Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | BERNARDINO TAVARES | ||
Descritores: | PROPRIEDADE INDUSTRIAL PATENTES SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 09/11/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Sumário: | - Deve ser declarada a suspensão da instância se existirem duas ações suscetíveis de dar origem a decisões com resultados incompatíveis e/ou inconciliáveis; - Não se justificada a suspensão de uma ação quando o resultado da outra seja insuscetível de a comprometer. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa: * I - Relatório Bayer Intellectual Property GMBH instaurou ação declarativa, sob processo comum, contra Germed Farmacêutica, Lda tendo formulado os seguintes pedidos: “a) Abster-se de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou pôr à venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, os medicamentos genéricos constantes das A.I.M.’s em causa nos presentes autos, até à caducidade do CCP 346, EP 1411932, EP 1689370, EP 1720866 e EP 1845961 objecto da presente acção; b) Abster-se de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou pôr à venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, qualquer medicamento contendo a substância activa “RIVAROXABANO”, até à caducidade do CCP 346, objecto da presente acção; c) Abster-se de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou pôr à venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, qualquer medicamento contendo a substância activa “RIVAROXABANO”, utilizado em conformidade com o âmbito de protecção das EP 1411932, EP 1689370, EP 1720866 eEP 1845961, objecto da presente acção, até à caducidade dos referidos direitos; d) Não transmitir a terceiros as A.I.M.’s em causa nos presentes autos, até à caducidade das patentes e CCPs objecto da presente acção; e) Pagar uma sanção pecuniária compulsória, à razão diária de € 35.000, por cada dia de importação, armazenamento, fabrico, manipulação, embalamento, colocação em circulação e a venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, de qualquer produto farmacêutico contendo a substância activa “RIVAROXABANO”, em infracção dos direitos de propriedade industrial da Autora e em caso de eventual incumprimento da condenação que vier a ser proferida de acordo com os pedidos supra indicados, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil.” * A Ré deduziu contestação, apresentando defesa por impugnação e por exceção, e concluiu que: “1. Deve ser julgada procedente a exceção de falta de interesse em agir por parte da autora e ser decretada a absolvição da instância. 2. Quando assim não se entenda e se venha a dar como provado que a autora é titular das patentes e dos certificados complementares de que se arroga, deve a ré ser absolvida dos pedidos consistentes em: i. não transmitir a terceiros as A.I.M.’s em causa nos presentes autos, até à caducidade das patentes e CCPs objecto da presente acção; e, ii. a pagar uma sanção pecuniária compulsória, à razão diária de €35.000, por cada dia de importação, armazenamento, fabrico, manipulação, embalamento, colocação em circulação e a venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, de qualquer produto farmacêutico contendo a substância activa “RIVAROXABANO”, em infracção dos direitos de propriedade industrial da Autora e em caso de eventual incumprimento da condenação que vier a ser proferida de acordo com os pedidos supra indicados, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil, por falta de fundamentos legais. 3. Caso venha a ser julgado procedente os pedidos que a autora apresenta sob as alíneas a) a c), devem os mesmos apenas ser atendidos, caso, na data da sentença as patentes e CCPs, ainda se encontrarem em vigor, atendendo as datas que a própria autora apresenta para a sua caducidade. 4. As custas devem ser atribuídas à autora que deu causa à ação.” * A A., a 7 de julho de 2022, em requerimento autónomo, respondeu à matéria da exceção. * Na audiência prévia, mediante requerimento da A., foi homologada a desistência parcial do pedido relativamente à Patente 1411932, “por ter chegado ao seu limite de vigência”, e julgado extinto nessa parte o direito que se pretendia fazer valer. * A Ré, a 14 de fevereiro de 2024, apresentou requerimento autónomo onde pugna pela suspensão da instância e, no caso de esta não ser concedida, pela designação de técnico com competências especializadas nas matérias técnicas em causa na ação. * A A., a 5 de março de 2024, respondeu ao requerimento de suspensão, pugnando pelo indeferimento. * O Tribunal da Propriedade Intelectual proferiu a seguinte decisão: “Assim sendo, ao abrigo do disposto no art.º 272º, nº1, do CPC, suspendo a instância até prolação das decisões nos processos abaixo descriminados, salvo se em algum deles for decretada a suspensão da instância, caso em que se impõe a reavaliação da situação: . Processo n.