Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | PEDRO BRIGHTON | ||
Descritores: | TAXA DE JUSTIÇA PREPARO SUBSEQUENTE MULTA PROIBIÇÃO DE PROVA INSOLVÊNCIA FACTOS-INDICES | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 10/15/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I- Nos termos do artº 14º nº 2 do Regulamento das Custas Processuais, a parte deve comprovar o pagamento da taxa de justiça subsequente no prazo de dez dias a contar da notificação para a audiência final ; se não o fizer, tem dez dias para a pagar, acrescida de multa, a contar da notificação que para o efeito a secretaria lhe deverá efectuar, conforme estatuído no artº 14º nº 3 do mencionado Regulamento. II- Decorrido o prazo de dez dias previsto no artº 14º nº 3 do Regulamento das Custas Processuais, sem que a parte tenha juntado ao processo o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da multa ou da concessão de benefício de apoio judiciário, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, fica precludida a possibilidade de a efectuar e no dia da audiência final, o Tribunal determina a impossibilidade da realização das diligências de prova que tenham sido requeridas pela parte em falta. III- O legislador concebeu a situação de insolvência como a impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas (cf. artº 3º nº 1 do C.I.R.E.), equiparando-se à situação de insolvência actual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação do devedor à insolvência (artº 3º nº 4 do C.I.R.E.). IV- A impossibilidade de cumprimento caracterizadora da insolvência não tem, necessariamente, de abranger todas as obrigações assumidas pelo devedor e já vencidas, bastando a incapacidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciem a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. V- O estado de insolvência revela-se a partir dos factos que estão descritos nas diversas alíneas do nº 1 do artº 20º do C.I.R.E., usualmente designados por “factos-índices”. | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da 1ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa I – Relatório 1- A “C..., S.A.”, intentou processo especial de insolvência contra AA… e mulher, BB…, peticionando a declaração de insolvência dos requeridos. Para fundamentar tal pretensão alegou, em resumo, que os requeridos se encontram impossibilitados de cumprir as suas obrigações vencidas para com a requerente e demais credores. 2- Os requeridos deduziram oposição, impugnando o montante global da dívida invocada pelo requerente e alegando possuírem património superior ao seu passivo, concluindo assim pela sua solvência. Sem prejuízo, para o caso de ser decretada a sua insolvência, requereram a exoneração do passivo restante. 3- Por despacho de 24/11/2022, foi agendada a audiência final, nos seguintes termos : “Designo o dia 02-12-2022, às 13h45 para realização da audiência de discussão e julgamento. Nos termos do artigo 35.º do CIRE, notifique o requerente e o devedor para comparecerem pessoalmente ou para se fazerem representar por quem tenha poderes para transigir, sob cominação de: -não comparecendo o devedor nem o seu representante, têm-se por confessados os factos alegados na petição inicial (n.º 2); -não comparecendo o requerente, por si ou através de um representante, vale como desistência do pedido (n.º 3)”. 4- Os requeridos foram notificados para a audiência final, em 28/11/2022. 5- Por impedimento do Mandatário dos requeridos, foi o julgamento adiado para o dia 9/1/2023. 6- Até ao dia 9/1/2023 não foram os requeridos notificados para liquidarem a segunda prestação da taxa de justiça, nem foram notificados pela secretaria para efectuarem o pagamento, acrescido de multa de igual montante. 7- Na audiência que decorreu no dia 9/1/2023, o Tribunal ouviu o requerido em declarações de parte, o que tinha sido requerido por aquele em sede de requerimento de produção de prova. 8- No final da sessão de julgamento, foi proferido despacho nos seguintes termos : “Atento o adiantado da hora, designa-se para sua continuação o dia 01-02-2023 pelas 11 horas (…)”. 9- No dia 27/1/2023 foi lavrado, pelo Sr. Funcionário judicial, Termo com o seguinte teor : “Em 27-01-2023, compulsados os autos, verificou-se que, devidamente notificado para o efeito, até à presente data, os requeridos não procederam ao pagamento da 2ª prestação da taxa de justiça devida, pelo que, neste momento, irei dar cumprimento ao disposto no artº 14º, nº 3 do Regulamento das Custas Processuais”. 10- Subsequentemente, e ainda nessa data, foram os requeridos notificados para efectuarem o pagamento da segunda prestação e da respectiva multa. 11- Por despacho de 5/2/2023, e já após as partes serem notificadas do adiamento da continuação do julgamento foi proferido o seguinte despacho : “Por motivos pessoais, imprevisíveis e inadiáveis, não foi possível assegurar a diligência agendada para o passado dia 01-02-2023. De igual modo, por se tratar de uma continuação, não foi possível determinar a intervenção da Mma. Juiz Auxiliar deste Tribunal, pese embora a natureza urgente dos presentes autos, atento o princípio do Juiz Natural e da Imediação. Em substituição designo o dia 24-02-2023, às 13h45, neste Tribunal. Notifique. D.N.”. 12- Devido a sucessivos conflitos de agenda, que impossibilitaram a realização do julgamento na referida data, veio o Tribunal a proferir, em 9/2/2023, o seguinte despacho : “Atento o encontro de agendas, designa-se o dia 01-06-2023, às 13h40 para continuação da audiência de julgamento. Notifique”. 13- No início da continuação da audiência de discussão e julgamento, no dia 1/6/2023, o Tribunal proferiu despacho nos seguintes termos : “Regularmente notificado para o efeito (por cartas registadas de 27-01-2023), os requeridos não pagaram a 2ª prestação da taxa de justiça devida, nem juntaram pedido ou decisão de eventual apoio judiciário. Assim sendo, ao abrigo do artº 14º, nº 3 e 4 do RCP, determino a impossibilidade da produção de prova pelos requeridos”. 14- Decorreu o julgamento com cumprimento das formalidades legais. 15- Após, com data de 3/6/2023, foi proferida Sentença a julgar a acção procedente, constando da sua parcela decisória : “Nesta conformidade, nos termos do artigo 36º do CIRE, julgo a ação procedente por provada e em consequência: 1. Declaro a insolvência AA…, contribuinte nº … e cônjuge BB…, contribuinte nº …, residentes na Rua da …, freguesia de …. 