Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
| ||
Relator: | FERNANDA SINTRA AMARAL | ||
Descritores: | DECISÃO EM PRAZO RAZOÁVEL CASO JULGADO DEVER DE ACATAMENTO DE DECISÃO DE TRIBUNAL SUPERIOR | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 03/21/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROVIDO | ||
Sumário: | (da responsabilidade da relatora) I. O direito à decisão da causa em prazo razoável, a uma decisão temporalmente adequada ou direito à tempestividade da tutela jurisdicional, aponta para uma tramitação processual adequada e para a razoabilidade do prazo da decisão, no sentido de a tutela jurisdicional ocorrer em tempo útil ou em prazo consentâneo. II. Sendo que a razoabilidade do prazo deverá ser aferida mediante critérios, como a complexidade do processo, o comportamento do recorrente e das diversas autoridades envolvidas no processo, o modo de tratamento do caso pelas autoridades judiciais e administrativas e as consequências da delonga para as partes, entre outros. III. A excepção dilatória de caso julgado pressupõe o confronto de duas acções (uma delas contendo uma decisão já transitada em julgado), e a tríplice identidade entre ambas de sujeitos, de causa de pedir e de pedido; e visa o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, por forma a evitar a repetição de causas. IV. A violação do dever de acatamento de uma decisão anteriormente proferida por um tribunal superior não se verifica, ainda que tenha ocorrido violação do caso julgado material, quando a ordem não acatada foi emanada em processo diferente, só assim se compreendendo o uso da expressão “em via de recurso”, usada, quer no citado art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, quer no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, para enquadrar as decisões proferidas pelos tribunais superiores e as proferidas pelos tribunais inferiores em violação daquelas. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 9ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: I- RELATÓRIO I.1 No âmbito dos autos de inquérito com o n.º 877/22.9TELSB, do Ministério Público da Comarca de Lisboa e a correrem termos (actos jurisdicionais) no TCIC - Juiz 3, Lisboa - Tribunal Central Instrução Criminal, foi proferido, pelo Mmº JIC então em serviço de turno, em 25/07/2023, despacho que ordenou o arresto da totalidade da pensão de reforma do arguido AA, o qual veio a ser, depois, complementado com o despacho datado de 31/07/2023, proferido pelo Mmº JIC então em serviço de turno, em que se determinou que o arresto dos montantes da pensão de reforma abrangeria igualmente os montantes que tenham sido ou venham a ser transferidos da conta do ... ou da ... para outras instituições financeiras relativamente a contas tituladas pelo arguido. » I.2 Recurso da decisão Inconformado com tais despachos, deles interpôs recurso o arguido AA, para este Tribunal da Relação, com os fundamentos expressos na respectiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões [transcrição]: “(…) CONCLUSÕES SEQUÊNCIA A. O Recurso vem interposto do despacho de 25/07/2023, completado por um outro de 31/07/2023, proferido nos autos à margem indicados, que decretou o arresto da totalidade da pensão de reforma do Arguido. B. Todavia, como estes autos foram constituídos a partir de uma certidão extraída do proc. n.º 184/12.5T8LSB, têm de se ter em conta os antecedentes atos de apreensão e arresto dessa mesma pensão de reforma, revogados por acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa, os quais vêm devidamente elencados no capítulo respetivo da motivação do recurso. DA VIOLAÇÃO DO PRICÍPIO DO JUIZ NATURAL C. O Juiz BB terá estado de turno no TCIC nos dias 17 e 18 de julho de 2023. Todavia, esteve impedido de dar sequência à promoção que lhe foi conclusa em 18/07/2023, uma vez que estava a presidir a interrogatórios demorados que tiveram lugar no proc. n.º 405/18.0TELSB (caso …), como o próprio reconhece a fls. 105 deste apenso. D. Estando impedido na situação descrita — o que se terá prolongado até ao dia 25/07/2023 —, o Juiz BB devia ter aberto mão dos autos, a fim de que outro juiz de turno, designadamente o que estivesse escalado para o dia subsequente (19/07), pudesse tramitar estes autos. Porém, o Juiz BB reteve os autos, até estar disponível para o despachar, chamando a si a decisão sobre o arresto num momento em que já não era o juiz de turno. E. O art.º 36.º, n.º 1, da Lei 62/2013, de 26 de agosto (LOSJ) dispõe o seguinte: "Nos tribunais organizam-se turnos para assegurar o serviço que deva ser executado durante as férias judiciais ou quando o serviço o justifique". Daí decorre que o juiz de turno só pode assumir a prática de atos jurisdicionais relativamente ao período em que está de turno, o que obviamente não prejudica que, tendo iniciado a ponderação de um determinado processo e/ou uma diligência no âmbito desse processo, a não possa concluir fora do período do turno, como, de resto, em relação ao Juiz BB, terá acontecido com os atos praticados no chamado caso …. F. O que o juiz de turno não pode é, estando impedido de apreciar um processo que, no turno, lhe é concluso — como o Juiz BB reconhece que estava —, reservá-lo para si (como se fosse coisa sua), para o despachar quando deixar de estar impedido. Os processos estão afetos ao Tribunal e não à pessoa do juiz. G. Quando o Juiz BB verificou que estava impedido de despachar o processo que lhe estava concluso em 18/07/2023, atendendo à sua intervenção no chamado processo …, devia ter formalmente declarado tal impedimento, de forma a que o mesmo fosse despachado por juiz de turno não impedido. Quando tomou conta deste processo de arresto — 7 dias depois de se verificar o impedimento —, o Juiz BB já não era o juiz competente para julgar o arresto. Não era o juiz natural do processo. H. Assim sendo, nessa sua intervenção, ocorre uma nulidade insanável, nos termos do art.º 119.º, al. e), do CPP, o que pode e deve ser declarado em qualquer fase do processo. DA SUBVERSÃO DO ESTADO DE DIREITO I. Por acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023, foi revogado o despacho que decretara o arresto da pensão de reforma do Arguido (ademais proferido depois de ter sido revogado o despacho que ordenara a apreensão dessa mesma pensão de reforma). Não há, em termos substanciais, qualquer facto novo na promoção do arresto que veio a ser decretado em 25/07/2023 relativamente ao arresto que fora decretado em 28/10/2022. J. Do probatório deste novo despacho constam menos factos dos que haviam sido elencados no despacho de 28/10/2022, porque, entretanto, houve a separação de processos, mas, em substância, os factos em causa aquando da prolação do despacho de 25/07/2023 já estavam compreendidos no despacho de 28/10/2022. A factualidade reportada no arresto de 25/07/2023, no que releva, já estava compreendida no âmbito do arresto decretado em 28/10/2022, particularmente o seguinte: i) o alegado pagamento dos salários do Arguido na ..., em montante de cerca de 1,2 milhões de dólares, como contrapartida dos favores efetuados à ... (e indiretamente ao ...); ii) os prejuízos causados pela conduta de AA aos residentes em Portugal, no valor de cerca de 1,2 mil milhões de euros, como consequência do pacto corruptivo firmado. K. Por outro lado, a Relação de Lisboa já decidira não considerar verificado o perigo de dissipação (periculum in mora), uma vez que "está em causa uma prestação periódica e que, portanto, será sempre possível arrestar as futuras, caso essa dissipação comece a ocorrer". L. Não havendo nada de novo em 25/07/2023, relativamente aos factos que já haviam sido objeto de apreciação em 28/10/2022, e não havendo igualmente qualquer facto novo que demonstrasse o perigo de dissipação da pensão de reforma do Arguido, o Juiz de Instrução BB violou ostensivamente o seu dever de acatamento da decisão proferida em via de recurso por um tribunal superior (o acórdão de 25/05/2023), a qual, de acordo com o art.º 4.º, n.º 1, da LOSJ, e bem assim com o art.º 205.º, n.º 2 da CRP, tinha a estrita obrigação de cumprir. E não observou o caso julgado (pelo acórdão de 25/05/2023). M. Tentando justificar o injustificável, o Juiz BB invoca que, no arresto ora decretado, estariam em causa o valor da peita paga pela ... (os seus salários na ...) e os prejuízos causados aos residentes em Portugal no quadro do tratamento dos …, o que não teria sido ponderado no âmbito do arresto precedente. Acontece que a peita e os prejuízos invocados —e os factos a que se reportavam — haviam já sido considerados no despacho de arresto de 28/10/2022, como consta dos segmentos do decisório supra transcritos na motivação do recurso. N. Acresce que o Juiz BB nem sequer se deu ao trabalho de explicar a razão pela qual desconsiderou o segmento do acórdão da Relação de Lisboa que decidira não haver risco de dissipação da pensão de reforma do Arguido, uma vez que se tratava de uma prestação periódica, a qual poderia sempre vir a ser objeto dessa providência, caso no futuro se viesse a verificar a ocorrência da dissipação. O Juiz BB tinha o estrito dever de o ter acatado. O. Há ainda um outro dado inquietante: segundo o Ministério Público e o Juiz de Instrução estão em causa prejuízos causados ao Estado e aos residentes em Portugal no valor de 1,2 mil milhões de euros, o que teria resultado de um pacto corruptivo celebrado entre os co-Arguidos. Porém, nestes autos em que há outros arguidos constituídos — e alegadamente indiciados pela prática dos correspondentes crimes de corrupção ativa —, a ninguém mais foi imposta qualquer medida de garantia patrimonial, o que, numa avaliação objetiva, significa que o alvo é apenas o património do CC. P. Tudo isto é muito triste, indigno e revoltante. Numa apreciação objetiva, considerando a ostensiva aparência dos factos, o ArguidoAA foi objeto de um ato retaliatório e mesquinho. Q. O juiz a quo violou o seu dever de acatamento de uma decisão proferida por um tribunal superior, bem como o caso julgado consubstanciado nesse acórdão da Relação de Lisboa de 23/05/2023. Tal dever de acatamento resulta do art.º 4.º, n.º 1, in fine da LOSJ, bem como do art.º 205.º, n.º 2 da CRP. Por outro lado, o caso julgado decorre do acórdão de 25/07/2023, que julgou insubsistente o arresto da pensão de reforma do Arguido, nada de novo tendo ocorrido nos autos que fizesse ponderar uma situação de facto substancialmente diferente. Daí a ilegalidade do despacho recorrido. R. A decisão recorrida consubstancia ainda um abuso de direito, através do qual o Juiz de Instrução, excedendo os limites impostos pela boa-fé (objetivamente considerados), serviu-se dos seus poderes para subverter o que fora decidido por um tribunal superior. DA INEXISTÊNCIA DE FUMUS BONI JÚRIS S. A promoção de arresto do Ministério Público elenca um arrazoado de factos, mas não convoca quaisquer meios de prova. T. Aquando dos primitivos arresto e apreensão decretados em 25/01/2022 e 23/02/2022, o Ministério Público convocara uma extensa listagem de meios de prova (cfr. págs. 221 a 224 do despacho de 25/01/2022, sob a epígrafe "PROVA"), em que o Juiz BB se terá fundado. Aquando do arresto decretado em 28/10/2022, estávamos perante um reforço do arresto decretado em 25/01/2022 e 23/02/2022, pelo que não tinha de se efetuar uma reapreciação do fumus boni juris. U. Porém, no despacho ora recorrido, estamos perante um processo novo (decorrente da extração de uma certidão do referido proc. n.