integral:

1. Relatório

José T. intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra Gruas A., Lda., deduzindo pedido no sentido de:
a) ser o contrato de trabalho a termo certo celebrado entre o autor e a ré convertido em contrato por tempo indeterminado por falta de indicação do motivo justificativo com a indicação expressa dos factos que o integram;
b) ser a cessação do contrato operada pela ré declarada ilícita;
c) ser a ré condenada a pagar ao autor as seguintes quantias:
1 – 797,95€ de diferenças salariais;
2 – 602,18€ de férias não gozadas;
3 – 278,12€ de subsídio de férias;
4 – 790,31€ de proporcionais de férias e subsídio de férias;
5 – 156,90€ de subsídio de Natal;
6 – 1.354,88€ de subsídio de deslocação (cláusula 31.ª do CCT);
d) ser a ré condenada a reintegrar o autor no seu posto de trabalho com a categoria e antiguidade que lhe pertenciam ou a indemnizá-lo com a quantia de 1.656,00€, opção a fazer até ao termo da audiência de discussão e julgamento;
e) ser a ré condenada a pagar ao autor os salários intercalares desde 30 dias antes da propositura da presente acção e até ao trânsito em julgado da decisão que ponha termo à causa;
f) ser a ré condenada a pagar ao autor juros de mora à taxa legal, vencidos e vincendos, sobre as referidas quantias.
Alega, em síntese, que foi contratado pela ré em 04/06/2014, para, sob a autoridade e direcção desta exercer as funções de condutor/manobrador, mediante o pagamento da retribuição mensal de 500,00€ (quinhentos euros), acrescida de 5,00€ (cinco euros) diários de subsídio de alimentação, contrato esse celebrado pelo prazo de seis meses. Mais alega que o contrato não contém a mínima justificação para a sua celebração a termo, motivo pelo qual deve ser considerado sem termo, o que torna ilícita a comunicação de denúncia que a ré lhe dirigiu em 11/11/2015 e através da qual pôs termo ao contrato. Alega finalmente não lhe ter sido paga a retribuição base mensal devida, face à convenção colectiva aplicável, para além de outros créditos laborais acima mencionados no pedido.
A ré contestou, admitindo a existência do contrato de trabalho e acrescentando que foram comunicados ao autor os factos que justificavam a sua celebração a termo. Entende, por isso, que a comunicação de caducidade é legal e não existe qualquer despedimento ilícito. Afirma que todas as quantias devidas ao autor estão pagas, nada mais havendo a pagar.
Termina pedindo a improcedência da acção e a sua absolvição do pedido.
Foi proferido despacho saneador e dispensada a selecção da matéria de facto.
Procedeu-se a julgamento, após o que pelo Mmo. Juiz a quo foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
«Assim e nos termos expostos, julgo a ação parcialmente procedente por provada e, consequentemente:
a) declaro que o contrato de trabalho a termo certo celebrado entre o autor José T. e a ré Gruas A. Lda., se converteu em contrato por tempo indeterminado por falta de indicação do motivo justificativo com a indicação expressa dos factos que o integram;
b) declaro ilícita a cessação do contrato operada pela ré Gruas A. Lda. através de carta dirigida ao autor em 11 de Novembro de 2015;
c) condeno a ré Gruas A. Lda., a pagar ao autor José T. as seguintes quantias:
1 – 797,95€ (setecentos e noventa e cinco euros e noventa e cinco cêntimos) de diferenças salariais;
2 – 628,42€ (seiscentos e vinte e oito euros e quarenta e dois cêntimos) a título de férias não gozadas e subsídio de férias não pago, devidos pelo tempo de duração do contrato;
3 – 157,59€ (cento e cinquenta e sete euros e cinquenta e nove cêntimos) de subsídio de Natal;
4 – 1.354,88€ (mil trezentos e cinquenta e quatro euros e oitenta e oito cêntimos) a título de subsídio de deslocação (cláusula 31ª do CCT);
d) condeno a ré Gruas A. Lda. a pagar ao autor José T. a quantia de 1.195,20€ (mil cento e noventa e cinco euros e vinte cêntimos: 1.656,00€-460,80€) a título de indemnização em substituição da reintegração;
e) condeno a ré Gruas A. Lda. a pagar ao autor José T. as retribuições devidas entre 05/06/2016 (30 dias antes da propositura da presente ação) e a data de trânsito em julgado da presente sentença, à razão mensal de 677,40€ (552,00€ + 5,70€ X 22);
f) condeno a ré Gruas A. Lda. a pagar ao autor José T. juros de mora à taxa legal de 4%, vencidos e vincendos até integral pagamento, sobre as referidas quantias, sendo as de c) 1. e e) a contar desde as respetivas datas de vencimento de cada retribuição e as de c) 2., 3., 4. e d) a contar desde a data de cessação do contrato.
Custas da ação por autor e ré, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 18,48% para o primeiro e 81,52% para a segunda – art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil.»
A ré, inconformada, interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões:
«A) O motivo para celebração do contrato de trabalho a termo, colocado no documento pela Ré, apesar de ser simples, é suficiente para se poder averiguar se a sua factualidade corresponderá ou não à realidade, preenchendo os requisitos dos artigos 140º e 141º do Código de Trabalho, devendo a cessação de contrato por caducidade ser considerada válida;
B) Deste modo, considerámos ter ocorrido, nesta parte, manifesto ERRO DE JULGAMENTO;
C) Não obstante, não foi indicado pelo Tribunal a quo, que deverá conhecer oficiosamente, o valor correspondente às prestações sociais obtidas pelo trabalhador desde a cessação do contrato de trabalho, que deverão ser tidas em conta nos cálculos de indemnização;»
O autor não apresentou resposta ao recurso da ré.
O recurso foi admitido como apelação, com efeito meramente devolutivo.
Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, pelo Ministério Público foi emitido parecer no sentido da procedência parcial do recurso, quanto à questão da dedução do subsídio de desemprego.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.