º 302/21.2YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade Farmoz – Sociedade Técnico Medicinal, S.A., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 125/21.9YHLSB (Juiz 3), onde a aí Ré, a sociedade Pentafarma – Sociedade Técnico Medicinal, S.A. deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 199/21.2YHLSB (Juiz 1), onde a aí Ré, a sociedade Biofarmoz – Sociedade Técnico Medicinal, Unipessoal, Lda. deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 222/21.0YHLSB (Juiz 1), onde a aí Ré, a sociedade alemã Stada Arzneimittel, AG deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 330/21.8YHLSB (Juiz 1), onde a Ré, a sociedade Ciclum Farma Unipessoal, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 360/22.2YHLSB (Juiz 3), onde a aí Ré, a sociedade Laboratórios Anova – Produtos Farmacêuticos, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 479/22.0YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade espanhola Towa Pharmaceutical, S.A., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 236/23.6YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade Sandoz Farmacêutica, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 12/24.9YHLSB (Juiz 2), ação intentada pela Generis Farmacêutica, S.A. contra a Bayer com vista à apreciação da validade da EP’961 e declaração da nulidade da patente EP’961. Sem efeito a audiência final para amanhã designada. DN.” * Inconformada com tal decisão, veio a A. Bayer Intellectual Property GMBH interpor recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões: “A. O presente recurso vem interposto da Decisão proferida pelo Douto Tribunal a quo, datada de 12 de Março de 2024, que, ao abrigo do disposto no art.º 272.º, n.º 1, do CPC, suspendeu a presente instância até prolação das decisões nos processos supra descriminados, salvo se em algum deles for decretada a suspensão da instância, caso em que se impõe a reavaliação da situação. B. É desta decisão que a Apelante ora recorre, pelas razões que adiante se explanarão: - DA PRESENTE ACÇÃO: C. Apresentou a Autora, ora Apelante a acção judicial em apreço peticionando, entre outras coisa a condenação da Ré, ora Apelada, a Abster-se de importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou pôr à venda, directa ou indirectamente, quer em Portugal, quer para exportação, os medicamentos genéricos constantes das A.I.M.’s em causa nos presentes autos, até à caducidade do CCP 346, EP 1411932, EP 1689370, EP 1720866, EP 1845961, objecto da presente acção. D. Veja-se que, o processo judicial em causa teve origem na invocação, por parte da Autora, ora Apelante, dos seus Direitos de Propriedade Industrial, decorrentes da titularidade de quatro patentes europeias, validadas em Portugal, e um Certificado Complementar de Protecção, entre elas, a PATENTE EUROPEIA N.º 1845961, com a epígrafe “TRATAMENTO DE DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS COM RIVAROXABANO”. E. Apresentou a Ré a sua Contestação, sem colocar em causa, quer a título de excepção, quer através de pedido reconvencional, a validade de qualquer um dos direitos objecto desta acção. F. A Ré, ora Apelada, também não impugnou os factos relativos à existência de infracção das patentes objecto da presente acção, a verificar-se a comercialização dos seus medicamentos genéricos contendo “rivaroxabano”. G. Em sede de Despacho Saneador, entendeu o Tribunal a quo que restaria apenas demonstrar: - se a substância ativa do xarelto é o rivaroxabano. - Se a Ré pretende importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou pôr à venda, directa ou indirectamente, os medicamentos genéricos constantes das A.I.M.’s por ela requerida, durante a validade do CCP 346, concedido com base na EP 1261606, e com validade até 02/04/2024, durante a validade das EPs 1689370, (com validade até 13/11/2024), da EP1720866, (com validade até 13/11/2024), e da EP1845961, (com validade até 19/01/2026). - se a conduta da Ré nos termos supra-descritos causa prejuízos à Ré e qual o montante desses prejuízos. H. Tendo ficado a Audiência de Discussão e Julgamento agendada para o dia 13 de Março de 2024. I. Do exposto, resulta claro que a validade da patente europeia, validada em Portugal n.º 1845961, com a epígrafe “TRATAMENTO DE DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS COM RIVAROXABANO”, nunca foi posta em causa no presente processo, não tendo resultado merecedor de prova, em sede de discussão em sede de Audiência de discussão e julgamento, qualquer facto que se prendesse com os requisitos de patenteabilidade do referido direito. J. No entanto, a poucos dias da realização da referida Audiência de discussão e julgamento, a Ré invocou a pendência das acções igualmente identificadas na decisão ora recorrida. K. Entendendo que se justificava, que a apreciação e decisão do litígio destes autos aguardem, pelo menos, a decisão que será proferida no processo n.