Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
25546/23.9T8LSB.L1-1
Relator: FÁTIMA REIS SILVA
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PER
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
PRIORIDADE RELATIVA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/15/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: 1 - Em abstrato, a impugnação da matéria de facto é possível em recurso de apelação de sentença de homologação (ou não homologação) de plano proferida em Processo Especial de Revitalização.
2 - O plano de recuperação, em PER, não é um meio de prova, é o objeto mediato do processo, a proposta que se converterá em negócio jurídico plurilateral mediante a expressão dos votos dos credores e ganhará eficácia, designadamente quanto aos credores não votantes, com a homologação judicial.
3 – No entanto, quando haja questões a decidir diretamente relacionadas com cláusulas do Plano pode e deve o teor do mesmo ser considerado como matéria de facto, bem como todos os demais elementos dos autos relevantes para a decisão a tomar.
4 – Sendo invocadas várias causas de não homologação do Plano de Recuperação aprovado, sem que o Tribunal delas conheça, não as declarando prejudicadas pela decisão tomada, a falta de reação a esta omissão determina a impossibilidade de conhecimento das mesmas em sede de recurso, quando não foi usado o mecanismo previsto no art. 636º do CPC.
5 - Um PER não é um processo de insolvência, é um processo pré-insolvencial, pelo que a flexibilidade da regra da igualdade pela forma como foi sendo trabalhada e modelada pela doutrina e pela jurisprudência sempre se aproximou mais da regra da prioridade relativa do que da regra da prioridade absoluta.
6 - A regra da prioridade relativa veio a ser acolhida como standard mínimo na versão final do art. 11º nº1, al. c) da Diretiva 2019/1023 e, na respetiva transposição, o legislador português consagrou esta como regra para os Processos Especiais de Revitalização em que o devedor trate os seus credores em categorias – art. 17º-F, nº7, al. c) do CIRE.
7 – O que implica que não aplicação da regra da prioridade absoluta, como regra, em PER, é uma evidência, mesmo para os PERs clássicos, sem tratamento dos credores em categorias.
8 - A prioridade relativa é uma combinação de dois princípios: o princípio segundo a qual deve dar-se às categorias superiores tratamento mais favorável e às categorias inferiores tratamento menos favorável e o princípio segundo a qual a categorias iguais deve dar-se tratamento igualmente favorável.
9 - Sendo respeitada a regra da prioridade relativa, temos garantido o cumprimento do princípio da igualdade.
10 – À luz do princípio da igualdade não surge como desproporcionado impor aos credores comuns o perdão de juros e ainda assim prever o pagamento 50% do capital dos credores subordinados, nomeadamente quando se assegura que este pagamento não será feito sem que aqueles (e os demais credores não subordinados) recebam integralmente os seus créditos nos termos previstos no Plano.
11 – A declaração de que determinados credores subordinados são fornecedores, inserta num Plano de recuperação apenas faz prova plena das declarações atribuídas ao seu autor; não se trata de um facto desfavorável ao devedor, pelo que tais factos não podem considerar-se provados nos termos do nº2 do art. 376º do CC.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam os Juízes da Secção de Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa

1. Relatório
CL, SA intentou o presente processo especial de revitalização.
Juntou os elementos previstos no nº3 do art. 17º-C do CIRE.
Foi proferido despacho de nomeação de administrador provisório nos termos do nº5 do art. 17º-C do CIRE.
Foi apresentada lista provisória de credores.
Foram apresentadas impugnações da lista de credores, nos termos e prazo previstos no art. 17º-D nº4 do CIRE por:
- CL, SA, impugnando o crédito reclamado por EGI, pedindo seja considerado inexistente, ou, caso assim não se entenda seja qualificado como subordinado;
- SNM, Lda, alegando a incorreção do montante do crédito constante da lista e pedindo o reconhecimento do montante de € 51.352,50;
- Condomínio A, alegando a incorreção do montante do crédito constante da lista e pedindo o reconhecimento do montante de € 8.983,45.
A Sra. Administradora Judicial Provisória veio pronunciar-se, declarando nada ter a obstar ao reconhecimento dos créditos pelos montantes indicados pelos credores SNM, Lda e Condomínio A.
EGI, SA veio responder à impugnação deduzida pela devedora, pedindo a sua improcedência.
Por decisão de 07/03/2024 foram as impugnações apresentadas por SNM, Lda e Condomínio A julgadas procedentes.
A devedora juntou aos autos proposta de plano de recuperação, o qual foi publicado nos termos do disposto no art. 17º-F nº1, proémio, do CIRE.
Foi pedida a não homologação do plano pelo Ministério Público, em representação do Estado, por EGI, SA, LBV, GB e LB.
A devedora, referindo ter tomado conhecimento dos requerimentos apresentados veio juntar nova versão do plano, requerendo a sua publicação e o início do prazo de votação.
O Plano foi objeto de publicação em 27/03/2024.
O Ministério Público, em representação do Estado veio pedir a não homologação do plano, alegando violação das normas aplicáveis aos créditos tributários, a falta da descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa, a falta de elementos contabilísticos atualizados, a violação do princípio da igualdade por não inclusão da Autoridade Tributária na cláusula que prevê o pagamento imediato com o produto da venda de imóveis, a não percetibilidade do clausulado quanto à extinção dos processos executivos e quanto às execuções tributárias, o facto de se prever o cancelamento de todas e quaisquer penhoras efetuadas em processos de execução fiscal, o não pagamento de juros vincendos, não se vislumbrar um plano de reestruturação da empresa, falta de fundamentação das projeções de meios para o cumprimento do plano e falta de colaboração da devedora com a AT. Requereu, caso se não decida pela não homologação, seja o plano declarado ineficaz em relação ao Estado.
GB e LB votaram desfavoravelmente e pediram a não homologação do plano alegando que o mesmo viola o princípio da igualdade dos credores, sendo idêntico ao já recusado por esse motivo no anterior Processo Extraordinário de Viabilização e por inexistência de negociações, vício procedimental que determina a não homologação.
EGI, SA e LBV vieram pedir a não homologação oficiosa do plano de recuperação, alegando que a devedora, ao iniciar o processo juntando um plano igual ao que já havia recusado em processo extraordinário de viabilização agiu de forma contrária ao princípio da boa-fé, que o processo foi iniciado com a manifestação de vontade de uma credora que, no momento da constituição de parte do crédito estava especialmente relacionada com a devedora, inexistência de negociações, por o plano não ser acompanhado pela descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa, desconhecendo-se o valor do passivo da mesma, em violação do disposto na al. b) do nº1 do art. 17º-F, a falta dos elementos previstos nas als. g) e h) do mesmo preceito, por violação do princípio da igualdade, por a credora EGI ser tratada de forma diversa dos demais credores garantidos sem qualquer indicação de motivo, por os credores subordinados beneficiarem de tratamento diferenciado, os quais parece ter sido equiparados aos credores comuns.
Pediram ainda a não homologação nos termos do art. 216º nº1, al. a) do CIRE, alegando que o cenário de liquidação em insolvência é o mais provável e que nesse caso a credora EGI lograria recuperar a totalidade do seu crédito com base na venda dos ativos onerados, dado que a sua garantia é superior ao montante que do plano para si resulta.
Mais alegam que também a credora LBV ficaria em situação mais benéfica no caso de insolvência, dado que receberia o pagamento do seu crédito antes dos credores subordinados, os quais, no plano em apreço, receberão simultaneamente com os credores comuns, sendo-lhe também prejudicial o facto de se prever perdão dos créditos comuns e, em simultâneo, pagamento de credores subordinados.
Condomínio A veio pedir a não homologação do Plano, invocando violação do princípio da igualdade e inexistência de negociações entre a devedora e os credores.
A Sra. Administradora Judicial Provisória juntou o resultado da votação, nos termos da qual o plano foi aprovado nos termos do disposto no art. 17º-F, nº5, al. b) do CIRE.
Juntou igualmente parecer nos termos da parte final do nº6 do art. 17º-F do CIRE, no qual analisou os elementos disponíveis e concluiu que a devedora diminuiu a sua atividade comercial, aumentou o passivo e tem falta de liquidez para solver as suas obrigações, nomeadamente para com o Estado e Segurança Social, mas tem património que lhe permitirá honrar as suas obrigações, pelo que o ressente plano ao fracionar os pagamentos possibilita “reverter esta situação de falta de pagamento pontual das obrigações, conseguindo a Devedora recuperar liquidez e reabilitar-se economicamente no tecido empresarial, cumprindo os seus compromissos.”
A devedora veio pronunciar-se quanto aos requerimentos de não homologação, invocando o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 3.º do CPC, pedindo a homologação do plano e alegando, em síntese:
- a prévia apresentação a PEVE não a impedia de se apresentar a PER;
- o Plano que juntou com o requerimento inicial não se destinava a ser votado mas antes a ser negociado e alterado;
- a credora que assinou a declaração inicial não é especialmente relacionada com a devedora, tendo o administrador da devedora cedido as quotas e renunciado à gerência daquela mais de dois anos antes de se apresentar a PER;
- negociou com todos os seus credores, apenas não tendo obtido resposta dos credores EGI, LBV, GB e LB, tendo ainda assim procurado acolher as respetivas pretensões, tendo enviado a todos a nova proposta e mostrado disponibilidade para reunir, não tendo nenhum destes respondido;
- juntou todos os elementos necessários e as projeções que fez são sustentadas nos dados que apresentou;
- não efetuou qualquer diferenciação no Plano em relação à credora EGI, que receberá nos exatos termos previstos para os demais credores garantidos;
- os créditos subordinados só serão pagos após o pagamento de todos os demais credores e com um perdão de 50% do capital e de todos os juros, não beneficiando assim de qualquer tratamento diferenciado;
- a lista de credores diferencia os credores subordinados e comuns, não havendo qualquer confusão entre fornecedores e credores subordinados;
- o crédito da credora EGI é litigioso e foi reconhecido sujeito a condição; a credora sempre teria que aguardar o desfecho do litígio em relação ao seu crédito, mesmo em cenário de liquidação; não é possível prever que a venda dos imóveis sobre que recai a garantia seja suficiente para o pagamento da totalidade do capital reclamado pela credora;
- a credora LBV sendo credora comum não receberá simultaneamente com os subordinados e não há qualquer perdão de capital, não sendo o valor dos imóveis a liquidar suficiente para pagar a todos os credores;
- introduziu no Plano todas as alterações necessárias relativamente aos créditos da Autoridade Tributária.
Por sentença de 28/06/2024, o tribunal decidiu:
«Pelo exposto, nos termos do artigo 17º-F, n.os 7 e 8, do CIRE, não homologo o plano de recuperação da devedora CL, S.A., sociedade anónima com o NIPC …, com sede na Av. … Lisboa.
Custas pela devedora com taxa reduzida a 1/2 (arts. 17º-F, n.º11, e 302º do CIRE), sendo o valor da ação para efeitos de custas o equivalente à alçada da Relação, nos termos do artigo 301º do CIRE.
Registe, notifique e publicite, nos termos dos artigos 37º e 38º, ex vi n.º10 do artigo 17º-F, todos do CIRE.»
Foi apresentado o parecer previsto no art. 17º-G nºs 3 e 4 do CIRE, tendo a Sra. Administradora Judicial Provisória concluído no sentido de que a devedora “não se encontra em situação de insolvência.”
Por despacho de 24/06/2024, foi declarado encerrado o processo especial de revitalização.
Inconformada apelou a devedora pedindo a revogação da decisão de não homologação do plano e a sua substituição por outra que homologue o plano de revitalização apresentado nos presentes autos, e formulando as seguintes conclusões:
“1.ª Vem o presente recurso interposto da douta sentença datada de 06/06/2024, notificada à devedora, ora recorrente, por ofício via CITIUS, cuja elaboração foi certificada pelo sistema em 07/06/2024, pela qual foi recusada a homologação do plano de revitalização apresentados nos presentes autos.
2.ª A recorrente não se conforma com a douta sentença porque entende que o Tribunal a quo (i) errou no juízo decisório quanto à matéria de facto e (ii) errou também no juízo decisório quanto ao direito aplicável aos factos apurados.
3.ª No que respeita à matéria de facto, face à prova existente nos autos, deveria constar no probatório o seguinte segmento:
Os pontos 6.5 e 6.6 da versão final do plano, que foi aprovada, previam o seguinte:
«6.5. Fornecedores e Credores Comuns
Plano de Regularização
A CL, propõe o pagamento de 100% do capital em dívida, com perdão de juros vencidos e vincendos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses.
A amortização da dívida obedecerá ao seguinte calendário:
- Ano 1: Período de carência total de amortização de capital;
- Ano 2: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor;
- Ano 3: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 4: Pagamento de 7,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 5: Pagamento de 10,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 6: Pagamento de 12,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
Ano 7: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 8: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 9: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 10: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
O primeiro pagamento da amortização de capital ocorrerá no décimo terceiro mês após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano. Os pagamentos seguintes serão feitos de forma mensal e sucessiva.
A Devedora, após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, compromete-se a diligenciar pela venda dos imóveis constantes do seu activo imobiliário por valores de mercado e a distribuir o produto da venda em paridade pelos seus credores, sendo pagos em primeiro lugar os credores que tenham garantia real sobre os imóveis alienados, sendo o remanescente distribuído pelos restantes na proporção dos créditos e privilégios reconhecidos incluindo a Administração Tributária e Segurança Social.
