Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
1594/17.7T8VCT.L1-2
Relator: ANTÓNIO MOREIRA
Descritores: INFORMAÇÃO BANCÁRIA
OFENSA AO BOM NOME
RESPONSABILIDADE CIVIL
PERDA DE CHANCE
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 10/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE
Sumário: 1- A participação de um facto, não verídico, à Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal, constitui uma ofensa ao crédito e bom nome dos visados.
2- Incorre em responsabilidade civil por factos ilícitos a entidade financeira que efectuou uma comunicação de responsabilidades ao Banco de Portugal, indicando cada um dos dois créditos dos AA. como “vencido em litígio judicial”, quando devia ter efectuado a indicação de cada um deles como “renegociado”.
3- Só se pode afirmar a existência de danos patrimoniais causados por essa comunicação incorrecta na medida em que daí decorra a efectiva perda da oportunidade de obtenção do crédito visado pelos AA., sendo essa perda de oportunidade causadora de um dano, quer na vertente de despesas acrescidas pela não aquisição do bem a que se destinava o crédito visado, quer na vertente de ganhos ou vantagens que ficaram por receber em razão da não aquisição desse bem.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:
Hipólito S. e Paula S. propuseram acção declarativa com processo comum contra C., pedindo a condenação da R. no pagamento de uma indemnização por danos morais no valor de € 9.000,00, bem como de uma indemnização por danos patrimoniais no valor de € 16.498,00, acrescidas de juros de mora à taxa legal.
Alegam para tanto e em síntese que:
· Encontram-se a pagar pontualmente dois créditos de que é titular a R., no âmbito de um plano de pagamentos aprovado pelos credores em processo de insolvência e homologado por sentença transitada em julgado;
· Viram ser recusados por duas instituições de crédito distintas um pedido de empréstimo da quantia de € 12.000,00, para aquisição de um veículo automóvel, em virtude de constar na Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal que os créditos da R. sobre os AA. se encontram na situação de “vencido em litígio judicial”;
· Tal menção decorre das informações incorrectas que a R. prestou ao Banco de Portugal, o que determinou a impossibilidade de toda e qualquer instituição financeira lhes conceder crédito, impedindo-os de adquirir um novo veículo automóvel;
· O seu actual veículo apresenta problemas mecânicos graves, que representam custos elevados de manutenção e de insegurança na condução do mesmo;
· Desta situação decorrem danos emergentes, com a assessoria jurídica e a sua representação em juízo, no valor de € 3.825,00, correspondente a honorários estimados, acrescidos de IVA, taxas de justiça e despesas de deslocação e ainda despesas, no valor de € 150,00, com deslocações acrescidas e dias de trabalho perdidos a contactar outras instituições de crédito;
· Por não terem podido adquirir um novo veículo automóvel sentiram vergonha e constrangimento, por serem reputados perante as entidades financeiras como incumpridores, o que causou ofensa ao seu bom nome.
Regularmente citada, a R. apresentou contestação, na qual se defende por impugnação, invocando que está correcta a informação que prestaram ao Banco de Portugal, em cumprimento da sua obrigação legal, já que os AA. se apresentaram à insolvência e apenas em Agosto de 2016 iniciaram os pagamentos à R., quando tal início devia ter ocorrido em 15/7/2016. Mais impugnaram os factos alegados pelos AA. e relativos aos danos alegados, concluindo pela improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.
Os AA. foram convidados a suprir as insuficiências da matéria factual alegada na P.I. e relativa aos danos patrimoniais alegados, não tendo respondido a tal convite.
Em audiência prévia foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu a R. dos pedidos.
Os AA. recorrem desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem:
I. O Tribunal ad quo considera indiferente o cumprimento ou não do dever legal de informação, o qual obriga à prestação de informações corretas e rigorosas por parte da Ré quanto à classificação do crédito, ao montante pago, ao seu remanescente e às datas do início e termo do seu pagamento.
II. De acordo com o Caderno 5 o crédito “renegociado” tem um carácter inequivocamente positivo ao lado do crédito “regular” enquanto que, a classificação do “vencido em litigio” tem um notório carácter negativo, assim, a conclusão, de que o crédito renegociado tem carácter negativo, não tem fundamento legal visto que em nenhum local está escrito que a “a classificação de crédito renegociado para efeitos da informação da Central de Responsabilidades de Crédito, assume um carácter negativo”, constituindo esta conclusão um juízo de mero valor, não a extração de uma conclusão com previsão normativa e com forma obrigacional legal.
III. Os Autores alegaram que a classificação correta é a de crédito renegociado e, que perante as falsas informações prestadas reiteradamente ao longo de 2 anos, pela Ré ao Banco de Portugal ficam automaticamente impedidos da mera apreciação da sua solvabilidade para efeitos da concessão de crédito.
IV. Portanto, os Autores não vieram aos autos alegar que tinham garantida a concessão de crédito, mas a absoluta impossibilidade de concessão com a classificação ilícita de “vencido em litígio judicial”, transmitida pela Ré.
V. Nesta matéria o Tribunal ad quo andou mal porquanto, o único dever que aqui existe, é o dever legal de informação e este impende sobre a Ré e não sobre os Autores, este dever legal de informação que impende sobre a Ré está sujeito a requisitos de verdade e de rigor, de acordo com o disposto no artigo 3.º n.º 1 do DL 204/2008 de 14/10 e, a sua violação é punível.
VI. O Caderno 5 do Banco de Portugal constitui um auxiliar de trabalho para a Ré que como instituição bancária ou financeira está obrigada a observar e um guia de informações sobre a Central de Responsabilidades de Crédito para os clientes bancários em geral.
