Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
20637/20.0T8LSB.L1-4
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: PRINCÍPIO DA FILIAÇÃO
DIRIGENTES SINDICAIS
CRÉDITO DE HORAS
FALTAS JUSTIFICADAS
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 06/22/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Texto Parcial: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA A SENTENÇA
Sumário: IPor força do princípio da filiação, se um sindicato não subscreve um Acordo de Empresa, não pode a empresa invocar o texto deste instrumento de regulamentação colectiva para regular direitos de natureza sindical dos trabalhadores dirigentes de tal sindicato, devendo a existência e conteúdo de tais direitos aferir-se à luz do Código do Trabalho.

IIO artigo 468.º do CT, ao estabelecer o número máximo de dirigentes sindicais a beneficiar dos direitos nele previstos a crédito de horas e a faltas justificadas, tem em vista o número de trabalhadores sindicalizados existentes na empresa e, não, o número de sócios de cada sindicato.

(Sumário elaborado pela Relatora)

Decisão Texto Parcial:Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa


1. Relatório


1.1.AAA”, intentou a presente acção, com processo comum, contra BBB peticionando, no final da sua petição inicial que:

A) Seja declarado que às relações laborais entre autor e ré, concretamente em relação ao direito a crédito de horas e a faltas justificadas dos membros da direcção do autor, se aplica o disposto no art. 468° n° 1 e 2 al. a) a i), do Código do Trabalho e que os membros da direcção do autor têm direito a crédito de horas correspondente a quatro dias de trabalho por mês e a faltas justificadas nos termos aí previstos;

B) Seja declarado que em relação às relações laborais entre autor e ré, concretamente em relação ao direito a crédito de horas e a faltas justificadas dos membros da direcção do autor, não se aplica o disposto nos AE’s celebrados entre BBB e o (…) publicado no BTE n.°12 de 29.3.2020 e o AE celebrado entre BBB e o (…) publicado no BTE n.°17 de 8.5.2020, concretamente o disposto nas cláusulas 79.° e 98.°, respectivamente;

C) Seja a ré condenada na atribuição aos membros da direcção do autor do crédito de correspondente a quatro dias de trabalho por mês e a faltas justificadas nos termos previstos nas alíneas a) a i) do n° 2 do art. 468° do CT;

D) Seja a ré condenada na desaplicação ao autor, por ilícito e inconstitucional, do disposto nas cláusulas 79.ª e 98.ª dos AE’s celebrados entre BBB e o (…)  publicado no BTE n.° 12 de 29.3.2020 e o AE celebrado entre BBB e o (…)  publicado no BTE n.°17 de 8.5.2020, respectivamente;

E) Seja a ré condenada no pagamento ao Presidente da Direcção do autor, (…) do crédito de horas utilizado para exercício de funções/actividade sindical desde 1 Junho de 2020 e concretamente dos dias já utilizados e que foram os dias 29 Junho de 2020, 2, 3,16 e 25 de Julho de 2020, 5 e 13 Agosto de 2020 e 3 e 12 de Setembro de 2020;

F) Seja a ré condenada a pagar juros legais sobre as importâncias devidas e peticionadas, desde a data do seu vencimento e até efectivo e integral pagamento;

G) Seja a ré condenada no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória no montante de € 100,00 por cada dia de atraso no cumprimento da decisão definitiva que venha a ser sentenciada por este tribunal, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 829.°- A do CC.

Para tanto alegou, em síntese: que é uma associação sindical e que às relações laborais entre os seus dirigentes e a ré, concretamente em relação ao direito a crédito de horas e a faltas justificadas dos membros da sua direcção, se aplica o disposto no artigo 468°, n°s 1 e 2, als. a) a i), do Código do Trabalho, tendo os membros da sua direcção direito a crédito de horas correspondente a quatro dias de trabalho por mês e a faltas justificadas nos termos ali previstos; que a R. é empregadora do associado (…), Presidente da Direcção do Sindicato autor, do que foi informada pelo menos desde 14 de Outubro de 2014; que no exercício do direito previsto no artigo 468.° n.° 1 e 2 al. a) do Código do Trabalho, o A. requisitou por escrito o trabalhador (…) para actividade sindical no exercício das suas funções nos dias de Junho a Setembro de 2020, que enumera, o que a R. recusou por entender que o A. não tem direito a designar membro da direcção com direito a crédito de horas e a faltas justificadas, pois apenas as Organizações Sindicais com representatividade mínima de 50 trabalhadores, têm direito a tal.

Realizada a audiência de partes, e não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação da R. para contestar, vindo esta no seu articulado a invocar que o número máximo de membros da direcção com direito a crédito de horas é determinado na lei em função do número de trabalhadores sindicalizados e em função da dimensão da empresa e que, de acordo com o número total de trabalhadores sindicalizados na empresa, é calculado o número de dirigentes sindicais que depois terá que ser, à semelhança do que sucede com os delegados, repartido pelas organizações sindicais, consoante o respectivo nível de representatividade na empresa, pelo que, considerando o universo de trabalhadores da CP (em que 2494 trabalhadores em cerca de 4000 são sindicalizados), a lei prevê o direito a 8 membros de direcção com direito a crédito de horas, número a ratear por todos os sindicatos com representatividade na empresa. Alega ainda, sem prescindir, que o regime convencional dos AE’s Geral e SMAQ/2020 não reconhece às associações sindicais com representatividade inferior a 50 trabalhadores o direito a crédito de horas para os seus dirigentes, que é mais favorável que o regime legal e não se mostra violado o princípio da igualdade.