2. Objecto do recurso

Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, as questões que se colocam a este tribunal são as seguintes:
- validade da estipulação de termo no contrato de trabalho;
- dedução do subsídio de desemprego na quantia devida a título de retribuições intercalares.

3. Fundamentação de facto

Os factos provados são os seguintes:
A) A ré é uma empresa que se dedica ao aluguer de equipamentos para a construção civil, bem como à prestação de serviços;
B) No exercício dessa actividade, a ré admitiu ao seu serviço o autor, por contrato a termo certo de 6 meses, no dia 4 de Junho de 2014, para sob as suas ordens, direcção e fiscalização, e mediante a remuneração base mensal de 500,00€ (quinhentos euros), acrescida do subsídio de alimentação diário de 5,00€ (cinco euros), lhe prestar a actividade de condutor/manobrador;
C) Como justificação para a celebração do contrato pelo prazo de seis meses, consta na cláusula 9.ª do mesmo o seguinte: “A celebração do presente contrato enquadra-se na situação prevista na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º da Lei n.º 7/2009 de 12 de Fevereiro, pelo facto da empresa prever um acréscimo excepcional da actividade, levando à necessidade de reforçar o pessoal para assegurar todos os serviços a efectuar, sem garantias que se prolongue para além desse prazo”;
D) O autor conduzia e manobrava gruas automóveis acima de 50 toneladas;
E) Por carta datada de 11 de Novembro de 2015, a ré comunicou ao autor a cessação do seu contrato, com efeitos a partir de 03 de Dezembro de 2015;
F) Durante o tempo que durou a relação contratual, foram pagas ao autor as seguintes retribuições:
- Junho/14: 450,00€;
- Julho/14: 500,00€;
- Agosto/14: 500,00€;
- Setembro/14: 500,00€;
- Outubro/14: 505,00€;
- Novembro/14: 505,00€;
- Dezembro/14: 505,00€;
- Janeiro/15: 505,00€;
- Fevereiro/15: 505,00€;
- Março/15: 505,00€;
- Abril/15: 505,00€;
- Maio/15: 505,00€;
- Junho/15: 505,00€;
- Julho/15: 505,00€;
- Agosto/15: 505,00€;
- Setembro/15: 505,00€;
- Outubro/15: 505,00€;
- Novembro/15: 512,00€;
- Dezembro/15: 51,20€;
G) Durante o tempo em que trabalhou para a ré, o autor apenas gozou 10 dias de férias no ano de 2015;
H) A ré pagou ao autor a título de subsídio de férias as quantias de 41,67€ em 08 de Julho de 2014 e 505,00€ em 10/07/2015;
I) A título de proporcionais de férias e subsídio de férias a ré pagou ao autor a quantia de 230,01€ em 03/12/2015;
J) A título de subsídio de Natal, a ré apenas pagou ao autor a quantia de 667,40€ (291,93€ em 09/12/14 e 375,47€ em 03/12/2015);
K) O autor esteve deslocado no estrangeiro desde Junho de 2014 até finais de Março de 2015;
L) A ré aproveitou a possibilidade de cedência de mão-de-obra à sociedade Euro, Lda. que obteve a possibilidade de realização de obras no Chile e no Panamá;
Facto resultante de documento não impugnado:
M) A título de compensação pela caducidade do contrato de trabalho, a ré pagou ao autor a quantia de 460,80€ (quatrocentos e sessenta euros e oitenta cêntimos) – fls. 13.