Não sendo o produto da venda suficiente para liquidação dos montantes em dívida, após amortização a prestação do plano será recalculada, mantendo-se os prazos e termos estabelecidos no plano de pagamentos supra apresentado.
6.6. Créditos Subordinados
Plano de Regularização:
Para os créditos subordinados a CL, Lda., propõe o pagamento de 50% do capital em dívida, com perdão do remanescente e dos juros vencidos e vincendos, a pagar após o pagamento de todos os restantes créditos objeto do PER.»
4.ª Os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa da recorrida, e que importa reapreciar, são os pontos 6.5 e 6.6 do Plano de recuperação junto aos autos com REFª: 38901572, 26-03-2024.
5.ª Na óptica do Tribunal a quo o plano enferma de violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do plano que impede a sua homologação, porquanto os credores subordinados continuam a beneficiar de um tratamento diferenciado quando se pretende que os seus créditos sejam parcialmente pagos, embora não se preveja no plano o pagamento integral dos créditos comuns.
6.ª Tal só seria possível se o Tribunal a quo tomasse em consideração a primeira versão do plano, onde se previa «(...) o pagamento de 60% do capital em dívida, perdão de 40% do capital reclamado e em dívida, perdão de juros vencidos, vincendos e outros encargos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses. (...)»
7.ª Por seu turno a versão publicada em 27 de Março de 2024, a qual foi submetida a votação, aprovada e sujeita a homologação, passou a prever, para os créditos comuns, o seguinte:
«A CL, propõe o pagamento de 100% do capital em dívida, com perdão de juros vencidos e vincendos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses. (...)»
8.ª Do exposto resulta que não é verdade que o plano representa um sacrifício para os credores comuns, que em situação de insolvência seriam pagos com prioridade sobre os subordinados.
9.ª Tribunal recorrido, ao ter decidido nos termos que se deixaram expostos, violou o disposto nos artigos 413.º e 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil, pelo que a decisão da matéria de facto, neste segmento, deve ser revogada e substituída por outra que decida em conformidade.
10.ª O Tribunal fundamenta o argumento do benefício dos “credores subordinados em detrimento dos credores comuns”, nos seguintes pontos:
1.º A aprovação do plano determina que os credores comuns fiquem numa situação mais gravosa do que a que pode resultar da insolvência da recorrente, pois vêm o seu crédito pago apenas parcialmente, até em comparação com os credores subordinados, os quais teriam prioridade no pagamento;
2.º Para efeitos de atribuição de classes de credores a recorrente equiparou os fornecedores a credores comuns, sem concretizar quais as entidades que qualifica como tal, sendo de concluir que tais fornecedores que se pretendem beneficiar, equiparando-os a credores comuns, são, na verdade, credores subordinados.
11.ª Relativamente ao primeiro ponto, é falso que plano determine que os credores comuns fiquem numa situação mais gravosa do que a que pode resultar da insolvência da recorrente, e é também falso que os credores subordinados tenham prioridade no pagamento dos seus créditos.
12.ª O plano aprovado e submetido a homologação prevê o pagamento de 100% do valor em dívida aos credores comuns em 120 prestações e relativamente aos credores subordinados apenas o pagamento de 50%, e a efetuar apenas após o pagamento integral a todos os outros credores.
13.ª Não se logra compreender a conclusão que o Tribunal recorrido alcança quanto a este ponto, até porque, mesmo considerando a versão inicial do plano que parece ter sido aquela que norteou a decisão em crise, ainda assim não havia beneficiação dos credores subordinados sobre os comuns.
14.ª No que respeita ao segundo ponto, não poderia o Tribunal a quo fazer-se valer da classificação de credores feita num outro processo para depreender/presumir que a recorrente quis incluir os fornecedores na categoria dos “credores subordinados”, até porque a recorrente encontrava-se dispensada de relacionar os credores por categoria nos termos do n.º 4 do artigo 17.º-C do CIRE.
15.ª Face aos elementos que deveriam constar no probatório, e tendo-se concluído que não existe qualquer privilégio dos credores subordinados sobre os credores comuns no plano de recuperação legítima e validamente aprovado nos termos legais, não se vislumbra qualquer motivo de recusa oficiosa do plano
16.ª A decisão recorrida é manifestamente violadora, no disposto no artigo 17.º- F, n.º 7 e 215.º do CIRE, pelo que deve ser revogada e substituída por outra que homologue o plano de revitalização apresentado nos presentes autos.”
O Ministério Público, em representação do Estado, respondeu ao recurso, pedindo seja negado provimento ao mesmo e mantida a decisão recorrida.
EGI, SA e LBV responderam ao recurso, pedindo seja negado provimento ao mesmo e mantida a decisão recorrida, formulando as seguintes conclusões:
“1. Em conformidade com o que consta das conclusões do recurso, o mesmo tem por objecto a decisão que determinou a não homologação do plano de revitalização apresentado nos presentes autos.
2. Para o efeito, a Recorrente invocou três fundamentos: i) a impugnação da matéria de facto, por alegadamente esta se tratar de uma decisão restritiva ou deficiente, requerendo a ampliação da matéria de facto; ii) a violação dos artigos 413.º e 607.º, n.º 5 do CPC; e iii) a violação do artigo 17.º-F, n.º 7 e 215.º, do CIRE.
3. Não assiste qualquer razão à Recorrente.
4. Com efeito, e no que toca à impugnação e consequente ampliação da matéria de facto, a Recorrente parece se esquecer que a sentença homologatória a proferir no âmbito de um PER tem uma natureza distinta da sentença propriamente dita e, como tal, a sentença destina-se tão somente a controlar a legalidade do plano apresentado pela respetiva devedora, e não a analisar o mérito do seu conteúdo.
5. Assim, num plano processual, o conteúdo do plano não equivale a um facto que deve constar da sentença homologatória proferida neste âmbito, e consequentemente não deverá integrar a decisão de facto o “segmento” peticionado pela Recorrente.
6. No que diz respeito, à alegada violação do artigo 413.º e 607.º, n.º 5 a mesma não se verifica.
7. Em primeiro lugar é manifestamente falso que os credores comuns vejam o seu crédito pago a 100% (cem por cento), porquanto, no que aos créditos comuns respeita, a Administradora Judicial Provisória reconheceu créditos com a quantia total de 2.137.836,51€ (dois milhões, cento e trinta e sete mil e oitocentos e trinta e seis euros e cinquenta e um cêntimos), ao passo que, no plano apresentado, a devedora propõe-se a pagar apenas o montante de 1.023.637,82€ (um milhão e vinte e três mil e seiscentos e trinta e sete euros e oitenta e dois cêntimos) e reconhece apenas a quantia de 1.130.152,34 (um milhão e cento e trinta mil e cento e cinquenta e dois euros e oitenta e quatro cêntimos).
8. Por outro lado, tendo a Recorrente i) confessado no âmbito de um processo PEVE, que correu termos no mesmo Tribunal a quo e apreciado pela mesma Mma. Juíza, aquando da apresentação do plano de revitalização, que os fornecedores eram credores subordinados; e ii) sendo-lhe essa confissão desfavorável;
9. O plano aí junto faz prova plena dessas declarações nos termos do artigo 376.º, n.º 2 do CC, não sendo suscetível de ser contrariada por outros meios de prova, nos termos do disposto n.ºs 4 e 5 do artigo 607.º, do CPC.
10. Em resultado, sendo falso que os credores comuns venham obter o pagamento de 100% (cem por cento) dos seus créditos, e tendo a Recorrente confessado que os fornecedores (que nos termos do plano beneficiam das mesmas condições que os credores comuns) são os credores subordinados, é evidente que existe o sacrifício para os primeiros em detrimentos dos últimos.
11. Por fim, também não se verifica qualquer violação dos artigos 17.º-F, n.º 7 e 215.º, do CIRE.
12. Aliás não se pode deixar de dizer que foram violadas regras procedimentais não negligenciáveis, como regras de conteúdo atinentes ao plano, incluindo o princípio da igualdade.
13. Assim não restava outra opção ao Tribunal a quo que não determinar a não homologação do referido plano.
14. Como tal improcede na integra o recurso, devendo-se manter a decisão recorrida. porquanto tanto o procedimento anterior ao plano, como o próprio plano apresentado padecem de várias vicissitudes.”
Não foram apresentadas outras contra-alegações.
O recurso foi admitido por despacho de 07/08/2024 (ref.ª 437650694).
Foram colhidos os vistos.
Cumpre apreciar.
*
2. Objeto do recurso
Como resulta do disposto nos arts. 608º, n.º 2, aplicável ex vi art. 663º n.º 2, 635º n.ºs 3 e 4, 639.º n.ºs 1 a 3 e 641.º n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil, sem prejuízo do conhecimento das questões de que deva conhecer-se ex officio e daquelas cuja solução fique prejudicada pela solução dada a outras, este Tribunal só poderá conhecer das que constem nas conclusões que, assim, definem e delimitam o objeto do recurso. Frisa-se, porém, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito –  art.º 5º, nº3 do mesmo diploma.
Consideradas as conclusões acima transcritas são as seguintes as questões a decidir:
- impugnação da matéria de facto;
- verificação de violação do princípio da igualdade como causa de não homologação de acordo de recuperação aprovado em Processo Especial de Revitalização.
*
            3. Fundamentos do recurso
3.1. Fundamentos de facto
3.1.1. Impugnação da matéria de facto
A recorrente alega que além de facto que aponta ter sido dado como provado[1], deveria ainda ter sido dados como provados os pontos 6.5. e 6.6. da versão final do plano, indicando ser o meio de prova correspondente a versão final do Plano e apontando a sua relevância para a decisão da causa dado que o tribunal a quo parece não ter atendido à versão final do Plano, mas antes à versão anteriormente apontada.
O Ministério Público não se pronunciou quanto à matéria da impugnação fáctica.
As credoras EGI e LBV apontam a natureza diversa do procedimento e da respetiva sentença, que apenas controla a legalidade do plano e não analisa o seu mérito, para concluir que se trata de uma sentença com figurino diverso. Tendo por certo que a ampliação da matéria de facto ainda se integra na impugnação da mesma, defendem que, no caso, a sentença não é deficiente do ponto de vista factual, dado que se trata de uma sentença de homologação. Acresce que o conteúdo do plano não equivale a um facto que deva constar da sentença. Defendem, assim, que a decisão de facto não deverá ser integrada pelo segmento em causa.
A primeira questão a resolver é, assim, da admissibilidade da impugnação da matéria de facto, questão suscitada pelas credoras que responderam ao recurso – embora não levada às últimas consequências.
O processo especial de revitalização (PER) é um processo com uma natureza híbrida, misto de negociação extrajudicial e aprovação judicialmente homologada. Foi introduzido no CIRE pela Lei nº 16/2012, de 20 de abril e alterado pelo Decreto-Lei nº 26/2015, de 6 de fevereiro, pelo Decreto-Lei n.º 79/2017, de 30 de junho e ainda pela Lei nº 9/2022 de 11 de janeiro.
O propósito de criação do PER foi claramente enunciado na Proposta de Lei do Governo 39/XII, que está na génese da Lei nº16/2012, e em cuja exposição de motivos se declarou: “O principal objectivo prosseguido por esta revisão passa por reorientar o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas para a promoção de recuperação, privilegiando-se sempre que possível a manutenção do devedor no giro comercial, relegando-se para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação.”
O PER destina-se a permitir ao devedor que se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas ainda suscetível de recuperação, estabelecer negociações com os respetivos credores de modo a concluir com estes um acordo conducente à sua revitalização. Tem desde logo uma característica essencial a este fim a que se propõe: permite aos devedores em situação económica difícil ou situação de insolvência eminente a sua recuperação mediante acordo com os seus credores sem que seja decretada a sua insolvência.
Tecnicamente, o processo especial de revitalização é um processo especialíssimo em relação ao processo de insolvência, no sentido em que este é já um processo especial na aceção do art. 549º nº1 do Código de Processo Civil, criado com a finalidade de proporcionar uma ferramenta legal expedita para a recuperação de empresa.
Os demais traços caraterísticos deste procedimento especial são a celeridade, a consensualidade e a iniciativa do devedor.
A celeridade enquanto traço essencial e condição de eficácia surge consagrado não só pela regra do art. 17º-A nº3 do CIRE[2] (“O processo especial de revitalização tem caráter urgente”), como pelos prazos e organização do próprio procedimento.
A consensualidade porque a finalidade do procedimento é possibilitar a negociação entre o devedor e os seus credores sujeitando-os a algumas regras para o procedimento, orientações para a negociação (resolução do Conselho de Ministros nº 43/2011 de 25/10) e consequências quando reunidos os pressupostos previstos.
Iniciativa do devedor porque a ele, e apenas a ele, cabe o desencadear deste específico procedimento, com exclusão de todos os demais legitimados para pedir a sua declaração de insolvência.
Ou, e nas palavras de Catarina Serra “Sem preocupações de exaustividade, identificam-se como caraterísticas a voluntariedade, a informalidade, a consensualidade, a transparência, o contraditório e a celeridade.”[3]
Estes traços essenciais do regime explicam-no, justificam muitas das suas regras e integram as demais regras aplicáveis em função das lacunas do regime próprio. O legislador optou por consagrar uma tramitação escassa em regras, deixando ao intérprete a tarefa de integrar as lacunas, mas sempre de acordo com estas caraterísticas.