º 184/12) e um arresto alegadamente requerido com fundamento diferente (muito embora, na realidade, assim não seja), o que não permite que o Ministério Público não tenha de invocar, perante o novo juiz de instrução a quem caiba a decisão de decretar ou não o arresto, os meios de prova em que alicerça o requisito do fumus boni juris, invocação que não foi efetuada. V. Por falta de prova, não pode ser julgado preenchido o requisito do fumus boni juris. É que, na matéria relativa aos … e às aulas lecionadas na ..., o arrazoado do Ministério Público não se funda em prova que sustente o requerido, a qual não foi sequer convocada. DA INEXISTÊNCIA DO PERICULUM IN MORA W. Quanto à verificação do requisito do periculum in mora, a decisão recorrida assenta ainda na existência de um património superior a 3 milhões de euros, de que o Arguido e a sua mulher seriam titulares em contas no estrangeiro, o que funda na correspondência trocada pelo Arguido e sua mulher com advogado …, que o Ministério Público recorta e insere no texto da promoção, que o Juiz de Instrução reproduz. X. Relativamente ao património sedeado em contas no estrangeiro, o Ministério Público socorre-se de um e-mail remetido pelo advogado … DD aos Arguidos AA e EE, com conhecimento aos advogados FF e GG. Não só as ilações que daí se retiram são abusivas e injustificadas, como, e é isso que neste momento releva, estamos perante prova proibida, uma vez que o Ministério Palio e o Juiz de Instrução se serviram de correspondência trocada entre os Arguidos e os seus advogados, o que gera a sua nulidade à luz do que dispõe o art.º 179.º, n.º 2 do CPP. Y. Sobra, assim, o facto de o Arguido ter uma residência arrendada em ..., o que é verdade, um apartamento em ..., o que é verdade, ter filhos no estrangeiro, o que também é verdade, e ter contactos no estrangeiro, o que igualmente é verdade. Daí não se pode é retirar que há um risco de dissipação do património do Arguido quando ele e a mulher têm … prédios em Portugal, que nunca procuraram vender, e de que a única conta bancária que o Arguido tem em Portugal, onde recebia a sua pensão de reforma, nunca ter sido encerrada ou objeto de movimentos suspeitos. Mais: o Arguido até recentemente promoveu importantes melhoramentos na casa onde está domiciliado (..., em ...), como se retira do requerimento da ... e documentos anexos, apresentado em 22/04/2022 no proc. n.º 184/12. Z. Finalmente, e decisivamente, porque, como já decidido pelo acórdão da Relação de 25/05/2023, estamos perante uma prestação periódica (a pensão de reforma), a qual sempre poderia vir a ser objeto desta providência, caso no futuro se viesse a verificar a ocorrência de uma qualquer dissipação. Não há, pois, periculum in mora. Termos em que o recurso deve ser julgado procedente, revogando-se o despacho de arresto de 25/07/2023, completado pelo despacho de 31/07/2023, com as legais consequências. (…)” » O recurso foi admitido nos termos do despacho proferido em 07/12/2023 – refª Citius nº 8652771 (apenso de procedimento cautelar – Arresto), o qual foi a subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo » I.3 Resposta ao recurso Efectuada a legal notificação, o Digno Magistrado do Ministério Público respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência, nos termos seguintes [transcrição]: “ (…) Ponto II No que concerne à alegada, mas inexistente, violação do princípio do juiz natural, cumpre afirmar, desde logo e como resulta à saciedade do próprio recurso, que o Mmo. JIC não se apropriou do inquérito: este foi-lhe distribuído regularmente em turno (circunstância que o arguido recorrente não coloca em causa), tendo o despachado assim que lhe foi possível. A invocação do impedimento por parte do Mmo. JIC destinava-se, tão-somente, a justificar a demora na prolação da decisão, não tendo naturalmente como consequência a obrigatória apresentação destes autos a outro/a Mmo/a Juiz/a de Turno. O Mmo. JIC poderia eventualmente ter colocado essa hipótese ao Exmo. Sr. Juiz Coordenador do TCIC mas, ao não tê-lo feito, não só não cometeu qualquer irregularidade e muito menos qualquer nulidade como, sobretudo, revelou enorme respeito pelo trabalho dos seus Mmos. Colegas de turno, os quais ficariam ainda mais assoberbados caso tivessem de despachar um processo de excecional complexidade que havia calhado em sorte a um outro Colega (quem, como nós, assegura serviço de turno tem bem essa noção). É curioso que, para arguir uma nulidade, o arguido reclame maior celeridade na apreciação de uma nova promoção de arresto da sua pensão de reforma, o que apenas faz, naturalmente, pelo facto da douta decisão de que ora recorre ser contrária aos seus interesses. O Ministério Público, e não o arguido recorrente, é que dispunha de legitimidade ¬para, em função dessa demora, requerer a apreciação mais rápida, ou eventualmente, até por outro Mmo. JIC de um turno subsequente. O que poderia vir a nem se revelar mais rápido, mas menos. Não temos como saber. Ponto III No que concerne à alegada, mas também inexistente, subversão do Estado de Direito e violação do dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores, importa relembrar que, numa situação idêntica (ocorrida no âmbito do inquérito 184/12 em que, na sequência de promoção do MP, primeiro apreendeu e posteriormente arrestou os montantes da pensão de reforma do arguido recorrente AA), "o processo de averiguações ao Sr. Juiz BB foi arquivado por se ter considerado que não foi praticada qualquer infração disciplinar", referiu o CSM em resposta à ..., descartando qualquer ligação do arquivamento à aplicação da lei da amnistia aprovada no âmbito da Jornada Mundial da Juventude." Esse processo nasceu duma "certidão recebida pelo CSM, confirmada pelo organismo de gestão e disciplina dos juízes em 07 de junho, com base num acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) no qual os juízes desembargadores mandaram devolver a pensão de reforma de … euros ao … AA, que havia sido arrestada por despacho do juiz do TCIC. "A situação participada justifica uma averiguação no quadro do disposto no art.º 123. º-A do Estatuto dos Magistrados Judiciais, com vista a aferir se esta conduta é suscetível de constituir infração disciplinar", referiu então fonte oficial do CSM, acrescentando que "foi nomeado um inspetor judicial para este processo de averiguações, que se já se encontra a decorrer". Na participação que foi enviada pelo TRL era reportada uma "situação que pode constituir violação do '(..) dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores' (...) relativamente ao Sr. Juiz de Direito BB"." https://expresso.pt/sociedade/justica/2023-09-12-Conselho-Superior-da-Maqistratura-arquiva-processo-de-averiguacoes-a-BB-9447d089 Donde, por identidade de razões com o decidido pelo CSM, também neste âmbito é de reconhecer a inexistência da violação de qualquer dever do Mmo. JIC e, naturalmente, muito menos de subversão do Estado de Direito. Apesar de, concede-se, a alusão ao patrocínio da ... pela ... e ao pagamento com esse montante dos respetivos salários do arguido AA poder, aparentemente, ser considerado integrado no âmbito da promoção de arresto do 184/12 e na decisão do Mmo. JIC que o decretou (posteriormente revogada), a verdade é que o montante de €5.000.000,00 (o único que se pode considerar, conclusão que não é prejudicada pela alusão a montante superior a cinco milhões, pois a adequação do arresto só pode aferir se por referência a valores exatos) se atinge apenas com transferências do .../... para a esfera patrimonial do casal AA e EE (ambos arguidos no 184/12), a saber (segmento da promoção do MP): "No período em que exerceu as funções de ministro da Economia, o arguido AA (e a arguida EE) recebeu indevidamente do ..., pelo menos, cerca de €1.265.000,00 (51 meses x 15.000 + €500.000,00 em maio de 2005), a que acresce o valor mensal de €15.000,00 euros que também recebeu durante o período em que presidiu à ... à ... (cerca de um ano, logo €180.000,00) e até junho de 2012 (igualmente em execução do pacto criminoso celebrado por si com o arguido HH, com conhecimento e adesão da arguida EE), num total de cerca de DOIS MILHÕES DE EUROS. Como ... do ... o arguido AA recebeu indevidamente (pois tal somente ocorreu na sequência do acordo com o arguido HH para beneficiar o .../... enquanto ministro), entre junho de 2010 e dezembro de 2014, um salário mensal de €39.000,00, ou seja, 227 mil euros por cada reunião do respetivo ..., no total de €2.496.649,00. A somar a isto temos os montantes, acima de €200.000,00, recebidos pela arguida EE do ...através de cheques de compensação, que a mesma, com a ajuda do seu II. Mandatário, alegou ter origem em conta do BPES do seu marido, o arguido AA (o que desde logo deita por terra a ideia, que tentou criar desde praticamente o início, da separação financeira entre si e o seu marido). No cômputo do produto global do crime é de incluir, igualmente, os salários mensais da arguida EE como curadora da colação ..., cerca de €7.000,00 mensais, o qual continuamos a considerar fortemente indiciado resultarem do acordo do arguido AA com o arguido HH. Só durante o período em que o seu marido foi ministro da Economia a arguida recebeu a esse título um valor global superior a €300.000,00." Além disso, dada a disparidade de valores, é inequívoco que na promoção de arresto do 184/12 não se contabilizou o prejuízo de várias centenas de milhões de euros para consumidores portugueses de energia com as decisões do arguido AA no dossiê … da .... Como nos parece evidente, uma coisa é invocar os montantes dos produtos do crime e prejuízos para terceiros dessa conduta, outra é promover o arresto para garantia dos pagamentos de apenas alguns montantes, cabendo ao MP, em primeiro lugar, delimitar o âmbito desse arresto (sendo sua legítima opção não querer abranger tudo de uma só vez). E foi isso que ocorreu no inquérito 184/12, ao decidir não se contabilizar na promoção de arresto os mais de mil milhões de euros de prejuízos da suficientemente indiciada atuação do arguido AA. Se assim fosse, não se teria invocado na promoção de arresto o valor de referência de "apenas" cinco milhões de euros (adequado ao património cujo arresto se pretendia) mas o de mais de mil milhões de euros (relativos a decisões do arguido AA no dossiê … da ...). A dimensão desses prejuízos arreda, desde logo, um dos obstáculos ao arresto da pensão de reforma do arguido AA constante do Acórdão do TRL que o revogou: a demonstração da insuficiência dos bens do arguido AA para fazer face aos mesmos, sendo evidente que tal ocorre. Em suma, a douta decisão ora em crise, também neste segmento, não violou o douto Acórdão do TRL que revogou o arresto da pensão de reforma do arguido AA no processo 184/12. Ponto IV do recurso No que concerne à alegada "inexistência de fumus boni juris" e à não indicação de prova para suportar a decisão, é de notar que, logo no início da promoção (e não no fim, como na anterior), o Ministério Público alude à mesma, ao determinar o seu envio ao TCIC em conjunto com a promoção (a única, logo não poderia ser prova de mais nada), a saber: "certidão de cópia do inquérito n.º 184/12.5TELSB, o apenso referido no número anterior [cópia integral dos seguintes volumes da certidão digital do NUIPC 184/12.5TELSB: 11º a 13º, 16º, 20º, 24º a 27º, 29º, 31º a 33º, 38º, 46º, 56º, 62º], os apensos em papel 9, 11 e 24 (...) das buscas à ..., os acórdãos do TRL de 19/04/2002 e de 11 e 13/10/2022, os relatórios de pesquisas informáticas indicados nas notas de rodapé". Aliás, em total contradição com o que alega a este respeito, o próprio requerente vem arguir a nulidade de uma dessas provas especificamente indicadas, a documentação trocada com advogados espanhóis. A verdade é que só se pode arguir a nulidade de prova... especificada e usada pelo Ministério Público e, ademais, conhecida (como foi) pelo arguido. Para além disso, o arguido recorrente olvida, ou pretende olvidar, que na enunciação da factualidade se indica, por diversas vezes, prova concreta, por exemplo inserindo vários recortes de e-mails, conforme segue: (… emails escritos em língua estrangeira, que, por isso, aqui não se transcreve – art.º 92º, nº 1 do CPP) (...) 1 Cfr. RELATÓRIO DE ANÁLISE DE EXAME DIGITAL FORENSE — II 51/2022 -EXAME 104/2022 que ora também se envia, referente ao do equipamento n.º 1 / Computador Portátil Apple A1466 s/n: GCCXM1ZEJ1WK, (Relatório de Pesquisa Informática n.