VII. Não existe qualquer norma jurídica que obrigue os Autores a contactar a Ré, nem a violação desse alegado dever prevê qualquer sanção.
VIII. A verificação da ilicitude reiterada da conduta da Ré, com o envio de informações falsas ao Banco de Portugal, constitui responsabilidade civil extracontratual.
IX. A conduta da Ré causou danos patrimoniais e morais aos Autores, danos esses que deveriam ter sido efetivamente apurados em sede de julgamento, caso tivesse sido possível e concretizável tal fase judicial.
X. Cada instituição bancária ou entidade prestadora de créditos é livre de avaliar o risco na sua concessão de créditos aos seus Clientes, assim, não é certo que os Autores não tivessem conseguido crédito se as informações contidas nas suas CRC estivessem corretas!
XI. A participação de informações falsas à Central de Responsabilidades de Crédito que vêm prestado desde setembro de 2016 ao indicar o crédito do Autor como vencido em “litígio judicial” constitui desde logo violação da sentença de homologação do plano de Pagamento dos Autores.
XII. Mas principalmente constitui violação do dever legal de informação à Central Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal, artigo 2.º n‑º 4 do Decreto-Lei n.º 204/2008, de 14 de outubro.
XIII. Por consequência a Ré incorreu em responsabilidade civil extracontratual,
XIV. E consequentemente constituiu-se na obrigação de indemnizar os danos daí resultantes, ao ter efetuado a participação de informações falsas à Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal, nos termos do disposto nos artigos 483.º e 486.º do CC
XV. A participação de um facto falso à Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal constitui ofensa ao crédito e ao bom nome dos autores, artigos 26.º n.ºs 1 e 3, 12.º n.º 3 e 16.º n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
XVI. A Ré fez constar desde Setembro de 2016 que o credito dos Autores como “vencido em litigio judicial”, entendendo-se como tais «os créditos vencidos ou abatidos ao ativo em litígio judicial são aqueles que, encontrando-se numa situação de incumprimento (ou seja, classificados como vencidos ou abatidos ao ativo), a sua existência, validade, exigibilidade ou execução se encontre pendente de ação declarativa ou executiva, desde a propositura da ação até ao encerramento do processo. Os créditos devem ser classificados desta forma pelas entidades participantes na CRC desde que se inicia o processo até à decisão final, e enquanto o crédito se encontrar em incumprimento.»
XVII. Mas a classificação adequada e correta é a de crédito renegociado que se definem como «Os créditos renegociados, para efeitos de comunicação à CRC, são aqueles que resultam de operações de crédito efetivamente concedido que, tendo entrado em situação de incumprimento (pelo facto do seu pagamento não ter ocorrido nos termos inicialmente acordados), foram objeto de renegociação entre a entidade participante e o cliente, sem que tenham sido prestadas garantias adicionais e em que o cliente esteja a cumprir as condições de pagamento acordadas.»
XVIII. A diferença entre estas classificações é abismal pois que, nos “créditos vencidos em litígio” a sua existência, validade, exigibilidade ou execução encontra-se pendente de acção declarativa ou executiva, desde a propositura da ação até ao encerramento do processo, enquanto que nos créditos renegociados o cliente, sem que tenham sido prestadas garantias adicionais encontra-se a cumprir as condições de pagamento acordadas.
XIX. No caso dos autos está documentalmente comprovado mediante a junção dos respectivos “mapas” da Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal que:
i. a Ré prestou informações falsas ao Banco de Portugal – facto voluntário do agente, artigo 2.º n-º 4 do Decreto-Lei n.º 204/2008, de 14 de outubro;
ii. agindo em violação do dever legal de informar com verdade e rigor – que constitui uma atuação ilícita, artigo 483.º n.º1 CC;
iii. perante o dever legal de informação a Ré atuou sabendo que tal conduta é ilícita e ainda assim, mantém a falsidade das informações até à presente data – o que é demonstrativo da sua culpa, artigos 483.º n.º1, 487.º n.º2 CC;
iv. o conhecimento das informações falsas causaram aos Autores sofrimentos e angustias e, impediram-nos de aceder ao crédito junto de instituições bancárias e financeiras do Pais, artigo 563.º CC;
v. tal violação causou danos, danos morais e patrimoniais, aos Autores, artigos 70.º, 484.º, 496.º n.º 1 e 564.º n.º1 do CC.
XX. O entendimento do Tribunal ad quo no sentido de que não se verifica a responsabilidade civil extracontratual da Ré com base na fundamentação de que a classificação de crédito renegociado tem carácter negativo e na de que sobre os Autores impendem o dever de pedir à Ré a sanação da sua conduta ilícita, o que estes não alegaram, padece de inconstitucionalidade material.
XXI. Tal interpretação e aplicação do art 483º do CC conjugado com o disposto no artigo 3.º n.º 1 do DL 204/2008 de 14/10 viola o Direito Fundamental de direito à tutela jurisdicional efectiva, dos princípios da legalidade, do Estado de Direito Democrático, da confiança, da proporcionalidade, da justiça, da imparcialidade e da boa fé, da confiança e do direito pessoal à imagem e ao bom nome, cristalizados nos art. 20º n.º 4, no art. 1º e 2º, no art. 266º nº 1 e 2 e no art. 26.º n.ºs 1 e 2 da nossa Constituição.
A R. apresentou alegação de resposta, sustentando a manutenção da sentença recorrida.
