Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
822/21.9T8CSC-A.L1-2
Relator: PEDRO MARTINS
Descritores: SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
CAUSA PREJUDICIAL
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 11/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I - A decisão de não suspender a instância, apesar de se verificar uma causa prejudicial, quando não se verificam os condicionalismos do art. 272/2 do CPC, é proferida com base num poder discricionário e por isso é irrecorrível.
II - Mas a decisão de indeferir a suspensão com base no pressuposto de que não se verifica uma questão prejudicial já é recorrível e pode-o ser autonomamente, ao abrigo do art. 644/2-h do CPC, ao menos no caso tipo dos autos, quando já se decidiu num outro acórdão de um tribunal de recurso, em situação idêntica (uma entre cerca de 40), que a questão em causa era realmente prejudicial, porque não teria sentido, depois de ter havido uma decisão final após julgamento, estar a revogar aquela decisão para se fazer só então e pela primeira vez um juízo da conveniência ou não de suspender a instância.
III – Revogado o despacho com base na existência de causa prejudicial, o tribunal de recurso deve limitar-se a devolver “ao tribunal recorrido o uso legal dos poderes discricionários que a lei lhe concede.”
IV - Não é pressuposto da possibilidade de suspensão que a acção prejudicial tenha sido instaurada em primeiro lugar.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo identificados:

A 18/03/2021, a G-SA, intentou uma acção comum contra J e mulher, pedindo que os réus sejam condenados (i) a demolir totalmente as obras realizadas no seu imóvel sem controlo prévio e em violação das normas e prescrições urbanísticas aplicáveis, por serem insusceptíveis de legalização; (ii) a repor o seu imóvel (terreno e edificação original) nas condições em que se encontravam antes do início das obras ou trabalhos ilegais, nos exactos termos das licenças que hajam sido validamente emitidas pela Câmara Municipal de Cascais para o imóvel dos réus; e (iii) a pagar à autora, a título de indemnização por danos patrimoniais sofridos, 205.653,98€.
Alega para tanto, em síntese, que as obras ilegais feitas pelos réus retiram valor e potencialidades aos prédios da G-SA; a acrescer a isso, os réus são parte numa providência cautelar que pretende impor à G-SA que transfira para o prédio dos réus edificabilidade de um dos prédios da G-SA – de acordo com negociações protocoladas que existiam entre a G-SA e a A (uma associação de proprietários nas mesmas condições que os réus) - e registaram essa providência, o que contribui para aqueles danos.
Os réus, depois de conseguirem a prorrogação do prazo para a contestação, vieram a 31/05/2021, (i) informar do requerimento da apensação da acção a outra instaurada anteriormente, (ii) apresentar contestação, (iii) requerer a intervenção provocada da A, (iv) arguir a litigância de má-fé da G-SA, e (v) requerer a suspensão da instância por estar pendente causa prejudicial.
Terminam a contestação dizendo que deverão ser julgadas procedentes (i) a excepção de incompetência absoluta do tribunal; (ii) a excepção de prescrição do direito que a G-SA pretende fazer valer na presente acção; (iii) a excepção de responsabilidade da G-SA pela prática de actos que não lhe eram permitidos e que concorreram para os factos em que sustenta a sua acção; (iv) a excepção de actuação em abuso do direito por parte da G-SA; (v) a excepção de incumprimento contratual da G-SA (a ser reconhecido em contrato que foi celebrado em representação e benefício da contestação - [sic]); ou, caso assim não se entenda, a acção deverá ser julgada improcedente por não provada.