º … / 2º Fase - 14/06/2022), que se encontrava no domínio do arguido AA, com o ID…. (…) "716. No dia 29/09/2009, JJ reenviou ao reitor da ... KK um e-mail que o arguido AA lhe tinha enviado dizendo, entre o mais, que a ... (do ...) estava disponível para financiar a ... se ele estivesse envolvido no desenvolvimento dum programa relacionado com energia e que apenas uma pequena parte do dinheiro do financiamento seria para pagar os seus salários: (…) De todo o modo, tal especificação de prova seria, a nosso modesto ver, totalmente desnecessária porquanto o Tribunal da Relação de Lisboa, por douto Acórdão de 19/04/2022 (proferido no ãmbito do processo 184/12, do qual foi extraída a certidão que deu origem ao presente, e que também vale nestes autos), deu por "indiciariamente demonstrada" a prática de crime de corrupção do arguido recorrente AA na sequência de acordo com os arguidos LL e MM: Finalmente, a comparticipação num esquema fraudulento de subsidiação da ... à ida do arguido AA pala a ..., como contrapartida de vantagens, está indiciariamente demonstrada pela troca de mails entre a recorrente e responsáveis da Universidade, do que resulta a disponibilidade do co-arguido para investir, via ..., em projectos daquela Universidade. Resulta indiciariamente demonstrado que a ida do arguido para Nova forque foi a expensas da ..., da qual o ... era acionista qualificado, com o patrocínio via ... à ... com a condição de contratarem o arguido AA como .... Decai este fundamento do recurso. Embora não seja argumento jurídico, não se pode deixar de repudiar a afirmação, falsa, de que o MP não indicou prova porque esperava que a promoção calhasse ao anterior Mmo. JIC. Tal afirmação é ultrajante para o MP. O MP respeita todo/as o/as Mmo/as. JIC e não espera nem tem de esperar que uma promoção seja distribuída a um ou outro. Que melhor desmentido dessa afirmação do arguido recorrente do que nova enunciação de mais de 700 (setecentos) artigos de matéria fatual na promoção de arresto? Ademais, o inquérito e a promoção de arresto seguiram para o TCIC antes das férias judiciais, podendo ser distribuído então qualquer um/a dos sete JIC que o integravam à data, sete salvo erro. Ponto v do recurso No que concerne à alegada "inexistência do periculum in mora", é de relembrar que o arguido se mantém sujeito a OPHVE à ordem do processo 184/12, no âmbito do qual, por douto Acórdão de 19/04/2022, o TRL considerou existir perigo de fuga: (…) Improcede este segmento de recurso. Há perigo de fuga. A nosso ver, por maioria de razão, um perigo de fuga que justifica uma OPHVE tem subjacente, naturalmente, um perigo muito superior de dissipação do património, visto que o arguido recorrente pode, em segundos, a partir da residência onde se encontra sujeito a essa medida de coação ordenar, desde logo através do seu telemóvel (como qualquer um de nós), a transferência de quaisquer montantes para o estrangeiro, onde possui contas bancárias, a somar ao profundo conhecimento que detém do sistema financeiro mundial que lhe foi permitindo criar diversas offshores ao longo da vida e ali ocultar e acumular riqueza de proveniência ilícita. É razoável esperar que o arguido recorrente acumule os montantes mensais da pensão de reforma e os devolva caso venha a ser condenado a pagar os prejuízos astronómicos que causou aos consumidores portugueses de energia (e os montantes relativos aos salários que recebeu da ... ao abrigo do patrocínio da ... por ordem do arguido LL e MM)? Aliás, a maior parte dos montantes da pensão de reforma que tinham sido antes arrestados já não se encontravam, à data do novo arresto, na conta onde o arguido recorrente os recebeu, pelo que a dissipação não é "apenas" um perigo, mas um facto. Qualquer montante da pensão de reforma do arguido AA para si transferido é irrecuperável, justificando-se plenamente a manutenção do arresto. No âmbito deste recurso, o arguido recorrente arguiu ainda a nulidade de um e-mail junto aos autos (do qual decorre a prova de que o arguido possui no exterior património superior, no mínimo, a milhão e meio de euros, pois a sua valiosa coleção de fotografia não entrou nesse cômputo) com fundamento de se tratar de correspondência com advogados. Tal arguição de nulidade foi apreciada na decisão instrutória do 184/12, tendo a Mma. JIC arredado a mesma (doutamente destrinçando a correspondência trocada entre arguido e defensor da trocada com outros advogados), nos seguintes termos, a que naturalmente aderimos: D. Da prova ilícita — correspondência com advogados (requerimento de abertura de instrução de AA) No seu requerimento de abertura de instrução, ponto III, o arguido reproduz o requerimento que já havia apresentado aos autos em fls. 30594 a 30604, de 01-02-2023, volume 90, invocando que foram apreendidas, em 03-11-2022, comunicações electrónicas entre o arguido e os seus advogados, tendo o Juiz de Instrução Criminal da fase inquérito determinado a sua junção aos autos por despacho de 11-10-2022. Alega que a correspondência em causa, trocada entre arguido e defensor, e entre os meses de Março e Outubro de 2022, não podia ter sido junta aos autos, pois foi-o em violação do disposto nos artigos 76.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, a par dos artigos 32.º, 1, 34.º, 208.º da Constituição da República Portuguesa, e 179.º, n.º 2, do Código de Processo Penal. Avança, ademais, que foram também apreendidas e validadas por JIC outras correspondências electrónicas entre o arguido e o advogado, mormente aquelas em que também participaram advogados fiscalistas espanhóis e advogados portugueses do escritório ... (exame digital forense 329/2022 do ..., validados em 06-12-2022, fls. 28241 a 28242); correspondência com os advogados DD, NN e GG (buscas de 23-02-2022, exame digital forense 133/2022, validado em 14-10-2022, fls. 28240 a 28247). Tais mensagens, preconiza, estão sujeitas a sigilo profissional, e os advogados identificam-se nessa qualidade. Pugna, por isso, que seja declarada nula a prova em causa, ao abrigo do citado artigo 179.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, mormente aquela que entregou como documento 2, junto com o requerimento sobredito (de fls. 30594 a 30604, volume 90), sendo os ficheiros de destruir na presença do arguido. Cumpre apreciar e decidir. O artigo 179.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, dita que «é proibida, sob pena de nulidade, a apreensão c qualquer outra forma de controlo da correspondência entre o arguido e o seu defensor, salvo se o juiz tiver fundadas razões para crer que aquela constitui objecto ou elemento de um crime». O conceito de defensor, para a lei penal, interpreta-se por referência aos artigos 62.º e seguintes do Código de Processo Penal, e não se confunde, por tal, com o conceito genérico de advogado. Os advogados DD, FF, OO, GG, NN, PP, QQ, e RR, não são defensores do arguido AA, nem da arguida EE, pois não têm procuração nos autos (nem há notícia de que assumam esse papel noutro processo crime conexo, nem o arguido o invocou), pelo que não há limitação à apreensão da correspondência ao abrigo do citado artigo 179.", n.º 2, do Código de Processo Penal. Não tendo a busca incidido sobre escritório desses mesmos advogados, não tem aplicação os artigos 75º e 76.º do BOA. Quanto aos demais e-mails, mormente os relativos a comunicações com outros advogados que não são defensores, nem de AA, nem de EE, tendo os mesmos sido encontrados como fruto de correspondência a palavras-chave que não são estranhas à investigação, assumindo relevância para a mesma, e não tendo sido apreendidos em busca a escritório de advogado ou que visasse advogados, não beneficiam da protecção dos artigos 113.º, 75.º, e 76.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, nem do artigo 179.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, por remissão da 17.º da Lel do Cibercrime, pelo que se julga não verificada a nulidade da sua apreensão, devendo os mesmos ficar nos autos, e nada impondo que se tenham por não escritas as passagens da acusação, ou outras peças processuais, que os reproduzam. Termos em que se requer que o presente recurso seja julgado totalmente improcedente e, em consequência, seja o aludido douto despacho a quo mantido nos seus exatos termos. ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA! (…)” » I.4 Parecer do Ministério Público Remetidos os autos a este Tribunal da Relação, nesta instância a Exmª. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso, acompanhando a resposta apresentada pelo Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido. » I.5 Resposta Tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foi apresentada resposta ao sobredito parecer, pelo arguido, que, em síntese, renovou todas as considerações já tecidas na sua peça recursiva, acrescentando o seguinte, que se transcreve: “(…) b) Justifica-se, no entanto, em face da resposta do Ministério Público, aditar mais duas especificações relevantes para o efeito em pauta; c) Em primeiro lugar, e quanto ao fumus boni juris, ao contrário do que consta de fls. 7 e ss. da resposta do Ministério Público, não é verdade que o Ministério Público ou o Juiz de Instrução tenham elencado os elementos de prova em que fundaram o pedido de arresto e a respetiva decisão, como consta dos documentos que foram notificados ao Arguido por carta registada de 19/10/2023; d) A evidência das coisas fala por si; não vale a pena vir agora convocar o que não foi oportunamente convocado; e) Em segundo lugar, e quanto à inobservância do segmento do acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023, em que foi declarado não ocorrer periculum in mora, uma vez que "está em causa uma prestação periódica e que, portanto, será sempre possível arrestar as futuras, caso essa dissipação comece a ocorrer" — o que é relevante para a argumentação invocada nas conclusões K) e Z) do recurso interposto —, regista-se que se trata de matéria à qual o Ministério Público nem responde; E não responde porque o Ministério Público certamente tem consciência de que tal matéria já fora decidida de forma desfavorável à sua pretensão — pelo acórdão de 25/05/2023, o qual não foi acatado, pelo menos nesse segmento, pelo despacho recorrido. Termos em que o recurso deve ser julgado procedente. (…)” » I.6 Concluído o exame preliminar, prosseguiram os autos, após os vistos, para julgamento do recurso em conferência, nos termos do artigo 419.º do Código de Processo Penal. Cumpre, agora, apreciar e decidir. » II- FUNDAMENTAÇÃO II.1- Poderes de cognição do tribunal ad quem e delimitação do objeto do recurso: Conforme decorre do disposto no n.º 1 do art.º 412.º do Código de Processo Penal, bem como da jurisprudência pacífica e constante [designadamente, do STJ1], e da doutrina2, são as conclusões apresentadas pelo recorrente que definem e delimitam o âmbito do recurso e, consequentemente, os poderes de cognição do Tribunal ad quem, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso a que alude o artigo 410º, nº 2, do Código de Processo Penal3, relativas a vícios que devem resultar directamente do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, a nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito), ou quanto a nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do C.P.P.). » II.2- Apreciação do recurso Face às conclusões extraídas pelo arguido recorrente da motivação do recurso interposto nestes autos, as questões decidendas a apreciar são as seguintes: - se o Mmº JIC, verificando que estava impedido de despachar o processo que lhe estava concluso em 18/07/2023, deveria ter formalmente declarado tal impedimento, de forma a que o mesmo fosse despachado por outro juiz de turno não impedido, de tal forma que, quando proferiu o despacho datado de 25/07/2023, já não era o juiz competente para julgar o arresto, por não ser o juiz natural do processo, ocorrendo, assim, uma nulidade insanável, nos termos do art.