º 320/21.2YHLS sobre o pedido reconvencional de declaração de nulidade da EP’961 ali formulado, decisão que potencialmente trará mais clareza à correta apreciação do que está em causa nesta ação. L. A Autora, ora Apelante, discordou e opôs-se a este pedido, na medida em que entendeu que a decisão a ser proferida nestes autos, a ser de condenação da Ré nos termos peticionados, não está dependente do resultado das acções, identificadas pela Ré, no âmbito das quais que foi requerida (na sua quase totalidade na sequência de um pedido reconvencional) a declaração de nulidade da patente EP 1845961. M. Ainda assim, decidiu o Tribunal a quo, não só suspender a instância até à prolação da decisão no Proc. n.º 302/21.2YHLSB, que corre termos no Juiz 2 deste Tribunal, como até prolação de todas (!) as decisões dadas a conhecer pela Ré, ora Apelada, inclusivamente, uma acção já intentada no decurso do corrente ano (Processo n.º 12/24.9YHLSB), ou seja, 2 anos após a apresentação da presente acção. N. Ora, salvo o devido respeito, a ora Apelante não pode concordar com a decisão da Mm.ª Juiz em questão por considerar, não só, ter existido nulidade por os fundamentos estarem em oposição com a decisão, como que o entendimento perfilhado pelo Douto Tribunal a quo, não se encontra correcto à luz dos critérios legais aplicáveis ao caso em apreço, pelas razões que adiante se exporão. Senão vejamos, - DA NULIDADE DA DECISÃO RECORRIDA, NOS TERMOS DO N.º 1, ALÍNEA C) DO ARTIGO 615.º DO CPC: O. Como supra indicado, entendeu o Tribunal a quo que: Veio a Ré requerer a suspensão da instância comfundamento no facto da validade da patente 1845961(EP’961) que serve de base ao certificado complementar de proteção n.º 346 (CCP 346), a qual protege à fórmula do Rivaroxabano, tersido posta emcausa quanto à sua validade, estando a decorrerváriasacções onde foi requerido, por via reconvencional, a sua nulidade, P. Ora, tal não se encontra factualmente correcto, na medida em que, ao contrário do indicado pelo Tribunal a quo a patente 1845961 (EP’961) não serve de base ao certificado complementar de proteção n.º 346 (CCP 346), nem protege a fórmula do Rivaroxabano. Q. Nem tal foi, aliás, invocado pela Ré, ora Apelada. R. Com efeito, e como indicado pela Autora, ora Apelante, na sua Petição Inicial, a PATENTE EUROPEIA N.º 1845961, com a epígrafe “TRATAMENTO DE DISTÚRBIOS TROMBOEMBÓLICOS COM RIVAROXABANO”, protege um regime terapêutico do rivaroxabano. (ver artigos 97.º a 100.º da Petição Inicial apresentada pela ora Apelante). S. Aliás, seguidamente na decisão recorrida, o Tribunal a quo indica isso mesmo: “(…) a EP 1845961 protege um regime terapêutico do Rivaroxabano, T. Para, logo a seguir indicar: entende-se que a apreciação da validade de qualquer uma destas patentes não assume relevância para o que aqui se discute, dado como se mostrar configurada a ação pela Autora. Todavia, nas demais ações em que se discute o composto e sua formulação, ou seja, em que é posta em causa a validade da patente 1261606, estas têm influência na decisão aqui a proferir, pelo que não se pode restringir a causa prejudicial apenas à ação que se encontra em vias de ser julgada e não estender às demais onde também é discutida a apreciação da validade da EP 1261606. U. Ou seja, o Tribunal a quo, erradamente, assume que as acções em curso nas quais foi colocada em causa a validade de um dos direitos invocados pela Autora, ora Apelante, na presente acção, dizem respeito à patente do composto Rivaroxabano – a EP 1261606, essa sim, que serve de base ao certificado complementar de proteção n.º 346 (CCP 346). V. Indicando, expressamente que, quanto à patente EP 1845961, que protege um regime terapêutico do Rivaroxabano, entende-se que a apreciação davalidade de qualquer uma destas patentes não assume relevância para o que aqui se discute. W. Mas é, exactamente, a validade da patente EP 1845961, e não da patente EP 1261606, que foi colocada em causa nas acções identificadas supra e indicadas pelo Tribunal a quo como prejudiciais em relação ao presente processo. X. Há assim, uma contradição insanável na fundamentação da decisão do Tribunal a quo, na medida em que a referida fundamentação leva a uma decisão contrária àquela que foi tomada. Y. Sendo que, o Tribunal a quo, na decisão de suspensão da presente instância, indica, inclusivamente, as razões porque entende que esta não deveria ser suspensa. Z. Ora, estamos claramente perante uma decisão cujos fundamentos estão em clara oposição com a mesma, tendo, assim, total aplicação a alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC. AA. Estado, portanto, tal decisão, que suspendeu o presente processo, ferida de nulidade. Nulidade essa que se requer, com as legais consequências. Assim não se entendendo, o que se conjectura por mero dever de patrocínio, sempre se dirá o seguinte: - DA MATÉRIA DE DIREITO: BB. Como supra indicado, o Tribunal a quo, ao abrigo do disposto no art.