Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
14842/20.7T8LSB.L1-6
Relator: ANA DE AZEREDO COELHO
Descritores: CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO
PRAZO DE PAGAMENTO
ALTERAÇÃO UNILATERAL
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/23/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário: I) No desenvolvimento do programa contratual estabelecido em mútuo bancário, a liquidação pelo Banco das prestações de acordo com o contrato surge como um dever acessório cuja violação determina responsabilidade contratual.
II) A culpa do Banco ao liquidar sem fundamento a prestação com base num prazo diverso do contratado constitui-o em incumprimento contratual e em responsabilidade pelos danos causados à contraparte, obrigando-o a reconstituir a situação que se verificaria sem o incumprimento: restituição do montante pago a mais.
III) Estando provado que a alteração do prazo do contrato de 25 para 30 anos e as diligências junto do Réu causaram transtornos aos Autores com deslocações, contactos, chamadas e e-mails, frustrados, noites mal dormidas e frustração, ansiedade e stress pelo facto de não conseguirem obter respostas e uma resolução definitiva do problema por parte do banco, deve o Banco ser condenado em indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 3.000,00.
(Pelo Relator)
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I) RELATÓRIO
M.. e J…, ambos com os sinais dos autos, instauraram a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra BANCO SANTANDER TOTTA, S.A., também com os sinais dos autos, pedindo que seja:
- declarada a nulidade do “aditamento” efetuado ao contrato de mútuo em crise na presente ação pela entidade mutuante, a qual estabeleceu unilateralmente e sem forma legal escrita um prazo de devolução do montante mutuado em 30 anos em oposição aos 25 anos que haviam sido contratados, colocando os aa. na mesma posição jurídica e com os mesmos encargos que tinham perante o contrato, efetivamente, celebrado entre as partes;
- a entidade bancária mutuante condenada na obrigação de devolver aos aa. a quantia respeitante a encargos que hajam sido pagos a mais em virtude da alteração unilateral e sem forma legal do prazo de duração do contrato de 25 para 30 anos que se estima ser no valor de 9.000,00 €;
- a entidade bancária mutuante condenada na devolução aos aa. da quantia de que despenderam para efetuar o cancelamento das hipotecas que incidiam sobre o imóvel objeto da relação contratual, cuja validade ora se discute na presente ação, por constituir uma obrigação assumida pela mesma, no valor de 100,00 €;
- a r. condenada no pagamento de danos não patrimoniais no valor de 11.000,00 €.
Alegaram, em resumida síntese, ter celebrado com antecessor do Réu um contrato de mútuo a 25 anos, tendo o Réu alterado o prazo, unilateralmente, para o de 30 anos, com os consequentes danos para os Autores que de tal só se aperceberam tardiamente, alegando ainda que o Réu não procedeu ao cancelamento de hipotecas a que estava obrigado, suportando os Autores as respectivas despesas.
O Réu contestou alegando que o alargamento do prazo decorreu de pedido dos Autores, com vista à redução da prestação mensal a que estavam obrigados, embora a alteração não ficasse devidamente regularizada em escrito assinado por ambas as partes. Quanto ao distrate da hipoteca, alega que nos termos do contrato cabia aos Autores suportarem o respectivo valor.
Realizou-se audiência prévia em que foi fixado o valor, os factos assentes e os temas da prova.
Cumprido o demais legal, houve audiência de julgamento após a qual foi proferido despacho para pronúncia sobre abuso de direito, e, seguidamente, sentença que julgou improcedente a acção.
Os Autores interpuseram o presente recurso dessa sentença e, alegando, concluíram como segue as suas alegações:
1.º O presente recurso é interposto da Decisão proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo Local Cível da Comarca de Lisboa, Juiz 12 que decidiu ser totalmente improcedente a ação cível proposta pelos AA..
2.º Sobre tal Decisão incidem erros notórios na apreciação da prova e contradição insanável.
3.º Foram fixados os seguintes temas da prova a apurar em sede de audiência de discussão e julgamento:
(…)
4.º O Tribunal a quo, considerou não provado que os AA.. não quiseram e não pediram a alteração do prazo do contrato de 25 para 30 anos.
5.º Considerando assim que tal alteração havia sido devido à manifestação da sua vontade.
6.º O que não é verdade, porque os AA. não queriam essa alteração contratual e não deram autorização para a mesma ser efetuada.
7.º Apesar de a A. ter referido que a alteração foi sugerida em reunião com a R. em 2003 e que estava diretamente relacionada com uma outra proposta contratual, assim os AA. aceitavam a alteração se lhes fosse concedido um crédito suplementar para realizarem obras em sua casa.
8.º Assim, tendo sido indeferido o crédito suplementar sempre configuraram que a alteração do prazo também teria sido indeferida e jamais houve qualquer prestação de informação pela R. posteriormente.
9.º Ficou demonstrado e provado que a alteração do prazo do contrato resultou de uma ilegalidade, a qual foi confessada pela R.
10. º O Tribunal por um lado aceitou e valorou, o parecer do diretor comercial da R. que não está assinado pelos AA. e atribuiu ao mesmo um valor intrínseco que não podia ter dado por resultar de uma ilegalidade.
11.º Isto apesar do referido documento ter sido mencionado na sentença como padecendo do vicio de forma nos termos do artigo 221.º n.º 2 do CC.
12.º O que se revela ser uma contradição que coloca em crise a sentença de que ora se recorre, nos termos do artigo 662 n.º 2 c) do C.P.C..
13.º Sendo certo que a Testemunha da R., seu funcionário, referiu inclusive que uma alteração deste tipo a um contrato de mútuo, requer um aditamento assinado pelas partes, ainda que não careça de documento particular autenticado.
14.º O que revela erro notório na apreciação da prova e ademais, segundo as regras da análise critica de documentos e factos materiais aos mesmos subjacentes, a aceitação do referido documento como corporizando uma legalidade ou um ato que pudesse resultar da vontade dos AA.. teria sempre de ser fundamentado, o que não aconteceu.
15.º Nem poderia em justa medida ser atribuído ao mesmo a valoração que assim sucedeu.
16.º O Tribunal a quo deveria ter considerado sim, face à prova produzida, que os AA. não autorizaram a alteração do prazo de duração do contrato e igualmente que não queriam a alteração do prazo de duração do contrato.
17.º Ficou provado que a R. agiu à unilateralmente e à revelia dos mutuários, ora Recorrentes.
18.º O parecer/proposta do Banco, documento junto pela R. não contém sequer os elementos para ser considerado uma proposta contratual.
19.º O Tribunal considerou não ser verdade que os AA.. só se aperceberam em 2009 da alteração efetuada ao prazo de duração do contrato de 25 para 30 anos.
20.º Apesar de a A. nas suas declarações ter referido que só se apercebeu desse facto nessa data, após ter comunicado com o banco e estes terem assumido a ilegalidade formal do contrato, que já remontava a 2003, em carta enviada precisamente em 2009.
21.º Todavia, sem conceder ou prescindir, ainda que assim não fosse, a nulidade de um contrato, pode ser pedida a todo o tempo.
22.º Sendo que, da análise dos Doc. n.º 7 e 9 juntos à PI, teria sempre em análise critica, juntamente com as restantes provas que tudo indicava que esta era a primeira vez que o Banco assumia a referida alteração de 25 para 30 anos, até porque só em 2011 é que admitem de facto essa alteração e assumem como sendo sua responsabilidade o sucedido.
23.º Se tivesse sido efetuada pelo Tribunal a quo uma análise critica ou segundo as regras da experiência comum, sempre se concluiria que se o Banco já havia anos antes comunicado esta alteração, então não perderia esta oportunidade em 2009 para o referir à sua cliente.
24.º Descartando de imediato as suas responsabilidades, mas ao invés a R. vem, só em 2011, assumir a sua responsabilidade pelo lapso, o que só acontece agora pela insistência da A. com reclamações e recurso ao serviço de advogados para sua defesa.
25.º Não se aceita a referida análise critica efetuada pelo Tribunal em relação ao referido documento, parecer do Banco, junto pela R. por ser errónea e injusta.
26.º A A. demonstra que já antes de 2009 por diversas vezes contatou o Banco para pedir esclarecimentos, mas como se encontravam os AA. imigrados não lhes era possível deslocarem-se a Portugal sempre que necessitassem.
27.º Em conversa informal com duas suas vizinhas, aqui arroladas como suas testemunhas, a A. confessou que havia em 2003 pedido um crédito suplementar para realizar obras em sua casa e juntamente com esse pedido requeria a extensão do prazo do crédito habitação de 25 para 30 anos, uma vez que uma das suas vizinhas também o tinha feito.
28.º Os testemunhos das suas vizinhas foram consentâneos com o facto de a A. só em 2009 se ter apercebido da alteração do prazo de duração do contrato de 25 para 30 anos.
29.º Além de consentâneos os testemunhos foram espontâneos e credíveis ao contrário do que considerou o Tribunal a quo, bastando para tal depreensão a audição de todas as testemunhas, incluindo a que é funcionário da R..
30.º O Tribunal a quo deveria ter considerado, face à prova produzida que os AA. só se aperceberam da alteração do prazo de duração do contrato em 2009.
31.º Após se terem apercebido da alteração unilateral do contrato pela R., os AA. comunicaram diversas vezes, por si e através do recurso ao serviço de advogado, com a entidade bancária R. para pedirem a documentação referente ao contrato.
32.º Nesse contexto fáctico temporal, inclusive pediram à R. que repusesse os termos iniciais do contrato.
33.º Ao invés, a R. confessou ter procedido à alteração unilateral do contrato que celebrou com os AA. através da alteração unilateral do prazo de duração do mesmo.
34.º E, a própria R. comunicou aos AA. que ia repor os termos iniciais do contrato, caso os AA., não dissessem se aceitavam assinar um aditamento ao contrato no prazo de 8 dias desta comunicação, lembrando, apenas que tal reposição solicitada iria dar lugar a um acerto de contas no valor de 6.900,00 €.
35.º Todavia, uma vez mais, a R., não procedeu nos exatos termos em que disse que iria proceder, repondo os termos iniciais do contrato.
36.º Sendo o incumprimento do contrato uma fonte do Direito das obrigações, sempre incumbia à R. a responsabilidade pelos danos causados aos AA. com a referida alteração unilateral do contrato.
37.º Saliente-se que, para fazer face ao pagamento do valor dos acertos, os AA. pediram um pagamento em prestações do montante exigido pela R., mas quanto a tal pedido não obtiveram qualquer resposta.
38.º Pelo exposto se demonstra que a R. jamais quis colaborar na reposição dos termos iniciais do contrato que haviam colocado em crise com a alteração unilateral.
39.º O Tribunal a quo, face a esta falta de vontade demonstrada pela R. sempre deveria ter concluído que a R. não quis proceder à formalização do contrato em respeito à Lei e aos AA.
40.º A alteração unilateral do contrato, confessada pela R. criou desequilíbrio contratual insuportável para os AA., e, o mesmo se diga, para um qualquer cliente de uma entidade bancária que se encontrasse nas mesmas condições dos AA.
41.º É de senso comum que tal desequilíbrio e as tentativas incessantes e infrutíferas dos AA. para resolver o mesmo crie um crescendo de stress e ansiedade e seja suscetível de levar a um estado clínico de depressão.
42.º Não só é expetável que tal aconteça como se encontra demonstrado que sucedeu com a A., encontrando-se tal diagnóstico clínico diretamente relacionado com a situação em causa resultante do incumprimento contratual por parte da R..
43.º A alteração unilateral do contrato por parte da R. foi causa direta e necessária sem a qual não se teriam produzido os danos alegados pelos AA., como foram o crescendo de stress e ansiedade, aqui fatores causadores do estado de depressão em que a A. se viu mergulhada durante diversos anos, sendo para a A. “massacrante”, como a própria referiu nas suas Declarações.
44.º Os danos não patrimoniais são demonstráveis pelas D.P. da Autora e pelas inquirições às testemunhas por si arroladas e pelo relatório médico junto pela A. junto como Doc. n.º 21.
45.º Os danos não patrimoniais sofridos pela A. encontram se cabalmente e em concreto demonstrados, pelo que o Tribunal a quo deveria ter dado como verificados os mesmos como tendo sido originados diretamente por todos os contornos da relação material controvertida nos autos.
Nomeadamente,
46.º Devido a todas as comunicações infrutíferas dirigidas pela A. ao Banco R., todas as deslocações, chamadas telefónicas e e-mails que não levaram à resolução adequada da situação que opunha as partes do contrato e o sentimento de impotência que tal conjuntura criou na saúde da A.
47.º A entidade bancária R. sabia que os AA. residiam no estrangeiro desde 2003, tendo sido a não concessão do crédito suplementar em 2003, devido ao fato de não terem qualquer rendimento em Portugal.
48.º A R. incumpriu as normas do RGIC (Regulamento Geral das Instituições de Crédito), nomeadamente os artigos 73.º, 74.º e 76.º.
49.º A R. incumpriu os artigos 220.º e 221.º do C.P.C..
50.º Sobre a R. impendia a obrigação de proceder ao cancelamento das hipotecas que incidiam sobre o imóvel dos AA., objeto do contrato de mútuo celebrado entre os ora opositores no presente litígio.
51.º Obrigação essa que resulta da prova produzida, nomeadamente das D.P. da Autora e do Doc. n. º 4 junto à sua PI.
52.º Os AA. devido à alteração unilateral e ilegal do prazo de duração do contrato pagaram a mais de juros o valor de pelo menos 3.102,38 €, valor confessado pela R. e aceite pelo Tribunal.
53.º O valor que os AA. tiveram de suportar em excesso relacionado com os juros respeitantes aos 5 anos de contrato devidos pela alteração unilateral representaram um lucro para a entidade bancária R. e um dano patrimonial para os AA..
54.º Valor esse que os AA. têm direito a ver ser-lhes devolvido.
55.º A R. é intermediário financeiro e o incumprimento em causa é gerador de responsabilidade civil, atendendo aos aspetos da sua organização e do exercício da sua atividade, previstos no artigo 304.º- A do C.V.M., onde assumem destaque estes últimos pela importância dos deveres de informação na relação dos intermediários financeiros com os investidores.
56.º E, tal como o Código Civil estabelece que na responsabilidade contratual a culpa do devedor no incumprimento é presumida, nos termos do Artigo 799.º, n.º 1, também o Código dos Valores Mobiliários determina que no âmbito das relações contratuais e pré-contratuais se presume a culpa do intermediário financeiro e sempre e em qualquer caso de violação dos deveres de informação, de acordo com o Artigo 304.º- A, n.º 2.
57.º A culpa da R. ora em apreço é presumida, pelo que dada a incorreta prestação de serviços e informações ao cliente, bem como na alteração do contrato de forma unilateral, o cliente tem apenas de provar, como aconteceu em concreto na situação em apreço, os restantes pressupostos da responsabilidade civil, que são a ilicitude da conduta ou a violação das normas legais, o dano, ou os prejuízos sofridos e o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação e o dano sofrido, sendo que a presunção de culpa se estende ainda a este nexo de causalidade entre o fato e o dano.
58.º A informação a prestar ao cliente pelo banco deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, tal como referido no Artigo 7.º, n.º 1 do CVM, que se demonstrou não ter ocorrido.
59.º A obrigação que recai sobre a instituição financeira é tanto maior quanto menor for o grau de conhecimento e experiência do cliente, nos termos do Artigo 312.º, n.º 2 do CVM, consagrando assim o princípio da proporcionalidade inversa.
60.º Princípio aqui em causa em concreto e cuja violação criou na esfera jurídica do intermediário financeiro um outro dever, que é o dever de conhecer o cliente e o perfil deste e assim atender às suas solicitações para esclarecimento de dúvidas e resolução de problemas que surjam durante os vários momentos da execução do contrato.
61.º Da ilicitude na violação dos deveres de informação resultou diretamente a violação de normas de proteção, previstas no Artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil, qualificando-se os deveres de informação como disposições legais destinadas a proteger interesses alheios, na situação vertente os interesses dos mutuários.
62.º Ficou igualmente demonstrado que se tivessem tido possibilidade de demonstrar a sua vontade negocial, não teria sido celebrado qualquer alteração ao contrato, neste caso o prazo de devolução do capital mutuado.
63.º A instituição financeira admitiu claramente que violou o dever de informar os clientes de acordo com os padrões legais e de cumprir o contrato de acordo com a natureza bilateral do mesmo, o que torna a situação em causa particularmente grave.
64.º O que só podia piorar pelo fato de o Tribunal a quo ter aderido aos argumentos da parte faltosa para com a ordem jurídica no seu sentido geral e em concreto para com os aqui AA.
65.º Deixando um sentimento de impunidade das entidades bancárias.
66.º De acordo com o Artigo 304.º n.º 2 do C.V.M., o princípio geral a seguir no cumprimento dos deveres de informação é que de que os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência.
67.º Pelo que, a lei não se limita a impor a transmissão de informação ao cliente, exige que o intermediário financeiro colha informação junto do cliente que lhe permita traçar o respetivo perfil e cumprir o princípio da adequação do investimento à concreta situação financeira, características e entendimento do cliente relativamente aos riscos envolvidos.
68.º O princípio da adequação, previsto nos Artigos. 314.º e seguintes do CVM reforça o ónus que impende sobre o intermediário financeiro de avaliar o carácter adequado do investimento ao cliente e até de recusar uma ordem dada pelo cliente se for contrária aos interesses deste, nos precisos termos do Artigo 326.º do CVM.
69.º Pelo que se disse, ainda que insuficiente para tal injustiça, diga-se que o Tribunal viu e apreciou os factos carreados para o processo mas não viu a verdade inerente aos mesmos.
Em suma,
70.º Nunca os AA. se conformaram com a alteração do contrato para pagamento de 25 para 30 anos;
71.º Lutaram para repor o contrato nos seus termos iniciais;
72.º Mesmo que qualquer alteração contratual seja em benefício do cliente bancário, esta alteração, nunca poderá ser unilateral!
73.º Pelo que, havendo a solicitada regularização contratual de 30 para 25 anos e um posterior, eventual, incumprimento pelos AA., estes teriam que, necessariamente, assumir esse incumprimento, assim como todas as responsabilidades dele decorrentes, aliás, como sempre o fizeram!
74.º A decisão de que se recorre desvirtuou a causa!
75.º Isto porque, a “preocupação” do Tribunal fixou-se na capacidade financeira dos AA. em conseguir suportar o pagamento do aumento das prestações com a alteração do crédito para os 25 anos,
76.º Ao invés de responsabilizar a R. pela alteração unilateral do contrato que se encontra comprovada!
77.º A R. reconheceu a inexistência de formalização da alteração contratual;
78.º A R. comunicou aos AA. a dizer que ia proceder à correção do empréstimo, conforme se pode ler no ponto 8. Da carta junta à PI como Doc. N.º 9 e não procedeu em conformidade
79.º Até ao final do contrato os AA. nunca se conformaram com a alteração unilateral do mesmo;
80.º Tendo sofrido, comprovadamente, “ansiedade levada ao extremo”, em virtude da referida alteração que em muito transtornou a vida dos AA.
81.º Os AA. tiveram que suportar o pagamento do cancelamento de dois registos de hipotecas anteriores à sua aquisição do imóvel, sendo esta uma responsabilidade da R., conforme Escritura Pública junta à PI.
C. DO PEDIDO
Nestes termos e nos mais que os Excelentíssimos Senhores Desembargadores venham a suprir deve o presente recurso, admitido que seja, obter provimento e, por se entender verificada o erro notório na apreciação da prova e, em resultado, seja anulada a Decisão proferida e proferida outra no sentido expendido e defendido no presente recurso se requerendo deste modo que:
- Seja reconhecida a nulidade do contrato, uma vez o mesmo foi unilateralmente alterado;
- Seja reconhecido que só a partir de 2009 os AA. tiveram conhecimento da alteração contratual;
- Seja determinada a restituição do valor pago em excesso a título de juros, no valor mínimo de 3.102,38 €;
- Seja determinado o pagamento da quantia de 100,00 €, em virtude do pagamento do cancelamento de 2 registos de hipoteca anteriores ao registo da hipoteca dos AA.;
- Seja fixada uma quantia a título de indemnização por danos não patrimoniais de valor não inferior a 11.000,00 €, em virtude de todo o sofrimento e ansiedade causada pela R.;
- O valor da causa seja reconhecido como sendo, no mínimo, de € 14.202,38, por ser de lei e representar a realização da sempre pedida e esperada de Vossas Excelências, JUSTIÇA!
O Réu contra-alegou defendendo o julgado.
O recurso foi admitido com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II) OBJECTO DO RECURSO
Tendo em atenção as conclusões dos Recorrentes - artigo 635.º, n.º 3, 639.º, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 608.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC -, cumpre apreciar das seguintes questões:
1. Da impugnação da decisão de facto.
2. Do mérito da decisão de improcedência da acção.
3. Do valor da causa.
III) FUNDAMENTAÇÃO
1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
1.1. Da impugnação
Os Autores impugnam a decisão quanto ao ponto 8 dos factos provados, o qual tem a seguinte redacção:
8 - Em 2003, os Autores formalizaram um pedido ao Réu para estender o prazo de duração do contrato.
 Impugnam ainda a decisão de considerar não provados os seguintes factos (sem numeração na sentença recorrida e que agora submetemos a alíneas para melhor referência ulterior):
a) - Os Autores não deram autorização para que o prazo do contrato fosse alterado de 25 para 30 anos;
b) - Os Autores não queriam que o prazo de duração do contrato fosse alterado de 25 para 30 anos;
c) - Só em meados de 2009 os Autores repararam que nos extractos bancários, referentes ao contrato hipotecário, pelo menos desde o ano de 2007, mencionavam o prazo de 30 anos;
d) - A alteração do contrato de 25 para 30 anos e a falta de informação por parte do Réu causaram transtornos aos Autores com deslocações, contactos, chamadas e e-mails, frustrados, noites mal dormidas e frustração, ansiedade e stress pelo facto de não conseguirem obter respostas e uma resolução definitiva do problema por parte do banco;
e) - A ausência de resolução das questões com o Réu fez com que a Autora tivesse de ser acompanhada pelo seu médico devido aos ataques de ansiedade e stress constantes que sofria.
1.2. Apreciação
1.2.1. Quanto ao ponto 8 dos factos provados.
Entendem os Recorrentes que o facto não deve ser julgado provado por inexistir prova nesse sentido, defendendo que não pode considerar-se que o documento apresentado pelo Réu (parecer de aceitação da alteração do prazo) o demonstre, resultando o contrário das declarações da Autora e das testemunhas que apresentou.
Lê-se a respeito na sentença recorrida:
No que concerne à factualidade descrita em 7., 8. e 11., o tribunal atendeu às regras da experiência comum conjugadas com a análise crítica do teor do documento de fls. 71, do teor da carta mencionada em 15., do documento junto a fls. 89 e ss. e com as declarações da Autora. Com efeito, a Autora nas suas declarações reconheceu, tal como havia feito na petição inicial, que a reunião ocorrida em 2003 foi realizada em virtude das dificuldades que os Autores tinham em cumprir, por falta de capacidade económica, o pagamento das prestações do contrato, admitindo ainda, contrariamente ao que refere na petição inicial, que foi solicitado - nessa altura e não em 2005, tanto que a Autora referiu que só voltou a incumprir o contrato em 2013 -, o aumento do prazo do contrato de 25 para 30 anos. Por outro lado, a Autora, confrontada com os factos respeitantes à situação económica do casal relatada no parecer constante do documento de fls. 71, reconheceu como verdadeiro o aí relatado. Acresce que a Autora também admitiu que a prestação do empréstimo baixou em 2003 e resulta do documento junto a fls. 89 a diferença do valor da prestação, que a Autora, em audiência, reconheceu existir.
Ora, considerando que o Réu só poderia ter conhecimento da situação relatada no parecer mencionado através dos Autores, que tal documento é contemporâneo da reunião mencionada, que o parecer refere expressamente que o que se pretendia era baixar a prestação para que os Autores tivessem disponibilidade para pagarem as quantias em mora e que até se comprometiam a pagar um montante superior para abater nos valores em dívida, que na carta referida em 15. já se fazia menção a que foi nessa reunião que foi solicitado o aumento do prazo do contrato e atendendo ao que a Autora agora veio reconhecer, deu-se como provada a factualidade descrita em 7. e 8. e 11. e como não provados os primeiros três factos elencados.
O documento de fls 71 (ref.ª 36755665), datado de 17 de Março de 2003, consiste numa apreciação pela instituição bancária do que o dito documento indica ser uma proposta de alteração de prazo do empréstimo pedido pelos Autores, apreciação essa favorável, do documento constando ainda decisão de conceder a alteração em conformidade com o parecer.
O documento de fls 89 e seguintes (ref.ª 40274548) é elaborado pela instituição bancária comparando o empréstimo a 25 anos e com a alteração a 30 anos e concluindo que os juros pagos foram superiores em € 3.102,38.
A decisão recorrida considerou provado que os Autores solicitaram a alteração de prazo em virtude de a própria Autora ter declarado que houve uma reunião com o Banco, em 2003, em que tal foi encarado, considerando face a tal e à carta referida em 15 (na qual o Banco se reporta a uma reunião nessa data), verosímil a versão do Banco. Considera ainda que essa seria a única hipótese de o Banco emitir o parecer a que se fez referência, o que, tudo, é congruente com as declarações da Autora quanto ao momento em que se apercebeu de que a prestação tinha baixado.
Ouvida toda a prova gravada, resulta de tal audição que a Autora referiu uma situação em 2003 em que pediu ao Banco um crédito suplementar (que destinaria a obras), pedindo simultaneamente a alteração do prazo de 25 para 30 anos a fim de conseguir uma prestação mais baixa da que obteria com a mera aprovação do crédito suplementar. Referiu ainda que por diversas vezes negociou créditos suplementares, mas para fazer face a incumprimentos verificados por dificuldades financeiras ocasionais. Quanto à proposta que os Autores fizeram em 2003, disse que a alteração do prazo apenas foi pedida para o caso de o crédito para obras ser concedido, sendo que foi recusado por os Autores não terem rendimentos em Portugal, face ao que pensou que o contrato se mantinha com o mesmo prazo.
Os depoimentos das testemunhas…., sobretudo desta, confirmaram a questão das obras e do crédito suplementar, embora não fossem congruentes quanto à questão da data.
Em suma, quanto à alteração do prazo, temos um parecer e decisão favorável do Banco em 2003, e as declarações da Autora de que o pedido de alteração que então teve lugar se incluía e dependia de um contexto contratual mais vasto que não mereceu acolhimento por parte da instituição bancária.
A testemunha apresentada pelo Réu de nada sabia a respeito, limitando-se a referir que as alterações de prazo que são feitas na instituição bancária são reduzidas a escrito assinado pelo Bando e pelos mutuários. Referiu que, em 2003, os processos eram mais rudimentares e bastava um pedido por parte do cliente para ser formalizada essa alteração contratual; o pedido tem de existir sempre.
Tratando-se de um contrato formal celebrado por uma instituição bancária, entendemos que não pode considerar-se provada a proposta de alteração por parte dos Autores através da mera apresentação de um parecer favorável a uma alteração de prazo. Sobretudo quando a Autora refere uma explicação plausível para que a questão da alteração de prazo tivesse sido encarada, explicação essa que o Banco em nada infirma. Ora, o Banco podia e devia fazê-lo através da apresentação da proposta em análise, o que permitiria saber se a mesma existiu como proposta ou tratou-se de mera hipótese, na afirmativa, qual o teor da mesma, e, nomeadamente, se se referia apenas ao prazo ou também a um crédito suplementar, como a Autora afirma, por maioria de razão necessária quando posteriormente inexiste qualquer formalização da alteração.
Ora, não só cabe ao Banco demonstrar que alterou a cláusula de prazo de acordo com os Autores, como é ao Banco, com serviços administrativos e de contabilidade necessariamente complexos e organizados, que tal prova é mais fácil de fazer. Sendo que a sua natureza de instituição bancária determina que se deva, aliás, munir convenientemente dos meios de apresentar tal prova.
O documento de fls 89 e seguintes nada tem a ver com o facto em causa.
A carta referida em 15 da sentença, em resposta a reclamação dos Autores quanto à alteração do prazo, é uma declaração que tem de ser apreciada como interessada, por parte do emissor, uma vez que foi lavrada já num contexto conflituoso.
Entendemos, em consequência, que deve ser alterada a decisão quanto ao ponto 8 da matéria de facto, procedendo a pretensão dos Recorrentes de que tal facto seja julgado não provado.
1.2.2. Quanto às alíneas a) e b) dos factos não provados e impugnados.
Pretendem os Recorrentes que seja julgado provado que não deram autorização para a alteração do prazo e que a não quiseram.
 No que a tal se refere, o único elemento directo de prova são as declarações de parte da Autora.
Não se exclui que, em abstracto, possa ser feita prova apenas com declarações de parte. Pese embora, as declarações de parte constituem, afinal, a narração ao tribunal dos factos que a parte apresentou como fundando a sua pretensão e dos quais está convencida, nomeadamente por uma interpretação deles que já processou ao longo do tempo, que cristalizou e que levou a acionar a resolução judicial do litígio. Exigem particular cuidado quando constituam o único elemento probatório.
No caso, as declarações da Autora encontram, todavia, corroboração indirecta em outros meios de prova.
Assim, o depoimento da testemunha P… (a testemunha A… foi mais confusa nas suas indicações, mas foi no mesmo sentido) relativamente ao facto de a Autora se ter dado conta, em 2009, de que o prazo fora alterado de 25 para 30 anos.
A testemunha foi muito directa e específica, situando aliás a data com referência ao seu casamento e ao nascimento do filho, razões de ciência fortes quanto à colocação temporal dos factos.
Por outro lado, descreve uma situação inteiramente verosímil com o habitual das relações humanas e congruente com as datas em causa nos autos (termo do prazo de 25 anos, data em que situa o conhecimento da alteração e datas em que a Autora iniciou a reclamação junto do Banco quanto à alteração do prazo). A situação verosímil é a de a Autora (que conhece há longos anos por ser amiga da mãe da testemunha e serem vizinhas) lhe dar nota da sua satisfação com o aproximar do ano em que completaria o pagamento da sua casa, satisfação tanto mais compreensível quanto o empréstimo teve situações de incumprimento e foi difícil de honrar.
Também se reveste de verosimilhança a possibilidade de nessa circunstância, em que a Autora tinha consigo o extracto bancário, a testemunha se ter apercebido de que o número de meses indicado (360) não correspondia a 25, mas sim a 30 anos.
Verosimilhança que ainda se encontra na descrição da preocupação da Autora (também referida pela testemunha A…) e nas diligências que comprovadamente encetou junto do Banco em ordem a tratar do assunto, as quais estão documentadas na correspondência trocada.
 Para concluir, as declarações da Autora quanto a não ter autorizado ou pretendido a alteração de prazo, sem mais, são corroboradas por esta prova indirecta quanto à sua reacção face à indicação pela testemunha de que o prazo assinalado no extracto não era de 25 anos e o contemporâneo início das diligências junto do Banco.
Procede nesta parte a impugnação, julgando-se provado o seguinte:
Os Autores não deram autorização nem pretendiam que o prazo do contrato fosse alterado de 25 para 30 anos.
1.2.3. Quanto à alínea c) dos factos não provados e impugnados.
Pretendem os Recorrentes que seja julgado provado que só em 2009 se aperceberam da alteração do prazo.
No que se refere a esta matéria, dá-se por reproduzido o que se disse no ponto 1.2.2.. De tal resulta que se entende proceder a impugnação da decisão de facto quanto à data do conhecimento da alteração do prazo, inexistindo elementos quanto a tal vir indicado nos extractos desde 2007.
Julga-se provado o seguinte facto, improcedendo no mais a impugnação:
Só em meados de 2009 os Autores repararam que os extractos bancários, referentes ao contrato hipotecário mencionavam o prazo de 30 anos, o que ocorreu desde data que não foi possível apurar.
1.2.4. Quanto às alíneas d) e e) dos factos não provados e impugnados.
Pretendem os Recorrentes que se julguem provados transtornos vários que entendem consubstanciarem danos não patrimoniais, resultantes da alteração do prazo e dos esforços que fizeram para reverter essa situação.
Encontra-se demonstrado, pela correspondência trocada entre os Autores e o Réu que os primeiros, a partir de 2009, começaram a inquirir o Banco quanto ao prazo de 30 anos e aos motivos porque o prazo inicial se havia alterado.
Mais está demonstrado que a proposta do Banco foi a de pagarem o montante de € 6.900,00, correspondente ao que haviam pago a menos desde a alteração da liquidação por via da alteração de prazo, ou formalizarem o acordo de alteração de prazo.
Os depoimentos das testemunhas arroladas pela Autora (o seu filho e as vizinhas) indicaram também com detalhe o estado de espírito alterado da Autora e a ansiedade ao saber que o empréstimo se mantinha por mais cinco anos e ao não conseguir resolver o assunto junto do Banco. As diligências várias junto do Banco constam da correspondência e ecoavam ainda na memória muito tardia da única testemunha que o Banco apresentou.
O relatório médico indica uma situação depressiva e que a Autora declarou ter como concausa a situação referida. Com a sentença recorrida, não valorizamos o relatório médico. Este, que é fls 54 (ref.ª 36072418) indica que a Autora imputou as suas queixas depressivas a diversos factores de entre os quais litígio com o Banco. Todavia, nada acrescenta ao que já se sabia: ser esse o entendimento da Autora. Concordamos com a sentença recorrida quando diz: (…) o que consta do relatório médico de fls. 54 não comprova o alegado, pois que não é mais do que o relatado pela própria Autora à subscritora de tal relatório.
Mas os demais meios de prova já indicados corroboram as expressivas declarações da Autora quanto ao percurso dos Autores ao longo dos anos para tentar reverter a situação, sem qualquer êxito e com as dificuldades inerentes à sua situação de emigrantes.
Do mesmo modo, as regras de experiência comum que indicam ser a questão do empréstimo para habitação uma questão de grande relevância para pessoas com a situação económica dos Autores (de dificuldade financeira) e ser fonte de preocupação e sentimento de impotência a repetição de dificuldades para resolver as questões atinentes.
Nomeadamente, a proposta do Banco, propondo a manutenção do prazo de 30 anos ou o pagamento do montante de € 6.900,00, é de molde a causar grave perturbação. A Autora descreveu de forma vívida as diligências feitas, a consulta de advogados, a deslocação a diversos balcões do Réu, em termos que merecem crédito.
Procede nesta parte a impugnação, com excepção da relação com a situação depressiva da Autora, julgando-se provado o seguinte:
A alteração do contrato de 25 para 30 anos e as diligências junto do Réu causaram transtornos aos Autores com deslocações, contactos, chamadas e e-mails, frustrados, noites mal dormidas e frustração, ansiedade e stress pelo facto de não conseguirem obter respostas e uma resolução definitiva do problema por parte do banco.
1.3. Da fixação da matéria de facto
Estão assentes os factos constantes da decisão de primeira instância, com as alterações resultantes do ponto 1.2. (mantendo-se a numeração que, assim, passa do ponto 7 para o 9, por facilidade das referências quando se recorra ao texto da decisão recorrida):
1. Os Autores celebraram com o Crédito Predial Português E.P., em 9 de Junho de 1988, o contrato de mútuo, junto a fls. 24 e ss., cujo teor se dá aqui por reproduzido, através do qual o Crédito Predial Português emprestou aos Autores, para aquisição de habitação própria permanente, a quantia de 4.590.000$00 (22.894,82 €), obrigando-se os Autores a restituir tal montante, em 300 prestações, mensais e sucessivas, pelo período de 25 anos, acrescido de uma taxa de juro de 17% ao ano, tendo dado como garantia do pagamento de tal quantia hipoteca sobre a fracção autónoma designada pela Letra “D” do prédio …., constando da cláusula 18.º que “Ficam de conta do “devedor” todas as despesas de segurança e cobrança do empréstimo, inclusive as deste título, as relacionadas com o seu registo e distrate, e as de qualquer avaliação que a “IC” mande efectuar ao imóvel hipotecado”.
2. Sobre o imóvel referido em 1. já incidia uma hipoteca voluntária que havia sido constituída pelos então vendedores a favor do Crédito Predial Português E.P., garantia a que este se obrigou a renunciar no dia 7 de Junho de 1988.
3. O contrato de compra e venda do imóvel, junto a fls. 32, cujo teor se dá aqui por reproduzido, foi celebrado por escritura pública, assinado pelas partes, no dia 9 de Junho de 1988, no Terceiro Cartório Notarial de Lisboa.
4. No dia 12 de Agosto de 1998, o Crédito Predial Português intentou contra os Autores uma acção executiva para pagamento de quantia certa, com o fundamento em incumprimento do contrato de mútuo bancário, considerando vencida toda a quantia em dívida, que ascendia aos 6.321.824$00 (31.533,14 €), tendo as partes chegado a acordo, com a renegociação do contrato, mantendo-se o prazo de cumprimento de 25 anos, pondo fim à acção executiva.
5. O Crédito Predial Português, S.A., foi, posteriormente, adquirido pelo Réu.
6. Ao contrato de mútuo n.º 0000.00327225541A estava anexado o contrato hipotecário n.º 541000327225, junto como documento n.º 5, cujo teor se dá aqui por reproduzido, do qual consta o prazo de 25 anos de duração do contrato
7. Em 2003, os Autores e os representantes da Ré realizaram uma reunião, tendo os Autores, em virtude de dificuldades financeiras, solicitado ao Réu que informasse sobre as opções que o Banco oferecia para reduzir despesas contratuais e alterar o montante da prestação mensal, sendo a solução de alargar o prazo de duração do contrato uma opção.
9. Em 5 de Março de 2003, o director de balcão do Réu emitiu um parecer favorável ao alargamento do prazo do contrato de mútuo de 25 para 30 anos, que foi aprovado pelo Réu em 12 de Março de 2003.
10. A alteração do prazo do contrato não foi reduzida a escrito assinado pelos Autores.
11. Em resultado da alteração referida em 9. o valor da prestação mensal do empréstimo passou de 256,00 € para 195,00 € em Julho de 2003.
12. Em 2009, a Autora dirigiu-se ao balcão do Réu para solicitar informação a respeito do valor das prestações, uma vez que teve conhecimento de que os juros bancários haviam sofrido um decréscimo significativo e que várias pessoas suas conhecidas tinham referido que assistiram a uma redução significativa das prestações dos seus créditos, tendo sido informada de que o juro anexado ao contrato de mútuo havia baixado, mas que o montante da prestação se havia mantido o mesmo.
13. Os Autores enviaram ao Réu a carta registada, com aviso de recepção, datada de 30 de Setembro de 2009, junta a fls. 37, cujo teor se dá aqui por reproduzido, da qual consta: (…) Depois de ter falado várias vezes com a vossa filial do Laranjeiro e apesar das justificações e explicações que me foram dadas, eu não fiquei satisfeita e acho que é impossível e ilógicas as explicações (…) As explicações que eu solicitei dizem respeito ao valor da minha prestação mensal mesmo depois dos juros terem baixado (…) Não fiquei satisfeita com as explicações, porque apesar da base das mesmas estarem correctas, é coincidência a mais que o montante do juro que baixou, seja exactamente o montante que o capital tinha de aumentar (…) Todos os documentos que tenho na minha posse, dizem que a hipoteca tem uma duração de 25 anos e de há 2 anos para cá (sensivelmente) os extractos bancários referem um período de 30 anos. Gostava de ter o documento que refere este período, porque além de eu não me lembrar de ter assinado nenhum documento a prolongar o período de 25 para 30 anos e de ter todos os documentos arquivados, não encontro nenhum que me fale desta alteração. A razão porque só ponho esta questão agora, é porque só há pouco tempo é que me dei conta deste detalhe no extracto bancário e só agora é que tive oportunidade de escrever esta carta”.
14. O Réu respondeu aos Autores, por cartada datada de 13 de Novembro de 2009, junta a fls. 38, cujo teor se dá aqui por reproduzido, da qual consta: “O empréstimo (…) foi contratado ao abrigo do regime Bonificado com prestações progressivas, pelo que, a prestação é sempre de valor igual durante uma dada anuidade. (…) Esta situação explica o facto de o valor da prestação se manter apesar das descidas da taxa de juro. Foi efectuada uma alteração das condições contratuais, para aumento de prazo do empréstimo de 25 para 30 anos, que ocorreu em Março de 2003 (…)”.
15. O Réu enviou aos Autores a carta, datada de 28 de Junho de 2011, junta a fls. 39 verso, cujo teor se dá aqui por reproduzido, da qual consta: “Tal como é do conhecimento de V.Exa., aliás recentemente reconhecido em reunião realizada, no período de Março de 2003, foi-nos solicitado por V. Exa. uma alteração contratual do empréstimo hipotecário (…) Naquela data tal pedido foi justificado por V. Exa. pelas dificuldades de natureza financeira então manifestadas, pretendendo que, mediante um alargamento do prazo de duração do contrato, houvesse uma redução dos encargos mensais. Face àquele pedido, este Banco procedeu à alteração, cujos efeitos tiveram o seu início em Julho de 2003. Como aliás pôde constatar pelo seu extracto mensal (…) a prestação mensal do s/ empréstimo do mês de Junho de 2003 para o mês de Julho de 2003, reduziu-se de € 256 para € 195, caso não tivesse sido efectuada a alteração a prestação seria de €267. Desde aquela data que tem sido cobrado o valor da prestação com a alteração de prazo, ou seja, há 96 meses (…) Todavia, constatou-se agora, que houve lapso na formalização do acordo materializador, inexistindo o documento de suporte do mesmo (…) No seguimento da reunião realizada com o Banco, na qual esteve presente o Dr. Luís … em representação do Banco (…) foi devidamente explicada esta situação e referido que o Banco está na disposição de rectificar o aludido-lapso, reintroduzindo no sistema informático os elementos correctos: prazo 25 anos. (…) Todavia, não podemos deixar de chamar a v/especial atenção para o facto desta correcção implicar o reprocessamento do empréstimo (…) Desta forma, tendo em conta que a regularização solicitada vai-se traduzir num re-cálculo de 96 prestações, concluímos que seria necessário (…) liquidar um valor (arrendondado) de 6900,00 € (…) estamos na disposição de consentir uma efectiva modificação contratual de forma a implementar uma alteração do prazo para 30 anos, desde que seja celebrado um aditamento, escrito, que formalize tais alterações. (…) Nesse sentido ficamos a aguardar que no prazo de oito dias nos comunique se pretende assinar tal aditamento, caso não seja emitida qualquer resposta iremos proceder à correcção do empréstimo (…)”.
16. Em 11 de Julho de 2011, a Autora pediu ao Réu um mês para dar resposta.
17. Por carta datada de 10 de Agosto de 2011, o Réu respondeu à Autora que aguardaria até ao dia 20 de Setembro de 2011.
18. Após a data referida em 17., o Réu não repôs o prazo de 25 anos, mantendo-se as prestações a ser cobradas com o cálculo do empréstimo a 30 anos.
19. Por carta datada de 12 de Outubro de 2018, os Autores, através de mandatária, requereram ao Réu a cópia do contrato de mútuo e aditamentos, a informação do capital mutuado e pago até ao final do contrato e dos encargos e juros que recaíram sobre o capital mutuado, tendo insistido por correio electrónico por tais informações em 16 de Maio de 2019 e em 18 de Junho de 2019.
20. Em 8 de Agosto de 2019, o Réu respondeu aos Autores, remetendo o contrato de mútuo, informado que o empréstimo estava liquidado e que estava a realizar diligências para obter toda a informação “uma vez que, face à antiguidade do empréstimo, em sistema apenas dispomos de movimentos após 09/03/2000”.
21. Os Autores pagaram todas as prestações, tendo o contrato cessado os seus efeitos no dia 3 de Janeiro de 2019.
22. Com a alteração do prazo do contrato de 25 para 30 anos, a partir da data referida em 11., os Autores pagaram mais 3102,38 € do que o valor inicialmente estabelecido no contrato para o prazo de 25 anos.
23. Durante o contrato mantiveram-se registadas as duas hipotecas sobre o imóvel.
24. O Réu não cancelou o registo das hipotecas.
25. Os Autores procederam ao cancelamento do registo das hipotecas, tendo, para tanto, procedido ao pagamento do valor de 100,00 €.
26. Os Autores não deram autorização nem pretendiam que o prazo do contrato fosse alterado de 25 para 30 anos.
27. Só em meados de 2009 os Autores repararam que os extractos bancários, referentes ao contrato hipotecário mencionavam o prazo de 30 anos, desde data que não foi possível apurar.
28. A alteração do contrato de 25 para 30 anos e as diligências junto do Réu causaram transtornos aos Autores com deslocações, contactos, chamadas e e-mails, frustrados, noites mal dormidas e frustração, ansiedade e stress pelo facto de não conseguirem obter respostas e uma resolução definitiva do problema por parte do banco.
Dos autos resulta ainda com pertinência, por resultar de documentos autênticos, a certidão de registo junta de fls 28 verso a 31 e do documento de fls 22 e verso, o que se adita nos termos do artigo 663.º, n.º 2, com referência ao artigo 607.º, n.º 4, ambos do CPC:
29. As hipotecas referidas 23 são as seguintes:
a) inscrita sob a inscrição C-1, apresentação 39/820112, a favor do Crédito Predial Português, para garantia de empréstimo a……., com origem na inscrição ..., a fls … do livro C-63, incidente sobre o prédio urbano sito na Rua …… da Conservatória do Registo Predial do Seixal;
b) inscrita sob a inscrição C-1, apresentação 05/841025, a favor do Crédito Predial Português, para garantia de empréstimo a …..(…), com origem na inscrição …, a fls … do livro C-79, incidente sobre a fracção D do prédio urbano sito na Rua ….
30. O Crédito Predial Português, em 7 de Junho de 1988 renunciou à hipoteca referida em 29. b).
2. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO
2.1. Da alteração do prazo do mútuo
Não está em causa nos autos que entre os Autores e antecessor do Réu foi celebrado um contrato escrito de mútuo pelo prazo de 25 anos, isso mesmo resultando do confronto entre os factos provados sob 1, 3 e 6, e o disposto no artigo 1142.º do Código Civil.
Resultou provado que, a dada altura, o Réu passou a liquidar as prestações a pagar pelos Autores de acordo com um prazo de 30 anos sem acordo dos Autores, pelo que desde essa alteração, foi cumprido o pagamento do montante mutuado de acordo com a liquidação das prestações tendo em atenção o prazo de 30 anos.
Conforme resulta do artigo 406.º, n.º 1, do Código Civil, o contrato apenas pode modificar-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei.
Não se vislumbra, nem foi invocada, norma legal que impusesse a alteração. Não existindo consentimento de ambos os contraentes, a imposição pelo Banco, unilateralmente, de um diferente programa contratual não tem qualquer acolhimento legal.
Pretendem os Recorrentes que seja declarada nula a cláusula que altera o prazo para 30 anos. Todavia, não resultou sequer provada a existência de uma tal cláusula contratual, apenas de uma liquidação do programa contratual de acordo com um prazo não consensualizado.
Carece, assim, de sentido o pedido de declaração de nulidade da cláusula de alteração do prazo.
2.2. Da diferença entre o montante pago e o devido nos termos do programa contratual
Conforme se disse anteriormente, o Banco liquidou as prestações de acordo com um prazo que não era aquele a que as partes estavam adstritas, na ausência de qualquer acordo entre os contraentes.
Resultou provado, sob 22, que com a alteração do prazo do contrato de 25 para 30 anos, a partir da data referida em 11., os Autores pagaram mais 3102,38 € do que o valor inicialmente estabelecido no contrato para o prazo de 25 anos.
Entendemos que no contexto do desenvolvimento do programa contratual estabelecido, a liquidação pelo Banco das prestações de acordo com o contrato surge como um dever acessório que lhe resulta das regras de boa-fé quanto ao cumprimento do contrato, impostas pelo artigo 762.º, n.º 2, do Código Civil.
Na verdade, mais do que uma violação do direito de outrem susceptível de ocasionar responsabilidade extra-contratual por via do disposto no artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil, o contexto contratual e as funções que as partes nele assumem, situam o caso na violação de dever acessório e, por essa via, na responsabilidade contratual.
Este regime funda-se no livre acordo de vontades delimitador do programa contratual, programa no qual se desenham as obrigações cujo incumprimento funda tal responsabilidade. Ora, é neste acordo de vontades e no seu objecto que se desenvolve a actuação do Banco, o que indica a consideração do caso à luz da responsabilidade contratual.
(…) a relação contratual, para lá das atribuições (patrimoniais ou não patrimoniais) pretendidas pelas suas estipulações e pelo programa contratual voluntariamente instituído, impõe, a cada um dos sujeitos que nela participam, deveres de cuidado ordenados à defesa da integridade do status quo pessoal ou patrimonial do outro[1].
A culpa do Réu ao liquidar sem fundamento a prestação com base no prazo de 30 anos, constitui-o em incumprimento contratual e em responsabilidade pelos danos causados à contraparte – artigo 798.º do Código Civil – ficando obrigado a reconstituir a situação que se verificaria sem o incumprimento – artigo 562.º do mesmo Código, que o mesmo é dizer, desde logo, a restituir aos Autores o montante que indevidamente pagaram a mais nos termos da liquidação feita – artigos 563.º e 564.º do Código Civil.
Procede a pretensão de condenação do Réu a pagar aos Autores o indicado montante de € 3.102,38 (três mil, cento e dois euros e trinta e oito cêntimos).
2.3. Dos danos não patrimoniais
A distinção entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual, com uma delimitação estrita dos respectivos contornos e fronteiras, merece há longo tempo amplo debate, mantendo-se em aberto as várias teorias que em abstracto se confrontam. Pese embora, no sistema jurídico Português apenas em casos fronteira essa distinção abstracta convoca na prática da aplicação concreta diferenças com relevo assinalável, mercê de uma posição do legislador suficientemente dúctil[2] [3].
Há longo tempo que a questão da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais em sede de responsabilidade contratual se encontra resolvida no sentido positivo, sendo fútil aprofundada referência[4] a essa pacífica ressarcibilidade.
A indemnização por danos não patrimoniais[5] encontra o seu assento legal no artigo 496.º, do Código Civil, que estabelece no seu n.º 1 a regra geral da ressarcibilidade determinada pela gravidade dos danos ocorridos.
Esta gravidade tem de ser aferida à luz de critérios de normatividade estabelecida e não de subjectividade casuística, critérios que apontam para a consideração dos bens jurídicos violados. Assim considerados, tem de concluir-se que danos que ocorram na esfera de bens jurídicos constitucionalmente garantidos ou aqueles que sejam assegurados ou protegidos pelas normas infraconstitucionais de natureza criminal, constituem um reduto inatingível da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais.
Entre estes se encontram os que respeitam à integridade física e saúde e, noutra dimensão, ao trabalho ou ao lazer, à propriedade ou ao bem-estar, tendo de considerar-se que a violação destes bens jurídicos, entendidos como de enorme relevo pelo ordenamento jurídico, tem como consequência a ressarcibilidade dos danos.
Entende-se que a insegurança quanto a um contrato com expressão significativa na vida pessoal - como o é o que se refere ao mútuo para aquisição de habitação - e económica - dado o relevo dos valores envolvidos -, acrescido da menor consideração na ponderação do problema por parte da instituição bancária com quem os Autores contrataram e a quem podiam exigir um comportamento diferente, situa os transtornos e incómodos sofridos no patamar da ressarcibilidade por via da sua relevância.
A questão da medida da indemnização implica um exercício de superior dificuldade qual seja o de traduzir quantitativamente o que é intrinsecamente qualitativo.
Em consequência, têm de procurar-se critérios que levem à determinação do “indeterminável”, ou seja, a exprimir em valor patrimonial aquilo que o não tem, por ser de outra ordem.
Nestas circunstâncias, o critério de fixação da indemnização funda-se na equidade, tem em conta os danos causados, o grau de culpa, a situação económica do lesado e do lesante e outras circunstâncias que concorram no caso – artigos 496º, nº3, e 494º, ambos do Código Civil – bem como a atribuição de uma indemnização cujo valor patrimonial proporcione nessa dimensão patrimonial algum conforto específico.
Como factor de medida da indemnização também avulta a culpa da instituição bancária e a atitude inflexível assumida com a exigência do pagamento dos € 6.900,00. Culpa que é critério na fixação da indemnização – artigos 494.º e 496.º, n.º 4, do CC.
Refere-se no acórdão de 20 de Novembro de 2019, proferido no processo 107/17.5T8MMV.C1.S1 (Nuno Pinto de Oliveira):
Em relação aos danos não patrimoniais, o princípio é o de que a indemnização deve calcular-se de acordo com a equidade (art. 496.º, n.º 4, do Código Civil) [5]. A equidade funciona como único recurso, “ainda que não descurando as circunstâncias que a lei manda considerar, a saber: o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso (por exemplo, a natureza e a intensidade e da lesão infligida)”
De suma importância, dada a indeterminação específica, a ponderação dos parâmetros que o legislador estabelece no artigo 8.º, n.º 3, do CC, ao apelar à consideração dos casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito.
Assim, o juízo de equidade, como os tribunais e particularmente o Supremo Tribunal de Justiça vêm advertindo, não repousa na discricionariedade e subjectividade antes se alimenta da ponderação dos critérios jurisprudenciais e neles deve apoiar-se[6].
Por isso que se afigura conveniente indicar os critérios seguidos em outros casos, pese embora a variedade da vida.
Assim:
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Setembro de 2020, proferido no processo 4871/18.6T8VNF.G1.S1 (Olindo Geraldes), entendeu, relativamente a uma situação de cerca de um ano de incómodos causados por um estaleiro ilegal contíguo à residência, por violação do direito à saúde, adequada uma indemnização de € 9.000,00.    
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1 de Abril de 2014, proferido no processo 577/07.OTBALM.L1-1 (Maria do Rosário Gonçalves), entendeu que, num caso relativo a defeitos da habitação causadores de constrangimentos na sua plena utilização, adequada a indemnização em € 2.500,00.
Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 4 de Fevereiro de 2021, proferido no processo 19053/18.9T8SNT.L1, deste Colectivo, entendeu que, para ressarcimento do sofrimento causado por uma queda, internamento, tratamentos, consequências, a incerteza durante o período de recuperação, era adequada indemnização no montante de € 7.000,00.
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 18 de Fevereiro de 2019, proferido no processo 25/17.2T8OAZ.P1 (Fátima Andrade), entendeu que para uma situação de privação de energia eléctrica que privou o autor do exercício pleno do seu direito à habitação e qualidade de vida básico e o obrigou a fazer diversas chamadas por dia para a ré, na tentativa de que esta resolvesse a situação, no que despendeu muito tempo, foi considerada adequada uma indemnização por danos não patrimoniais de € 5.000,00.
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 19 de Dezembro de 2018, proferido no processo 762/15.0T8LRA.C1 (Emídio Santos), entendeu equitativa a indemnização de dez mil euros [€ 10 000,00] pelos seguintes danos não patrimoniais: sofrimento físico e psíquico vivido pelo autor, fixado, no grau 4, défice funcional permanente da integridade física ou psíquica, fixado em 1 ponto, e desgosto causado pelo facto de a vítima ter deixado, durante vários meses, de andar de bicicleta e de jogar futebol.
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 26 de Fevereiro de 2013, proferido no processo 505/08.5TBTND.C1 (Luís Cravo), entendeu que deve considerar-se como gravemente negligente a actuação da instituição bancária Ré que face às ordens de transferência do dinheiro que lhe foram endereçadas por terceiro não concretamente identificado (em montante total de € 245.577,30), não mereceram da parte daquele uma actuação conforme às normas procedimentais que regulamentam a sua actividade, tendo mesmo agido ao arrepio de elementares regras de rigor e prudência que regem a actividade bancária, assim deferindo tais ordens em prejuízo directo do A. que viu correspondentemente esvaziadas as suas contas e, assim, o montante de € 10.000,00 adequado e proporcionado a compensar o A. dos danos não patrimoniais que na circunstância sofreu.
Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 11 de Dezembro de 2018, proferido no processo 6934/14.8CBR.C1 (Carlos Moreira), entendeu que provando-se que por virtude de deficiências construtivas que provocaram humidades durante largos meses e até anos, decorreram tristeza e angústia para o autor comprador e o agravamento da sua bronquite asmática, que o Autor anda triste e angustiado por ver as paredes e tectos da sua casa enegrecidas e o chão estragado pela acção da humidade e que a humidade existente na fracção provocou o agravamento da bronquite asmática de que padecia situação que se prolongou por largos meses e até anos, era adequada a indemnização de € 2.000,00 a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais sofridos.
Não se escamoteia que alguns destes acórdãos têm já alguns anos. Todavia, o juízo de equidade convive com a ponderação da sua antiguidade para a elaboração do raciocínio de tratamento de casos análogos. Aliás, numa outra dimensão, a da heterogeneidade dos danos sofridos, também a ponderação relativa é exigida.
Face aos exemplos, entende-se que a situação dos autos apresenta menor gravidade do que a apreciada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça e do deste Colectivo, aproximando-se da do acórdão desta Relação de 1 de Abril de 2014, havendo que ponderar, embora, os oito anos entretanto decorridos.
A similitude da situação de “conflito” com instituição bancária aproxima a situação da do acórdão de 2013 do Tribunal da Relação de Coimbra, também longínquo no tempo, embora se afaste decididamente quanto à perda patrimonial.
Face a tudo o que se referiu, entende-se ajustada a fixação da indemnização por danos não patrimoniais em € 3.000,00 (três mil euros), à data em que se profere decisão.
2.4. Do pagamento do distrate das hipotecas
Invocaram os Réus que pagaram € 100,00 pelo distrate de hipotecas registadas quanto à fracção em causa, de que era beneficiário o Réu, pretendendo que este seja condenado a pagar tal montante, assim impugnando a decisão recorrida que de tal o absolveu.
O Réu alegou que foi convencionado que o distrate da hipoteca era de responsabilidade dos Autores nos termos do contrato.
As hipotecas que estão em causa são as que garantem mútuos diversos do celebrado entre os Autores e o Réu, nada existindo no contrato celebrado quanto à responsabilidade pelos custos do cancelamento do respectivo registo. Em suma, trata-se daquelas a que se refere o ponto 30 dos factos assentes e não da que é mencionada no ponto 6.
Conclui-se que não existe cláusula contratual que determine que o Banco deve pagar o distrate das hipotecas de que é beneficiário, sendo certo que nenhuma norma lhe impõe tal obrigação.
Improcede nesta parte o recurso.
2.5. Do valor
Nas conclusões do recurso, os Recorrentes pedem que o valor da causa seja reconhecido como sendo, no mínimo, de € 14.202,38.
O valor da causa foi fixado por despacho proferido na audiência prévia, do qual não foi interposto recurso. No entanto, não sendo fundamento de apelação autónoma, cumpre conhecer da pretensão neste momento – artigo 644.º, n.º 2 e 3, do Código de Processo Civil.
O valor que os Autores indicam respeita à soma da indemnização por danos não patrimoniais que pedem (€ 11.000,00), do montante relativo à restituição do que pagaram a mais (€3.102,38) e do montante do pagamento do cancelamento das hipotecas (€ 100,00).
O valor da causa foi fixado em € 29.100,00.
Foram formulados o pedido de nulidade da cláusula e de restituição do montante de € 9.000,00, pago a mais em virtude da alteração de prazo, o pedido de indemnização por danos não patrimoniais (€ 11.000,00) e o de pagamento das despesas de distrate (€ 100,00).
O pedido de declaração de nulidade não tem relevo económico que exceda o de condenação na restituição do montante pago a mais, uma vez que o contrato já se extinguiu. Em consequência, entende-se que, nos termos dos artigos 297.º, n.º 1, e 301.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o valor corresponde à soma das parcelas constituídas pelos pedidos pecuniários formulados, a saber, o de € 20.100,00.
Carece de fundamento a pretensão dos Autores de que seja fixado tendo em atenção os montantes que pedem neste recurso em função da revogação da decisão recorrida, por isso que para a fixação do valor se deve atender ao momento em que a acção é proposta – artigo 299.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

IV) DECISÃO
Pelo exposto, ACORDAM em julgar parcialmente procedente o recurso e, em consequência:
1) Alterar a decisão de facto nos termos consignados;
2) Revogar a decisão de fixação do valor da causa, fixando-o em € 20.100,00 (vinte mil e cem euros);
2) Revogar parcialmente a decisão recorrida e:
a) Condenar o Réu a pagar aos Autores o montante de € 3.102,38 (três mil, cento e dois euros e trinta e oito cêntimos), a título de indemnização por danos patrimoniais decorrentes de incumprimento contratual;
b) Condenar o Réu a pagar aos Autores o montante de € 3.000,00 (três mil euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais decorrentes de incumprimento contratual, absolvendo-os do demais pedido a esse título;
3) Manter no mais a decisão recorrida.
Custas pelos Autores/Recorrentes e pelo Réu/Recorrido, em ambas as instâncias, nas proporções respectivas de 69,64% (sessenta e nove vírgula sessenta e quatro por cento) e 30,36% (trinta vírgula trinta e seis por cento), por serem as do decaimento   – artigo 527.º, n.º 2, do CPC.
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Lisboa, 23-06-2022
Ana de Azeredo Coelho
Eduardo Petersen Silva
Manuel Rodrigues
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[1] Assim, Manuel Carneiro da Frada in Os deveres (ditos) “acessórios” e o arrendamento, consultado em https://portal.oa.pt/upl/%7Bd785b4f1-80eb-4b99-a33a-b654a218724e%7D.pdf.
[2] Sobre o tema, por todos, Fernando Ferreira Pinto in O concurso entre a responsabilidade contratual e a responsabilidade extracontratual, Revista de Direito Comercial, 20-11-2020, consultado em https://static1.squarespace.com/static/58596f8a29687fe710cf45cd/t/5fb7f1ad07ae9c7f2c8c806f/1605890479428/2020-38+-+1945-2018+-+LA-PV.pdf.
[3] (…) entre nós, a doutrina tende a desvalorizar a referida distinção, considerando não serem as discrepâncias do  regime das duas formas de responsabilidade suficientes para afirmar uma verdadeira diferença essencial ou de natureza entre elas refere Fernando Ferreira Pinto no esclarecido artigo que seguimos (cf. fls 68).
[4] Sobre a questão, veja-se o acórdão desta Relação de 4 de Novembro de 2021, proferido no processo 839/20.0T8AGH.L1-2 (Pedro Martins) e do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 2014, proferido no processo 77/09.3TBSVC.L1.S1 (Mário Mendes): vem sendo a jurisprudência dominante deste STJ que na responsabilidade contratual são indemnizáveis os danos não patrimoniais que mereçam a tutela do direito (art. 496.º, n.º 1, do CC).         
[5] Seguimos o nosso acórdão de 23 de Janeiro de 2020, proferido no processo 590/13.8TVLSB.L1.
[6] «Cumpre “não nos afastarmos do equilíbrio e do valor relativo das decisões jurisprudenciais mais recentes” (acórdão de 25 de Junho de 2002 (www.dgsi.pt, proc. nº 02A1321); nas palavras do acórdão deste Supremo Tribunal de 31 de Janeiro de 2012 (www.dgsi.pt, proc. nº 875/05.7TBILH.C1.S1), “os tribunais não podem nem devem contribuir de nenhuma forma para alimentar a ideia de que neste campo as coisas são mais ou menos aleatórias, vogando ao sabor do acaso ou do arbítrio judicial. Se a justiça, como cremos, tem implícita a ideia de proporção, de medida, de adequação, de relativa previsibilidade, é no âmbito do direito privado e, mais precisamente, na área da responsabilidade civil que a afirmação desses vectores se torna mais premente e necessária, já que eles conduzem em linha recta à efectiva concretização do princípio da igualdade consagrado no artº 13º da Constituição”» (cf. Acórdão de 21 de Fevereiro de 2013, proferido no processo 2044/06.0TJVNF.P1.S1 (Cons. Maria dos Prazeres Beleza).