Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | SUSANA SANTOS SILVA | ||
Descritores: | LIQUIDAÇÃO DO ACTIVO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO PRECLUSÃO VENDA NULIDADE | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/15/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PROCEDENTE | ||
Sumário: | I - Se existirem motivos para assacar à decisão judicial a violação dos princípios do contraditório, a sindicabilidade do despacho proferido sobre a arguição de uma nulidade secundária está condicionada pela alegação da concreta violação deste princípio. No que concerne a cada uma das decisões a que se reporta o n.º 2 do art.º 630º, entre os quais a violação do princípio do contraditório, deverá a parte interpor recurso desta decisão. II. Não tendo sido arguida por nenhum dos interessados a nulidade da venda com fundamento na venda de bem não apreendido para a massa insolvente, tem-se por sanada, não cabendo ao Tribunal de recurso conhece-la. III - Não sendo o ato processual extemporâneo não há que apreciar e por consequência concluir pela extemporaneidade do requerimento apresentado, não enfermando o despacho recorrido da nulidade por omissão de pronúncia, prevista no art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC. IV - No caso de venda em estabelecimento de leilão a interpelação a que alude o art. 823º do CPC, só pode ser cumprida pelo Administrador da Insolvência depois de ter uma proposta de compra e a aceitação da mesma, cumprindo ao preferente ir diretamente ao processo de execução exercer o seu direito. V – Em caso do desconhecimento dos preferentes não há lugar à aplicação do disposto nos art. 819º, n.º 3 do CPC nos termos do art. 17º nº1 do CIRE, dado que a tramitação prevista naqueles preceitos contraria o regime especificamente desenhado pelo legislador da insolvência para a liquidação do ativo. VI - Em face da finalidade do processo de insolvência que é, no caso de liquidação do património do devedor, a repartição do produto obtido pelos credores, tendo os prédios em causa nos autos sido vendidos em segundo leilão, realizado entre os preferentes que se apresentaram a preferir, após terem sido convocados por editais, por preço superior ao da primeira venda, e por via da aplicação dos arts. 1380º e 417º do Cód. Civil, não configura qualquer irregularidade ou incumprimento de regra imperativa que seja suscetível de gerar invalidade dos atos de liquidação – venda em leilão, adjudicação e comunicação para efeitos de direito de preferência. VII - Tendo já sido concretizada a venda mediante escritura de compra e venda, fica esta venda sem efeito, nos termos do disposto no art.º 839º, n.º1, al. a) do CPC ex vi do art.º 17º do CIRE. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 1ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa I. Relatório 1. Por sentença de 27 de janeiro de 2016 proferida nos autos principais foi declarada a insolvência de AA, residente…. 2. Em 21/12/2022 BB apresentou requerimento indicando que, nos termos e para os efeitos previstos no art. 835.º do Cód. Proc. Civil, “vem RECLAMAR CONTRA AS IRREGULARIDADES cometidas no ato do leilão”, concluindo como segue: “Termos em que, deve ser desconsiderado o despacho que ordenou nova venda executiva sob a modalidade de leilão eletrónico exclusiva a preferentes porquanto não só não figuram como preferentes os pretensos adquirentes na medida em que não são confinantes nem disso fizeram prova, como se comprova, bem como não poderia a primeira venda, celebrada com o reclamante, ter sido “anulada” e “substituída” por outra modalidade, por não se enquadrar, a situação dos autos, na previsão dos arts. 819º, 830º a 832º Cód. Proc. Civil e 416º e 1410.º do Cód. Civil normas que se têm por violadas. Devendo e venda ocorrida, porque nula, ser substituída por decisão que ordene a celebração da escritura pública publicitada e mais bem descrita nos termos anunciados a 04.04.2022, Condenando-se leiloeira e Exma. A. E. pelo incumprimento contratual perpetrado em virtude da não celebração da anunciada escritura pública de compra e venda. Pede respeitosamente deferimento”. 3. O pedido de anulação da venda consubstanciava-se nos seguintes fundamentos: No âmbito dos presentes autos vieram apreendidos e posteriormente anunciados, para venda, em leilão, quatro terrenos, inscritos na respetiva caderneta predial sob os artigos 2084, 2057, 2056 e 2123; e, procedendo-se à venda sob alegada modalidade de leilão eletrónico, pela Exma. AE veio aceite a proposta de aquisição/licitação apresentada pelo reclamante, designado por licitante; assim, durante o período inicial de leilão, mais precisamente no dia 18.02.2022, invocando a qualidade de preferente, o licitante apresentou uma proposta de aquisição dos quatro prédios no valor global de 6.000,00€; vindo, no entanto, informado de que o procedimento de negociação particular (não se entende?!) que corria termos, terminava apenas a 11.03.2022, pelo que teria de aguardar o seu curso; tudo se processando como se duas vendas, em simultâneo, corressem os seus termos, ainda que tendo por base/ objetos os mesmos bens, o que não se concebe nem concede!; no entanto a proposta que apresentara veio aceite a 24.03.2022, não tendo existido qualquer outra proposta para além da que havia formulado. Nesse mesmo dia o reclamante, em consequência, procedeu ao pagamento do sinal acrescido da respetiva comissão; Disso tendo sido emitida fatura-recibo, nomeadamente, quanto à comissão da leiloeira; subsequentemente, a 04.04.2022 veio publicado edital no qual se dava conta da “celebração de escritura pública de compra e venda a ter lugar durante o mês de maio de 2022.”; o que, contudo, não veio a suceder porquanto, a 29.06.2022, veio criada (nova?!) modalidade de venda, sob a forma de proposta por negociação particular destinada exclusivamente para o melhor proponente e alegados confinantes, com a data-limite de apresentação das ofertas de 04.07.2022; e, posteriormente, mais precisamente a 29.11.2022 veio o reclamante notificado de que “Considerando o dissidio existente no que concerne à venda do imóvel apreendido no âmbito dos processos supra identificados, verificando-se a existência de vários confrontantes alegando direito de preferência sobre os respetivos imóveis, e ao abrigo do Artigo 823º, n.º 2 do Código de Processo Civil, entende-se que a licitação entre todos os interessados deverá ter lugar na nossa plataforma online em www.(...).pt.”; tendo o aqui reclamante tomado conhecimento por consulta do site da Leiloeira que havia sido aceite a venda a favor de um dos alegados preferentes a 6.12.2022. Ora, a decisão sobre a modalidade de venda dos bens penhorados cabe ao Exmo. AE, sendo notificada aos demais cabendo, sem lugar a recurso, ao Juiz titular decidir, sem recurso, pelo que a decisão sobre a modalidade de venda e o valor base dos bens cabe ao AE e, em derradeira instância, ao Juiz da causa; todavia, no que concerne à modalidade de venda a preferir, exceto os casos dos artigos 830.º e 831.º, deve ser dada primazia à venda de bens imóveis (como é o caso) penhorados mediante leilão eletrónico, a publicar nos termos dos n.ºs 2 a 4 do artigo 817º do Cód. Proc.Civil; e do resultado do leilão deve ser notificados o exequente, executado e credores, bem assim, o proponente, para que este deposite o preço e demonstre o cumprimento das eventuais obrigações fiscais (quanto a natureza do bem assim o imponha); salvo se existirem titulares de direito de preferência conhecidos, caso em que, antes de notificar o proponente para depósito do preço, deve ser dada oportunidade aos preferentes para exercerem o seu direito; à data de ambas as vendas referidas supra, não eram conhecidos titulares de direito de preferência não tendo, por isso, sido notificados para exercerem o seu direito de preferência e, por esse motivo, o reclamante, também ele (na verdade, exclusivo...) preferente procedeu ao depósito do preço; pelo que deveria, desde logo, ter-se concretizado a imediata adjudicação do bem ao reclamante/ proponente; sempre se dirá que, de igual modo, existindo propostas, sem conhecimento de preferentes, o bem deveria, uma vez liquidado o sinal e respetiva comissão, ter-lhe sido adjudicado de imediato; na medida em que o preço sempre seria depositado pelo comprador, numa instituição de crédito, à ordem do Agente de Execução ou, nos casos em que as diligências de execução sejam realizadas por oficial de justiça, da secretaria, antes de lavrado o instrumento da venda; em todo o caso, sempre se dirá que a venda é feita por negociação particular (cfr.art. 832º do Cód. Proc. Civil), apenas nos casos expressos nas als. do citado artigo, designadamente, f) Quando se frustre a venda em leilão eletrónico por falta de proponentes... o que não parece ser o caso dos autos com o devido respeito; aplicando-se à venda em leilão eletrónico (cfr. n.º 3 do citado artigo) as regras relativas à venda em estabelecimento de leilão em tudo o que não estiver especialmente regulado por portaria, aplica-se-lhe, designadamente, o vertido no artigo 835.º por com aquele não colidir, cabendo, por tanto, reclamação contra as irregularidades que se cometam no ato do leilão por banda de qualquer dos licitantes aqui apontadas; cabendo a anulação do leilão (cfr. n.º 2), quando as irregularidades cometidas hajam viciado o resultado da licitação; o reclamante não concebe, em face do sobredito, qual o motivo (e normativo legal) determinante da “segunda tentativa de leilão” ... muito menos da terceira quando não existia, sequer, à data de 29.06.2022, “qualquer prova e pagamentos por parte dos outros alegados confinantes antes/ durante e após esta segunda tentativa de leilão” como refere a leiloeira; os alegados confinantes (um dos quais veio efetivamente a ver-lhe adjudicado o prédio anteriormente adquirido pelo reclamante nos mesmos autos!), não são, como se logra demonstrar, tampouco preferentes, porque não são confinantes; circunstância que o reclamante veio esclarecer remetendo e-mail para o efeito quer para a leiloeira quer para a Exma. A. E, na medida em que os prédios em leilão não confinam com eventuais prédios dos alegados confinantes, não sendo, uma delas, sequer conhecida naquela localidade. Certo é que, a venda por negociação particular é a modalidade residual da venda forçada e, uma vez não verificados os requisitos dos quais depende, in casu, jamais poderia ter corrido termos; Sumariando.... sempre se dirá que, havendo titulares de direito de preferência CONHECIDOS no processo, devem ser estes notificados do resultado do leilão, dispondo do prazo de 8 dias para exercer tal direito (artigo 416º do Código Civil) de preferência, fazendo prova desse mesmo direito, caso este já não esteja formalmente evidenciado no processo; a fazer, após notificação, no prazo de oito dias contados da respetiva notificação para que possam beneficiar na venda do bem constante da certidão de encerramento de leilão eletrónico, através de comunicação escrita dirigida ao Exmo. AE, remetida por CR, juntando prova que sustente esse direito, pois que, caso venha a ser reconhecido o direito de preferência, oportunamente serão notificados os preferentes para depósito do preço e demonstração do cumprimento das demais obrigações; sendo que na venda por negociação particular (cfr. art. 819º Cód. Proc. Civil), os titulares do direito de preferência na alienação são notificados do dia, da hora e local aprazados para a abertura das propostas, a fim de poderem exercer o seu direito no próprio ato, se alguma proposta for aceite; e tratando-se de venda por negociação particular a referida obrigação de notificação dos preferentes sobre as condições do negócio de molde que possam exercer cabalmente o direito de preferência, impende sobre o encarregado de venda; sendo certo que a omissão da referida notificação não acarreta qualquer nulidade, porquanto apenas teria como consequência (cfr. n.º 4 do art. 819º do Cód. Proc. Civil) a consequência de permitir ao preferente intentar, no prazo e nas condições da lei substantiva (cfr. art. 1410º do Cód. Civil), a competente ação de preferência; no caso, pese embora não fossem conhecidos preferentes, não tendo, por conseguinte, sido possível a sua notificação, havendo-os e conhecendo-se os mesmos em fase posterior ao edital a comunicar a venda, jamais poderia subsumir-se ao vertido no artigo no que concerne à notificação do resultado do leilão... não podendo, salvo o devido respeito, ter esse objetivo/ alcance, pois que essa notificação apenas teria lugar caso os preferentes fossem conhecidos, não tendo como propósito encontrar preferentes; E os preferentes que viessem a demonstrar-se enquanto tal, deveriam fazer prova e exercer o seu direito na competente ação declarativa... mal andando quer a leiloeira quer a Exma. A. E. designada ao permitir a abertura de segundo e terceiro leilão com o propósito claro de obstar à aquisição dos prédios por banda do ora reclamante; na verdade, querendo, os pretensos preferentes sempre poderiam lançar mão do mecanismo previsto no art. 1410º do Cód. Civil, e apresentar a respetiva ação de preferência, salvaguardando, deste modo, os seus eventuais direitos. A Sra. Administradora de Insolvência pronunciou-se sobre o requerido. 