Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
621/21.8T8BRR.L1-4
Relator: MANUELA FIALHO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
ALTERAÇÃO DA RETRIBUIÇÃO
PRESTAÇÃO REGULAR E PERIÓDICA
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/03/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMAÇÃO A SENTENÇA
Sumário: 1–O acervo fático (provado e não provado) deve enformar-se apenas por factos, considerando-se não escrita a matéria de teor conclusivo.

2–Uma prestação, paga ao trabalhador, durante 11 anos, em valor certo e de modo regular e periódico, e como contrapartida da atividade desenvolvida, assume a natureza de retribuição sendo ilegítima a decisão de a retirar sem que se prove uma modificação das circunstâncias que levaram à sua atribuição.

(Elaborado pela Relatora)

Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa



CENTRO HOSPITALAR (…) E.P.E., Réu nos autos de Ação de Processo Comum supra identificados vem interpor RECURSO DE APELAÇÃO incidindo sobre a sentença.

Pede para se revogar a decisão judicial recorrida, e julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada, declarando que a prestação de € 1.000,00 (mil euros) não constitui uma componente da retribuição mensal do Autor; absolvendo, assim, o Réu do pedido de integrar o montante de € 1.000,00 (mil euros) na remuneração do Autor; do pagamento do montante de € 4.000,00 (quatro mil euros) a título de prestações pecuniárias, que integram a retribuição, vencidas, desde dezembro de 2020 a março de 2021 e não pagas, acrescido de juros à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento; bem como do pagamento das prestações pecuniárias, que integram a retribuição, no montante de € 1.000,00 (mil euros), vincendas, desde abril de 2021 inclusive, acrescido de juros vincendos à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento; E, do pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, no valor de € 3.000,00 (três mil euros).

Funda-se nas seguintes conclusões, apresentadas após convite ao aperfeiçoamento:
(…)
AAA, AUTOR, tendo sido notificado da interposição de recurso apresentado pelo RÉU vem apresentar a sua RESPOSTA defendendo a improcedência do recurso apresentado.

O MINISTÉRIO PÚBLICO emitiu parecer segundo o qual, a manter-se a decisão de facto, a sentença merece ser confirmada.

*

Apresentamos, seguidamente, um breve resumo dos autos:

AAA intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum emergente de contrato de trabalho contra CENTRO HOSPITALAR (…), E.P.E., unidade de saúde que integra o Serviço Nacional de Saúde (SNS) com a natureza de entidade pública empresarial, peticionando que fosse:
a.-Declarado que a prestação pecuniária, periódica e regular de € 1.000,00 constitui uma componente da retribuição mensal do AUTOR;
b.-O RÉU condenado a integrar o montante de € 1.000,00 (mil euros) na remuneração do AUTOR;
c.-O RÉU condenado ao pagamento do montante de € 4.000,00 (quatro mil euros) a título de prestações pecuniárias, que integram a retribuição, vencidas, desde dezembro de 2020 a março de 2021 e não pagas, acrescido de juros à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento;
d.-Fosse o RÉU condenado ao pagamento das prestações pecuniárias, que integram a retribuição, no montante de € 1.000,00 (mil euros), vincendas, desde abril de 2021 inclusive, acrescido de juros vincendos à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento;
e.-Fosse o RÉU condenado ao pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, de valor nunca inferior a € 3.000,00 (três mil euros).