2. Fixo a residência dos insolventes na Rua da …, freguesia de …. 3. Nomeio Administrador da Insolvência pessoa inscrito/a na Lista Oficial de Administradores do Distrito da Comarca dos Açores, a indicar por sorteio automático no citius e a efectuar pela secção após criação do interveniente devedor (artigo 36º, al. d), e 52º, nº 1, do CIRE). 4. Determino que o Insolvente entregue imediatamente ao ao/à Sr/a. Administrador/a da Insolvência os documentos referidos artigo 24.º, n.º 1 do CIRE que ainda não se encontrem nos autos. 5. Ordeno a apreensão, para entrega ao/à Sr/a Administrador/a da Insolvência, dos elementos da contabilidade do Insolvente e de todos os seus bens, ainda que arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos, sem prejuízo do disposto no nº 1 do artigo 150º do CIRE (artigo 36º, al. g) do CIRE). 6. Não declaro, por ora, aberto o incidente de qualificação da insolvência, atenta a ausência de elementos que o justifiquem, consignando-se que o prazo para requerer o aludido incidente é de 15 dias após a junção aos autos do relatório a que se refere o artigo 155º do CIRE. 7. Não nomeio, por ora, comissão de credores, nos termos do artigo 66º, nº 2, do CIRE, atento o reduzido número de credores da insolvência, sem prejuízo de tal ser requerido/ordenado se se mostrar necessário. (…) * Dê publicidade à sentença conforme o disposto no artigo 38º, nº 1, do CIRE. Solicite o registo oficioso da declaração de insolvência, bem como da nomeação do/a Administrador/a da Insolvência, na competente Conservatória do Registo Civil, nos termos do artigo 38º, nº 2, al. a), do CIRE; (…) Notifique a presente sentença (artigo 37º, nºs 1 e 2, do CIRE): a) Aos Insolventes; b) Ao Ministério Público; c) Ao Sr/a. Administrador/a da Insolvência. Comunique a presente sentença à DGI. * Valor da causa: o indicado na petição inicial, sem prejuízo de se vir a apurar valor do activo do devedor superior ao indicado (artigo 15º do CIRE). Custas pela massa insolvente, nos termos do disposto nos artigos 301º e 304º do CIRE. Registe”. 16- Inconformados com a decisão referida em 13. e com a Sentença, delas recorreram os requeridos, para tanto apresentando as suas alegações com as seguintes conclusões : “1. Nos presentes autos, a audiência de julgamento iniciou em 09/01/2023, sem que os requeridos tivessem junto comprovativo de pagamento da segunda prestação da taxa de justiça; 2. No entanto, até essa data, nunca foram notificados pela secretaria para o efeito; 3. Conforme decorre da acta da audiência de julgamento, o requerido foi ouvido em declarações de parte, como, aliás, havia requerido no requerimento probatório apresentado com a oposição; 4. Devido ao adiantar da hora a diligência foi interrompida e todas as testemunhas (incluindo as arroladas pelos requeridos) foram notificadas para comparecerem noutra data; 5. Em 27/01/2023, a secretaria dá cumprimento ao disposto no nº 3, do artigo 14º, do RCP, notificando os requeridos para procederem ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da respectiva multa; 6. Em, 01/06/2023, no início da continuação da audiência de julgamento, é proferido o douto despacho, ora apelado, a determinar a impossibilidade de os requeridos produzirem prova, por falta de pagamento da segunda prestação da taxa de justiça; 7. Salvo melhor opinião, ao admitir num primeiro momento a produção de prova, sem que estivesse demonstrado o pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, considera-se esgotado o poder jurisdicional do Juiz (cfr. artigo 613º, nº 1, do CPC); 8. Assim, com o devido respeito, deverá admitir-se a produção de prova requerida pelos requeridos e, em consequência, repetir-se audiência de discussão e julgamento, com vista à inquirição das testemunhas indicadas no rol probatório; 9. Caso assim não se entenda, ao ter sido proferido despacho a determinar a impossibilidade da produção de prova pelos requeridos, em consequência, deverá ser determinado o desentranhamento dos autos das declarações de parte do requerido, entretanto, prestadas em audiência de julgamento; 10. A requerente veio pedir a declaração de insolvência dos requeridos, ora apelantes, nomeadamente, por se encontrarem em incumprimento generalizado; 11. A convicção do Tribunal a quo, quanto ao incumprimento generalizado das obrigações dos requeridos, em referência nos pontos 23., 24. e 25. da factualidade dada como provada, fundou-se, exclusivamente, na admissão pelo requerido em sede de declarações de parte; 12. Contudo, as declarações de parte resultam do facto de o requerido as ter solicitado no requerimento probatório apresentado com a oposição; 13. A requerente, não requereu, nem o Tribunal a quo determinou, oficiosamente, o depoimento de parte do requerido; 14. Assim, salvo melhor opinião, tendo o Tribunal determinado a impossibilidade de produção de prova pelos requeridos, por falta do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, não pode valorar as declarações de parte do requerido; 15. Pois, ao invés, tais declarações, devem ser desentranhadas dos autos; 16. Não tendo sido produzido outro meio de prova que permitisse ao julgador formar a convicção de que os requeridos estão numa situação de incumprimento generalizado das suas obrigações, a factualidade dos pontos 23., 24. e 25., deverá considerar-se não provada; 17. E, não tendo o Tribunal a quo considerado provado qualquer outro facto subsumível em alguma das situações elencadas no artigo 20º, do CIRE, com o devido respeito, não existe fundamento legal para declarar a insolvência dos requeridos, ora apelantes. 18. Com a prolação da douta decisão, ora recorrida, foram violados, entre outros, os artigos 613º, do CPC e artigo 20º, do CIRE. Termos em que, invocando-se o douto suprimento deste Venerando Tribunal, deverão as doutas decisões recorridas ser substituídas: a) O despacho que determinou a impossibilidade de prova deverá ser substituído por decisão que admita a produção de prova pelos requeridos; b) Caso assim não se entenda, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por decisão a julgar o pedido de declaração de insolvência improcedente, por não provado. Fazendo-se, assim, a costumada Justiça”. 