4. Em 6/02/2023 (ref. n.º 4948913) foi proferida decisão pelo Tribunal a quo que indeferiu a reclamação apresentada por aquele BB contra as irregularidades cometidas no ato de leilão, com os seguintes fundamentos: “Dispõe o artigo 835º, nº1 do Código de Processo Civil que os licitantes (como é o caso de BB) podem reclamar contra as irregularidades que se cometam no ato do leilão. Contudo, e conforme aquele acaba por resumir no seu requerimento, o que o insurge não é o leilão (cujas irregularidades acaba por não invocar), mas sim a alteração da modalidade de venda por parte da Administradora da Insolvência (a qual, e bem, realizou diligências no sentido de aferir da existência de titulares do direito de preferência). Ora, não tendo havendo reclamação tempestiva da decisão de venda, não pode o Tribunal apreciar a mesma agora neste momento, pelo que se indefere o requerido.” 5. Não se conformando, em 27-02-2023, interpôs BB recurso de apelação o que veio merecer acolhimento por Acórdão desta Relação de 2/10/2023 (apenso L) decidindo nos seguintes termos: “Pelo exposto, anula-se a decisão recorrida, proferida em 06-02-2023 e decide-se que a administradora da insolvência deve ser notificada para, em 10 dias, informar nos autos e documentar os termos em que diligenciou pela venda dos bens/direitos incidindo sobre os quatro prédios indicados pelo apelante (prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …., …, … e …) e ainda do bem descrito sob a verba número 14, bem como indicar os elementos alusivos ao novo proponente e à venda realizada em leilão de 6.12.2022, nos moldes determinados supra, em 2. e 3., devendo a primeira instância, oportunamente, e depois de dar cumprimento ao contraditório, nos termos indicados, proferir decisão sobre a reclamação apresentada em 21-12-2022.” No ponto 2 do referido acórdão, em sede de fundamentação de direito, lê-se, nomeadamente: “O ponto é que a informação que agora presta é contraditória com aquela que anteriormente havia prestado nos autos, não se logrando compatibilizar a informação agora prestada e alusiva aos termos em que a venda dos (quatro) prédios indicados foi publicitada – com um leilão eletrónico a realizar, com início em 05-12-2022 às 09h00 e fim em 06-12-2022 às 12h00, conforme número 6 dos factos provados – com aquela outra informação prestada em 18-03-2022, em que informou que, quanto às verbas números 12, 14 e 15 foram recebidas duas propostas, sendo a mais elevada no valor de 6.000,00€ e que aceitou esta última, “estando a diligenciar pela efetivação da venda”, bem como “logo que realizadas as escrituras de compra e venda, serão remetidas cópias aos autos”, informação que é repetida em 04-04-2022. (…) “A decisão recorrida foi, pois, prematura, impondo-se, antes de mais, a notificação da AI para, com rigor e pormenor, informar e documentar no processo os termos em que diligenciou, individualmente ou em conjunto com o AI do outro processo, pela venda dos bens/direitos incidindo sobre os quatro prédios indicados pelo apelante (prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …, … e ….) e ainda do bem descrito sob a verba número 14, inscrito na matriz sob o artigo …. Só posteriormente se justifica a prolação, pela primeira instância, de decisão sobre a reclamação apresentada em 21-12-2022, afigurando-se que não tem cabimento apreciar essa reclamação abstraindo-se o tribunal de primeira instância da questão alusiva à concreta delimitação do ativo da insolvente que foi objeto das operações e decisões de venda realizadas pela AI e questionadas pelo apelante, como aconteceu, independentemente da aferição da correção e tempestividade do procedimento impugnatório apresentado, ou do mérito da pretensão formulada”. E, no ponto 3 do mesmo acórdão, em sede de fundamentação de direito, lê-se: “3. Acresce que, tendo o apelante invocado na reclamação apresentada que tomou “conhecimento por consulta do site da Leiloeira que havia sido aceite a venda a favor de um dos alegados preferentes a 6.12.2022” (art. 11.º), desconhece-se a identidade do referido proponente, nem em que termos foi feita e aceite a proposta, matéria que, novamente, a AI não concretizou no processo aquando da prestação de informações no apenso de liquidação, como está obrigada a fazer, sendo que na resposta à reclamação também não identificou o referido proponente. Resulta dos autos que esse proponente não foi notificado para se pronunciar sobre a reclamação apresentada pelo apelante, sendo certo que, apresentada essa reclamação, o despacho subsequente, proferido em 10-01-2023, apenas determinou a notificação da AI para se pronunciar sobre a reclamação. É inadmissível que não seja exercido o contraditório (art. 3.º do CPC) relativamente ao outro interessado, que apresentou proposta de compra na nova diligência de venda realizada envolvendo os alegados preferentes/confinantes porquanto é, obviamente, um terceiro interessado na sorte da reclamação apresentada e diretamente afetado pela mesma. Deve, pois, a AI concretizar os elementos em falta com vista a que o tribunal de primeira instância, oportunamente, permita ao referido proponente exercer o contraditório relativamente à reclamação”. 4. Baixando os autos à primeira instância, foi em 7/11/2023, (…) proferido o seguinte despacho pelo Tribunal a quo no apenso de Liquidação (apenso E). “Atento o decidido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no apenso L, notifique-se a Administradora da Insolvência para, em 10 dias, informar nos autos e documentar os termos em que diligenciou pela venda dos bens/direitos incidindo sobre os quatro prédios indicados pelo recorrente (prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …., … e …) e ainda do bem descrito sob a verba número 14, bem como indicar os elementos alusivos ao novo proponente e à venda realizada em leilão de 6.12.2022.” A Sra. Administradora da Insolvência respondeu conforme requerimento de 17/11/2023 (…) nos seguintes termos: “(…) administradora de insolvência nos autos em epígrafe, notificada para o efeito vem juntar os documentos comprovativos dos termos em que diligenciou a venda dos quatro imóveis rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …, … e …, apreendidos nos autos. Importa esclarecer, desde já, que a verba 14 corresponde ao artigo …, existindo um lapso na sua identificação porquanto é referido o artigo … em vez de …, sendo certo que o número da descrição predial é o mesmo e está correto e a localização é, naturalmente, a mesma, pelo que não existem cinco verbas para alienar, mas apenas quatro conforme consta dos esclarecimentos prestados ao Tribunal da Relação de Lisboa. Estas quatro verbas foram objeto de nove tentativas de venda, verificando-se que só na nona foi possível obter propostas de compra para as mesmas. Apesar da melhor proposta ter sido aceite, houve a necessidade de notificar os eventuais preferentes e foi em resultado desta diligência que surgiram os engulhos que até hoje impediram a alienação dos prédios. Uma vez que os prédios foram objeto de venda num único lote e os mesmos não são contíguos, surgiram diversos confinantes a manifestar interesse na compra. Para melhorar o preço de venda que havia sido obtido em leilão, entenderam os administradores dos dois processos judiciais, ser adequado abrir um novo leilão restrito ao melhor proponente e aos preferentes que haviam manifestado interesse na compra. Em resultado desta diligência foi obtida uma proposta no valor de 6.500,00 euros, apresentada por um dos preferentes. Inconformado com estas diligências, o senhor BB, proponente vencedor do leilão que originou a notificação dos preferentes, insurgiu-se judicialmente contra a venda ao preferente, sendo esta a razão pela qual até hoje não foi concretizada a venda dos imóveis em causa. Atentos os esclarecimentos prestados e os documentos juntos, ordenará V. Ex. o que tiver por conveniente.” Juntou nove documentos, constando num dos documentos juntos os licitantes inscritos, entre os quais “3. CC”. Notificado, manteve aquele BB a posição anteriormente defendida. 5. Por despacho de 6/12/2023 proferido no apenso de Liquidação (apenso E - ref. citius n.º…) foi julgada a reclamação de BB procedente, determinou que a Administradora da Insolvência juntasse aos autos o respetivo título de transmissão a favor de BB, devendo a secretaria diligenciar pela transferência do montante depositado a título de caução para a conta da massa insolvente. 6. Deste despacho veio a ser interposto recurso por CC (…) na qualidade de interessado porquanto em 14/12/2022 lhe foi comunicado pela leiloeira a aceitação da proposta por si apresentada no leilão eletrónico para venda dos prédios rústicos supra identificados requerendo que, na procedência do recurso, que o despacho que julgou procedente a reclamação de BB seja declarado nulo e por consequência anulado o titulo de transmissão a favor deste, porquanto, ao decidir a reclamação sem dar cumprimento ao contraditório nos termos indicados pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 2/10/2023 (apenso N), porquanto não ouviu o proponente, desrespeitou o dito Acórdão e violou o Principio do Contraditório. 7. Por decisão sumária de 14/05/2024 decidiu este Tribunal da Relação: “julgar procedente a apelação e, anulando-se a decisão recorrida, proferida em 06.12.2023, determina-se que a primeira instância dê integral cumprimento ao acórdão proferido anteriormente (apenso L); consequentemente, deve o tribunal de 1ª instância dar seguimento ao incidente suscitado pelo BB, ouvindo o outro interessado, ora apelante, CC, sobre aquela pretensão, para o que deve este (CC) ser notificado, por intermédio dos respetivos mandatários judiciais entretanto constituídos, para em 10 dias se pronunciar, querendo, com entrega de cópia das peças processuais pertinentes, não só do referido BB como as que a propósito da reclamação foram apresentadas pela AI e que este TRL já cuidou de concretizar supra (cfr. os números 2, 4, 10, 11 e 12).” 8. Baixando, novamente os autos à primeira instância, em 12/06/2024 foi proferido no apenso E (ref. citius n.º..) o seguinte despacho: “Atenta a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa, notifique-se CC, por intermédio dos respetivos mandatários judiciais, entretanto constituídos, para, em 10 dias se pronunciar, querendo, remetendo-se cópia das seguintes peças processuais: requerimento da Administradora da Insolvência de 17/11/2023 e requerimentos de BB de 04/12/2023 e de 21/12/2022.” 9. Por requerimento de 21/06/2024 (ref. citius n.º…) veio interessado CC dizer que “atenta a extensão e complexidade dos mesmos, requer a prorrogação do indicado prazo de pronuncia por mais dez dias (…).” 10. Em 25/06/2024 foi proferido despacho com o seguinte teor: “Veio CC requerer a prorrogação do prazo para responder ao despacho proferido a 12/06/2024, invocando, em síntese, que a extensão e a complexidade dos requerimentos. Ora, o prazo processual marcado pela lei é prorrogável nos casos nela previstos (artigo 141º, nº1 do Código de Processo Civil), não estando prevista qualquer prorrogação de prazo para a pronúncia do interessado (artigo 149º, nº1 do Código de Processo Civil). Mesmo que se entendesse recorrer por analogia ao artigo 569º, 5, do Código de Processo Civil, o requerimento do requerido não respeita os limites aí definidos, quer por não se mostrar devidamente fundamentado (não bastam alegações genéricas, sendo necessário serem alegados factos concretos de onde se extraia que há motivo que impede ou dificulte, de forma anormal, a contestação), quer por o mesmo já ter analisado os autos, conforme decorre dos dois recursos já por si interpostos. Desta forma, e por inadmissibilidade legal, indefiro ao requerido. Notifique pelo meio mais célere, inclusive por telefone.” 