Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
953/09.3TMBRG.G1
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: FUNDO DE GARANTIA DE ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES
REVISÃO DOS PRESSUPOSTOS
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/17/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário ( elaborado pelo Relator):

I- Conforme decorre da própria letra da lei, o legislador no art. art. 3º, nº 2 e 3 do Decreto-Lei nº 70/2010, para o efeito de aferir a condição de recursos exigível, em sede de verificação dos pressupostos de intervenção do FGADM, elegeu como critério geral “os rendimentos reportados ao ano civil anterior”.

II- Nessa medida, em princípio, seria, também, em face dos valores globais ilíquidos do ano civil anterior que a decisão (anual) de ponderação da manutenção ou cessação da prestação do FGADM devia ser proferida (cfr. art. 9º do Decreto-Lei 164/99, na redacção introduzida pela Lei 64/2012, de 20/12).

III- No entanto, o legislador, no referido nº 3 do art. 3º do Decreto-Lei nº 70/2010, acrescenta que poderá não ser assim se “as instituições gestoras das prestações e dos apoios sociais dispuserem de rendimentos actualizados mais recentes…”, caso em que “… esses rendimentos podem ser tidos em conta para a determinação da condição de recursos…”.

IV- Nesta última situação, importa, porém, atender que, mesmo por força deste critério, apenas se poderá atender àqueles rendimentos (mais) actualizados que tivessem sido auferidos até à data em que a revisão anual da prestação do FGADM tinha que ser efectuada”.
Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. RELATÓRIO.
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Face ao teor do relatório da Segurança Social junto aos autos, a Exma. Magistrada do Ministério Público promoveu “o arquivamento dos presentes autos”, por considerar que os rendimentos ilíquidos do agregado familiar da Requerente e a ponderação do agregado familiar levam a considerar um rendimento per capita de valor superior a 421,32 €.
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Na sequência, o Tribunal de Primeira Instância proferiu a seguinte decisão:

“Face ao exposto, e por terem deixado de subsistir os pressupostos previstos no art. 3º da Lei nº 75/98, de 19.11 e art. 3º do Decreto-Lei nº 164/99, de 13/5, determina-se a cessação do pagamento da prestação alimentar substitutiva ex vi do nº 4 do art. 3º da Lei 75/98, de 19/11”.
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Sucede que a Requerente apresentou novo requerimento, que admitido pelo Tribunal Recorrido, teve como efeito terem sido desenvolvidas novas diligências probatórias no sentido de ultrapassar “as dúvidas” existentes quanto à composição do agregado familiar da Requerente- v. promoção do Ministério Público a fls. 244 e decisão do Tribunal recorrido de fls. 245.
Entretanto, foi junto aos autos novo relatório social da Segurança Social- fls. 246 e ss.
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A Requerente, em face do teor daquele, veio pedir “a renovação do pagamento da prestação de alimentos pelo FGADM…”- fls. 257.
A Exma. Magistrada do Ministério Público, por sua vez, pugnou pela manutenção do despacho de arquivamento.
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Finalmente, foi proferida a seguinte decisão:

“…Mantenham-se os autos arquivados, como promovido. “
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É desta decisão que a Recorrente/Progenitora recorre, concluindo as suas alegações da seguinte forma:

Conclusões:

I- Vem o presente recurso interposto do despacho/sentença proferido no âmbito dos presentes autos sob a referência nº 156907917, datado de 21/02/2018, que manteve os autos arquivados como promovido no despacho sob a referência 155141794, datado de 20/10/2017 por não estarem preenchidos os requisitos para a renovação da atribuição da prestação alimentar substitutiva a pagar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores.
II. Com a qual, salvo o devido respeito, não pode a ora recorrente concordar, por considerar estarem preenchidos os pressupostos legais fundamentais para que tal aconteça.
III. Dispõe o artigo 3º, do DL 169/99 de 13 de Maio, no seu n.º 1, que o FGADM assegura o pagamento das referidas prestações de alimentos quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos não satisfizer as quantias em dívida e o Menor não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre.
IV. O referido Decreto-Lei n.º 70/201 veio redefinir as condições de acesso aos apoios sociais, definindo o conceito de agregado familiar, os rendimentos a considerar e define a capitação dos rendimentos em função da composição dos elementos do agregado familiar, tendo em consideração a existência de economias de escala no seio dos mesmos – cfr. preâmbulo do referido Decreto-Lei.
V. Nos termos do seu artigo 1.º, n.º 2, alínea c), as regras aí previstas são aplicáveis ao pagamento das prestações de alimentos, no âmbito do Fundo de Garantia dos Alimentos a Menores.
VI. Ora, manda o n.º 3 do artigo 2.º deste DL n.º 70/2010 que, na verificação da condição de recursos, sejam considerados os rendimentos do requerente e dos elementos que integram o seu agregado familiar, de acordo com a ponderação referida no artigo 5.º, sendo certo que neste artigo 5.º a ponderação de cada elemento do agregado familiar é efectuada de acordo com a seguinte escala de equivalência: Requerente: 1, por cada indivíduo maior: 0,7, por cada indivíduo menor: 0,5.
VII. Quanto à determinação dos rendimentos a considerar, lê-se no artigo 3º do Decreto-Lei nº 70/2010, de 16 de Junho, que: para «efeitos da verificação da condição de recursos, consideram-se os seguintes rendimentos do requerente e do seu agregado familiar: a) Rendimentos de trabalho dependente; b) Rendimentos empresariais e profissionais; c) Rendimentos de capitais; d) Rendimentos prediais; e) Pensões; f) Prestações sociais; g) Apoios à habitação com carácter de regularidade» (nº 1); mas para «efeitos de atribuição e manutenção de cada prestação ou apoio social, o respectivo valor não é contabilizado como rendimento relevante para a verificação da condição de recursos» (nº 4).
VIII. A definição do que sejam os referidos «rendimentos de trabalho dependente» resulta do art. 6º do Dec-Lei nº 70/2010, de 16 de Junho, onde se lê que serão «os rendimentos anuais ilíquidos como tal considerados nos termos do disposto no Código do Imposto do Rendimento das Pessoas Singulares (Código do IRS), sem prejuízo do disposto no presente decreto-lei».
IX- Ou seja, para efeitos de IRS o respectivo Código considera, e tributa, não só os doze ordenados/salários mensais, mas também o subsídio de férias e o subsídio de Natal (art. 2º, nº 1, nº 2, e nº 3, al. b) do Código de IRS).
X- E, nos termos do nº 2 do art. 3º do Decreto-Lei nº 70/2010, de 16 de Junho, os «rendimentos referidos no número anterior reportam-se ao ano civil anterior ao da data da apresentação do requerimento», isto é, aos 365 dias ou aos 12 meses anteriores.
XI- Isto significa que se incluem nesse valor o obtido durante um ano, incluindo neles os subsídios de férias e de natal.
XII- Considera-se, portanto, que devem os rendimentos anuais ilíquidos do trabalho dependente ser divididos pelos 12 meses do ano, independentemente de naquele montante global estarem ou não englobados os subsídios de férias ou de Natal.
XIII- Assim se pronunciaram o Tribunal da Relação de Coimbra, no seu acórdão datado de 12-07- 2017, processo n.º 92/14.5TBNLS-A.C1, Tribunal da Relação de Guimarães, no seu acórdão datado de 30/11/2017, processo n.º 4360/08.7TBGMR.G1 e o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu acórdão datado de 09.04.2013, processo n.º 1025/09.6TBBRR-A.L1-7, ambos in www.dgsi.pt.
XIV- Ora, considerando que se encontra assente nos autos que o menor vive com a mãe e o rendimento anual ilíquido da Apelante ascende a €7.447,16, aplicado o coeficiente de capitação do artigo 5.º do DL.70/2010 ao agregado familiar da Apelante, em que é atribuído à requerente o peso de 1 na “escala de equivalência” e ao menor o peso de 0,5, resulta que a capitação do agregado familiar do menor é de €7.447,16 a dividir por 12 meses = €620,34 a dividir por 1,5 = €413,73
XV- Sendo, portanto, inferior ao valor de referência legitimador da intervenção do FGADM, que actualmente se encontra fixado em €421,32.
XVI- Pelo que, no entender da aqui Apelante, deve-se revogar a decisão proferida e decidir-se que in casu estão preenchidos os requisitos de atribuição da prestação alimentar substitutiva a pagar pelo FGADM, previstos no artigo n.º 2 da Lei n.º 75/98 e artigo 3.º do DL n.º 164/99, de 13/5.