17- A requerente apresentou contra-alegações onde conclui : “A) Recorrem os Apelantes por questões de direito e não por questões relativas à valoração da prova produzida, pelo que, não tendo sido impugnada a decisão sobre a matéria de facto (mormente através da transcrição de depoimentos de testemunhas que ponham em xeque a decisão do Tribunal a quo), a questão que tem de ser abordada é a do acerto da decisão quanto à não produção da prova indicada pelos Apelantes e ao relevo das declarações do Apelante na formação da convicção do Tribunal. B) Dispõe o artº 14º nº 2 do Regulamento das Custas Processuais que: a segunda prestação da taxa de justiça deve ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação para a audiência final, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou comprovar a realização desse pagamento no mesmo prazo. C) Os Apelantes confessam: nunca haverem procedido ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, terem sido notificados para a audiência de julgamento e para os sucessivos adiamentos da mesma, também sem terem aproveitado qualquer desses momentos para procederem ao pagamento em falta ou para terem, pelo menos, tentado obter apoio judiciário, bem como terem sido notificados pela Secretaria para procederem ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da respetiva multa, e de, ainda assim, não terem procedido ao pagamento respectivo. D) Em face do exposto, bem andou o Tribunal a quo ao não admitir a produção da prova testemunhal requerida pelos Apelantes, conforme dispõe o artº 14º nºs 3 e 4 do Regulamento das Custas Processuais. E) A Secretaria deveria ter procedido à notificação dos Apelantes em tempo útil para que estes cumprissem com a sua obrigação legal de pagarem a segunda prestação da taxa de justiça e, como não o fez, o Tribunal a quo não poderia ter prejudicado os agora Apelantes por não se ter dado disso conta aquando do início da audiência de julgamento, pois por um erro ou omissão da Secretaria não pode prejudicar as partes, como aliás reconhecem os Apelantes (artº 157º nº 6 do C.P.C.). F) Ora, sendo um acto cuja prática é imposta por lei, e uma vez que a audiência de julgamento prolongou-se no tempo, com sucessivos reagendamentos até à sua conclusão, surgiu outra oportunidade para a Secretaria praticar o acto devido e fê-lo, tal como os Apelantes expressamente o reconhecem. G) A obrigação de pagamento da segunda prestação não depende de notificação expressa da Secretaria para existir, decorrendo antes do disposto no artº 14º nº 2 do Regulamento das Custas Processuais, norma que os Apelantes não podem alegar desconhecer, assim como não se podem prevalecer do seu não cumprimento dessa obrigação (artº 6º do Código Civil), o que consubstancia um abuso de direito e um uso abusivo do processo, tentando invalidar as declarações já prestadas através do não cumprimento de uma obrigação própria. H) Não havendo impedimento à prestação das declarações de parte, requeridas pelos próprios Apelantes no intuito de exporem as suas razões que justificariam a improcedência da ação, não faz sentido, agora virem os Apelantes dizer que afinal as declarações prestadas – porque os prejudicam uma vez que traduziram a realidade dos factos – não devem ser consideradas. I) Para se desconsiderar as declarações de parte a prestação das mesmas teria de estar ferida de nulidade, o que não se verifica pois, nos termos do disposto no artº 195º nº 1 do C.P.C., estamos perante uma situação de mera irregularidade, uma vez que não só a lei não comina a nulidade para a produção de prova – não proibida, concretamente no que tange a meios de prova ilícitos – no caso vertente. J) A lei dispõe que será nulo o ato quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa, mais uma vez a irregularidade resultante da omissão de notificação pela Secretaria não influenciou o acto em si, nem a liberdade com que o mesmo foi praticado, aliás a prestação de declarações de parte é um acto processual legítimo, tendo sido praticado em juízo pelo Apelante marido, a seu pedido, com plena liberdade quanto ao que entendeu dizer e quanto ao que preferiu omitir. K) Acresce que as declarações de parte são legalmente requeridas por quem as quer prestar, não sendo, todavia, obrigado a fazê-lo, pelo que o permitir que tal acto seja praticado não é processualmente uma situação que prejudique parte e que, como tal, seja a admissão da realização de um acto que, per se, violando a lei, influa na decisão da causa, pois uma coisa é o acto processual e outra o seu conteúdo. L) A sentença recorrida não se baseou unicamente nas declarações de parte do Apelante marido, tendo sido amplamente escorada na abundante prova documental junta aos autos, no teor da contestação e na prova testemunhal produzida pela Apelada, pelo que as declarações de parte não fizeram senão corroborar a restante prova junta aos autos. M) Por último, ainda que se tratasse de uma nulidade processual a mesma não foi invocada em tempo, pelo que se teria, sempre, por sanada (artº 199º nº 1 a contrario do C.P.C.). N) Tratando-se de uma irregularidade, não surte os efeitos pretendidos pelos Apelantes, pelo que, também por essa razão improcede o presente recurso. O) Por último, a suposta violação do artº 613º não se verificou pelas razões supra expostas, já quanto à pretensa violação do disposto no artº 20º do C.I.R.E. não se alcança onde terá o tribunal mal interpretado ou mal aplicado esse preceito, desde logo porque não se pode confundir questões de facto com questões de direito e sobre as questões de facto não incide o presente recurso, sendo que o tribunal a quo aplicou correctamente o direito aos factos julgados provados. Termos em que, por não provado, deve o presente recurso ser julgado improcedente e mantida a douta sentença recorrida, assim se fazendo Justiça”. * * * II – Fundamentação a) A matéria de facto considerada como provada em 1ª instância é a seguinte : 1- A requerente é uma instituição de crédito que se dedica à actividade bancária, tendo, no âmbito da mesma, financiado os requeridos na aquisição de um prédio urbano para sua residência, financiamento, esse, concretizado na escritura pública de compra e venda e mútuo com hipoteca, outorgada a 21/8/2002 no Cartório Notarial da …, constante de fls. 81 a 83 do Livro de notas para escrituras diversas nº G-17, no âmbito da qual os requeridos constituíram, a favor daquela, uma hipoteca sobre o prédio urbano composto de casa de moradia, sito na Rua Dr. …, freguesia e concelho da …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo …, descrito na Conservatória do Registo Predial da … na ficha nº … da referida freguesia. 