11. Por requerimento de 28/06/2024 (…) veio o interessado CC dizer e requerer que: (…) pelo despacho em referência ordenou V.Exa. que fossem remetidos ao interessado as seguintes peças processuais: requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023; requerimento de BB de 4/12/2023 e de 21/12/2022; 2. Acontece, porém, que apenas foram remetidos ao interessado o requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023 e o requerimento de BB de 04/12/2023. Mas não foi remetido o requerimento de BB de 21/12/2022. Assim o interessado não poderá pronunciar-se enquanto não lhe foi remetida a referida peça processual em falta. Por outro lado, o despacho de V. Exa. Foi proferido “atenta a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa”, a qual julgou a apelação procedente e determinou que a 1ª instância desse integral cumprimento ao Acórdão da Relação proferido anteriormente a ordenar o exercício do contraditório pelo interessado. Explicitou aquele acórdão que o exercício do contraditório deveria ser exercido após a Administradora da insolvência “com rigor e pormenor, informar e documentar no processo “os termos em que diligenciou, individualmente ou em conjunto com o Administrador da Insolvência do noutro processo, pela venda dos bens/direitos incidindo sobre os quatro prédios indicados pelo Apelante (prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos…,…, …., e …) e ainda do bem descrito sob a verba numero 14, inscrito na matriz sob o artigo …”. Esta determinação resultou da apreciação feita no Acórdão da Relação sobre o conteúdo das informações prestadas pela AI (…), o requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023, remetido ao interessado não dá cumprimento ao exigido pela Relação – aliás, nada acrescenta à informação já anteriormente prestada pela AI – e não permite que o interessado tenha efetivo conhecimento dos factos e sobre eles se possa pronunciar. A título meramente exemplificativo, salienta-se o seguinte: o requerimento não contém quaisquer novas informações, para além das já prestadas e que foram qualificadas de “vagas, genéricas e contraditórias”; omite documentação pertinente e imprescindível designadamente. A) cópia dos editais de publicitação do leilão com inicio em 16 de fevereiro de 2022 e do leilão com inicio em 5 de fevereiro de 2022, e bem assim os respetivos relatórios do leilão e de venda, propostas de atuação enviadas aos destinatários e respetivas propostas, cópia de todas as comunicações da Administradora da insolvência ao proponente e vice-versa; esclarecimento da questão suscitada pelo outro interessado de que o procedimento de negociação particular que corria termos terminava apenas em 11/03/2022, pelo que teria de aguardar o seu curso; o edital publicado em 04/04/2022 a dar conta da celebração da escritura de compra e venda a ter lugar durante o mês de maio; resposta da Administradora de Insolvência de 01/2/2023. Face ao exposto, entende o interessado para exercer cabalmente o seu direito ao contraditório é imprescindível que a AI preste as informações com clareza e rigor e em conformidade com o determinado no Acórdão da Relação. Termina pedindo o cumprimento integral do despacho remetendo-se ao interessado os elementos em falta e, que lhe sejam facultados os elementos e informações em falta da Administradora da Insolvência em cumprimento do Acórdão da Relação.” 12. Sobre este requerimento incidiu em, 01/07/2024 (ref. Citius n.º 57528670), o seguinte despacho: “Na sequência do despacho proferido a 25/06/2024, pelo qual se indeferiu a prorrogação de prazo para resposta ao convite formulado por despacho de 12/06/2024, veio CC requerer o cumprimento integral do despacho proferido a 12/06/2024 e que lhe sejam remetidos os elementos e informações em falta da Administradora da Insolvência em cumprimento da relação. Apreciando. A 12/06/2024, foi proferido o seguinte despacho: Atenta a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa, notifique-se CC, por intermédio dos respetivos mandatários judiciais, entretanto constituídos, para, em 10 dias se pronunciar, querendo, remetendo-se cópia das seguintes peças processuais: requerimento da Administradora da Insolvência de 17/11/2023 e requerimentos de BB de 04/12/2023 e de 21/12/2022. Analisada a mesma (referência citius 57426054) verifica-se que remeteu o requerimento da Administradora da Insolvência de 17/11/2023 e o requerimento de BB de 04/12/2023, estando efetivamente em falta o requerimento de 21/12/2022. Tal lapso da secretaria poderá justificar-se pelo facto de o mesmo não se encontrar neste apenso de liquidação, mas nos autos principais de insolvência. No entanto, dispõe o artigo 247º, nº7 do Código de Processo Civil que a notificação à parte considera-se ainda efetuada, em qualquer circunstância, quando o notificando proceda à consulta eletrónica do processo, nos termos previstos na portaria prevista no nº2 do artigo 132º, o que aconteceu, pois aquele apresentou requerimento posterior à notificação (a 21/06/2024). Significa o que vem de dizer-se que, em conformidade com o estabelecido pelo artigo 247º do Código de Processo Civil, tem-se a Ilustre Mandatária por regularmente notificada de todos os requerimentos em causa, inexistindo qualquer fundamento para o alegado impedimento de resposta, pelo que se indefere o requerido. De qualquer forma, acrescente-se ainda a senhora advogada tem acesso a todo o processo desde 18/12/2023 (referência 47448239 dos autos principais e referência 5493116 de 18/12/2023 do apenso da liquidação). Também indeferida vai qualquer notificação à Administradora da Insolvência, por aquela ter cumprido, a 17/11/2023, o ordenado pelo Tribunal a 07/11/2023. Notifique.” 13. Por requerimento de 2/07/2024 (…) veio o ora requerente suscitar questão prévia e pronunciar-se quanto à reclamação de BB nos seguintes termos: “1. Por via do despacho em referência 57528670, foi indeferido o requerimento apresentado pelo Interveniente, CC, a solicitar o cumprimento integral do despacho de V. Exa proferido a 12/06/2024, nos termos do qual deveria ter-lhe sido remetido - e não o foi -, entre outros elementos, a reclamação apresentada por BB, apresentada em 21/12/2024; No despacho em causa, foi reconhecido que a reclamação apresentada por BB em 21/12/2024 não foi remetida na referência CITIUS 57426054, pelo que o Interveniente não foi dela notificado; Ora, a notificação da reclamação em falta ao Interveniente foi expressamente ordenada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 02-102023, ao determinar que este fosse notificado para se pronunciar com os elementos necessários e antes de ser apreciada e decidida a reclamação em causa. Em manifesto incumprimento do acórdão, V. Exa. deferiu a reclamação em causa sem prévio contraditório do ora Interveniente; Interposto recurso daquele despacho, por decisão singular da Relação, foi o mesmo declarado nulo e ordenada a notificação do Interveniente para se pronunciar, querendo, "com entrega de cópia das peças processuais pertinentes, não só do referido BB, como as que a propósito da reclamação foram apresentadas pela AI (...)"; Nos termos do despacho de V. Exa. com a referência 57415156, e tendo por base a referida decisão singular, foi ordenada a notificação do Interveniente para se pronunciar com a remessa da cópia de várias peças processuais entre as quais requerimento de BB de 21/12/2022, a qual não foi remetida, como se referiu; É, pois, incompreensível, inaceitável e ilegal que, reconhecida que foi por V. Exa., a omissão da remessa da reclamação na notificação do Interveniente, decida indeferir o envio da Reclamação em falta; Indeferimento esse fundamentado numa presunção de carácter formalista de que o Interveniente, porque em tempos consultou o processo, pode obter a reclamação através da consulta do processo via CITIUS; Com efeito, o Interveniente não tem cópia da Reclamação, nem consegue aceder à mesma porque só tem acesso a este apenso e ao apenso do Recurso, e a reclamação em causa não está em nenhum deles; Desta forma, e à cautela de patrocínio, o Interveniente vê-se forçado a pronunciar sobre a reclamação de BB, da qual não tem conhecimento; Nestas circunstâncias, por cautela de patrocínio, vem pronunciar-se, sob protesto, uma vez que lhe está a ser negado o exercício do contraditório nos termos legais, designadamente por não ter acesso à informação e documentos necessários para o cabal exercício desse direito, em violação do disposto nos artigos 4°, 6°, 7° e 8° do Código de Processo Civil; Também, por cautela de patrocínio, a pronúncia é feita com base exclusivamente nos documentos que lhe foram remetidos e com base no que se retira do Acórdão da Relação proferido em 02-10-2023 sobre a reclamação de BB apresentada em 21-12-2022, sem prescindir do direito que lhe assiste a exercer a pronúncia nos termos legais se e quando tal notificação vier a ser efetuada. DA PRONÚNCIA DO INTERVENIENTE Segundo se retira do referido Acórdão do Tribunal da Relação, o Interveniente BB reclamou das irregularidades cometidas no ato do leilão, o qual não está identificado e, por isso, só podemos deduzir qual seja. Assim, sem prejuízo de posterior pronúncia, caso a dedução esteja incorreta, o Interveniente deduz que esteja em causa o leilão realizado em 06/12/2022; Segundo se retira do mesmo Acórdão, entende aquele Reclamante que o despacho que ordenou um novo leilão exclusivo a preferentes deve ser desconsiderado porque: a) "os pretensos adquirentes não figuram como preferentes na medida em que não são confinantes nem disso fizeram prova (...); b) a primeira venda não podia ser "anulada" e substituída por outra modalidade, por não se enquadrar, a situação dos autos, na previsão dos artigos 819°, 830° a 832° do C.P.C. e 416° e 1410° do Código Civil, normas que se têm por violadas". Parece, assim, que o fundamento principal invocado pelo Reclamante BB para discordar do leilão realizado em 06/12/2022 é a negação da posição do adquirente nesse leilão como preferente, alegando que o mesmo não é preferente por não ser confinante com os prédios objeto da venda; Contudo, como se irá demonstrar, o Interveniente é preferente e é confinante de 3 prédios objeto de venda por leilão; Assim, o Interveniente CC é proprietário de 2 (dois) prédios na freguesia de …., a saber: a)prédio inscrito na matriz sob o artigo … freguesia de …., concelho …., e descrito sob o n° …. da referida freguesia e concelho na Conservatória …. (cfr. Caderneta predial e certidão do registo predial, que se juntam como docs. n° 1 e 2); e b) prédio, com a área de 2.703 m2, inscrito na matriz sob o artigo rústico n° …. da freguesia de …, concelho …, e descrito sob o n° …, referida freguesia e concelho na Conservatória …. (cfr. Caderneta predial e certidão do registo predial, que se juntam como docs. n° 3 e 4). Este prédio confina com os prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …. e …, da freguesia de …., concelho …, que foram objeto do leilão realizado no dia 06/12/2022; A situação de contiguidade do prédio rústico propriedade do Interveniente e os prédios acima identificados é comprovada pelos seguintes documentos: (…) Dispõe o n° 1 do artigo 1380 do CC que os proprietários de terrenos confinantes, de área inferior à unidade de cultura, gozam reciprocamente do direito de preferência no caso de venda a quem não seja proprietário confinante (…) Tanto quanto resulta dos documentos remetidos ao Interveniente para se pronunciar sobre a reclamação de BB, este não é proprietário de prédio confinante com algum dos prédios objeto do leilão; Sendo certo que, no caso de haver vários proprietários com direito de preferência, deverá abrir-se licitação entre eles, nos termos do n° 3 do artigo 1380a do CC; segundo informação da AI, com competência para definir e diligenciar a venda dos imóveis da Insolvente, esta considerou útil para obtenção de melhores propostas fazer a venda por leilão exclusivamente entre o Proponente BB e os demais preferentes que tinham manifestado interesse em participar naquele; O Interveniente BB foi notificado que em 21.12.2022 seria realizado o leilão restrito àquele Interveniente e preferentes não licitou; Pelo que, tem obviamente de se conformar com a adjudicação da proposta de compra dos imóveis do Proponente que apresentou a licitação mais elevada; Ao contrário do que alega o Reclamante — atento o referido no Acordão do Tribunal da Relação -, a "primeira" venda não foi "anulada"; Segundo a AQI e o Mmo. Juiz que se pronunciou sobre a questão, depois de realizado o leilão em que o reclamante apresentou a proposta mais alta, foi apurada a existência de preferentes e, em consequência, foi decidido realizar um leilão restrito com o objetivo de atingir propostas mais elevadas. O que efetivamente veio a acontecer, com a licitação do Interveniente de € 6.500,00; Acresce, finalmente, que o Interveniente BB não reclamou, nem impugnou a decisão de venda da AI através de leilão eletrónico restrito àquele e aos demais preferentes que tinham manifestado interesse na compra realizado em 06/12/2022; Não o tendo feito deixou precludir esse eventual direito e, em consequência, o leilão realizado em 06/12/2022 é absolutamente válido devendo ser mantido; Pelas razões expostas, deverá ser anulada a venda dos artigos n° …, … e …, titulada pela escritura celebrada com BB e outorgada a escritura de venda dos referidos prédios ao Interveniente CC.”- 14. Em 4/07/2024 (…) foi proferido pelo Tribunal a quo despacho mediante o qual decidiu nada ter a determinar quanto ao “exercício do direito de protesto” e, decidindo a reclamação apresentada por BB, julgou-a, agora, procedente, determinando que a Administradora da Insolvência junte aos autos o respetivo título de transmissão. * Não se conformando com tal despacho, dele interpôs recurso CC, juntando alegações e formulando as seguintes conclusões que se reproduzem: 1 - No presente recurso está em causa o despacho proferido pelo Mmo. Juiz a quo que declarou procedente a reclamação /requerimento apresentado por BB em 21/12/2022; 2 - Esta decisão fundamentou-se no entendido do Sr. Juiz de que "inexistia fundamento para a Administradora de Insolvência desconsiderar a venda já efetuada e prosseguir nova venda executiva"; e, em consequência determinou que a AI junte aos autos o respetivo título de transmissão a favor de BB; 3 - O Recorrente discorda desta decisão, sinteticamente, pelas seguintes razões: a) O despacho recorrido foi proferida sem o prévio exercício do contraditório do Recorrente, nomeadamente por não lhe ter sido remetido o requerimento de BB de 21/12/2022 e os elementos essenciais dos procedimentos de venda apresentados pela AI e remetidos ao Recorrente erram insuficientes, incompletos e pouco ou nada esclarecedores; b) O requerimento apresentado por BB em 21/12/2022 era intempestivo, porque apresentado depois de decorridos 10 dias a contar do conhecimento pelo mesmo dos factos que fundamentaram a reclamação; c) A decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia relativamente a certas questões e excesso de pronúncia, relativamente a outras, nos termos do disposto na alínea d) do n° 1 do art. 615° do CPC; d) A decisão recorrida é ainda nula por falta de fundamentação, nos termos do disposto na alínea b) do n° 1 do art. 615° do CPC; e) A decisão recorrida é anulável por estar inquinada de erros vários de julgamento. 