Foi proferido despacho saneador e o Mmo. Juiz a quo absteve-se de proferir o despacho previsto no art. 596º do CPC - art. 49º nº 3, do CPT – e fixou o valor da acção em € 30.000,01.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
«Por tudo o que ficou exposto e nos termos das disposições legais citadas, julgo procedente a presente acção e, em consequência, condeno a ré a pagar ao Presidente da Direcção do autor…, o crédito de horas utilizado para exercício de funções/actividade sindical nos dias 29 de Junho de 2020, 2, 3,16 e 25 de Julho de 2020, 5 e 13 Agosto de 2020 e 3 e 12 de Setembro de 2020, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde as datas dos respectivos vencimentos e até integral pagamento.
Custas pela ré – art. 527º, nºs 1 e 2, do CPC
[…]

1.2.O A., inconformado interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões:
(...)

1.3.Também a R. recorreu, concluindo que:
(…)”

1.4.Os recursos foram admitidos em 1.ª instância, o da R. com efeito suspensivo, atenta a caução prestada. O Mmo. Juiz a quo afirmou ainda que a sentença não enferma da nulidade invocada pelo A. 
                                                                                                               *

1.5.Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer no sentido de que, quanto ao recurso do A., pelo menos os pedidos enunciados sob as alíneas C) e G) deveriam ter sido objecto de apreciação e decisão, e, quanto ao recurso da R., que apenas restará atender à questão da verificação de abuso de direito na actuação do A., mas da matéria de facto provada – que não foi posta em causa neste recurso – não resultam elementos para que se conclua terem sido pelo A. excedidos os limites da boa-fé, nem tal conclusão resulta do mero enunciado dos procedimentos no âmbito da acção, não se traduzindo a perspectiva da R. a este respeito em dados objectivos, pelo que deverá este recurso improceder.
                                                                                                               *

Colhidos os vistos dos Exmos. Srs. Desembargadores Adjuntos, e realizada a Conferência, cumpre decidir.
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2. Objecto do recurso
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, aplicável “ex vi” do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal são, pela ordem lógica da sua apreciação, as seguintes:

1.ª da nulidade da decisão por omissão de pronúncia;
2.ª do direito a crédito de horas e a faltas justificadas do dirigente do Sindicato autor;
3.ª do abuso do direito;
4.ª dos pedidos declarativos e condenatórios formulados.

3. Fundamentação de facto

A sentença da 1.ª instância considerou provados os seguintes factos:

A)– O autor é uma pessoa colectiva sob a forma de associação sindical, com estatutos publicados no BTE n.° 22 de 15 de Junho de 2014 e posterior alteração publicada no BTE n.° 43 de 22 de Novembro de 2014, segundo os quais, “representa todos os trabalhadores ferroviários, qualquer que seja a sua categoria profissional, independentemente da natureza do vínculo, da Empresa, Departamento, Área geográfica ou local de trabalho”.

B)– São associados do autor e também dirigentes deste, os seguintes trabalhadores ao serviço da ré: … – Presidente.

C)– A ré é o empregador do associado …, Presidente da Direcção do Sindicato autor.

D)– A ré foi informada e sabe, pelo menos desde 14/10/2014, que o trabalhador (...) é Presidente da Direcção do Sindicato autor.

E)– Além de (...), Presidente da Direcção do Sindicato autor, este tem mais associados a prestar trabalho na ré, os quais descontam directamente pelo recibo de vencimento a quota sindical para o Sindicato.

F)–No exercício do direito previsto no artigo 468.° n.° 1 e 2 al. a) do Código do Trabalho, o autor requisitou o trabalhador (...), Presidente da Direcção do Sindicato autor, para actividade sindical no exercício das suas funções nos seguintes dias de trabalho:
- 29 Junho de 2020;
- 2, 3,16 e 25 de Julho de 2020;
- 5 e 13 Agosto de 2020;
- 3 e 12 de Setembro de 2020.

G)–Este crédito de horas solicitado pelo autor à ré foi pedido/comunicado por escrito, via email, através dos pedidos de dispensa n.° 10, 11 e 12 de 2020.

H)– Em resposta remetida pela ré ao autor via email, subscrita por RC....., a ré recusou a concessão do crédito nos seguintes termos:
Pedido de dispensa n.° 10
“Acusamos a receção da v. comunicação relativa à requisição do dirigente (...) para os dias 29.06 e 2, 3, 16 de Julho de 2020, que mereceu a nossa melhor atenção, e informamos que nos termos legais aplicáveis, relativo ao exercício da atividade sindical, o STF não tem direito a designar membro da direção com direito a crédito de horas e a faltas justificadas, nos termos do n.° 2 do artigo 468° do Código do Trabalho”.