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Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Novo Código de Processo Civil, as questões submetidas a recurso, delimitadas pelas aludidas conclusões, prendem‑se com:
a) a afirmação da ilicitude da conduta da R., face à violação do dever de prestação de informações correctas ao Banco de Portugal, relativamente às responsabilidades dos AA.;
b) a inconstitucionalidade da interpretação que o tribunal recorrido fez do disposto no art.º 483º do Código Civil, quando conjugado com o disposto no art.º 3º, nº 1, do D.L. 204/2008, de 14/10.
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A sentença recorrida considerou como provada a seguinte matéria de facto, correspondente à alegada pelos AA. na P.I.:
1) Os AA. encontram-se a proceder ao pagamento à R., de forma pontual e integral, de dois créditos, com os n.ºs … e …, da titularidade da R., mediante o Plano de Pagamentos aprovado pelos credores e homologado por sentença transitada em julgado, notificada em 15/1/2016, nos autos que correram seus termos sob o Proc. (…), em que a R. também interveio.
2) Os AA. vêm cumprindo estes créditos de acordo o referido Plano e com base no modo de pagamento indicado pela própria R. na sua Resposta, apresentada em 13/10/2015.
3) Os AA. viram recusado o seu pedido de empréstimo no valor de € 12.000,00 destinado à aquisição de um veículo automóvel para substituição do seu antigo Opel Corsa B com matricula …-…-FL de 1995.
4) A recusa foi transmitida pela instituição D, que, por e-mail de 23/1/2017, comunicou que “Conforme o disposto no art.10º do DL 133/09 de 2 de Junho, informamos que a sua proposta de crédito n.º … foi recusada após consulta à Central de Responsabilidades de Crédito (CRC) gerida pelo Banco de Portugal. Informação registada junto da CRC que motivou a recusa: credito vencido 5.697,00 EUR”.
5) A recusa de empréstimo veio também da parte da instituição E, que em resposta ao pedido de empréstimo comunicou que “Tal decisão fundamentou‑se no facto de V. Exa estar registado na Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal com responsabilidades em mora/incumprimento”.
6) Os AA. têm os seus nomes sombreados no ficheiro da Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal respeitante às responsabilidades referentes a Setembro de 2016 e de Março de 2017, porque a R. informou a instituição supervisora que os seus créditos se encontram na situação de “vencido em litígio judicial”.
7) Os AA. sentiram desgosto, vergonha e constrangimento por serem reputados perante as entidades financeiras e bancárias como incumpridores e por não poderem adquirir o veículo automóvel que é imprescindível ao seu transporte para o trabalho, sendo que não têm transportes públicos para o trabalho, além de que trabalham, também, por turnos.
8) O preço do veículo automóvel que os AA. pretendem adquirir para substituição do seu antigo ascende a cerca de € 11.000,00.
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As questões suscitadas neste recurso são exactamente as mesmas que já foram suscitadas no recurso do processo nº 3906/17.4T8VIS.L1, na parte em que foi impugnada a sentença proferida numa acção com contornos factuais e jurídicos em tudo idênticos ao da acção proposta pelos AA. e aqui recorrentes.
A semelhança entre os dois recursos é tal que as conclusões apresentadas neste apresentam a mesma redacção das que ali foram apresentadas (na parte da impugnação da sentença).
E tal recurso foi já conhecido por este Tribunal da Relação de Lisboa, através do acórdão de 16/5/2019, relatado por Cristina Neves e disponível em www.dgsi.pt.
Nesse acórdão ficou afirmado, após reprodução da fundamentação constante da sentença recorrida (do mesmo teor e sentido que a fundamentação constante da sentença recorrida neste processo), que:
Efectivamente no âmbito da responsabilidade civil por factos ilícitos, incumbe ao putativo lesado alegar e provar o facto ilícito, o dano e o nexo de causalidade entre os factos e os danos.
Em causa está a ocorrência de um ilícito consistente na prestação de informações não verídicas ao Banco de Portugal, enquadrando-se os AA. na categoria de créditos vencidos, ao invés de créditos renegociados.
Efectivamente, conforme refere o Ac. do STJ de 01/07/14 (relator Hélder Roque, Proc. nº 504/10.7TCGMR.S1, disponível in www.dgsi.pt) “Na categoria dos tipos de créditos em situação de incumprimento de pagamento, também designados por créditos vencidos, sob o ponto de vista da responsabilidades dos devedores, de acordo com a natureza das operações, com base na agregação de saldos de contas do Plano de Contas para o Sistema Bancário, existe a classificação de créditos em mora, compreendendo os créditos e juros não pagos, no prazo contratado, de créditos em contencioso, compreendendo os créditos e juros não pagos, no prazo contratado, mas mantendo-se, no entanto, expectativas de cobrança, e cujos processos transitaram para os serviços de contencioso da instituição financeira respetiva, e de créditos abatidos ao activo, compreendendo os créditos e juros vencidos que foram abatidos das contas de crédito, mas que continuam em cobrança.
Os créditos renegociados resultam de operações de crédito, efetivamente, concedido que, tendo entrado em situação de incumprimento, decorrente da simples mora ou já da sua transição para a fase de contencioso, pelo facto de o seu pagamento integral não ter ocorrido, nos termos, inicialmente, acordados, foram, entretanto, renegociados, sem garantias adicionais, entre a entidade participante e o beneficiário do crédito, quanto à forma ou ao prazo de pagamento, deixando, assim, de se encontrar na situação de incumprimento e, portanto, de constituir um crédito vencido. No entanto, o tipo classificativo dos créditos renegociados faz parte das situações objeto de informação mensal relevante, a enviar pelas entidades participantes ao Banco de Portugal.”