º 272.º, n.º 1, do CPC, suspendeu a presente instância até prolação das decisões em 9 (nove) processos. CC. Tendo entendido que todas estas acções configuravam causa prejudicial em relação à presente acção. DD. Sucede que, nem a Ré, ora Apelada, requereu a suspensão da presente instância até prolação de decisão em todas estas acções, tendo limitado o seu pedido de suspensão, até decisão proferida no processo n.º 320/21.2YHLS sobre o pedido reconvencional de declaração de nulidade da EP’961 ali formulado. EE. Processo esse que já se encontrava numa fase muito avançada, com audiência de julgamento agendada para o corrente mês de Abril de 2024 (com continuação entretanto agendada para Maio de 2024). FF. E processo, esse sim, anterior à presente acção, ao contrário do que sucede com o Processo n.º 360/22.2YHLSB (Juiz 3), o Processo n.º 479/22.0YHLSB (Juiz 2), o Processo n.º 236/23.6YHLSB (Juiz 2) e o Processo n.º 12/24.9YHLSB (Juiz 2) GG. Também eles indevidamente considerados prejudiciais em relação ao presente processo pelo Tribunal a quo e todos com data de apresentação posterior à presente acção. HH. O n.º 1 do artigo 272.º do CPC é claro quando indica que o Tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão em causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta (…) II. Pelo que, nos termos da lei, tais processos nunca constituiriam causa prejudicial à presente acção. A acrescer, JJ. A Apelante entende que nenhum dos processos indicados pelo Tribunal a quo como constituindo causa prejudicial à presente acção são, de facto, prejudiciais. KK. Na medida em que entende que a decisão a ser proferida nestes autos, a ser de condenação da Ré, ora Apelada, nos termos peticionados, não está dependente do resultado das referidas acções, no âmbito das quais foi requerida (na sua quase totalidade na sequência um pedido reconvencional) a declaração de nulidade da patente EP 1845961. LL. Veja-se que, tendo, nos termos da lei, a possibilidade de o fazer no presente processo, a título reconvencional, a Ré, ora Apelada, não peticionou a declaração de nulidade da patente EP 1845961. MM. A tal acresce que, o que é peticionado pela Autora, ora Apelante, nesta acção, a ser decretado, só terá efeitos enquanto se mantiverem válidos os direitos invocados por esta, incluindo a patente EP 1845961. NN. Deste modo, sendo proferida decisão que declare a nulidade da patente EP 1845961, o que se conjectura por mero dever de patrocínio, a Ré, ora Apelada, não ficará impedida - em virtude de condenação nos presentes autos -, de actuar dentro do âmbito de protecção que antes era conferido à Autora, ora Apelante, em virtude da titularidade do referido direito. Ademais, OO. Entendeu o Tribunal a quo manter a presente instância suspensa, até prolação de decisão em 9 (nove) processos, incluindo uma acção intentada já este ano (Processo n.º 12/24.9YHLSB (Juiz 2)). PP. Significa isto que a presente acção poderá manter-se suspensa por vários anos (!). QQ. Tal circunstância acarretará sérios prejuízos para a Autora, ora Apelante, que se verá impedida de obter uma decisão neste processo em tempo útil. RR. Veja-se que a Ré, ora Apelada, não colocou em causa a validade de qualquer um dos direitos invocados pela Autora, ora Apelante na presente acção. SS. E como é possível verificar, não só através da Contestação apresentada por esta, como também através dos Temas da Prova definidos no Despacho Saneador de fls._, a ora Apelada também não impugnou a existência de infracção dos direitos de propriedade industrial da ora Apelante, invocados nos presentes autos. TT. Direitos esses com as seguintes datas de validade: - Patente 1689370 (válida até 13-11-2024), - Patente 1720866 (válida até 13-11-2024) e - Patente 1845961 (válida até 19-01-2026) (cfr. consta do “Objecto do litígio”). UU. No entanto, a apesar desses factos - como a Autora, ora Apelante, indicou no seu requerimento de 21.02.2024 -, o Preço de Venda ao Público (PVP), dos medicamentos “Rivaroxabano Germed” da Apelada já foi aprovado. VV. Sendo tal circunstância claramente demonstrativa do facto de que a Ré, ora Apelada, se preparava para iniciar a comercialização dos seus medicamentos, ainda durante a vigência dos direitos da titularidade da Autora, invocados nesta acção. WW. Comercialização essa que, entretanto, se veio a verificar, conforme é possível verificar através da campanha que a Ré, ora Apelada, iniciou online e junto das farmácias, através do link https://forms.office.com/pages/responsepage.aspx?id=KxjQ5Vj0PECNBrglESQItqVG3ziVihxMm-L_k_LIm61UQk9aWTI3NlNJNEozNEFTMENJWEhaNjZZOS4u&utm_term=OCP%2bdh% 3f%3f%3f%3f%3f%3f%2bNovo%2bLancamento%3a%2bRivaroxabano%2bGermed%2b-%2bMG%2bdh%3f%3f%3f%3f%3f%3f&utm_campaign=OCP%2bPORTUGAL&utm_source=e-goi&utm_medium=email&eg_sub=bed79144d6&eg_cam=5bc9dd743346b03210a85a57ad3b7268&eg_list=13 e conforme, Doc. n.