º 119º, al. e), do CPP; - se o Mmº JIC, que proferiu o despacho datado de 25/07/2023, violou o caso julgado, decorrente do acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023, proferido no âmbito do P. 184/12.5TELSB-W, que veio a ser separado, dando origem aos autos principais a que respeita o presente apenso de arresto; e, bem assim, o seu dever de acatamento de uma decisão anteriormente proferida por um tribunal superior; - se tal despacho consubstancia ainda um abuso de direito, através do qual o Mmº JIC, excedendo os limites impostos pela boa-fé (objectivamente considerados), serviu-se dos seus poderes para subverter o que fora decidido por um tribunal superior; - se, relativamente ao despacho que decretou o arresto, datado de 25/07/2023, não se encontra preenchido o requisito do fumus boni juris, não se tendo o Ministério Público, na matéria relativa aos … e às aulas leccionadas na ..., fundado em prova que sustentasse o requerido, a qual não foi sequer convocada; - se, tal como já anteriormente decidido pelo acórdão da Relação de Lisboa, de 25/05/2023, não se verifica o requisito do periculum in mora, com os fundamentos ali vertidos (que se prendem com a natureza periódica da prestação de reforma) e, bem assim, se a prova apresentada pelo Ministério Público, para justificar o mesmo, consubstanciada no e-mail remetido pelo advogado … DD ao arguido AA e sua mulher, com conhecimento aos advogados FF e GG, constitui prova proibida, uma vez que se trata de correspondência trocada entre os arguidos e os seus advogados, o que gera a sua nulidade à luz do que dispõe o art.º 179.º, n.º 2 do CPP. Vejamos. II.3 - Da decisão recorrida Foram estes os despachos proferidos pelo Tribunal de instrução criminal, alvos do presente recurso [transcrição]: Despacho datado de 25/07/2023 [com transcrição apenas dos segmentos relevantes, circunscritos à parte da apreciação e decisão do Mmº JIC, o que apenas se inicia depois de uma inicial reprodução do requerimento do Ministério Público, que vai do ponto 1) ao ponto 776)]: “ (…) Corroboramos o entendimento do detentor da acção penal de que o actual estado da investigação permite a conclusão de que se mostra suficientemente indiciada a factualidade descrita na petição supra transcrita e que considero dada como provada, em face dos elementos de prova já carreados para os autos, que escrutinei. Indiciam fortemente os autos a prática pelo arguido AA de, entre outros, um crime de corrupção passiva para ato ilícito de titular de cargo político (arts. 16º n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, na versão vigente à data dos factos), relativamente a decisões tomadas a favor da ... em concretização do pacto firmado com os arguidos LL e MM, conforme decorre da factualidade supra transcrita. Resulta igualmente fortemente indiciado que o produto global da corrupção do arguido AA pelos arguidos LL e MM, supera um milhão de euros (patrocínio da ... à ... para assegurar a contratação do primeiro como respectivo docente e pagamento dos respectivos salários). Corrobora-se o entendimento sancionado pelo titular da acção penal de que, em resultado da prática dos factos imputados ao arguido AA (considerados fortemente indiciados no douto despacho que determinou a sua sujeição a OPHVE no NUIPC 184/12 e que o arguido optou por não colocar em causa no respetivo recurso para o TRL, cfr. resulta dos acórdãos do TRL de 19/04/2002 e de 15/12/2022, cujo teor se dá aqui reproduzido por economia processual), este terá causado aos cidadãos residentes em Portugal um prejuízo de 1,2 mil milhões de euros, bem como uma distorção da concorrência, nomeadamente ao criar as condições para a ... manipular a oferta dos serviços de sistema entre 2009 e 2013 (que a ... - estimou em 140 milhões de euros 4), com consequências ainda bem nefastas para o sistema elétrico nacional. Igualmente se concorda com o titular da acção penal quando aduz que, para além destas consequências, o ex-ministro conseguiu um enriquecimento ilegítimo da ..., via ..., pois o arguido AA recebeu indevidamente, entre 2010 e 2014 (sem esse patrocínio não teria sido chamado a dar ali aulas) o valor de, pelo menos, USD$137.973,00 anuais (no total de USD$689.865,00, cf. documento de fls. 22 do apenso de busca à ... n.º 24), sendo de contabilizar também, neste âmbito, o valor total daquele patrocínio da ... a ... (USD$300.000,00 anuais, logo USD$1.200.00,00 entre 2010 e 2014). Verifica-se que, no dia 09/09/2019, o câmbio USD/Euro era de 0,90646, logo o correspondente valor dos salários entre 2010 e 2014 é €620.878,00. Atente-se no e-mail de 15/07/20155 que se logrou encontrar posteriormente à sujeição do arguido AA a OPVHE no âmbito do NUIPC 184/12, no qual esse arguido assume que foi ele a indicar o arguido LL para a ... ("LL was appointed by me to ..."): (… email escrito em língua estrangeira, que, por isso, aqui não se transcreve – art.º 92º, nº 1 do CPP) Como bem refere o titular da acção penal, o arguido AA não só residia, até à aplicação das medidas de coação no âmbito do processo 184/12.5TELSB (do qual foi extraída a certidão que originou a instauração do presente), fora de Portugal (indicaram uma morada de um apartamento arrendado em ...), como têm diversos filhos no estrangeiro (... e ...), um apartamento em ... (adquirido por cerca de um milhão de dólares em 2010 e que hoje valerá bastante mais) e contactos, pelo menos, nesses países e na .... Por outro lado, verifica-se que o RERT III, ao qual o arguido aderiu em 2012, não implicou a transferência de capitais detidos no estrangeiro para Portugal, sendo que continuam por arrestar o apartamento de ... (adquirido em 2010 por cerca de um milhão de dólares) e por apreender fundos pecuniários em contas no estrangeiro. Com efeito, como aduzido pelo detentor da acção penal, no final de março de 2021, o arguido AA e a sua mulher EE contabilizavam como seu o seguinte património (cfr. e-mail de 30/03/2021 que acompanha esta promoção 6, cuja junção aos NUIPC 184/12 foi determinada pelo Mmo. JIC no dia 14/10/2022, fls. 28245/7 — vol. 83), superior a três milhões e seiscentos mil euros (sem contar com a sua coleção de fotografia), não sendo minimamente crível que o tenham desbaratado em cerca de dois anos: (… email escrito em língua estrangeira, que, por isso, aqui não se transcreve – art.º 92º, nº 1 do CPP) Ou seja, verifica-se que, nessa data os arguidos AA e EE detinham um património superior a €3.500.000,00, isto sem contar com diversas fotografias da sua coleção 7. Como bem refere o titular da acção penal, nada leva a crer que esse património financeiro tenha, entretanto, diminuído, como também não diminuiu desde 2018: Documento excel denominado "Workbook4" U Propriedades de Workbook4 Geral Segurança Detalhes Versões anteriores Propriedade Valor Descrição Título Assunto Etiquetas Categorias Comentários Origem Autores AA Última gravação por AA Número de revisão Número da versão Nome do programa Microsoft Macintosh Excel Empresa Gestor Conteúdo criado 18/12/2017 20:26 Data da última gravação 1B/12/2017 20:44 Última impressão Remover Propriedades e Informações OK Cancelar Saldos Moeda furos (.85) ... 1129000 U$ Imposto a receber 220000 U$ Capital One 19000 U$ Total 1 368 000,00 1 162 800,00 Saldo Pilarjardim 2176000 Euros Imposto IRC (-) 211000 Euros Total 1 965 000,00 Euros Grande total Euros 3 127 800,00 (…) Como é documentado pela seguinte informação constante do computador pessoal de AA encontrado durante a última busca em final de 2022: 5. Atualmente,, tenho as contas seguintes: a. ..., saldo de 1,1 M$+ 230 m$ em divida a receber do fisco americano b. Pilarjardjm, saldo de cerca de 1.8 ME (após pagamento de impostos) proveniente da venda da nossa casa em Lisboa c. ... saldo de 18 m$ para despesas correntes d. ..., saldo de 7 m E para despesas correntes em ... e. ..., saldo de 190, 000 Y proveniente das aulas e conferencias que dou na ... Como referido pelo titular da acção penal, os limites previstos no art.º 738º do CPC apenas se aplicam aos casos em que o visado pelos arrestos ou apreensões não disponha de outras fontes de rendimento (por exemplo, prediais e financeiros) para sua subsistência. Ora, como aduzido pelo titular da acção penal, não só o arguido poderá arrendar os apartamentos de que é proprietário em Portugal e ... (este último nem sequer arrestado) como, por outro lado, receberá rendimentos das aplicações e produtos financeiros que mantém no estrangeiro (outrossim não apreendidos e que poderá desmobilizar para prover à sua subsistência por um longo período de tempo). Caso contrário permitir-se-ia ilegitimamente o gozo de um benefício excecional a quem do mesmo manifestamente não precisa, com prejuízo para o ressarcimento do Estado dos prejuízos decorrentes das condutas criminosas do arguido indiciadas fortemente nos autos. Concorda-se com o titular da acção penal quando aduz que, mesmo estando a entidade pagadora (...) da pensão de reforma do arguido AA domiciliada em Portugal, impõe-se desde já o respetivo arresto (integral), visto que, não obstante o seu elevado valor (cerca de €17.000,008), apenas ao fim de quase três décadas se atingirá, com tal medida, o valor global do produto dos crimes fortemente indiciados nos autos (mais de cinco milhões de ouros), sendo que, relativamente aos prejuízos causados enquanto Ministro da Economia será sempre uma "gota no oceano". Igualmente se corrobora o entendimento sancionado pelo detentor da acção penal de que, caso a pensão de reforma do arguido AA não seja de imediato arrestada, poderá o mesmo, com elevada probabilidade (por ser novamente fácil pressupor essa intenção da Justiça), transferir o respetivo montante para sociedades localizadas no estrangeiro (offshores) cujo controlo por si será mais difícil de comprovar pela investigação (como já aliás ocorreu, pois a avença mensal do ... paga enquanto o arguido AA era Ministro da Economia foi transferida para a ... e SS, e constituiu a ... nos ... para aí receber cerca de um milhão de euros dessa avença e comprar um apartamento em ...), sendo assim evidente e concreto o perigo de dissipação dos montantes da pensão de reforma recebida em Portugal. Somos a concordar que no âmbito deste novo inquérito não há que atender às apreensões e arrestos decretados no processo 184/12.5TELSB, pois o objeto é diferente — tendo a ver com a sua atuação relativa ao dossier ... (o fim dos … e a transição para os …) — e, adiante-se, os valores que resultam dos factos criminosos são muitíssimo mais elevados. Também é do meu conhecimento funcional de que os bens e saldos de contas já arrestados e apreendidos no processo 184/12.5TELSB não atingem o valor global do produto dos crimes e, muito menos, o dos prejuízos causados com a atuação do arguido AA enquanto …. Atentei no aduzido pelo titular da acção penal de que a fls. 47 do acórdão do TRL de 25/05/2023 (Processo 184/12.5TELSB), que determinou a revogação do arresto da pensão de reforma, admite-se o decretamento do mesmo (nesses autos e apenas com esses factos relativos ao dossiê .../...) caso se comprove que o valor dos bens é insuficiente para cobrir o montante total do produto dos crimes (e naturalmente, aditamos nós, dos prejuízos causados com os atos criminosos, melhor especificados adiante, para as quais se remete por economia processual). Refere esse douto aresto: Ora, o despacho recorrido não refere o valor de mercado do património já arrestado e, por isso, não se pode concluir que seja insuficiente para garantir os referidos 05.000.000,00. Quanto ao perigo de dissipação, importa ter em conta que está em causa uma prestação periódica e que, portanto, será sempre possível arrestar as futuras, caso essa dissipação comece a ocorrer. Contudo, como bem refere o titular da acção penal, o montante total da pensão de reforma do arguido AA que foi apreendido (por decisão de 25/01/2022 no NUIPC 184/12.5TELSB) e arrestado e que, eventualmente, ainda se encontrará na conta do ... não é superior a meio milhão de euros, ou seja, menos de metade do patrocínio da ... à ... e muito aquém das centenas de milhões de euros de prejuízos causados aos consumidores portugueses, com as decisões indiciariamente ilegais, por si tomadas, em favor da ... em concretização do pacto que firmou com os arguidos LL e MM. Assim, considero que, esta nova promoção de arresto não pretende ser uma "subversão" do Acórdão do TRL de 25/05/2023 que determinou o levantamento do arresto da pensão de reforma (como a nosso ver, e salvo o devido respeito, também não o era o arresto subsequente ao levantamento da apreensão), porquanto visa garantir o valor da peita paga pela ..., por ordem dos arguidos LL e MM, ao arguido AA e dos prejuízos causados aos consumidores portugueses de eletricidade, os quais não foram considerados no Acórdão do TRL de 25/05/2023, em face do objeto desses autos, determinado pelo princípio da vinculação temática (essa decisão cingiu-se "apenas" aos cinco milhões de euros recebidos indevidamente do ... pelos arguidos AA e EE). Face ao supra exposto, deferindo ao doutamente promovido, nos termos dos arts. 1º n.