É um procedimento híbrido, no sentido em que, para alcançar a sua finalidade última, a recuperação do devedor, se trata de um processo extrajudicial, mas que exige a intervenção do tribunal em três momentos chave: no seu início, na decisão da impugnação da lista provisória de créditos e no final, para tornar gerais os efeitos do acordo, para recusar a sua homologação ou para extrair as devidas consequências da não aprovação do mesmo.
O já citado art. 17º-A nº3 contém ainda a previsão do regime subsidiário aplicável: aplicam-se ao processo especial de revitalização «todas as regras previstas no presente código que não sejam incompatíveis com a sua natureza.»
Concatenado esta regra com a prevista no nº1 do art. 17º do CIRE[4] temos assim o seguinte esquema de aplicação de direito subsidiário:
Em 1º lugar – aplicam-se as regras próprias do PER (17º-A a 17º-J);
            Em 2º lugar – as demais regras do CIRE se não contrariarem a natureza e especificidades do PER;
Em 3º lugar - as regras do CPC, passadas por um duplo crivo: se não contrariarem regras específicas do PER e não contrariarem as especiais natureza e caraterísticas do PER; e se não contrariarem regras específicas do CIRE e se não contrariarem as regras gerais e comuns do CIRE, se necessário adaptadas às regras gerais e comuns do PER e do CIRE.
            Percorrendo as regras próprias do PER, sem qualquer surpresa, atentas as natureza e caraterísticas já enunciadas, nelas não encontramos qualquer regulação quanto à alegação e prova de matéria de facto.
            Percorrendo depois as regras do CIRE, resulta também evidente que, exceção feita ao estabelecimento de presunções e indicação de ónus em determinadas matérias, o Código não regula por qualquer forma a impugnação da matéria de facto (em recurso ou fora dele).
            Passamos assim para o CPC, diploma ao abrigo do qual a recorrente formulou a sua pretensão.
            Como bem apontam as credoras que contra-alegaram, estamos ante um procedimento diverso do previsto no processo civil clássico.
Este não é um processo em que o interessado venha deduzir uma pretensão que depende da prova de factos essenciais cujo ónus de alegação lhe caiba. Este é, na essência, um processo não litigioso, um processo negocial que terminará, se bem-sucedido, com a celebração de um negócio jurídico plurilateral entre o devedor e os seus credores, formado através da proposta e da respetiva votação, cuja homologação é uma condição de eficácia.
Neste momento legislativo já não é absolutamente claro que o juízo de homologação seja um mero juízo de legalidade – a nova al. g) do nº7 do art. 17º-F do CIRE introduziu a apreciação de um elemento de mérito no juízo de homologação: a apreciação de se o plano de recuperação apresenta perspetivas razoáveis de evitar a insolvência ou de garantir a viabilidade da empresa.
Num procedimento sem qualquer incidência – por exemplo, em que o plano foi aprovado por maioria clara, sem necessidade de qualquer definição quanto a créditos condicionais ou concessão de direito de voto a créditos impugnados, no qual ninguém requereu a não homologação e o parecer do AJP foi no sentido da viabilidade da empresa – da sentença homologatória não necessitam de constar mais factos que o mero relato da sequência processual, que por regra se enquadra formalmente em relatório, na parte inicial da sentença.
Mas caso existam incidências dependentes de factos, apreciações sobre meros factos processuais, questões a apreciar de conhecimento não oficioso cuja apreciação dependa da alegação e prova de determinados factos, então a sentença poderá conter os factos necessários àquela apreciação, seja na forma de relatório (quanto aos factos procedimentais e processuais) seja como matéria de facto autonomizada, possível seja quanto aos factos procedimentais e processuais como quanto aos demais necessários.
Ou seja, a aplicação das regras do CPC pode ter que ser feita no tocante ao apuramento da matéria de facto, com as devidas adaptações, dependendo das concretas questões suscitadas.
Um dos pontos mais trabalhados pela doutrina e jurisprudência é o da impugnação da lista de créditos provisória, em relação ao qual se estabilizou o entendimento de que, devido às necessidades de celeridade e eficácia do procedimento e valores que estes protegem (satisfação dos credores, maximização do valor, evitar da liquidação de devedores recuperáveis, etc.) se limitam os meios de prova admissíveis, por regra à prova documental – neste sentido entre muitos outros os Acs. TRP de 27/06/2022 (Mendes Coelho – 846/21), TRP de 12/07/2021 (Maria José Simões – 2752/20) e TRL de 29/05/2014 (Tomé Almeida Ramião – 723/13)[5]. Ora a discussão sobre a admissibilidade de meios de prova apenas faz sentido na necessidade de fixação de matéria de facto, como aliás se decidiu expressamente no Ac. TRP de 27/06/2022 (Miguel Baldaia Morais – 1472/21)[6].
Mas na verdade esta é uma questão transversal a todo o procedimento. Por exemplo, se for invocada factualidade integrante do disposto na al. a) do nº1 do art. 216º do CIRE como causa de não homologação, sendo o respetivo ónus de alegação e prova do credor que requer tal não homologação, também neste caso poderá ser necessária a fixação de matéria de facto.
Se forem alegados vícios não negligenciáveis do procedimento negocial, por regra tratam-se de factos ocorridos fora do processo judicial, que demandam alegação e prova, sempre nos limites céleres e concentrados que as finalidades e objetivos do PER consentem.
Ou seja, sempre que se justifique, sempre que haja uma questão a decidir, mesmo incidental, que dependa da alegação e prova (mesmo nos termos muito limitados que se adaptam ao PER) pode haver fixação de matéria de facto provada. E assim sendo, pode haver lugar à sua falta ou incorreção, sendo aplicáveis (sempre com as devidas adaptações) as regras previstas no CPC, designadamente as relativas à impugnação da matéria de facto em recurso de apelação.
Assim, podemos concluir que, em abstrato, a impugnação da matéria de facto é possível em recurso de apelação de sentença de homologação (ou não homologação) de plano proferida em Processo Especial de Revitalização.
Passando à apreciação concreta:
No caso concreto, o ponto trazido é o conteúdo parcial do plano, que reveste natureza de proposta negocial[7], nos termos que já assinalámos e, assim, sendo, corresponde a matéria de facto que pode ser dada por provada.
Na realidade, o plano está junto aos autos, é objeto de publicação e está adquirido por todos os intervenientes, desde o juiz aos credores. Ou seja, o plano, cuja aprovação e homologação é o objeto imediato de todo o procedimento, está sempre subjacente e adquirido, como aliás, claramente sucedeu no caso concreto.
O Sr. Juiz a quo fez constar do relatório o “facto” processual puro que foi a apresentação e publicação da segunda versão do plano de recuperação. A partir daí, não é sequer legítima a dúvida expressa pela recorrente – de que tenha sido considerada a primeira versão do plano na decisão recorrida.
Se a apreciação feita pelo Tribunal a quo está correta ou corresponde à única versão eficaz do plano, aquela que foi votada pelos credores é já uma questão de mérito[8].
Assim, a falta de especificação, como matéria de facto, do conteúdo do plano não implica qualquer omissão e, designadamente, não corresponde a qualquer violação dos arts. 413º e 607º do CPC, dado que o plano de recuperação, em PER, não é um meio de prova, é o objeto mediato do processo, a proposta que se converterá em negócio jurídico plurilateral mediante a expressão dos votos dos credores e ganhará eficácia, designadamente quanto aos credores não votantes, com a homologação judicial.
No entanto, no nosso procedimento habitual, para melhor leitura e compreensão, por regra, destacamos como factos alguns factos processuais e procedimentais: o universo de votantes e os sentidos de votos se a questão a decidir é relacionada com a aprovação/não aprovação, o teor do plano se há pedidos de não homologação dirigidos a conteúdos do plano[9] e todos os demais elementos constantes dos autos que foram (ou deveriam ter sido) relevantes para a decisão tomada e a analisar.
Atentas as plausíveis soluções de direito para as questões a dilucidar, também neste caso sempre fixaríamos os factos (processuais ou resultantes dos autos) nesse nosso procedimento habitual, incluindo, no caso, o teor da proposta de Plano[10], razão pela qual, não obstante no rigor das regras legais não podermos concluir estar perante uma impugnação da matéria de facto procedente, entendemos, em exercício de adequação formal do processado, julgar procedente a impugnação da matéria de facto, declarando-se desde já que não nos ateremos aos dois pontos indicados como factos a provar, mas a todo o conteúdo do plano (que os inclui).
Mais se consigna que se trata do exercício dos poderes previstos no art. 662º nº1 do CPC, com as devidas adaptações, exercício a que estamos obrigados por lei e que, no caso, inclui necessariamente os pontos de facto cuja relevância e falta haviam sido apontadas em recurso, sem prejuízo dos demais que igualmente se entendam relevantes.
Pelo exposto, nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se procedente a impugnação da matéria de facto, a qual será incluída na demais matéria de facto com relevância para a decisão do recurso que se irá consignar ao abrigo do disposto no art. 662º nº1 do CPC, aplicável ex vi arts. 17º-A nº3 e 17º nº1 do CIRE, com as devidas adaptações.
*
            3.1.2. Fundamentos de facto
Com relevância para a decisão do recurso mostram-se assentes os factos constantes do relatório e ainda os seguintes, resultantes dos termos dos autos:
1 - A requerente é sociedade anónima que tem por objeto social a construção civil, a compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim, aquisição, gestão e cessão de créditos, podendo praticar todas as atividades conexas e prestar serviços de consultoria e assessoria em todas aquelas áreas.
2 - O capital social, integralmente realizado, é de € 200.000,00 (duzentos mil euros), repartido pela seguinte forma:
- SBU, Lda – € 138.800,00
- W, Lda – € 49.000,00
- JLR – € 12.200,00.
3 - O Conselho de Administração é constituído por dois administradores:
- JCR
- JSA.
4 – A requerente instaurou o presente processo especial de revitalização em 25/10/2023.
5 – Com o requerimento inicial a devedora juntou a proposta de plano de recuperação cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
6 – A devedora apresentou-se a processo extraordinário de viabilização de empresas que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa sob o nº 25768/21.7T8LSB, no qual apresentou plano de recuperação que não foi homologado por sentença de 28/06/2022, a qual foi confirmada por Ac. TRL de 04/10/2022, os quais aqui se dão por integralmente reproduzidos (sentença e acórdão juntos em 03/01/2024, requerimento refª 38039054).
7 – A lista definitiva de créditos, após decisão, não impugnada, das impugnações à mesma, ficou organizada pela seguinte forma:
- ADC, S.A. – € 256,31 – comuns;
- AAG – € 30.000 – garantidos;
- Condomínio A – comuns;
- AAA – € 1.235,94 – comuns;
- Autoridade Tributária – € 913.544,22, sendo € 13.971,85 garantidos, € 25.315,59 privilegiados e o remanescente comuns;
-  BSO, Lda –€ 17 835.00 - comuns;
- BI, SARL – € 85 358.18 - subordinados;
- CMC – € 358.80 – comuns;
- CAS – € 3 867.46 – comuns;
- CIT, Lda – € 59 635.14 – subordinados;
- Condomínio B – € 8 983.45 – comuns;
- Condomínio C – € 15 670.00 – comuns;
- Condomínio D – € 3 886.33 – comuns;
- CO, Lda. – € 435 705.75 – garantidos;
- DV, S.A. – € 27,31 – subordinados;
- EDP – € 98,65 – comuns;
- ECS – € 27 308.90 – comuns;
- EF, Lda - € 327 010.56 – comuns;
- EGI, S.A. – € 357 698.38 – garantidos sob condição;
- FV – € 4 828.03 – comuns;
- GB e LB – € 31 629.42 – comuns;
- GV – € 1 834.30;
- IL, Lda – € 47 377.93 - subordinados;
- Instituto da Segurança Social, IP – € 141 921.28, sendo € 46.386,83 privilegiados e o remanescente comuns;
- JCR – € 153 843.72 – subordinados;
- KCA, Sp, Lda – € 1 295.25 – comuns;
- LBV– € 88 405.21 – comuns;
- MPB – € 196 624.11 – comuns;
- MF – € 45.000,00 – garantidos;
- CQU, Lda – € 382 324.66 – comuns;
- QST, S.A. - 580.56 – comuns;
- RA, Lda – € 2.659,84 – comuns;
- SCG, Lda – € 178 340.53 – subordinados;
- SNM, Lda – € 51 352.50 – comuns;
- SBU, Lda. – € 39 906.89 – subordinados;
- VVM – € 35 000.00 – garantidos;
- W, Lda – € 638.38 – subordinados.
8 – Do Plano de recuperação apresentado pela devedora nos autos em 26/03/2024 e publicado em 27/03/2024, e que foi objeto de votação pelos credores consta:
“1. IDENTIFICAÇÃO DA DEVEDORA
(…)
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA E ACTIVIDADE DA DEVEDORA
A Devedora foi constituída em 17 de dezembro de 2007.
A actividade da Devedora sempre se concentrou no sector imobiliário.
Nos últimos anos, a Devedora tem-se dedicado à promoção e comercialização dos seus imóveis, aquisição de carteiras de crédito vencido e à optimização dos processos de colectas de créditos sem garantia.
3. CAUSAS DA SITUAÇÃO ECONÓMICA DIFÍCIL DA DEVEDORA
O sector imobiliário, onde a Devedora desenvolve a sua actividade, foi, como é sabido, um dos sectores em crescimento na economia portuguesa e europeia.
A Devedora é detentora de activos imobiliários, no entanto, impendem sobre estes imóveis ónus e hipotecas, vindo os credores a bloquear a venda dos referidos imóveis ao não comparecer a escrituras para entrega do distrate.