Alegam para tanto, entre o mais e para o que agora importa, que “a G-SA conhece a existência de obras de ampliação na vila dos contestantes há mais de 20 anos”; que a edificabilidade de um dos prédios da G-SA foi aumentada à custa do prédio dos réus (e de outros associados da A); a regularização urbanística das moradias do Lote A depende da disposição de edificabilidade, i.e. da possibilidade de edificar determinada área de construção pelos proprietários; a disposição de edificabilidade no Lote A pode ser conseguida pela transferência de índice de edificabilidade de outro lote com a mesma aptidão do lote A que dela disponha, através de alteração ao alvará de loteamento respectivo; em 21/06/2017 a G-SA e a A celebraram um protocolo pelo qual, entre o mais, a G-SA se obrigou a negociar com proprietários de vilas do lote A que fossem associados da A, entre eles os réus, ou com a própria A, os termos e condições de transferências da edificabilidade em lotes de sua propriedade, atribuídos pelo alvará de loteamento e ainda não utilizados, na medida do necessário, para que os aqueles proprietários, pudessem efectuar a regularização de situações urbanísticas em suas unidades implantadas no Lote A; e a G-SA e a A celebraram na mesma data, um protocolo complementar destinado a regular a transferência de edificabilidade pela G-SA para os donos das vilas do lote A, enquanto proprietários interessados representados pela A, entre os quais os réus, com a correspectiva redução dessa edificabilidade nos lotes da G-SA (incluindo o lote CT), mediante a contrapartida de 1250€ por m2; a G-SA não cumpriu as obrigações a que estava adstrita nos termos destes protocolos e está a fazer projectos no seu lote que, se foram executados, inviabilizarão a cedência de edificabilidade do Lote CT pela G-SA aos proprietários de vilas do Lote A; daí que a A, os réus e os proprietários de outras 30 vilas do Lote A, para prevenir lesão irrecuperável dos seus direitos, propuseram providência cautelar em 30/10/2019, na qual foi peticionado o decretamento das seguintes providências (i) que seja judicialmente apreendido o direito de disposição da G-SA do lote CT; (ii) que a G-SA seja inibida de realizar negócios jurídicos sobre o identificado lote CT; (iii) que a ré seja inibida de realizar ou desenvolver operações urbanísticas ou no âmbito do regime jurídico dos empreendimentos turísticos sobre o mencionado lote CT; e em 26/05/2021 a A, os contestantes e os proprietários de outras 30 vilas do Lote A propuseram a acção principal, que corre termos, onde pediram a condenação da G-SA no cumprimento das obrigações a que se vinculou nos exactos termos dos protocolos que celebrou com a A, em especial que seja proferida sentença que produza os efeitos das declarações negociais da G-SA e que, por via disso: (i) decrete a subscrição pela G-SA do pedido de informação prévia apresentado pela A e (ii) decrete a subscrição pela G-SA do contrato-promessa de transferência de edificabilidade nos termos que constam do documento 54 junto com o procedimento cautelar; e (iii) condene a G-SA a indemnizá-los pelos danos sofridos em virtude da sua conduta moratória; os réus entendem que esta acção é causa prejudicial da presente acção, e que o incumprimento de obrigação que é subjacente ao pedido é causa impeditiva, ou mesmo extintiva, do direito que a G-SA se arroga e por isso excepção de direito material que aqui invoca e que deve conduzir de imediato à absolvição dos réus.
A G-SA replicou; entre o mais, e no que agora importa, refere que réus se limitaram a requer a suspensão, limitando-se a dizer que se tratava de uma acção prejudicial sem qualquer fundamentação; e impugna os factos base das excepções de prescrição, de responsabilidade da G-SA, de incumprimento contratual e de abuso de direito.
Por despacho de 25/10/2021, depois de se constatar que a G-SA já tinha sido citada na acção referida pelos réus, a G-SA foi notificada para responder ao pedido de suspensão, vindo ela fazê-lo, repetindo que o mero facto de os réus dizerem que a causa é prejudicial, sem [tentativa de] demonstração de como a decisão a ser proferida no âmbito do processo  1737/21.6T8CSC influi no julgamento da presente instância, não é fundamento bastante para o decretamento da requerida suspensão; e, confrontando os pedidos das duas acções diz que não existe qualquer relação de prejudicialidade entre as acções, uma vez que a decisão a proferir no âmbito de um dos processos não destrói o fundamento ou a razão de ser do outro e não influi directamente na decisão de cada uma das causas; ainda acrescenta que a suspensão da instância por causa prejudicial pressupõe a suspensão do processo que tenha sido instaurado em segundo lugar, pressuposto que não se verifica no caso aqui em discussão.