I)– Em relação ao pedido de dispensa/crédito de horas e faltas de membro de direcção para o dia 25 de Julho de 2020, operado através da dispensa sindical n.° 11/2020, a ré, em comunicação escrita subscrita por (…), datada de 19/08/2020, recusou-o nos seguintes termos:
“Acusa-se a receção do v. pedido de dispensa sindical que antecede, a respeito do qual informamos não ter sido possível atender ao mesmo, uma vez que o dirigente em causa não tem direito a crédito de horas. Com efeito, apenas as Organizações Sindicais com representatividade mínima de 50 trabalhadores, tem direito a créditos sindicais – cf. n.°1 da cláusula 98.ª do AE Geral/2020 e n.°1 do artigo 498.° do CT a contrario.

Nesse sentido, como não poderá deixar de ser, as ausências com a aludida justificação serão, doravante, consideradas como injustificadas, com os devidos e legais efeitos. Exceção feita às ausências decorrentes da participação nas reuniões de negociação do Regulamento de Carreiras em curso, de acordo com comunicação anterior a esse respeito.”.

J)– Em relação ao pedido de dispensa/crédito de horas e faltas de membro de direcção para os dias 3 e 12 de Setembro de 2020, operado através da dispensa sindical n.° 12 e 13/2020, a ré, em comunicação escrita subscrita por (…), datada de 26/08/2020, recusou-o nos seguintes termos:
“Considerando que a posição da Empresa a respeito de créditos sindicais, por nós (JR) transmitida em 19/8/2020, não sofreu quaisquer alterações, informa-se que, pelos motivos então aduzidos, não é possível atender aos pedidos de dispensa sindical em anexo.”.

K)– A ré descontou ao trabalhador (...), na retribuição dos meses de Julho e Agosto, a retribuição correspondente aos dias de crédito de horas para o exercício das suas funções enquanto membro da direcção do AAA.

L)– No entender da ré e subjacente à recusa de concessão do crédito de horas e justificação de faltas ao trabalhador dirigente do autor, (...), está o argumento segundo o qual, à situação in casu e à relação laboral se aplica a Cl.ª 98ª do AE Geral/2020 e o n.° 1 do artigo 498.° do CT a contrario, isto é, como o autor tem menos de 50 associados ao serviço da ré, não pode beneficiar desse mesmo crédito pois só as associações sindicais com 50 ou mais associados gozam desse direito nos termos do dito AE.

M)– Na empresa ré, o STF, autor nos presentes autos, possui desde 2014 pelo menos um sindicalizado, in casu, o trabalhador (...), Presidente da Direcção do Sindicato e, à data de Agosto de 2020, possuía ainda os seguintes associados:
(…)(…) (…) (…) (…) (…) e (…).

N)– Em 2020, existiam em vigor na ré dois AE’s, a saber:
a)- O AE celebrado entre BBB e o AAA publicado no BTE n.° 12 de 29/03/2020;
b)- O AE celebrado entre BBB e o Sindicato Ferroviário da Revisão e Comercial Itinerante… publicado no BTE n.° 17 de 08/05/2020.

O)–O Sindicato autor não celebrou, não subscreveu nem assinou os ditos AE’s como outorgante, nem aderiu aos mesmos posteriormente.

P)–Em 2019, no universo de trabalhadores da CP, 2.494 trabalhadores, em cerca de 4.000, eram sindicalizados.
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4. Fundamentação de direito
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4.1. Da nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia

O autor, ora recorrente, suscita a nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia, em virtude de o tribunal a quo apenas ter decidido os pedidos constantes das alíneas e) e f) do pedido, omitindo pronúncia sobre os demais pedidos, que eram distintos do vertido na alínea e) e carecem de decisão/pronúncia.

Defende que todos os pedidos formulados são fundados de facto e de direito e devem ser julgados procedentes.

Cumpre apreciar e decidir.

Estabelece o artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, aplicável ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho ser nula a sentença sempre que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.

As questões a decidir reconduzem-se aos concretos problemas jurídicos que o tribunal tem que necessariamente solver em função da causa de pedir e do pedido formulado, das excepções e contra-excepções invocadas[1].

Deduz-se da alegação do reclamante que o mesmo considera ter o acórdão incorrido em omissão de pronúncia por não ter apreciado todos os pedidos deduzidos.

É sabido que as decisões judiciais incorrem em omissão de pronúncia quando deixam de pronunciar-se sobre questões que devessem apreciar (primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil), o que constitui cominação à violação do dever imposto ao tribunal, na primeira parte do n.º 2 do artigo 608.º do mesmo Código, de “resol­ver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras”.

Mas tal vício só existe quando a decisão omite qualquer pronúncia sobre determinada questão que deva conhecer e, não, quando o tribunal, invocando determinadas razões, deixa de conhecer da questão. Como diz o Prof. José Alberto dos Reis, “realmente uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar razão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção"[2].