4. Apreciação do recurso

4.1. A Recorrente insurge-se, desde logo, contra a sentença recorrida na parte em que considerou que o contrato de trabalho a termo certo que aquela celebrou com o Recorrido se converteu em contrato por tempo indeterminado por falta de indicação do motivo justificativo com a indicação expressa dos factos que o integram e, em consequência, que foi ilícita a cessação desse contrato operada pela Recorrente através de carta que endereçou ao Recorrido no dia 11/11/2015.
Vejamos.
Estabelece o Código do Trabalho de 2009 (diploma a que se reportarão todos os preceitos doravante indicados sem outra menção):
Artigo 140.º
Admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo
1 - O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade.
2 - Considera-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa:
a) Substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar;
b) Substituição directa ou indirecta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude de despedimento;
c) Substituição directa ou indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição;
d) Substituição de trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado;
e) Actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima;
f) Acréscimo excepcional de actividade da empresa;
g) Execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro;
h) Execução de obra, projecto ou outra actividade definida e temporária, incluindo a execução, direcção ou fiscalização de trabalhos de construção civil, obras públicas, montagens e reparações industriais, em regime de empreitada ou em administração directa, bem como os respectivos projectos ou outra actividade complementar de controlo e acompanhamento. 3 - Sem prejuízo do disposto no n.º 1, só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto em situação referida em qualquer das alíneas a) a c) ou e) a h) do número anterior.
4 - Além das situações previstas no n.º 1, pode ser celebrado contrato de trabalho a termo certo para:
a) Lançamento de nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores;
b) Contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego.
5 - Cabe ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo.
6 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto em qualquer dos n.os 1 a 4.
Artigo 141.º
Forma e conteúdo de contrato de trabalho a termo
1 - O contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita e deve conter:
a) Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes;
b) Actividade do trabalhador e correspondente retribuição;
c) Local e período normal de trabalho;
d) Data de início do trabalho;
e) Indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo;
f) Datas de celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação.
2 - Na falta da referência exigida pela alínea d) do número anterior, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.
3 - Para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto na alínea e) do n.º 1 ou no n.º 3.
Artigo 147.º
Contrato de trabalho sem termo
1 - Considera-se sem termo o contrato de trabalho:
a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;
b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.ºs 1, 3 ou 4 do artigo 140.º;
c) Em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências ao termo e ao motivo justificativo;
d) Celebrado em violação do disposto no n.º 1 do artigo 143.º
2 - Converte-se em contrato de trabalho sem termo:
a) Aquele cuja renovação tenha sido feita em violação do disposto no artigo 149.º;
b) Aquele em que seja excedido o prazo de duração ou o número de renovações a que se refere o artigo seguinte;
c) O celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo.
3 - Em situação referida no n.º 1 ou 2, a antiguidade do trabalhador conta-se desde o início da prestação de trabalho, excepto em situação a que se refere a alínea d) do n.º 1, em que compreende o tempo de trabalho prestado em cumprimento dos contratos sucessivos.
Em face do exposto, conclui-se, conforme refere João Leal Amado (Contrato de Trabalho, Coimbra Editora, 2009, p. 91), que “…a nossa lei estabelece requisitos de verificação obrigatória para que seja validamente celebrado um contrato de trabalho a prazo. Existem requisitos de ordem material, que se prendem com o tipo e o elenco de situações legitimadoras da contratação a termo, e existem requisitos de ordem formal, obrigando à adequada documentação deste negócio jurídico.”
No que toca aos requisitos materiais, dispõe o art. 140.º, n.º 1 que o contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade, procedendo o n.º 2 a uma enumeração exemplificativa de situações que ali podem caber, restringidas pelo n.º 3, com carácter de taxatividade, para o caso de contratação a termo incerto. Acrescenta, todavia, o n.º 4 que, além das situações previstas no n.º 1, pode ser celebrado contrato de trabalho a termo certo em duas situações de satisfação de necessidades permanentes de trabalho, que, contudo, não relevam no presente caso.
No que, em especial, se refere às situações de necessidade temporária, como aquela que ora nos ocupa, “(…) a conjugação do n.º 1 com os n.ºs 2 ou 3 do art. 140.º do CT permite concluir que a celebração de contratos de trabalho a termo com uma fundamentação de gestão corrente passa por duas operações sucessivas: a indicação de um dos motivos do art. 140.º n.º 2 (ou de outro motivo previsto em convenção colectiva, no caso de contrato a termo certo) ou do art. 140.º n.º 3 (no caso de contrato a termo incerto); e a subsunção deste motivo à cláusula geral de fundamentação do art. 140.º n.º 1, com o objectivo de verificar se o contrato corresponde, efectivamente, a uma necessidade temporária da empresa e se é celebrado pelo tempo correspondente a essa necessidade.
A cláusula do n.º 1 do art. 140.º funciona assim como um controlo geral de admissibilidade do contrato, restringindo essa contratação quando necessário” (cfr. Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II – Situações Laborais Individuais, Almedina, 2014, p. 281).
No que respeita aos requisitos formais, estão previstos no art. 141.º, nos termos do qual, além do mais, o contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita e deve conter a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, este pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.
A propósito desta disposição legal, salienta-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/02/2017, proferido no âmbito do processo n.º 2236/15.0T8AVR.P1.S1 (disponível em www.dgsi.pt), o seguinte:
"(...) Com este requisito visa-se, um duplo objectivo: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a hipótese legal ao abrigo da qual se contratou, por um lado; e por outro, a averiguação acerca da realidade e adequação da justificação invocada face à duração estipulada, porquanto o contrato a termo - nas palavras de Monteiro Fernandes [‘Direito do Trabalho’, 13.ª Edição, pg. 319] - …só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem.