A 03/01/2022, a suspensão foi indeferida, com a seguinte fundamentação [depois de (i) se transcreverem os pedidos de ambas as acções, de (ii) se dizer que os réus não deduzem reconvenção mas defendem-se por excepção requerendo que seja reconhecido o incumprimento contratual da G-SA em contrato que foi celebrado em representação e benefício dos réus e julgada procedente a respectiva excepção de incumprimento contratual da G-SA, com os devidos efeitos legais, de (iii) se transcrever o art. 272/1 do CPC, e (iv) os ensinamentos de Alberto dos Reis, CPC anotado, volume I, 3.ª Edição – Reimpressão, Coimbra Editora, Janeiro 2012, pág. 383 e 384; e de Lebre de Freitas e outros, CPC anotado, volume 1.º, Coimbra Editora, Coimbra, Maio 1999, pág. 501; bem como os sumário dos acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 07/01/2010, proc. 940/08.9TVPRT.P1, e do TRL de 22/01/2008, proc. 7664/2007-1]:
Aqui chegados, não se descortina a existência de razão suficientemente idónea para sustentar a existência de uma relação de prejudicialidade entre os presentes autos e a acção referida tendo por referência os pedidos formulados em cada uma das acções, sendo certo que no que respeita a alegado incumprimento dos acordos celebrados, na presente acção será objecto de apreciação enquanto matéria de excepção.
Não há, pois, dependência da decisão dos presentes autos da acção referida, pelo que se indefere a requerida suspensão da instância por causa prejudicial.
Os réus interpõem recurso desta decisão (com referência ao art. 644/2-h do CPC), voltando a dizer que se verifica uma relação de prejudicialidade entre a acção 1737/21 e esta acção 822/21 (para o efeito descrevem os factos, dizem que as partes se imputam reciprocamente o incumprimento dos protocolos, que as acções têm um mesmo facto jurídico de que emergem e a interdependência entre elas é claríssima e dizem que a norma do artigo 272/1 do CPC determina que seja suspensa a acção quando esteja pendente causa prejudicial e essa norma, quando interpretada conjuntamente com a norma do artigo 8/3 do CC, impõe que seja suspensa a causa dependente, quando possa estar em perigo a aplicação uniforme do direito e a prolação de decisões contraditórias) e a G-SA contra-alega defendendo o contrário (diz que na acção 822/21 discute-se a existência de um dano na esfera patrimonial da G-SA, decorrente da construção clandestina no imóvel dos réus e a pretensão da G-SA de obter o ressarcimento do referido prejuízo, enquanto na acção 1737/21 os réus e outros pretendem obter a execução específica de um contrato-promessa bem como a subscrição de um pedido de informação prévio; em face do objecto destas acções e dos pedidos apresentados pelas partes a decisão a proferir no âmbito de um dos processos não destrói o fundamento ou a razão de ser do outro e também não influi directamente na decisão de cada uma das causas, pelo que não encontram verificados os pressupostos de existência de uma prejudicialidade entre os processos).
A 18/09/2022, foi proferido despacho, pelo tribunal recorrido, a admitir o recurso interposto pelos réus, ao abrigo do art. 644/2-h do CPC.
A 14/10/2022 o recurso foi remetido a este TLR, onde chegou a 20/10/2022.
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Questão prévia:
Antes de mais, diga-se que os réus apresentaram no recurso vários documentos, sem sequer as alegações necessárias para a sua apresentação só agora, com o recurso, razão pela qual os mesmos devem ser desentranhados/ocultos electronicamente e os réus devem ser condenados numa multa (artigos 651, 425, 423 e 443/1, todos do CPC e 27/4 do RCP)
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Questão a decidir: se o pedido de suspensão não devia ter sido indeferido.
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O art. 272/1 do CPC dispõe que: O tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta […].
Trata-se pois da decisão de uma causa estar dependente do julgamento de outra.