2- Essa hipoteca destinou-se a garantir um financiamento entretanto concedido pela ora requerente aos requeridos no valor de 125.000 €, bem como os respectivos juros à taxa anual efectiva de 5,37%, acrescida de uma sobretaxa de 4% a título de cláusula penal em caso de mora. 3- O prazo para o reembolso do referido empréstimo era de 25 anos, a pagar em trezentas prestações mensais sucessivas, vencendo-se a primeira a 21/9/2002. 4- Sucede que os requeridos deixaram de cumprir com o pagamento das prestações a partir, inclusive, do dia 21/4/2013, não mais tendo pago montante algum desde essa data até 7/9/2022 (data da entrada da presente acção), pelo que se encontra em dívida a quantia de 86.722,69 € a título de capital e a de 24.738,90 € a título de juros, tudo no montante global de 111.461,59 €. 5- Os requeridos foram demandados pela requerente em sede de processo executivo, Processo nº 1 …– instaurado na Instância Central 2ª Secção Cível e Criminal de … – Juiz 2, em 9/10/2014, sendo, nessa data, a quantia exequenda, capital e juros, de 98.655,54 €. 6- Sucede que esse bem encontrava-se, à data da execução, já penhorado à ordem de outro processo com o nº 2…-A que corria os seus termos pela Instância Local, de … Secção Cível – J2, em que era exequente S…& B… que demandava os requeridos para o pagamento da quantia de 43.620,72 €. 7- À data da reclamação de créditos efectuada pela requerente em 1/6/2015, a dívida dos requeridos ascendia já a 103.887,29 €, sendo desse valor o montante de 17.164,60 € correspondente a juros vencidos e vincendos até essa data. 8- Entretanto veio também o Instituto de Gestão de Regimes de Segurança Social, P.C. nº …, reclamar também os seus créditos sobre os requeridos, créditos, esses, no valor de 2.252,63€. 9- De igual modo, o “Banco C… S.A.”, então “Banco B…, S.A.”, reclamou também os seus créditos no valor de 83.394,13 €. 10- Para além do mútuo supra referido, a requerente, no âmbito da sua actividade bancária, celebrou a 30/6/2013, um contrato de financiamento com a empresa “Auto Reparações …, Ldª”, como mutuária, na qual o sócio gerente desta e a mulher do mesmo, AA… e BB…, ora requeridos, intervieram como garantes, para a concessão de um empréstimo que se revestiu da forma de Descoberto Eventual na Conta de Depósitos à Ordem nº …026 até ao montante de 30.000 €, contrato esse celebrado pelo prazo de 365 dias sucessivamente renovado por idêntico período a mesmo que fosse denunciado por alguma das partes. 11- Sobre esse empréstimo foram convencionados juros à taxa anual que resultava da média aritmética simples das cotações diárias do mês anterior ao período de contagem de juros da taxa Euribor para operações activas a um mês com arredondamento à milésima, acrescida de um “spread” de 7% que nessa data era de 7,112% ao ano, o que TAE (taxa anual efectiva) de 7,348% ao ano calculada nos termos do artº 4º do Decreto-Lei nº 220/94 de 23/8, sendo que sobre essa taxa acresceria uma sobretaxa de 4% ao ano em caso de mora. 12- Para garantia desse empréstimo, a mutuária, “Auto Reparações, Ldª”, entregou à requerente uma livrança em branco, avalizada pelo seu sócio-gerente e mulher (os requeridos), destinada ao preenchimento pela requerente em caso de violação de qualquer cláusula do contrato que implicasse o vencimento da dívida. 13- Esse financiamento foi igualmente garantido por uma hipoteca já constituída pelos garantes da sociedade mutuária, ora requeridos, a favor da requerente criada por escritura pública de Hipoteca e Mandato, realizada a 5/3/2008, no Cartório Notarial de …, sobre o prédio urbano composto de edifício destinado a armazém de comércio e quintal, sito nos …, freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº …, inscrito a favor daqueles pela inscrição G Ap. 4 de 2003/09/15, hipoteca, essa, prontamente registada a favor da requerente. 14- Essa hipoteca foi constituída para garantir, desde logo, o pagamento de todas e quaisquer letras ou livranças pela requerida, já descontadas ou a descontar ou ainda das que por efeito de reforma vierem a subsistir, bem como descobertos em Depósitos à Ordem e/ou contas com limite de crédito, até ao limite de 180.000 €, nas quais os primeiros outorgantes, o sócio gerente da requerida e a sua mulher, fossem intervenientes, individual ou coletivamente, quer como aceitantes, subscritores, sacadores, endossantes, avalistas ou pelas quais de qualquer forma sejam responsáveis, assim como dos juros das referidas dívidas à taxa anual efectiva (TAE) de 6,71%, acrescida, se disso for caso, dos juros à taxa de 4% a título de cláusula penal, sendo o montante máximo garantido por essa hipoteca de 255.834 €. 15- Sucede que a sociedade mutuária e os seus garantes deixaram de cumprir com o pagamento do empréstimo tendo sido preenchida a livrança com a data de vencimento de 24/4/2014 e ficado por pagar, pelo que foi a requerida e os seus garantes demandada judicialmente, em sede executiva, através do Processo nº 9… que corre os seus termos pelo Juízo Local de Competência Genérica de …, para pagar a quantia em dívida nessa data no valor de 31.391,64 € a título de capital e de 2.192,23 €, perfazendo o montante global com que foi iniciada essa execução de 33.583,87 €, sem prejuízo dos juros vincendos peticionados sobre o referido capital à taxa contratualizada de 10,71%, sendo que, à data de 7/9/2022, encontrava-se ainda em dívida a quantia de 31.391,64 € a título de capital, 10.786,56 € a título de juros, tudo no montante global de 42.178,20 €. 16- Por força do outro processo executivo instaurado contra os requeridos, Processo nº 9… já referido, o Processo executivo nº 95… que corre os seus termos pelo actual Juízo de Competência Genérica de … foi sustado, tendo a requerente tido que reclamar os seus créditos, na altura no valor de 37.664,38 € (capital de 31.391,64 € e juros 6.272,74 €) naquele outro processo. 