Ou seja, se o tribunal invoca um fundamento, procedente, ou improcedente, para justificar a sua abstenção, nomeadamente por entender que o seu conhecimento se mostra prejudicado ou lhe está vedado por lei, poderá haver erro de julgamento que contende com o mérito da decisão – não com a sua estrutura formal – e é sindicável em via de recurso, podendo a parte questionar essa opção decisória. Em qualquer destes casos, designadamente se o julgador entende que a questão se mostra prejudicada, o que há é errore in judicando[3].

Ora, como ressalta da simples leitura da sentença, a mesma concluiu pela procedência da acção nos termos que ficaram vertidos no decisório e afirmou, expressamente, que ficou “prejudicada a apreciação das demais questões suscitadas nos autos” (sic.).

Concorde-se com esta perspectiva, ou discorde-se da mesma, não pode é dizer-se que a sentença omitiu pronúncia sobre as questões subjacentes à apreciação dos demais pedidos formulados na petição inicial.

Ainda que tal entendimento possa radicar num erro de julgamento, o que se analisará na sede própria, sendo caso disso, deve julgar-se improcedente a arguida nulidade por omissão de pronúncia.
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4.2.Do direito a crédito de horas e a faltas justificadas do dirigente do Sindicato autor

Cabe agora enfrentar a questão essencial que se coloca nas apelações da R. e do A. e da qual depende a resposta a todos os pedidos formulados.

Na petição inicial apresentada, o A. defende que aos membros da sua direcção se deve reconhecer o direito a crédito de horas e a faltas justificadas, aplicando-se o disposto no artigo 468°, n°s 1 e 2, als. a) a i), do Código do Trabalho.

A R., por seu turno, defende que o Código do Trabalho estabelece um número máximo de membros da direcção com direito a crédito de horas, sendo o mesmo determinado em função do número de trabalhadores sindicalizados e em função da dimensão da empresa, tendo em conta os escalões identificados nas alíneas do n° 2, do art. 468° do mesmo diploma legal, e que o número de dirigentes sindicais é calculado de acordo com o número total de trabalhadores sindicalizados numa empresa, que depois terá que ser repartido pelas organizações sindicais, consoante o respectivo nível de representatividade na empresa, à semelhança do que sucede com os delegados sindicais, pelo que, por referência ao total de 2.494 efectivos sindicalizados, considerando o universo de 4.000 trabalhadores da CP, a lei prevê o direito a 8 membros de direcção com direito a crédito de horas, número a ratear por todos os sindicatos com representatividade na empresa.

A sentença sob recurso, sobre este assunto, começou por afirmar que:
“Na verdade, a atribuição de créditos de horas a organizações sindicais que representam 1, 2 ou 5 trabalhadores, num universo de 2500 trabalhadores sindicalizados, não parece coincidir com o espírito da lei, no sentido em que a representação deve coadunar-se com a defesa de interesses difusos e colectivos”.

Não obstante, veio a considerar que a tese da R. não tinha apoio legal, essencialmente com base nas seguintes considerações:
“É certo que, nos termos do nº 2, al. g), do preceito transcrito e atento o que consta da alínea P) dos factos provados, na ré, o número máximo de membros de direcção de associação sindical com direito a crédito de horas e a faltas justificadas, será de oito.
E também é certo que, conforme referido em M) dos factos provados, em 2020, o tinha apenas 5 associados que eram trabalhadores da ré.
No entanto, além de o nº 2 do preceito em análise não estabelecer um limite mínimo de associados que permita aos membros de direcção de associação sindical usufruírem do direito a crédito de horas e faltas justificadas, a ré não alega, nem consequentemente prova, quantos mais dirigentes sindicais, no universo dos seus trabalhadores, já beneficiam de tal direito e quantos associados têm as respectivas associações sindicais, de modo a justificar, por uma questão de equidade, que se lance mão do critério de interpretação legal que pretende ver aplicado.
Assim sendo, em face da letra da lei e da factualidade adquirida no processo, nenhuma razão existe, sempre salvo melhor entendimento, para afastar o direito do dirigente sindical (...), beneficiar do direito a crédito de horas e a faltas justificadas, previsto no nº 1 do art. 468º do CT”.

E, após, afastou que ao caso sub judice fossem aplicáveis, quer o Acordo de Empresa (AE) celebrado entre BBB e o AAA, publicado no BTE n.°12 de 29.3.2020, quer o AE celebrado entre BBB e o … publicado no BTE n.°17 de 8.5.2020, concretamente o disposto nas cláusulas 79.° e 98.°, respectivamente.

Sustentando esta sua afirmação no disposto no artigo 496.º do Código do Trabalho, que estabelece o princípio da filiação, e no facto de o sindicato A. não ter celebrado, subscrito ou assinado os ditos instrumentos de regulamentação colectiva como outorgante, nem ter aderido aos mesmos posteriormente [alínea O) dos factos provados].

Não se compreende pois que o A. ora recorrente venha esgrimir de novo perante esta Relação a inaplicabilidade dos indicados AE’s, pois que nesse ponto não ficou vencido, (cfr. o artigo 631.º do Código de Processo Civil), sequer quanto aos fundamentos.