4. Pelo despacho com a referência 57415156, o Sr. Juiz a quo ordenou a notificação de CC para em 10 dias se pronunciar, com remessa da cópia do requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023 e dos requerimentos de BB de 04/12/2023 e de 21/12/2022; 5. Sucede que apenas foram remetidos ao Recorrente o requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023 — a qual não prestou as informações dos processos e diligência de venda de forma completa nem esclarecedora e juntou documentos desconexos e incompletos - e o requerimento de BB, de 04/12/2023, mas não o requerimento (reclamação) de BB de 21/12/2022; 6. Face ao exposto o Recorrente arguiu as apontadas irregularidades, e requereu que lhe fosse remetido o requerimento em falta e solicitado à AI que complementasse as informações prestadas; 7. O Sr. Juiz, porém, indeferiu o requerido, com fundamento em que o Recorrente já havia consultado o processo nos termos da Portaria prevista no n° 2 do artigo 132°; 8.° Entende o Recorrente que o indeferimento do seu requerimento contrariava a decisão anterior do Sr. Juiz, e viola o princípio do contraditório, e da cooperação e da igualdade das partes, estabelecidos nos artigos 3° 4° 7° do CPC e bem assim da confiança e da segurança nas decisões dos tribunais; 9. Segundo se retira do teor Acórdão da Relação de Lisboa e da Decisão Singular da Relação de Lisboa, no requerimento apresentado em 21/12/2022, BB alegou várias irregularidades que, no seu entender, impunham a anulação do leilão eletrónico realizado em 05 e 06/12/2022 e requereu que fosse efetivada a venda dos prédios por este licitados no leilão iniciado em 18/02/2022. 10. Ora, o reclamante BB só suscitou as irregularidades apontadas e só requereu a anulação do leilão depois de decorridos mais de 10 dias do seu conhecimento, pelo que, a verificar-se a sua existência, as mesmas foram sanadas por não terem sido tempestivamente arguidas; 11. Em consequência, o despacho recorrido deveria ter julgado da intempestividade do requerimento de 21/12/2022, pelo que, não tendo assim decidido, deve ser anulado por violação do disposto nos artigos 195° e 196° do CPC; 12. A decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia relativamente a certas questões e excesso de pronúncia, relativamente a outras, nos termos do disposto na alínea d) do n° 1 do art. 615° do CPC; 13. Com efeito o despacho recorrido não se pronunciou sobre a tempestividade do requerimento de 21/12/2022, nem sobre as informações prestadas pela AI e documentos juntos, nem sobre a questão da concreta determinação do ativo insolvente que foi objeto das operações e decisões de venda realizadas pela AI, nem sobre o leilão iniciado em 05/12/2022, e consequente adjudicação da proposta do Recorrente e pagamento de parte do preço; 14. Por seu turno, enferma de excesso de pronúncia quando assentou a sua decisão no errado pressuposto de que a venda dos imóveis estava efetuada à data da reclamação e, por isso, não podia com base naquele considerar inexistir fundamento para a AI desconsiderar aquela venda, a qual à data não existia; 15. A decisão recorrida é ainda nula por falta de fundamentação, nos termos do disposto na alínea b) do n° 1 do art. 615° do CPC, porquanto omite a fundamentação de direito da decisão em recurso; 16. Ainda no que respeita ao leilão realizado em 06/12/2022 cabe salientar que o despacho recorrido não apontou à AI a violação de qualquer norma do CIRE. Aliás, como resulta dos despachos anteriormente proferidos, o Sr. Juiz sempre aceitou e concordou com os atos e decisões da mesma, incluindo a decisão de realização de venda entre o proponente BB e os preferentes; 17. Por esta razão, não tinha o Mmo. Juiz fundamento legal para decidir que inexistia razão para desconsiderar a venda já efetuada e prosseguir a nova venda executiva, nem invocou qualquer fundamento legal válido para o efeito, pelo que tal decisão é nula por falta de fundamentação de direito, nos termos do disposto na alínea b) do artigo 615° do CPC e anulável por violação do artigo 164° do GIRE; 18. Por último, a compra e venda efetuada entre a AI e BB, titulada pela escritura celebrada em …., no Cartório Notarial de …, dos prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, … e …, respetivamente pelo preço de 516,00 €, 231,00 € e 1.756,00 €. é nula, por não corresponder ao objeto colocado a leilão, nem à proposta de compra apresentada por aquele proponente/licitante. O recurso foi admitido, tendo o Mmº Juiz a quo pugnado pela inexistência das nulidades invocadas, remetendo-se para o despacho proferido a 01/07/2024, o qual não foi objeto de recurso. Não foram apresentadas contra-alegações. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II. Do Objeto do recurso: Estando o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes —artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (doravante, abreviadamente, designado por CPC), ressalvadas as questões do conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, a questão que se coloca à apreciação deste Tribunal consiste em saber: 1) se o despacho recorrido foi proferido sem o prévio exercício do contraditório do Recorrente, nomeadamente por não lhe ter sido remetido o requerimento de BB de 21/12/2022; 2) se os elementos essenciais dos procedimentos de venda apresentados pela Sra. Administradora da Insolvência e remetidos ao Recorrente eram insuficientes, incompletos e pouco ou nada esclarecedores; 3) se a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia quanto à tempestividade do requerimento apresentado por BB em 21/12/2022; 4) se o requerimento apresentado por BB em 21/12/2022 era intempestivo, porque apresentado depois de decorridos 10 dias a contar do conhecimento pelo mesmo dos factos que fundamentaram a reclamação. 5) se a decisão recorrida é ainda nula por falta de fundamentação, nos termos do disposto na alínea b) do n° 1 do art. 615° do CPC, porquanto omite a fundamentação de direito da decisão em recurso; 6) se a compra e venda efetuada entre a AI e BB, titulada pela escritura celebrada em …, no Cartório Notarial de …., dos prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, … e …, respetivamente deve ser dada sem efeito. * III. Fundamentação de Facto A factualidade a considerar na motivação de direito é a que consta do relatório deste acórdão que aqui se dá por integralmente reproduzida. Relevam, ainda, para apreciação do recurso, as seguintes incidências processuais que os autos de insolvência e apensos respetivos documentam e a que se teve acesso informático e bem assim o teor dos documentos juntos pela Sra. AI com o requerimento de 17/11/2023 (…). 1. Na contestação apresentada nos autos de insolvência, a insolvente apresentou a “relação de todos os bens que integram o seu património”, aí identificando os seguintes bens/direitos, sob as alíneas que seguem: “(…) i) Metade do prédio rústico que constitui terra de lenha, sito no lugar …, freguesia …, concelho …, descrito na Conservatória do Registo Predial …sob o n.º … e inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial de 2,26 € conforme documento 9. (…) o) Metade do prédio rústico que constitui terra de lenha, sito no lugar …, freguesia…, concelho …, descrito na Conservatória do Registo Predial …sob o n.º … e inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial de 7,67 € conforme documento 15. p) Metade do prédio rústico que constitui terra de lenha, sito no lugar …, freguesia ..., concelho …, descrito na Conservatória do Registo Predial …sob o n.º … e inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial de 1,01 € conforme documento 16. (…) r) Metade do prédio rústico que constitui terra de lenha, sito no lugar…, freguesia …, concelho …, descrito na Conservatória do Registo Predial … sob o n.º … e inscrito na respetiva matriz predial rústica sob o artigo …, com o valor patrimonial de 34,07 € conforme documento 18. 2. No âmbito dos presentes autos, a Sra. administradora da insolvência procedeu à apreensão do direito à meação tendo por objeto, entre outros, os seguintes prédios: - Verba nº12 descrito na matriz predial rústica sob o artigo … e na CRP sob o nº …, aludido na referida alínea r); - Verba nº15, descrito na matriz predial rústica sob o artigo … e na CRP sob o nº …, aludido na referida alínea i); - Verba n.º 14, descrito na matriz predial rústica sob o art. … e na CRP sob o n.º …; 3. A verba n.º 14, corresponde ao prédio descrito na matriz predial rustica sob o art. … e na CRP sob o n.º …; 4. A verba corresponde à alínea p) – artigo … – da relação de bens apresentada pela insolvente, referida em 1 não consta do auto de apreensão (Apenso A). 5. As verbas 12, 15 e 14 e ainda a verba correspondente à alínea p) – artigo … - “integram o lote 06 do leilão efetuado no processo do ex-cônjuge da aqui insolvente”. 6. A Sra. Administradora da Insolvência encarregou estabelecimento de leilão “LL” da vendas das verbas integrantes do lote 6 ; 7. Estas verbas foram objeto de nove tentativas de venda. 8. Em 18/03/2022 a Sra. Administradora de Insolvência informou, quanto às verbas números 12, 14 e 15 (que integram o lote 6 do leilão efetuado no processo do ex-cônjuge da aqui insolvente) que: foram recebidas duas propostas, sendo a mais elevada no valor de 6000,00€. A AJ aceitou esta última proposta, “estando a diligenciar pela efetivação da venda”, bem como “logo que realizadas as escrituras de compra e venda, serão remetidas cópias aos autos”, informação que é repetida em 04-04-2022. - Em 04-05-2022 a Sra. Administradora da Insolvência informa que “se encontra a aguardar o decurso do prazo da notificação edital dos preferentes, a fim de poder designar data da escritura de compra e venda”; - Em 08-07-2022 a Sra. Administradora da Insolvência informa que continua a aguardar; - Em 04-10-2022 a Sra. Administradora da Insolvência informa que ainda não foi possível realizar a escritura. - Em 02-12-2022 a Sra. Administradora da Insolvência informa que “não foi realizada a escritura de compra e venda”. - Em 08-03-2023 a Sra. Administradora da Insolvência informa que: “(…) administradora de insolvência nos autos em epígrafe, notificada do despacho que antecede, penitenciando-se pelo lapso cometido, vem prestar os seguintes esclarecimentos acerca do estado da liquidação: 1- A escritura de compra e venda não foi ainda realizada pelos motivos contantes do requerimento apresentado em 01/02/2023 no processo principal, cuja cópia se anexa, e que resumidamente refere que existiu um conjunto de vicissitudes, até àquela data que impediram a realização da escritura. 2- Tais vicissitudes prenderam-se com a necessidade de notificar os confinantes, de ter sido aberta licitação entre todos os que demonstraram tal qualidade e de um deles, insatisfeito com o procedimento legal adotado, o ter vindo pôr em causa por meio de requerimento dirigido aos autos. 3- Sobre tal requerimento recaiu despacho judicial datado de 06-02-2023, que indeferiu o peticionado pelo confinante. 4- Tal despacho foi objeto de interposição de recurso e foram já produzidas as alegações. 5- Face a este contexto, entendeu a AJ, cautelarmente, não dar prosseguimento às diligências de venda, nomeadamente com a marcação da escritura de compra e venda, até que haja decisão do recurso interposto, apesar de saber que o mesmo não foi ainda admitido e que tem efeito meramente devolutivo. 6- Entende a AJ, s.m.o., que será juridicamente mais seguro para a massa insolvente e para o comprador que a celebração da escritura de compra e venda ocorra só depois de existir decisão transitada em julgado relativa ao recurso apresentado. 7- Apesar de ser este o entendimento da AJ, a mesma cumprirá escrupulosamente a decisão do tribunal e/ou dos credores sobre esta sua posição acerca do momento da celebração da escritura de compra e venda. Junta um documento que consubstancia a resposta dada ao requerimento apresentado pelo apelante. 9. JJ, “Real Estate Manager” da sociedade leiloeira, enviou a BB comunicação eletrónica, em 29-11-2022, às 12:58, com o seguinte teor: “Subject: Leilão Privado - "FAST SALE" // Terrenos – (…) // Proc. … DD e AA To: Exmo.(a). Sr(a), bom dia, Considerando o dissídio existente no que concerne à venda do imóvel apreendido no âmbito dos processos supra identificados, verificando-se a existência de vários confrontantes alegando direito de preferência sobre os respetivos imóveis, e ao abrigo do Artigo 823.