Nestes termos, deve-se dar provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida decidindo-se pelo deferimento do pedido formulado pela requerente, protegendo o menor Gustavo, por estarem reunidas as condições para accionar o FGADM”.
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Foram apresentadas contra-alegações pela Exma. Magistrada do Ministério Público, onde se defende a improcedência do Recurso.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, a Recorrente coloca a seguinte questão que importa apreciar:

-se (não) estão verificados os pressupostos para a cessação da obrigação substitutiva a cargo do FGAM no pagamento dos alimentos devidos aos menores.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Podem-se considerar provados os seguintes factos (que aqui se especificam por decorrerem dos elementos processuais constantes dos autos):

1. O Menor Gustavo nasceu em … e vive em Portugal com a sua mãe, a quem foi confiada a guarda;
2.O Progenitor incumpre a obrigação de alimentos a que está vinculado por decisão proferida nestes autos em 2010, no valor de 150 € por mês, actualizada nos termos aí fixados, ou seja, em, pelo menos, 3% por ano;
3. A Progenitora exerce a profissão de “costureira qualificada”, tendo auferido os seguintes rendimentos:

- durante o ano de 2016- a quantia global ilíquida de 7.447, 16 € (sete mil quatrocentos e quarenta e sete euros e dezasseis cêntimos);
- nos meses de Janeiro a Abril de 2017, o montante ilíquido mensal de 557€ (quinhentos cinquenta e sete euros);
3. Não é possível o recurso aos mecanismos previstos no art. 189º da OTM (art. 48º do RGPTC) para obter um cumprimento coercivo do pagamento dos alimentos
4. O agregado familiar onde se integra o Menor Gustavo é constituído por ele próprio e pela Progenitora/Recorrente.
5. Por decisão proferida em 2 de Fevereiro de 2015 foi atribuído ao Menor o valor de 150 € (com actualização de 3%), quantia a suportar pelo FGADM.
6. Em Fevereiro de 2016 a Progenitora foi notificada para fazer prova da manutenção dos pressupostos subjacentes à atribuição da pensão de alimentos;
7. Em 10.3.2016 a Progenitora veio juntar a pertinente prova documental.
8. Em 14.4.2016 foi proferida decisão, julgando verificada a manutenção dos pressupostos que estiveram subjacentes à intervenção do FGADM;
9. Em 29.3.2017 veio juntar novamente a pertinente prova documental para o efeito de lhe continuar a ser atribuída a pensão de alimentos pelo FGADM.
10. Foi junto relatório social pela Segurança Social, que concluiu que a capitação média do rendimento do agregado familiar em que o Menor Gustavo se encontra inserido excede o valor de referência legitimador da intervenção do FGADM;
11. Foi proferida a fls. 238 a decisão, datada de 20.10.2017, que concluiu que: “Face ao exposto, e por terem deixado de subsistir os pressupostos previstos no art. 3º da Lei nº 75/98, de 19.11 e art. 3º do Decreto-Lei nº 164/99, de 13/5, determina-se a cessação do pagamento da prestação alimentar substitutiva ex vi do nº 4 do art. 3º da Lei 75/98, de 19/11”.
12. A Requerente apresentou novo requerimento, que admitido pelo Tribunal Recorrido, teve como efeito terem sido desenvolvidas novas diligências probatórias no sentido de ultrapassar “as dúvidas” existentes quanto à composição do agregado familiar da Requerente- v. promoção do Ministério Público a fls. 244 e decisão do Tribunal recorrido de fls. 245.
13. Entretanto, foi junto aos autos novo relatório social da Segurança Social- fls. 246 e ss.
14. Requerente, em face do teor daquele, veio pedir “a renovação do pagamento da prestação de alimentos pelo FGADM…”- fls. 257.
15. Finalmente, foi proferida a seguinte decisão:
“…Mantenham-se os autos arquivados, como promovido. “.
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Fundamentação da matéria de facto

A decisão sobre a matéria de facto teve por base:

- os elementos processuais probatórios constantes dos autos;
- a prova documental relativa à situação pessoal, económica e social do agregado familiar onde se integra o Menor.
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B)- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como supra se referiu, a questão que importa apreciar e decidir consiste em:

-saber se estão verificados os pressupostos para a cessação da obrigação substitutiva a cargo do FGAM no pagamento dos alimentos devidos ao menor.

