Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | VAZ GOMES | ||
Descritores: | DIREITO ESTRANGEIRO ESTADO ESTRANGEIRO CUSTAS RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRA-CONTRATUAL APOIO JUDICIÁRIO COMPETÊNCIA INTERNACIONAL COMPETÊNCIA INTERNACIONAL DOS TRIBUNAIS PORTUGUESES | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/11/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | Sumário da responsabilidade do relator: I- Em Espanha, o serviço público da administração da justiça é gratuito. Não são cobradas taxas ou encargos pela utilização deste serviço. No entanto, regra geral, o litígio dá origem a determinados custos, nomeadamente: honorários de advogados e procuradores; custos com a publicação de anúncios em jornais oficiais; depósitos necessários para a interposição de determinados recursos; remunerações de especialistas ou peritos. De um modo geral, estes custos devem ser pagos antecipadamente pela parte interessada. No termo do processo, o tribunal tem de decidir quem deve, em última instância, suportar os custos através do princípio conhecido em Espanha como «condenação ao pagamento das custas» («condena en costas»), baseado no critério da condenação objectiva segundo o qual «quem perde paga». Todos os cidadãos da UE que demonstrem não dispor de recursos suficientes (para litígios transfronteiriços, apenas pessoas singulares), assim os nacionais de países terceiros que residam legalmente em Espanha ou cujos direitos sejam reconhecidos por convenções internacionais (por exemplo, as convenções sobre o rapto internacional de crianças) beneficiam igualmente deste direito, nas mesmas condições que os cidadãos da UE; em matéria de emprego, qualquer trabalhador assalariado, independentemente da sua nacionalidade e dos seus meios financeiros, associações e fundações de utilidade pública. No caso de litígios transfronteiriços, o apoio judiciário pode ser obtido se se provar que os custos do processo não podem ser cobertos devido a diferenças de custo de vida entre o Estado-Membro do domicílio e a Espanha. Os pedidos de apoio judiciário, juntamente com a documentação pertinente, devem ser apresentados aos serviços de orientação jurídica da Ordem dos Advogados do local onde se situa o tribunal que aprecia o processo principal, ou ao tribunal do domicílio do requerente, se o processo não tiver sido iniciado. A Ordem dos Advogados pode adoptar as seguintes decisões provisórias: notificar o interessado de que o pedido enferma de vícios que devem ser sanados no prazo de dez dias, caso contrário este será arquivado; declarar que o pedido não é admissível e carece de fundamento e notificar a Comissão de Apoio Judiciário em conformidade; declarar que o pedido cumpre os requisitos legais, nomeando nesse caso um advogado no prazo de 15 dias, e notificando a Ordem dos «Procuradores» (Colegio de Procuradores) para nomear um «procurador» no prazo de três dias. A Ordem dos Advogados apresentará o pedido à Comissão de Apoio Judiciário para aprovação final. Se a Ordem dos Advogados não puder tomar uma decisão no prazo de 15 dias, o requerente deve reiterar o seu pedido diretamente à Comissão de Apoio Judiciário, que decidirá nomear imediatamente um «procurador» e um advogado, a título provisório, enquanto verifica as informações e os documentos. A decisão final sobre a concessão ou não do apoio judiciário deve ser adoptada pela Comissão de Apoio Judiciário no prazo de 30 dias a contar da recepção do pedido. Se, decorridos 30 dias, ainda não tiver sido tomada uma decisão, as decisões provisórias adoptadas pela Ordem dos Advogados e dos «Procuradores» serão ratificadas. A decisão deve ser notificada, no prazo de três dias, ao requerente, à Ordem dos Advogados, à Ordem dos «Procuradores» e ao tribunal competente, ou ao presidente do tribunal, se o processo não tiver sido iniciado. O requerente pode impugnar a decisão relativa ao apoio judiciário através de um requerimento apresentado à própria Comissão no prazo de dez dias a contar da notificação da decisão. A impugnação é decidida pelo tribunal competente. II- O Autor na acção de responsabilidade extracontratual do Reino de Espanha em suma alega que pretendendo executar em Espanha sentença de condenação de empresa espanhola proferida por tribunal português, desde o início que o patrocínio judiciário em Espanha suscitou vários entraves que, obstaculizavam o início do processo, o Autor apresentou queixa junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, bem como, junto da Provedoria de Justiça, em Janeiro do ano de 2002 ainda o Autor recorria ao Ministério da Justiça Espanhol para tentar tramitar o seu processo nunca obteve quaisquer resultados de todas as diligências promovidas, em 2016 voltou a requerer apoio judiciário junto da Segurança Social para o efeito, confrontado o patrono espanhol com a situação, este declarou-se incompetente em razão da competência territorial, dando nota ao Autor que iria reportar a situação à sua Ordem, o Autor aguarda, até hoje, por um contacto que jamais voltou a existir, não aceita o tratamento a que foi votado, manifestando profunda indignação com o funcionamento do sistema judiciário espanhol no âmbito da assistência jurídica gratuita requerida e deferida. III- A jurisprudência dos tribunais evoluiu de posições que consideravam em termos quase absolutos a imunidade jurisdicional dos Estados estrangeiros para a tese da imunidade restrita; também na jurisprudência portuguesa, designadamente no foro do trabalho, esta tese tem vindo a receber acolhimento. Tendo como dado adquirido que a teoria restritiva da imunidade é hoje dominante, há que ver se estamos perante um acto de gestão pública ou de gestão privada. a distinção entre atos jure imperii e jure gestionis também pode ser feita à partir do teste que procura identificar se o acto tem caráter governamental ou se o acto poderia ser praticado por um particular. Neste último caso, o acto seria classificado como jure gestionis. IV- A concessão do apoio judiciário em Espanha nunca poderia ser realizada por um particular qualquer, apenas pode ser feito pela mencionada entidade que, nessa matéria, desempenha funções que se podem considerar funções do Estado, desde logo porque da decisão da não concessão pode haver recurso para o Tribunal como se referiu, por outro lado, mesmo pelo critério do propósito do acto, o propósito do requerente de apoio judiciário é o de pleitear a sua causa, seja a execução da sentença portuguesa perante um Tribunal espanhol e assim obter o pagamento das quantias em que a empresa espanhola foi condenada em tribunal português já nos idos de 2001, o que sendo um propósito particular ou pessoal do requerente apenas pode ser realizado mediante o recurso aos tribunais, seja pelo exercício da função jurisdicional, que é uma função do Estado, neste caso uma função do Estado espanhol pelo que, mesmo por esse critério do propósito, o acto deve ser entendido como uma acto de iure imperii e por isso um acto sujeito à imunidade de jurisdição do Reino de Espanha. Ocorrendo uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha apenas perante os tribunais espanhóis é que o autor poderia fazer valer os seus direitos, sendo por essa razão incompetentes os tribunais portugueses para conhecer da acção. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: I – RELATÓRIO APELANTE/AUTOR: A … (Litigando com apoio judiciário nas modalidades de nomeação e patrono, e pagamento da compensação e dispensa de pagamento de honorários e encargos) * APELADA/RÉ: MINISTÉRIO das RELAÇÕES EXTERIORES do ESTADO ESPANHOL, representado pela EMBAIXADA DE ESPANHA em LISBOA * Valor da acção: 87.078,31€ (cinco mil, cento e cinquenta e nove euros e vinte cinco cêntimos) (sentença recorrida). * I.1. O Autor propôs contra a Ré a presente acção declarativa de condenação onde pede a condenação do Réu pagar-lhe uma indemnização no montante de 87.078,31€ (oitenta e sete mil, setenta e oito euro e trinta e um cêntimos) – dos quais 77.078,31€, a título de danos patrimoniais e 10.000,00€ (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais -, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento. Em suma alega que por sentença proferida pelo Tribunal de Trabalho de Lisboa datada de 05.01.2001, na sequência de acção contra a empresa espanhola B …, S.A sediada em Espanha, foi a mesma condenada a pagar ao Autor da quantia de 3.045.000 pesetas pelos salários que deixou de auferir, 1.213.333 pesetas, igualmente a título de vencimentos não pagos, 7.000.000 pesetas a título de comissões vencidas e não pagas pelas vendas efectuadas, 1.067,261 pesetas a título dos proporcionais de férias e subsídio de férias, acrescido de juros de mora vincendos sobre as prestações em atraso, o que veio a equivaler a um total de 74.078,31€, a título de pedido principal sem computar e acrescer os juros vincendos, no decurso dos autos de processo laboral os legais representantes da B …, S.A., encerraram a empresa em Portugal ausentando-se do país para Espanha, onde estavam sediados B …, S.A. foi condenada de acordo com a lei espanhola no pedido, todos os contactos encetados pelo Autor para tentar ressarcir-se dos valores em débito saíram frustrados, restando-lhe a execução, desde o início que o Patrocínio Judiciário em Espanha suscitou vários entraves que, obstaculizavam o início do processo, o Autor apresentou queixa junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, bem como, junto da Provedoria de Justiça, em Janeiro do ano de 2002 ainda o Autor recorria ao Ministério da Justiça Espanhol para tentar tramitar o seu processo nunca obteve quaisquer resultados de todas as diligências promovidas, em 2016 voltou a requerer apoio judiciário junto da Segurança Social para o efeito, confrontado o Patrono Espanhol com a situação, este declarou-se incompetente em razão da competência territorial, dando nota ao Autor que iria reportar a situação à sua Ordem, o Autor aguarda até hoje por um contacto que jamais voltou a existir, não aceita o tratamento a que foi votado, manifestando profunda indignação com o funcionamento do sistema judiciário espanhol no âmbito da assistência jurídica gratuita requerida e deferida. O Autor, com todo este processo, sofreu danos quer patrimoniais, quer não patrimoniais, danos patrimoniais decorrentes da inexistência de qualquer ressarcimento da quantia em dívida no montante de 74.078,31€, bem como, de todas as diligências a que esteve obrigado para dar andamento à execução e que estima em montante nunca inferior a 3.000,00 euros, deslocou-se várias vezes a Madrid e, pelo menos, uma a Badajoz teve, assim, obrigatoriamente, despesas com deslocações e com a respectiva acomodação, acresce ainda os danos não patrimoniais sofridos pelos incómodos, desgaste com o processo, ansiedade, perda de tempo, angustia e tristeza por se sentir enganado quer pela entidade patronal, quer pelo próprio sistema que nada fez para acautelar a situação, pelos danos não patrimoniais o valor computado no mínimo de 10.000,00€ no valor total indemnizatório de 87.078,31€ (oitenta e sete mil, setenta e oito euros e trinta e um cêntimos) o Autor não encontra como responsabilizar o Estado Espanhol pela ineficiência dos seus serviços senão através do esgotamento dos recursos internos para, quiçá, a final vir a acautelar a repetição de situações idênticas. As simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, há, por força da lei, o dever de praticar o acto omitido: cf. o artigo 486.º do Código Civil, Os Estados respondem pela culpa funcional dos seus agentes. I.2. Foi proferido despacho aos 28/1/2022 a declarar a incompetência absoluta deste Tribunal por infracção das regras de competência internacional dos tribunais portugueses, com custas pelo Autor sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido. I.3. Inconformado o Autor dele apelou em cujas alegações conclui: i. Causa de pedir é o facto jurídico de que emerge a pretensão deduzida, isto é, o ato ou facto jurídico em que o autor se baseia para formular o seu pedido. ii. A causa de pedir é constituída pelo conjunto dos factos concretos suscetíveis, segundo a perspetiva do autor, de produzir o efeito jurídico pretendido iii. Quando a causa de pedir é complexa e contém mais do que um facto, o altruísmo e a abnegação da lei processual portuguesa são elevados: é suficiente, para reconhecer a competência internacional, a circunstância de algum (ou alguns) desses factos ter ocorrido em Portugal(vide REMÉDIO MARQUES, Acão Declarativa à Luz do Código Revisto (Pelo DL n.º 303/2007, de 24/08), p. 178 . iv. Por outro lado, ainda que subsidiariamente, deve sempre ser admitida a competência internacional dos Tribunais portugueses ao abrigo do artigo 62º, al. c) do C.P.C., atendendo aos fortes elementos de conexão com a ordem jurídica portuguesa e a apreciável dificuldade em propor “nova” ação em Espanha, o que é notório atenta a factualidade que está na base dos presentes autos. v. Já que, a alínea c) consagra o critério da necessidade, que alarga a competência dos tribunais portugueses às situações em que o direito invocado apenas se possa efetivar por meio de ação proposta em território português, ou em que seja apreciavelmente difícil para o autor a sua propositura no estrangeiro (digamos que in casu o Autor não o consegue. Com efeito, trata-se de uma emanação do dever geral que incumbe ao Estado de garantir o acesso à justiça para tutela dos direitos (cf. artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem) e que, por essa razão, sempre seria de admitir mesmo na ausência de expressa previsão sequer equacionar. v.i. Em nosso entender, a douta sentença ora recorrida violou assim o disposto nas alíneas b) e c) do artigo 62º., do Código de Processo Civil. Termos em que pelos fundamentos expostos a sentença recorrida violou os artigos 59º., 60º., e 62º., al. b) e c) do Código de Processo Civil, devendo ser revogada e, consequentemente, determinar-se o prosseguimento dos autos até final como é de justiça. I.4. Já nesta Relação por despacho proferido aos 3/5/2022 pela então ilustre Juíza Desembargador (Maria José Mouro) foi determinado que os autos baixassem ao tribunal recorrido ao abrigo dos disposto nos art.ºs 641/7 e 629/3-c para se citar a Ré para os termos do recurso e da causa. I.5. Baixando os autos para a citação veio a Ré a intervir suscitando desce logo a nulidade da sua citação e a intempestividade do recurso, à cautela contra-alegando onde concluí: 1. O recurso de apelação da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal deve ser interposto no prazo de 15 dias, pelo que o prazo legalmente previsto para recorrer da decisão recorrida terminou em 18.02.2022. 2. O recurso interposto é manifestamente intempestivo, com o consequente trânsito em julgado da decisão recorrida, que deve manter na íntegra. 3. A decisão recorrida não merece qualquer censura, encontrando-se devidamente sustentada em termos de facto e de direito. 4. Segundo resulta dos factos alegados (causa de pedir), estamos perante situação de responsabilidade extracontratual, na medida em que está em causa a responsabilidade do Recorrido – Reino de Espanha - por não ter providenciado a devida assistência jurídica ao Recorrente, para efeitos de execução de sentença. 