E quanto à R., se é certo que, como resulta da alínea L) dos factos provados, começou por recusar a concessão do crédito de horas e justificação de faltas ao trabalhador dirigente do A. sob o argumento da cláusula 98ª do AE Geral/2020 (segundo a qual só as associações sindicais com 50 ou mais associados gozam desse direito), é igualmente certo que na presente apelação, nas vestes de recorrente, não invoca já este instrumento de regulamentação colectiva para defender a sua posição, a não ser na perspectiva de que o A. teria incorrido em abuso do direito pois não subscreveu os AE’s exactamente por causa desta questão e veio invocar o indicado direito a crédito de horas e faltas justificadas conferido pelo artigo 468.º do Código do Trabalho – vide as conclusões D) a E) da apelação da R., em conjugação com o corpo das alegações.

Seja como for, deve dizer-se que não merece censura a sentença neste ponto, não se vendo como poderia a R. invocar os indicados instrumentos de regulamentação colectiva para regular direitos de natureza sindical de trabalhadores dirigentes de associações sindicais que os não subscreveram, sem um atropelo evidente ao princípio básico da filiação consagrado no artigo 496.º do Código do Trabalho, nos termos do qual “[a] convenção colectiva obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante” (n.º 1).

Sendo assim, como é, a existência e conteúdo de tais direitos devem aferir-se à luz da lei laboral.

O Código do Trabalho, em linha com os artigos 55.º e 56.º da Constituição da República Portuguesa, consagra um estatuto especial para os trabalhadores eleitos para as estruturas de representação colectiva dos trabalhadores, designadamente, no que concerne ao crédito de horas dos dirigentes sindicais e às suas ausências ao serviço por motivo do exercício das correspondentes funções sindicais.

Sobre o crédito de horas e faltas de membro de direcção rege o artigo 468.º do Código do Trabalho[4], nos termos do qual:
«1Para o exercício das suas funções, o membro de direcção de associação sindical tem direito a crédito de horas correspondente a quatro dias de trabalho por mês e a faltas justificadas, nos termos dos números seguintes.
2Sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, em cada empresa, o número máximo de membros de direcção de associação sindical com direito a crédito de horas e a faltas justificadas sem limitação de número é determinado da seguinte forma:
a)- Em empresa com menos de 50 trabalhadores sindicalizados, um;
b)-Em empresa com 50 a 99 trabalhadores sindicalizados, dois;
c)-Em empresa com 100 a 199 trabalhadores sindicalizados, três;
d)-Em empresa com 200 a 499 trabalhadores sindicalizados, quatro;
e)- Em empresa com 500 a 999 trabalhadores sindicalizados, seis;
f)-Em empresa com 1000 a 1999 trabalhadores sindicalizados, sete;
g)-Em empresa com 2000 a 4999 trabalhadores sindicalizados, oito;
h)-Em empresa com 5000 a 9999 trabalhadores sindicalizados, 10;
i)-Em empresa com 10 000 ou mais trabalhadores sindicalizados, 12.
3No caso de membro de direcção de federação, união ou confederação, a aplicação da fórmula referida no número anterior tem em conta o número de trabalhadores filiados nas associações que fazem parte dessa estrutura.
4O trabalhador que seja membro de direcção de mais de uma associação sindical não tem direito a cumulação de crédito de horas.
5Os membros de direcção que excedam o número máximo calculado nos termos dos números anteriores têm direito a faltas justificadas até ao limite de 33 por ano.
6A direcção da associação sindical deve comunicar ao empregador, até 15 de Janeiro de cada ano e nos 15 dias posteriores a qualquer alteração da sua composição, a identidade dos membros a quem se aplica o disposto no n.º 2.
7A direcção da associação sindical pode atribuir crédito de horas a outro membro da mesma, desde que não ultrapasse o montante global atribuído nos termos dos n.ºs 1 e 2 e informe o empregador da alteração da repartição do crédito com a antecedência mínima de 15 dias.

(…)».

Segundo o Professor Jorge Leite, o fundamento material do crédito para desempenho de funções sindicais confunde-se como o fundamento da própria liberdade sindical ou constitui dela complemento. Citando N. Bobbio, afirma que “a liberdade não consiste apenas em ser titular de poderes abstractos sem meios para os exercitar, mas sobretudo em ser titular de direitos e dispor de condições para os exercer[5]. Ainda de acordo com o pensamento do mesmo Professor, o conteúdo do direito da liberdade sindical tem um “conjunto complexo e heterogéneo de componentes” que abrangem, em termos sintéticos, “a liberdade sindical como liberdade negativa, a liberdade sindical como liberdade positiva e a liberdade sindical como conjunto de posições jurídicas activas”, sendo no âmbito das normas que atribuem estas posições jurídicas (que interferem na esfera jurídica de terceiros, impondo-lhes encargos ou sujeições correspondentes às vantagens que atribuem às associações sindicais, aos trabalhadores ou aos seus representantes) que se inscrevem as normas que atribuem o direito de não comparência na empresa para o desempenho de funções, umas vezes sem perda de retribuição (crédito remunerado), outras com perda de retribuição (faltas justificadas)[6].