A A., conforme decorre do artº 1 nº1 a) é uma da entidades abrangidas pelo D.L. 204/2008 de 14/10, cabendo assim à Central de Responsabilidades de Crédito do B. de Portugal, “centralizar as responsabilidades efectivas ou potenciais de crédito concedido por entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, abrangendo “a informação recebida relativa a responsabilidades efectivas ou potenciais decorrentes de operações de crédito, sob qualquer forma ou modalidade, de que sejam beneficiárias pessoas singulares ou coletivas, residentes ou não residentes em território nacional” (nº2), sendo a responsabilidade pela informação divulgada “das entidades que a tenham transmitido, cabendo exclusivamente a estas proceder à sua alteração ou rectificação, por sua iniciativa ou a solicitação dos seus clientes, sempre que ocorram erros ou omissões” (artº 2 nº4).
Exige-se assim, perante o Dec. Lei 204/2008 “que a comunicação de dados alusivos a um crédito concedido por uma instituição financeira, da inteira responsabilidade da entidade participante, seja feita de forma exacta, isto é, exprimindo com rigor a realidade do relacionamento entre a entidade bancária e o cliente, nomeadamente quando está em causa a comunicação de uma situação de incumprimento.
Igual exigência decorre da Lei n.º 67/98 de 26 de Outubro (Lei da Protecção de Dados Pessoais), que transpõe para a ordem jurídica portuguesa a directiva 95/46/CE, do parlamento europeu e do conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados; O elemento em causa – crédito concedido pela entidade bancária a um seu cliente e informação sobre incumprimento – é relativo a uma pessoa singular identificada e consubstancia um dado pessoal, sendo protegido e tutelado enquanto tal.” [Ac. do TRL de 20/05/2014, relatora Isabel Fonseca, proc. 1723/10.1YXLSB.L1‑1, disponível in www.dgsi.pt]
Está alegado pelos AA. e decorre dos factos assentes a existência de uma omissão ilícita, resultante de a R. não ter, na sequência da homologação de plano de pagamentos, em que a sua aprovação foi suprida, corrigido a comunicação efectuada ao Banco de Portugal, para crédito renegociado, o que constitui a omissão de um dever legal de informação (correcta) que resulta do disposto no artº 2 nº1 do D.L. 204/2008 de 14 de Outubro.
Ao contrário do que alegava a R., a classificação correcta deste crédito, decorrente desta sentença notificada em 10/02/16, que deveria ter sido comunicada ao Banco de Portugal, era de “crédito renegociado” (código 005) e não já de “crédito vencido” (código 003).
Assim, a violação de um dever legal de informação correcta ao B. de Portugal, constitui o R. em responsabilidade civil para com os AA., desde a data em que deveria ter sido operada a comunicação da alteração deste crédito, desde que, da inobservância deste dever de corrigir a informação de “crédito vencido” para “crédito renegociado”, tenham resultado prejuízos para os AA., uma vez que, mesmo «as simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando, independentemente dos outros requisitos legais, havia, por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de praticar o acto omitido» (artº 486 CC.)
E que este dever existia não está aqui em causa. Cabe à instituição efectuar as referidas comunicações e a responsabilidade pela sua correcção é sua, não do seu cliente, nem do Banco de Portugal.
Aqui chegámos e debruçando-nos sobre outra questão referida no âmbito deste recurso e considerada na decisão como afastando a responsabilidade civil da R., consiste no facto de os AA. não terem alegado que contactaram a R. pedindo a alteração da classificação do crédito, de “crédito vencido” para “crédito renegociado”.
Efectivamente, os AA. devem efectuar este contacto, requerendo à entidade que comunicou a situação de incumprimento a alteração da classificação do seu crédito, uma vez que lhes incumbe não só a comunicação, mas as alterações e correcções devidas, por sua iniciativa ou por solicitação do cliente.
Constitui interesse do cliente fazê-lo, mas não se trata de uma imposição, nem a solicitação do cliente à entidade para que altere (ou elimine) uma comunicação de “crédito vencido” ao Banco de Portugal, mesmo que atendida, constitui uma exoneração da entidade que prestou informações erróneas, pelos danos que tenham resultado dessa conduta.
Também não constitui requisito prévio à instauração da acção de indemnização por factos ilícitos, consistentes na prestação de informações erradas ao Banco de Portugal, a prévia solicitação do lesado, para correcção da informação.
Não sendo requisito prévio, a sua não verificação, não constitui causa de exclusão de ilicitude, mas quanto muito de limitação dos danos.
O acto ilícito existe sempre, enquanto não for removida a informação (ou alterada para a classificação correcta), por parte da instituição financeira.
Com efeito, «o facto de os bancos serem obrigados a remeter mensalmente e por via informática ao Banco de Portugal todos os créditos e a respectiva situação devidamente codificada, não irresponsabiliza aqueles pelas comunicações efectuadas», uma vez que «o automatismo dessa comunicação e as consequências que dela nascem para o cliente impõem um reforço do cuidado e da diligência por forma a evitar o erro e suas consequências» [Ac. do S.T.J. de 19/5/2011, relator Pires da Rosa, proc. 3003/04.2TVLSB.L1.S2, disponível para consulta in www.dgsi.pt].
Assim, demonstrada a prática de um acto/omissão ilícita da R., sobre esta impende o dever de indemnizar os AA, pelos danos resultantes dessa violação, tendo em conta que neste âmbito se observa o princípio da causalidade adequada e que o princípio da reconstituição natural impõe o ressarcimento dos danos que tenham resultado da violação.