17- Foi proferida Sentença de graduação de créditos no âmbito do Processo executivo nº 95… tendo os dois suprarreferidos créditos da requerente, por força das hipotecas registadas, sido graduados em primeiro lugar. 18- No âmbito do Processo 95… foram penhorados os seguintes prédios dos requeridos : a) Prédio rústico com o artigo …8 da freguesia de …, concelho de …. b) Prédio urbano com o artigo …9 da freguesia e concelho da …. c) Prédio urbano com o artigo …2 da freguesia de …, concelho de …. d) Prédio urbano com o artigo …1 da freguesia e concelho da …. 19- Para além dos dois empréstimos supra referidos, em Março de 2008 os requeridos, juntamente com a sociedade “Auto Reparações …, Ldª”, celebraram um contrato de financiamento com a requerente, aquela como mutuária e estes como garantes, sendo a requerente a mutuante, mediante o qual a requerente concedeu um financiamento à mutuária no valor de 180.000 € a creditar na conta D/O nº …026 designada por conta vinculada, contrato, esse, celebrado pelo período de 180 meses. 20- A taxa de juros aplicada ao contrato corresponde à Euribor a 6 meses acrescida de um “spread” de 2 pontos percentuais, arredondada para ¼ de ponto percentual imediatamente superior, ou seja 6,5150% para o 1º período, susceptível de alteração no início de cada período de contagem em função da evolução das taxas de juro do mercado para operações deste tipo. À taxa fixada corresponde uma taxa anual efetiva (TAE) de 6,7150% nos termos do Decreto-Lei nº 220/94 de 23/8. 21- O reembolso desse financiamento seria feito em 180 prestações mensais constantes e sucessivas, sendo que em caso de mora a requerente poderia somar à taxa de juro contratual a máxima sobretaxa legalmente prevista, bem como à sua capitalização. 22- Para garantia desse financiamento a mutuária entregou à requerente uma livrança por si subscrita em branco e avalizada pelos garantes, ora requeridos, a qual se destinou a que a requerente a preenchesse em caso de incumprimento que gerasse o vencimento da dívida, sendo que a hipoteca constituída pelos requeridos a favor da requerente a 5/3/2008 garantia, nos seus precisos termos, este financiamento concedido pela requerente. 23- Sucede que esse contrato de financiamento também não foi objecto de cumprimento por parte da mutuária nem dos seus garantes que entraram em incumprimento em 5/4/2014, estando, em dívida, à data de 7/9/2022, a quantia de 119.896,65 € a título de capital e 39.093,50 € a título de juros, tudo no montante global de 158.990,15 €. 24- Os requeridos encontram-se em incumprimento da generalidade das suas obrigações já há mais de dez anos, não tendo logrado, até hoje, regularizar qualquer pagamento, nem manifestaram qualquer vontade, aliás, nesse sentido. 25- Os requeridos são incapazes de realizar quaisquer pagamentos e estão sem acesso a qualquer crédito. 26- Em Setembro de 2022, no âmbito do Processo executivo 95…, foi adjudicado o artigo matricial 1551 e descrito na Conservatória do Registo Predial da …, na ficha 721/19911023, pelo valor de 170.711,90 €, tendo a requerente recebido a quantia de 59.593,41 €. 27- Os requeridos são proprietários : a. Do prédio urbano sito na Rua da …, inscrito na Conservatória do Registo Predial de … sob a ficha … da freguesia de … e na matriz predial urbana da mesma freguesia sob o número …2, com o valor patrimonial de 54.261,90 €. b. Do prédio urbano sito na Rua …, inscrito na Conservatória do Registo Predial da … sob a ficha …, da freguesia da …, e na matriz predial urbana sob o artigo …4, com o valor patrimonial total de 100.932,37 €, com 4 divisões susceptíveis de utilização independente, com a área total de terreno de 905,000 m2, implantação do edifico de 250,000 m2, área bruta privativa total de 391,270 m2. c. Os requeridos são ainda proprietários de prédio urbano sito no …, freguesia da …, inscrito na matriz predial urbana no artigo matricial …9, com o valor patrimonial de 77.789,73 €. 28- Sobre o prédio 112 incide uma penhora a favor de “S… & F…” para garantia da quantia exequenda 47.982,79 €. 29. Sobre o prédio 2684 incide : i. uma hipoteca voluntária a favor da “C...” para garantia de um empréstimo, no montante máximo de 172,637,50 €. ii. uma penhora a favor da “S… & B…, Ldª” para garantia da quantia exequenda no valor de 43.620,72 €; uma penhora a favor da “C...” para garantia da quantia exequenda no valor de 98.655,54 €. iii. uma penhora a favor do Instituto da Segurança Social de…, IPRA – Núcleo Processo Executivo, para garantia da quantia exequenda no valor de 139.730,02 €. 30- Sobre o prédio 1119 incide uma hipoteca voluntária a favor do “Banco C…, S.A.” para garantia de um empréstimo com o montante máximo assegurado de 19.530.000$00. 31- Os requeridos são casados entre si. b) Como resulta do disposto nos artºs. 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito. “In casu” estamos perante um recurso referente a um despacho intercalar, e outro incidente sobre a Sentença, interpostos pelos requeridos c) Recurso do despacho intercalar. Perante as conclusões das alegações dos recorrentes a única questão em recurso consiste em determinar se devia ser autorizada a produção de prova pelos apelantes, em sede de audiência de discussão e julgamento. d) Recurso da Sentença. Perante as conclusões das alegações dos apelantes a questão sob recurso consiste em saber se é possível concluir, como fez o Tribunal de 1ª instância, que os recorrentes se encontram em situação de insolvência. e) Quanto ao recurso do despacho intercalar : Dispõe o artº 1º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais que “todos os processos estão sujeitos a custas, nos termos fixados pelo presente Regulamento”. As custas, em sentido amplo, assumem, “grosso modo”, a natureza de taxa paga pelo utilizador do aparelho judiciário, reduzindo os custos do seu funcionamento no âmbito do Orçamento Geral do Estado (cfr. José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. 2º, 3ª ed., pg. 418). Nos termos previstos nos artºs. 