Conforme decorre das alegações da Recorrente, a única divergência existente resulta da diferente ponderação dos rendimentos que aqui devem ser tidos em consideração para efeitos de apurar a manutenção dos pressupostos da atribuição da obrigação substitutiva colocada a cargo do FGADM.

Segundo a Recorrente, esses rendimentos devem ser aqueles que por si foram auferidos no ano de 2016, ou seja, a quantia global ilíquida de 7.447, 16 € (sete mil, quatrocentos e quarenta e sete euros e dezasseis cêntimos), pelo que estariam verificados os pressupostos de manutenção da atribuição da prestação alimentar substitutiva pelo FGADM.
Segundo o Tribunal Recorrido (aceitando a promoção da Exma. Magistrada do Ministério Público), deve atender-se antes aos rendimentos actuais da Progenitora (ou seja, o montante ilíquido mensal de 557€ (quinhentos cinquenta e sete euros)), pelo que aqueles pressupostos já não estariam preenchidos.
Antes de entrarmos propriamente no cálculo matemático que aqui tem que ser efectuado, importa salientar um ponto que se julga que não pode ser descurado na resolução da presente questão.
É que a decisão de manutenção da prestação substitutiva do FGADM teria que ter sido proferida em Fevereiro de 2017, pois que, tendo a Progenitora que efectuar anualmente a prova dessa manutenção dos requisitos, esse ano concluía-se justamente naquela data, atenta a data em que, por seu turno, havia sido proferida a decisão inicial de concessão desta prestação à Progenitora (Fevereiro de 2015).

Nesta conformidade, e salvo o devido respeito pela opinião contrária, é com referência a esta data que, na altura em que a decisão foi proferida, devia ter sido apreciada a manutenção dos pressupostos de concessão da atribuição desta prestação colocada a cargo do FGADM- ou seja, no final de um ano a contar da data em que foi atribuída esta prestação- mês de Fevereiro de cada ano (sem prejuízo, da eventual relevância da alteração superveniente dos rendimentos que venham ao conhecimento do Tribunal).

É, pois, dentro destes requisitos temporais que a pretensão da Requerente (a comprovação anual da existência dos pressupostos) deve ser apreciada- ou seja, por referência ao mês de Fevereiro de 2017.
Aqui chegados, importa, pois, verificar se, naquela data, a Requerente reunia os pressupostos necessários para continuar a beneficiar da atribuição da prestação substitutiva colocada a cargo do FGADM.
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Como é sabido, mediante a Lei nº 75/98, de 19.11 (com as alterações introduzidas pela Lei nº 66-B/2012, de 31.12), o Estado assumiu a obrigação de garantir o pagamento das prestações alimentares devidas a menores quando o respectivo progenitor o não fizer (art. 1º), sendo que essa garantia de pagamento ficou limitada, nos termos do art. 2º, nº 1 da Lei 75/98 (cfr. art. 3º, nº 5 do Decreto-Lei nº 164/99, de 13.05- entretanto alterado pelo Decreto-Lei nº 70/2010, de 16.06 e pela Lei nº 64/2012, de 20.12) por um tecto máximo mensal de um IAS (que, na data em causa, estava fixado em 421,32 € O Indexante de apoios sociais (IAS) foi criado pela Lei nº 53-B/2006 de 29/12, tendo o seu valor sido fixado para o ano de 2009 em 419,22 € através da Portaria nº 1514/2008, valor que veio a ser alterado em 2017 para o referido valor (Portaria nº 4/2017 de 3 de Janeiro)- sendo actualmente, 428,90 € por força da Portaria nº 21/2018, de 18 de Janeiro de 2018; ), por cada devedor, independentemente do número de filhos menores

Assim, em concreto, refere o art. 3º do Decreto-Lei nº 164/99 que:

1 - O Fundo assegura o pagamento das prestações de alimentos referidas no artigo anterior até ao início do efectivo cumprimento da obrigação quando:
a) a pessoa judicialmente obrigada a prestar não satisfizer as quantias em divida tal obrigação pelas formas previstas no artigo 189º do DL 314/78 de 27 de Outubro;
b) O menor não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre.
2 - Entende-se que o alimentado não beneficia de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, superiores ao valor do IAS, quando a capitação do rendimento do respectivo agregado familiar não seja superior àquele valor.
3 - O agregado familiar, os rendimentos a considerar e a capitação dos rendimentos, referidos no número anterior, são aferidos nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, alterado pela Lei n.º 15/2011, de 3 de maio, e pelos Decretos-Leis nº 113/2011, de 29 de Novembro, e 133/2012, de 27 de Junho.
4 - Para efeitos da capitação do rendimento do agregado familiar do menor, considera-se como requerente o representante legal do menor ou a pessoa a cuja guarda este se encontre.
5 - As prestações a que se refere o n.º 1 são fixadas pelo tribunal e não podem exceder, mensalmente, por cada devedor, o montante de 1 IAS, (…). (1)
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Decorre, pois, deste artigo 3º do decreto-lei 164/99 (na redacção introduzida pela Lei nº 64/2012, de 20/12) que o Fundo assegura o pagamento das prestações de alimentos a menores quando:

- a pessoa judicialmente obrigada a prestá-los não satisfaça tal obrigação pelas formas previstas no artigo 189º da OTM (actual, art. 48º do RGPTC) - é o caso do Progenitor do Menor Gustavo.
- o menor não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, tendo-se em conta a capitação de rendimentos do agregado familiar.

No caso concreto, considerando-se que estariam reunidos estes requisitos, foi proferida a decisão datada de Fevereiro de 2015 que determinou a intervenção do FGADM (Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores).

No entanto, prosseguindo os autos, e já em sede de revisão anual desses pressupostos (na segunda revisão), o Tribunal Recorrido veio a concluir que tais requisitos deixaram de se mostrar preenchidos, pelo que foi proferida a decisão aqui posta em crise que determinou a cessação da intervenção do FGADM.

Para tanto, o Tribunal de Primeira Instância considerou que não se mostrava verificado o segundo requisito atrás mencionado, uma vez que o rendimento mensal do agregado familiar a quem a guarda do menor se encontra atribuída era superior ao valor do IAS.

Não se mostra, assim, questionado o preenchimento dos demais requisitos, uma vez que conforme resulta da matéria de facto provada:

- o Progenitor do menor, judicialmente obrigado a prestar-lhe alimentos, não cumpre tal obrigação;
- por outro lado, resulta demonstrada também a impossibilidade de tornar efectiva a prestação do Progenitor, através dos meios constantes do citado artigo 189 da OTM (actual, art. 48º do RGPTC).

Assim, o único pressuposto que aqui é questionado é apenas o segundo requisito atrás mencionado.
Ora, mesmo neste âmbito, no caso concreto, não se questiona a composição do agregado familiar e, assim, não se questiona o valor da capitação de rendimentos aplicável (que é de 1,50).
E também não se questiona a fórmula como deve ser efectuado o cálculo matemático (rendimentos anuais ilíquidos a dividir por 12 meses, multiplicado pelo coeficiente de capitação de rendimentos) (2).
Como se referiu, a única divergência estabelece-se apenas quanto ao valor que deve ser atendido em termos de rendimentos anuais ilíquidos.

Segundo a Recorrente, esses rendimentos devem ser aqueles que por si foram auferidos no ano de 2016 (ano civil anterior), ou seja, a quantia global ilíquida de 7.447, 16 € (sete mil, quatrocentos e quarenta e sete euros e dezasseis cêntimos), pelo que estariam verificados os pressupostos de manutenção da atribuição da prestação alimentar substitutiva pelo FGADM.

Segundo o Tribunal Recorrido (aceitando a promoção da Exma. Magistrada do Ministério Público), deve atender-se antes aos rendimentos actuais da Progenitora (ou seja, o montante ilíquido mensal de 557€ (quinhentos cinquenta e sete euros) auferido pela Progenitora no ano de 2017), pelo que aqueles pressupostos já não estariam preenchidos.
Ponderados os argumentos, julga-se que a questão que é colocada tem que ser resolvida em função do que atrás afirmámos, ou seja, tendo em conta a data em que a revisão anual da manutenção dos pressupostos teria que ter sido efectuada (Fevereiro de 2017).

Na verdade, nesta sede, o legislador impõe que “ a pessoa que recebe a prestação fica obrigada a renovar anualmente a prova, perante o Tribunal competente, de que mantém os pressupostos subjacentes à sua atribuição” (art. 9º do Decreto-Lei 164/99, na redacção introduzida pela Lei 64/2012, de 20/12).

Ora, para o efeito dessa comprovação, a Progenitora teria que demonstrar que continuavam a estar preenchidos os requisitos que lhe permitiriam manter a atribuição da prestação alimentar colocada a cargo do FGADM.

No que concerne aos rendimentos do agregado familiar teria, pois, a Progenitora de comprovar que os rendimentos auferidos, tendo em conta o agregado familiar e a respectiva capitação, manter-se-iam inferiores ao valor do IAS aplicável, nessa data, ou seja, 421,32 €.

Impõe, de facto, o legislador que estes critérios “… são aferidos nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, alterado pela Lei n.º 15/2011, de 3 de maio, e pelos Decretos-Leis nº 113/2011, de 29 de Novembro, e 133/2012, de 27 de Junho…” (art. 3º, nº 3 do DL nº 164/99).

Ora, prescreve o art. 3º, nº 2 e 3 do citado Decreto-Lei nº 70/2010 o seguinte:

“2- Os rendimentos referidos no número anterior reportam-se ao ano civil anterior ao da data da apresentação do requerimento (3), desde que os meios de prova se encontrem disponíveis, e, quando tal se não verifique, reportam-se ao ano imediatamente anterior àquele, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
3-Sempre que as instituições gestoras das prestações e dos apoios sociais disponham de rendimentos actualizados mais recentes, esses rendimentos podem ser tidos em conta para a determinação da condição de recursos…”.

Assim, conforme decorre da própria letra da lei, o legislador, para esse efeito de aferir a condição de recursos exigível, elegeu como critério geral “os rendimentos reportados ao ano civil anterior”- que, no caso, atenta a data em que foi apresentado o requerimento de comprovação, seria o ano civil de 2016 cujos valores se mostravam disponíveis- v. declaração/liquidação de IRS junta aos autos de onde decorre que a Progenitora auferiu o montante global de 7.447, 16 € (sete mil, quatrocentos e quarenta e sete euros e dezasseis cêntimos).

Nessa medida, em princípio, seria em face desses valores globais ilíquidos do ano civil anterior que a decisão de ponderação da manutenção ou cessação da prestação do FGADM devia ser proferida.

Sucede que o legislador, no referido nº 3, acrescenta que poderá não ser assim se “as instituições gestoras das prestações e dos apoios sociais disponham (dispuserem) de rendimentos actualizados mais recentes…” , caso em que “… esses rendimentos podem ser tidos em conta para a determinação da condição de recursos…”.

Ora, importa atender que, mesmo por força deste critério, apenas se poderia atender àqueles rendimentos (mais) actualizados que tivessem sido auferidos até à data em que a revisão anual da prestação do FGADM tinha que ser efectuada.
Nessa medida, salvo o devido respeito pela opinião contrária, no caso concreto, para este efeito, sabendo-se a que aquela revisão se efectuaria em Fevereiro de 2017 (4), só os rendimentos auferidos no mês de Janeiro de 2017 poderiam aqui ser tidos em conta- tudo sem prejuízo da reponderação futura dos pressupostos tendo em conta os rendimentos superiores que a Requerentes viria a auferir no ano civil seguinte (2017).

Aqui chegados, importa aplicar estas conclusões ao caso concreto, efectuando os respectivos cálculos matemáticos.

Como decorre do exposto, independentemente dos rendimentos terem sido auferidos em 14 meses (como sucede no caso concreto), o cálculo que a lei impõe efectuar implica a divisão dos rendimentos ilíquidos anuais por 12 (doze) e não por 14 (catorze).

No caso concreto, tendo em conta o exposto, poder-se-iam configurar aqui duas hipóteses:

- ou considerar os rendimentos anuais ilíquidos do ano civil anterior (2016)- 7.447, 16 € (sete mil, quatrocentos e quarenta e sete euros e dezasseis cêntimos)- caso em que obteríamos o valor de 413, 73 € (7.447, 16 € a dividir por 12 meses = 620, 34 € a dividir por 1,5 = 413,73 €) inferior ao valor do IAS em vigor.
- ou considerar os rendimentos anuais ilíquidos auferidos entre Fevereiro de 2016 e Janeiro de 2017- de Fevereiro de 2016 a Dezembro de 2016 (retirando o mês de Janeiro de 2016- 530 €; e acrescentando o valor do mês de Janeiro de 2017: 557 €), caso em que obteríamos o valor de (7.474, 16 € a dividir por 12 meses = 622, 84 € a dividir por 1,5 = 415,23 €) de novo inferior ao valor do IAS em vigor .
Ora, em ambos os casos, mesmo tendo em conta os rendimentos mais actualizados (anteriores à data em que a decisão de revisão anual devia ter sido proferida), o valor apurado é inferior ao valor do IAS em vigor à data em causa.

Nesta conformidade, se assim é, dúvidas não restam que, considerando que tais rendimentos mensais não ultrapassam o valor do IAS, este requisito de intervenção do FGADM mostrava-se preenchido à data em que a revisão anual devia ter ocorrido.

Consequentemente, sendo o rendimento per capita do agregado familiar do Menor Gustavo inferior ao valor do IAS (421,32 €), não podia o Tribunal Recorrido declarar cessada a prestação do FGADM, pois que, na data em que a revisão anual devia ter ocorrido, continuavam a verificar-se os pressupostos de atribuição de tal prestação, tendo em conta os rendimentos mensais do agregado familiar onde se integra o menor.
Termos em que se tem que concluir pela procedência do Recurso.
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III- DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar:

-o Recurso interposto pela Recorrente/ Progenitora procedente, pelo que revoga-se a decisão recorrida, e, em consequência, atendendo a que, à data em que a mesma foi proferida, se mostravam verificados os respectivos pressupostos, decide-se manter a prestação determinada a cargo do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores.
Notifique.
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Sem custas.
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Guimarães, 17 de Maio de 2018

Pedro Alexandre Damião e Cunha
Maria João Marques Pinto de Matos
José Alberto Moreira Dias



1. Estabelece a lei que “as prestações são fixadas pelo Tribunal e não podem exceder mensalmente, por cada devedor, o montante de 1 IAS, devendo aquele atender à capacidade económica do agregado familiar, ao montante da prestação de alimentos fixada e às necessidades específicas do menor (artigos 2.º, da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, e 3.º, n.º3, do Decreto-Lei n.º 164/99, de 13 de Maio, na redacção que foi introduzida pela Lei 64/2012) - devendo-se ter em atenção a Jurisprudência fixada no Ac. do STJ de Uniformização de jurisprudência 5/2015 de 19.3.2015 onde se decidiu que: “ Nos termos do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro, e no artigo 3.º n.º 3 do DL n.º 164/99, de 13 de Maio, a prestação a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores não pode ser fixada em montante superior ao da prestação de alimentos a que está vinculado o devedor originário.”; sobre esta e outras questões que têm sido levantadas sobre a intervenção do FGADM, v., por todos, Tomé Ramião, in “ Regime Geral do Processo Tutelar Cível- anotado e comentado- Jurisprudência e legislação conexa”, págs. 178 e ss.;
2. V. quanto a esta questão os acórdãos citados pela Recorrente; e o ac. da RG de 20.10.2016 (de que fui também relator e em que interveio como Juíza Desembargadora Adjunta a aqui também interveniente Juíza Adjunta).
3. Devendo entender-se que a data do requerimento que aqui interessa é a data em que a Progenitora devia ter apresentado o seu requerimento – Fevereiro de 2017- tendo em conta a data em que a decisão inicial foi proferida – Fevereiro de 2015.
4. Eventualmente, poder-se-ia considerar também os meses de Fevereiro e Março de 2017, se se considerasse que a revisão anual só teria que ser efectuada em Abril, a exemplo do que sucedeu no ano de 2016, mas, efectuando os respectivos cálculos, a solução seria a mesma.