5. Os factores de atribuição de competência internacional aos Tribunais Portugueses são definidos no art.º 62.º do CPC. 6. No caso em apreço, inexiste qualquer elemento de conexão com a ordem jurídica Portuguesa, como bem entendeu o Tribunal a quo, num raciocínio que não é abalado pelas alegações do Recorrente. 7. O facto gerador da responsabilidade imputada ao Recorrido não ocorreu em Portugal, nem existe qualquer outro facto relevante, que sustente a causa de pedir, praticado em território português. 9. Salvo o devido respeito, o critério legal da al. c) é de natureza objectiva, pelo que não pode o Recorrente invocar os factos que integram a própria causa de pedir para inverter a natureza de tal critério, tornando-o subjectivo. 10. Objectivamente, não se vislumbra qualquer dificuldade apreciável do autor na propositura da acção no estrangeiro, sendo que a factualidade que o Recorrente alega nesse sentido nem sequer se encontra provada, não podendo, por isso, ser argumento utilizado para confirmar aquela dificuldade. 8. Alega o Recorrente que existe dificuldade apreciável do autor na propositura da acção no estrangeiro, porquanto os presentes autos derivam, precisamente, de tal dificuldade já sentida no passado quanto à execução da sentença condenatória. 11. De igual modo, não se vislumbra existir qualquer conflito negativo de jurisdições, nem o direito invocado pelo Recorrente ficaria sem garantia judiciária face à declaração de incompetência internacional dos tribunais Portugueses, na medida em que pode ser exercido perante os Tribunais espanhóis, falhando, por isso, a verificação do critério da necessidade. 12. O único facto ocorrido em território nacional terá sido, alegadamente, o pedido e deferimento da concessão de apoio judiciário, sendo que não é esse acto que sustenta o pedido de condenação formulado a final contra o Recorrido. 13. Os danos invocados pelo Recorrente não decorreram desse acto inicial, mas sim dos que se lhe seguiram e que o Recorrente imputa ao ora Recorrido, pelo que não poderá esse acto ser considerado um elemento de conexão relevante para determinar a competência dos Tribunais Portugueses. 14. O facto ilícito que o Recorrente imputa ao Recorrido, e que integra a causa de pedir, não foi praticado em território português, falhando, pois e também, a verificação do invocado critério de causalidade. 15. Também a matéria substantiva em causa reitera aponta para a incompetência territorial dos Tribunais portugueses. 16. Considerando que estamos perante uma acção de responsabilidade civil extracontratual de um Estado soberano, permitir que fosse outro Estado a julgar a actuação do primeiro, abrindo-se a possibilidade, pelo menos teórica, de vir a ser proferida uma decisão condenatória, constituiria uma clara ingerência no exercício do seu poder jurisdicional e mesmo uma violação à sua soberania. 17. Não se pode admitir que o Estado Português pudesse apreciar a imputada responsabilidade do Estado Espanhol no exercício da função judicial que traduz um poder público, i.e., um verdadeiro acto de iure imperii, o que poderia redundar no absurdo jurídico de um Tribunal Português vir a condenar o Estado Espanhol ao pagamento de uma determinada indemnização, e já sem referir as dúvidas levantadas quanto à lei aplicável a tal decisão. Termos em que se requer a V. Exas. se dignem negar provimento ao recurso interposto pelo Recorrente, mantendo-se na íntegra a decisão recorrida. Assim decidindo, farão V. Exas. a costumada JUSTIÇA! I.6. Por despacho de 22/4/2022, no tribunal recorrido, entendeu-se que: “Requerimento do Réu – Reino de Espanha – de 16/11/2023 – apresentação de contra-alegações: Citado nos termos do art. 641º nº 7 do C.P.C. em cumprimento do doutamente determinado por decisão do Tribunal da Relação, veio o Réu invocar a nulidade da citação por não ter sido observado o disposto na Convenção das Nações Unidas obre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens, aberta à assinatura em Nova Iorque em 17 de Janeiro de 2005, aprovada pela Assembleia da República Portuguesa, cuja versão em português se encontra anexa à Resolução da Assembleia da República n.º 46/2006, publicada no Diário da República, I Série A, n.º 117, de 20 de Junho de 2006. Do expediente que antecede resulta além de mais que a advocacia do Estado Espanhol não aceitou a citação/notificação por não estar acompanhada de tradução. Efectivamente tem razão o Réu, pois, nos termos do art. 1º nº 1 do Regulamento UE 2020/1784 do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de novembro de 2020 relativo à citação ou notificação de atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados-Membros (citação ou notificação de atos), o mesmo não é aplicável à responsabilidade de um Estado-Membro por atos e omissões no exercício do poder público («acta iure imperii»), como é o caso da situação vertente. Haveria que ter em conta o disposto no art. 22º da antedita Convenção das Nações Unidas obre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens. Assim, a citação foi por isso irregular e como tal é nula (arts. 191º nº 1 e 2), mas não carece de ser repetida posto que o Réu interveio na acção, tendo apresentado as suas alegações e revelado pleno conhecimento da mesma, sendo inútil proceder à repetição da sua citação já que a falta cometida, em concreto, não prejudicou a sua defesa (art. 195º nº 4 do C.P.C.). Prosseguindo, admitem-se as contra-alegações apresentadas e no que toca à intempestividade do recurso interposto pelo Autor invocada pelo Réu, o certo é que o mesmo já foi admitido e então considerado tempestivo. Em todo o caso, sempre se diga que também em nosso entendimento o prazo de recurso aplicável é o que resulta do disposto no art. 644º nº 1 al. a) do C.P.C., ou seja, 30 dias, porquanto, a decisão de incompetência colocou termo ao processo absolvendo o Réu da instância e a redução para 15 dias do prazo para interposição de recurso, nos termos conjugados nos arts. 638º, nº 1 e 644º, nº 2 do mesmo diploma vale apenas para decisões interlocutórias (neste sentido, inter alia, acórdão do S.T.J. de 31/02/2019 proferido no processo nº 27417/16.6T8LSB-A.L1.S2 in www.dgsi.pt). Notifique.” I.7. Por despacho do Relator convidou-se o recorrente a pronunciar-se sobre a questão da imunidade jurisdicional do Reino de Espanha ínsita nas contra-alegações por ser prévia à questão a competência internacional dos tribunais portugueses e, sobre tal, o recorrente veio dizer que a imunidade jurisdicional dos Estados implica que um Estado soberano não pode ser sujeito à jurisdição dos tribunais de um Estado estrangeiro, a imunidade jusrisdicional dos estados é um instituto distinto das imunidades diplomáticas e consulares, pelo que, sendo a acção proposta contra a Embaixada de um Estado estrangeiro, não está em causa a aplicação directa do regime das imunidades contido na Convenção de Basileia de 16 de Maio de 1972 sobre Relações Diplomáticas de âmbito Europeu (convenção que, não vigorando na ordem interna portuguesa, tem, o mérito de evidenciar uma tendência geral sobre o âmbito da aplicação do princípio de direito internacional sobre a imunidades dos estados), o regime da imunidade jurisdicional dos Estados encontra-se regulado pela Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens, de 17 de janeiro de 2005, aprovada na ordem jurídica portuguesa pela Resolução da Assembleia da República n.