A pandemia Covid-19, veio a agravar a situação de liquidez da empresa, com efeito, apesar de os resultados do ano 2020 terem sido positivos, nos anos de 2021 e 2022 tem decorrido de forma substancialmente pior a nível de concretização de liquidez, sobretudo através da venda de património imobiliário. Apesar dos activos da empresa terem um valor considerável, a dificuldade dos devedores em pagar acordos e dívidas, e a estagnação do mercado imobiliário durante este ano 2023, provocou um decréscimo abrupto na situação líquida da CL, S.A..
Pelas razões acima expostas, a sociedade está na iminência de ser confrontada com a exigência de cumprimento de obrigações de avultado montante, para as quais não possuirá liquidez suficiente.
4. DESCRIÇÃO DA SITUAÇÃO PATRIMONIAL, FINANCEIRA E REDITÍCIA DA DEVEDORA
4.1. Dos capitais próprios da Devedora
Com referência às contas reportadas no ano 2022, a Devedora apresenta um Capital Próprio de €10.720.410,27.
Os capitais próprios reflectem a diferença entre o valor do activo (€14.001.540,55) e o valor do passivo (€ 3.281.130,28), o que resulta numa situação líquida de €10.720,410,27.
4.2. O activo da Devedora
O activo da Devedora é composto por vários imóveis com um valor patrimonial de €2.030.107.
As hipotecas sobre os imóveis totalizam cerca de €1.200.000,00.
O activo inclui ainda carteiras de crédito com um valor nominal de cerca de €3.500.000,00
4.3. O passivo da Devedora
Como se disse, à data de reporte das contas em 2022, o passivo total da Devedora ascendia ao montante de € 3.281.130,28.
5. PLANO DE RECUPERAÇÃO
5.1 VIABILIDADE ECONÓMICA E FINANCEIRA DA DEVEDORA
Não obstante a actual situação da Devedora, a mesma considera ser viável do ponto de vista económico e financeiro, como será evidenciado no Plano de Recuperação aqui apresentado.
Desde logo importa notar que a Devedora tem vindo a tentar assegurar o pagamento pontual dos planos de pagamento em vigor junto da Autoridade Tributária, mas dadas as dificuldades de obtenção de liquidez, não tem conseguido fazer face ao valor total mensal dos planos prestacionais.
O presente processo pretende a recuperação da sociedade CL, S.A., baseando-se na negociação com todos os seus credores com vista à conclusão de um acordo que permita aumentar a solvabilidade e tesouraria da empresa, sem a qual a mesma entrará em incumprimento generalizado, com prejuízos para todos!
5.2. Finalidade do Plano de Recuperação
A finalidade do Plano Especial de Revitalização é assegurar a viabilidade económico-financeira da Devedora e que esta mantém a sua actividade num quadro em que os activos excedem o valor do passivo e do capital social e os recebimentos gerados são os suficientes para cobrir os pagamentos aos fornecedores, salários e Estado.
Para tanto é necessário uma reestruturação do endividamento pela conversão de passivo de curto prazo em passivo em médio longo prazo.
5.3. Elenco das medidas necessárias à recuperação
Para alcançar a finalidade indicada no ponto anterior as medidas de recuperação previstas no presente Plano de Recuperação envolvem, fundamentalmente, uma reestruturação do seu passivo.
Concretamente as medidas necessárias à recuperação da Devedora são as seguintes:
a) Concessão de período de carência de 12 (doze) meses a contar do trânsito em julgado da decisão de homologação do presente Plano Especial de Revitalização, que permita a recuperação de ativos financeiros, a reorganização da empresa e a promoção de venda de activos imobiliários não afetos à actividade, com vista à amortização dos valores em dívida
b) Negociação de prazos e condições de pagamento, promovendo acordos de pagamento, junto dos principais fornecedores.
c) Promover a recuperação de activos.
d) Promover a venda dos activos imobiliários não afectos à actividade.
Desta forma pensamos, estarem reunidas as condições necessárias ao sucesso do plano, nomeadamente, os recursos materiais, técnicos, humanos, capacidade de gestão e controlo sobre as operações e mercado, somente possíveis de concretizar na totalidade com a aprovação do plano de recuperação que permitirá a adequação dos compromissos assumidos à capacidade de libertação de fundos.
6. PLANO DE PAGAMENTOS
CONTEÚDO DO PLANO (ARTIGO 195º DO CIRE)
O Plano de revitalização deve indicar claramente as alterações dele decorrentes para as posições jurídicas dos credores da devedora.
Depois de devidamente analisada e ponderada a viabilidade económica da CL S.A. temos por bem propor o seguinte:
6.1. Autoridade Tributária
Plano de Regularização
A regularização ocorrerá nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 196º e seguintes do Código de Procedimento e Processo Tributário, ou seja:
∙ As prestações são mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do Plano;
∙ Considerando o crédito reconhecido no valor de 913.544,22€, pagamento será efectuado em 120 prestações, (não sendo nenhuma prestação de valor inferior a 10 unidades de conta), mensais iguais e sucessivas;
∙ Não haverá lugar à redução de coimas e custas;
∙ Não haverá lugar a qualquer moratória;
∙ Manutenção das garantias existentes, nos termos do nº 13, do artº 199º do CPPT;
. A empresa está disponível para garantir o plano prestacional, nos termos legais.
6.2. Instituto da Segurança Social
Plano de Regularização:
A regularização ocorrerá nos termos e para os efeitos previstos nos nº1 e nº2 do artigo 190º do Código Contributivo.
∙ As prestações são mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira até ao final do mês seguinte à data da sentença homologatória do Plano;
∙ Considerando o crédito reconhecido no valor de 141.921,28€ o pagamento será efectuado em 120 prestações, (não sendo nenhuma prestação de valor inferior a 10 unidades de conta), mensais iguais e sucessivas;
∙ Não haverá lugar à redução de coimas e custas;
∙ Não haverá lugar a qualquer moratória;
∙ Manutenção das garantias existentes, nos termos do nº 13, do artº 199º do CPPT;
. A empresa está disponível para garantir o plano prestacional, nos termos legais.
6.3. Instituições Financeiras, Sociedades de Garantia Mútua, Credores
Garantidos:
A CL, propõe o pagamento de 100% do capital em dívida, com perdão de juros vencidos e vincendos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses.
A amortização do capital em dívida será efetuado da seguinte forma:
- Ano 1: Período de carência total de amortização de capital;
- Ano 2: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor;
- Ano 3: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 4: Pagamento de 7,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 5: Pagamento de 10,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 6: Pagamento de 12,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 7: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 8: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 9: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 10: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
O primeiro pagamento da amortização de capital ocorrerá no décimo terceiro mês após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano. Os pagamentos seguintes serão feitos de forma mensal e sucessiva.
A Devedora, após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, compromete-se a diligenciar pela venda dos imóveis constantes do seu activo imobiliário por valores de mercado e a distribuir o produto da venda em paridade pelos seus credores, sendo pagos em primeiro lugar os credores que tenham garantia real sobre os imóveis alienados, sendo o remanescente distribuído pelos restantes na proporção dos créditos e privilégios reconhecidos incluindo a Administração Tributária e Segurança Social.
Não sendo o produto da venda suficiente para liquidação dos montantes em dívida, após amortização a prestação do plano será recalculada, mantendo-se os prazos e termos estabelecidos no plano de pagamentos supra apresentado.
6.4. Contratos de Locação Financeira
Plano de Regularização:
A CL, propõe a continuação em vigor dos contratos de leasing/locação financeira, a amortizar conforme planos de amortização originais, retomando-se o cumprimento dos contratos 30 dias após o trânsito em julgado da sentença homologatória do PER, sem prejuízo da revogação, denúncia ou resolução que possa ter lugar.
6.5. Fornecedores e Credores Comuns
Plano de Regularização
A CL, propõe o pagamento de 100% do capital em dívida, com perdão de juros vencidos e vincendos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses.
A amortização da dívida obedecerá ao seguinte calendário:
- Ano 1: Período de carência total de amortização de capital;
- Ano 2: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor;
- Ano 3: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 4: Pagamento de 7,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 5: Pagamento de 10,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 6: Pagamento de 12,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 7: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 8: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 9: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 10: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
O primeiro pagamento da amortização de capital ocorrerá no décimo terceiro mês após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano. Os pagamentos seguintes serão feitos de forma mensal e sucessiva.
A Devedora, após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, compromete-se a diligenciar pela venda dos imóveis constantes do seu activo imobiliário por valores de mercado e a distribuir o produto da venda em paridade pelos seus credores, sendo pagos em primeiro lugar os credores que tenham garantia real sobre os imóveis alienados, sendo o remanescente distribuído pelos restantes na proporção dos créditos e privilégios reconhecidos incluindo a Administração Tributária e Segurança Social.
Não sendo o produto da venda suficiente para liquidação dos montantes em dívida, após amortização a prestação do plano será recalculada, mantendo-se os prazos e termos estabelecido 6.6. Créditos Subordinados
Plano de Regularização:
Para os créditos subordinados a CL, Lda., propõe o pagamento de 50% do capital em dívida, com perdão do remanescente e dos juros vencidos e vincendos, a pagar após o pagamento de todos os restantes créditos objeto do PER.s no plano de pagamentos supra apresentado.
6.7 Créditos Sob Condição
Plano de Regularização:
Verificando-se a condição a que se encontram sujeitos, a CL, propõe o seu pagamento, nos mesmos termos e condições definidos anteriormente para cada uma das categorias de credores em que se integrem.
6.8. Razões Objetivas de diferenciação entre credores:
O presente Plano poderá contemplar a derrogação do princípio da igualdade, previsto no artigo 194.º do CIRE e aplicável analogicamente ao presente processo especial de revitalização, no que tange aos créditos Privilegiados da Autoridade Tributária, por força do enquadramento legal previsto nas normas dos artigos 30.º e 36.º da Lei Geral Tributária que determinam a indisponibilidade dos créditos tributários e versam sobre o objecto, constituição e alteração da relação jurídica tributária.
No plano apresentado a devedora viu-se obrigada a apresentar um tratamento diferenciado entre os diversos credores, desde logo entre Administração Tributária, Instituto de Segurança Social, Credores Garantidos, Locações Financeiras e fornecedores e credores comuns.
a) - A Administração Tributária e Segurança Social, nos termos do disposto nos artigos 196.º e 199.º, do CPPT, e 30.º, n.º 2, da LGT, os seus créditos fiscais são indisponíveis, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito pelo princípio da igualdade e da legalidade tributária. Nos termos do disposto número 3 do artigo 30.º, da LGT, introduzido pela Lei n.º 55 – A/2010, de 31 de Dezembro, o princípio da indisponibilidade dos créditos tributários sobrepõe-se a qualquer outra legislação especial.
b) – No que diz respeito à diferenciação das condições de reembolso entre Instituições Financeiras, Sociedades de Garantia Mútua, Credores Garantidos, Locações Financeiras e fornecedores / credores comuns, a sua diferenciação encontra cabimento na exceção prevista na parte final do nº 1 do art 194.º do CIRE e justifica-se pelo facto de a devedora necessitar do apoio das instituições bancárias em face da falta de liquidez que atravessa.
Os credores garantidos possuem garantias reais sobre os imóveis da devedora. Em caso de falência ou liquidação, esses credores têm prioridade sobre os ativos garantidos em relação aos credores comuns, o que significa que são os primeiros a serem pagos com o produto da venda desses bens.
Os credores que concederam financiamento, com garantias reais, basearam sua decisão de crédito na segurança oferecida pelos imóveis da empresa. Dessa forma, é fundamental garantir que esses credores recuperem a totalidade de seus créditos, incentivando assim o financiamento da empresa.
Ao propor o pagamento da totalidade do capital aos credores garantidos, a devedora cria um ambiente propício para atrair novos financiamentos e investimentos na empresa. Os potenciais financiadores e investidores podem sentir-se mais confiantes ao saber que recuperarão a totalidade dos seus créditos.
Realça-se, ainda neste contexto, a necessidade de a Devedora manter relações bancárias equilibradas, de forma a garantir das instituições financeiras os financiamento e linhas de crédito essenciais ao sucesso da sua revitalização económica e financeira.
O plano de recuperação depende assim da continuidade do apoio das instituições bancárias e financeiras, face à falta de liquidez daquela.
6.9. Efeitos Legais do Plano:
a) Qualquer processo de natureza executiva que esteja a decorrer contra a CL S.A., será extinto, nos termos do n.º 1 do artigo 17.º-E do CIRE, com aprovação e homologação do presente plano de revitalização, promovendo-se, de imediato, pelo cancelamento de todas e quaisquer penhoras efetuadas no âmbito desses mesmos processos.
b) Qualquer processo de natureza declarativa em que a devedora intervenha como Ré ou como Autora e que tenha como objecto o reconhecimento de direitos ou créditos, ainda que os créditos se encontrem reconhecidos, de forma condicional ou não, nos presentes autos, deverão prosseguir os seus termos, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos e transitada em julgado a sentença que os reconheceu, os termos previstos no presente Plano, para créditos de igual natureza.
c) As ações executivas pendentes para cobrança de dívidas à Autoridade Tributária e Segurança Social não são extintas mantendo-se suspensas após aprovação e homologação do plano de revitalização, (extinguindo-se estas apenas nos termos do CPPT), nos termos das disposições da LGT, do CPPT e demais legislação aplicável.
d) Todas as acções declarativas e procedimentos cautelares que venham a ser propostas e tenham em vista o reconhecimento de créditos sobre a CL S.A., anteriores à nomeação de AJP, cujos créditos não se encontrem reconhecidos nos presentes autos, deverão prosseguir os seus termos, aplicando-se a tais créditos, uma vez reconhecidos, os termos previstos no Plano para créditos de igual natureza.
e) Com a sentença de homologação, produzem efeito todos os parâmetros e alterações nele previstas com impacto nos créditos sobre a CL S.A., independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados, tal como determina o n.º 1 do art.º 217.º do CIRE.