Para tanto alegou, em suma, que: Celebrou, em novembro de 2004, um contrato individual de trabalho (CIT) com o Hospital. S.A., (capitais exclusivamente públicos), auferindo a remuneração mensal de €3.072,67, acrescido de subsídio de alimentação de €3,70, para um horário semanal de 40 horas. Por via de alterações operadas legislativamente passou, com efeitos reportados a 1 de novembro de 2009, a ser trabalhador do ora Réu, o qual resulta da fusão do Hospital Nossa Senhora do Rosário, S.A. e do Hospital … E.P.E. A partir de 1 de abril de 2009 o serviço de cirurgia plástica onde se encontrava integrado passou a ser composto por dois médicos, por força da aposentação de um terceiro passando toda a atividade programada a ser prestada por dois médicos (o Autor e um outro médico), tendo sido o Autor nomeado Responsável da Unidade Funcional. O Diretor de Departamento (…) dirigiu ao Conselho de Administração um memorando interno pedindo autorização para negociar com os dois médicos ainda ao serviço naquele serviço a manutenção da produção contratada em doentes operados e consultados e a subida do Casemix da Especialidade em troca de ajuste salarial. O Conselho de Administração autorizou o pagamento do vencimento do médico aposentado, sendo metade para cada um dos médicos e que não ultrapassasse os €1.500,00 mensais, no valor de €750,00. Posteriormente, o Diretor de Departamento de Cirurgia e Especialidades Cirúrgicas veio a propor que 2/3 desse valor fossem atribuídos ao Autor e o restante ao outro médico, tendo considerado a produção a 100%, tendo, ainda, proposto a flexibilização de 20%, para mais ou para menos, a aferir trimestralmente, consoante o cumprimento das metas de Internamento, Consulta Externa e Bloco Operatório sendo que seriam tomadas em conta as adversidades ao integral cumprimento, o que foi aceite pelo Conselho de Administração, que, na altura, tinham autonomia para tanto. Desta feita, passou, desde há mais de 11 anos, o Autor a receber a remuneração fixa, 80%, no montante de €800,00; e a variável, de 20%, no montante de €200,00 sendo que a componente variável seria aferida trimestralmente em função do cumprimento ou incumprimento das metas de produção de serviço; ou seja, passou a auferir um total de €1.000,00 semanais. O montante de €800,00 foi sempre considerado para efeitos de processamento de subsídios de férias e de Natal.
Nunca o Réu procedeu à aferição trimestral, quanto às metas de produção, tendo pago sempre mensalmente os €200,00 nem, tampouco, fez menção ao SIGIC sendo que quando a atividade do serviço de cirurgia plástica não atingiu os objetivos, não o foi por qualquer causa imputável ao Autor.
Em 9 de outubro 2020, o Conselho de Administração do Réu deliberou retirar ao Autor o acréscimo de €1.000,00, o que veio a concretizar o que corresponde a uma diminuição da retribuição.
Tal levou a que o Autor sofresse danos patrimoniais, por não conseguir honrar compromissos que havia assumido, e não patrimoniais, uma vez que se sentiu humilhado, preocupado por não honrar os seus compromissos e ter passado a ser olhado pelos seus pares, familiares e amigos, como alguém que não honrava os seus compromissos.

Contestou o Réu concluindo que: Verifica-se uma exceção dilatória porquanto os Juízos do Trabalho são materialmente incompetentes; mas, ainda que assim não se entenda; Deve a ação improceder por se mostrar impugnada a matéria de facto bem como a de direito aplicável ao caso.

Alegou o Réu, em suma, que: O Autor tomou a iniciativa de, face à cessação de funções de outro médico, dos três que integravam a equipa de cirurgia plástica assente na premissa de que o serviço iria cumprir os seus objetivos de produção, o que não aconteceu. Numa laboriosa construção jurídica, acabou por concluir que o direito aplicável ao caso não era o emergente diretamente do Código do Trabalho mas, antes, o do IRCT sendo que não tinha o Conselho de Administração do Réu qualquer liberdade negocial para a fixação de novas posições remuneratórias, tendo chamado à colação o DL nº176/2009, de 04/08 sendo que, no caso dos autos, o Autor apenas viu a sua remuneração mensal ser aumentada com base em pressupostos que não se verificaram, assentes em premissas que deixaram de existir.

Por despacho já transitado em julgado, foi julgada improcedente a exceção dilatória da incompetência, em razão da matéria.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a ação  totalmente procedente, por totalmente provada e, consequentemente:
a.-Declarou que a prestação pecuniária, periódica e regular de € 1.000,00 constitui uma componente da retribuição mensal do AUTOR;
b.-Condenou o Réu a integrar o montante de € 1.000,00 (mil euros) na remuneração do Autor;
c.-Condenou o Réu condenado ao pagamento do montante de € 4.000,00 (quatro mil euros) a título de prestações pecuniárias, que integram a retribuição, vencidas, desde dezembro de 2020 a março de 2021 e não pagas, acrescido de juros à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento;
d.-Condenou o Réu condenado ao pagamento das prestações pecuniárias, que integram a retribuição, no montante de € 1.000,00 (mil euros), vincendas, desde abril de 2021 inclusive, acrescido de juros vincendos à taxa legal de 4% a contar da data do seu vencimento e até efetivo e integral pagamento;
e.-Condenou o RÉU ao pagamento de uma indemnização, por danos não patrimoniais, no valor de € 3.000,00 (três mil euros).

***

As conclusões delimitam o objeto do recurso, o que decorre do que vem disposto nos Art.º 608º/2 e 635º/4 do CPC. Apenas se exceciona desta regra a apreciação das questões que sejam de conhecimento oficioso.

Nestes termos, considerando a natureza jurídica da matéria visada, são as seguintes as questões a decidir, extraídas das conclusões:
1ª –O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto?
2ª–Em consequência, as questões 2.4.2 e 3 abordadas na sentença devem responder-se em contrário?

***

FUNDAMENTAÇÃO:

Invoca o Apelante erro de julgamento circunscrito à decisão de facto que enforma os pontos Q, R, U, JJ, KK, LL, MM, NN, 00, PP, QQ, RR, SS, TT dos factos julgados como provados e quanto aos pontos H, I, J, e K dos factos julgados como não provados.
Comecemos pela decisão positiva!