No nosso processo civil rege o princípio da causalidade adequada, ou seja, “não basta que o evento tenha produzido (naturalística ou mecanicamente) certo efeito, para que este, sob o ponto de vista jurídico, se possa considerar causado ou provocado por ele: sendo ainda necessário que o evento danoso seja uma causa provável, adequada desse efeito. Não bastando, pois, a relação de condicionalidade concreta entre o facto e o dano, sendo, ainda, preciso que, em abstracto, o facto seja uma causa adequada do dano. Sendo antes necessário, para que um facto seja causa de um dano, que, por um lado, no plano naturalístico, ele seja condição (directa ou indirecta) sem a qual o dano se não teria verificado, e, por outro, que em abstracto ou em geral, seja causa adequada do mesmo.” [Ac. do S.T.J. de 18/10/2012, relator Serra Baptista, proc. 5817/09.8TVLSB.L1.S1, disponível para consulta in www.dgsi.pt]
Demonstrado o acto ou omissão ilícitas, não está o lesado, dispensado de alegar e demonstrar a existência de danos que decorram desse ilícito, uma vez que só estes são indemnizáveis.
A este respeito, considerou o tribunal recorrido não ter sido feita esta alegação, uma vez que tratando-se de factos constitutivos do seu direito, não bastam meras conclusões, sendo que notificados para aperfeiçoar a sua p.i., os AA., por manifesta incúria, não o fizeram, apresentando articulado fora do prazo peremptório fixado e sem que cuidassem do pagamento atempado da multa pela apresentação tardia.
Posto isto, da prestação de informações inverídicas ao B. de Portugal, podem decorrer dois tipos de danos:
- danos decorrentes da impossibilidade de aceder ao empréstimo pretendido e de adquirir um veículo automóvel de que os AA. necessitariam para as suas deslocações;
-danos resultantes da ofensa ao bom nome e imagem dos AA., em especial do A. marido, que é agente da PSP, com vários louvores no seu currículo.
Com efeito, o mesmo facto ilícito pode provocar danos patrimoniais e não patrimoniais, distinguíveis consoante sejam ou não susceptíveis de avaliação pecuniária. Os primeiros, porque incidentes sobre interesses de natureza material ou económica, reflectem-se no património do lesado, ao contrário dos últimos, que se reportam a valores de ordem espiritual, ideal ou moral, e que apenas “podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” [Antunes Varela, Das Obrigações Em Geral, 5ª Edição, Vol. I, pág. 561]
Verificando-se a existência dos pressupostos da responsabilidade civil, decorre do disposto no artº 562 do C.C., que o lesante deve reconstituir a situação que existiria, caso se não tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
Assim, o princípio geral é o de que a indemnização deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento danoso, ou seja, a medida da indemnização corresponde à medida do dano sofrido.

Nesta medida, tem a 2ª instância vindo a equacionar diversos critérios para aferir do dano, mormente recorrendo à figura da “perda de chance” [Ac. do TRL de 22/02/2018, relatora Teresa Soares, proc. 456/14.4TVLSB.L1-6, disponível in www.dgsi.pt], ou seja, avalia-se se do acto ou omissão praticado, decorreu uma efectiva perda de “oportunidade” e em que medida essa perda de “oportunidade” causou um dano.
Com efeito, o nosso ordenamento “jurídico-civil nacional tutela o dano conhecido pela «perda de chance» ou de oportunidade, que ocorre quando uma situação omissiva faz perder a alguém a sorte ou a «chance» de alcançar uma vantagem ou de evitar um prejuízo.” [Ac. do S.T.J. de 05/02/2013, relator Hélder Roque, proc. nº 488/09.4TBESP.P1.S1, disponível in www.dgsi.pt]
Esta perda de chance reporta-se obviamente à probabilidade de concessão do referido empréstimo, certo que sempre poderia ser recusado por outros factores, decorrentes de impossibilidade financeira de suportar mais encargos por parte dos requerentes (do empréstimo), visando-se com esta teoria, como refere o citado acórdão do STJ (05/02/13) distribuir “o risco da incerteza causal entre as partes envolvidas, isto é, o lesante responde apenas na proporção e na medida em que foi autor do ilícito, traduzindo uma solução equilibrada que pretende conformar-se com uma sensibilidade jurídica a que repugna a desoneração do agente danoso por dificuldades probatórias, mas, também, que não comina a reparação da totalidade do dano que, eventualmente, não cometeu. A jurisprudência foi pioneira na teorização da «perda de chance», referindo-se, em regra, aos casos em que o lesado se encontra, de certo modo, numa situação de desequilíbrio ou de desigualdade de armas relativamente ao agente, porque carece de conhecimentos e meios para fazer apreciar e demonstrar a existência da causalidade, atenuando as dificuldades da prova, tendo ainda como efeito distribuir entre as partes a carga da incerteza, mas fazendo incidir sobre o lesante, apenas, a responsabilidade proporcional à medida do dano que causou. Porém, a questão da perda de oportunidade diz respeito, não à teoria da causalidade jurídica ou da imputação objectiva, mas antes à teoria da causalidade física, e, tanto assim é, que a teoria da perda de chance conduz a um alargamento dos casos de responsabilidade, enquanto que a teoria da causalidade jurídica ou da imputação objectiva leva a uma restrição dos mesmos.