6.10. Nos termos do nº 3 do artigo 209º, do CIRE
O Plano de Recuperação acautela os créditos que sejam eventualmente controvertidos em processo de impugnação, por forma a garantir o mesmo tratamento.
6.11. Fiscalização da Execução do Plano
O plano de recuperação será objecto de fiscalização pela Sra. Administradora Judicial Provisória.
A devedora fica obrigada a prestar com prontidão quaisquer informações solicitadas no âmbito da fiscalização do cumprimento do plano.
6.12. Cláusula "Salvo Regresso de Melhor Fortuna"
É intenção da Revitalizanda proceder ao pagamento da totalidade dos créditos estipulados no presente plano de recuperação nas condições e percentagens definidas, no entanto, caso o desempenho económico da CL S.A., assim o permita, poder-se-á, de forma generalizada, proceder à liquidação antecipada e integral dos pagamentos a credores.
Nos termos desta cláusula, se a situação económico-financeira da CL S.A., permitir uma libertação de meios para além das prestações do Plano, que lhe possibilite efetuar pagamentos adicionais aos fornecedores sem comprometer o seu regular funcionamento, a devedora compromete-se a efetuar os reembolsos totais ou parciais dos montantes.
7. MANUTENÇÃO DA ACTIVIDADE DA EMPRESA
Conforme supra referido, a finalidade do Plano Especial de Revitalização é assegurar a viabilidade económico-financeira da Devedora e que esta mantém a sua actividade num quadro em que os activos excedem o valor do passivo e do capital social e os rendimentos gerados são os suficientes para cobrir os custos.
A continuação da actividade é assegurada pelo prosseguimento da actividade imobiliária, esperando-se angariar novos investimentos nos curto e médio prazos.
8. IMPACTO DAS ALTERAÇÕES RESULTANTES DO PLANO, COMPARATIVAMENTE COM A AUSÊNCIA DO MESMO
Na ausência do presente Plano, a Devedora teria inevitavelmente de apresentar-se à insolvência, pois não lograria satisfazer os valores vencidos aos credores, nem os impostos decorrentes da respectiva actividade. Neste contexto, para além de todas as consequências negativas do ponto de vista económico e social associadas ao encerramento da actividade e de todos os inconvenientes associados ao processo (custos e morosidade, menor flexibilidade na gestão do património, risco de desvalorização dos imóveis decorrentes de fire sales), cabe referir que os credores comuns provavelmente não veriam qualquer parte dos seus créditos ressarcida, uma vez que os activos imobiliários da Devedora se encontram hipotecados para garantia de créditos e as vendas em sede judicial são sempre menos proveitosas.
Pode, pois, concluir-se que o presente Plano representa a alternativa que melhor serve os interesses económicos e sociais subjacentes à consagração do processo especial de revitalização de empresas, ao abrigo do qual se garante o pagamento integral a todos os credores reclamantes excepto aos credores subordinados. A homologação do presente Plano, é a alternativa que melhor assegura a satisfação relativa dos direitos dos credores, em particular dos credores comuns.
9. O PLANO DE VIABILIDADE ECONÓMICA E FINANCEIRA
Nos mapas seguintes podemos encontrar as perspectivas económico financeiras da CL, SA, para o período expectável do plano de recuperação, com o limite máximo de 120 meses, incluindo uma carência inicial de 12 meses.
Pressupostos do Plano:
9.1 Passivo a Reestruturar / Liquidar:
Por tipo de Credor - Créditos Sobre a Devedora
Para efeitos da presente proposta de regularização dos créditos sobre a devedora, foram considerados os discriminados no mapa da página seguinte:
9.2 Rendimentos:
9.3. Gastos Gerais – F.S.E.
9.4 Gastos com o Pessoal:
9.5 Demonstração Financeiras - Resultados Previsionais:
9.6 Demonstração Financeiras - Balanços Previsionais:
9.7 Demonstração da Viabilidade Financeira:
Fica então demonstrada a capacidade da empresa, em termos de tesouraria e fluxos de caixa positivos, para fazer face aos compromissos decorrentes do plano e dos restantes compromissos correntes e de investimento
9.9 Comentários:
As demonstrações financeiras históricas e Previsionais e os indicadores económicos daí resultantes, apresentam valores bastante positivos ao longo do estudo, com resultados económicos e cash-flow acima do limiar das necessidades financeiras assumidas. Desta forma fica garantida a continuidade do negócio.
Os indicadores financeiros apresentam na sua generalidade uma evolução favorável. O que indica que a empresa fruto do plano proposto recupera a solidez financeira e a capacidade para responder perante os seus compromissos.
Assim sendo, da conjugação do bom desempenho económico, que contribui para a recuperação da estabilidade financeira, associada ao plano de conversão de passivo de curto prazo em passivo de médio longo prazo, conforme plano de recuperação proposto, é recuperado o equilíbrio económico-financeiro da empresa e a correspondente capacidade de fazer face aos compromissos operacionais, decorrentes do plano de recuperação proposto e de liquidar todo o passivo.
Desta forma, segundo o plano de recuperação, e com base no estudo de viabilidade apresentado, fica assegurada a capacidade da empresa em cumprir com os planos apresentados aos demais credores em processo de recuperação, nomeadamente no Plano de Recuperação aqui apresentado.
Pelos motivos até agora expostos, a recuperação assume-se de longe como a melhor solução, mais satisfatória ao interesse dos credores.
10. Análise da situação económico-financeira da empresa na ausência de qualquer plano de Insolvência / recuperação:
Tendo em devida consideração o conteúdo do presente documento, os pilares que sustentam a revitalização da sociedade, e por todos os motivos expostos a recuperação da sociedade assume-se como a solução que mais satisfará os interesses dos credores.
Para além da CL S.A. e dos seus órgãos de representação continuarem a confiar na Recuperação e viabilidade da empresa, o que também é uma realidade, é que os cenários resultantes da aprovação do Plano de Revitalização nos termos apresentados, e uma possível declaração de insolvência decorrente da não aprovação são bastantes discrepantes. Senão vejamos:
Resultado da recuperação:
a) Aos credores garantidos é efetuado o pagamento de 100% do capital reconhecido;
b) Aos credores comuns é efetuado o pagamento entre 100% do capital reconhecido;
c) Aos credores subordinados é efetuado o pagamento de 50% do capital reconhecido, após a liquidação a todos os outros;
Resultado da liquidação:
Como é do conhecimento geral verificar-se-ia uma drástica diminuição do valor real dos bens, como acontece, sem exceção, nos processos de liquidação. Por várias razões, a fraca atividade económica, acrescendo ao facto de imóveis e equipamentos, vendidos num processo de liquidação seriam substancialmente desvalorizados, pretendendo os interessados adquirir por preços substancialmente abaixo do seu valor de mercado.
Estima-se, no cenário de liquidação, que os credores receberão uma percentagem muito reduzida dos seus créditos.
11. Considerações Finais:
Após reflexão sobre o assunto em apreço, resume-se o plano da seguinte forma:
A CL, SA, encontra-se numa situação de dificuldades tesouraria e financeiras que a impossibilita de cumprir com todos os seus compromissos financeiros já assumidos.
A CL, SA, está neste momento privada dos meios financeiros necessários para o normal funcionamento da sua atividade, nomeadamente meios financeiros oriundos de crédito, bancário e crédito de fornecedores.
Se atendermos aos pressupostos expostos no plano de recuperação e nomeadamente no estudo de viabilidade económico-financeiro nele incluído, e se observarmos as demonstrações financeiras previsionais a que deram origem, e onde já se encontram incluídos os efeitos decorrentes das medidas de reestruturação propostas, incluindo as de carácter financeiro, chegamos à conclusão de que:
A CL SA, será uma empresa viável, em caso de aprovação do plano de recuperação, capaz de a pôr em prática, e capaz de gerar neste novo cenário, pós PER:
a) Resultados e desempenhos económicos positivos, conforme demonstrações de resultados previsionais, fomentadores de cash-flows igualmente positivos e suficientes para fazer face ao serviço da dívida, prestações decorrentes do plano de recuperação proposto aos seus credores, nomeadamente o pagamento em prestações das suas dívidas.
b) A implementação e execução deste Plano de revitalização, mantendo CL S.A. em atividade, configura um cenário de recuperação da totalidade dos respetivos créditos pelos credores.
c) Prevê-se que, após um período inicial de 1 ano em que a empresa irá fortalecer a sua capacidade reditícia, será possível gerar os cash flows suficientes para honrar, de forma autónoma e sem recurso a financiamento, os compromissos assumidos neste Plano;
d) A avaliação económica e financeira das contas previsionais, medido através de um conjunto de indicadores de atividade, rentabilidade, produtividade e equilíbrio financeiro evidenciam a consistência do projeto que se pretende implementar.
Assim, parece ter ficado demonstrada a consonância do Plano de Recuperação aqui apresentado, com a estratégia de continuidade da CL SA, e da sua administração, com o interesse maior dos credores de receber os seus créditos, sendo o diferimento dos pagamentos, a única via possível.
Esperamos assim, a melhor apreciação e eventuais contributos por parte dos credores da CL, porquanto está nas suas mãos a aprovação do Plano de Recuperação, no âmbito do PER aqui apresentado.”
*
3.2. Fundamentos de direito
            Importa, antes de mais, clarificar o objeto do presente recurso, atenta a tramitação seguida na primeira instância e acima descrita no relatório.
No caso dos presentes autos, a não homologação do plano foi, em tempo, pedida por vários credores e com fundamentos diversos[11].
Assim, o Ministério Público pediu a não homologação invocando:
- o incumprimento de regras tributárias como a não efetivação do pagamento dos créditos tributários que se vão vencendo e o incumprimento de prévios planos prestacionais;
- que a proposta não vem acompanhada da descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa, em violação da al. b) do nº 1 do art. 17º-F do CIRE;
- que a proposta não veio acompanhada de declaração de contabilista certificado ou revisor oficial de contas atestando que a devedora não está insolvente, datada de menos de 30 dias antes;
- ser desconhecida a contabilidade da devedora do exercício de 2023;
- nas contas do exercício de 2022 juntas aos autos não foi junto parecer do órgãos de fiscalização nem certificação legal de contas;
- não há elementos que permitam avaliar um decréscimo nas contas a receber de 8,8 milhões de euros em relação às contas de 2022;
- de entre a 1ª versão do plano apresentada para a 2ª versão do plano apresentada há uma redução das carteiras de créditos sem explicação;
- a cláusula do plano que prevê a venda dos bens e a repartição do respetivo produto pelos credores não contempla a Autoridade Tributária, o que viola o princípio da igualdade;
- não se compreende a conjugação das cláusulas do plano que preveem a extinção das ações executivas e a não extinção das execuções por créditos tributários e da Segurança Social;
- o plano prevê o cancelamento imediato de todas as penhoras o que incluirá as da Autoridade Tributária;
- não se prevê o pagamento de juros vincendos;
- o Plano prevê “Nos termos do nº 3 do artigo 209º do CIRE, que o Plano de Recuperação acautela os créditos que sejam eventualmente controvertidos em processo de impugnação, por forma a garantir o mesmo tratamento.”. Sucede que o plano apenas pode acautelar os créditos que sejam controvertidos em impugnação da lista de credores do PER e não em “processos de impugnação” (o tratamento dado aos créditos reclamados no PER não se aplica a créditos que venham a surgir de impugnações judiciais);
- não se vislumbra qualquer plano de recuperação, apenas aumento do prazo de pagamento das dívidas;
- as projeções não se encontram fundamentadas quanto à capacidade de libertação de meios para cumprimento do plano;
- nos últimos contactos com a Autoridade Tributária não houve colaboração por parte da devedora.
 GB e LB pediram a não homologação do plano alegando:
- que o Plano viola o princípio da igualdade dos credores, sendo idêntico ao já recusado por esse motivo no Processo Extraordinário de Viabilização;
- inexistência de negociações, vício procedimental que determina a não homologação.
EGI, SA e LBV vieram pedir a não homologação oficiosa do plano de recuperação, alegando:
Como violações procedimentais não negligenciáveis:
- que a devedora, ao iniciar o processo juntando um plano igual ao que já havia recusado em processo extraordinário de viabilização agiu de forma contrária ao princípio da boa-fé;
-  que o processo foi iniciado com a manifestação de vontade de uma credora que, no momento da constituição de parte do crédito estava especialmente relacionada com a devedora;
- inexistência de negociações;
Como violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do Plano:
- o plano não ser acompanhado pela descrição da situação patrimonial, financeira e reditícia da empresa, desconhecendo-se o valor do passivo da mesma, em violação do disposto na al. b) do nº1 do art. 17º-F;
- a falta dos elementos previstos nas als. g) e h) do mesmo preceito;
- por violação do princípio da igualdade, dado a credora EGI ser tratada de forma diversa dos demais credores garantidos sem qualquer indicação de motivo e por os credores subordinados beneficiarem de tratamento diferenciado, os quais parecem ter sido equiparados aos credores comuns;
E nos termos do art. 216º nº1, al. a) do CIRE:
- alegando que o cenário de liquidação em insolvência é o mais provável e que nesse caso a credora EGI lograria recuperar a totalidade do seu crédito com base na venda dos ativos onerados, dado que a sua garantia é superior ao montante que do plano para si resulta;
- que também a credora LBV ficaria em situação mais benéfica no caso de insolvência, dado que receberia o pagamento do seu crédito antes dos credores subordinados, os quais, no plano em apreço, receberão simultaneamente com os credores comuns, sendo-lhe também prejudicial o facto de se prever perdão dos créditos comuns e, em simultâneo, pagamento de credores subordinados.