É o seguinte o teor dos ditos pontos de facto:

Q.Assim, foi atribuído ao AUTOR o seguinte acréscimo remuneratório mensal:
a.-REMUNERAÇÃO FIXA: 80% = €800,00
b.-REMUNERAÇÃO VARIÁVEL: 20% = €200,00
Total: 100% = €1.000,00

R.–Mais se determinou que a remuneração variável seria aferida trimestralmente, consoante o cumprimento, ou não, das metas de produção de serviço.
U.–Nunca se procedeu a qualquer aferição trimestral quanto às metas de produção de serviço, tendo o pagamento do montante de € 200,00 (duzentos euros) assumido caráter mensal, certo, regular e periódico.
JJ.–O AUTOR sempre cumpriu as suas funções com total zelo e diligência, pautando a sua atuação clínica pelos mais altos padrões de excelência e em estrito cumprimento das leges artis e das normas éticas e deontológicas aplicáveis.
KK.–Dedicando todo o seu esforço e saber à promoção do bem-estar e saúde dos utentes, bem como a criar uma boa imagem do serviço de cirurgia do RÉU, procurando contribuir para o seu prestígio e imagem de rigor e excelência dos seus serviços.
LL.–Pelo facto de receber a quantia de €1.000,00 a título certo, fixo, determinado e constante, o ora AUTOR planeou e concebeu a sua vida familiar e privada a contar com tal valor mensal.
MM.–Em função disso, assumiu compromissos financeiros compatíveis com a remuneração mensal auferida que não resistem a uma redução drástica de tal remuneração.
NN.–A diminuição da sua remuneração mensal provocou-lhe graves constrangimentos, tendo que incumprir alguns dos compromissos financeiros por si assumidos ou adiar pagamentos, o que lhe provocou uma tremenda vergonha e desgosto, tendo passado a sofrer de insónias constantes e permanentes e dores de cabeça frequentes.
OO.–A situação financeira em que se viu, despois de 11 (onze) anos de absoluta dedicação ao RÉU e aos respetivos utentes, provocou-lhe uma enorme tristeza e sentimentos depressivos e de ansiedade como nunca, na sua vida, sentira.
PP.–Sentiu-se humilhado e diminuído na sua autoestima, até perante os Colegas de profissão.
QQ.–Pela extrema dedicação que o ora AUTOR devotou ao RÉU e aos respetivos utentes, e ao contrário do que fazem outros médicos nesta área de especialidade, nunca teve qualquer atividade privada, não recebendo quaisquer proventos de outra atividade profissional que não a que desempenha, com todo o rigor e dedicação, junto do RÉU.
RR.–A conduta do RÉU provocou ao AUTOR constrangimentos e transtornos assinaláveis e profundo sofrimento psicológico.
SS.–Desde a diminuição da remuneração, e pelos problemas financeiros que atravessa, sente-se triste e deixou de ter a alegria que sempre o caracterizou.
TT.–Por andar sempre preocupado com a solvabilidade dos compromissos assumidos, o AUTOR sente-se cansado e diminuído na sua dignidade pessoal.
Pretende-se uma decisão de não provado.
Na sentença recorrida, exarou-se, em sede de fundamentação da matéria de facto, e no que para aqui releva, que O Tribunal analisadas criticamente as provas, as quais foram avaliadas segundo regras de experiência, fundou a sua convicção nos seguintes meios de prova:

Em depoimento de parte, (…)
Resulta do depoimento do legal representante do Réu que os factos alegados pelo Autor têm acolhimento também na perspetiva do Réu, nomeadamente e em suma, que o aumento de €1.000,00 foi devido à distribuição do vencimento do médico entretanto aposentado; que os objetivos propostos ao Autor foram cumpridos e quando, pontualmente, não o eram, tal acontecia por razões alheias ao Autor e que o Autor quis manter o regime que vigorava, pronunciando-se contra o SIGIC.
Aqui chegados, cumpre referir que este SIGIC constitui, essencialmente, matéria de direito pelo que não pode ser valorado, nesse âmbito, o depoimento de parte.
Prestou, pois, um depoimento isento, claro e objetivo tendo, quanto à matéria que não conhecia, declarado tal.
A testemunha (…) embora não conhecesse o vencimento certo do Autor, este era o suporte financeiro da família…
O Autor, ao ser confrontado com a diminuição do rendimento, entrou em depressão…
A testemunha (…)
Assim, para além do enunciado no parágrafo anterior, soube que, de uma realidade de cerca de €3.500,00 mensais, o Autor passou a ganhar cerca de €2.500,00, o que lhe causou muito transtorno. Para além disso, esclareceu que é o Autor quem paga as despesas todas da casa e ainda ajuda a mãe e a irmã, desempregadas bem assim como a vizinhança. É da opinião que, fazendo clínica privada, ganharia muito mais mas mantém-se fiel ao SNS não obstante as dificuldades económicas que anda a atravessar.
(…) estas declarações vieram corroborar o já alegado pelo Autor…
A testemunha (…)
Esclareceu que foi ele quem propôs a medida de distribuir o vencimento do médico que se aposentou pelo resto da equipe de cirurgia plástica o que implicava os restantes dois elementos da especialidade de cirurgia plástica cumprirem os mesmos objetivos, objetivos esses que foram sempre integralmente cumpridos.
Confrontado com o documento de fls. 25vº, Memorando Interno, confirmou que foi o seu subscritor bem assim como o seu teor.
Finalmente, ouvido em declarações de parte o Autor pronunciando-se de forma clara, objetiva e isenta, não obstante ser parte na ação, no sentido do já por si alegado em sede de P.I.