º 46/2006, de 20 de abril esta imunidade permite que os Estados pratiquem actos em relação a si e aos seus bens, no exercício do seu poder soberano, sem intervenção da jurisdição de outros Estados. Um Estado não pode, contudo, invocar imunidade no âmbito de processos onde estejam em causa: (i) transações comerciais; (ii) contratos de trabalho; (iii) danos causados a pessoas e bens; (iv) propriedade, posse e utilização de bens; (v) propriedade intelectual ou industrial; (vi) participações em sociedade ou outras pessoas coletivas; (vii) navios de que um Estado é proprietário ou explora; e ainda (viii) em relação aos efeitos das convenções de arbitragem em que o Estado seja parte. Estas exceções estão previstas nos artigos 10.º a 17.º da Convenção Assim, a prática da imunidade jurisdicional relativa é, hoje, dominante na comunidade internacional, passando a resolução da questão posta por indagar se a actividade a que se refere o litígio se configura como acto jure imperii ou jure gestionis, sendo actos jure imperii os actos de poder público, de manifestação de soberania, enquanto os actos jure gestionis são actos de natureza privada. Com efeito e de acordo com a teoria da imunidade jurisdicional relativa os Estados beneficiam de imunidade para actos jure imperii, mas não para os actos jus gestionis, por tal se entendendo aqueles actos em que os Estados intervêm como pessoa de direito privado em relações de direito privado. Em conformidade e pelo que nos presentes autos está em causa, entendemos que não deverá ser reconhecida a imunidade de jurisdição da Embaixada de Espanha, ora Recorrida e por via disso, reconhecida a competência internacional do Tribunal Cível português para julgar a acção em apreciação. I.8.Nada obsta ao conhecimento do recurso. I.9. Questões a resolver: a) Saber se ocorre uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha. b) Não ocorrendo uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação do disposto nas alíneas b) e c) do artigo 62º., do Código de Processo Civil, e bem assim como dos artigos 59º, 60º, do mesmo diploma legal, devendo ser revogada e, consequentemente, determinar-se o prosseguimento dos autos até final como é de justiça. II- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO É do seguinte teor a decisão recorrida: “Da Incompetência Internacional dos Tribunais Portugueses A …, com domicílio no Largo …, nº. …, …. Esq., 1500-200 Lisboa, intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO ESTADO ESPANHOL, representado pela EMBAIXADA DE ESPANHA EM LISBOA, com domicílio na Rua …, nº. …, 1269-052 Lisboa, peticionando que o Réu seja condenado a pagar uma indemnização ao Autor no montante de 87.078,31€ (oitenta e sete mil, setenta e oito euro e trinta e um cêntimos) – dos quais 77.078,31€, a título de danos patrimoniais e 10.000,00€ (dez mil euros) a título de danos não patrimoniais - acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação até integral pagamento. Para o efeito, alegou, em síntese, que no ano e 2000 o Autor intentou no Tribunal de Trabalho de Lisboa uma ação com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra a empresa espanhola B …, S.A. Por Sentença datada de 05.01.2001, a alegada empresa sediada em Espanha, B …, S.A. foi condenada de acordo com a lei espanhola no pedido, designadamente no pagamento ao Autor da quantia de 3.045.000 pesetas pelos salários que deixou de auferir, 1.213.333 pesetas, igualmente a título de vencimentos não pagos, 7.000.000 pesetas a título de comissões vencidas e não pagas pelas vendas efetuadas, 1.067,261 pesetas a título dos proporcionais de férias e subsídio de férias, acrescido de juros de mora vincendos sobre as prestações em atraso. Não obstante as diligências realizadas para executar a sentença, não aceita o tratamento a que foi votado pelo funcionamento do sistema judiciário espanhol no âmbito da assistência jurídica gratuita requerida e deferida. Consequentemente, sofreu danos patrimoniais decorrentes da inexistência de qualquer ressarcimento da quantia em dívida no montante de 74.078,31€, bem como, de todas as diligências a que esteve obrigado para dar andamento à execução e que estima em montante nunca inferior a 3.000,00€ (Três mil euros). Cumpre apreciar. No caso em apreço estamos perante uma relação jurídica em que são partes o Autor, pessoa singular, cidadão português, e o Réu, MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES DO ESTADO ESPANHOL, pressupondo a Signatária que o Autor pretende demandar o Estado Espanhol, atentos os factos constitutivos da causa de pedir. Daqui resulta que estamos perante uma ação relativa a responsabilidade extracontratual. Nos termos do art. 62.º do CPC, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes: a) Quando a ação possa ser proposta em tribunal português segundo as regras de competência territorial estabelecidas na lei portuguesa; b) Ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação, ou algum dos factos que a integram; c) Quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real. A alínea a) convoca-nos para a previsão ínsita no n.º 2 do art. 71.º do Código de Processo Civil, nos termos do qual “se a ação se destinar a efetivar a responsabilidade civil baseada em facto ilícito ou fundado no risco, o tribunal competente é o correspondente ao lugar onde o facto ocorreu”. Atentos os factos alegados pelo Autor, o facto gerador de responsabilidade civil não ocorreu, sob nenhuma forma, em Portugal, porquanto, alegou dificuldades na execução de sentença portuguesa em Espanha. No que respeita à al. b), inexiste qualquer facto praticado em território português constitutivo da causa de pedir. Por fim, afigura-se-nos que não se verificam os pressupostos a que alude a al. c) do artigo 62.° do Código de Processo Civil, cuja razão de ser visa prevenir conflitos negativos de jurisdição e evitar situações de denegação de justiça, sendo que a tutela dos direitos de personalidade é transversal ao mundo ocidental. Deste modo, estamos perante a verificação da exceção de incompetência internacional dos Tribunais portugueses para apreciar a presente ação, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 96.° do Código de Processo Civil, a qual configura exceção dilatória e tem como consequência a absolvição do Réu da instância, nos termos do n.° 2 do artigo 576.º e da alínea a) do artigo 577. °, ambos do Código de Processo Civil, caso o mesmo já tenha sido citado, o que não aconteceu nos presentes autos. Pelo exposto decide-se declarar a incompetência absoluta deste Tribunal por infração das regras de competência internacional dos tribunais portugueses.(...)” III- FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO III.1. Conforme resulta do disposto nos art.ºs 608/2, 5, 635/4 e 639 (anteriores 660, n.º 2, 664, 684, n.º 3, 685-A, n.º 3), do CPC[1] são as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso. É esse também o entendimento uniforme do nosso mais alto Tribunal (cfr. por todos o Acórdão do S.T.J. de 07/01/1993 in BMJ n.