Deste modo, a perda de oportunidade apenas pode colocar-se, verdadeiramente, quando o julgador, depois de aplicar as regras e critérios positivos que orientam e limitam a sua capacidade de valoração, não obtém a prova de que um determinado facto foi causa física de um determinado dano final, não encontra um grau suficiente de probabilidade para optar pela hipótese segundo a qual o agente causou o dano. A questão que, de imediato, se coloca é, então, a de determinar qual é esse grau suficiente de probabilidade e quais são as regras ou critérios a que se deve recorrer para o calcular, pois que de tais respostas depende a consideração de que se está perante hipóteses de causalidade demonstrada ou antes de causalidade não demonstrada, sendo estas últimas as que concernem com a doutrina da «perda de chance» e com a fórmula da sua reparação. O «standard de prova» descreve o grau de probabilidade de ocorrência de um facto que a parte, sobre quem impende o respectivo ónus, deve alcançar, o que, de acordo com o princípio da regularidade adoptado, também denominado de critério do que acontece, normalmente, implica afirmar a causalidade natural quando se chega à conclusão de que o curso normal das coisas, caso não tivesse intermediado o facto ilícito, conduziria à obtenção de um ganho ou ao obviar de um dano. E, para optar pela hipótese segundo a qual o agente causou o dano, há que distinguir dois juízos probabilísticos, sendo um destinado a averiguar a probabilidade de, ao faltar o facto ilícito, deixar de produzir-se o dano [causalidade física], e o outro dirigido a determinar a probabilidade de a causa física provada, conforme o juízo causal anterior, ser, normalmente, adequada ou idónea para produzir o resultado lesivo [causalidade jurídica ou imputação objectiva]. A perda de oportunidade apresenta-se em situações que podem qualificar-se, tecnicamente, de incerteza, situando-se o seu campo de aplicação entre dois limites, sendo um constituído pela probabilidade causal, nula ou irrelevante, de o facto do agente causar o dano, em que não há lugar a qualquer indemnização, e o outro constituído pela alta probabilidade, que se converte em razoável certeza da causalidade, que dá lugar à reparação integral do dano final, afirmando-se o nexo causal entre o facto e este dano. Através destes dois limiares, importa, pois, distinguir três tipos de hipóteses, ou seja, a perda de oportunidade genérica, imperfeita, simples ou comum, abaixo do limiar de seriedade da «chance», que não dá direito a qualquer reparação [a], a perda de oportunidade super-específica, super-qualificada, ou perfeita, igual ou acima do limiar da certeza da causalidade, e que determina a afirmação do nexo causal entre o facto e o dano final [b] e a perda de oportunidade específica, qualificada, situada entre os dois limiares, e que pode dar lugar à actuação da doutrina da «perda de chance».
E são os casos de «chances» sérias e reais que expressam probabilidades consideráveis, sem embargo de serem insuficientes para efeito de afirmação do nexo causal.
Assim sendo, a doutrina da «perda de chance» ou da perda de oportunidade, propugna, em tese geral, a concessão de uma indemnização quando fique demonstrado, não o nexo causal entre o facto ilícito e o dano final, mas, simplesmente, que as probabilidades de obtenção de uma vantagem ou de obviar um prejuízo, foram reais, sérias, consideráveis, permitindo indemnizar a vítima nos casos em que não se consegue demonstrar que a perda de uma determinada vantagem é consequência segura do facto do agente, mas em que, de qualquer modo, há a constatação de que as probabilidades de que a vítima dispunha de alcançar tal vantagem não eram desprezíveis, antes se qualificando como sérias e reais”.
Volvendo ao caso concreto, concorda-se neste ponto com a decisão recorrida e com as alegações da R., no sentido de que a viabilidade de concessão deste crédito, caso não existisse o acto ou omissão danosos, era em si praticamente inexistente (considerando a decisão sob recurso que a menção a crédito renegociado contém em si em elemento negativo), decorrente da situação de incumprimento que conduziu a esta renegociação efectuada no âmbito de um plano de pagamentos, aprovado em sede de insolvência. Recorde-se que os AA. em virtude de apresentação à insolvência, requereram e viram ser-lhes homologado plano de pagamento aos credores, conforme o possibilita os artºs 258 e 259 do CIRE, sendo que a aprovação deste plano de pagamentos, implica o reconhecimento e a declaração de insolvência.
Nestes termos, a possibilidade, a “chance” de concessão de um novo empréstimo, caso a informação fosse de crédito renegociado, afigura-se-nos inexistente, nada tendo sido alegado pelos AA. em contrário, ou seja que essa efectiva possibilidade existia, ou seja que o crédito teria “chance” de aprovação, caso não existisse a comunicação de “crédito vencido”, mas a correcta de “crédito renegociado”.
Por outro lado, ainda que assim não fosse, o prejuízo que decorreria dessa “perda de chance” de concessão de crédito, não equivale ao montante, quer do crédito que se visava obter, quer do valor do bem que se pretendia adquirir.
Denote-se que, na sua p.i. vieram os AA., alegar que “a título de lucros cessantes o prejuízo equivale ao preço do veículo automóvel pretendido adquirir para substituição dos seus antigos que nos últimos anos têm exigido elevados gastos com reparações mecânicas” (artº 32º) e que “O veículo automóvel em apreço, estava à venda pelo valor de 11.750,00€, conforme com a ficha do veículo” (artº 33º) e ainda que “A título de danos emergentes com os gastos em assessoria jurídica e sua representação em Juízo estima-se o seu valor em 3.579,00€ correspondente a honorários estimados no valor de 2.200€, acrescidos do IVA, das taxas de justiça e das despesas de deslocação.” (artº 34º)
Ora, ao contrário do equacionado pelos AA., o crédito que se visava obter, para aquisição do veículo, a ser concedido, implicaria o seu pagamento à instituição que o concedesse, pelo que o prejuízo dos AA. não corresponde ao valor do veículo (ou do crédito para a sua aquisição), mas antes aos danos que resultassem da não concessão desse crédito, quer por suportar despesas acrescidas por não poder adquirir o bem, quer por não beneficiar dos ganhos ou vantagens que esperava obter com o bem, tendo em conta que, de acordo com o disposto no art. 564º do Cód. Civil, o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão. (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição, Coimbra Editora, pág.s 579 e 580), mas não se destina a beneficiá-lo, atribuindo-lhe, a custo zero, o valor necessário para a aquisição do veículo, que iria obter por via de um empréstimo, sujeito a reembolso.