Condomínio A veio pedir a não homologação do Plano, invocando:
- violação do princípio da igualdade;
- inexistência de negociações entre a devedora e os credores.
O tribunal a quo não apreciou ou sequer mencionou as demais causas de não homologação invocadas nos autos pelos interessados, tendo-se limitado a referir:
“No caso dos autos, os credores ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, GB, LB, EGI, S.A., e LBV  apresentaram requerimentos, pugnando nomeadamente pela não homologação do plano, em síntese, por entenderem que o plano apresentado viola o princípio da igualdade entre credores.
A revitalizanda respondeu nomeadamente pugnando pela não violação do principio da igualdade de credores.”
E conhecendo, o tribunal a quo decidiu não homologar o plano exclusivamente com fundamento na violação do princípio da igualdade, enquanto violação não negligenciável de norma aplicável ao conteúdo do plano e não referiu, em qualquer momento, qualquer dos demais fundamentos invocados, não tendo, nomeadamente, declarado prejudicado o respetivo conhecimento pela apreciação efetuada.
Ou seja, de entre a panóplia de fundamentos invocados pelos credores o tribunal apenas conheceu – e parcialmente em relação ao que havia sido invocado – da violação do princípio da igualdade, sem apreciar sequer a aptidão dos demais enquanto causas de não homologação.
Apenas a devedora apelou e, de mérito, apenas colocando em causa a violação do princípio da igualdade conhecida pelo tribunal a quo, pelo que o conhecimento deste tribunal de recurso está delimitado nestes termos.
Dois dos credores que haviam solicitado a não homologação do Plano com base em fundamentos diversos da violação do princípio da igualdade responderam ao recurso, mas sem lançar mão do disposto no art. 636º do CPC.
Estabelece o art. 636º nº1 do CPC que «No caso de pluralidade de fundamentos da ação ou da defesa, o tribunal de recurso conhece do fundamento em que a parte vencedora decaiu, desde que esta o requeira, mesmo a título subsidiário, na respetiva alegação, prevenindo a necessidade da sua apreciação.»
E o nº2 prevê ainda que o recorrido, ou seja, o vencedor, a título subsidiário argua a nulidade da sentença ou impugne a decisão sobre a matéria de facto que o recorrente não tenha impugnado, igualmente prevenindo a hipótese da procedência das questões por este suscitadas.
As nulidades da sentença incluem a omissão de pronúncia (615º nº1, al. d) do CPC).
Para os efeitos da alínea d) do nº1 do art. 615º do CPC, quando se comina com nulidade a sentença, em que o juiz “…deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…” referem-se as questões que constituem o objeto da sentença. A alínea d) do nº1 do art. 615º deve ser conjugado com o artº 608º, com vista à determinação das questões a resolver na sentença. Essas questões, aquelas que se impõe ao juiz resolva na sentença são, em primeira linha as questões de forma, alegadas pelas partes ou de conhecimento oficioso e finalmente as questões de fundo, que constituem o mérito da causa, suscitadas pelas partes como fundamento do pedido ou como fundamento das exceções e ainda as que o juiz deva conhecer oficiosamente – cfr. nº2 do art. 608º.
“A falta (ou omissão) de pronúncia está prevista na primeira parte da referida al. d) e decorre da violação das normas que impõem ao tribunal o dever de tomar posição sobre certa questão, o que ocorre tanto para as questões de conhecimento oficioso (cf., por ex., os artigos 578.º e 579.º), como para as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação (cf. a primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º).”[12]
Num caso como o presente, em que um pedido que cumpria conhecer, de não homologação de plano de recuperação aprovado em PER, foi formulado com vários fundamentos, alguns dos quais de conhecimento oficioso, o não conhecimento daqueles outros fundamentos, sem qualquer declaração de prejudicialidade, seria suscetível de ser invocado como omissão de pronúncia, mediante a arguição da nulidade a que já aludimos.
Ora, precisamente, as nulidades da sentença previstas no art. 615º do CPC, “não são de conhecimento oficioso, pelo que se não forem arguidas pela parte, sanam-se com o decurso do prazo para a sua arguição, pelo que o tribunal superior não pode conhecer delas.”[13]
O facto de alguns dos fundamentos cujo conhecimento foi omitido serem de conhecimento oficioso não altera a impossibilidade do conhecimento oficioso da nulidade correspondente ao seu não conhecimento, caso a situação viesse a ser enquadrada como tal.
Como escreve Miguel Teixeira de Sousa[14] “A circunstância de o tribunal não ter conhecido de uma causa de nulidade de conhecimento oficioso implica a nulidade da decisão por omissão de pronúncia (cf. art. 615.º, n.º 1, al. d), CPC), mas, uma vez transitada em julgado a decisão sem a arguição da sua nulidade, nada pode obstar à preclusão decorrente do ónus de concentração da defesa na contestação (art. 573.º, n.º 1, CPC). O que é de conhecimento oficioso pelo tribunal numa acção também pode ser alegado pelo réu nessa mesma acção, pelo que a omissão desta alegação e da impugnação da decisão por nulidade implica a referida preclusão.”
Aqui chegados, e verificando-se que a enquadrável nulidade por omissão de pronúncia, que, a proceder, implicaria o conhecimento subsidiário dos motivos de não homologação invocados e não conhecidos na 1ª instância, por este tribunal, caso constassem dos autos os elementos suficientes para tal, não foi arguida por qualquer dos intervenientes no recurso, nomeadamente pelos recorridos, nos termos previstos no nº2 do art. 636º do CPC, conclui-se que qualquer dos demais fundamentos de não homologação arguidos nos autos que não a violação do princípio da igualdade tal como foi conhecida pelo tribunal a quo está fora do objeto deste recurso.
O disposto no art. 665º do CPC – regra da substituição pelo tribunal recorrido – não se aplica no caso concreto pelas seguintes ordens de razões:
O disposto no art. 665º do CPC aplica-se em caso de declaração de nulidade da sentença (665º nº1 do CPC) ou quando o tribunal recorrido tenha deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio (665º nº2).
Ora como vimos, não há qualquer possibilidade de declaração de nulidade por omissão de pronúncia, dado que não foi arguida, não tendo o tribunal considerado prejudicado qualquer ponto.
Como refere Abrantes Geraldes, em anotação ao art. 665º do CPC[15] “[há] que distinguir os casos a que se aplica a ampliação do objeto do recurso, nos termos do artigo 636.º (decaimento em algum fundamento de facto ou de direito ou verificação de nulidade da sentença), daqueles em que, em face da matéria de facto que está provada e das questões jurídicas que a mesma suscita, se exige que se extraiam da decisão respetiva as consequências que o estado do processo impuser.”
Feito este enquadramento prévio há que passar ao conhecimento do objeto de mérito do recurso tal como fica circunscrito.
*
3.2.1. Violação do princípio da igualdade
Dando-se aqui por reproduzidas todas as considerações expendidas em 3.1.1. quanto à origem, caraterísticas e funções do processo especial de revitalização, há agora que conhecer dos fundamentos do recurso interposto tal como supra delimitado.
No caso dos autos, verificada a aprovação[16] do plano de recuperação apresentado pela devedora, foi proferida uma decisão de não homologação com fundamento na violação do princípio da igualdade, nos termos do art. 215º do CIRE, aplicável nos termos do art. 17º-F, nº7, do mesmo diploma.
A decisão recorrida enumerou as regras legais aplicáveis (17º-F nº7, 215º e 216º do CIRE), indicou ter sido arguida a violação do princípio da igualdade de credores, indicou ter que apreciar os motivos de recusa oficiosa do plano, aludiu ao conceito de negligenciabilidade, definiu violações procedimentais, citando doutrina e jurisprudência e transcreveu o art. 194º do CIRE.
Seguidamente fundamentou a decisão alcançada nos seguintes termos:
Analisado o plano temos que o mesmo beneficia os credores subordinados em detrimento dos credores comuns.
Os credores subordinados continuam a beneficiar um tratamento diferenciado.
Desde logo, porque se pretende com que os respetivos créditos destes sejam parcialmente pagos, muito embora não se preveja no plano o pagamento integral dos créditos comuns (cujos credores veem, desta forma, reduzido o montante a receber da devedora, em prol dos credores subordinados).
Por outro lado, não se pode deixar de referir, que, para efeitos de atribuição de classes de credores, a devedora equiparou os fornecedores aos credores comuns, sem que, no entanto, se concretizasse quais as entidades que considera qualificarem-se, nesta sede, como fornecedores,
Ou seja, tendo em conta a descrição que a devedora já fez dos credores subordinados no processo deste Juízo de Comércio de Lisboa, Juiz 2, com o n.º 25768/21.7T8LSB, “(…)
a) Os créditos subordinados são quem faz a gestão e recuperação dos créditos, e inclusive a gestão dos imóveis da CL, o montante em dívida de uma dessas empresas que detém créditos subordinados ascende a mais de €200.000,00, estas empresas estão na disposição e no acordo de continuarem os seus respetivos trabalhos para com a devedora, de acordo com os termos da lei; (…)” estes serão os “fornecedores” que a devedora pretende beneficiar no plano ora em apreço, ao serem equiparados aos credores comuns.
Quando, na realidade, se tratam de credores subordinados.
É notório que a aprovação do plano representa assim para os credores comuns uma situação mais grave do que a possa resultar da insolvência da requerente.
Ainda que os credores subordinados prestem serviços à requerente, não pode a continuação da atividade de requerente prosseguir com o sacrifício dos credores comuns que em situação de insolvência seriam pagos com prioridade sobre os subordinados.
O plano representa para os credores comuns uma situação claramente mais desfavorável e beneficia os credores subordinados, os quais com a aprovação do plano adquirem natureza distinta por decisão da requerente e dos subscritores do Acordo, logo seriam pagos, prejudicando os credores comuns, situação contrária a que se verificaria em caso de insolvência.
Ocorre, assim, e em conclusão, violação não negligenciável de normas aplicáveis ao conteúdo do plano que impede a sua homologação, a saber do artigo 194º do CIRE, pelo que, nos termos do art.º 215º do CIRE, aplicável ex vi art.º 17º-F, n.º7, do mesmo diploma, há que recusar a homologação do plano de recuperação apresentado pela devedora e aprovado pela maioria dos seus credores.”
A apelante entende que o tribunal concluiu erradamente que o plano beneficia os credores subordinados em relação aos credores comuns porque:
“1.º A aprovação do plano determina que os credores comuns fiquem numa situação mais gravosa do que a que pode resultar da insolvência da recorrente, pois vêm o seu crédito pago apenas parcialmente, até em comparação com os credores subordinados, os quais teriam prioridade no pagamento;
2.º Para efeitos de atribuição de classes de credores a recorrente equiparou os fornecedores a credores comuns, sem concretizar quais as entidades que qualifica como tal, sendo de concluir que tais fornecedores que se pretendem beneficiar, equiparando-os a credores comuns, são, na verdade, credores subordinados.”
Quanto ao primeiro ponto, argumenta, os credores comuns vão receber integralmente o capital em dívida, sendo apenas perdoados os juros vencidos e vincendos e previsto o pagamento em 120 prestações mensais e sucessivas com um período de carência de 12 meses enquanto que os créditos subordinados apenas receberão 50% do capital em dívida, sendo objeto de perdão 50% do capital e juros vencidos e vincendos, sendo que o respetivo recebimento só sucederá após o pagamento de todos os demais créditos abrangidos pelo Plano. Assim nem os credores comuns ficam numa situação mais gravosa do que o que poderia resultar da insolvência nem os credores subordinados têm prioridade no pagamento dos seus créditos.
Quanto ao segundo ponto aponta que o Tribunal não se poderia ter feito valer da classificação feita noutro processo para presumir que quis incluir os fornecedores nos credores subordinados. Lembra que não estava sujeita à obrigação de tratar os credores em categorias, valendo as classes de créditos previstas no CIRE. Os fornecedores integram os credores comuns não ocorrendo qualquer violação das regras aplicáveis ao conteúdo do Plano.
O Ministério Público, no tocante à matéria objeto do recurso entende que estão a ser equiparados credores comuns e subordinados, os quais em situação de insolvência seriam os últimos a receber, e que previsivelmente tal não sucederia. Alega terem sido equiparados fornecedores e credores comuns sem especificar, com referência à lista provisória quem serão esses fornecedores e se serão os credores subordinados. Do plano resulta o pagamento aos credores subordinados com primazia sobre os outros credores, que não vêm pago o valor total de capital e juros.