Por isso, ocorre a invalidade do termo se o documento escrito omite ou transcreve de forma insuficiente as referências respeitantes ao termo e ao seu motivo justificativo, face à prescrição do artigo 147º, nº 1, alínea c).
Assim, e conforme se decidiu no acórdão deste Supremo Tribunal de 2/12/2013, Processo n.º 273/12.6T4AVR.C1.S1, 4ª Secção, consultável em www.dgsi.pt, a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade “ad substantiam”, tendo que integrar, forçosamente, o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova.
Donde ser de concluir que as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº 2 do art. 140º do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, por forma a permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal e que é real a justificação invocada e adequada à duração convencionada para o contrato.
Por isso, tal indicação deve ser feita de forma suficientemente circunstanciada para permitir o controlo da existência da necessidade temporária invocada pela empresa no contrato, possibilitando também, quanto àquelas necessidades temporárias, que se comprove que o contrato a termo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, cabendo ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, conforme prescreve o n.º 5 do mencionado artigo 140º. (...)".
Ou seja, em suma, sob pena de o contrato ser considerado sem termo, as razões que justificaram a aposição do termo têm que ser verdadeiras, competindo ao empregador a respectiva prova (art. 140.º, n.º 5), e, por outro lado, o contrato tem que indicar de modo suficientemente preciso essas razões, fazendo menção expressa dos factos e estabelecendo a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado (art. 141.º, n.ºs 1, al. e) e 3).
Isto é, como ensina João Leal Amado (op. cit., pp. 95-96), a “…lei exige que, no indispensável documento escrito, seja indicado o motivo justificativo da contratação a termo. Caso este exista, mas não seja indicado, a consequência é a prevista no n.º 1, al. c) do art. 147.º. Caso o motivo seja indicado, mas realmente não exista (motivo forjado), terá aplicação o n.º 1, als. a) e b) do art. 147.º - sendo certo que, em ambos os casos, o contrato de trabalho é tido como um contrato sem termo. Note-se ainda que, segundo o n.º 3 do art. 141.º, «a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado». A lei impõe, portanto, que o documento contratual seja revelador, que não seja vago ou opaco, que permita um controlo externo da situação – e este especial ónus de transparência e de veracidade recai sobre o empregador, como decorre do n.º 1, al. c), do art. 147.º”.
Ora, no caso em apreço, provou-se que, como justificação para a celebração do contrato pelo prazo de seis meses, consta na cláusula 9.ª do respectivo documento assinado pelas partes o seguinte: “A celebração do presente contrato enquadra-se na situação prevista na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º da Lei n.º 7/2009 de 12 de Fevereiro, pelo facto da empresa prever um acréscimo excepcional da actividade, levando à necessidade de reforçar o pessoal para assegurar todos os serviços a efectuar, sem garantias que se prolongue para além desse prazo”.
Verifica-se, assim, que a expressão usada no contrato é, objectivamente, vaga e insusceptível de ser percepcionada nos seus exactos contornos pelo trabalhador, bem como de ser objecto dum efectivo controlo pelo tribunal, porquanto não está concretizado em que se traduziu o “acréscimo excepcional da actividade”, nem qual a conexão do mesmo com a contratação do autor pelo prazo de 6 meses, mais não sendo do que a reprodução literal da lei.
Assim, tem de se entender como não motivada a aposição do termo no contrato de trabalho celebrado entre o autor e a ré, e, por conseguinte, que o mesmo é desde o início um contrato sem termo, sem que tivesse de se provar também a falsidade do suposto motivo ou o uso abusivo ou fraudulento da contratação a prazo, visto que se trata de dois vícios distintos, bastando a verificação de apenas um para se desencadear o efeito jurídico mencionado.
Acresce, todavia, que a ré também não demonstrou, como lhe competia, factualidade concreta subsumível a qualquer acréscimo excepcional de actividade, delimitado temporalmente no período de 6 meses de vigência do contrato, pelo que também por essa razão teria de se considerar o contrato de trabalho celebrado por tempo indeterminado.
Em face do exposto, o contrato de trabalho dos autos não pode deixar de considerar-se sem termo por força do art. 147.º, n.º 1, als. b) e c), sendo certo que, repete-se, bastava a verificação de um dos vícios.
Improcede, pois, a pretensão da Apelante nesta parte.
4.2. A Recorrente sustenta também que o tribunal recorrido deveria ter oficiosamente determinado a dedução do subsídio de desemprego na quantia devida ao Recorrido a título de retribuições intercalares no período desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declarou a ilicitude do despedimento.
Estabelece o art. 390.º:
Compensação em caso de despedimento ilícito
1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.
2 - Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.
Tendo em conta os termos em que está prevista a dedução do subsídio de desemprego, afigura-se-nos que, nesta parte, assiste razão à Recorrente.
Com efeito, é jurisprudência pacífica dos nossos tribunais superiores que a alínea c) do n.º 2 do art.º 390.º prossegue um evidente interesse público e tem natureza imperativa, não estando na disponibilidade das partes accioná-la e, consequentemente, não dependendo da iniciativa processual de nenhuma delas, sendo, por isso, matéria de conhecimento oficioso a dedução imposta na referida norma, pelo que, independentemente de a questão ter ou não sido suscitada pelas partes, ou de se ter feito, ou não, prova do pagamento de subsídio de desemprego, sempre deverá o tribunal, oficiosamente, acautelar tal possibilidade, prevendo e determinando na sentença a necessidade de desconto no montante devido ao trabalhador e de entrega à segurança social, para o caso de o referido subsídio ter sido auferido (vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Setembro de 2012, proferido no âmbito do processo n.º 154/06.2TTMTS-C.P1.S1, e Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 19 de Dezembro de 2013, proferido no âmbito do processo n.º 679/12.0TTPTM.E1, disponíveis em www.dgsi.pt).
Com efeito, se assim não fosse, corria-se o risco de o trabalhador ficar duplamente ressarcido e de a segurança social ficar injustificadamente desfalcada.
Veja-se ainda neste sentido o douto parecer do Exmo. Procurador-Geral Adjunto.
Em face ao exposto, procede o recurso da Recorrente nesta parte.

5. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, em determinar a dedução, nas retribuições devidas entre 05/06/2016 e a data de trânsito em julgado da sentença, do subsídio de desemprego que tenha sido atribuído ao autor nesse período, devendo a ré entregar essa quantia à segurança social.
No mais confirma-se a sentença recorrida.
Custas pelas partes na proporção do decaimento.

Guimarães, 11 de Julho de 2017


(Alda Martins)
(Eduardo Azevedo)
(Vera Sottomayor)

Sumário (elaborado pela relatora):
I – É de considerar celebrado por tempo indeterminado, nos termos do art. 147.º, n.º 1, als. b) e c) do Código do Trabalho de 2009, o contrato de trabalho a termo em que não se indicaram de modo suficientemente preciso as razões que justificaram a aposição do termo e ou estas não foram demonstradas pelo empregador.
II – Enferma do primeiro vício aludido o contrato de trabalho pelo prazo de seis meses em que consta a seguinte cláusula para justificação da aposição de termo: “A celebração do presente contrato enquadra-se na situação prevista na alínea f) do n.º 2 do art. 140.º da Lei n.º 7/2009 de 12 de Fevereiro, pelo facto da empresa prever um acréscimo excepcional da actividade, levando à necessidade de reforçar o pessoal para assegurar todos os serviços a efectuar, sem garantias que se prolongue para além desse prazo”.
III – A alínea c) do n.º 2 do art. 390.º do Código do Trabalho de 2009 prossegue um evidente interesse público, sob pena de o trabalhador ficar duplamente ressarcido e de a segurança social ficar injustificadamente desfalcada, sendo, por isso, matéria de conhecimento oficioso, pelo que deve o tribunal determinar na sentença o desconto do eventual subsídio de desemprego auferido no montante devido ao trabalhador e a sua entrega à segurança social.

(Alda Martins)