Alberto dos Reis, no Comentário ao CPC, vol. 3.º, 1946, Coimbra Editora, pág. 206 (com desenvolvimento nas páginas 265 a 272), diz que “Uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão daquela pode prejudicar a decisão desta, isto é, quando a procedência da primeira tira a razão de ser à existência da segunda.”
E depois de dar dois exemplos conclui (na mesma página): “Sempre que numa acção se ataca um acto ou facto jurídico que é pressuposto necessário de outra acção, aquela é prejudicial em relação a esta”.
No mesmo sentido, as obras de Lebre de Freitas e de Teixeira de Sousa que já foram muito citadas na acção e neste processo.
E se, por isso, se pode dizer “que a razão de ser da suspensão por pendência de causa prejudicial é a economia e coerência dos julgamentos” (Alberto dos Reis, obra citada, pág. 272), por se evitar estar a discutir o mesmo pressuposto em duas acções e por se criar as condições para respeitar a autoridade do caso julgado da acção prejudicial, isto nada tem a ver, ao contrário do que pretendem os réus, com o art. 8/3 do CC ou com a vontade da aplicação uniforme do direito.
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Trata-se pois de comparar um facto ou pressuposto necessário da acção dita dependente com a futura decisão de uma acção dita prejudicial.
Assim, no caso dos autos, trata-se de saber se a decisão da acção 1737/21, dita prejudicial, porá em causa um pressuposto necessário desta acção 822/21.
Na acção 1737/21 pode vir a ser decidido decretar a subscrição pela G-SA do pedido de informação prévia apresentado pela A e do contrato-promessa de transferência de edificabilidade.
Ora da subscrição destes documentos decorre que a G-SA, se e enquanto estiver vinculada por eles, perde o direito a obter dos réus a demolição das obras realizadas no seu imóvel e reposição do imóvel nas condições em que se encontravam antes do início das obras ou trabalhos ilegais.
Dito de outro modo, enquanto a G-SA estiver obrigada pela subscrição daqueles documentos não poderá, ao mesmo tempo, estar a agir contra essas obrigações.
Portanto, da decisão do processo 1737/21 decorre o desaparecimento da razão de ser desta acção 822/21, enquanto aquela vinculação existir.
Daí que a G-SA, na petição inicial, tenha sugerido que não estava, ou já não estava, obrigada pelos protocolos.
Em suma, está-se, realmente, perante uma acção prejudicial.
No mesmo sentido, e para um caso de um outro proprietário do lote A, vai o ac. do TRL de 14/07/2022, proferido no processo 803/21.2T8CSC-A.L1-2 que revoga um despacho idêntico ao destes autos.
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Um despacho que decide a questão da suspensão tem de estar baseado no pressuposto da existência da uma causa prejudicial e é um despacho proferido no uso legal de um poder discricionário porque a lei dá ao juiz o poder de ordenar ou não a suspensão da causa (artigos 272 e 152/4 do CPC).
Ao decidir sobre a existência do pressuposto, o despacho é recorrível. Mas, verificado o pressuposto, falta decidir, com base num prudente arbítrio do juiz, sobre a conveniência da suspensão, tendo em vista os fins do processo e este juízo é, naturalmente, insindicável/irrecorrível (artigos 152/4 e 630 do CPC). Isto é, “não é recorrível com o fundamento de que tal decisão não representa a melhor forma de prosseguir o fim que a lei pretende seja atingido” – Castro Mendes, Recursos, AAFDL, 1980, pág. 42.
E se isto é assim, então a suspensão não tem nada a ver, ao contrário do que pretendem os réus, com uma imposição legal de suspensão quando se verifica uma causa prejudicial. Não há um poder vinculado, há um poder discricionário.
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O despacho que vai ser revogado por força do que se disse acima, só decidiu com base no facto de não se verificar uma questão prejudicial. Ou seja, não se está perante uma decisão de indeferimento do pedido de suspensão com base na inconveniência da suspensão tendo em vista os fins do processo (caso em que, porque se estaria perante um despacho proferido no uso de um poder discricionário, não seria recorrível: artigos 272/1, 152/4, 630 e 644/2-c a contrario do CPC).