Resulta com clareza do artigo 468.º do Código do Trabalho que a lei estabelece limites ao número de dirigentes sindicais que podem usufruir das vantagens nele expressas.

O problema que se coloca, em face da redacção do preceito e das várias alíneas do seu n.º 2, que estabelecem o número máximo de dirigentes sindicais com direito a crédito de horas e faltas justificadas, consiste em saber se a fórmula legal se aplica globalmente ao número de trabalhadores sindicalizados existentes na empresa ou se, em vez disso, a determinação do número máximo de dirigentes sindicais a beneficiar dos direitos previstos na norma se faz atendendo ao número de sócios de cada sindicato.

Na doutrina, Luís Gonçalves da Silva parece defender a segunda posição, ainda que a propósito do artigo 463.º do Código do Trabalho, preceito que estabelece o número máximo de delegados sindicais que beneficiam do regime de protecção previsto no Código. De acordo com este autor, que começa por afirmar que o legislador não resolveu expressamente a questão de saber se o número de trabalhadores sindicalizados a que o preceito se refere tem em conta a totalidade de trabalhadores sindicalizados existentes na empresa ou apenas os filiados no sindicato que o delegado sindical integra, deverá “ser tomad[o] em consideração o número de sindicalizados no sindicato de que o delegado sindical faz parte”[7].Argumenta o autor com o facto de o delegado sindical ter sido eleito exactamente para exercer actividade sindical na empresa [artigos 442.º, n.º 1, alínea f) e 462.º, n.º 1] e com o facto de o mesmo despender mais ou menos tempo nessa actividade consoante o número de representados. Já a propósito do artigo 468.º, em causa nos presentes autos, o autor não analisa expressamente a questão.

Já a Professora Maria do Rosário Palma Ramalho afirma, a este respeito, que:
No que toca aos critérios de atribuição do crédito de horas, a regra é a sua atribuição aos delegados sindicais e aos membros da direcção do sindicato em função da dimensão da empresa, nos termos dos arts. 463º e 468º respectivamente.
Da leitura destas normas, conjugadas com a norma geral do art. 408º poderia parecer que beneficiariam do regime de crédito de horas todos os membros eleitos para estas estruturas. Contudo, não pode ser assim, até porque nada impede que todos os trabalhadores sejam eleitos delegados sindicais pela respectiva associação. Na realidade, o que decorre do art. 463º nº 1 e do art. 468º nº 2 é que, independentemente do seu número total, apenas um  determinado número de delegados sindicais ou de membros da direcção do sindicato (que é indexado à dimensão da empresa) beneficia do crédito de horas. Entendemos que, neste caso, compete à associação sindical comunicar ao empregador quais são os trabalhadores delegados sindicais que devem ser considerados para efeitos do crédito de horas.
Por outro lado, uma vez que o art. 463º nº 1 reporta aquele número de delegados sindicais à empresa e não a cada associação sindical que nela tenha delegados sindicais, se várias associações sindicais actuarem na empresa, julga-se que caberá ratear entre elas o número máximo de delegados sindicais com crédito de horas previsto nesta norma, tendo em conta o grau de representatividade de cada uma das associações, para o que se atenderá ao número de trabalhadores filiados em cada uma[8].

Ainda que reconhecendo a dificuldade da questão, entendemos ser esta última posição a mais consentânea com os termos em que o artigo 468.º, n.º 2 do Código do Trabalho regula esta matéria, particularmente com a expressão constante do corpo do preceito quando o mesmo indica que “em cada empresa” o número máximo de membros da direcção com os indicados direitos “é determinado da seguinte forma: a) em empresa com menos de 50 trabalhadores sindicalizados, um; b) em empresa com 100 a 199 trabalhadores sindicalizados, dois; (…)”.

Não só a letra do preceito circunscreve logo no início a “cada empresa” o número máximo de dirigentes a atender, como ainda nenhuma indicação é feita na norma – expressa ou implicitamente – no sentido de reconduzir o intérprete a aferir daquele máximo tendo como referência “cada” associação sindical ou sindicato.

Assim, na esteira do defendido pela Professora Maria do Rosário Palma Ramalho, afigura-se-nos que a interpretação correcta do preceito é no sentido de considerar que os limites expressos no n.º 2, do artigo 468.º, do Código do Trabalho, se referem ao número total de trabalhadores sindicalizados na empresa e não ao número de trabalhadores sindicalizados em cada sindicato dos que têm trabalhadores seus filiados ao serviço da empresa.

No caso sub judice, resulta dos factos provados que em 2019, no universo de trabalhadores da CP de cerca de 4.000 trabalhadores, 2.494 trabalhadores eram sindicalizados [facto P)] e que o Sindicato A. tem 6 associados, um deles seu dirigente [factos E) e M) e conclusão E].