3º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais e 529º nº 1 do Código de Processo Civil, as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte. Os encargos do processo são “todas as despesas resultantes da condução do mesmo, requeridas pelas partes ou ordenadas pelo juiz da causa” (cf. artº 529º nº 3 do Código de Processo Civil). “As custas de parte compreendem o que cada parte haja despendido com o processo e tenha direito a ser compensada em virtude da condenação da parte contrária, nos termos do Regulamento das Custas Processuais” (cf. artº 529º nº 4 do Código de Processo Civil). Por fim, a taxa de justiça corresponde ao “montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais” (cf. artº 529º nº 2 do Código de Processo Civil). Remete este último preceito para o Regulamento das Custas Processuais, no qual a da taxa de justiça se fixará nos termos dos artºs. 5º a 7º, 11º, 13º a 15º e das Tabelas I e II anexas. De acordo com o artº 6º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais, “a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A”, que faz parte integrante do Regulamento das Custas Processuais. O elemento que implica o pagamento da taxa de justiça é, pois, o impulso processual do interessado que corresponde à prática do acto de processo que dá origem a “núcleos relevantes de dinâmicas processuais” como a acção, a execução, o incidente, o procedimento cautelar e o recurso (cfr. Salvador da Costa, in “As Custas Processuais – Análise e Comentário, 7ª ed., Almedina, pg. 15). A taxa de justiça é paga nos termos fixados no Código de Processo Civil (cf. artº 13º nº 1 do Regulamento das Custas Processuais), sendo a oportunidade do seu pagamento regulada no artº 14º do Regulamento das Custas Processuais, devendo ser paga no momento do respetivo impulso processual, em uma ou duas prestações, por meio de autoliquidação da parte, para o que esta deverá socorrer-se das tabelas anexas ao diploma e, no caso de processo cuja taxa seja variável, liquidará a taxa pelo seu valor mínimo, pagando o excedente, se o houver, a final (cf. artº 6º nº 6 do Regulamento das Custas Processuais). Ora, o aludido artº 14º do Regulamento das Custas Processuais dispõe o seguinte : “1 – O pagamento da primeira ou única prestação da taxa de justiça faz-se até ao momento da prática do acto processual a ela sujeito, devendo: a) Nas entregas eletrónicas, ser comprovado por verificação eletrónica, nos termos da portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º do Código de Processo Civil; b) Nas entregas em suporte de papel, o interessado proceder à entrega do documento comprovativo do pagamento. 2 – A segunda prestação da taxa de justiça deve ser paga no prazo de 10 dias a contar da notificação para a audiência final, devendo o interessado entregar o documento comprovativo do pagamento ou comprovar a realização desse pagamento no mesmo prazo. 3 – Se, no momento definido no número anterior, o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça ou da concessão do benefício de apoio judiciário não tiver sido junto ao processo, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, a secretaria notifica o interessado para, no prazo de 10 dias, efectuar o pagamento, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC. 4 – Sem prejuízo do prazo adicional concedido no número anterior, se no dia da audiência final ou da realização de qualquer outra diligência probatória não tiver sido junto ao processo o documento comprovativo do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça e da multa ou da concessão de benefício do apoio judiciário, ou não tiver sido comprovada a realização do pagamento da segunda prestação da taxa de justiça, o tribunal determina a impossibilidade de realização das diligências de prova que tenham sido ou venham a ser requeridas pela parte em falta. 5 – Nos casos em que não haja lugar a audiência final, não sendo dispensada a segunda prestação nos termos do artigo seguinte, esta é incluída na conta de custas final. 6 – Quando se trate de causa que não importe a constituição de mandatário e o acto seja praticado directamente pela parte, só é devido o pagamento após notificação de onde conste o prazo de 10 dias para efectuar o pagamento e as cominações a que a parte fica sujeita caso não o efectue. 7 – O documento comprovativo do pagamento perde validade 90 dias após a respectiva emissão, se não tiver sido, entretanto, apresentado em juízo ou utilizado para comprovar esse pagamento, caso em que o interessado solicita ao Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I. P., no prazo referido no número seguinte, a emissão de novo comprovativo quando pretenda ainda apresentá-lo. 8 – Se o interessado não pretender apresentar o documento comprovativo em juízo, requer ao Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I. P., no prazo de seis meses após a emissão, a sua devolução, mediante entrega do original ou documento de igual valor, sob pena de reversão para o referido Instituto. 9 – Nas situações em que deva ser pago o remanescente nos termos do nº 7 do artigo 6º, o responsável pelo impulso processual que não seja condenado a final fica dispensado do referido pagamento, o qual é imputado à parte vencida e considerado na conta a final”. * f) “In casu”, os apelantes reconhecem que não procederam ao pagamento da taxa de justiça subsequente no prazo de dez dias previsto no artº 14º nº 2 do Regulamento das Custas Processuais e que, posteriormente, foram notificados pela Secretaria para procederem a esse pagamento. Porém, referem que a notificação apenas ocorreu já depois do início da audiência de julgamento e que apenas foram notificados entre as primeira e segunda sessões de julgamento, isto já depois de terem iniciado a sua produção de prova, com as declarações de parte do recorrente. Não se vê que assista razão aos apelantes. É manifesto ter havido um lapso do Tribunal e isso mesmo é reconhecido no “Termo” lavrado em 27/1/2023, no período entre a primeira e a segunda sessão de julgamento, onde o Sr. Funcionário judicial diz expressamente que “os requeridos não procederam ao pagamento da 2ª prestação da taxa de justiça devida, pelo que, neste momento, irei dar cumprimento ao disposto no artº 14º, nº 3 do Regulamento das Custas Processuais”. E o certo é que, notificados os recorrentes nessa mesma data, os mesmos mantiveram, a sua atitude passiva, a qual se manteve até ao início da segunda sessão de julgamento (que decorreu cerca de seis meses depois de tal