º n.º 2 do Código do Processo Civil, entende-se que a licitação entre todos os interessados deverá ter lugar na nossa plataforma online em www.(...).pt. Por forma a esclarecer as condições de participação no evento, queira por favor considerar o seguinte: I. MODALIDADE DE VENDA Leilão Privado – “FAST SALE” O evento é aberto apenas aos destinatários da presente comunicação, sendo fechado a terceiros. II. ACESSO AO LEILÃO O Leilão encontra-se já disponível para consulta aqui: (…) As licitações apenas serão permitidas após validação do “Registo Prévio” que consta na página de leilão, por forma a garantir a exclusividade de acesso ao evento. III. DURAÇÃO DO LEILÃO Inicio: 05/12/2022 às 09h00 Término: 06/12/2022 às 12h00 (fuso horário GMT - Portugal Continental) O evento irá iniciar com o Valor de Abertura de € 6.500,00, sendo entretanto disputado em lances mínimos de € 500,00. Findo o leilão, o melhor lance obtido será de imediato aceite, procedendo-se à formalização do negócio junto do licitante vencedor. Para qualquer esclarecimento adicional, por favor não hesite em contactar. Nesta oportunidade, apresentamos os nossos melhores cumprimentos”. 10. Foi publicitada a venda, por leilão eletrónico, no âmbito dos presentes autos e ainda do processo de insolvência n.º (…), alusivo a DD, dos seguintes prédios, venda com início em 05-12-2022 às 09h00 e fim em 06-12-2022 às 12h00: - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 15); - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 14); - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº …; - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 12). 11. Foram licitantes inscritos EE, BB e CC, correspondendo a melhor oferta a deste último pelo montante de 6500,00€. 12. Em 19/12/2023 foi concedida a consulta eletrónica dos autos principais à Ilustre mandatária do apelante (…). 13. Em 18/12/2023 foi concedida a consulta eletrónica dos autos do apenso da liquidação à Ilustre mandatária do apelante (…). 14. Em 22/12/2023 foi junta procuração aos autos de liquidação pela Ilustre mandatária do apelante (…). 15. No dia 15 de dezembro de 2023 a Sra. Administradora Judicial, em representação da massa insolvente de AA e DD outorgou escritura publica de compra e venda com BB, mediante a qual declarou vender-lhe, pelo preço de 2500,00€ os prédios descritos sob os art. …, … e …. * IV. Fundamentação de Direito 1. Da violação do Princípio do Contraditório Diz o apelante que o Tribunal a quo ao não remeter na notificação de 12/06/2024 todos os elementos que haviam sido ordenados na Decisão Singular desta Relação de 14/05/2024, a saber: cópia do requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023 e dos requerimentos de BB de 4/12/2023 e de 21/12/2022, tendo-lhe sido remetidos apenas o requerimento da Sra. Administradora de Insolvência de 17/11/2023 e o requerimento de BB de 4/12/2023, mas não o de 21/12/2022, violou, novamente, o Principio do Contraditório. Quanto a esta questão revelam-nos os factos provados que na sequência da decisão sumária deste Tribunal da Relação, mediante a qual se determinou que a primeira instância desse integral cumprimento ao acórdão proferido anteriormente (apenso L), devendo dar seguimento ao incidente suscitado por BB, ouvindo o outro interessado, ora apelante, CC, sobre aquela pretensão, devendo este CC ser notificado, por intermédio dos respetivos mandatários judiciais entretanto constituídos, para em 10 dias se pronunciar, querendo, com entrega de cópia das peças processuais pertinentes, não só do referido BB como as que a propósito da reclamação foram apresentadas pela AI, o tribunal a quo, em 12/06/2024 proferiu no apenso E (ref. citius n.º 57415156) o seguinte despacho: “Atenta a decisão singular do Tribunal da Relação de Lisboa, notifique-se CC, por intermédio dos respetivos mandatários judiciais, entretanto constituídos, para, em 10 dias se pronunciar, querendo, remetendo-se cópia das seguintes peças processuais: requerimento da Administradora da Insolvência de 17/11/2023 e requerimentos de BB de 04/12/2023 e de 21/12/2022.” Ou seja, o Tribunal a quo não deixou de cumprir o ordenado na decisão sumária desta Relação. Não obstante, o certo é que ao apelante não foi remetido o requerimento do interessado BB de 21/12/2022, como é reconhecido pelo Tribunal a quo no despacho de 01/07/2024 (…). Dessa omissão deu o apelante conta ao Tribunal no seu requerimento de 28/06/2024 (…) dizendo que apenas foram remetidos ao interessado o requerimento da Administradora de Insolvência de 17/11/2023 e o requerimento de BB de 04/12/2023. Mas não foi remetido o requerimento de BB de 21/12/2022, arguindo a irregularidade cometida e requerendo a repetição da notificação. Esta sua pretensão foi indeferida pelo Tribunal a quo com a seguinte fundamentação: “(…) dispõe o artigo 247º, nº7 do Código de Processo Civil que a notificação à parte considera-se ainda efetuada, em qualquer circunstância, quando o notificando proceda à consulta eletrónica do processo, nos termos previstos na portaria prevista no nº2 do artigo 132º, o que aconteceu, pois aquele apresentou requerimento posterior à notificação (a 21/06/2024). Significa o que vem de dizer-se que, em conformidade com o estabelecido pelo artigo 247º do Código de Processo Civil, tem-se a Ilustre Mandatária por regularmente notificada de todos os requerimentos em causa, inexistindo qualquer fundamento para o alegado impedimento de resposta, pelo que se indefere o requerido. De qualquer forma, acrescente-se ainda a senhora advogada tem acesso a todo o processo desde 18/12/2023 (referência … dos autos principais e referência … de 18/12/2023 do apenso da liquidação).” O apelante tem mandatário constituído nos autos desde 02/12/2023. Nos termos do disposto no artigo 247.º, n.º 1, do C.P.C. as notificações às partes em processos pendentes são feitas na pessoa dos seus mandatários judiciais. No caso em apreço, o interessado está representado por mandatário sendo por isso pacífico que a notificação ordenada veio a ser realizada na pessoa do seu mandatário, por força do estatuído no n.º 1 do citado artigo 247.º, como havia sido ordenada na decisão sumária deste Tribunal da Relação. O n.º 7 do art. 247º decorreu da alteração operada ao CPC pelo DL 97/19 de 26/07 e nele estabelece-se que “a notificação à parte considera-se ainda efetuada, em qualquer circunstância, quando o notificando proceda à consulta eletrónica do processo, nos termos previstos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º”. Ou seja, esta norma conjuga-se com a possibilidade de as próprias partes consultarem os processos em que tenham intervenção, nos termos do disposto no art.º 27º-A da portaria n.º 280/13, introduzido pela portaria n.º 170/17 de 25/05 e alterado pela portaria n.º 267/18 de 20/09 e implica que se estiver em vias de ser realizada uma notificação à própria parte, o ato já não terá de ser praticado se acaso essa parte realizar entretanto a consulta a consulta do processo. Em 19/12/2023 foi concedida a consulta eletrónica dos autos principais à Ilustre mandatária do apelante (…), em 18/12/2023 foi concedida a consulta eletrónica dos autos do apenso da liquidação à Ilustre mandatária do apelante (…) e em 02/12/2023 foi junta procuração aos autos de liquidação pela Ilustre mandatária do apelante (…). A partir desta data, o apelante passou a estar representado nos autos por mandatário. Ora, como anotam A. Geraldes e Paulo Pimenta, in Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, pág. 317, esta disposição não tem aplicação em sede de notificação de mandatários, cujo regime específico se encontra regulado no art.º 248º do CPC. Diz este preceito que “os mandatários são notificados por via eletrónica nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º, devendo o sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja.” Por seu turno, dispõem o art.º 25º da Portaria n.º 280/13 que as notificações da secretaria aos mandatários são efetuadas por via eletrónica nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 132.º, devendo o sistema de informação de suporte à atividade dos tribunais certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no terceiro dia posterior ao do seu envio, ou no primeiro dia útil seguinte a esse, quando o não seja. E o seu n.º 2 que: “quando o ato processual a notificar contenha documentos que apenas existam no processo em suporte físico, deve ser enviada cópia dos mesmos ao mandatário, por carta registada dirigida ao seu escritório ou domicílio escolhido, podendo igualmente ser notificado pessoalmente pelo funcionário quando se encontre no edifício do tribunal.” Nos presentes autos, todos os requerimentos e documentos relevantes para o mérito da decisão estão juntos aos autos em suporte eletrónico. A Ilustre mandatária do apelante acedeu à tramitação eletrónica do processo principal e dos autos de liquidação relativos ao presente recurso em 18/12/2023 e juntou procuração, de modo que, como se considerou, e bem, no despacho 1/07/2023 a Ilustre Mandatária tem-se “por regularmente notificada de todos os requerimentos em causa, inexistindo qualquer fundamento para o alegado impedimento de resposta.” De qualquer modo, ainda que assim não se entendesse, considerando-se ter sido cometida pelo Tribunal a quo uma irregularidade processual materializada na não reconhecida remessa ao apelante do requerimento de BB de 21/12/2022, suscetível de influir na decisão da causa, e como tal a consubstanciar nulidade processual nos termos do disposto no art. 195º do CPC, o facto é que, após a sua arguição pelo apelante e respetivo indeferimento por despacho de 1/07/2023, com este se conformou o apelante porquanto dele não interpôs recurso. Com efeito, de acordo com as regras gerais da nulidade de atos apenas gera nulidade «a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato que a lei prescreva», «quando a lei o declare» (como a lei o faz no regime dos arts.186º ss. para a petição inicial, a citação, a vista e a forma do processo) ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa» (art.195º, n.º 1 do CPC). O apelante, entendendo que havia ocorrido nulidade que influa no exame na causa – art. 195º do CPC – arguiu-a, tempestivamente, conforme o art.º 199º do CPC, respeitando o brocardo segundo qual “dos despachos recorre-se, contra as nulidades reclama-se”. Como esclarecem os já citados autores, in Ob. Cit., pág. 261, “a reclamação e o recurso não são meios de impugnação concorrentes, cabendo à parte reclamar previamente para suscitar a prolação de despacho sobre a arguida nulidade”. Uma vez que as nulidades processuais previstas no art. 195º apenas relevam nos casos em que se possam antecipar implicações no exame e na decisão da causa, a sua apreciação pelo juiz é, em regra, definitiva, daí que o art. 630º, n.º 2 do CPC estabeleça como regra a irrecorribilidade do despacho que aprecie as nulidades atípicas. Apesar disso, o legislador previu uma cláusula de salvaguarda, afastando a insindicabilidade dos poderes do juiz sempre que se mostre desrespeitado, entre outros, e para o que ao caso interessa o princípio do contraditório. Se existirem motivos para assacar à decisão judicial a violação dos princípios do contraditório, a sindicabilidade do despacho proferido sobre a arguição de uma nulidade secundária está condicionada pela alegação da violação deste princípio concreto (cf. A. Geraldes in Recursos em Processo Civil, pags. 89 a 97). Em conclusão, no que concerne a cada uma das decisões a que se reporta o n.º2 do art.º 630º, entre os quais a violação do principio do contraditório, deverá a parte interpor recurso desta decisão, o que, no caso não sucedeu. O apelante limitou-se a pronunciar-se no requerimento sob a Ref. n.º 2/07/2024 (Ref. Citius n.º…) sobre a reclamação de BB “sob protesto”. Ainda que o recurso a interpor, atento o disposto no art. 644º, n.º 2, houvesse de ser interposto com o recurso que decidiu a reclamação, tal não sucedeu, porquanto, o apelante, ainda que invocando a violação do Principio do Contraditório apenas interpôs recurso da decisão que decidiu a reclamação apresentada por BB, que é o que está em causa na presente apelação. Do tudo quanto viemos de expôr concluímos, por um lado, que não só não ocorreu a violação do principio do contraditório ao apelante por não lhe ter sido disponibilizada cópia da reclamação apresentada por BB em 18/12/2022 porquanto se encontrava representado por mandatária que, desde data anterior havia consultado os autos, nomeadamente os autos principais, como, por outro, o despacho judicial que conheceu da nulidade arguida transitou em julgado, porquanto dele não recorreu o apelante. Face ao exposto, improcede, nesta parte, a apelação. * Igual conclusão se impõe quanto à segunda das imputadas violações ao principio do Contraditório invocada pelo recorrente e que se prende com a omissão das informações relevantes a fornecer pela Sra. Administradora da Insolvência na sequência do Acórdão desta Relação de Lisboa proferido no apenso l (liquidação). Neste conspecto, alega o recorrente nas suas alegações recursivas que o requerimento da Sra. Administradora de Insolvência de 17/11/2023 remetido ao recorrente não dá cumprimento ao exigido no Acórdão da Relação, pois nada acrescenta à informação já anteriormente prestada, não permitindo assim que tivesse efetivo conhecimento dos factos para sobre eles se pronunciar. Por requerimento de 28/06/2024 já o apelante havia suscitado esta omissão suscetível de, do seu ponto de vista, influir no exame da causa, a constituir nulidade ao abrigo do disposto no art. 195º do CPC (juntamente com aquela outra que supra se apreciou, e relativa à omissão da remessa de cópia da reclamação de BB de 21/12/2022). Sobre esta, incidiu o despacho do tribunal a quo de 01/07/2024 com o seguinte teor: “Também indeferida vai qualquer notificação à Administradora da Insolvência, por aquela ter cumprido, a 17/11/2023, o ordenado pelo Tribunal a 07/11/2023.” Deste despacho, não foi interposto recurso pelo apelante, pelo que se consolidou nos mesmos termos do ante exposto. De qualquer modo, e analisada a resposta da Sra. Administradora de Insolvência junta aos autos em 17/11/2023 (cf. Ref. n.