º 423, pág. 539. III.2. Não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objecto tal como enunciadas em I III.3. Saber se ocorre uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha. III.3.1. Sustenta o Reino de Espanha nas conclusões das suas contra-alegações, para além de pugnar pela bondade do decidido quanto à incompetência internacional dos tribunais portugueses que se não pode admitir que o Estado Português possa apreciar a imputada responsabilidade do Estado Espanhol no exercício da função judicial que traduz um poder público, i.e., um verdadeiro acto de iure imperii, o que poderia redundar no absurdo jurídico de um Tribunal Português vir a condenar o Estado Espanhol ao pagamento de uma determinada indemnização, e já sem referir as dúvidas levantadas quanto à lei aplicável a tal decisão. Transparecendo que a decisão da concessão (ou não) da protecção judiciária em Espanha tal como em Portugal não constitui o exercício de uma função judicial antes de uma função administrativa do Estado há que, primeiramente, avaliar se ocorre na situação dos autos imunidade jurisdicional do Reino de Espanha, ou seja, uma situação que impeça a propositura de uma acção em Portugal contra o Reino de Espanha perante os Tribunais portugueses. Adiantamos desde já que não está em causa a imunidade ratione personae de chefes de Estado, chefes de governo Ministros das Relações Exteriores, em exercício, o que tem sido entendido como imunidade diplomática, que que tem sido considerado absoluta por diversas decisões de tribunais europeus e pelo próprio CDI se bem que em relação aos chefes de estado se restrinja ao período em que exercem o seu mandato, quem está na acção é o Ministério das Relações Exteriores de Espanha representado pela Embaixada de Espanha em Portugal coisa diferente, sendo que o alegado acto ilícito gerador de danos sofridos pelo Autor em Portugal se consubstanciou na circunstância de o Autor ao tentar executar em Espanha a sentença do tribunal de trabalho portuguesa contra empresa espanhola não o conseguiu na medida em que o patrocínio judiciário que o Autor solicitou em Espanha suscitou vários entraves que, obstaculizaram o início do processo. O regime da imunidade jurisdicional dos Estados encontra-se regulado pela Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens, de 17 de janeiro de 2005, a qual foi aprovada na ordem jurídica portuguesa pela Resolução da Assembleia da República n.º 46/2006, de 20 de abril. A referida Convenção não se encontra em vigor na medida em que, de acordo com o seu artigo 30.°, apenas vigorará no 30. ° dia seguinte à data do depósito do 30.° instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão junto do Secretário-Geral das Nações Unidas e no momento presente há 28 assinaturas e apenas 21 países a ratificaram, aceitaram ou aprovaram 15. Ainda que nestes países se inclua Portugal, não tem a Convenção força vinculativa a se, não podendo ser directamente invocada. Contudo tendo em consideração as prescrições da Convenção de Viena de 1961 [artigos 22.°, n.° 3 e 1.°, alínea i) e tendo em consideração que na ordem jurídica interna, vigora a regra consuetudinária emergente dos citados preceitos convencionais da Convenção da ONU de Nova Iorque, nos termos do artigo 8.°, n.°1 da Constituição da República Portuguesa (costume internacional de âmbito geral), regra que emerge também da jurisprudência que vem sendo emitida em vários Estados há que ver a interpretação que tem vindo a ser feita do princípio da imunidade. O princípio da imunidade jurisdicional dos Estados estrangeiros é um corolário do princípio da igualdade soberana dos Estados e está consagrado no artº 2º-1 da Carta das Nações Unidas segundo o qual nenhum Estado (em princípio) pode julgar os actos de um outro ou mesmo um dos seus órgãos superiores, maxime por intermédio de um dos seus tribunais, sem o consentimento deste, trata-se duma noção de direito internacional que se desenvolveu a partir da máxima par in parem non habet imperium. Todavia, o desenvolvimento das relações internacionais e a intervenção crescente do Estado em áreas do direito privado concorreram para o reforço da teoria da imunidade relativa em detrimento da teoria da imunidade absoluta, segundo aquela teoria, o estado beneficiaria da imunidade para os actos jure imperii, mas não para os actos jure gestionis (aqueles em que intervém como pessoa de direito privado em relações de direito privado); a Convenção de Basileia, ao limitar o número de casos em que os Estados podem invocar a imunidade de jurisdição, acompanha a tendência que se desenvolveu na doutrina e jurisprudência da maioria dos países, Portugal assinou esta convenção em 10.05.1979, mas não a ratificou (o que significa que a mesma não vigora no país). No direito português, não existe norma que regule a questão da imunidade jurisdicional dos Estados estrangeiros perante os tribunais portugueses, como se disse, a questão tem que ser apreciada à luz das normas e dos princípios do Direito Internacional, os quais, segundo o artº 8º-1 da Constituição da República Portuguesa, fazem parte integrante do direito português. A jurisprudência dos tribunais evoluiu de posições que consideravam em termos quase absolutos a imunidade jurisdicional dos Estados estrangeiros para a tese da imunidade restrita; também na jurisprudência portuguesa, designadamente no foro do trabalho, esta tese tem vindo a receber acolhimento. Tendo como dado adquirido que a teoria restritiva da imunidade é hoje dominante, há que ver se estamos perante um acto de gestão pública ou de gestão privada. Embora não seja pacífico o critério distintivo entre estes actos, O Supremo Tribunal de Justiça considera dominante o que atende à respectiva natureza, assim, segundo este critério, actos jure imperii serão os actos de poder público, de manifestação de soberania; enquanto, os actos jure gestionis, são actos de natureza privada, os que poderiam ser de igual modo praticados por um particular.[2] A Convenção Europeia sobre a Imunidade dos Estados é dividida em seis partes, entre as quais, a primeira reúne as regras mais substanciais sobre a imunidade dos Estados. Em conformidade com os termos do artigo 15º (que é o último artigo da primeira parte, mas que serve de ilustração genérica), um Estado Parte desta Convenção tem direito à imunidade de jurisdição perante os tribunais nacionais de outro Estado parte, se uma ação judicial em causa não se enquadrar nas situações especificadas pelos artigos 1º a 14 (art.º 15 da Convenção de Basileia). Neste sentido, o Relatório Explicativo da Convenção de Basileia chama a Convenção de uma “conciliação” entre a doutrina restritiva e a doutrina absoluta, uma vez que os Estados ainda têm direito a invocar a imunidade relativamente a todos os outros atos que não estão previstos nesta Convenção, mesmo que esses actos sejam de jure gestionis de acordo com a doutrina restritiva[3]. Vejamos as principais categorias de excepções à imunidade que estão enumeradas na Convenção de Basileia. O nº 1 do artigo 1º diz respeito à submissão voluntária de um Estado à jurisdição estrangeira, quando for o próprio Estado a instituir um processo ou intervir num processo perante um tribunal de outro Estado. Um Estado, quer seja a parte autora quer seja a parte interveniente está a afastar-se voluntariamente da sua imunidade de jurisdição e, mesmo que numa fase posterior, as posições do autor e do réu forem revertidas num pedido reconvencional, o Estado que instaurou o processo não poderá invocar posteriormente a imunidade. Em conformidade com as disposições do artigo 2º, um Estado não pode invocar a imunidade de jurisdição se ele tiver consentido expressamente no exercício da jurisdição por um tribunal estrangeiro e este consentimento reveste-se de várias formas, tais como acordos internacionais, contratos escritos ou um consentimento expresso após ter surgido a disputa (art.º 2). O artigo 3º determina até que ponto uma conduta de um Estado for equivalente ao seu consentimento para o exercício da jurisdição pelo tribunal do Estado do foro e, se o Estado em causa comparecer perante o tribunal para reivindicar o seu direito à imunidade, isso não deve ser considerado como tendo renunciado à imunidade. Sujeito às disposições do artigo 5º, o nº 1 do artigo 4º prevê que um Estado não pode invocar a imunidade num processo relacionado com as suas obrigações contratuais quando estas, por força de um contrato, devem ser cumpridas no território do Estado do foro (art.