notificação). Consequentemente, o Tribunal, considerando o preceituado no já citado artº 14º nºs. 3 e 4 do Regulamento das Custas Processuais, determinou “a impossibilidade da produção de prova pelos requeridos”, limitando-se, pois, a aplicar a sanção legal para o comportamento dos recorrentes. Para tentarem justificar essa atitude de falta de pagamento da segunda prestação da taxa de justiça devida, vêm os recorrentes dizer que a notificação do dia 27/1/2023 (para procederem, no prazo de 10 dias, ao pagamento, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC nem superior a 10 UC, da segunda prestação da taxa de justiça devida) deve ser considerada legalmente inadmissível. Antes pelo contrário, dizemos nós. Essa notificação não só era legal, como foi efectuada para corrigir o lapso de ainda não ter sido realizada. Estranho seria o Tribunal considera legalmente inadmissível um acto… legal. Assim, sendo a mesma decisão devidamente suportada nos citados preceitos legais, não podiam os recorrentes continuar a produzir prova na segunda sessão de julgamento. Nem se diga, como fazem os recorrentes, que ao admitir a produção de prova num primeiro momento (na primeira sessão) ficou esgotado o poder jurisdicional do Juiz, nos termos do artº 613º nº 1 do Código de Processo Civil. Na realidade, o Tribunal, na primeira sessão, laborou numa inexactidão devida a um lapso manifesto da secretaria (que não notificou os apelantes nos termos supra referidos), e esse circunstancialismo, nos termos dos artºs. 613º nºs. 2 e 3 e 614º do Código de Processo Civil, constitui uma excepção à regra do esgotamento do poder jurisdicional do Juiz, consagrada no artº 613º nº 1 do Código de Processo Civil. Por fim, quanto a este ponto, referem os apelantes que a prova anteriormente produzida ao despacho recorrido, através das declarações de parte do apelante, não poderia ser valorada, como foi, aquando da prolação da Sentença. Ora, por um lado há que salientar que, no processo de insolvência, nos termos dos artºs. 11º e 17º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.), 6º e 411º do Código de Processo Civil, regem os princípios dos poderes de gestão e do inquisitório, pelo que sempre podia o Tribunal tomar declarações às partes. Por outro lado, há que atender ao princípio da aquisição processual (cf. artº 413º do Código de Processo Civil), segundo o qual o Tribunal, no julgamento da matéria de facto, deve ter em consideração todas as provas produzidas no processo, ou seja, uma vez produzida uma prova (como foi “in casu” a prova por declarações de parte) ela passa a pertencer ao processo e torna-se irrelevante quem a forneceu. Deste modo, bem andou o Tribunal “a quo” ao proferir o despacho de 1/6/2023 (no início da segunda sessão da audiência de discussão e julgamento) e ao “aproveitar” a prova por declarações de parte produzida na primeira sessão de julgamento. * g) Resulta do exposto que o recurso, nesta parte, incidente sobre o despacho proferido em 1/6/2023, terá de improceder. * h) Quanto ao recurso da Sentença : Vejamos, então, se é possível concluir, como fez o Tribunal de 1ª instância, que os recorrentes se encontram em situação de insolvência. Ora, dispõe o artº 1º do C.I.R.E. que “o processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a liquidação do património de um devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores, ou a satisfação destes pela forma prevista num plano de insolvência, que nomeadamente se baseie na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente”. O legislador concebeu a situação de insolvência como a impossibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações vencidas (cf. artº 3º nº 1 do C.I.R.E.), equiparando-se à situação de insolvência actual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação do devedor à insolvência (artº 3º nº 4 do C.I.R.E.). A impossibilidade de cumprimento caracterizadora da insolvência não tem, necessariamente, de abranger todas as obrigações assumidas pelo devedor e já vencidas, bastando a incapacidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciem a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. Um reduzido número ou mesmo uma única obrigação incumprida poderão, por si só, indiciar a penúria do devedor, característica da sua insolvência, tal como, inversamente, a não satisfação de um número quantitativamente significativo pode não ser suficiente para caracterizar tal estado (neste sentido ver Carvalho Fernandes e João Labareda, in “C.I.R.E. Anotado”, pgs. 70 e 71). Tudo dependerá, pois, do peso relativo das obrigações incumpridas e da sua repercussão na actividade do devedor. O estado de insolvência revela-se a partir dos factos que estão descritos nas diversas alíneas do nº 1 do artº 20º do C.I.R.E., usualmente designados por “factos-índices”, que se transcrevem : -Suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas ; -Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações ; -Fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor ou abandono do local em que a empresa tem a sede ou exerce a sua principal actividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo ; -Dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constituição fictícia de créditos ; -Insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente verificada em processo executivo movido contra o devedor ; -Incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos, nas condições previstas na alínea a) do nº 1 e no nº 2 do artº 218º ; -Incumprimento generalizado, nos últimos seis meses, de dívidas de algum dos seguintes tipos : I) Tributárias ; II) De contribuições e quotizações para a segurança social ; III) Dívidas emergentes de contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato ; IV) Rendas de qualquer tipo de locação, incluindo financeira, prestações do preço da compra ou de empréstimo garantido pela respectiva hipoteca, relativamente a local em que o devedor realize a sua actividade ou tenha a sua sede ou residência ; -Sendo o devedor uma das entidades referidas no nº 2 do artº 3º, manifesta superioridade do passivo sobre o activo segundo o último balanço aprovado, ou atraso superior a nove meses na aprovação e depósito das contas, se a tanto estiver legalmente obrigado. Quando o pedido