Vejamos, então, ponto por ponto!
(…)

Altera-se, pois, a resposta ao ponto U pelo modo seguinte:
Provado apenas que o pagamento do montante de 200,00€ assumiu carater mensal, regular e periódico e não provado que nunca se procedeu a qualquer aferição trimestral quanto às metas de produção de serviço.

(…)
Em presença da prova apresentada, não pode manter-se a resposta de provado. Razão pela qual os pontos JJ e KK se têm como não provados.

(…)
Assim, os pontos LL e MM, atendendo aos depoimentos das testemunhas, não resultando diretamente dos mesmos, conjugados eles com as regras da experiência, devem manter-se.
Quanto ao ponto NN apenas se prova que a diminuição da sua remuneração mensal provocou-lhe vergonha e desgosto. Tudo o mais é não provado.
Aos pontos OO e PP responde-se provado apenas que a situação financeira em que se viu, depois de 11 anos de absoluta dedicação ao R. e aos respetivos utentes, lhe provocou enorme tristeza, sentindo-se humilhado e envergonhado. Também o mais que aí se exarou resulta não provado.
Não provada resulta também a matéria dos pontos QQ,  RR – exceto quanto ao sofrimento psicológico já constante das respostas de provado anteriores – e TT.
O ponto SS mantém-se.

Passamos, agora, a deter-nos sobre a matéria de facto não provada.

Em causa os pontos H, I, J, e K, cujo conteúdo é o seguinte:
(…)
Assim sendo, resulta evidente que a matéria que deu corpo aos pontos de facto não provados I, J e K jamais poderá vir a integrar o acervo fático (seja o provado, seja o não provado). São conclusões que apenas mediante prova de factos que as suportem poderão vir a ajuizar-se.
Deste modo, considera-se não escrita a matéria em presença.
Resta, então, para apreciação, o ponto H.
(…)
Nenhuma razão há, pois, para que se modifique a resposta em análise.
Concluindo:
- Mantém-se os pontos de facto Q, R, LL, MM e SS do acervo provado;
- Modificam-se as respostas aos pontos de facto U, JJ, KK, NN, OO, PP, QQ, RR e TT do acervo provado;
- Consideram-se não escritos os pontos de facto I, J e K do acervo não provado;
- Mantém-se o ponto de facto H deste acervo.

As modificações introduzidas nas respostas de provado inserir-se-ão no acervo fático infra exarado.

*

Ainda no tocante à matéria de facto, sob a epígrafe “Dos alegados pelo Réu”, consignou-se como provado:
B.Com a melhoria continua das técnicas cirúrgicas, organização de pessoas e meios, é natural que todo os profissionais possuam condições de desempenho e celeridade comparativamente com a realidade dos serviços médicos prestados em 2009.
Conforme acima exposto, apenas factos devem enformar o acervo factual. A matéria que integra este ponto é absolutamente conclusiva. Nessa medida, considera-se não escrita.

***

FACTOS PROVADOS:

Dos alegados pelo Autor:
A.Em 17 de novembro de 2004 foi celebrado entre AUTOR e o Hospital … S.A. – B_____, sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, um contrato individual de trabalho, por tempo indeterminado, nos termos do qual o AUTOR foi admitido ao serviço do Hospital …, S.A. – B_____, para, sob a sua autoridade e direção, exercer funções de médico, colocado na Unidade Funcional (…), cujos efeitos se produziram desde a data da sua celebração, até que as partes livremente o revoguem ou ocorra facto que determine a sua caducidade ou revogação
B.De acordo com a cláusula 6.ª, do supra mencionado contrato de trabalho, estabeleceu-se que a retribuição ilíquida mensal a auferir pelo AUTOR seria de €3.072,67 (três mil e setenta e dois euros e sessenta e sete cêntimos), correspondente à categoria de Assistente da Carreira Médica Hospitalar, acrescida de subsídio de refeição no montante de € 3,70 (três euros e setenta cêntimos), por cada dia de trabalho efetivo.
C.Mais acordaram que a prestação do trabalho do AUTOR obedeceria a um horário semanal de 40 (quarenta) horas, sendo o horário diário o do serviço de colocação onde o AUTOR se encontrasse funcionalmente integrado, de acordo com a organização, esquema e escala de funcionamento desse serviço, sem prejuízo de quaisquer alterações decorrentes das necessidades objetivas do funcionamento dos serviços do Hospital de …, S.A. – B____.
D.O Decreto-Lei n.º 93/2005, de 7 de junho, procedeu à transformação em entidades públicas empresariais das sociedades anónimas constantes da lista publicada em anexo ao diploma, que dele faz parte integrante, no qual se incluía o Hospital … S.A.
E.As entidades públicas empresariais criadas sucederam às sociedades anónimas constantes da lista anexa ao Decreto-Lei n.º 93/2005, de 7 de junho, conservando a universalidade dos direitos e obrigações, legais e contratuais, que integravam a sua esfera jurídica no momento da transformação.
F.Em consequência, passou o Hospital …, E.P.E., a ser a entidade empregadora do ora AUTOR, a partir de 31 de dezembro de 2005.
G.De acordo com o Programa do XVII Governo Constitucional e com o Programa de Estabilidade e Crescimento, o Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de dezembro, iniciou o processo de transformação dos hospitais em entidades públicas empresariais (E.P.E.).
H.Considerando as complementaridades existentes entre o Hospital … E. P. E., e o Hospital do M_____, e tendo em vista potenciar a articulação entre ambos, o Decreto-Lei n.º 280/2009, de 6 de outubro, procedeu à criação do Centro Hospitalar Barreiro M_____, E.P.E., por fusão do Hospital …, E. P. E., com o Hospital (…).
I.A entidade pública empresarial criada pelo supra referido diploma legal, Centro Hospitalar B____ - M____, E.P.E., sucedeu às unidades de saúde que lhe deram origem em todos os direitos e obrigações, independentemente de quaisquer formalidades adicionais.
J.O vínculo laboral existente entre o AUTOR e o Hospital …, E.P.E., transmitiu-se para o ora RÉU, com efeitos a 1 de novembro de 2009 (vide artigo 8.º, do Decreto-Lei n.º 280/2009, de 6 de outubro).
K.A partir de 1 de abril de 2009, o serviço de cirurgia plástica onde o AUTOR se encontrava integrado, passou a ser composto por apenas 2 (dois) médicos especialistas, incluindo o AUTOR, atenta a aposentação do Dr. (…), que ocupava, à data, o cargo de chefe de serviço de cirurgia plástica.
L.Passando toda a atividade programada, que até então era realizada por 3 (três) médicos especialistas, a ser realizada por apenas 2 (dois) médicos, sendo 1 (um) deles o AUTOR.
M.Após a aposentação do chefe de serviço de cirurgia plástica, por deliberação do Conselho de Administração de 13 de maio de 2009, foi o AUTOR nomeado Responsável da Unidade (…), tendo-lhe sido abonado, a acrescer ao seu salário mensal, o montante de € 128,74 (cento e vinte e oito euros e setenta e quatro cêntimos) pelo exercício dessas funções.
N.Em consequência, o Diretor do Departamento de Cirurgia (…), Dr. (…), dirigiu um memorando interno à Senhora Presidente do Conselho de Administração, onde refere que: Se me autorizar, tenciono negociar com os dois médicos restantes a manutenção da produção contratada em doentes operados e consultados e a subida do Casemix da Especialidade a troco de ajuste salarial. Este, num total nunca superior a metade do vencimento auferido pelo médico aposentado.
O.Sobre o memorando supra referido, pronunciou-se a Responsável pelo Serviço de recursos Humanos, Dr.ª (…), através de informação interna referindo que: Face à proposta do Sr. Diretor do Departamento de Cirurgia e Especialidades Cirúrgicas, Dr. (…), em anexo, seria de considerar um valor para os dois médicos (metade do vencimento do médico aposentado), cujo total não ultrapasse os € 1.500,00. Considerando a referida proposta e dado que o responsável está a ser remunerado pelo cargo, com o valor acima indicado, e no caso dos dois médicos assegurarem a mesma produção realizada anteriormente pelos três elementos, poderá se assim for entendido, ser abonado a cada um dos médicos, € 750,00, em remuneração acessória ou em remuneração base.
P.Em momento posterior, veio o Diretor do Departamento de Cirurgia e Especialidades Cirúrgicas a dirigir novo memorando interno à Senhora Presidente do Conselho de Administração onde refere: É minha intenção que desse valor dois terços sejam atribuídos ao Responsável e o restante ao outro elemento, correspondendo a isso o cumprimento integral do contratualizado, que anexo. Como fortemente sugerido, proponho então a flexibilização de 20% deste montante, considerado a produção em causa como igual a 100%. A flexibilização de 20%, para mais ou para menos, seria aferida trimestralmente consoante o cumprimento das metas de Internamento, Consulta Externa e Bloco Operatório. Seriam também tomadas em conta todas as adversidades ao integral cumprimento, alheias ao trabalho médico.
Q.Assim, foi atribuído ao AUTOR o seguinte acréscimo remuneratório mensal:
a.- REMUNERAÇÃO FIXA: 80% = €800,00
b.- REMUNERAÇÃO VARIÁVEL: 20% = €200,00
Total: 100% = €1.000,00