º 4/1 da Convenção de Basileia). A lógica inerente ao artigo 4º é, de certa forma, análoga àquela do artigo 5º, cujas disposições tratam da situação em que a imunidade não pode ser invocada num processo relacionado com um contrato de trabalho entre um Estado e uma pessoa singular, quando o trabalho do empregado tem que ser realizado no território do Estado do foro. A entidade patronal e o trabalhador podem acordar diversamente por escrito, a menos que, em conformidade com o direito do Estado do foro, os seus tribunais tenham competência exclusiva sobre o litígio em causa. Se o empregado é nacional do seu Estado empregador no momento da instauração do processo ou se o reclamante não é nacional nem residente habitual do Estado do foro, o Estado demandado ainda pode invocar a imunidade de jurisdição. Para além de garantir a posição dos indivíduos em relações laborais com os Estados empregadores, o artigo 6º, por sua vez, tem como objectivo proteger os interesses e direitos das pessoas singulares e coletcivas em relações com os Estados, nomeadamente aquando da participação de um Estado com uma ou mais pessoas privadas numa sociedade, associação ou outra entidade jurídica com sede, domicílio social ou principal local de negócios no território do Estado do foro. Se surgir um processo judicial atinente a disputas decorrentes desta relação entre o Estado demandado e outras pessoas jurídicas, o demandado não pode reivindicar o direito à imunidade soberana, a não ser que as partes interessadas tenham acordado em sentido diverso. O disposto do artigo 7º pretende abranger os principais actos de natureza jure gestionis exercidos pelos Estados, tais como as actividades comerciais, industriais ou financeiras, resumindo-os numa categoria genérica de restrição à imunidade de jurisdição. Para além da sua natureza jure gestionis, estas actividades devem ser levadas a cabo pelo Estado acusado da mesma maneira que uma pessoa privada e por meio dos seus escritórios, agências ou outros estabelecimentos no território do Estado do foro. Os artigos 8º e 9º examinam as excepções à imunidade jurisdicional em termos dos direitos de propriedade intelectual e industrial e de propriedade, posse e utilização de bens imóveis, sobre os quais os Estados não gozam da imunidade em situações previstas nestes artigos, sem prejuízo do estatuto jurídico de imóveis utilizados por missões diplomáticas e postos consulares não deve ser afetada O artigo 10º diz respeito à restrição da imunidade de jurisdição dos Estados quando os processos estiverem relacionados com quaisquer direitos dos réus sobre bens móveis ou imóveis em virtude de uma herança, doação ou bona vacantia. Em conformidade com as disposições do artigo 11º, um Estado não pode reivindicar o direito à imunidade de jurisdição em processos relativos à reparação de danos pessoais ou de danos de bens corpóreos ocorridos no território do Estado do foro. É de frisar que os termos neste artigo não fazem a distinção entre os atos jure imperii e jure gestionis. Desde que tenha havido danos à pessoa ou danos materiais, a categoria de excepção à imunidade aplica-se igualmente a quaisquer reclamações concomitantes de danos morais decorrentes dos atos alegadamente atribuídos ao Estado demandado; pelo contrário, se não tiver causado quaisquer danos físicos nem danos materiais, não se aplica esta exceção à imunidade que está prevista no artigo 11. Conforme o artigo 12º, se um Estado tiver concluído por escrito para submeter os litígios à arbitragem, salvo previsão em contrário no acordo de arbitragem, este Estado não pode invocar a imunidade de jurisdição num tribunal de outro Estado que seja competente para julgar o caso num processo judicial relativo à validade ou interpretação do acordo de arbitragem, ao processo de arbitragem ou à rejeição da decisão arbitral. Em rigor, os termos do artigo 13º não constituem uma categoria de excepção à imunidade. Por fim, o disposto do artigo 14º, que trata da última categoria de excepção, destina-se a evitar que a imunidade de um Estado obstrua o exercício de competências dos tribunais do Estado do foro em termos de administrar, supervisionar ou organizar a administração de bens, tais como uma propriedade fideicomissária ou o património resultante de uma falência. Uma das evoluções na Ordem Jurídica Internacional é o fortalecimento da posição dos indivíduos como verdadeiros sujeitos do Direito Internacional e o alargamento da legitimidade ativa a sujeitos não estaduais. Observa-se o surgimento do chamado “human-being-oriented approach”, em contraposição com o “State sovereignty-oriented approach. A transição da doutrina absoluta da imunidade para a doutrina restritiva reflete, por um lado, a consciência sobre a injustiça de os Estados invocarem a imunidade ao exercer atos jure gestionis e, por outro lado, a preocupação acerca da proteção de direitos e interesses de indivíduos face aos Estado. O acto gerador da responsabilidade civil extracontratual atribuído ao Reino de Espanha representada em juízo pela sua embaixada em Portugal, prende-se com a função jurisdicional espanhola ainda que em relação a um particular dessa função que é a concessão- ou não concessão- ao Autor em Espanha da protecção judiciária solicitada para promover o processo de execução perante das autoridades judiciárias espanholas. Colhe-se do respectivo portal[4] que em Espanha, o serviço público da administração da justiça é gratuito. Mais se refere aí que não são cobradas taxas ou encargos pela utilização deste serviço, no entanto, regra geral, o litígio dá origem a determinados custos, nomeadamente: honorários de advogados e procuradores; custos com a publicação de anúncios em jornais oficiais; depósitos necessários para a interposição de determinados recursos; remunerações de especialistas ou peritos. De um modo geral, estes custos devem ser pagos antecipadamente pela parte interessada. No termo do processo, o tribunal tem de decidir quem deve, em última instância, suportar os custos através do princípio conhecido em Espanha como «condenação ao pagamento das custas» («condena en costas»), baseado no critério da condenação objetiva segundo o qual «quem perde paga». Todos os cidadãos da UE que demonstrem não dispor de recursos suficientes (para litígios transfronteiriços, apenas pessoas singulares), assim os nacionais de países terceiros que residam legalmente em Espanha ou cujos direitos sejam reconhecidos por convenções internacionais (por exemplo, as convenções sobre o rapto internacional de crianças) beneficiam igualmente deste direito, nas mesmas condições que os cidadãos da UE; em matéria de emprego, qualquer trabalhador assalariado, independentemente da sua nacionalidade e dos seus meios financeiros; Associações e fundações de utilidade pública. No caso de litígios transfronteiriços, o apoio judiciário pode ser obtido se se provar que os custos do processo não podem ser cobertos devido a diferenças de custo de vida entre o Estado-Membro do domicílio e a Espanha. O apoio judiciário pode ser concedido em todos os tipos de processos, contenciosos ou não, cujo montante seja superior a 2 000 EUR, excepto se a matéria em causa exigir a assistência de um advogado, e abranger todas as formalidades, tanto eventuais recursos que se interponham como a execução de decisões judiciais. Os pedidos de apoio judiciário, juntamente com a documentação pertinente, devem ser apresentados aos serviços de orientação jurídica da Ordem dos Advogados do local onde se situa o tribunal que aprecia o processo principal, ou ao tribunal do domicílio do requerente, se o processo não tiver sido iniciado. A Ordem dos Advogados pode adoptar as seguintes decisões provisórias: notificar o interessado de que o pedido enferma de vícios que devem ser sanados no prazo de dez dias, caso contrário este será arquivado; declarar que o pedido não é admissível e carece de fundamento e notificar a Comissão de Apoio Judiciário em conformidade; declarar que o pedido cumpre os requisitos legais, nomeando nesse caso um advogado no prazo de 15 dias, e notificando a Ordem dos «Procuradores» (Colegio de Procuradores) para nomear um «procurador» no prazo de três dias. A Ordem dos Advogados apresentará o pedido à Comissão de Apoio Judiciário para aprovação final. Se a Ordem dos Advogados não puder tomar uma decisão no prazo de 15 dias, o requerente deve reiterar o seu pedido diretamente à Comissão de Apoio Judiciário, que decidirá nomear imediatamente um «procurador» e um advogado, a título provisório, enquanto verifica as informações e os documentos. A decisão final sobre a concessão ou não do apoio judiciário deve ser adotada pela Comissão de Apoio Judiciário no prazo de 30 dias a contar da recepção do pedido. Se, decorridos 30 dias, ainda não tiver sido tomada uma decisão, as decisões provisórias adotadas pela Ordem dos Advogados e dos «Procuradores» serão ratificadas. A decisão deve ser notificada, no prazo de três dias, ao requerente, à Ordem dos Advogados, à Ordem dos «Procuradores» e ao tribunal competente, ou ao presidente do tribunal, se o processo não tiver sido iniciado. O requerente pode impugnar a decisão relativa ao apoio judiciário através de um requerimento apresentado à própria Comissão no prazo de dez dias a contar da notificação da decisão. A impugnação é decidida pelo tribunal competente. Dificilmente se pode considerar que a decisão ou a omissão de decisão sobre um pedido de apoio judiciário perante os serviços de orientação jurídica da Ordem dos Advogados do local onde se situa o tribunal (em Espanha) que aprecia o processo principal pode ser considerado um acto de gestão. O Tribunal Internacional de Justiça identificou, na prática dos Estados, que uma distinção é feita entre actos jure imperii e atos jure gestionis de forma que os Estados têm, em regra, direito à imunidade em respeito àqueles. Apesar da possibilidade de se distinguir entre esses dois tipos de atos, a distinção nem sempre é clara e há casos capazes de gerar controvérsias. Com a aplicação da imunidade relativa, surge o problema relativo ao critério a ser utilizado para distinguir os atos soberanos dos atos comerciais dos Estados. Ao decidir disputas que envolvam transações que tenham tanto elementos comerciais quanto governamentais, surge a questão se os tribunais nacionais devem analisar apenas a natureza da transação, ou se o seu propósito deve também ser levado em conta para a classificação dos actos como jure imperii ou jure gestionis. Assim, dois critérios são usados para distinguir entre atos jure imperii e atos jure gestionis. Um deles é baseado na natureza do acto e o outro no propósito do acto. A Convenção da ONU determina que, em regra, o critério da natureza do acto deve ser aplicado pelos tribunais. Contudo, o propósito do acto deve ser levado em conta caso as partes assim tiverem acordado ou se na prática do Estado do foro o propósito do ato for relevante para determinar se um acto tem caráter comercial ou não. Assim, o artigo 2 (2) da Convenção da ONU estabelece que para a identificação de uma transacção comercial deve-se analisar, primeiramente, a natureza do contrato ou transação em questão. Contudo, o propósito da transação também deve ser levado em conta: (i) se as partes do contrato ou transação assim concordarem; ou (ii) se na prática do Estado do foro, o propósito for relevante para determinar o caráter não comercial de um contrato ou transação. Dependendo do critério utilizado, pode-se chegar a conclusões opostas. Por exemplo, o acto da compra de bens para as forças armadas pode ser considerado um acto privado, caso o critério da natureza do acto for aplicado, ou um acto soberano, se o critério do propósito do ato for aplicado. Weiss, que foi juiz do TPJI (Tribunal Penal de Justiça Internancional), defendeu que se deve levar em conta a sua natureza e não o propósito do ato. O teste consistiria não em analisar se a transação visava alcançar um objetivo diretamente ligado às funções políticas do Estado, mas analisar, independentemente do propósito, a natureza jurídica da transação, de forma a identificar se ela poderia ser praticada por um particular ou não. Não haveria imunidade quando um particular pudesse praticar o acto, como no caso de contratos firmados pelo Estado estrangeiro. Assim, a distinção entre actos jure imperii e jure gestionis também pode ser feita à partir do teste que procura identificar se o acto tem caráter governamental ou se o acto poderia ser praticado por um particular. Neste último caso, o acto seria classificado como jure gestionis.[5] Ora a concessão do apoio judiciário em Espanha nunca poderia ser realizada por um particular qualquer, apenas pode ser feito pela mencionada entidade que, nessa matéria, desempenha funções que se podem considerar funções do Estado, desde logo porque da decisão da não concessão pode haver recurso para o Tribunal como se referiu, por outro lado, mesmo pelo critério do propósito do acto, o propósito do requerente de apoio judiciário é o de pleitear a sua causa, seja a execução da sentença portuguesa perante um Tribunal espanhol e assim obter o pagamento das quantias em que a empresa espanhola foi condenada em tribunal português já nos idos de 2001, o que sendo um propósito particular ou pessoal do requerente apenas pode ser realizado mediante o recurso aos tribunais, seja pelo exercício da função jurisdicional que é uma função do Estado neste caso uma função do Estado espanhol pelo que mesmo por esse critério do propósito o acto deve ser entendido como uma acto de iure imperii e por isso um acto sujeito à imunidade de jurisdição do Reino de Espanha. Ocorrendo uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha apenas perante os tribunais espanhóis é que o autor poderia fazer valer os seus direitos, sendo por essa razão incompetentes os tribunais portugueses para conhecer da acção. III.4. Não ocorrendo uma situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha saber se ocorre no despacho recorrido erro de interpretação e de aplicação do disposto nas alíneas b) e c) do artigo 62º., do Código de Processo Civil, e bem assim como dos artigos 59º, 60, do mesmo diploma legal, devendo ser revogada e, consequentemente, determinar-se o prosseguimento dos autos até final como é de justiça. III.4.1. Como acima se disse ocorre a situação de imunidade jurisdicional do Reino de Espanha e consequentemente a incompetência dos tribunais portugueses para apreciar a questão, o que bastaria para considerar prejudicada a questão. Mas, mesmo que assim se não entenda, sempre se confirmaria a decisão recorrida que assentou nas seguintes razões: “A alínea a) do art.º 62 do Código de Processo Civil convoca-nos para a previsão ínsita no n.º 2 do art. 71.º do Código de Processo Civil, nos termos do qual “se a ação se destinar a efetivar a responsabilidade civil baseada em facto ilícito ou fundado no risco, o tribunal competente é o correspondente ao lugar onde o facto ocorreu. Atentos os factos alegados pelo Autor, o facto gerador de responsabilidade civil não ocorreu, sob nenhuma forma, em Portugal, porquanto, alegou dificuldades na execução de sentença portuguesa em Espanha. No que respeita à al. b), inexiste qualquer facto praticado em território português constitutivo da causa de pedir. Por fim, afigura-se-nos que não se verificam os pressupostos a que alude a al. c) do artigo 62.° do Código de Processo Civil, cuja razão de ser visa prevenir conflitos negativos de jurisdição e evitar situações de denegação de justiça, sendo que a tutela dos direitos de personalidade é transversal ao mundo ocidental. III.4.2. Discorda o recorrente em suma dizendo que “quando a causa de pedir é complexa e contém mais do que um facto, o altruísmo e a abnegação da lei processual portuguesa são elevados: é suficiente, para reconhecer a competência internacional, a circunstância de algum (ou alguns) desses factos ter ocorrido em Portugal(vide REMÉDIO MARQUES, Acção Declarativa à Luz do Código Revisto (Pelo DL n.º 303/2007, de 24/08), p. 178 . iv. Por outro lado, ainda que subsidiariamente, deve sempre ser admitida a competência internacional dos Tribunais portugueses ao abrigo do artigo 62º, al. c) do C.P.C., atendendo aos fortes elementos de conexão com a ordem jurídica portuguesa e a apreciável dificuldade em propor “nova” ação em Espanha, o que é notório atenta a factualidade que está na base dos presentes autos. v. Já que, a alínea c) consagra o critério da necessidade, que alarga a competência dos tribunais portugueses às situações em que o direito invocado apenas se possa efetivar por meio de ação proposta em território português, ou em que seja apreciavelmente difícil para o autor a sua propositura no estrangeiro (digamos que in casu o Autor não o consegue). Com efeito, trata-se de uma emanação do dever geral que incumbe ao Estado de garantir o acesso à justiça para tutela dos direitos (cf. artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e artigo 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem) e que, por essa razão, sempre seria de admitir mesmo na ausência de expressa previsão sequer equacionar. Não vemos em que medida é que a causa de pedir seja complexa já que o facto gerador da responsabilidade, seja a acção ou omissão das entidades competentes espanholas para a concessão do apoio judiciário ao autor ocorreu em Espanha. O terceiro critério é o da necessidade, previsto na alínea c) do art. 62º do Cód. de Proc. Civil, da qual resulta que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes «quando o direito invocado não possa tornar-se efetivo senão por meio de ação proposta em território português ou se verifique para o autor dificuldade apreciável na propositura da ação no estrangeiro, desde que entre o objeto do litígio e a ordem jurídica portuguesa haja um elemento ponderoso de conexão, pessoal ou real.» É um caso excepcional e subsidiário de competência, por meio do qual se tem em vista evitar que o direito fique sem garantia judiciária (Cfr. Alberto dos Reis, “Comentário ao Código de Processo Civil”, vol. 1º, 2ª ed. pág. 139). É uma cláusula de salvaguarda tendente a evitar que, atenta a impossibilidade de ordem prática ou jurídica (v.g. recusa de competência) ou a grave dificuldade da instauração da ação num tribunal de outro Estado, o direito em causa possa ficar sem tutela efectiva (v.g. casos de guerra ou outras calamidades). Porém, nestes casos, a atribuição da competência aos tribunais nacionais exige uma forte conexão com a ordem jurídica portuguesa, seja de ordem pessoal (v.g. nacionalidade ou residência das partes), seja de natureza real (v.g. o facto de se situar em território nacional o bem que é objeto imediato ou mediato da ação).[6]. O Autor é português e os danos alegadamente ocorreram em território nacional. Quanto ao critério da dificuldade em propor a acção em Espanha é um tanto ou quanto imperceptível porque a dificuldade prende-se com a dificuldade em obter o apoio judiciário em Espanha mas não resulta demonstrado que o Autor tenha esgotado os meios que a legislação espanhola concede em matéria de apoio judiciário, designadamente, no caso de falta de resposta da Ordem dos advogados, o requerimento directo à Comissão de Apoio Judiciário e eventual impugnação judicial por falta de resposta. O que o requerente diz, em suma, é que apresentou queixa junto do Ministério dos Negócios Estrangeiros, bem como, junto da Provedoria de Justiça, em Janeiro do ano de 2002 ainda o Autor recorria ao Ministério da Justiça Espanhol para tentar tramitar o seu processo nunca obteve quaisquer resultados de todas as diligências promovidas, em 2016 voltou a requerer apoio judiciário junto da Segurança Social para o efeito, confrontado o Patrono Espanhol com a situação, este declarou-se incompetente em razão da competência territorial, dando nota ao Autor que iria reportar a situação à sua Ordem, o Autor aguarda até hoje por um contacto que jamais voltou a existir, não aceita o tratamento a que foi votado, manifestando profunda indignação com o funcionamento do sistema judiciário espanhol no âmbito da assistência jurídica gratuita requerida e deferida. Deu o requerente os passos correctos para ver satisfeitos os seus direitos perante as entidades competentes e por último o recurso aos tribunais perante a omissão? Tornou-se impossível perante os tribunais espanhóis a satisfação do direito do Autor? Os factos alegados não permitem concluir tal pelo que ainda que se admitisse não estarmos perante a imunidade jurisdicional do Reino de Espanha, mesmo pelo critério da necessidade da alínea c) do art.º 62 não é possível concluir pela competência internacional dos Tribunais portugueses. Falece assim o recurso. IV- DECISÃO Tudo visto acordam os juízes em julgar improcedente a apelação, consequentemente mantêm a decisão recorrida, ainda que com fundamentação não inteiramente coincidente. Regime da Responsabilidade por Custas: as custas são da responsabilidade do recorrente que decai e porque decai (art.º 527/1 e 2) sem prejuízo do apoio judiciário que lhe foi concedido nas modalidades mencionadas. Lxa., 11-07-2024 Vaz Gomes Laurinda Gemas Carlos Branco _______________________________________________________ [1] Na redacção que foi dada ao Código do Processo Civil pela Lei 41/2013, de 26/6, atentas as circunstâncias de a acção de responsabilização por facto ilícito extracontratual ter sido intentada em 2022 e a decisão recorrida ter sido proferida em 22/1/2024 e o disposto nos art.ºs 5/1 da Lei 41/2013 de 26/7 que estatui que o novel Código de Processo Civil entrou em vigor no dia 1/09/2013 e que se aplica imediatamente a todas as acções; ao Código referido, na redacção dada pela Lei 41/2013, de 26/6, pertencerão as disposições legais que vierem a ser mencionadas sem indicação de origem. [2] Cfr entre outros AcSTJ de 18/2/2006, no processo 05s32379 relatado por Maria Laura Leonardo disponível no sítio www.dgsi.pt [3] Council of Europe, Explanatory Report to the European Convention on State Immunity, European Treaty Series No. 74, Basel, 1972, parág.56. [4] https://e-justice.europa.eu/37129/PT/legal_aid?SPAIN&clang=pt [5] Cfr. ALCICI, Lucas Moreira, AS IMUNIDADES JURISDICIONAIS DO ESTADO E O PAPEL DO TRIBUNAL INTERNACIONAL DE JUSTIÇA NA PROTEÇÃO DIPLOMÁTICA, tese de mestrado, 2019, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, pp 24 a 27 , doutrina aí referida, disponível on line. [6] GERALDES, Abrantes, PIMENTA, Paulo e de SOUSA, Pires, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, 2ª ed., pág. 99 |