º 1 al. f) e j) e 10º da Lei nº 5/2002, de 11/01, 227º n.º 1 al. a) e 228º n.º 1 parte inicial do Código de Processo Penal e 391º a 393º e 738º do Código de Processo Civil (com as devidas adaptações), atenta a existência de fumus boni iuri e o periculum in mora e sem audiência prévia do arguido AA (visto que a revogação do arresto dessa pensão de reforma foi determinada por douto Acórdão do TRL de 25/05/2023, já transitado em julgado e cuja execução a Mma. JIC já determinou, pelo que a qualquer momento o arguido recuperará os montantes que tinham sido já apreendidos e arrestados e, com elevada probabilidade, ordenará a sua transferência para o estrangeiro), decreta-se o arresto preventivo e integral dos montantes da pensão de reforma do arguido AA que tinham sido arrestados e dos futuros montantes da mesma (sem o limite previsto no art.º 738º do CPC9, não podendo beneficiar de um regime de exceção destinado a quem nada mais tem ou recebe). (…)” Despacho datado de 31/07/2023 (complementar do anterior): (…)” Por despacho proferido nos presentes autos de procedimento cautelar de arresto, ao abrigo das disposições conjugadas nos artigos 1.º, n.º 1, als. f) e j) e 10º, ambos da Lei 5/2002 de 11 de janeiro, artºs 227º, nº 1, al. a) e 228º, nº 1, parte inicial, do Código Processo Penal e artigos 391º a 393º e 738º do Código de Processo Civil (com as devidas adaptações), foi determinado o ARRESTO preventivo e integral dos montantes da pensão de reforma do arguido AA, que tinham sido arrestados e dos futuros montantes da mesma, sem o limite previsto no artigo 738º do CPC. Posteriormente, a fls. 279 a 280 veio o Ministério Público promover que se determine que a douta decisão judicial que decretou o arresto de todos os montantes da pensão de reforma que o arguido AA recebeu da ... abranja, com os mesmos termos e fundamentos dessa decisão, igualmente todos os montantes que tenham sido ou venham a ser transferidos da conta do ... ou da ... para outras Instituições Financeiras em Portugal ou no estrangeiro, desde logo contas tituladas pelo arguido AA na ..., ..., ... e ..., ou nas quais o mesmo conste como procurador, representante, autorizado a movimentar ou a qualquer outro título. Nos termos e com os fundamentos constantes do despacho que ora faz fls. 106 a 270, para os quais se remete e cuja fundamentação de facto e de direito aqui se dá por integralmente reproduzida, por manter plena validade, defere-se o requerido, determinando-se que a decisão judicial que decretou o arresto de todos os montantes da pensão de reforma que o arguido AA recebeu da ... de garantia patrimonial, deverá abranger igualmente todos os montantes que tenham sido ou venham a ser transferidos da conta do ... ou da ... para outras Instituições Financeiras em Portugal ou no estrangeiro, desde logo contas tituladas pelo arguido AA na ..., ..., ... e ..., ou nas quais o mesmo conste como procurador, representante, autorizado a movimentar ou a qualquer outro título. DN, notificando-se de imediato os referidos Bancos. (…)” » II.4- Apreciemos, então, as questões a decidir. Como vimos, com o presente recurso, insurge-se o arguido recorrente contra os despachos datados de 25/07/2023 e 31/07/2023 (sendo este complemento do anterior), pedindo a revogação dos mesmos e, assim, do decretado arresto da pensão de reforma daquele. Analisemos, então, as questões decidendas. Cumpre, antes de mais, apreciar se o Mmº JIC, verificando que estava impedido de despachar o processo que lhe estava concluso em 18/07/2023, deveria ter formalmente declarado tal impedimento, de forma a que o mesmo fosse despachado por outro juiz de turno não impedido, de tal forma que, quando proferiu o despacho datado de 25/07/2023, já não era o juiz competente para julgar o arresto, por não ser o juiz natural do processo, ocorrendo, assim, uma nulidade insanável, nos termos do art.º 119º, al. e), do CPP. Nesta parte, desde já adiantamos que não assiste razão ao recorrente. O princípio do juiz natural está constitucionalmente consagrado no art.º 32.º, n.º 9 da Lei Fundamental determinando que “nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior”. “O juiz natural é aquele que está previamente encarregado do julgamento de causas abstractamente previstas, ou seja, aquele cuja competência para julgamento dessas causas lhe é antecipadamente atribuída. Este princípio está fortemente ligado a um julgamento imparcial e independente. No desejo de se assegurar a isenção do julgador, exige-se que a designação deste seja previamente prevista de forma desvinculada de qualquer acontecimento concreto ocorrido ou a acorrer” 10 Subjacente a este princípio está, pois, a ideia de obstar à determinação da competência jurisdicional de uma forma discricionária ou arbitrária. Este é um princípio que ganha especial relevo no âmbito do direito processual penal, estando relacionado com as garantias conferidas legalmente ao arguido. Pretende-se, assim, evitar que “sejam criados post factuam tribunais de excepção ou a definição individualizada da competência, o desaforamento ou a nomeação dos juízes por qualquer forma discricionária” 11 Nos termos do art.º 73.º n.º 1 da Lei n.º 3/99 de 13 de Janeiro, prevê-se a organização de turnos, durante os períodos de férias judiciais, para assegurar o serviço urgente. Ora, nos presentes autos não houve qualquer desaforamento da causa. Com efeito, o juiz que estava em serviço de turno, que proferiu o despacho recorrido, não foi nomeado através de qualquer forma discricionária ou arbitrária, não foi criado qualquer tribunal de excepção para julgar a causa, nem foi feita qualquer definição individualizada de competência. O que aconteceu foi que o referido juiz de turno despachou 7 dias depois de lhe ter sido aberta conclusão para o efeito, em turno. Concretamente, foi-lhe aberta conclusão no dia 18/07/2023, em dia de turno do referido juiz e este despachou 7 dias depois, em dia em que já não estava de turno. Não cremos, porém, que tal situação possa ser qualificada como uma violação do princípio do juiz natural. Não foi, efectivamente, violada qualquer norma de atribuição de competência, na situação em apreço. O que sucedeu no presente caso foi, tão só, que o Juiz de turno despachou o presente processo, não em “data supra”, ou seja, no dia da abertura de conclusão, mas 7 dias depois. Nos termos do art.º 152º do Código de Processo Civil “Os juízes têm o dever de administrar justiça, proferindo despacho ou sentença sobre as matérias pendentes e cumprindo, nos termos da lei, as decisões dos tribunais superiores”. E, segundo a Lei (Código de Processo Penal – art.º 105º, nº 1), o Juiz tem o prazo de 10 dias para proferir uma decisão interlocutória. Mas é importante reconhecer que a justiça exige um processo minucioso e imparcial, e que o tempo necessário para tomar uma decisão pode variar de caso para caso. O direito a uma decisão em prazo razoável tem consagração constitucional no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição e no artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ratificada pela Lei n.º 65/78, de 13/10. O direito à decisão da causa em prazo razoável, também referido como direito a uma decisão judicial sem dilações indevidas, direito a uma decisão temporalmente adequada ou direito à tempestividade da tutela jurisdicional, aponta para uma tramitação processual adequada e para a razoabilidade do prazo da decisão, no sentido de a tutela jurisdicional ocorrer em tempo útil ou em prazo consentâneo. Sendo que a razoabilidade do prazo deverá ser aferida mediante critérios, como a complexidade do processo, o comportamento do recorrente e das diversas autoridades envolvidas no processo, o modo de tratamento do caso pelas autoridades judiciais e administrativas e as consequências da delonga para as partes, entre outros. Portanto, o Juiz que tenha conclusão aberta em dia em que esteja em serviço de turno, pode, como acontece fora do período de turno, usar do prazo legal de 10 dias, ou de um período razoável, para despachar, com vista a decidir em ponderação, sem que, com tal procedimento, esteja a violar o princípio do Juiz natural. Transpondo estes considerandos para a situação “in casu”, impõe-se concluir que não violou o princípio do Juiz natural o Juiz que proferiu o despacho recorrido, não no dia em que estava de turno, mas 7 dias depois, não se impondo ao mesmo que largasse mão do processo, como argumenta o arguido recorrente, pela circunstância de estar ocupado [e não “impedido”, como aduz o recorrente], com outro serviço, no dia da abertura da conclusão. Tal situação não pode ter tratamento diferente daquela que ocorreria se o Juiz em referência não tivesse tido qualquer outro serviço no dia da abertura da conclusão, mas tivesse usado de tal prazo para preparação, estudo ou análise da questão a decidir, o que não pode, de modo algum, ser coarctado ao Juiz. Não se verifica, pois, em consequência, a invocada nulidade insanável, prevista na al. e), do art.º 119.º, do CPP, resultante da violação das regras de competência do tribunal, porquanto, como vimos, não ocorreu a invocada violação do juiz natural. Improcede, pois, neste segmento, o recurso. * Importa agora apreciar a questão se o Mmº JIC, que proferiu o despacho datado de 25/07/2023, violou o caso julgado, decorrente do acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023, proferido no âmbito do P. 184/12.5TELSB-W, que veio a ser separado, extraindo-se certidão que deu origem aos autos principais a que respeita o presente apenso de arresto. Vejamos. O caso julgado é um instituto com raízes no direito fundamental, constitucional, intimamente ligado ao princípio do Estado de Direito Democrático, por ser uma garantia basilar dos cidadãos onde deve imperar a segurança e a certeza; é hoje um valor máximo de justiça, aliado ao princípio da separação de poderes 12. «O fundamento do caso julgado reside, por um lado, no prestígio dos tribunais, o qual “seria comprometido em alto grau se a mesma situação concreta uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente” e, por outro lado, numa razão de certeza ou segurança jurídica 13, pois “sem o caso julgado estaríamos caídos numa situação de instabilidade jurídica verdadeiramente desastrosa. (…) Seria intolerável que cada um nem ao menos pudesse confiar nos direitos que uma sentença lhe reconheceu”. “Se assim não fosse, os tribunais falhariam clamorosamente na sua função de órgãos de pacificação jurídica, de instrumentos de paz social” - Ac. da RG, de 17.05.2018, José Flores, Processo n.º 1053/15.2T8GMR-C.G1, citando inicialmente Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, pág. 306, e depois Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, 1985, pág. 705. Lê-se no art.º 619.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (doravante também CPC), que, «Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º, sem prejuízo do disposto nos artigos 696.º a 702.º». Mais se lê, no art.º do 628.º, do CPC, que uma decisão judicial «considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação». Quando assim seja, segundo o critério da eficácia e nos termos dos arts. 619.º, n.º 1 e 620.º, n.