Tendo em atenção o disposto no artigo 468.º, n.º 2, alínea g) do Código do Trabalho, “[s]em prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, em cada empresa, o número máximo de membros de direcção de associação sindical” com os direitos previstos no preceito, é, “[e]m empresa com 2.000 a 4.999 trabalhadores sindicalizados, de oito”.

À luz do Código do Trabalho, é pois de 8 o número máximo de dirigentes sindicais trabalhadores da empresa da R. beneficiários dos direitos previstos no preceito, uma vez que nela há 2.494 trabalhadores sindicalizados.

Tendo em consideração que destes 2.494 trabalhadores sindicalizados, 6 são sindicalizados no A., e procedendo ao rateio devido, é de concluir que, à luz do Código do Trabalho, não pode reconhecer-se ao identificado dirigente do Sindicato A. o direito a crédito de horas e a faltas justificadas reconhecido aos membros da direcção de associação sindical nos termos previstos no artigo 468°, n°s 1 e 2 do Código do Trabalho[9].

Deve dizer-se que não vemos que esta interpretação do artigo 468.º do Código do Trabalho ofenda “um direito legal e constitucional fundamental deste e um direito, liberdade e garantia” tal como conclusivamente aduz o A. nas suas alegações, e que designadamente ofenda os preceitos constitucionais dos artigos 46.º, 55.º e 56.º da Constituição da República Portuguesa. Quer a liberdade de associação, quer a liberdade sindical, quer os direitos constitucionais e das associações sindicais e contratação colectiva, na medida em que se concretizam também neste tipo de normas constitutivas de direitos que interferem na esfera jurídica do empregador que, desse modo, se vê temporariamente privado do poder de exigir a prestação de trabalho contratualmente assumida pelo trabalhador e mantém, mesmo assim, o dever de pagar a retribuição, se mostram salvaguardados com a previsão de um número máximo de dirigentes sindicais com direito a crédito de horas e faltas justificadas “em cada empresa”. A restrição decorrente da fixação pelo legislador deste tecto, que é proporcionalmente mais alto consoante a empresa tem um maior número de trabalhadores sindicalizados (vejam-se as várias alíneas do n.º 2 do artigo 468.º do CT) mostra-se efectuada em medida que se prefigura como adequada à prossecução dos fins visados pela lei, necessária e em “justa medida”, na medida em que, apesar de o preceito reportar o número máximo de dirigentes sindicais a cada empresa e não a cada associação sindical que nela tenha delegados sindicais, se várias associações sindicais actuarem na empresa, julga-se que caberá ratear entre elas o número máximo de dirigentes sindicais com crédito de horas, tendo em conta o grau de representatividade de cada uma das associações, para o que naturalmente se atenderá ao número de trabalhadores filiados em cada uma, não se revelando assim, a nosso ver, como desproporcionada ou excessiva.

Procede neste aspecto o recurso da R. e improcede o do A.
                                                                                                               *

4.3.Do abuso do direito
Alega a R., recorrente, que o A. actua em abuso de direito, por ser ilegítimo o seu exercício, pois não está a proceder de um modo honesto e leal e viola expectativas incutidas na contraparte e, mais ainda, nos colegas de trabalho.

Radica esta afirmação na circunstância de o Sindicato A., apesar de ter participado nas negociações dos Acordos de Empresa, ter entendido não os subescrever exactamente por causa desta questão.

Ora, em primeiro lugar, concluindo nós que ao direito a crédito de horas e a faltas justificadas dos membros da direcção do autor, se aplica o disposto no art. 468° n° 1 e 2 al. a) a i), do Código do Trabalho e que, de acordo com o regime deste preceito, o dirigente do A. não tem direito a crédito de horas e a faltas justificadas nos termos aí previsto, é patente que não podem afirmar-se os direitos peticionados.

E, assim, mostra-se prejudicada a análise da questão do abuso do direito que a R., ora recorrente, também fez constar das suas alegações, pois que, se não se reconhece ao A. o direito em causa, não chega a colocar a questão do eventual abuso de tal inexistente direito.

Na verdade, só é lícito o recurso ao instituto do abuso do direito quando se esteja perante o exercício de um direito ou de uma faculdade jurídica de que se seja titular, não havendo espaço para o seu funcionamento quando a pessoa contra quem for utilizado não é titular do direito ou da faculdade jurídica invocada, como ocorre no caso em análise[10].

Seja como for, não pode deixar de se dizer que a conduta do A. de se fazer valer do regime do Código do Trabalho através da presente acção não é contraditória com a não subscrição do Acordo de Empresa mas, ao invés, coerente com a mesma. Se o A. não assinou o AE porque não concordava com o regime que nele se plasmou a este propósito e estava convicto de que o regime legal lhe era mais favorável, actua com lisura e boa fé quando, em conformidade com aquela sua atitude, invoca o regime jurídico plasmado no Código do Trabalho a propósito do número máximo de dirigentes sindicais que têm direito a créditos de horas e faltas justificadas para desempenho de funções sindicais.
                                                                                                              *

4.4.Dos pedidos declarativos e condenatórios formulados
Em face do que ficou decidido quanto ao direito a crédito de horas e a faltas justificadas dos membros da direcção do autor, é patente que não pode proceder qualquer um dos pedidos pedidos formulados pelo A. na sua petição inicial.