R.Mais se determinou que a remuneração variável seria aferida trimestralmente, consoante o cumprimento, ou não, das metas de produção de serviço.
S.Assim, e a partir daquela data, o AUTOR passou a auferir, para além do valor da remuneração anteriormente fixado e já supra identificado, o montante mensal de €1.000,00 (mil euros).
T.O montante de € 800,00 (oitocentos euros) foi considerado sempre, ao longo dos anos, para efeitos de cálculo do subsídio de férias e do subsídio de Natal.
U.O pagamento do montante de 200,00€ assumiu carater mensal, regular e periódico.
V.O montante de € 1.000,00 (mil euros) foi atribuído ao ora AUTOR, pelo Conselho de Administração do ora RÉU, ao abrigo da plena autonomia de que, à data da respetiva atribuição, beneficiavam os Conselhos de Administração das E.P.E., na fixação das condições remuneratórias dos profissionais de saúde com contrato individual de trabalho.
W.O pagamento de tal montante nunca ficou dependente da realização de qualquer atividade de recuperação de cirurgias em atraso ou de qualquer valor a disponibilizar no âmbito do SIGIC (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia) nunca tendo sido intenção do RÉU integrar tal componente no SIGIC.
X.Quando a atividade do serviço de cirurgia plástica não atingiu os objetivos definidos, não o foi por causas imputáveis ao AUTOR[1]
Y.Tais causas alheias ao AUTOR consistiram, entre outras, em:
a.-Múltiplos cortes na disponibilização de salas de cirurgia;
b.-Avarias em materiais e dispositivos essenciais à prossecução da atividade cirúrgica da especialidade, tais como ventiladores;
c.-Falta de anestesistas; e
d.-Desistências de doentes,
Z.Fatores esses que tiveram um impacto na atividade da especialidade e na satisfação dos objetivos definidos.
AA.O não cumprimento dos objetivos ficou sempre a dever-se a fatores alheios à atividade médica (tal como tinha sido expressamente previsto no memorando interno), o montante de € 200,00 (duzentos euros), que o RÉU denominou como remuneração variável, em função do cumprimento dos objetivos definidos, nunca sofreu qualquer alteração, tendo-se mantido o seu pagamento ao AUTOR com caráter mensal, certo, pontual e regular.
BB.Em virtude da pandemia provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e pela doença COVID-19, tais constrangimentos têm sido cada vez maiores, com redução grave dos meios disponíveis para a cirurgia plástica, designadamente, camas em enfermaria, anestesistas e salas no bloco operatório, pelo que sempre seria expectável que uma atividade como a cirurgia plástica tivesse uma redução da procura enquanto durar a situação pandémica.
CC.O acréscimo da retribuição do AUTOR, no valor de € 1.000,00 (mil euros) nunca teve como pressuposto qualquer alteração ao seu tempo normal de trabalho uma vez que o RÉU declarou que: (…) os referidos profissionais desenvolvem a sua prestação de trabalho durante o mesmo período horário em que o faziam antes, não se podendo considerar que exista produção adicional que motive a atribuição de qualquer complemento” e mais à frente “(…). Aquilo que este Conselho de Administração não pode deixar de reconhecer é que os referidos profissionais, com a aposentação do terceiro elemento da equipa de cirurgia plástica, tornaram-se mais eficientes e eficazes, conseguindo desenvolver uma maior produção médica – sejam no que concerne a cirurgias realizadas, seja no que concerne a consultas médicas prestadas – do que anteriormente conseguiam e tudo durante o mesmo período normal de trabalho.
DD.O que se pretendia era que o AUTOR e o outro médico do serviço de cirurgia, dentro do mesmo horário normal de trabalho, fizessem um esforço adicional, por forma a realizarem o trabalho que até então era realizado pelo médico que, entretanto, se aposentou, objetivo que foi plenamente alcançado.
EE.O que o AUTOR sempre fez, nos 11 (onze) anos que se seguiram ao aumento da sua remuneração, nos termos supra expostos, mantendo-se o pagamento mensal, certo, pontual e regular do acréscimo retributivo de € 1.000,00 (mil euros) mensais.
FF.Retribuição mensal que se manteve a mesma durante mais de 11 (onze) anos, tendo sido sempre paga ao AUTOR pelo RÉU, com caráter pontual, regular, periódico e contínuo.
GG.Através da Deliberação n.º 25/2020, de 9 de outubro, o Conselho de Administração do RÉU deliberou revogar a deliberação do Conselho de Administração de 14 de maio de 2009, que fixou o acréscimo retributivo ao AUTOR no montante de € 1.000,00 (mil euros), fazendo cessar o seu pagamento ao AUTOR (fazer cessar o pagamento do complemento remuneratório e propor a ambos os profissionais a presentação de um plano de cirurgia adicional a definir em articulação com a Direção do Departamento Cirúrgico, nos exatos termos e condições atualmente aplicáveis às demais equipas cirúrgicas e enformado nas regras do SIGIC)
HH.Notificado dessa deliberação, o AUTOR pronunciou-se contra tendo, no entanto, através da Deliberação n.º 30/2020, do Conselho de Administração do RÉU este órgão vindo revogar Deliberação do Conselho de Administração de 14 de maio de 2009, fazendo cessar o pagamento do montante mensal de € 1.000,00 (mil euros) ao AUTOR.
II.Desde o mês de dezembro de 2020 e até à presente data, o RÉU passou a proceder ao pagamento de menos € 1.000,00 (mil euros) mensais ao AUTOR.
JJ.Não provado.
KK.Não provado.
LL.Pelo facto de receber a quantia de €1.000,00 a título certo, fixo, determinado e constante, o ora AUTOR planeou e concebeu a sua vida familiar e privada a contar com tal valor mensal.
MM.Em função disso, assumiu compromissos financeiros compatíveis com a remuneração mensal auferida que não resistem a uma redução drástica de tal remuneração.
NN.A diminuição da sua remuneração mensal provocou-lhe vergonha e desgosto.
OO.e PP.A situação financeira em que se viu, depois de 11 anos de absoluta dedicação ao R. e aos respetivos utentes, provocou-lhe enorme tristeza, sentindo-se humilhado e envergonhado.
QQ.Não provado.
RR.Não provado.
SS.Desde a diminuição da remuneração, e pelos problemas financeiros que atravessa, sente-se triste e deixou de ter a alegria que sempre o caracterizou.
TT.Não provado.

Dos alegados pelo Réu:
A.Os profissionais afetos ao serviço de cirurgia plástica beneficiaram de uma crescente melhoria da qualidade assistencial proporcionado aos utentes, quer em termos de eficiência na utilização dos recursos, quer em termos de efetividade dos resultados alcançados.
B.Não escrito.

***

O DIREITO:

Como 2ª questão a dirimir elencámos a seguinte: Em consequência (da propugnada modificação de facto), as questões 2.4.2 e 3 abordadas na sentença devem responder-se em contrário?
A questão emerge das Conclusões nº 16 e 19.
Em sede de alegações sustentou-se que do exposto quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, isto é, alterando as decisões aos concretos pontos de facto supra mencionados, dúvidas não se poderão manter que o pagamento dos dois prémios em causa era realizado em função das metas de serviço de cirurgia plástica, que eram mais exigentes antes da pandemia; mas que já durante a pandemia Covid 19 com a redução da atividade cirúrgica, cessou a situação de facto que esteve na base da atribuição de tais prémios, e que, por isso a deliberação do CA no sentido da sua cessação foi legítima.
Na sentença a questão 2.4.2 assumiu a seguinte epígrafe: 2.4.2. A segunda questão que importa decidir é a de saber se as quantias que, desde há mais de 11 anos, são pagas ao Autor integram, ou não, o conceito de remuneração” e a questão 3 “3.- DECISÃO FINAL”, sendo integrada pelo decisório.
Da conjugação do alegado com as conclusões nas quais se sustenta a questão elencada resulta, pois, claro, que em causa está apenas a legitimidade da deliberação do Conselho de Administração.
Toda a fundamentação vai nesse sentido, designadamente a referência aos Ac. do STJ de 1/04/2009 do qual se extrai que resulta ser permitido ao empregador retirar ao trabalhador determinados complementos salariais se cessar, licitamente, a situação que serviu de fundamento à atribuição dos mesmos, sem que daí decorra a violação do analisado princípio a retribuição pode ser encarada de diferentes perspetivas, e da RC de 26/03/2015, Proc.º 806/13.0TTCBR. Ou ainda as referências doutrinais citadas, a saber, RAMALHO, Mª do Rosário Palma, Tratado de Direito do Trabalho Parte II – Situações laborais individuais, Almedina, Coimbra, 2014, 5ª edição, páginas 687 e 688 e MARTINEZ, Pedro Romano, Direito do Trabalho, Almedina, 7ª edição, Lisboa, 2015, página 618.

Através da Deliberação n.º 25/2020, de 9 de outubro, o Conselho de Administração do RÉU deliberou revogar a deliberação do Conselho de Administração de 14 de maio de 2009, que fixou o acréscimo retributivo ao AUTOR no montante de € 1.000,00 (mil euros), fazendo cessar o seu pagamento ao AUTOR (fazer cessar o pagamento do complemento remuneratório e propor a ambos os profissionais a presentação de um plano de cirurgia adicional a definir em articulação com a Direção do Departamento Cirúrgico, nos exatos termos e condições atualmente aplicáveis às demais equipas cirúrgicas e enformado nas regras do SIGIC). Decisão mantida pela deliberação nº 30/2020.

Muito embora tendo logrado a modificação de alguns dos pontos de facto impugnados, tal modificação não foi de molde a sustentar uma alteração da decisão.

Desde logo, em nenhum momento a alteração conseguida (da matéria de facto) se prendeu com qualquer circunstância imposta pela pandemia COVID 19. E nem o acervo fático permite qualquer ponderação das mesmas, pois em momento algum se constata alguma referência à dita pandemia com repercussões na decisão do Conselho de Administração.

Efetivamente decorre de tal acervo que o não cumprimento dos objetivos ficou sempre a dever-se a fatores alheios à atividade médica (tal como tinha sido expressamente previsto no memorando interno) e que em virtude da pandemia provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e pela doença COVID-19, tais constrangimentos têm sido cada vez maiores, com redução grave dos meios disponíveis para a cirurgia plástica, designadamente, camas em enfermaria, anestesistas e salas no bloco operatório, pelo que sempre seria expectável que uma atividade como a cirurgia plástica tivesse uma redução da procura enquanto durar a situação pandémica (AAA e BB). Porém, daqui não emerge que a alteração imposta à retribuição se fundasse na pandemia ou em algo que lhe esteja associado. E nem sequer que tenham ficado por cumprir alguns objetivos.

Do mesmo modo não vemos que o acervo fático cuja prova se obteve traduza a cessação da situação de facto que esteve na base da atribuição dos complementos remuneratórios. Ou que as metas de serviço eram mais exigentes antes da pandemia.

Na ausência dos pressupostos de facto em que o Apelante funda a questão, o sucesso da mesma está votado ao fracasso.

Não deixaremos, contudo, de reproduzir a argumentação tecida sob o ponto 2.4.2 da sentença, a saber:
No caso dos autos, certo é que, desde há mais de 11 anos que, pontualmente, o Réu, pela prestação de trabalho do Autor como médico especialista do serviço de cirurgia plástica, paga-lhe mensalmente, a quantia de €1.000,00 concluindo-se, pois, que tal pagamento foi feito de forma regular e periódica, todos os meses do ano, durante mais de 11 tendo sido o montante de € 800,00 (oitocentos euros) considerado para efeitos de cálculo dos subsídios de férias e de Natal, sendo inequívoco que tais prestações (€800,00 e €200,00) têm um valor patrimonial, sempre pagas ao trabalhador pela atividade desenvolvida no período normal do trabalho.
De salientar que, pese embora a parcela de €200,00 tenha sido acordada em função do desempenho do Autor, desempenho este a avaliar trimestralmente, certo é que nunca houve lugar a tal avaliação e, mesmo que tivesse sido efetuada, os objetivos traçados em função de tal desempenho, não foram alcançados por causas absolutamente estranhas ao Autor, razão pela qual, fica acionada, relativamente à totalidade dos €1.000,00 mensais, a presunção ínsita no número 1 do artigo 258.º, do Código do Trabalho, presunção essa iuris tantum (cfr. arts. 349º e 350º do CC) não ilidida pelo Réu, e fica também a situação jus laboral, no que respeita à remuneração, tutelada pelo nº 4. do artigo 258.º, do Código do Trabalho.
Declara-se, pois, que a prestação de €1.000,00 que o Réu, desde há mais de 11 anos, paga ao Autor mensalmente como contrapartida do seu trabalho, tem a natureza de retribuição.
Não obstante a modificação introduzida no ponto U, da qual resulta agora como não provado que nunca se procedeu a qualquer aferição das metas de produção, os considerandos assim expendidos mantém-se válidos. Na verdade, absolutamente relevante para a questão é a existência de uma prestação cujo pagamento foi efetuado regular e periodicamente, durante mais de 11 anos, em consequência da atividade desenvolvida pelo Apelado – pontos K a Q e EE  e FF. E, não obstante se ter determinado que a remuneração variável (200,00€) seria aferida trimestralmente, consoante o cumprimento, ou não, das metas de produção de serviço, o certo é que a partir da atribuição, o AUTOR passou a auferir, para além do valor da remuneração anteriormente fixado, o montante mensal de €1.000,00 (pontos R, S e U). Donde, a decisão proferida em 1ª instância se deve manter incólume.

Não havendo outras questões a decidir, improcede a apelação.

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As custas da apelação, não obstante a parcial procedência da impugnação da decisão de facto, ficam a cargo do Apelante, visto tal procedência não se repercutir na decisão final (Artº 527º do CPC).

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Em conformidade com o exposto, acorda-se em modificar o acervo fático conforme sobredito e julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença.
Custas pelo Apelante.
Notifique.
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Lisboa, 3/05/2023


MANUELA FIALHO
ALDA MARTINS
SÉRGIO ALMEIDA



[1]Corrige-se a redação deste ponto de modo a fazê-la coincidir com o subsequente. Constava “não o foi por causas não imputáveis ao AUTOR”