º…) conclui-se que esclareceu a divergência constatada por esta Relação no Acórdão de 02/10/2023, proferido no apenso L e juntou documentos relativos aos anúncios do leilão que se consideram suficientemente elucidativos. Decidiu-se naquele aresto anular a decisão proferida em primeira instância quanto à reclamação apresentada por BB e em consequência, ordenar que a Sra. Administradora da Insolvência fosse notificada para informar e documentar nos autos: - os termos em que diligenciou pela venda dos bens/direitos incidindo sobre os quatro prédios indicados pelo apelante (prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …, … e …) e ainda do bem descrito sob a verba número 14; - indicar os elementos alusivos ao novo proponente e à venda realizada em leilão de 6.12.2022. A Sra. Administradora da Insolvência no requerimento de 17/11/2023 (cf. Ref. n.º ) juntou: - os documentos comprovativos dos termos em que diligenciou a venda dos quatro imóveis rústicos inscritos na matriz sob os artigos …, …, … e …. - Esclareceu que a verba 14 corresponde ao artigo …, existindo um lapso na sua identificação porquanto é referido o artigo … em vez de …, sendo certo que o número da descrição predial é o mesmo e está correto e a localização é, naturalmente, a mesma, pelo que não existem cinco verbas para alienar, mas apenas quatro conforme consta dos esclarecimentos prestados ao Tribunal da Relação de Lisboa. - Estas quatro verbas foram objeto de nove tentativas de venda, verificando-se que só na nona foi possível obter propostas de compra para as mesmas. - Apesar da melhor proposta ter sido aceite, houve a necessidade de notificar os eventuais preferentes. - Uma vez que os prédios foram objeto de venda num único lote e os mesmos não são contíguos, surgiram diversos confinantes a manifestar interesse na compra. - Para melhorar o preço de venda que havia sido obtido em leilão, entenderam os administradores dos dois processos judiciais, ser adequado abrir um novo leilão restrito ao melhor proponente e aos preferentes que haviam manifestado interesse na compra. - Em resultado desta diligência foi obtida uma proposta no valor de 6.500,00 euros, apresentada por um dos preferentes. Inconformado com estas diligências, o senhor BB, proponente vencedor do leilão que originou a notificação dos preferentes, insurgiu-se judicialmente contra a venda ao preferente, sendo esta a razão pela qual até hoje não foi concretizada a venda dos imóveis em causa. Juntou nove documentos relativos aos anúncios dos leilões do lote 6 que compreende os artigos …, …, … e …. Deles resulta que, relativamente à venda com início em 05-12-2022 às 09h00 e fim em 06-12-2022 às 12h00 foi publicitada a venda, por leilão eletrónico, no âmbito dos presentes autos e ainda do processo de insolvência…, alusivo a DD, dos seguintes prédios: Prédio inscrito na matriz: Artigo nº …(verba 15); Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 14); Prédio inscrito na matriz: Artigo nº …; Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 12) e que foram licitantes inscritos EE, BB e CC, correspondendo a melhor oferta a desta última pelo montante de 6500,00€. Ou seja, da informação prestada conclui-se que o lote seis compreendia quatro prédios, que foram realizados nove leilões e que, no último deles, a realizar entre os preferentes para obtenção de maior proposta foram proponentes EE, BB e CC, correspondendo a melhor oferta a do apelante pelo montante de 6500,00€. Entendemos, pois, que com o esclarecimento prestado ficaram dissipadas as dúvidas que primeiramente tinham sido detetadas quanto aos bens que integravam o lote 6 e bem assim a identificação dos intervenientes e proponentes do leilão. É certo que o lote 6 integra o artigo …. Esta verba corresponde à alínea p) – artigo … – da relação de bens apresentada pela insolvente, mas não consta do auto de apreensão (Apenso A), ou seja, a Sra. Administradora da Insolvência não procedeu, no âmbito dos presentes autos, à apreensão deste prédio e quanto a esta questão não avança qualquer justificação na informação apresentada em 17/11/2023. Quanto a esta questão, como já se havia feito notar no Acórdão desta Relação de 02/10/2023 proferido no apenso L “A venda do ativo da insolvente incide, exclusivamente, sobre os bens/direitos que, pertencendo à insolvente, são apreendidos para a massa, passando a integrar a mesma, na sequência de determinação vertida na sentença de declaração de insolvência, competindo ao administrador da insolvência diligenciar pela entrega dos bens, para posterior venda (arts. 36.º nº1, alínea g), 149.º, 150.º e 55.º, nº1, alínea a) do CIRE, diploma a que aludiremos quando não se fizer menção de origem). Se o administrador judicial enceta diligências de venda nelas incluindo prédios que não foram efetivamente apreendidos, pratica um ato que a lei não admite, verificando-se, pois, uma nulidade processual (art.º 195.º, nº1 do CPC) que, no entanto, deve ter-se por sanada se nenhum interessado se apresenta a reclamar peticionando a anulação do ato da venda com esse fundamento (art. 839.º, nº1, alínea c) do CPC), uma vez que não estamos perante hipótese em que o tribunal deva, oficiosamente, conhecer da nulidade (art. 196.º, a contrario, do CPC), em particular quando, como parece ser o caso em apreço, não se questiona qualquer venda de bem alheio porquanto não estará em causa a titularidade do direito de propriedade da insolvente sobre os prédios, ainda que em comum com o seu ex-cônjuge.” Não tendo sido arguida por nenhum dos interessados a nulidade da venda com base neste fundamento – venda de bem não apreendido – tem-se por sanada, não cabendo, por conseguinte a este Tribunal de recurso conhece-la. Concluindo, entendendo-se, como entendeu o Tribunal a quo, que os esclarecimentos prestados pela Sra. Administradora de Insolvência são suficientes quer para a determinação dos bens que integravam o lote 6 do leilão eletrónico com inicio no dia 05-12-2022 às 09h00 e fim em 06-12-2022 às 12h00, quer para a identificação dos propoentes e bem assim quanto às diligências que foram efetuadas, juntamente com o Administrador da insolvência do ex-cônjuge da insolvente, para venda dos bens que integram a massa, v.g., o lote 6 e quais as circunstâncias que determinaram que tivesse lugar a venda em leilão eletrónico cuja irregularidade foi arguida por BB improcede, igualmente, nesta parte o recurso do apelante. *** Da nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia quanto à tempestividade do requerimento apresentado por BB em 21/12/2022, por falta de fundamentação e por excesso de pronúncia. Entende o recorrente que a decisão recorrida é nula nos termos do disposto no art. 615º, n.º1, al. d) do CPC por omissão de pronúncia quanto à questão da tempestividade do requerimento apresentado por BB em 21/12/2022, alegando para o efeito que o reclamante BB suscitou as irregularidades apontadas e só requereu a anulação do leilão depois de decorridos mais de 10 dias do seu conhecimento, pelo que a verificarem-se e, por consequência, a violação do disposto nos artigos 195º e 196º do CPC o despacho recorrido deveria ter julgado da intempestividade daquele requerimento de 21/12/2022. Nos termos do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, relativo às causas de nulidade da sentença, uma sentença é nula quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido. O recorrente arguiu a ocorrência da nulidade constante da alínea d) do mencionado n.º 1 do artigo 615.º do CPC, por omissão de pronúncia do Tribunal recorrido, aplicável aos despachos por força do n.º3 do art. 613º. A nulidade por omissão de pronúncia supõe o silenciar, em absoluto, por parte do tribunal sobre qualquer questão de cognição obrigatória, isto é, que a questão tenha passado despercebida ao tribunal, já não preenchendo esta concreta nulidade a decisão sintética e escassamente fundamentada a propósito dessa questão (assim o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01/03/2007, Relator Sebastião Póvoas, processo n.º 07A091). Caso o tribunal se pronuncie quanto às questões que lhe foram submetidas, isto é, sobre todos os pedidos, causas de pedir e exceções que foram suscitadas, ainda que o faça genericamente, não ocorre o vício da nulidade da sentença, por omissão de pronúncia. Poderá, todavia, existir mero erro de julgamento, atacável em via de recurso, onde caso assista razão ao recorrente, se impõe alterar o decidido, tornando-o conforme ao direito aplicável. É tendo em consideração o disposto no artigo 608º, nº 2 do CPC, que se terá de aferir da nulidade prevista na alínea d), do n.º 1, do art. 615º, do CPC. Como se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/03/2022, Relator Carlos Castelo Branco, processo n.º 7960/14.2T8LSB-A.L1-2, disponível para consulta in www.dgsi.pt: “A nulidade da sentença (por omissão ou excesso de pronúncia) há de, assim, resultar da violação do dever prescrito no n.º 2 do referido artigo 608.º do Código de Processo Civil do qual resulta que o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas, cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” (…) O que o juiz deve fazer é pronunciar-se sobre a questão que se suscita apreciando-a e decidindo-a segundo a solução de direito que julga correta.” O vocábulo legal - “questões” - não abrange todos os argumentos invocados pelas partes. Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir (assim cf. os Acórdãos Tribunal da Relação de Guimarães de 15/03/2018, relatora Eugénia Cunha, processo nº 1453/17.3T8BRG.G1, do Tribunal da Relação de Coimbra de 28-09-2011, Relator Orlando Gonçalves processo n.º 480/09.9JALRA.C1, do Tribunal da Relação de Lisboa de 08/05/2019, relatora Maria da Graça Santos Silva, processo 1211/09.9GACSC-A.L2-3, todos disponíveis in www.dgsi.pt. Preceitua o art.º 608º, nº2 do CPC que o Juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se senão de questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. E é precisamente neste ponto que reside a questão. Em 21/12/2022, BB apresentou requerimento indicando que, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 835.º do Cód. Proc. Civil, “vem RECLAMAR CONTRA AS IRREGULARIDADES cometidas no ato do leilão”, pedindo, a final que se declare a nulidade da venda, a qual deverá ser substituída por decisão que ordene a celebração da escritura pública publicitada e mais bem descrita nos termos anunciados a 04/04/2022, alegando para o efeito que apresentou uma proposta de compra dos quatro imóveis identificados, vendidos em lote, oferecendo o valor de 6.000,00€, que foi aceite, tendo o proponente depositado a favor da massa insolvente o valor de 20% daquela quantia, pago o valor de “comissões”, encontrando-se por liquidar o remanescente do preço de venda proposto e aceite, no valor de 4.800,00€ (valor esse que se encontra depositado nos autos a título de caução). No entanto, a Administradora da Insolvência realizou novo leilão, tendo obtido uma proposta que supera a anterior por quinhentos euros, motivo pelo qual aceitou esta última. Dissecado o seu requerimento concluímos que aquele BB não arguiu qualquer irregularidade que tenha sido cometida no ato do leilão, a contender, nomeadamente, como a inscrição e acesso dos licitantes, formalização das propostas, à publicidade do leilão, mas à realização do ato de leilão em si remetendo para o art.° 835º do C.P.C. nos termos qual os credores, o executado e qualquer dos licitantes podem reclamar contra as irregularidades que se cometam no ato do leilão, ou seja, visto o teor do requerimento apresentado por BB e que foi apreciado no despacho em crise, apesar de no seu introito referir tratar-se de uma reclamação ao abrigo do disposto no art.º 835º do CPC conclui-se que não arguiu qualquer irregularidade que seja suscetível de viciar o leilão em sim mesmo. Aquele requerente insurge-se, antes, contra o facto de ter sido designado segundo ato de leilão, com a consequente desconsideração da sua proposta no primeiro. Concluindo pela invalidade da venda e invocando a prática de um ato que a lei não admite, o reclamante arguiu nulidade processual suscetível de influenciar a decisão da causa, tese que se afigura evidente que a decisão recorrida acolheu, atenta à decisão e sua fundamentação, enquadrando a situação de facto nas normas jurídicas aplicáveis nos termos do previsto no art. 5º, n.º3 do CPC (o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito). Assim, na tese da decisão recorrida, a desconsideração do leilão com aceitação da proposta do reclamante BB e a realização de subsequente leilão entre os licitantes (preferentes), consubstanciando-se na prática de um ato que a lei não admite, não se enquadra na previsão do artigo 196º do CPC, seguindo, assim, o regime previsto no art.º 195º do CPC ex vi do art. 17º do CIRE. (Cf. Manuel de Andrade, in Noções Elementares de Processo Civil, 1979, pág. 176-177, Antunes Varela, in Manual de Processo Civil, 2ª edição, pág. 387 e Alberto dos Reis, in Comentário ao CPC, 2º volume, págs. 339 e ss.), a constituir nulidade processual secundária, que não é do conhecimento oficioso do tribunal (cf. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in “O Código de Processo Civil Anotado”, vol. I, pág. 236). Como ensinam estes autores, as nulidades previstas no artigo 195º do Código de Processo Civil - nulidades processuais - traduzem-se na “prática de um acto que a lei não admita, bem como a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva (…)”. Sintetizando, como refere Manuel de Andrade, in Ob. Cit., loc. “as nulidades do processo podem definir-se nestes termos: são quaisquer desvios do formalismo processual seguido, em relação ao formalismo processual prescrito na lei e a que esta faça corresponder - embora não de modo expresso - uma invalidação mais ou menos extensa de actos processuais”. “A nulidade processual refere-se ao acto como trâmite, e não ao acto como expressão da decisão do tribunal ou da posição da parte. O acto até pode ter um conteúdo totalmente legal, mas se for praticado pelo tribunal ou pela parte numa tramitação que o não comporta ou fora do momento fixado nesta tramitação, o tribunal ou a parte comete uma nulidade processual. Em suma: a nulidade processual tem a ver com o acto como trâmite de uma tramitação processual, não com o conteúdo do acto praticado pelo tribunal ou pela parte.” (cf. Miguel Teixeira de Sousa, in Blogue do IPPC (disponível in https://blogippc.blogspot.com/2018/04/o-que-e-uma-nulidade-processual.html). Quanto ao regime e meio de arguição, a regra é a de que o juiz só conhece destas nulidades mediante arguição da parte e o meio processual próprio para o fazer é a reclamação (v. parte final do art. 196º e 197º), no momento em que ocorrer a nulidade, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário e, no caso de o não estar, o prazo geral de arguição, de dez dias, conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando se deva presumir que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência (cfr. arts. 199º, n.º 1 e 149º, n.º 1, do C. P. Civil). Quanto ao prazo de arguição, esta nulidade deve ser arguida no prazo de 10 dias (art.ºs 149.º e 199.º do CPC) no tribunal em que foi cometida, contando-se este prazo de uma das circunstâncias seguintes: da sua intervenção em qualquer ato processual subsequente ou da notificação para qualquer termo do processo. No primeiro caso, a mera intervenção processual marca o início do prazo da arguição, o que significa que a parte tem o ónus, por via da consulta do processo, detetar o vicio sob pena de preclusão. No segundo caso, não basta a simples notificação para marcar o início do prazo, impondo-se ainda que seja de presumir que a parte, em face da notificação, tomou conhecimento da nulidade ou se pôs aperceber da mesma (Cf. A. Geraldes e Paulo Pimenta, in Ob. Cit., Vol. I, pág. 364). Revertendo ao caso dos autos, os factos provados revelam-nos que JJ, “Real Estate Manager” da sociedade leiloeira, enviou a BB comunicação eletrónica, em 29-11-2022, às 12:58, com o seguinte teor: “Subject: Leilão Privado - "FAST SALE" // Terrenos – (…) – DD e AA To: Exmo.(a). Sr(a), bom dia, Considerando o dissídio existente no que concerne à venda do imóvel apreendido no âmbito dos processos supra identificados, verificando-se a existência de vários confrontantes alegando direito de preferência sobre os respetivos imóveis, e ao abrigo do Artigo 823.º n.º 2 do Código do Processo Civil, entende-se que a licitação entre todos os interessados deverá ter lugar na nossa plataforma online em www…..pt. Por forma a esclarecer as condições de participação no evento, queira por favor considerar o seguinte: I. MODALIDADE DE VENDA Leilão Privado – “FAST SALE” O evento é aberto apenas aos destinatários da presente comunicação, sendo fechado a terceiros. II. ACESSO AO LEILÃO O Leilão encontra-se já disponível para consulta aqui: (…) As licitações apenas serão permitidas após validação do “Registo Prévio” que consta na página de leilão, por forma a garantir a exclusividade de acesso ao evento. III. DURAÇÃO DO LEILÃO Inicio: 05/12/2022 às 09h00 Término: 06/12/2022 às 12h00 (fuso horário GMT - Portugal Continental) O evento irá iniciar com o Valor de Abertura de € 6.500,00, sendo entretanto disputado em lances mínimos de € 500,00. Findo o leilão, o melhor lance obtido será de imediato aceite, procedendo-se à formalização do negócio junto do licitante vencedor. Para qualquer esclarecimento adicional, por favor não hesite em contactar. Nesta oportunidade, apresentamos os nossos melhores cumprimentos”. Resulta também que foi publicitada a venda, por leilão eletrónico, no âmbito dos presentes autos e ainda do processo de insolvência , relativo a DD, dos seguintes prédios, venda com início em 05-12-2022 às 09h00 e fim em 06-12-2022 às 12h00: - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 15); - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 14); - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº …; - Prédio inscrito na matriz: Artigo nº … (verba 12). E ainda que foram licitantes inscritos DD, BB e CC, correspondendo a melhor oferta a deste último pelo montante de 6500,00€. Ou seja, pelo menos no dia 6 de dezembro de 2022, data fim do leilão, em que o reclamante figurava como licitante inscrito, o arguente BB teve conhecimento da efetiva realização do segundo leilão que determinaria que o primeiro, realizado em 18/02/2022 e no âmbito do qual lhe havia sido adjudicado o lote seus compostos pelos quatro imóveis, ficaria sem efeito. Dispunha, por isso, de dez dias, para arguir a nulidade decorrente a prática de ato que a lei não admite, prazo que se iniciou em 7/12/2022 e terminou em 16/12/2022. O ato do reclamante veio a ser praticado, a 21/12/2022, 2º dia útil seguinte ao do terminus do prazo. O reclamante liquidou a multa a que alude o art. 139, n.º 5, al. c) (cf. Ref. n.º…) concluindo-se, deste modo pela não extemporaneidade do ato. Não o sendo, não haveria que apreciar e por consequência concluir pela extemporaneidade do requerimento apresentado por BB, não enfermando o despacho recorrido da nulidade por omissão de pronúncia, prevista no art. 615º, n.º 1, al. d) do CPC arguida pelo recorrente. * Defende, para além, o apelante que a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 615º do CPC porquanto omite fundamentação de direito. Vejamos. Para avaliar da pretensão de BB convocou o despacho recorrido o art.º 165º do CIRE e bem assim o disposto nos art.º 819º do CPC. Ainda que de forma sucinta a decisão recorrida está fundamentada de facto e de direito, não se verificando, neste ponto, a nulidade arguida e prevista no art.º 615º, n.º 1, al. b) do CPC. Questão diversa será a de saber se, ao invés, na aplicação das normas aos factos ocorreu erro de julgamento, o que, de todo o modo, não se confunde com as arguidas nulidades do despacho proferido. Não se confunde, de igual forma, com a decorrente da previsão da alínea d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC, por excesso ou omissão de pronúncia. Quanto a esta nulidade especifica, como tivemos já ocasião de referir, não tem o Tribunal que se pronunciar sobre todos os argumentos aduzidos pelas partes, não constituindo nulidade por omissão de pronúncia a falta de apreciação pelo Tribunal de todos e cada um dos argumentos defendidos para alcançar um determinado efeito jurídico. Por outro, lado, da análise do despacho recorrido não decorre que, para julgar procedente a reclamação, se tenha o mesmo fundado na concretizada venda a BB (por escritura publica) outorgada em 5/12/2022. Não ocorre, também, a nulidade da decisão proferida por excesso de pronuncia. * Do erro de julgamento da decisão recorrida ao decidir que inexistia razão para desconsiderar a venda já efetuada e prosseguir a nova venda executiva. Para fundamentar a procedência da pretensão reclamatória de BB, entendeu-se na decisão recorrida, em suma, que atento o disposto no art.º 819º do CPC a notificação dos titulares do direito de preferência, legal ou convencional com eficácia real, não pode ser edital, aplicando-se as regras relativas à citação, conforme resulta dos artigos 819º, n.º 3 e 227º, n.º 2 do Código de Processo Civil; no que concerne às consequências da omissão de notificação do titular do direito de preferência na venda dos bens apreendidos dispõe o artigo 819º, nº 2 do Código de Processo Civil, nos termos do qual, a falta de notificação tem a mesma consequência que falta de notificação ou aviso prévio na venda particular. Em consequência, a reação do preferente não notificado para o exercício do seu direito de preferência resume-se à possibilidade de instaurar ação de preferência nos termos gerais, prevista no artigo 141º do Código Civil, não acarretando a nulidade do ato da venda. Vejamos se assim é. O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores.» – art. 1º nº1 do CIRE. É um processo especial que, quanto à sua natureza, pode ser considerado misto, com uma fase marcadamente declarativa (até à declaração de insolvência) e outra claramente executiva (após a declaração de insolvência com liquidação de todo o património do devedor que integra a massa insolvente para satisfação dos credores ou através da aprovação de um plano de insolvência) – cf. Maria do Rosário, Epifânio em Manual de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2012, pg. 13). Nos termos do nº 1 do art.º 17º do CIRE, o processo de insolvência é regido pelas regras deste código e, subsidiariamente pelo Código de Processo Civil, «em tudo o que não contrarie as disposições do presente código.», ainda assim, ao longo do código, o legislador remeteu especificamente para algumas regras do Código de Processo Civil em especial para as normas que regulam o processo executivo na parte relativa à tramitação de feição “executiva”, ou seja, a apreensão e liquidação. A regra geral do art.º 17º, no entanto, vale também para as remissões expressas, ou seja, a aplicação dos preceitos do CPC dá-se enquanto os mesmos não contrariem disposições do CIRE. A liquidação do ativo (arts. 158º e ss. do CIE) insere-se, claramente na fase “executiva” do processo de insolvência e está orientada diretamente para a finalidade principal do processo de insolvência - “destina-se à conversão do património que integra a massa insolvente numa quantia pecuniária a distribuir pelos credores, havendo, para isso, que proceder à cobrança dos créditos e à venda dos bens da massa insolvente, por forma a obter os respetivos valores” (cf. Maria do Rosário Epifânio, in Ob. Cit., pag. 13). O despacho recorrido considerou aplicável ao caso o disposto no art.º 819º do CIRE, sem que tivesse questionado, desde logo a modalidade da venda adotada pela Sra. Administradora da Insolvência. Como vimos a venda foi realizada com “auxilio” de estabelecimento de leilão. Dispõe o art.º 164º do CIRE que «1- O administrador da insolvência procede à alienação dos bens preferencialmente através de venda em leilão eletrónico, podendo, de forma justificada, optar por qualquer das modalidades admitidas em processo executivo ou por alguma outra que tenha por mais conveniente», ou seja, este preceito dá total autonomia ao Administrador da Insolvência para a escolha da modalidade de venda, impondo-lhe, porém, que caso não opte pela modalidade de leilão eletrónico, o justifique. O CIRE não regula por qualquer forma as modalidades de venda, remetendo, nesta matéria, diretamente para o CPC, pelo que, nos termos do disposto no art. 811º do CPC, as modalidades de venda disponíveis em liquidação de ativo em processo de insolvência são a venda mediante propostas em carta fechada; a venda em mercados regulamentados; a venda direta a pessoas ou entidades que tenham direito a adquirir os bens; a venda por negociação particular; a venda em estabelecimento de leilões; a venda em depósito público ou equiparado; e a venda em leilão eletrónico. A remissão específica para as modalidades de venda em processo executivo significa que, quando no nº4 do artigo 161º do CIRE se referem alienações (…) por negociação particular, se preveem as vendas efetuadas nos termos do art.º 833º do CPC. Da mesma forma quando, no nº1 do art.º 164º do CIRE se menciona o leilão eletrónico, a lei está-se a referir à modalidade da venda prevista no art.