EGI, SA e LBV alegam, quanto à matéria objeto do recurso a que respondem, ser falso que os credores comuns sejam pagos a 100%, dado que a Administradora Judicial Provisória reconheceu créditos comuns de € 2.137.836,51€, enquanto que no Plano a devedora apenas se propõe pagar 1.023.637,82€ e reconhece apenas a quantia de 1.130.152,34. Alega ainda que a devedora confessou, no processo extraordinário de viabilização que os fornecedores eram credores subordinados e aquele plano faz prova plena dessas declarações, não sendo suscetível de ser contrariado por outros meios de prova (arts. 376º nº2 do CC e 607º nºs 4 e 5 do CPC).
Apreciando começaremos por recordar as medidas propostas quanto ao pagamento aos fornecedores e credores comuns e créditos subordinados:
“6.5. Fornecedores e Credores Comuns
Plano de Regularização
A CL, propõe o pagamento de 100% do capital em dívida, com perdão de juros vencidos e vincendos, a pagar em 120 prestações mensais e sucessivas, após um período de carência de 12 meses.
A amortização da dívida obedecerá ao seguinte calendário:
- Ano 1: Período de carência total de amortização de capital;
- Ano 2: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor;
- Ano 3: Pagamento de 5,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 4: Pagamento de 7,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 5: Pagamento de 10,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 6: Pagamento de 12,50% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 7: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 8: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 9: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
- Ano 10: Pagamento de 15,00% da dívida com amortizações mensais correspondentes a 1/12 daquele valor.
O primeiro pagamento da amortização de capital ocorrerá no décimo terceiro mês após a data do trânsito em julgado da sentença de homologação do plano. Os pagamentos seguintes serão feitos de forma mensal e sucessiva.
A Devedora, após o trânsito em julgado da sentença de homologação do plano, compromete-se a diligenciar pela venda dos imóveis constantes do seu activo imobiliário por valores de mercado e a distribuir o produto da venda em paridade pelos seus credores, sendo pagos em primeiro lugar os credores que tenham garantia real sobre os imóveis alienados, sendo o remanescente distribuído pelos restantes na proporção dos créditos e privilégios reconhecidos incluindo a Administração Tributária e Segurança Social.
Não sendo o produto da venda suficiente para liquidação dos montantes em dívida, após amortização a prestação do plano será recalculada, mantendo-se os prazos e termos estabelecido
 6.6. Créditos Subordinados
Plano de Regularização:
Para os créditos subordinados a CL, Lda., propõe o pagamento de 50% do capital em dívida, com perdão do remanescente e dos juros vencidos e vincendos, a pagar após o pagamento de todos os restantes créditos objeto do PER.s no plano de pagamentos supra apresentado.”
A devedora aponta, no Plano, como passivo a reestruturar € 3.654.151,04, num quadro que não faz parte do Plano, mas antes dos elementos que o devem acompanhar.
Ainda assim, e quanto ao ponto levantado pelas credoras EGI e LBV, fácil é ver que, na sua alegação conclusiva, não tiveram em conta o facto de, no quadro constante do plano, a devedora ter separado os credores públicos dos demais credores, não distinguindo, quanto a estes a natureza dos créditos, dado que prevê pagar a estes credores da forma (diversa dos demais) prevista no Plano, independentemente das respetivas naturezas, sendo que tais créditos têm parcelas garantidas, privilegiadas e comuns. Aliás, a diferença apontada pela credora, crê-se que por lapso de desatenção, resulta da subtração dos créditos comuns dos credores públicos ao total de credores comuns listado pela Sra. AJP.
Mas na verdade, o que é homologado é o Plano que contém a proposta a ser votada pelos credores e não os respetivos anexos. No caso, o conteúdo do Plano consta do Ponto 6, sendo a tabela erigida pelas credoras em fundamento de discórdia apenas um dos elementos relativos à viabilidade do plano a usar para a avaliação desta. Tal é óbvio pelo próprio Plano e pela previsão no mesmo das alíneas b) e d) da cláusula 6.9.[17]
Assim, e como alegado pela recorrente, o Plano aprovado prevê o pagamento de 100% do capital dos credores comuns e o perdão dos juros vencidos e vincendos, prevendo o pagamento em 120 prestações mensais e sucessivas, ou seja, em 10 anos, após 12 meses de carência.
E o Plano prevê o pagamento de 50% dos créditos subordinados com perdão integral de juros, a pagar após o pagamento dos demais credores, ou seja, a pagar daqui a 11 anos (1 ano de carência e 10 anos de prestações) e apenas se o capital dos credores públicos e dos credores garantidos e comuns for entretanto integralmente satisfeito.
A decisão recorrida entende que os credores subordinados beneficiam de um tratamento diferenciado por receberem parte dos seus créditos sem que haja pagamento integral dos credores comuns. Os credores comuns, conclui a decisão recorrida vêm reduzido o montante a receber da devedora “em prol” dos credores subordinados.
O raciocínio do tribunal recorrido não é exatamente o apontado pela recorrente. O tribunal não considerou “que os credores comuns fiquem numa situação mais gravosa do que a que pode resultar da insolvência da recorrente”. O que claramente o tribunal recorrido censurou foi a não aplicação da regra da prioridade absoluta, ou seja, o facto de uma das categorias não ser integralmente paga havendo pagamento a uma categoria de grau inferior.
Um primeiro ponto a relevar é que, de facto, os credores comuns não são integralmente pagos. Não se trata, como já vimos de não se tratar de um pagamento de 100% do capital, mas sim da previsão de perdão de juros vencidos e vincendos, em especial dos já vencidos.
A regra da prioridade absoluta “exige que nenhum credor das categorias discordantes deixe de ser pago na íntegra antes do pagamento aos credores das categorias inferiores ou menos graduadas.
(…)
Em contrapartida, a regra da prioridade relativa exige – exige apenas – que as categorias discordantes de credores sejam tratadas pelo menos tão favoravelmente como as categorias que tenham a mesma posição e mais favoravelmente dos que as categorias inferiores ou menos graduadas”[18]
A regra da prioridade relativa veio a ser acolhida como standard mínimo na versão final do art. 11º nº1, al. c) da Diretiva 2019/1023[19] e, na respetiva transposição, o legislador português consagrou esta como regra para os Processos Especiais de Revitalização em que o devedor trate os seus credores em categorias – art. 17º-F, nº7, al. c) do CIRE.
O presente não é um caso de PER aprovado por categorias de credores, pelo que a regra não se lhe aplica, sendo aplicável a regra geral de aferição de violação do princípio da igualdade.
Na verdade, entre nós, desde a entrada em vigor das regras que instituíram o PER, em 2012 sempre funcionou como limite de aferição o princípio da igualdade, o qual quadra bem melhor com a regra da prioridade relativa do que com a regra da prioridade absoluta, a regra claramente aplicável em processo de insolvência, atento o disposto nos arts. 172º e ss. do CIRE.
Um PER não é um processo de insolvência, é um processo pré-insolvencial, pelo que a flexibilidade da regra da igualdade pela forma como foi sendo trabalhada e modelada pela doutrina e pela jurisprudência sempre se aproximaram mais da prioridade relativa do que da prioridade absoluta.
Hoje em dia, mediante a opção do legislador português – que podia ter transposto para o PER por categorias a regra da prioridade absoluta, não o tendo feito – a não aplicação da regra da prioridade absoluta, como regra, em PER, é uma evidência, mesmo para os PERs clássicos, sem tratamento dos credores em categorias.
É assim face à regra da igualdade que devemos ponderar o tratamento dado aos credores, sem prejuízo de sindicarmos se a regra da prioridade relativa, como indicador e não como limite, é cumprida.
Temos assim perdão integral de juros vencidos e vincendos seja para os credores comuns, seja para os credores subordinados, recebendo os primeiros, em 10 anos, 100% do capital, enquanto que os segundos receberão 50%, após o término dos dez anos e do pagamento integral de todos os créditos não subordinados.
Poderemos censurar o mero facto de se prever pagamento para os credores subordinados? Sabemos que não, dado que, mesmo em processo de insolvência se prevê a possibilidade da previsão do pagamento dos créditos subordinados em plano de insolvência – cfr. art. 197º al. b) do CIRE, a contrario.
Temos, claramente, um tratamento mais favorável dos credores comuns do que dos credores subordinados, ou seja, a regra da prioridade relativa está assegurada.
Assim, o que importa indagar – correspondendo ao que o tribunal recorrido censurou – é se o perdão dos juros vencidos e vincendos surge desproporcional, à luz do princípio da igualdade, ao pagamento de 50% do capital dos créditos subordinados após o pagamento integral de 100% do capital dos créditos comuns e garantidos (e pagamento integral dos credores públicos).
Nos termos do art. 194º do CIRE, aplicável nos termos dos arts. 17º-F nº7 e 215º do CIRE:
«1 - O plano de insolvência obedece ao princípio da igualdade dos credores da insolvência, sem prejuízo das diferenciações justificadas por razões objectivas.
2 - O tratamento mais desfavorável relativamente a outros credores em idêntica situação depende do consentimento do credor afectado, o qual se considera tacitamente prestado no caso de voto favorável.
3 - É nulo qualquer acordo em que o administrador da insolvência, o devedor ou outrem confira vantagens a um credor não incluídas no plano de insolvência em contrapartida de determinado comportamento no âmbito do processo de insolvência, nomeadamente quanto ao exercício do direito de voto.»
O princípio da igualdade arranca do tratamento, por princípio, de todos os credores por igual, permitindo, porém, diferenciações justificadas por razões objetivas.
Esta dimensão material do princípio – devem ser tratadas por igual situações iguais e de forma distinta, situações distintas -, corporiza uma das mais importantes e convocadas regras aplicáveis ao conteúdo do plano ou do acordo, e tem sido tratado pela jurisprudência como uma regra imperativa, que arranca diretamente do tecido constitucional, cuja violação é, por regra, não negligenciável[20].
Perpassa quer na jurisprudência do Supremo, quer das Relações, que, exceção feita aos créditos tributários, as razões objetivas diferenciadoras têm que constar do plano. Será essa a única forma de controlo do cumprimento do princípio.
São em geral aceites noções como credores estratégicos (não no sentido das necessidades de aprovação, mas das necessidades dos devedores), como por exemplo no Ac. TRC de 17/03/15, já citado; e, em geral, a diferenciação baseada na diferente classificação de créditos é permitida (Acs. TRE de 17/03/16[21] e de 10/09/15[22]; Ac. TRP de 07/04/16[23]; Ac. TRL de 28/01/16[24]); ainda assim, quando baseadas na diferente classificação de créditos, a jurisprudência não tem deixado de censurar excessos: como no caso do Ac. TRE de 21/04/16 (Bernardo Domingos – 1065/15), no qual todos os créditos eram perdoados à exceção do credor hipotecário, ou no caso do Ac. TRG de 25/02/16 (Francisco Xavier – 2588/15), em cujo plano o credor hipotecário recebia integralmente o seu crédito, enquanto os demais se viam reduzidos a 15%, apontando-se que a revitalização estava a ser integralmente suportada por estes últimos credores, ou ainda no caso de pagamento de 100% dos créditos tributários e apenas 15% dos demais, no Ac. TRL de 16/12/2021 (Manuela Espadaneira Lopes – 26908/20).
            A regra geral é de que todos os credores estão em situação de igualdade perante o património do devedor – cfr. arts. 601º e 604º do Código Civil.
            Existem, porém, causas de preferência no pagamento, legalmente consagradas e que podem incidir sobre alguns bens ou todos os bens do devedor, as quais constituem exceções ao princípio da igualdade dos credores perante o património do daquele.
            Incluem-se nestes as garantias e os privilégios, sendo que o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas veio consagrar a repartição dos credores por classes – art. 47º do citado diploma e, em especial, o nº4 – sendo garantidos os créditos que beneficiem de garantias reais, incluindo os privilégios especiais, privilegiados os créditos que beneficiem de privilégios creditórios gerais, subordinados os créditos enumerados no art. 48º, exceto quando beneficiem de privilégios ou garantias que se não extingam por efeito da declaração de insolvência (cfr. art. 97º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas) e comuns os demais créditos.
            Tratam-se de normas aplicáveis em PER, como o demonstra a maioria de votos prevista no nº5 do art. 17º-F do CIRE, no qual se estabelecem duas maiorias de aprovação, que importam o cômputo de créditos subordinados e não subordinados.
            A diferenciação por classes de credores enforma a apreciação do princípio da igualdade tal como o entendemos, sendo clara a necessidade de tratamento de todos os credores dentro da mesma classe, ou seja, nas mesmas condições, de forma igualitária, a menos que razões objetivas e ponderosas os diferenciem.
            Porque objetivamente os credores que beneficiam de um regime de exceção ao princípio par conditio creditorum – sejam garantias, sejam privilégios, sejam um estatuto menorizado – não estão em pé de igualdade com os créditos que deles não gozam ou sofrem, a diferenciação entre classes e a diferença de tratamento entre elas surge justificada pela necessidade de tratar por igual o que é igual e por desigual o que é desigual.
            Daí que, por regra, se aceite o pagamento em montante superior aos créditos garantidos – que sempre receberiam pelo produto da venda dos bens garantidos, em cenário de liquidação ou de execução e, por regra, se preveja um menor pagamento, ou mesmo um perdão aos créditos subordinados, aqueles que, na ordem legal da regra da prioridade seriam os últimos a receber, por regra, em cenário de insolvência, não chegando a ser satisfeitos[25].