º 1, que se junta e aqui dá por integralmente reproduzido, e cuja admissão se requer a V.Exas. nos termos do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, na medida em que, tratando-se de uma actuação da Apelada verificada nos últimos dias, a sua apresentação só foi possível neste momento. XX. Estabelece o n.º 2 do artigo 272.º do CPC que “Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens.” (sublinhado nosso) YY. A jurisprudência também tem sido unânime no entendimento de que não deve ser decretada a suspensão da instância nos termos do art.º 272º, n.º 1, do CPC quando se verifique que os efeitos da suspensão acarretam graves prejuízos e desigualdades. Veja-se, nesse sentido, o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo n.º 4079/17.8T8VNF-A.G1, datado de 25-02-2021. ZZ. Ora, como a Apelante teve oportunidade de indicar na sua Petição Inicial, a comercialização pela Ré, em Portugal, dos medicamentos contendo o princípio activo “rivaroxabano”, sem o consentimento ou licença da autora, é susceptível de causar os gravíssimos prejuízos referidos nos artigos 138.º a 156.º daquela peça processual. AAA. Designadamente, prejuízos que advêm da clara privação dos lucros legítimos da Autora, ora Apelante, relativamente ao medicamento Xarelto®, em consequência de as necessidades do mercado virem a ser, em parte, satisfeitas (ilicitamente) pela Ré, ora Apelada, com os medicamentos genéricos contendo a substância activa “rivaroxabano”. BBB. Em face de tudo quanto supra se expôs, dúvidas não devem existir em como esteve mal o Tribunal a quo ao decidir a suspensão da presente instância, nos termos do n.º 1 do artigo 272.º do CPC. CCC. Deste modo, a decisão de suspensão da presente instância, da qual se recorre, acabou por violar o disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. c) do CPC, pelo que deve ser declarada nula, violando, igualmente, o disposto no artigo 272.º, n.ºs 1 e 2, do CPC, pelo que deve ser revogada.” Concluiu: “Termos em que, nos melhores de Direito, e sempre com o mui Douto suprimento de V. Exas., vem a Apelante requer, que seja dado provimento ao presente recurso, - Sendo declarada nula a Decisão a quo de suspensão da presente instância. Assim não se entendendo, - Sendo revogada a Decisão a quo, de suspensão da presente instância, com as legais consequências.” * Na sua resposta, a R. (…) pede a improcedência do recurso sem ter apresentado conclusões. * Os autos foram à conferência. * II - Questões a decidir O objeto do recurso é balizado pelas conclusões do apelante, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, não estando o tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista; não conhece questões novas, isto é, questões que não tenham sido apreciadas pelo Tribunal recorrido, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito, conforme resulta dos artigos 5.º, n.º 3, 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, todos do CPC. Assim, importa, no caso, apreciar e decidir: - se o despacho proferido pelo Tribunal a quo, que determinou a suspensão da instância, deve ser revogado e substituído por decisão que ordene o imediato prosseguimento dos autos. * II - Fundamentação. O Tribunal a quo fundamentou a decisão referida supra, nos seguintes termos: “ Veio a Ré requerer a suspensão da instância com fundamento no facto da validade da patente 1845961 (EP’961) que serve de base ao certificado complementar de proteção n.º 346 (CCP 346), a qual protege à fórmula do Rivaroxabano, ter sido posta em causa quanto à sua validade, estando a decorrer várias acções onde foi requerido, por via reconvencional, a sua nulidade, pelo que o pedido aqui formulado quanto à violação dos seus direitos resultante dessa proteção, extinguir-se-ão caso proceda o pedido de nulidade, existindo por isso uma causa prejudicial. Pronunciou-se a Ré em sentido oposto, alegando que o que é peticionado pela Autora nesta acção, a ser decretado, só terá efeitos enquanto se mantiverem válidos os direitos invocados por esta, incluindo a patente EP 1845961, mas que, caso se decida pela suspensão que apenas o deverá até que seja proferida decisão no processo Proc. n.º 302/21.2YHLSB, que corre termos no Juiz 2 deste Tribunal, e tem audiência de julgamento agendada para os dias 3, 8, 10 e 19 de abril de 2024, no âmbito do qual está a ser discutida a validade da patente EP’961. Nestes autos a Autora pretende que a Ré seja condenada a abster-se de comercializar importar, armazenar, fabricar, manipular, embalar, colocar em circulação, vender ou colocar à venda, direta ou indiretamente de medicamentos genéricos que contenham a substância ativa do Rivoraxabano, com fundamento na violação dos seus direitos que se mostram protegidos pelo referido CCP, emanado tendo por base a aludida EP 1845961. Nesta medida, estando em causa a validade de uma patente no qual assenta a validade do CCP, no qual por sua vez emanam os direitos que a Autora alega estarem a ser violados e com base no qual se pretende impedir essa violação, é inelutável que essa proibição só poderá ser acolhida se estiver comprovada a titularidade dos direitos de que a Autora se arroga, cuja existência depende da patente ser válida. Assim sendo, esta questão surge a priori, constituindo a sua apreciação causa prejudicial na medida em que afeta os fundamentos do que aqui se discute. Neste sentido o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 07-04-2005, no proc. nº 1091/2005: “Verifica-se a existência de uma causa prejudicial quando “a procedência da causa indicada como prejudicial reveste a virtualidade de uma efetiva e real influência na causa suspensa, por forma a poder concluir-se que a decisão desta depende incontornavelmente daquela” e ainda cfr. Acórdão do STJ de 09-05-2023 e Acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 15-07-2015, do Tribunal da Relação Lisboa de 13-12-2001, de 7-11-2023, in www.dgsi.pt. Uma vez que a EP 1411932 protege a combinação do rivaroxabano com outros compostos terapêuticos; a EP 1689370 protege um método de produção de uma composição farmacêutica que compreende rivaroxabano com outros compostos terapêuticos; a EP 1720866 protege um processo para a preparação do rivaroxabano; a EP 1845961 protege um regime terapêutico do Rivaroxabano, entende-se que a apreciação da validade de qualquer uma destas patentes não assume relevância para o que aqui se discute, dado como se mostrar configurada a ação pela Autora. Todavia, nas demais ações em que se discute o composto e sua formulação, ou seja, em que é posta em causa a validade da patente 1261606, estas têm influência na decisão aqui a proferir, pelo que não se pode restringir a causa prejudicial apenas à ação que se encontra em vias de ser julgada e não estender às demais onde também é discutida a apreciação da validade da EP 1261606. Assim sendo, ao abrigo do disposto no art.º 272º, nº1, do CPC, suspendo a instância até prolação das decisões nos processos abaixo descriminados, salvo se em algum deles for decretada a suspensão da instância, caso em que se impõe a reavaliação da situação: . Processo n.º 302/21.2YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade Farmoz – Sociedade Tecnico Medicinal, S.A., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 125/21.9YHLSB (Juiz 3), onde a aí Ré, a sociedade Pentafarma – Sociedade Técnico Medicinal, S.A. deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 199-21.2YHLSB (Juiz 1), onde a aí Ré, a sociedade Biofarmoz – Sociedade Técnico Medicinal, Unipessoal, Lda. deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 222/21.0YHLSB (Juiz 1), onde a aí Ré, a sociedade alemã Stada Arzneimittel, AG deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 330/21.8YHLSB (Juiz 1), onde a Ré, a sociedade Ciclum Farma Unipessoal, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 360/22.2YHLSB (Juiz 3), onde a aí Ré, a sociedade Laboratórios Anova – Produtos Farmacêuticos, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 479/22.0YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade espanhola Towa Pharmaceutical, S.A., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 236/23.6YHLSB (Juiz 2), onde a aí Ré, a sociedade Sandoz Farmacêutica, Lda., deduziu pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP’961; . Processo n.º 12/24.9YHLSB (Juiz 2), ação intentada pela Generis Farmacêutica, S.A. contra a Bayer com vista à apreciação da validade da EP’961 e declaração da nulidade da patente EP’961. Sem efeito a audiência final para amanhã designada. DN.” * Vejamos, então. Da nulidade da decisão. Dispõe o artigo 613.º do CPC, sob a epígrafe “Extinção do poder jurisdicional e suas limitações”, que: “… 3 – O disposto nos números anteriores, bem como nos artigos subsequentes, aplica-se, com as necessárias adaptações aos despachos.” Por sua vez, estabelece o artigo 615.º do CPC, sob a epígrafe “Causas de nulidade da sentença”, que: “1 – É nula a sentença quando: … c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; …”. A respeito desta alínea, o STJ, em acórdão proferido a 9 de fevereiro de 2017, no âmbito do processo 2913/14.3TTLSB.L1.S1, considerou que “Ocorre a nulidade prevista no art.º 615º, nº 1, al. c) do CPC quando os fundamentos referidos pelo juiz conduziriam necessariamente a uma decisão de sentido oposto ou, pelo menos, de sentido diferente, não se verificando quando a solução jurídica decorreu de interpretação dos factos, diversa da pretendida pelo arguente.” Por sua vez, a respeito da norma em apreço, no CPC Anotado por Abrantes Geraldes, é referido que “importa que se estabeleça uma separação entre nulidades de processo e nulidades de julgamento, sendo que o regime do preceito apenas a estas se aplica; as demais deverão ser arguidas pelas partes ou suscitadas oficiosamente pelo juiz, nos termos previstos noutros normativos.” Mais se refere na anotação à norma em análise que “acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso. Finalmente, reportando-se à nulidade prevista na alínea c), é ali referido que “… ocorre quando existe incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Situação que, sendo violadora do chamado silogismo judiciário, em que as premissas devem condizer com a conclusão, também não se confunde com um eventual erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide contrariamente aos factos apurados ou contra norma jurídica que lhe impõe uma solução jurídica diferente. A decisão judicial é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível e é ambígua quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes.” (Vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração, pág. 737 e 738). Importa agora aplicar os ensinamentos referidos ao despacho em crise. É nosso entendimento que a decisão em crise efetivamente apresenta a apontada nulidade. Vejamos porquê! Desde logo, porque os fundamentos avançados pela decisão excluem a decisão tomada, ou seja, a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final. Efetivamente, a decisão em crise assume que a apreciação da validade de qualquer uma das patentes, “a EP 1411932 protege a combinação do rivaroxabano com outros compostos terapêuticos; a EP 1689370 protege um método de produção de uma composição farmacêutica que compreende rivaroxabano com outros compostos terapêuticos; a EP 1720866 protege um processo para a preparação do rivaroxabano; a EP 1845961 protege um regime terapêutico do Rivaroxabano” não se mostra relevante “para o que aqui se discute, dado como se mostrar configurada a ação pela Autora.” (destaques são nossos). Mais, tendo admitido que as ações “em que se discute o composto e sua formulação, ou seja, em que é posta em causa a validade da patente 1261606, estas têm influência na decisão aqui a proferir, pelo que não se pode restringir a causa prejudicial apenas à ação que se encontra em vias de ser julgada e não estender às demais onde também é discutida a apreciação da validade da EP 1261606”. (destaques são nossos). Porém, tendo identificado diversas ações e referido que nessas as respetivas RR. deduziram “pedido reconvencional de declaração de nulidade da patente EP´961”, conclui pela suspensão da instância até à prolação das decisões naqueles processos. Dito de outra forma, tendo afastado a relevância, entre outras, da patente EP 1845961 para efeito do objeto dos autos, e atribuído a mesma à EP 1261606, suspendeu a instância – por reputar causa prejudicial – com base em processos onde se discute aquela. Nessa medida, reputamos os fundamentos em oposição com a decisão proferida. Em conclusão, entendemos que a decisão em crise padece de nulidade. * Reconhecida a nulidade da decisão em crise, importa considerar o disposto no artigo 665.º do CPC, ou seja, aferir da possibilidade de conhecer do objeto da apelação. Importa referir, para o efeito, que dispomos de todos os elementos necessários. * Da suspensão da instância. Dispõe o a artigo 269.º do CPC, sob a epígrafe “Causas”, que: “1 – A instância suspende-se nos casos seguintes: … c) Quando o tribunal ordenar a suspensão ou houver acordo das partes;” Por sua vez, estabelece o artigo 272.º do CPC, sob a epígrafe “Suspensão por determinação do juiz ou por acordo das partes”, que: “1 - O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 2 - Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superam as vantagens. 3 - Quando a suspensão não tenha por fundamento a pendência de causa prejudicial, fixa-se no despacho o prazo durante o qual estará suspensa a instância. 4 - As partes podem acordar na suspensão da instância por períodos que, na sua totalidade, não excedam três meses, desde que dela não resulte o adiamento da audiência final.” Em anotação a estas disposições, no CPC Anotado de António Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, é referido que “A suspensão da instância tem como efeito a paralisação da tramitação processual, na medida em que, enquanto perdurar, apenas podem ser praticados os atos urgentes destinados a evitar dano irreparável, nos termos do art.º 275.º, n.º 1.” Mais é referido que “apenas podem motivar a suspensão com esse motivo ações que tenham sido instauradas anteriormente à ação em causa, a não ser que se verifique uma relação de prejudicialidade relativamente a um processo da competência dos tribunais criminais ou dos tribunais administrativos e fiscais (art.º 92.