Por outro lado, quer em relação a estes, quer em relação aos denominados “danos emergentes”, conforme refere o tribunal recorrido, não estão alegados factos concretos que os suportem (sendo aliás os custos com honorários e despesas relacionadas a serem ressarcidas mediante custas de parte), pelo que sempre estaria o tribunal impedido de os apreciar, ainda que considerasse que existia a aludida perda de chance.
Esta falta de alegação de factos não suprida, apesar de convite para tal, não pode ser suprida em fase de recurso.
Posto isto, questão diversa, consiste na eventual existência de danos morais decorrente da existência de uma comunicação de “crédito vencido” ao Banco de Portugal, uma vez que, constitui sempre uma ofensa ao crédito e bom nome, a participação de um facto, não verdadeiro, à Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal. [Ac. do TRL de 15/09/2011, relatora Carla Mendes, proc. nº 6771/09.1TBOER.L1-8, disponível para consulta in www.dgsi.pt]
Assim sendo, ao contrário do considerado pela decisão sob recurso, os danos morais, a existirem, não são os “decorrentes da falta de aquisição de um veículo automóvel”, cuja necessidade não ficou demonstrada, mas antes os decorrentes da ofensa ao crédito e bom nome dos AA.
Este direito ao crédito e bom nome, encontra consagração no nosso regime jurídico, nomeadamente no C.Civil, que nos seus artigos 70 e segs., estabelece a protecção de todos os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral, ao seu bom nome à imagem e reputação, encontrando ainda acolhimento na Constituição, consagrando-se a protecção da dignidade da pessoa humana como fundamento da sociedade e do estado, nomeadamente nos seus artºs 13, (princípio da igualdade), 24 (inviolabilidade da pessoa humana), 25 (direito à integridade moral e física da pessoa humana) e 26, que ressalva em especial o direito ao bom nome e reputação do ser humana, preceitos estes directamente aplicáveis e vinculativos das entidades públicas e privadas (conforme decorre do artº 18 da C.R.P.)
Nestes termos, a simples possibilidade de prejuízo, decorrente desta comunicação, justifica a tutela que é concedida.
Denote-se que o tribunal considerou assente que os Autores sentiram vergonha e humilhação, aos níveis pessoal e profissional, ao serem reputados perante as entidades financeiras e bancárias como incumpridores (ponto 6), que o Autor é agente da PSP onde entrou em Novembro de 1996 tendo actualmente a categoria de Agente Principal (ponto 7), que a sua carreira tem decorrido sempre em progressão tendo concorrido em Janeiro passado a Agente Coordenador, (procedimento concursal nº 06/2016), encontrando-se na classe de comportamento exemplar, sem qualquer punição (ponto 8) e que, finalmente o Autor recebeu um Louvor pelo Exmo. Sr. Comandante do Comando Metropolitano de Lisboa, publicado em …/11/2010 (Ordem de serviço … /CM Lisboa); um Louvor pelo Exmo. Sr. Comandante do Comando Distrital de Aveiro, publicado em …/08/2012 (Ordem de serviço … Comando Distrital de Aveiro); um Elogio pelo Exmo. Sr. Comandante do Comando Distrital de Aveiro, publicado em …/11/2016 (Ordem de serviço … Comando Distrital de Lisboa) (ponto 9) e, por último os Autores sempre pautaram a sua conduta pelo cumprimento dos seus deveres cívicos e profissionais, fazendo-o com muito brio na imagem quer pessoal e familiar quer profissional (ponto 10).
Daqui resultam duas realidades:
-os AA. sentiram-se envergonhados e humilhados pelo facto de serem reputados como incumpridores, perante as instituições financeiras e bancárias, por reporte à comunicação de “crédito vencido”;
-este acto não se repercutiu a nível profissional, pelo menos para o A.;
Por outro lado, o crédito renegociado por força do plano de pagamentos homologado na insolvência dos AA., estava já vencido e, efectivamente, a insolvência resultou da incapacidade destes de honrarem os seus compromissos.
Por último, a comunicação ou manutenção de uma informação errada ao Banco de Portugal, constitui uma ofensa ao bom nome e consideração dos visados, tendo em conta que intentaram aprovação de plano de pagamentos que se encontram a cumprir, pelo que, atenta a ilicitude do acto e a “gravidade” dos danos, neste circunspecto, deve o banco ressarcir este dano.
Ora, “no domínio dos danos não patrimoniais o recurso à equidade constitui elemento essencial e insubstituível para avaliar o dano, representando o juízo equitativo um verdadeiro momento constitutivo na determinação da compensação adequada a tal tipo de danos e daí que a relatividade e subjectividade da fixação não deva constituir uma arbitrariedade, tendo sempre presente a intensidade da culpa do réu (no caso na forma de negligência), a circunstância de que este é uma entidade bancária que opera no mercado e a quem cabe um particular dever de diligência e cuidado, necessariamente dotada de organização empresarial e dos meios necessários para responder em condições apropriadas de qualidade e eficiência” [Ac. do TRC de 08/11/2016, relator Manuel Capelo, proc. nº 4514/14.7T8CBR.C1, disponível para consulta in www.dgsi.pt], bem como o facto de que os AA. são pessoas singulares declaradas insolventes e a cumprir plano de pagamentos, sem que se veja que esta comunicação tenha um efectivo reporte a nível profissional ou social pelo que, tendo em conta os factos acima referidos e de acordo com critérios de equidade, se deve fixar em € 2.500,00.