É isto (e não o alegado pelos réus no requerimento do recurso), esclareça-se antes de mais, que leva a que se considere, no caso, que o recurso era admissível e nesta altura (art. 644/2-h do CPC): como se está perante um despacho que decidiu no pressuposto da não verificação da questão prejudicial, não se está perante um recurso de um despacho discricionário, proferido com base no juízo de conveniência da suspensão do processo. Ora, não teria sentido, só depois de ter havido uma decisão final depois do julgamento (por força do art. 644/3 do CPC), estar a revogar aquela decisão para se vir a fazer só então e pela primeira vez um juízo da conveniência ou não de suspender a instância, para mais quando já se decidiu num outro acórdão de um tribunal de recurso, em situação idêntica, que a questão em causa era realmente prejudicial.
Teve-se em conta João de Castro Mendes, Recursos, citado, páginas 40 a 44; Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 1.º, 4.ª edição, Almedina, 2021 (reimpressão de 2017), páginas 209 a 212, 325, 550 a 552 e 554; Lebre de Freitas, Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 3.º, 3.ª edição, 2022, Almedina, páginas 41-42 e 120-121 e 122; Castro Mendes / Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, vol. II, CIDP/AAFDL, 2022, páginas 178-180, e Miguel Teixeira de Sousa CPC online, IG, L 412013, art. 1.º a 361.º (vs. 2022.09).pdf, anotação ao art. 272 (e, do relator, com aplicação destas posições, o ac. do TRL de 21/09/2017, proc. 402/14.5T8LSB-2; a decisão singular do TRP de 23/02/2016, proc. 7091/15.8T8PRT-B.P1; o ac. do TRP de 29/01/2015, proc. 252/06.2TBMDB-Q; e o ac. do TRP de 08/01/2015, proc. 129/03.3TBGDM.P1).
Repetindo: a revogação do despacho, agora com base na conclusão contrária à do despacho recorrido, ou seja, da verificação da existência de uma causa prejudicial, coloca de novo a questão de saber se deve ou não suspender-se a instância, com base na conveniência dessa decisão para os fins do processo.
Quanto a este novo juízo (da conveniência da suspensão), a formular pela primeira vez, este TRL deve limitar-se a devolver “ao tribunal recorrido o uso legal dos poderes discricionários que a lei lhe concede” (Castro Mendes / Teixeira de Sousa, obra citada, págs. 179-180), embora se possam configurar situações em que o TRL se possa substituir ao tribunal recorrido (art. 665 do CPC). No caso, tal não se justifica minimamente, dada a pendência mais de 4 dezenas deste tipo de processos, pelo menos 4 da competência da mesma Srª juíza, como decorre do que consta da acção: entende-se que esse juízo discricionário, irrecorrível, baseado naquela conveniência, deve ser feito pelo próprio tribunal recorrido que melhor sabe o que é que se passa com a acção e com os outros processos conexos.
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Esclareça-se que, ao contrário do que a G-SA entende, mal, não é pressuposto da possibilidade de suspensão que a acção prejudicial tenha sido instaurada em primeiro lugar – neste sentido, por exemplo, Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, CPC anotado, vol. 1.º, citado, pág. 551, e Teixeira de Sousa, CPC online, citado, anotação 3 ao art. 272.
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Pelo exposto, revoga-se o despacho recorrido, ficando agora decidido que a acção 1737/21 é uma causa prejudicial a esta 822/21 e é com base neste pressuposto que o juiz da causa deve agora decidir suspender ou não a instância (art. 272/1 do CPC).
Custas de parte, do recurso, pela G-SA, que é quem perde o recurso.
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Desentranhe e devolva aos réus e/ou oculte electronicamente os documentos apresentados por eles com o recurso.
Os réus vão condenados numa multa de 1UC pela junção de tais documentos sem qualquer justificação.

Lisboa, 10/11/2022
Pedro Martins
Inês Moura
Laurinda Gemas