º 1, ambos do CPC, terá força obrigatória: dentro do processo e fora dele, se for sentença ou despacho saneador que decida do mérito da causa, impedindo que o mesmo ou qualquer outro tribunal possa definir em termos diferentes o direito concreto aplicável à relação material litigada (caso julgado material ou substancial); ou apenas dentro do processo, se for sentença ou despacho que haja recaído unicamente sobre a relação processual, impedindo que o mesmo tribunal, na mesma acção, possa alterar a decisão proferida, mas não impedindo que, noutra acção, a mesma questão processual concreta seja decidida em termos diferentes pelo mesmo tribunal ou por outro entretanto chamado a apreciar a causa (caso julgado formal). Do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais (distintos, mas provenientes da mesma realidade jurídica): um negativo (excepção dilatória de caso julgado), de impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida, isto é, impedindo que a causa seja novamente apreciada em juízo; e um positivo (força e autoridade de caso julgado), de vinculação do mesmo tribunal e, eventualmente de outros (estando em causa o caso julgado material), à decisão proferida 14. Logo (e face aos arts. 576.º, n.º 1 e n.º 2, 577.º, al. i), 580.º e 581.º, todos do CPC), a excepção dilatória de caso julgado pressupõe o confronto de duas acções (uma delas contendo uma decisão já transitada em julgado), e a tríplice identidade entre ambas de sujeitos, de causa de pedir e de pedido; e visa o efeito negativo da inadmissibilidade da segunda acção, por forma a evitar a repetição de causas. Já a força e autoridade de caso julgado decorre de uma anterior decisão que haja sido proferida, designadamente no próprio processo, sobre a matéria em discussão, e prende-se com a sua força vinculativa; e visa o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito (podendo funcionar independentemente da tríplice identidade exigida pela excepção) 15. Veja-se o diz, a este propósito, também o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 5/2019, processo n.º 6941/16.6T8GMR.G1 -A.S1, D.R. 1ª série, 26 de Setembro de 2019: “(…) 74 — Assim, estamos perante caso julgado material quando a decisão se torna firme, impedindo a renovação da instância em qualquer processo que tenha por objecto a apreciação do mesmo ou dos mesmos factos ilícitos. «E perante caso julgado formal quando a decisão se torna insusceptível de alteração por meio de qualquer recurso como efeito da decisão no próprio processo em que é proferida, conduzindo ao esgotamento do poder jurisdicional do juiz e permitindo a sua imediata execução (actio judicatï)» — acórdãos, do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de Janeiro de 2002 (processo 3924/01), e de 3 de Março de 2004 (processo 215/04). O caso julgado formal respeita a decisões proferidas no processo, no sentido de determinação da estabilidade instrumental do processo em relação à finalidade a que está adstrito — acórdão, do Supremo Tribunal de Justiça, de 18 de Setembro de 2013 (processo n.º 438/08.5SGLSB.L1 -B.S1). 75 — No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Novembro de 2008 (processo 08P268), refere -se, designadamente: «O caso julgado formal constitui noção separada do caso julgado que, como categoria geral (caso julgado material) está construída para a decisão definitiva do direito do caso, nas condições da sua existência, conteúdo e modalidades de exercício; no processo penal respeita à declaração sobre a culpabilidade e determinação da sanção, bem como da não culpabilidade (seja por não pronúncia ou por absolvição). «O caso julgado formal respeita ao efeito da decisão no próprio processo em que é proferida». «O caso julgado material consubstancia a eficácia da decisão proferida relativamente a qualquer processo ulterior com o mesmo objecto» e «tem um valor impeditivo da renovação da apreciação judicial sobre a mesma matéria» — cf. Cavaleiro de Ferreira, loc. cit., p. 25. N.º 185 26 de setembro de 2019 Pág. 75 Diário da República, 1.ª série. O caso julgado que fixa, no processo e fora dele, a vinculação de efeitos materiais quanto à definição e concretização judicial da relação controvertida ou objecto material do processo, é o caso julgado material — fixado e estável com fundamento na vinculação às decisões e na realização dos valores da justiça, certeza e segurança, também no âmbito do exercício do direito de punir do Estado em relação ao cidadão arguido da prática de uma infracção penal. Em processo penal, pode dizer -se que existe caso julgado material quando a decisão se torna firme, impedindo a renovação da instância em qualquer processo que tenha por objecto a apreciação do mesmo ou dos mesmos factos ilícitos. O caso julgado formal não assume semelhante função, nem contém, no essencial, dimensão substancial. Há caso julgado formal quando a decisão se torna insusceptível de alteração por meio de qualquer recurso como efeito da decisão no próprio processo em que é proferida, conduzindo ao esgotamento do poder jurisdicional do juiz e permitindo a sua imediata execução (actio judicati) — cf. acórdão do Supremo Tribunal de 23 e Janeiro de 2002, proc. 3924/01. O caso julgado formal respeita a decisões proferidas no processo, no sentido de determinação da estabilidade instrumental do processo em relação à finalidade a que está adstrito. Em processo penal atinge, pois, no essencial, as decisões que visam a prossecução de uma finalidade instrumental que pressupõe estabilidade — a inalterabilidade dos efeitos de uma decisão de conformação processual, ou, no plano material, a produção de efeitos que ainda se contenham na dinâmica da não retracção processual, mas supondo a inalterabilidade subsequente dos pressupostos de conformação material da decisão. No rigor das coisas, o caso julgado formal constitui apenas um efeito de vinculação intraprocessual, pressupondo a imutabilidade dos pressupostos em que assenta. O procedimento é dinâmico, sequencial e, como contínuo instrumental, subsiste até ao momento em que o processo atinja a sua finalidade — a obtenção de uma decisão que lhe ponha termo, seja decisão final sobre pressupostos negativos de procedimento ou sobre a verificação de condições extintivas, seja decisão final de determinação, positiva ou negativa, da culpabilidade ou de aplicação da sanção que couber.» Cumpre, ora, transpor os referidos ensinamentos ao caso concreto. In casu, temos que o arguido recorrente vem pedir que se reconheça que o despacho proferido pelo Mmº JIC, datado de 25/07/2023 (e, necessariamente, o que o complementou, datado de 31/07/23), violou o caso julgado decorrente do acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023, proferido no âmbito do P. 184/12.5TELSB-W, que veio a ser separado, extraindo-se certidão que deu origem aos autos principais a que respeita o presente apenso de arresto. O mencionado acórdão da Relação de Lisboa de 25/05/2023 revogou o despacho que decretara o arresto da pensão de reforma do arguido (proferido depois de ter sido revogado o despacho que ordenara a apreensão dessa mesma pensão de reforma). Argumenta o arguido recorrente que não há, em termos substanciais, qualquer facto novo na promoção do arresto que veio a ser decretado pelo despacho recorrido, de 25/07/2023, relativamente ao arresto que fora decretado em 28/10/2022. Alega o recorrente que do probatório deste novo despacho constam menos factos dos que haviam sido elencados no despacho de 28/10/2022, porque, entretanto, houve a separação de processos, mas, em substância, os factos em causa aquando da prolação do despacho de 25/07/2023 já estavam compreendidos no despacho de 28/10/2022. Afirma o recorrente que a factualidade reportada no arresto de 25/07/2023, no que releva, já estava compreendida no âmbito do arresto decretado em 28/10/2022, particularmente o seguinte: i) o alegado pagamento dos salários do Arguido na ..., em montante de cerca de 1,2 milhões de dólares, como contrapartida dos favores efectuados à ... (e indiretamente ao ...); ii) os prejuízos causados pela conduta de AA aos residentes em Portugal, no valor de cerca de 1,2 mil milhões de euros, como consequência do pacto corruptivo firmado. Contrapõe o Ministério Público, em resposta a este segmento do recurso, que apesar de a alusão ao patrocínio da ... pela ... e ao pagamento com esse montante dos respetivos salários do arguido AA poder, aparentemente, ser considerado integrado no âmbito da promoção de arresto do P. nº 184/12 e na decisão do Mmº. JIC que o decretou (posteriormente revogada), a verdade é que o montante de €5.000.000,00 (o único que se pode considerar, conclusão que não é prejudicada pela alusão a montante superior a cinco milhões, pois a adequação do arresto só pode aferir se por referência a valores exatos) se atinge apenas com transferências do .../... para a esfera patrimonial do casal AA e EE (ambos arguidos no P. nº 184/12), pelo que dada a disparidade de valores, é inequívoco que na promoção de arresto do P. nº 184/12 não se contabilizou o prejuízo de várias centenas de milhões de euros para consumidores portugueses de energia com as decisões do arguido AA no dossiê … da .... Alega o Ministério Público que, uma coisa é invocar os montantes dos produtos do crime e prejuízos para terceiros dessa conduta, outra é promover o arresto para garantia dos pagamentos de apenas alguns montantes, cabendo ao MP, em primeiro lugar, delimitar o âmbito desse arresto (sendo sua legítima opção não querer abranger tudo de uma só vez). E foi isso que ocorreu no inquérito P. nº 184/12, ao decidir não se contabilizar na promoção de arresto os mais de mil milhões de euros de prejuízos da suficientemente indiciada actuação do arguido AA. Se assim fosse, não se teria invocado na promoção de arresto o valor de referência de "apenas" cinco milhões de euros (adequado ao património cujo arresto se pretendia) mas o de mais de mil milhões de euros (relativos a decisões do arguido AA no dossiê … da ...). A dimensão desses prejuízos arreda, desde logo, um dos obstáculos ao arresto da pensão de reforma do arguido AA constante do Acórdão do TRL que o revogou: a demonstração da insuficiência dos bens do arguido AA para fazer face aos mesmos, sendo evidente que tal ocorre. Vejamos. Nos autos de inquérito nº 184/12.5T8LSB, dos quais foi extraída a certidão que deu origem aos autos de inquérito com o nº 877/22.9TELSB, aos quais corre em apenso o arresto ora em dissídio, foi proferido despacho, pelo Mmº JIC, em 28/10/2022, no qual se decidiu [transcrição): “(…) Assim, face ao que tudo aqui se disse, julgamos procedente o pedido de arresto, por se verificarem cumulativamente os requisitos que exige a invocação de factos que revelem: - A probabilidade da existência do crédito; - O justo receio da perda da garantia patrimonial. Consequentemente, face aos fundamentos supra aduzidos, deferindo ao doutamente promovido pelo detentor da acção penal, nos termos dos arts. 1º n.º 1 al. f) e j) e 10º da Lei nº 5/2002, de 11/01, 227º n.º 1 al. a) e 228º n.º 1 parte inicial do Código de Processo Penal e 391º a 393º e 738º do Código de Processo Civil (com as devidas adaptações), atenta a existência de fumus boni iuri e o periculum in mora e sem audiência prévia do arguido AA (visto que a apreensão dessa pensão de reforma foi levantada por douto Acórdão do TRL de 13/10/20222 e a qualquer momento o arguido poderá tentar recuperar os montantes que tinham sido já apreendidos), determino a decretação do arresto preventivo e integral dos montantes da pensão de reforma do arguido AA que tinham sido apreendidos e dos futuros montantes da mesma (sem o limite previsto no art.º 738º do CPC, não podendo beneficiar de um regime de exceção destinado a quem nada mais tem ou recebe). (…)” Nesta decisão de decretamento de arresto, considerou-se que indiciavam fortemente os autos a prática pelo arguido AA de, entre outros, dois crimes de corrupção passiva para acto ilícito de titular de cargo político (arts. 16º n.º 1 da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na versão vigente à data dos factos) e branqueamento (art.º 368º-A do Código Penal), este com recurso a sociedades constituídas no ... e nos ... e em co-autoria com a arguida EE. Mais ali se considerou que, da factualidade descrita e dada como provada, resultava que os arguidos obtiveram uma vantagem ilegítima, que resultaram dos crimes em investigação que superam em muito os €5.000.000,00. E mais ali se considerou que, em resultado da prática de todos os factos imputados ao arguido AA (considerados fortemente indiciados nos acórdãos do TRL de 19/04/2002 e de 11 e 13/10/2022), este terá causado aos cidadãos residentes em Portugal um prejuízo de 1,2 mil milhões de euros, bem como um distorção da concorrência, nomeadamente ao criar as condições para a ... manipular a oferta dos serviços de sistema entre 2009 e 2013 (que a ... estimou em 140 milhões de euros ), com consequências ainda bem manifestas para o sistema eléctrico nacional. Mas, para além destas consequências, o ex-ministro conseguiu, ainda, um enriquecimento ilegítimo, no que respeita à ..., consubstanciado no recebimento indevido, desta entidade, via ..., entre 2010 e 2014 (pois sem esse patrocínio não teria sido chamado a dar ali aulas) o valor de, pelo menos, USD$ 137.973,00 (no total de USD$689.865,00, cf. documento de fls. 22 do apenso de busca à ... nº 24). Na sequência do recurso interposto pelo arguido, do atrás mencionado despacho, veio este Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão datado de 25/05/2023, decidir nos termos seguintes [transcrição]: “(…) Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos parcialmente provido o recurso e, consequentemente, decidimos: - revogar o despacho recorrido, na parte em que decreta o arresto da pensão de reforma do Recorrente, devendo-lhe ser, devolvidos todos os montantes, desde a apreensão decretada em 25/01/2022; - para tanto, devem-se autorizar as operações bancárias na conta em que é depositada a pensão de reforma, de forma a que o Recorrente possa dela dispor; - revogar os despachos recorridos relativos à apreensão de bens durante a busca ordenada em 14/10/2022, na parte em que mantêm a apreensão de bens, determinando-se a sua devolução, com entrega no local de onde foram retirados, salvo quanto aos que já tenham sido considerados, naqueles despachos, elementos de prova. Sem custas. (…)” Lê-se assim, no referido acórdão deste Tribunal da Relação [transcrição]: “(…) Quanto ao arresto posto em crise. Em 13/10/2022, foi proferido acórdão nesta Relação que decidiu nos seguintes termos: "Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, julgamos parcialmente provido o recurso e, consequentemente, revogamos o despacho recorrido, na parte em que decreta a apreensão da pensão de reforma do Recorrente.". O tribunal recorrido, em 28/10/2022, subvertendo o decidido pelo referido acórdão, decretou, o arresto da mesma pensão, nos termos já supra citados. Tal pode constituir violação do "... dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores ..." (art.º 4º/1 da L n.º 62/2013, de 26/08 - Lei da Organização do Sistema Judiciário)). Concomitantemente, os indícios dos crimes (que não vêm postos em causa pelo Recorrente) e o perigo de dissipação são os que já existiam quando foi decretada a apreensão revogada e o arresto de outros bens, conforme conta do despacho proferido em 25/01/2022, tendo-se então considerado que "... Consequentemente, face aos fundamentos supra aduzidos, deferindo ao doutamente promovido pelo detentor da acção penal, atenta a existência de fumus boni iuri e o periculum in mora, sem audiência prévia dos visados, de modo a acautelar que a vantagem da actividade criminosa aqui em investigação, assim como as garantias de pagamento de eventuais penas pecuniárias e outros créditos, se dissipem, ordeno o arresto à ordem dos presentes autos, dos bens abaixo indicados, com vista a assegurar o pagamento do valor das vantagens, por referência aos arguidos AA e EE, no valor de 5.000.000,00 - ex vi das disposições conjugadas nos art.ºs 228.º do Código de Processo Penal, 110.º do Código Penal e 391.º a 393.º do Código de Processo Civil (CPC) e ainda nos termos do disposto nos art.ºs 7.º, n.º 1 e 10.º da Lei 5/2002. ..." (sublinhado nosso). Sustenta o despacho recorrido que o Recorrente não prestou a caução que lhe foi arbitrada (£6.000.000,00), mas há que ter conta que tal caução foi carcerária e não económica, pelo que não tem a virtualidade de dispensar a prova do fundado receio de perda da garantia patrimonial. "... O decretamento do arresto depende da verificação cumulativa de dois requisitos, a saber a probabilidade da existência do crédito e o justo receio da perda da garantia patrimonial. ..." 16 Por outro lado, o reforço do arresto já decretado, há-de depender da sua insuficiência, uma vez que "... Se o arresto houver sido requerido em mais bens que os suficientes para segurança normal do crédito, reduz-se a garantia aos justos limites. ..." (art.º 393º/2 do CPC11). Ora, o despacho recorrido não refere o valor de mercado do património já arrestado e, por isso, não se pode concluir que seja insuficiente para garantir os referidos €5.000.000,00. Quanto ao perigo de dissipação, importa ter em conta que está em causa uma prestação periódica e que, portanto, será sempre possível arrestar as futuras, caso essa dissipação comece a ocorrer. É, pois, procedente, nesta parte, o recurso. (…)”. Ora, aqui chegados e analisadas as peças em confronto, outra não pode ser a conclusão senão a de que assiste razão ao arguido recorrente, ao aduzir que esta concreta questão (do arresto da pensão de reforma do arguido) foi já anteriormente apreciada e decidida, por este Tribunal de recurso, com trânsito em julgado, não podendo, por isso, nas mesmas condições, como ocorre in casu, o juízo então proferido ser alterado. Senão vejamos. O novo arresto, ora decretado pelo despacho recorrido, datado de 25/07/2023, para além da tríplice identidade de sujeitos e do pedido, tem por base os mesmos factos que já constavam do anterior arresto (causa de pedir), decretado por despacho datado de 28/10/2022 (no âmbito do P. nº 184/12.5TELSB), revogado por acórdão proferido por este Tribunal da Relação, datado de 25/05/2023. Note-se que, após a referida decisão do Tribunal superior, foi requerida pelo Ministério Público e ordenada pelo Mmº JIC a separação de inquéritos, com extração de certidão que deu origem ao P. 877/22.9TELSB, a que respeita o apenso de arresto objecto do presente recurso. Ora, este novo processo (P. 877/22.9TELSB) constitui apenas um “minus” do anterior processo, não respeitando a factualidade diferente, mas, antes, a factualidade específica, concretamente à alegada actuação do arguido recorrente a favor da ..., relativamente à matéria relativa aos …, tendo como contrapartida o pagamento da sua ida para a ..., no valor de 1,2 milhões de dólares. Constata-se que, no arresto anteriormente decretado (por despacho de 28/10/2022), revogado por este Tribunal da Relação, constituiu causa de pedir a alegada prática de todos os factos imputados ao arguido recorrente, que terá causado aos cidadãos residentes em Portugal um prejuízo de 1,2 mil milhões de euros, bem como um distorção da concorrência, nomeadamente ao criar as condições para a ... manipular a oferta dos serviços de sistema entre 2009 e 2013, com consequências ainda bem manifestas para o sistema eléctrico nacional. No referido despacho de arresto mais se referia que, para além destas consequências, o ex-ministro conseguiu um enriquecimento ilegítimo, designadamente proveniente da ..., via ..., de quem recebeu indevidamente, entre 2010 e 2014 (pois sem esse patrocínio não teria sido chamado a dar ali aulas) o valor de, pelo menos, USD$ 137.973,00 (no total de USD$689.865,00 -documento de fls. 22 do apenso de busca à ... nº 24). Tal causa de pedir surge novamente, de forma clara, no novo arresto, apenas com a redução resultante da separação de inquéritos entretanto operada, circunscrevendo-se o processo separado (P. 877/22.9TELSB), à específica e alegada actuação do arguido recorrente a favor da ..., relativamente à matéria relativa aos …, tendo como contrapartida o pagamento da sua ida para a ..., no valor de 1,2 milhões de dólares. No anterior arresto, revogado por este Tribunal da Relação, como vimos, fundamentou o Mmº JIC, o periculum in mora nos termos seguintes: “Caso a pensão de reforma do arguido AA não seja de imediato arrestada, poderá o mesmo, com elevada probabilidade (por ser ora fácil pressupor essa intenção da Justiça), transferir o respetivo montante para sociedades localizadas no estrangeiro cujo controlo por si será mais difícil de comprovar pela investigação (como já aliás ocorreu, pois além da ..., ... e ..., detinham a ... para onde a avença mensal do ... chegou a ser transferida em março e abril de 2005 quando o arguido AA já era Ministro da Economia), sendo assim evidente e concreto o perigo de dissipação dos montantes da pensão de reforma recebida em Portugal.” Bold e sublinhado nosso Ora, a este propósito, entendeu o acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 25/05/2023, que: “O decretamento do arresto depende da verificação cumulativa de dois requisitos, a saber a probabilidade da existência do crédito e o justo receio da perda da garantia patrimonial”. [citando-se o Acórdão da RL de 02/04/2019, relatado por Luís Gominho, no proc. 959/11.2IDBGC-B.L1, in www.dgsi.pt.] E quanto ao segundo daqueles requisitos, considerou-se que: “Quanto ao perigo de dissipação, importa ter em conta que está em causa uma prestação periódica e que, portanto, será sempre possível arrestar as futuras, caso essa dissipação comece a ocorrer.” Portanto, como decorre à evidência do decidido pelo Tribunal superior, e tendo em atenção a verificação de um dos apontados requisitos para o decretamento do arresto preventivo, qual seja o do periculum in mora, foi ali entendido que o mesmo não se verificava, que nenhum elemento indicava que a dissipação tivesse ocorrido ou disso houvesse indícios, pois só assim é possível entender a referência a que tal, caso venha a acontecer no futuro, aí sim, poderá ser decretado o arresto. Ora, todas estas considerações têm por base a argumentação supra transcrita do ali despacho recorrido, o qual não colheu adesão, não tendo sido considerado fundamento suficiente para demonstrar a existência daquele perigo. Ocorre que no novo despacho de arresto (25/07/2023), ora recorrido, o Mmº JIC repristinou o mesmo fundamento, não acolhido, nos termos sobreditos, pelo acórdão da Relação de Lisboa. Com efeito, escreve assim o Mmº JIC: “Igualmente se corrobora o entendimento sancionado pelo detentor da acção penal de que, caso a pensão de reforma do arguido AA não seja de imediato arrestada, poderá o mesmo, com elevada probabilidade (por ser novamente fácil pressupor essa intenção da Justiça), transferir o respetivo montante para sociedades localizadas no estrangeiro (offshores) cujo controlo por si será mais difícil de comprovar pela investigação (como já aliás ocorreu, pois a avença mensal do ... paga enquanto o arguido AA era Ministro da Economia foi transferida para a ... e SS, e constituiu a ... nos ... para aí receber cerca de um milhão de euros dessa avença e comprar um apartamento em ...), sendo assim evidente e concreto o perigo de dissipação dos montantes da pensão de reforma recebida em Portugal.” Bold e sublinhado nosso O Mmº JIC repetiu ipsis verbis o argumento já anteriormente utilizado, acrescentando-lhe apenas a palavra “novamente”, espelhando, com clareza, a repetição da argumentação. Ora, como vimos, convocado em recurso, decidira já este Tribunal da Relação que tal argumentação não se revelava suficiente para preencher o requisito do periculum in mora. Temos, pois que concluir no sentido de que o despacho revidendo, decisão de mérito que decretou o novo arresto (de 25/07/2023) e, necessariamente, o despacho que o complementou (de 31/07/2023), violam o caso julgado material, decorrente do acórdão deste Tribunal da Relação, datado de 25/05/2023, com força obrigatória dentro do processo e fora dele (arts. 619.º, n.º 1 e 620.º, n.º 1, ambos do CPC), impedindo que o mesmo ou qualquer outro tribunal possa definir em termos diferentes o direito concreto aplicável àquela concreta questão litigada (arresto total da reforma do arguido recorrente). Estamos, indubitavelmente, perante uma situação de caso julgado material, fixado e estável com fundamento na vinculação às decisões e na realização dos valores da justiça, certeza e segurança, encontrando-se impedida a renovação da instância em qualquer processo que tenha por objecto a apreciação do mesmo ou dos mesmos factos ilícitos, o que aconteceu, de resto. Como a autoridade do caso julgado consubstancia uma excepção dilatória, tal implica a extinção da instância do procedimento cautelar de arresto, por julgamento de forma (art.º 277º, al. a), do CPC), o que se declara, com todas as consequências daí decorrentes – vd. neste sentido, o Ac. RC, Relator Desembargador Jorge Arcanjo, P. nº 80/1995.C1, de 15 Maio 2007. Procede, pois, este segmento do recurso. * Resulta, necessariamente, prejudicada a apreciação das demais questões recursivas, à excepção da análise que segue. * Cumpre analisar, por fim, da questão recursiva atinente à invocada violação, por parte do Mmº JIC que proferiu o despacho datado de 25/07/2023, do seu dever de acatamento de uma decisão anteriormente proferida por um tribunal superior e, bem assim, se tal despacho consubstancia ainda um abuso de direito, através do qual o Mmº JIC, excedendo os limites impostos pela boa-fé (objectivamente considerados), serviu-se dos seus poderes para subverter o que fora decidido por um tribunal superior. É certo que, como se lê no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12/03/2015, Conselheiro Belo Morgado, 756/09: «Consistindo o processo jurisdicional num conjunto não arbitrário de atos jurídicos ordenados em função de determinados fins, as partes devem deduzir os meios necessários para fazer valer os seus direitos na altura/fase própria, sob pena de sofrerem as consequências da sua inatividade, numa lógica precisamente assente, em larga medida, na autorresponsabilidade das partes e, conexamente, num sistema de ónus, poderes, faculdades, deveres, cominações e preclusões. No mesmo sentido apontam outros princípios processuais estruturantes, como é o caso dos da boa-fé, cooperação e lealdade processual, os quais obrigam, não só as partes e seus mandatários, mas também os magistrados (arts. 7.º e 8.º, CPC). Ocorre que, no tocante ao invocado abuso de direito, ou abuso de poderes, por parte do Mmº JIC que proferiu o despacho datado de 25/07/2023, desde já se consigna que tal questão está materialmente arredada do campo das competências deste Tribunal de recurso, pelo que, sobre a mesma, nada há a apreciar ou decidir. Vejamos, ora, quanto à invocada violação, por parte do mesmo Mmº JIC, do seu dever de acatamento de uma decisão anteriormente proferida por um tribunal superior. Lê-se no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), que: «Os magistrados judiciais julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento pelos tribunais inferiores das decisões proferidas, em via de recurso, pelos tribunais superiores»; e, de forma idêntica, no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário) que: «Os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a quaisquer ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores». Logo, a indiscutível consagração da independência dos magistrados judiciais, no exercício da sua função judicante, é feita com a expressa salvaguarda do seu dever de acatamento das decisões que, em via de recurso, sejam proferidas por Tribunais superiores. O exposto é reafirmado, no particular campo do processo civil, no art.º 152.º, n.º 1, do CPC, onde se lê que: «Os juízes têm o dever de administrar justiça, proferindo despacho ou sentença sobre as matérias pendentes e cumprindo, nos termos da lei, as decisões dos tribunais superiores». Compreende-se, por isso, que se leia no art.º 42.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, que: «Os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados para efeito de recurso das suas decisões». Pondera-se, a propósito, que «não sendo a jurisprudência uma ciência exata, de rigor matemático, sempre será possível discordar das soluções defendidas pelos colegas, independentemente da instância em que se encontrem, razão pela qual sem o disposto no artigo 4.º, n.º 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário, a possível coerência do sistema judiciário era impossível» (Ac. da RL, de 27.10.2020, João Moraes Rocha, Processo n.º 508/14.0GHVFX-A.L1 -3). Ora, a violação de um tal dever de acatamento de prévia decisão proferida por Tribunal superior, proferida em via de recurso e transitada em julgado, constitui uma nulidade insuprível da decisão que assim venha a ser proferida, nomeadamente por o objecto de renovada pronúncia do Tribunal inferior constituir questão de que o mesmo não podia tomar conhecimento (arts. 613.º, nº 3 e 615.º, n.º 1, al. d), II parte, ambos do CPC) (8). Poderá até constituir ainda uma infracção disciplinar, nos termos do art.º 82.º, da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, onde se lê que se qualificam como tal «os atos, ainda que meramente culposos, praticados pelos magistrados judiciais com violação dos princípios e deveres consagrados no presente Estatuto». É, no entanto, do nosso entendimento, descendo ao caso dos autos, que a invocada violação, por parte do Mmº JIC, que proferiu o despacho datado de 25/07/2023, do dever de acatamento de uma decisão anteriormente proferida por um tribunal superior, não pode proceder, ainda que, como vimos, tenha sido violado o caso julgado material, decorrente de anterior decisão deste Tribunal da Relação. Isto porque, para efeitos da verificação da violação deste dever, é imprescindível que a ordem não acatada ocorra no processo em que a mesma é emanada, só assim se compreendendo o uso da expressão “em via de recurso”, usada, quer no citado art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho, quer no art.º 4.º, n.º 1, da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, para enquadrar as decisões proferidas pelos tribunais superiores e as proferidas pelos tribunais inferiores em violação daquelas. O facto de estarmos agora perante um outro processo (decorrente da separação de inquéritos, tudo nos moldes já supra explanados), que, como vimos, não impede a força do caso julgado material, já, para efeito da verificação do não acatamento das decisões de tribunais superiores, tal circunstância impede que a violação do invocado dever se tenha por verificada. Improcedem, pois, estes segmentos do recurso. » III- DISPOSITIVO Pelo exposto, acordam os Juízes da 9.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido, reconhecendo-se a verificação da excepção dilatória de caso julgado material e, em consequência: - determina-se a extinção da instância do procedimento cautelar de arresto; - determinando-se, em consequência, o levantamento do arresto da pensão de reforma do recorrente, devendo-lhe ser devolvidos os montantes arrestados por ordem dos despachos recorridos (datados de 25/07/2023 e de 31/07/2023, proferidos no apenso de arresto do P.877/22.9TELSB); - para tanto, devem-se autorizar as operações bancárias na conta em que é depositada a pensão de reforma, de forma a que o recorrente possa dela dispor. Sem custas. Notifique nos termos legais. » Lisboa, 21 de Março de 2024 (O presente acórdão foi processado em computador pela relatora, sua primeira signatária, e integralmente revisto por si e pelas Exmas. Juízes Desembargadoras Adjuntas – art.º 94.º, n.º 2 do Código de Processo Penal - encontrando-se escrito de acordo com a antiga ortografia) As Juízes Desembargadoras, Fernanda Sintra Amaral Ana Marisa Arnedo Amélia Carolina Marques Dias Teixeira ______________________________________________ 1. Indicam-se, a título de exemplo, os Acórdãos do STJ, de 15/04/2010 e 19/05/2010, in http://www.dgsi.pt. 2. Germano Marques da Silva, Direito Processual Penal Português, vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág.335; Simas Santos e Leal-Henriques, Recursos Penais, 8.ª ed., Rei dos Livros, 2011, pág.113. 3. Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada pelo Acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR/I 28/12/1995. 4. Cf.: https://observador.pt/2018/Q9/03/concorrencia-acusa-eclp-cle-abuso-de-posicao-doininatne-e-de-causar-dan(1-dc-140-milhoes-aos-constunidores,/ 5. Cfr. RELATÓRIO DE ANÁLISE DE EXAME DIGITAL FORENSE — II 51/2022 - EXAME 104/2022 que ora também se envia, referente ao do equipamento n.º 1 / Computador Portátil Apple A1466 s/n: GCCXM1ZEJ1WK, (Relatório de Pesquisa Informática n.º 4082 / 2' Fase -14/06/2022), que se encontrava no domínio do arguido AA, com o ID 755939. 6. item 20.ANDERSEN.ES, pág. 40 do Exame 133/2022 - Relatório de Análise de Exame Digital Forense SIATID 54/2022: Referente ao do equipamento n.º 4 / Computador Portátil Apple A1465 IMEI: CO2M21WRF5YW, (Relatório de Pesquisa Informática n.º 4082 - 2.ª Fase -14/06/2022). 7. O próprio arguido AA publicamente declarou que ele e a arguida EE são proprietários de uma "coleção grande fotografia", sendo que em Gondizalves apenas foram apreendidas quatro - fls. 26050/1— vol. 76. 8. por coincidência ou não, um valor muito aproximado ao da avença mensal de €15.000.00 que recebeu do ... entre, pelo menos, 2005 e 2012. 9. Quando a apreensão da pensão de reforma do arguido AA foi determinada pelo Mmo. JIC, deixando-lhe três SMN, não se conhecia esta informação mais recente de março de 2021, a última era de 2018; 10. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07-06-2011, disponível em www.dgsi.pt. 11. Jorge Miranda/ Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, Coimbra, Coimbra Editora,2005, p.363. 12. Miguel Pimenta de Almeida, A intangibilidade do Caso Julgado na Constituição (Brevíssima Análise), pág. 18. 13. O art.º 2502.º do CC de Seabra, de 1867, afirmava cristalinamente que o caso julgado é o facto ou o direito, tornado certo por sentença de que não há recurso. O art.º 580º, n.º 2 do CPC dispõe hoje no mesmo sentido, quando afirma que tanto «a excepção da litispendência como a do caso julgado têm por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior». 14. Neste sentido, Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume III, Coimbra Editora, págs. 92-93. 15. No mesmo sentido, José Lebre de Freitas, A. Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 2.ª edição, Coimbra Editora, 2008, págs. 713 e 714, onde nomeadamente se lê que, seja «qual for o seu conteúdo, a sentença produz, no processo em que é proferida, o efeito de caso julgado formal, não podendo mais ser modificada (…). Mas, quando constitui uma decisão de mérito (“decisão sore a relação material controvertida”), a sentença produz também, fora do processo, o efeito de caso julgado material: a conformação das situações jurídicas substantivas por ela reconhecidas como constituídas impõe-se, com referência à data da sentença, nos planos substantivo e processual (…), distinguindo-se, neste, o efeito negativo da inadmissibilidade duma segunda acção (proibição de repetição: excepção de caso julgado) e o efeito positivo da constituição da decisão proferida em pressuposto indiscutível de outras decisões de mérito (proibição de contradição: autoridade de caso julgado)». Ainda Miguel Teixeira de Sousa, «O Objecto da Sentença e o Caso Julgado Material», BMJ, n.º 325, pág. 49, onde se lê - com bold apócrifo - que «a excepção de caso julgado visa evitar que o órgão jurisdicional duplicando as decisões sobre idêntico objecto processual, contrarie na decisão posterior o sentido da decisão anterior ou repita na decisão posterior o conteúdo da decisão anterior», enquanto que «quando vigora como autoridade e caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade de caso julgado é o comando de acção, a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição do processo subsequente do conteúdo da decisão anterior e à não contradição no processo posterior do conteúdo da decisão anterior». 16. Acórdão da RL de 02/04/2019, relatado por Luís Gominho, no proc. 959/11.2IDBGC-B.L1, in www.dgsi.pt |