(…)
Quanto à alegação de inconstitucionalidade, não se descortina a razão de ser desta alegação e está esta prejudicada pela decisão acima referida.
No entanto, sempre se dirá, que o acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva, não está posto em causa pela decisão recorrida, uma vez que, a não alegação de factos ou a deficiência de alegação, não suprida, é imputável à parte.
Por outro lado, denote-se que os AA. não peticionam que o R. altere a comunicação feita ao B. de Portugal, não sendo igualmente por esta via que poderia ser obtido este desiderato.
Denote-se que o tribunal recorrido não considerou a inexistência de responsabilidade civil extra-contratual, “com base na fundamentação de que a classificação de crédito renegociado tem carácter negativo”, mas antes que não foram alegados nem demonstrados factos dos quais resultasse o dano e o nexo de causalidade, porque, por um lado, não foram alegados os factos correspondentes, apesar do despacho de aperfeiçoamento e, por outro, porque dos factos apurados também não resulta essa realidade, porque a concessão de crédito dependeria sempre da apreciação da solvabilidade dos RR., tendo em conta a existência deste e de outros créditos objecto do plano de pagamentos, de acordo com o disposto nos artºs 562 e segs. do C.C.
Por último, constando efectivamente dos Cadernos do B. de Portugal que o cliente, ao verificar a incorrecção da informação, deve contactar a entidade responsável, uma vez que só elas podem proceder a essa correcção, esta comunicação não desonera a entidade do dever de ressarcir os danos que haja provocado e que provoque futuramente enquanto a incorrecção se mantiver, mas insere-se no dever do lesado que esteja de boa fé de, solicitando essa correcção, não concorrer para a manutenção ou agravamento dos danos, pela sua inacção.
Procede assim parcialmente o recurso interposto”.
Ou seja, as questões suscitadas pelos AA. neste recurso foram igualmente apreciadas e decididas por este Tribunal da Relação de Lisboa, através do referido acórdão de 16/5/2019, cuja fundamentação se acaba de transcrever.
E inexiste qualquer motivo para divergir dessa apreciação, na medida em que os fundamentos de facto e de direito apresentados são absolutamente idênticos.
É que, desde logo no que respeita à consideração da existência de uma ofensa ao bom nome e crédito dos AA., constata-se que decorre a mesma da informação incorrecta transmitida pela R. à Central de Responsabilidades de Crédito junto do Banco de Portugal (quando comunicou que os créditos dos AA. se encontravam na situação de vencidos em litígio judicial, devendo a comunicação ter sido no sentido de que se encontravam na situação de renegociados, face à homologação de um plano de pagamentos e ao cumprimento do mesmo por parte dos AA.).
A mesma identidade de fundamentos se verifica no que respeita à consideração da inexistência de outros danos (designadamente o decorrente da perda de oportunidade de obter um crédito bancário para a aquisição de um veículo automóvel, oportunidade essa inexistente face à situação de insolvência dos AA.) para além do dano não patrimonial (correspondente ao desgosto, vergonha e constrangimento que os AA. sentiram por serem reputados perante as entidades financeiras e bancárias como incumpridores).
E no que respeita à indemnização pelo referido dano não patrimonial, importa recordar de acordo com o disposto no n.º 1 do art.º 496º do Código Civil “Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Sendo que a gravidade do dano não patrimonial “há-de medir-se por um pa­drão objectivo (...) e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)” (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, pág. 499, 4ª edição).
Ou seja, entendendo-se que na indemnização por danos não patrimoniais se deve considerar uma quantia que conceda ao ofendido a oportunidade de lhe proporcionar alegria ou satisfação que, de algum modo, contrabalancem as dores, desilusões, desgostos ou outros sofrimentos que o ofensor lhe tenha causado, e considerando-se que a gravidade dos danos não patrimoniais sofridos pelos AA. e acima descritos se reveste de uma gravidade merecedora da tutela do direito, há que utilizar os critérios de equidade a que obriga o n.º 3 do art.º 496º, e em conjugação com o que dispõe o art.º 494º, aqui aplicável por força do referido art.º 496º, todos do Código Civil.
De onde se conclui que deve ser fixado o montante de € 2.500,00 para o ressarcimento dos danos de natureza não patrimonial dos AA. que resultam demonstrados.
Ou seja, acolhendo aqui na sua totalidade a fundamentação do referido acórdão de 16/5/2019 deste Tribunal da Relação de Lisboa, acima reproduzida, e face ao ora exposto, há que afirmar a parcial procedência das conclusões dos AA., com a revogação da sentença recorrida e sua substituição por outra que condene a R. no pagamento aos AA. da referida quantia de € 2.500,00, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais causados, bem como juros de mora à taxa legal contados desde a data desta decisão (por força do disposto no art.º 566º, nº 2, do Código Civil), e sendo absolvida do demais peticionado.

DECISÃO
Em face do exposto julga-se parcialmente procedente o recurso, revogando-se a sentença recorrida, que se substitui por esta outra que condena a R. no pagamento aos AA. da quantia de € 2.500,00, acrescida de juros de mora à taxa legal, contados desde a data desta decisão e até integral pagamento, mais a absolvendo do demais peticionado que excede a medida da condenação.
Custas por AA. e R. na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido aos AA.

Lisboa, 10 de Outubro de 2019

António Moreira
Carlos Castelo Branco
Lúcia Sousa