º 837º do CPC. Existe um outro sentido, factual, para a expressão leilão eletrónico – correspondente a um leilão realizado por meios eletrónicos em estabelecimento de leilão – mas que não corresponde à modalidade de venda prevista como preferencial no nº1 do art.º 164º do CIRE (e no nº1 do art. 837º do CPC) mas antes à modalidade de venda prevista no artigo 834º do CPC (Cf. neste sentido o Acórdão desta secção de 26/04/2022, relatora Fátima Reis Silva, proc. n.º 144/19.5T8VFX-H.L1-1). Isto para concluir que, nos autos a Sra. Administradora da Insolvência escolheu de modalidade de venda em estabelecimento de leilão, por meios eletrónicos, sem que se vislumbre que tenha sido apresentada fundamentação para o afastamento da modalidade da venda de leilão eletrónico, necessariamente através da plataforma “e-leilões”. Ocorreu, assim, uma omissão de uma formalidade prevista na lei - fundamentação por modalidade diversa da preferencial. Porém, esta concreta omissão de justificação pelo Administrador da Insolvência constitui mera irregularidade, porquanto não suscetível de influir no exame da causa de acordo com “o critério do fim” (Alberto dos Reis, Comentário, II, pág. 486) não consubstancia, por isso, uma nulidade processual ao abrigo do disposto no art.195º, nº1 CPC, como se verá adiante, e sequer foi arguida nos autos por qualquer dos interessados, nomeadamente pelo devedor ou pelos credores. * Considerou o Tribunal recorrido ter havido violação do disposto no art.º 819º do CPC por duas ordens de razões: - A notificação dos preferentes, que não pode ser edital; - No que concerne às consequências da omissão de notificação do titular do direito de preferência na venda dos bens apreendidos, a falta de notificação tem a mesma consequência que falta de notificação ou aviso prévio na venda particular, ou seja, a reação do preferente não notificado para o exercício do seu direito de preferência resume-se à possibilidade de instaurar ação de preferência nos termos gerais, prevista no artigo 141º do Código Civil, não acarretando a nulidade do ato da venda. O apelante faz derivar a sua qualidade de preferente no art.º 1380º do Código Civil. O art.1380.º, nº1, do C. Civil, confere direito de preferência com eficácia “erga omnes” aos donos de prédios rústicos confinantes desde que um deles (seja aquele cujo dono quer vendê-lo, seja o outro contíguo que pretende comprá-lo) tenha área inferior à unidade de cultura. Prescreve o art.º 165º do CIRE que aos credores garantidos que adquiram bens integrados na massa insolvente e aos titulares de direito de preferência, legal ou convencional com eficácia real, é aplicável o disposto para o exercício dos respetivos direitos na venda em processo executivo (sublinhado nosso). Entendeu-se no despacho recorrido que o art.º 165º do CIRE remete para o art.º 819º do Código de Processo Civil (que se aplica a todas as modalidades da venda ex vi do art. 811º, n.º 3 do CPC), ou seja que, na liquidação do património insolvencial, esses preferentes devem ser “notificados do dia, da hora e do local aprazados para a abertura de propostas, a fim de poderem exercer o seu direito no próprio ato, se alguma proposta for aceite” (artigo 819.º, n.º 1, do CPC); a falta de notificação tem a mesma consequência que a falta de notificação ou aviso prévio na venda particular (n.º 2); à notificação prevista no n.° 1 aplicam-se as regras relativas à citação, salvo no que se refere à citação edital, que não terá lugar (n.º 3). A frustração da notificação do preferente não preclude a possibilidade de propor ação de preferência nos termos legais (n.º 4). A venda do objeto de preferência conjuntamente com outras coisas encontra-se regulada no art. 417º do CC, no qual se estabelece: «1.– Se o obrigado quiser vender a coisa juntamente com outra ou outras, por um preço global, pode o direito ser exercido em relação àquela pelo preço que proporcionalmente lhe for atribuído, sendo lícito, porém, ao obrigado exigir que a preferência abranja todas as restantes, se estas não forem separáveis sem prejuízo apreciável. 2.– O disposto no número anterior é aplicável ao caso de o direito de preferência ter eficácia real e a coisa ter sido vendida a terceiro juntamente com outra ou outras». Como anota António Menezes Cordeiro, in Código Civil Comentado, II – Das Obrigações em Geral, Almedina, pag. 210. ao preceito citado, a sequência é a seguinte: 1) o obrigado à preferência faz a comunicação da venda da coisa conjuntamente com outras; 2) recebida a comunicação o preferente pode exercer a sua preferência em relação à coisa objeto do direito de preferência, pelo preço que proporcionalmente lhe caiba, se não estiver indicado; 3) exercida essa opção (o preferente pode optar por preferência pela venda conjunta) se o obrigado à preferência entender que a separação lhe traz um prejuízo considerável, o que (então) terá que provar, pode exigir que a preferência abranja todo o conjunto e, se o preferente discordar, renuncia à mesma. Transpondo para o caso concreto, foi determinada a venda em conjunto, englobando imóveis objeto de direito de preferência, em estabelecimento de leilão. Foi apresentada proposta de compra dos bens que integravam o lote 6 pelo reclamante BB no valor global de 6000,00€, a qual foi aceite pela Sra. Administradora da Insolvência. A Sra. Admnistradora da insolvência, encontrava-se obrigada a fazer a comunicação aos eventuais preferentes (confinantes) – art.º 823º do CPC nos termos do qual se dispõem que: “aceite alguma proposta, são interpelados os titulares do direito de preferência presentes para que declarem se pretendem exercer o seu direito. Esta interpelação, que só pode ser cumprida pelo Administrador da Insolvência depois de ter uma proposta de compra e a aceitação da mesma (tal qual como sucede no exercício da preferência no âmbito de uma venda privada/particular), conduz-nos à conclusão de que o disposto no art.º 819º do CPC, no que diz respeito à regra prescrita para a citação dos preferentes (que neste casos não pode ser edital - n.º3 do art. 819º), não tem aplicabilidade às outras modalidade da venda, nomeadamente à venda em estabelecimento de leilão que é o caso dos autos. A notificação/citação dos preferentes prevista no n.º 3 do art.º 819º do CPC enquadra-se na venda judicial por que esta se desenvolve numa diligência presencial (para abertura das propostas de compra apresentadas), mas já não se enquadra na negociação particular nem na venda por leilão, maxime se este for por recurso a plataforma eletrónica, porque nestas a apresentação e a aceitação de uma proposta não ocorre no âmbito de um procedimento nem de um ato presencial formalmente definido para o efeito (como existe na venda judicial). Assim se entendendo, nestas modalidades, para que diligência/ato, prévio à aceitação de uma proposta, seriam citados os preferentes? Consequentemente, nestas modalidades de venda a única coisa que se impõe ao vendedor obrigado à preferência (no caso dos autos o obrigado à preferência é a massa) é a interpelação dos preferentes para que declarem se querem exercer o seu direito (art. 823º CPC), interpelação que o Administrador da Insolvência só pode cumprir depois de ter uma proposta de compra e a aceitação da mesma (tal qual como sucede no exercício da preferência no âmbito de uma venda privada/particular), cumprindo ao preferente ir diretamente ao processo de execução exercer o seu direito. Obtida a proposta de venda, a Sra. Administradora da Insolvência procedeu então ao primeiro passo destacado supra - fez a comunicação da venda da coisa conjuntamente com outras. E, fê-lo, por editais, porquanto ignorava a entidade dos preferentes, resolvendo, desta forma, aquele desconhecimento, mas cumprindo a formalidade que a lei lhe impunha – a comunicação aos preferentes. A forma como tal convocação foi efetuada e que sustentou a irregularidade conhecida no despacho recorrido, é irrelevante para o caso, pois que a forma pela qual foi cumprida a interpelação, só ao preferente seria legitimo discutir na ação própria (nomeadamente se a comunicação para preferência obedeceu aos requisitos legais). A sua forma de proceder, na sua globalidade, considera-se ter sido a que, em sede de liquidação, melhor tutela o interesse da massa por ser o adequado a evitar eventual ação judicial contra a massa (e contra o adquirente) para exercício da preferência, entrando em ação a limitação da aplicação subsidiaria do CPC prevista pelo art. 17º do CIRE (em tudo o que não contrarie as disposições do presente Código.) e a latitude/liberdade de procedimentos que a parte final do nº 1 do art. 164º atribui ao Administrador da Insolvência, no âmbito do cumprimento da liquidação da massa (qualquer modalidade de venda que tenha por mais conveniente). Concluindo, entendemos que a Sra. Administradora da Insolvência não cometeu as ilegalidades que lhe são imputadas na decisão recorrida, que mais não correspondem do que ao oportuno cumprimento da interpelação devida pelo obrigado à preferência, no momento em que o poderia cumprir (depois da apresentação e aceitação de uma proposta de compra, porque só aí fica definido o preço) e na consideração do desconhecimento da identidade dos preferentes. Constituindo, como se disse, o processo de insolvência um processo de execução universal e concursal, que tem como finalidade a satisfação dos credores, (artigos 1º do CIRE), a desjudicialização do processo, a ampla autonomia dos credores, e o reforço dos poderes do administrador, mormente, no que respeita à liquidação do ativo do insolvente, constituem hoje princípios basilares do CIRE. Na sequência desses princípios, incumbe então ao administrador da insolvência promover a alienação dos bens que constituem a massa insolvente, funções que exerce sob a fiscalização da comissão de credores, da assembleia de credores e do juiz, sendo o administrador civilmente responsável pelos danos causados ao devedor e aos credores da insolvência e da massa insolvente pela inobservância culposa dos deveres que lhe incumbem, podendo ser destituído, a todo o tempo, pelo juiz, se fundadamente considerar existir justa causa (artigos 55º, 56º, 58º, 59º, 79º e 80º do CIRE). Como consequência do disposto no art. 164º do CIRE no âmbito da insolvência as modalidades da venda deixaram de ter carater taxativo, podendo o administrador da insolvência optar não apenas pelas reconhecidas em processo executivo, mas também por qualquer outra que considere adequada. Se é certo que há determinadas particularidades que são essenciais ao regime de determinada modalidade de venda, outras são insuscetíveis de ser cumpridas nos autos de insolvência ou não são sequer nele exigíveis, não obstante constituírem fundamento para anulação da venda nos autos de execução. O que já não será aceitável é a violação de determinados princípios e regras essenciais da venda executiva. No caso dos autos, em face da finalidade do processo de insolvência que é, no caso de liquidação do património do devedor, a repartição do produto obtido pelos credores, tendo os prédios integrados do lote n.º 6 sido vendidos em segundo leilão, realizado entre os preferentes que se apresentaram a preferir, por preço superior ao da primeira venda, atentas as razões expostas, e por via da aplicação dos arts. 1380º e 417º do Cód. Civil, não se surpreende qualquer irregularidade ou incumprimento de regra imperativa que seja suscetível de gerar invalidade dos atos de liquidação – venda em leilão, adjudicação e comunicação para efeitos de direito de preferência. Tendo já sido concretizada a venda de pelo menos parte dos prédios que integram o lote 6, mediante escritura de compra e venda em 15/12/2023, outorgada entre a Sra. Administradora da Insolvência e BB, fica esta venda sem efeito, nos termos do disposto no art.º 839º, n.º1, al. a) do CPC ex vi do art.º 17º do CIRE, devendo a Sra. Administradora requerer a restituição dos bens no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado desta decisão e devendo o comprador ser embolsado previamente do preço e das despesas de compra (n.º3 do art.º 839º do CPC). Ficando prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas em termos de recurso, procede a presente apelação com a consequente revogação do despacho recorrido. * IV. Decisão: Assim, em face do exposto, acordam as juízas desta 1º secção do Tribunal da Relação de Lisboa em julgar procedente o recurso e, por consequência, revogar o despacho recorrido que julgou procedente a reclamação de BB, mantendo-se a adjudicação efetuada ao apelante e, ficando, por consequência, sem efeito, a venda de pelo menos parte dos prédios que integram o lote 6, realizada por escritura de compra e venda em 15/12/2023, outorgada entre a Sra. Administradora da Insolvência e BB. Deverá a Sra. Administradora requerer a restituição dos bens no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado desta decisão e devendo o comprador ser embolsado previamente do preço e das despesas de compra (n.º3 do art. 839º do CPC). Custas pelo apelado (artºs. 527º, nºs. 1 e 2, do CPC, e 17º e 17º-I, nº. 4, do CIRE). Susana Santos Silva Amélia Rebelo Manuela Espadaneira |