de declaração de insolvência não seja apresentado pelo devedor, deve o requerente justificar, na petição inicial, a origem, natureza e montante do seu crédito, ou a sua responsabilidade pelos créditos sobre a insolvência, consoante o caso, e oferecer com ela os elementos que possua relativamente ao activo e passivo do devedor (artº 25º nº 1 do C.I.R.E.), devendo tal peça processual conter, além da exposição dos factos que integram os pressupostos da declaração requerida, o pedido de insolvência, a identificação dos administradores do devedor e os seus cinco maiores credores, com exclusão do próprio requerente, no caso do devedor ser casado, a identificação do cônjuge e regime de bens do casamento e ser instruída com certidão do registo público a que o devedor esteja, eventualmente, sujeito (artº 23º nºs. 1 e 2 als. b), c) e d) do C.I.R.E.). No caso de não lhe ser possível fazer as indicações e junções acima referidas, deve solicitar que as mesmas sejam prestadas pelo próprio devedor (artº 23º nº 3 do C.I.R.E.). Deve ainda o requerente oferecer todos os meios de prova de que disponha. Como se afirma no Acórdão da Relação do Porto de 16/12/2009 (Relator Abílio Costa, consultado na “internet” em www.dgsi.pt), “parece, assim, estarmos perante uma acção executiva, uma vez que visa a reparação efectiva de direitos de crédito, mas com características especiais, já que se trata de uma execução colectiva, genérica ou total, e que segue um processo especial que, além do mais, contém elementos declarativos – cf. Menezes Leitão in “Direito da Insolvência”, 18)”. Finalmente, é de salientar que, apresentado o requerimento de pedido de declaração de insolvência pelo credor (e se não houver motivo para indeferimento liminar) o devedor é citado para, no prazo de dez dias, deduzir oposição com a cominação de que se não o fizer consideram-se confessados os factos alegados na petição inicial (cf. artº 30º nº 5 do C.I.R.E.). De acordo com aquele último preceito, os factos alegados pelos requerentes apenas se têm por confessados, embora isso não envolva necessariamente a prolação de Sentença condenatória. O Juiz deve, então, verificar se os factos confessados são de molde a consubstanciar alguma das hipóteses configuradas nas alíneas do artº 20º nº 1 do C.I.R.E. e, só nesse caso, é que declarará a insolvência. * i) No que ao caso em apreço diz respeito, está em causa, essencialmente, o preceituado no artº 20º nº 1, al. b) do C.I.R.E. (“A declaração de insolvência de um devedor pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados, verificando-se algum dos seguintes factos : (…) b) Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações”. Ora, em face da matéria apurada, concordamos plenamente com o raciocínio expendido pelo Tribunal “a quo”, pois, face ao montante elevado da dívida dos apelantes para com a recorrida (253.036,53 € em 3/6/2023), a que acrescem as dívidas tituladas pelos demais credores (por exemplo, “S… & B…, Ldª”, “H… Stc, S.A.” e Instituto de Gestão de Regimes de Segurança Social), e atento, do lado do Activo, o património dos apelantes, praticamente todo ele onerado com penhoras no âmbito de vários processos de execução, há que concluir que os recorrentes se encontram numa situação financeira que não lhes permite cumprir as suas obrigações, sendo o seu Passivo muito superior ao Activo. Além disso, não são conhecidos outros rendimentos aos recorrentes. E tendo em atenção os factos apurados, entendemos estarem preenchidos os requisitos necessários ao preenchimento da previsão da al. b) do nº 1 do artº 20º do C.I.R.E., o que implica a declaração de insolvência dos recorrentes. Com efeito, verifica-se uma suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas e a falta de cumprimento dessas obrigações, pelo seu montante e pelas circunstâncias do incumprimento, revelam a impossibilidade de os apelantes satisfazerem pontualmente a generalidade das suas obrigações. Acresce que os recorrentes não produziram qualquer prova que infirme a presunção resultante do preenchimento da previsão do artº 20º nº 1, al. b) do C.I.R.E., sendo certo que cabia a eles o ónus de alegar e provar que, apesar do preenchimento de tais índices, o mesmo não decorria de uma impossibilidade actual e definitiva de solver as suas obrigações, decorrendo, por exemplo, quaisquer outras circunstâncias, nomeadamente um impedimento temporário, circunstancial e de solubilidade expectável. Como dissemos, não foi esse o caso. Aliás, a posição dos recorrentes neste ponto alicerça-se numa eventual invalidade da prova que permitiu ao Tribunal considerar como Provados os Factos 24. e 25. (“24- Os requeridos encontram-se em incumprimento da generalidade das suas obrigações já há mais de dez anos, não tendo logrado, até hoje, regularizar qualquer pagamento, nem manifestaram qualquer vontade, aliás, nesse sentido” ; “25- Os requeridos são incapazes de realizar quaisquer pagamentos e estão sem acesso a qualquer crédito”) invalidade essa que, como já supra referimos, não ocorre, sendo de considerar tais factos como plenamente provados. Em suma, existe um incumprimento dos recorrentes, está demonstrado que os mesmos não patenteiam condições de solvabilidade, razão pela qual estão preenchidos todos os pressupostos necessários ao decretamento da insolvência daqueles. * j) Assim sendo, e estando plenamente demonstrado o pressuposto objectivo essencial consagrado no artº 3º nº 1 do C.I.R.E. (“É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas”), por força da verificação do facto-índice previsto no artº 20º nº 1, al. b) do C.I.R.E., não ilidido, é de confirmar o decidido na Sentença recorrida quanto à verificação do estado de insolvência doa apelantes. * * * III – Decisão Pelo exposto acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa em : 1º- Julgar improcedente o recurso incidente sobre o despacho proferido em 1/6/2023, que determinou a impossibilidade de produção de prova pelos recorrentes em sede de audiência de discussão e julgamento. 2º- Julgar improcedente o recurso incidente sobre a Sentença. Custas : Pelos recorrentes (artº 527º do Código do Processo Civil). Processado em computador e revisto pelo relator Lisboa, 15 de Outubro de 2024 Pedro Brighton Renata Linhares de Castro Amélia Sofia Rebelo |