             É por essa razão que o princípio da igualdade, tal como vem sendo entendido e aplicado, acaba por condizer muito bem com a regra da prioridade relativa – como refere Catarina Serra[26]  “É possível dizer que a prioridade relativa é uma combinação de dois princípios/duas regras: o princípio/a regra segundo a qual deve dar-se às categorias superiores tratamento mais favorável e às categorias inferiores tratamento menos favorável  e o princípio/a regra segundo a qual a categorias iguais deve dar-se tratamento igualmente favorável.”
            O princípio da igualdade, no entanto, tem ainda maior dose de flexibilidade, dado que permite ainda que esta regra base sofra desvios, desde que justificados por razões objetivas e que não se apresentem desrazoáveis ou desproporcionais.
Passando ao caso concreto temos um cenário traçado como sendo de ativo superior ao passivo e falta de liquidez, o que constitui um indício no sentido da desnecessidade de previsão de perdão integral dos créditos subordinados.
            No entanto, é também indício da desnecessidade de perdão aos créditos de categoria imediatamente superior, ou seja, os créditos comuns.
            Se o ativo chega para pagar todo o passivo, reunidas as condições para tal, o perdão de parte dos créditos só se explica por ausência de liquidez.
A grande diferença entre este Plano e o anteriormente apresentado por esta devedora em PEVE é exatamente esta: no anterior Plano havia perdão de parte do capital dos créditos comuns e pagamento integral do capital dos créditos subordinados, o que significava que a recuperação ficava a cargo “apenas” dos credores comuns, os quais, aliás, recebiam um tratamento menos favorável que os credores subordinados; neste Plano há ainda perdão dos créditos comuns, mas muito menor (apenas juros vencidos e vincendos) e os credores subordinados são pagos, mas com perdão de juros e metade do capital e são sujeitos a uma verdadeira condição, que se traduz em apenas receberem se e quando os demais sejam integralmente pagos.
            O que foi censurado no Plano apresentado em PEVE foi que uma classe de credores que seria a última a ser paga pela ordem prevista em insolvência o fosse integralmente enquanto que a classe imediatamente superior, representando cerca de 52% do seu universo de credores, apenas receberia 50% dos seus créditos, por via de um perdão.
            O presente Plano é totalmente diferente.
            Não só é integralmente respeitada a regra da prioridade relativa, como, acrescentamos, não vemos no facto de se contrapor perdão de juros aos credores comuns com pagamento de 50% do capital aos credores subordinados qualquer desproporção merecedora de censura.
            Sendo respeitada a regra da prioridade relativa, temos garantido o cumprimento do princípio da igualdade.
            Ainda que assim se não considere, à luz do princípio da igualdade não surge como desproporcionado impor aos credores comuns o perdão de juros e ainda assim prever o pagamento 50% do capital dos credores subordinados, nomeadamente quando se assegura que este pagamento não será feito sem que aqueles (e os demais credores não subordinados) recebam integralmente os seus créditos nos termos previstos no Plano.
            Não surpreendemos, assim, no tratamento dado aos credores comuns e subordinados qualquer violação do princípio da igualdade.
            O segundo fundamento que o tribunal a quo usou para fundamentar a sua decisão de não homologação foi, e recordando, ainda como violação do princípio da igualdade, que, face a declaração efetuada no anterior processo de PEVE pela devedora e ao facto de ter equiparado fornecedores a credores comuns nas cláusulas do plano, estarem (ou haver o risco de estarem) a ser tratados como credores comuns fornecedores que são credores subordinados.
            O plano anterior não tratava os credores subordinados como credores comuns. A devedora destacava ali o facto de alguns dos credores subordinados serem fornecedores como justificação para o tratamento que lhes estava a dar naquele plano (tratamento que não lhes deu no Plano que estamos agora a apreciar), e que foi censurado pelas instâncias.
            Neste processo correu o prazo de reclamação de créditos, foi apresentada a lista provisória, a qual foi objeto de impugnações conhecidas quanto a dois credores comuns e não houve qualquer impugnação quanto aos credores e respetivos créditos qualificados como subordinados, que, assim, passaram à lista definitiva de créditos nesses exatos termos.
            Não é pelo facto de alguns desses credores serem (ou não, trata-se de ponto que aqui não cabe ou sequer releva averiguar) fornecedores que deixam de ser credores subordinados.
E sendo credores subordinados, fornecedores ou não, vão ser tratados nos termos previstos no ponto 6.6. do Plano.
Como destaca a devedora, no presente PER não optou pelo tratamento dos seus credores em categorias, único caso em que poderia relevar uma categoria de “fornecedores”. Por outro lado, não podemos considerar o segmento do plano apresentado em processo anterior transcrito no despacho recorrido como “confissão” de que (todos) os fornecedores eram credores subordinados.
O que a credora apelada considera confessório é o seguinte trecho, retirado do Plano que a devedora apresentou em PEVE:
“(…)
a) Os créditos subordinados são quem faz a gestão e recuperação dos créditos, e inclusive a gestão dos imóveis da CL, o montante em dívida de uma dessas empresas que detém créditos subordinados ascende a mais de €200.000,00, estas empresas estão na disposição e no acordo de continuarem os seus respetivos trabalhos para com a devedora, de acordo com os termos da lei; (…)”
A confissão é «o reconhecimento que a parte faz da realidade de um facto que lhe é desfavorável e favorece a parte contrária.» - art. 352º do CC.
O segmento do Plano apresentado em PEVE pela devedora nem constitui a admissão de um facto que lhe é desfavorável, nem de um facto favorável a seja quem for, dado que estes processos (incluindo PEVE, PER, PEAP e insolvência após decretada), por um lado são processos sem partes e, já em esforço de lógica, caso assim se não entendesse, não favorecem qualquer outro interveniente no procedimento que não os próprios credores subordinados e só por via de um Plano que não chegou a ser homologado.
Não se tratando da admissão de qualquer facto desfavorável à devedora naquele PEVE o nº2 do art. 376º do CC não tem aplicação, fazendo aquele plano prova plena apenas de que a devedora, naquele local e naquele procedimento para aquele efeito, declarou o que ficou transcrito, nos termos do nº1 do art. 376º do referido diploma.
Depois, basta um olhar à lista definitiva de créditos para verificar que é tão provável a existência de credores comuns que são fornecedores, como o seu contrário[27], pelo que não podemos afirmar, como o fez o despacho recorrido, que nesta parte não pode ser mantido, que “estes serão os “fornecedores” que a devedora pretende beneficiar no plano ora em apreço, ao serem equiparados aos credores comuns. Quando, na realidade, se tratam de credores subordinados.” Pode perfeitamente haver fornecedores que são credores comuns.
Finalmente, não se consegue sequer compreender a lógica do afirmado quando o universo de credores subordinados é todo tratado da mesma forma, sem qualquer distinção de quem seja ou não fornecedor.
Não se surpreende, em resumo, qualquer violação do princípio da igualdade nas disposições do Plano votado e aprovado pelos credores da devedora no presente Processo Especial de Revitalização, pelo que, em integral procedência da apelação, há que revogar o despacho recorrido e homologar o Plano em causa.
*
Os credores apelados, porque vencidos, suportarão integralmente as custas do presente recurso que, in casu se traduzem apenas nas custas de parte devidas, porquanto se mostra paga a taxa de justiça devida pelo impulso processual do recurso e o recurso não envolveu diligências geradoras de despesas – arts. 663.º, n.º 2, 607.º, n.º 6, 527.º, n.º 1 e 2, 529.º e 533.º, todos do Código de Processo Civil[28].
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5. Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em, julgando integralmente procedente a apelação:
a) Revogar a decisão recorrida;
b) Homologar, nos termos do 17º-F nºs 7 e 11 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, o plano de recuperação da devedora CL, SA, pessoa coletiva nº …, com sede na Avenida …, em Lisboa, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Lisboa sob o mesmo número.
A presente decisão vincula todos os credores, mesmo que não hajam participado nas negociações – artº 17º-F, nº 11 do CIRE.
Custas do procedimento pela apresentante com taxa de justiça reduzida a ¼ - arts. 17º-F, nº 12 e 302º nº 1, ambos do CIRE - sendo o valor da ação para efeitos de custas equivalente ao da alçada da Relação, nos termos do art. 301º do CIRE.
Registe, notifique e publicite nos termos dos arts. 37º e 38º, ex vi nº 11 do art. 17º-F, todos do CIRE.
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Custas de parte na presente instância recursiva pelos recorridos.
Notifique.
*
Lisboa, 15 de outubro de 2024
Fátima Reis Silva
Nuno Teixeira
Amélia Sofia Rebelo
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[1] A recorrente entende que na sentença foi dado como provado “Em 27 de Março de 2024 foi publicado no portal Citius anúncio, dando conta de ter sido junta ao processo nova versão do plano de revitalização.»
[2] Diploma ao qual pertencem todos os artigos citados sem referência.
[3] Em Lições de Direito da Insolvência, Almedina, 2018, pg. 333.
[4] Que estabelece «Os processos regulados no presente diploma regem-se pelo Código de Processo Civil, em tudo que não contrarie as disposições do presente Código.»
[5] Todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[6] Disponível, como os demais arestos citados sem referência, em www.dgsi.pt e no qual se sumariou “IV - Em caso de impugnação de crédito reclamado, a decisão que sobre ela recaia não tem como finalidade dirimir litígios sobre a existência, natureza ou amplitude desse crédito.
V - Essa decisão, como decisão incidental, está, sob pena de nulidade (artigo 615º, nº 1, alínea b) do Código de Processo Civil ex vi do artigo 17º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas), subordinada ao dever de nela se enunciarem os factos provados e não provados e bem assim de motivação da respetiva decisão de facto, maxime através da análise crítica dos meios de prova apresentados pelo credor reclamante que tenha visto o seu crédito ser excluído da lista definitiva.” 
[7] José Gonçalves Machado, em Instrumentos de recuperação de empresas pré-insolventes, Almedina, 2023, pg. 209, propõe a seguinte definição para o plano de recuperação: “um encontro de vontades por parte dos vários sujeitos envolvidos no processo negocial, tendo em conta a sua situação concreta, particularmente a natureza dos seus créditos, no caso de terem relações pré-constituídas, e os seus interesses atuais, para antigos e novos credores.”
[8] Como aliás a própria recorrente assinala nas conclusões 10ª e ss.
[9] O conteúdo do plano é também relevante para determinação do direito de voto nos termos do art. 212º nº2, al. a) do CIRE).
[10] Dado que foi alegada a violação do princípio da igualdade, ou seja, de regra imperativa relativa ao conteúdo do plano.
[11] Sem qualquer juízo da nossa parte quanto à aptidão do alegado enquanto causa de não homologação de um plano de recuperação aprovado.
[12] Rui Pinto, Em Os meios reclamatórios comuns da decisão civil (artigos 613.º a 617.º CPC), Julgar Online, maio de 2020, pg.21.
[13] Rui Pinto, local citado na nota anterior, pg. 10.
[14] Em Blog do IPPC, 20/02/2015 “O que significa o conhecimento oficioso da nulidade?”, disponível em https://blogippc.blogspot.com/2015/02/o-que-significa-o-conhecimento-oficioso.html.
[15] Em Recursos em Processo Civil, 7ª edição, Almedina, 2022, pg. 388, nota 604.
[16] A decisão recorrida não é assertiva quanto a este ponto, apenas afirmando “O administrador judicial provisório juntou o mapa de apuramento da votação do plano e os votos, informando que o mesmo foi aprovado, nos termos constantes do requerimento de 15.04.2024.”, mas a aprovação não foi posta em causa por qualquer dos intervenientes.
[17] As quais implicam o tratamento dos credores em causa, desde que abrangidos, nos termos do Plano pelo valor que lhes venha a ser reconhecido e que pode não coincidir ou mesmo não constar da lista provisória de créditos.
[18] Catarina Serra Em face do Direito da insolvência iminente. O tratamento justo como condição para a reestruturação forçada da dívida: prioridade absoluta ou relativa?, V Congresso de Direito da Insolvência, coord. Catarina Serra, Almedina, 2019, pg. 16.
[19] Diretiva (UE) 2019/1023 do Parlamento Europeu e do Conselho de 20 de junho de 2019 sobre os regimes de reestruturação preventiva, o perdão de dívidas e as inibições, e sobre medidas destinadas a aumentar a eficiência dos processos relativos à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas, e que altera a Diretiva (UE) 2017/1132, disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32019L1023&qid=1717826092703.
[20] Neste sentido, entre muitos outros, os Acs. TRC de 17/03/15 (Henrique Antunes – 338/13); TRC de 27/06/2017 (Isaías Pádua – 8389/16); TRP de 08/07/15 (Manuel Domingos Fernandes – 261/14); TRP de 30/01/2024 (Maria da Luz Seabra – 462/22); TRL de 09/06/16 (Ondina Carmo Alves - 17154/15); TRL de 28/04/2020 (Paula Cardoso - 7771/19), TRL de 11/07/2024 (Manuela Espadaneira Lopes – 8294/23).
[21] Relatado Por Manuel Bargado, processo nº 1228/15.
[22] Relatado Por Alexandra Moura Santos, processo nº 63/14.
[23] Relatado por Carlos Querido, processo nº 1709/15.
[24] Relatado por Ilídio Sacarrão Martins, processo nº 1702/15.
[25] O cenário mais frequente é o do ativo inferior ao passivo.
[26] Local citado, pg. 18.
[27] Por exemplo a EDP ou a CMC.
[28] Vide neste sentido Salvador da Costa in Responsabilidade das partes pelo pagamento das custas nas ações e nos recursos, disponível em https://blogippc.blogspot.com/.