º), em que o juiz pode decretar a suspensão, ou, como se diz nesse preceito, “sobrestar na decisão” até que o tribunal competente se pronuncie. Por outro lado, deve comprovar-se uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto da outra decisão (v.g. ação para cumprimento de um contrato e ação em que se invoque a nulidade do contrato). O nexo de prejudicialidade define-se assim: estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão de uma poder afetar o julgamento a proferir noutra; a razão de ser da suspensão, por dependência de causa prejudicial é a economia e a coerência de julgamentos; uma causa é prejudicial em relação à outra quando a decisão da primeira possa destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda … Ainda que esses dois requisitos se verifiquem, o juiz deve negar a suspensão fundada na prejudicialidade quando se demonstrar que a ação foi intentada precisamente para se obter a suspensão da outra ou, independentemente disso, quando o estado da causa tornar gravemente inconveniente a suspensão. É que não pode ignorar-se que a suspensão obsta a que a instância prossiga naturalmente, o que pode revelar-se gravoso para os interesses que o autor procura acautelar. Daí que, nessas situações, cumpra apreciar na ação todas as questões que tenham sido suscitadas. … A suspensão da instância em geral pode encontrar outros motivos cuja justificação é sujeita a escrutínio do juiz, o qual, goza de uma larga margem de discricionariedade, devendo aquilatar se efetivamente se justifica tal medida.” (Vol. I, pág. 314 e 315). No caso que nos ocupa, ao contrário do que pugna o Tribunal a quo, não estamos perante uma causa prejudicial, na medida em que a pretensão formulada nas outras ações, quer as que foram interpostas em data anterior aos presentes autos quer as que o foram em data posterior, não constitui um pressuposto da decisão dos presentes autos. Na verdade, como disso dá conta a Recorrente e o saneador também o reflete, nos presentes autos não se mostra questionada a validade das patentes e do certificado complementar de proteção que aquela invocou como fundamento do seu direito, quando é certo que a Recorrida, enquanto demandada, o podia ter feito. Aliás, a R. fundamenta a sua defesa, não pondo em causa a validade das patentes e ou do certificado complementar de proteção, mas antes negando a (sua) pretensão de fazer uso das AIM´s requeridas enquanto aquelas vigorarem. Dito de outra forma, a presente ação, porque não se mostra questionada a validade das patentes que servem de base ao direito invocado pela Recorrente, não depende das decisões a proferir nos outros processos, em que se discute, para o que aqui releva, a validade da patente 1845961 (EP). Acresce ainda, que sempre inexistiria uma efetiva relação de dependência entre os presentes autos e as referidas ações, na medida em que, mais uma vez, como disso também dá conta o despacho saneador, o direito invocado pela Autora funda-se, igualmente, em outras patentes e certificado complementar de proteção; ou seja, mesmo considerado procedente o pedido reconvencional e declarada a nulidade da patente EP 1845961, não se desencadeia – automaticamente – a improcedência da presente ação. Não obstante, apesar de afastada a referida relação prejudicialidade, a verdade é que entre as ações existe um ponto de contato objetivamente relevante que, por isso, é suscetível de integrar a figura do “outro motivo justificado”. Vejamos, então. A circunstância já referida de se estar a discutir, nas outras ações, por força de pedido reconvencional, a validade de uma patente que, também, funda o direito invocado pela aqui A. é, sem mais, objetivamente relevante, nem que seja, ao nível da justiça material. Porém, mais uma vez, afastado que se mostra a “economia” de qualquer resultado que venha a ser obtido da procedência e ou improcedência daquele pedido reconvencional para os presentes autos, julgamos que sendo «motivo», seguramente não é «justificado». Efetivamente, como vimos, a decisão que vier a ser proferida no âmbito dos processos em que foi impugnada a validade da patente EP 1845961, jamais será, por si só, suficiente para colocar em causa o pedido/ posição da A. formulado nestes autos, em toda a sua abrangência. Nessa medida, quer por insuscetível de dar origem a decisões judiciais contraditórias, pois, como vimos, ao contrário das outras ações, aqui não se discute a validade da(s) patentes, quer pelo resultado daquelas também não ser suscetível de “resolver” o diferendo existente nos presentes autos, julgamos que também não é suscetível de se recorrer à figura do “outro motivo justificado”. * Por todo o exposto, julgamos procedente o recurso apresentado pela A., revogando-se a decisão proferida pelo Tribunal a quo que suspendeu a instância. * III - Decisão. Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente o recurso apresentado pela Bayer Intellectual Property GMBH, revogando a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância que suspendeu a instância. * Custas pela Recorrida (artigo 527.º do CPC). * Lisboa, 11 de setembro de 2024 Bernardino Tavares Alexandre Au-Yong Oliveira Eleonora Viegas |