Pelo que deve revogar-se a sentença na parte em que a mesma condenou a R. a pagar ao Presidente da Direcção do autor, (...), o crédito de horas utilizado para exercício de funções/actividade sindical nos dias 29 de Junho de 2020, 2, 3,16 e 25 de Julho de 2020, 5 e 13 Agosto de 2020 e 3 e 12 de Setembro de 2020, acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde as datas dos respectivos vencimentos e até integral pagamento.

E, colmatando a omissão de pronúncia quanto aos demais pedidos, julgam-se os mesmos improcedentes na medida em que a sua procedência dependia do reconhecimento ao A. e ao seu dirigente sindical dos indicados direitos.

Improcede o recurso do A. no que concerne ao seu mérito. 

Procede o recurso da R.
                                                                                                               *

O A. ficou vencido no recurso que interpôs pois, apesar de ver declarada a nulidade da sentença no que concerne aos aspectos por si assinalados, certo é que este tribunal se substituiu à 1.ª instância quanto aos pedidos em falta e o A. não viu atendidas as suas pretensões (não se autonomiza a pretensão de aplicar o Código do Trabalho, pois que, em bom rigor, se trata apenas de um pressuposto dos verdadeiros pedidos formulados).

E decaiu igualmente no recurso interposto pela R., na medida em que a não procedência da questão do abuso do direito não teve reflexo autónomo na decisão final de mérito, não tendo o A. logrado vencimento em qualquer questão.

Assim, tendo o A. ficado vencido em ambos os recursos, as custas inerentes aos mesmos recaem sobre si (cfr. artigo 527.º, do Código de Processo Civil). Mostrando-se pagas as taxas de justiça e não havendo encargos a contar nos recursos que, para efeitos de custas processuais, configuram processos autónomo (artigo 1.º, n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais), a condenação é restrita às custas de parte que haja (artigo 4.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais) e apenas no que concerne ao recurso da R., pois quanto ao recurso do A., uma vez que a R. não contra-alegou nem, por isso, teve despesas com o recurso, não há lugar a custas.
                                                                                                               *

5. Decisão

Em face do exposto, decide-se:
5.1.- julgar procedente a invocada nulidade por omissão de pronúncia;
5.2.- absolver a R. de todos os pedidos formulados na petição inicial.
Sem custas o recurso interposto pelo A.
Condena-se o A. nas custas de parte que haja a contar relativamente ao recurso interposto pela R.



Lisboa, 22 de Junho de 2022



(Maria José Costa Pinto)
(Manuela Bento Fialho)
(Sérgio Almeida)



[1]Vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 2015.02.02, Processo: 5901/13.3YYPRT-B.P1, in www,dgsi.pt.      
[2]In Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, reimpressão, Coimbra, p. 143.
[3]Vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2010.11.11, Revista n.º 2467/06.4TBAMT.P1.S1 - 7.ª Secção e de 2006.06.20, Revista n.º 1443/06 - 1.ª Secção, ambos sumariados in www.stj.pt.
[4]Cfr. ainda os artigos 408.º e 409.º do Código do Trabalho.
[5]No seu escrito «Crédito remunerado para desempenho de funções sindicais», in Questões Laborais n.º 1, Ano I, 1994, pp. 3 e ss.
[6]No seu escrito «Crédito para desempenho de funções – um crédito mal amado», in revista Questões Laborais n.º 42 (especial comemorativo dos vintes anos da revista), Ano 20.º, Dezembro de 2013, pp. 9 e ss. Vide ainda do mesmo Professor «A ausência do trabalhador no desempenho de funções sindicais»,  in Revista do Ministério Público Ano 8.º, 1987, n.º 32, pp.32 e ss.
[7]In Código do Trabalho Anotado, sob a coordenação de Pedro Romano Martinez e outros, 8.ª edição, Coimbra, 2009, p. 1134.
[8]Maria do Rosário Palma Ramalho, in “Tratado de Direito do Trabalho – Parte III – Situações Laborais Colectivas”, Coimbra, 2012, pp. 76 e ss..
[9]De acordo com o seguinte cálculo proporcional 6 x 8 / 2494 = 0,01. Note-se que se todos os sindicatos tivessem 6 trabalhadores sindicalizados, como o A., e fosse de considerar apenas o número de sindicalizados em cada sindicato, haveria na empresa da R. 416 dirigentes sindicais com direito a créditos de horas e a faltas justificadas, estas sem limitação de número (2.494/6= 415,6). E, a seguir esta tese por que o A. propugna, poderiam, em teoria, existir muitos mais dirigentes nestas circunstâncias, bastando para o efeito que os múltiplos sindicatos possíveis tivessem ainda menos trabalhadores sindicalizados.
[10]Vide o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 2016-03.14, Processo 3274/10.5TBSTS.P1, in www.dgsi.pt.      


Decisão Texto Integral: