Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa | |||
Processo: |
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Relator: | ARLINDO CRUA | ||
Descritores: | SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA CAUSA PREJUDICIAL CONDOMÍNIO | ||
Nº do Documento: | RL | ||
Data do Acordão: | 07/11/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Texto Parcial: | N | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | IMPROCEDENTE | ||
Sumário: | I – Para que ocorra suspensão judicial da instância, prevista no nº. 1, do artº. 272º, do Cód. de Processo Civil, por pendência de causa prejudicial, é mister que se comprove uma real e concreta relação de dependência, em que a decisão a proferir na causa prejudicial afecte o julgamento da causa dependente, ou seja, que a apreciação do litígio nesta seja condicionado pelo que venha a decidir-se naquela ; II – Exercitando a Autora, na causa alegadamente dependente, eventual direito de crédito relativamente ao Réu Condomínio, decorrente de um contratualizado acordo de prestação de serviços, no âmbito do qual afirma ter-lhe prestado serviços de administração, jardinagem, limpeza e material de escritório, e tendo o demandado Réu, na acção alegadamente prejudicial, em que figura como Requerente/Autor, reclamado a condenação da ali Requerida/Ré (ora Autora) a entregar-lhe bens e documentos que alegadamente lhe pertencem, aduzindo que, caso venha a ser julgada procedente, “poderá encontrar evidência da quantia ora peticionada ter sido já paga”, a eventual decisão a proferir na aludida causa prejudicial – acção de apresentação de coisas e bens – nunca poderia fazer desaparecer a razão de ser ou o fundamento da presente acção reivindicada como dependente, ou seja, a resolução da controvérsia em litígio naquela causa, alegadamente prejudicial, nunca modificaria, de forma juridicamente relevante, a decisão a prolatar nos presentes autos, pois a pretensão afirmada no objecto daquela não constitui pressuposto da pretensão reivindicada nos presentes autos ; III - Efectivamente, um putativo juízo de procedência daquela aludida causa prejudicial, não determinaria a perda da razão de ser da presente causa aludidamente dependente, pois o ali decidido nenhuns reflexos jurídicos relevantes provocaria na apreciação da questão em controvérsia na presente acção ; IV – Mesmo configurando tal prejudicialidade em termos de potencialidade probatória, como o Apelante Réu o faz, ao aduzir que, sem aquela documentação que reclama na catalogada causa prejudicial, vê-se impossibilitado de exercer o seu direito de defesa na presente acção, reclamada como dependente, nomeadamente no que concerne à impugnação dos créditos reclamados ou mera alegação do seu pagamento, este fundamento ou desiderato não pode ser reconhecível como fundamentação para a requerida suspensão judicial por pendência de causa prejudicial, que não acolhe como fundamento eventual potencialidade probatória a adquirir por via da resolução desta causa. Sumário elaborado pelo Relator – cf., nº. 7 do artº. 663º, do Cód. de Processo Civil | ||
Decisão Texto Parcial: | |||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM os JUÍZES DESEMBARGADORES da 2ª SECÇÃO da RELAÇÃO de LISBOA o seguinte [1]: I – RELATÓRIO 1 – A……………….., LDA., instaurou, em 10/10/2022, processo injuntivo contra CONDOMÍNIO ……………….., alegando o seguinte: “A Requerente A........................,Lda., com o NIPC ………………e com igual número de matrícula na Conservatória do Registo Comercial do Funchal, com sede na Rua ………………, concelho do Funchal, com o código postal …, tem como objeto social a Gestão e consultoria de condomínios, jardinagem, atividades de limpeza geral em edifícios, compra e revenda de materiais de construção civil, pintura de construção civil e construção civil, realização de sistemas de canalizações e manutenção de canalizações, instalações e manutenções elétricas, compra para revenda de imóveis a título de mediação imobiliária, compra para revenda e aluguer de veículos automóveis, mediação de seguros, realização de alojamento local, conforme resulta de certidão comercial permanente com o código de acesso …………... O Requerido é o Condomínio.................., com o NIPC …, com sede na Rua …, freguesia de Santo António, concelho do Funchal, com o código postal …. A Requerente e o Requerido celebraram contrato de prestação de serviços através do qual a Requerente prestou ao Requerido os serviços seguintes: administração, jardinagem, limpeza e material de escritório. O Requerido deve à Requerente os serviços de administração de Fevereiro de 2021 a Junho de 2022 no valor de €5.737,50, sendo o valor mensal de administração de €337,50. O Requerido deve à Requerente os serviços de jardinagem de Fevereiro de 2021 a Junho de 2022 no valor de €1.244,40, sendo o valor mensal de jardinagem de €73,20. O Requerido deve à Requerente os serviços de limpeza de Outubro no valor de €433,10. O Requerido deve parcialmente à Requerente os serviços de limpeza de Dezembro de 2019 no valor de €53,10, o que perfaz um total de dívida de limpeza de €486,20. O Requerido deve à Requerente pelos serviços de material de escritório de Fevereiro de 2021 a Junho de 2022 no valor de €531,25, sendo o valor mensal de material de escritório de €31,25. Pelo que, o Requerido deve à Requerente, conforme supra exposto, o valor total de capital de €7.999,36, conforme resulta de fatura 2022/140, emitida e com data de vencimento em 15.07.2022 e conforme extrato de conta corrente de n.º 2560 a 2839. O Requerido deve à Requerente sobre o referido capital de €7.999,36 juros comerciais à taxa legal em vigor desde o dia 16.07.2022 até efetivo e integral pagamento. O Requerido deve à Requerente o valor da taxa de justiça no montante de €102,00. O Requerido deve à Requerente o valor de €100 com os encargos devidos pela cobrança desta dívida. Pelo exposto, o Requerido deve à Requente o capital de €7.999,36, deve os sobreditos juros de mora comerciais à taxa legal em vigor desde o dia 16.07.2022 até efetivo e integral pagamento do capital em dívida, deve a taxa de justiça no valor de €102,00 e deve os mencionados €100,00. Em suma, o Requerido deve à Requerente o montante total de €8.201,36. Fatura 2022/140 no valor de 7 999,36 € + juros entre 15/07/2022 e 23/08/2022 () Capital Inicial: 7 999,36 € Total de Juro: 0,00 € Capital Acumulado: 7 999,36 € Fatura 2022/140 no valor de 7 999,36 € + juros entre 15/07/2022 e 23/08/2022 () Capital Inicial: 7 999,36 € Total de Juro: 0,00 € Capital Acumulado: 7 999,36 € Fatura 2022/140 no valor de 7 999,36 € + juros entre 15/07/2022 e 23/08/2022 () Capital Inicial: 7 999,36 € Total de Juro: 0,00 € Capital Acumulado: 7 999,36 €”. 2 – Devidamente notificado/citado o Requerido, veio apresentar oposição, alegando, em resumo, o seguinte: - a Requerente em momento algum indica as condições contratuais dos referidos alegados contratos, ou seja, correspondente nível de serviço, actos ou serviços em concreto praticados, dias de prestação de serviço, prazo de pagamento, periodicidade e bens em concreto fornecidos ; - isto é, a Requerente não identificou nem individualizou os bens e serviços dos supostos contratos de fornecimento de bens e serviços alegadamente constantes da factura ; - existindo, assim, ineptidão da p. i., por falta de causa de pedir, o que determina a nulidade de todo o processo, nos termos do artigo 186º, nºs. 1 e 2, alín. a), do Cód. de Processo Civil ; - o que constitui excepção dilatória, determinante da absolvição da instância do Requerido ; - os créditos invocados com mais de 2 anos, à data de 19/09/2022, estão prescritos ; - e foram pagos pelo Requerido antes dessa data de 19/09/2022, o que se invoca para todos os efeitos legais ; - em 02/09/2022, solicitou à Requerente que lhe fosse entregue toda a documentação do condomínio, o que aquela nunca fez, invocando um inexistente direito de retenção sobre tal documentação ; - a Requerente não pode ignorar que o documento por si elaborado referente às prestações de contas dos anos civis de 2018 a 2021 foi reprovado em assembleia de condóminos de 03/06/2022 ; - pelo que a recusa em entregar tais documentos fá-la incorrer em manifesto abuso de direito ; - pois está a coarctar a possibilidade da Requerida intentar contra a mesma acção judicial de prestação de contas, coarctando, assim, de forma inadmissível, o seu direito de defesa ; - ademais, a Requerente não prestou ao condomínio nenhum dos invocados serviços, quer de limpeza quer de jardinagem, quer de material de escritório, tendo o edifício sido entregue à empresa administradora completamente abandonado ; - para além do serviço de administração do condomínio ter sido efectuado de forma defeituosa, pois não elaborou a prestação de contas dos anos de 2019 a 2022, não intentou acções judiciais de cobrança de quotas em atraso, apesar de existirem, não promoveu diligências extrajudiciais para cobrança de dívidas ao condomínio, apesar de existirem, e não promoveu assembleias de condomínio nos termos legais. Conclui, no sentido da: - procedência da excepção dilatória invocada ; - procedência da excepção de prescrição parcial ; - procedência da excepção de abuso de direito e, Caso assim não se entenda, deverá ser julgado improcedente o requerimento inicial. 3 – Expressamente notificada para, querendo, responder às excepções invocadas, veio a Requerente fazê-lo em 04/11/2022, referenciando, em súmula, que: - o procedimento de injunção foi devidamente utilizado, pelo que deve improceder a excepção do alegado uso indevido da injunção ; - os serviços prestados pela Autora à Ré encontram-se devidamente individualizados no requerimento inicial, o que é perfeitamente entendível pela Requerida, pelo que deve improceder o pedido de nulidade de todo o processo por suposta ineptidão da petição inicial por alegada falta de causa de pedir ; - a Autora exerce o legal direito de retenção sobre a documentação do condomínio, sendo que o pedido de entrega da documentação, efectuado pela Ré, e aquele exercício do direito de retenção sobre a aludida documentação não constituem objecto do presente processo ; - inexistindo, assim, no direito da Requerente em pretender a condenação da Requerida, pelos serviços que lhe prestou, qualquer abuso de direito, mas antes o exercício legítimo de dois direitos: o exercício do direito de retenção sobre os aludidos documentos ; e o exercício do direito de instaurar acção judicial para exigir a condenação da Ré no pagamento de tais serviços que a Autora lhe prestou ; - pelo que deve improceder a alegada excepção de abuso de direito invocada pela Ré ; - deve improceder a excepção de alegadamente não terem sido peticionados pela Requerente a condenação da Requerida no pagamento de juros moratórios vencidos ; - bem como a alegada excepção de prescrição, estando-se perante uma prescrição presuntiva e não de uma prescrição extintiva ; - tais serviços nunca foram pagos. 4 – Em 17/01/2023, veio o Requerido suscitar o denominado Incidente de verificação de uma causa questão prejudicial, alegando, o seguinte: “1º O requerido em sede de oposição defendeu-se por excepção invocando para o efeito o abuso de direito e o inexistente direito de retenção de documentação pertencente ao requerido invocado pela requerente para não entregar a documentação respeitante ao período em que exerceu as funções de Administração do requerido, e que poderia servir para a sua defesa, nomeadamente provar que o valor peticionado se encontra já pago. 2º A este propósito vide os artigos 13º a 28º da oposição. 3º À data da oposição o requerido não havia intentado contra a requerente, na qualidade de anterior administrador do condomínio, acção para entrega de bens e documentos nem acção provocada para prestação de contas. 4º Acontece, porém, que no dia 3 de Janeiro de 2023 o requerido intentou uma acção judicial de apresentação de documentos e bens contra a requerente, referente ao período a que se reporta a quantia peticionada, a que correspondeu o Proc. n.º 29/23.0T8FNC, que corre termos no Juízo Local Cível do Funchal – Juiz 2, desta Comarca. Doc. 1 5º Naqueles autos, o requerido, formulou o pedido seguinte: “NESTES TERMOS, E nos melhores de direito, com o mui douto suprimento de V.ª Ex.a, deve a presente acção ser julgada procedente por provada e a requerida condenada no seguinte: 1) Entregar os bens e documentos pertencentes ao condomínio, conforme segue: a) Cópia da escritura de propriedade horizontal; b) Livro de actas das assembleias de condomínio, ou actas originais avulsas; c) Cópia do orçamento em vigor até à cessação, e dos antecedentes; d) Livro de recibos (ou duplicados) do condomínio; e) Chaves de partes comuns do edifício; f) Regulamento do condomínio (original); g) Documentos respeitantes às contas bancárias do condomínio e respectivos saldos; h) Contrato de seguro; i) Contrato(s) de manutenção de elevadores; j) Relação de todos os condóminos (nomes, moradas, e, se for o caso, morada dos seus procuradores); k) Posição devedora ou credora de cada condómino relativamente às prestações ou encargos da sua responsabilidade, até à data da entrega formal de toda a documentação; l) O cartão de número de identificação de pessoa colectiva do condomínio; m) As acções judicias pendentes intentadas pela administração em representação do condomínio; n) Relatório das anomalias do edifício; o) Identidade dos vários prestadores de serviço que prestaram serviço ao condomínio, respectivos contratos e posição financeira (credora/devedora); p) Equipamentos de limpeza e de jardinagem; 2) Condenar a requerida no pagamento à requerente uma sanção pecuniária compulsória de €10,00 por cada dia de atraso na entrega dos documentos e bens do condomínio até à efectiva entrega voluntária ou apreensão no âmbito de penhora.” 6º Se a acção para entrega de documentação for procedente o ora requerido poderá encontrar evidência da quantia ora peticionada ter sido já paga. 7º E, também no dia 3 de Janeiro de 2023, o requerido intentou uma acção judicial de prestação de contas contra a requerente, referente ao período a que se reporta a quantia peticionada, a que correspondeu o Proc. n.º31/23.2T8FNC, que corre termos no Juízo Local Cível do Funchal – Juiz 1, desta Comarca. Doc. 2 8º Naqueles autos, o requerido, formulou o pedido seguinte: “Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, requer- se a V.ª Ex.a se digne admitir a presente Acção Especial de Prestação Provocada de Contas, ao abrigo do disposto no art.º941.º do CPC, e a ordenar a citação da ré para apresentar contas do período de 01 de Janeiro de 2018 a 31 de Maio de 2022, na qualidade de empresa responsável pelo exercício das funções do órgão, Administrador do Condomínio, ou contestar a ação, sob cominação de não poder deduzir oposição às contas que o autor apresente.” 9º Se a acção para entrega de documentação for procedente o ora requerido poderá encontrar evidência da quantia ora peticionada ter sido já paga. 10º Nesta data encontram-se pendentes os referidos processos judiciais, não tendo o requerente, réu naqueles processos apresentado contestação. 11º A retenção pela requerente de documentação do requerido, documentação essa que lhe poderia servir para estribar a sua defesa nos presentes autos, em que aquela lhe reclama o pagamento de alegados serviços, e tendo aquela exercido as funções do órgão, Administrador do Condomínio, precisamente no período a que respeitam os serviços peticionados, afigura-se ilegítima e abusiva. 12º E para o caso de não ser atendida a invocada excepção nos presentes autos, o requerido intentou as duas referidas acções judicias. 13º Uma eventual decisão nos presentes autos não deverá ser alheia e depende da decisão que vier a ser proferida nos referidos autos da acção para apresentação de documentos e também da acção provocada para prestação de contas, precisamente porque em ambos estes processos o requerido espera poder estribar a sua defesa contra o pedido de pagamento por serviços alegadamente prestados a si pela requerente. 14º Por outro lado, ao Direito e à Justiça importa salvaguardar o efeito útil das decisões que vierem a ser produzidas nos referidos processos judiciais, sendo certo que os danos para o requerido, são irreparáveis se se jugar procedente o pedido de pagamento da requerente, sem aguardar pelas decisões naqueles processos. 15º E se não forem irreparáveis, acarretam para a requerente a necessidade de intentar nova acção judicial para pedir o reembolso da quantia ora peticionada, e até mesmo, a necessidade de acção executiva para pagamento de quantia certa, em caso de não pagamento voluntário. 16º A decisão das questões ali colocadas irá influir, naturalmente, na decisão que aqui se vier a adoptar, designadamente, 17º Modificando, ou, mesmo, inutilizando os seus efeitos ou mesmo tirando razão de ser dos presentes autos, 18º Todos esses processos judiciais, pendentes, constituem questões prejudiciais prévias, relativamente ao objecto do presente litígio, nos termos e para os efeitos do artigo 272º do Código de Processo Civil, o que para todos os efeitos se invoca. 19º Razão pela qual deverão estes ser suspensos, nos termos legais”. Conclui, no sentido de dever ser dada como provada e verificada a causa prejudicial, nos termos expostos, conforme o estatuído no artº. 272º, do Cód. de Processo Civil. 5 – Notificada a Requerente/Autora para dizer o que tivesse por conveniente, veio, em 22/03/2023, alegar, no que ora releva, o seguinte: “(….) 59º O douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, proferido em 06.09.2018, decidiu, no processo 4730/16.7T8LSB.L1-2, in www.dgsi.pt, que: Questão prejudicial pode definir-se como aquela cuja solução é necessária para se decidir uma outra; - existe prejudicialidade nas situações em que o conhecimento do fundo ou mérito da acção (ou seja, para se prover sobre o petitório formulado) está dependente da prévia resolução de uma outra questão que, segundo a estrutura lógica ou o encadeamento lógico da sentença, carece de prévia decisão;” 60º Ora, não é da decisão judicial sobre a entrega da documentação do réu condomínio pela autora que depende a decisão sobre se a autora é credora do réu porquanto o réu tem como aceder à conta bancária e aos cheques e a todos os débitos realizados na conta bancária e dessa forma tem como saber que deve todos os valores em causa na presente acção. 61º E não é da decisão judicial relativa à prestação de contas que depende a decisão sobre se a autora é credora do réu porquanto o réu tem como aceder à conta bancária e aos cheques e a todos os débitos realizados na conta bancária e dessa forma tem como saber que deve todos os valores em causa na presente acção. 62º Por outro lado, o réu condomínio deduziu um incidente mas não liquidou qualquer taxa de justiça respeitante ao referido incidente, 63º Pelo que deste modo o réu condomínio praticou um acto que a lei não admite sem o pagamento da correspondente taxa de justiça e que por poder vir a influir no exame e na decisão da causa mostra-se ferido de nulidade, que ora se argui e de que ora se reclama para todos os efeitos legais, tudo com todas as legais consequências. 64º A autora impugna todos os documentos juntos pelo réu condomínio, designadamente quanto ao efeito probatório que deles pretende retirar, tudo para todos os efeitos legais, tudo com todas as legais consequências“. Conclui, no sentido da improcedência do incidente em equação. 6 – Em 09/05/2023, foi proferido o seguinte DESPACHO: “O réu vem deduzir incidente de verificação de uma causa prejudicial, alegando em síntese que propôs duas novas ações contra a autora, uma que visa reclamar a entrega dos documentos e bens, referente ao período em que exerceu funções de administrador de condomínio, e outra, de prestação de contas do respetivo exercício, que considera que sendo estas procedentes fará antever que não se encontram os serviços prestados por pagar. Em sede de resposta, o que apenas se admite nos artigos 59.º a 64.º do requerimento apresentado pela autora (ref.: 5167931), pugna pelo indeferimento da suspensão por considerar que as ações não conflituam com o direito de crédito que esta pretende fazer valer. Atenta a natureza da presente ação especial, a pretensão do réu não poderá ter procedência contando que, as ações propostas por este contra a autora não conflituam com o exercício do direito de crédito que esta pretende fazer valer por via da presente ação, não obsta ao exercício do seu direito de defesa, nem impede o conhecimento deste Tribunal das exceções por si invocadas. Por outro lado, tendo já sido designada data para a realização da audiência final, que só não veio a realizar-se por razões alheias à tramitação dos presentes autos, atendendo o seu estado adiantado, não se afiguram razões para serem suspensos os presentes autos em face do disposto no n.º 2 do art. 272.º do Código de Processo Civil. Assim sendo, indefere-se o requerido por falta de fundamento legal, e determino o prosseguimento dos autos com designação de data para realização da audiência final. Custas do incidente a cargo do réu, que fixo em 1 UC (uma unidade de conta), ao abrigo do disposto no n.º 4 do art. 7.º do Regulamento das Custas Processuais e Tabela II a ele anexa. Registe e notifique”. 7 – Inconformado com o decidido, o Réu apresentou recurso de apelação, no qual formulou as seguintes CONCLUSÕES (inexistem conclusões 2. e 9.): “1. A sentença recorrida não pode manter-se uma vez que não efectuou uma correcta apreciação dos princípios legais e das normas em vigor: 3. Dos presentes autos constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto 4. Do conjunto dos factos resultantes da matéria de facto provada, sobreelevam os descritos supra nos pontos 1). a 10.) da matéria de facto provada; 5. Deles decorre que o ltígio reporta-se a um pedido de pagamento de serviços vários, reclamados pela autora, na qualidade de Administração do Condomínio réu, cargo para o qual foi nomeada em assembleia de condóminos, mas também serviços de limpeza, jardinagem e material de escritório, que alega terem sido por si prestados, sem suporte de deliberação condominial, tendo o réu deduzido oposição invocando a não entrega de documentos e bens do condomínio, a não aprovação da prestação de contas, a não prestação de serviços ou serviço deficiente, e o abuso de direito pela retenção indevida da documentação do condomínio, nomeadamente a documentação financeira que alega ser imprescindível para a sua defesa. 6. Ainda que não esteja em causa analisar uma excepção dilatória inominada de inadequação processual da AECOP para o caso em apreço, cumpre alegar que os presentes autos seguem a forma de Acção Especial para Cumprimento de Obrigações (DL 269/98), que este processo não é adequado para decidir litígios que revestem alguma complexidade, como é o caso dos autos, e que nos termos do artigo 3º, n.º3 desse diploma, os documentos devem ser juntos na audiência de discussão de julgamento. 7. Nos presentes autos o réu não pode formular requerimentos de prova – Documentos na posse de terceiro, nos termos do artigo 432.º do CPC. 8. A autora exerceu as funções do órgão Administração do condomínio do réu entre 2 de Julho de 2018 e 03 de Junho de 2022. Cfr. Ponto 1. da matéria de facto provada 10. A autora tem o dever legal de guarda dos documentos do condomínio, os quais não lhe pertencem, nos termos do art. 1436.º, n.º1, n) do CC. 11.Entre esses documentos, constam as actas das assembleias de condóminos, os orçamentos, e todos aqueles que respeitam à vida financeira do condomínio: receitas e despesas. 12. Entre as despesas, devem constar as facturas e os recibos de prestadores de serviço, os comprovativos de pagamento, e os extractos bancários. 13. A autora não pode recusar a entrega da documentação do condomínio, e enquanto Administradora ou ex-Administradora do Condomínio réu não é titular de um direito de retenção sobre essa documentação, nos termos do art.º754º a 756º do CC. 14. A recusa de entregar esses documentos fá-la incorrer em manifesto abuso de direito, nos termos no artigo 334.º do CC. 15. E ao peticionar judicialmente o pagamento de quantias que se arroga por serviços prestados, cuja prestação de contas não foi aprovada em assembleia de condóminos, a autora incorre também em manifesto abuso de direito nos termos do artigo 334.º do CC. 16. Ainda que se admitisse, por mera hipótese, que a autora seria titular desses créditos, ao recusar-se a entregar a documentação do condomínio ora réu, a autora está a impossibilitar o exercício do direito de defesa que permita impugnar esses mesmos créditos, ou alegar o simples pagamento. 17. Ora, é da análise da documentação do condomínio, nomeadamente a relativa aos anos civis 2019 a 2022, que será possível ao réu verificar a existência de contratos, actas de deliberações da assembleia de condóminos, acesso a extractos bancários, pagamentos efectuados, e inclusivamente verificar da regularidade da documentação fiscal emitida pela autora ao réu condomínio, quanto a valores que não peticiona na presente injunção, nomeadamente facturas e recibos. 18. A autora ao recusar-se a entregar a documentação do condomínio relativa aos anos civis 2019 a 2022 está a impedir, com prejuízo para o réu, e a manifesto seu favor, que o réu junte aos presentes autos documentos comprovativos da inexistência e/ou pagamento dos créditos ora peticionados. *** 19. Uma eventual decisão nos presentes autos não deverá ser alheia e depende da decisão que vier a ser proferida nos referidos autos da acção para apresentação de documentos (29/23.0T8FNC Juízo Local Cível do Funchal – Juiz 2) precisamente porque nesse processo, o réu espera poder estribar a sua defesa contra o pedido de pagamento por serviços alegadamente prestados a si pela autora. 20. Por outro lado, ao Direito e à Justiça importa salvaguardar o efeito útil da decisão que vier a ser produzida no referido processo judicial, sendo certo que os danos para o réu, são irreparáveis (sentença condenatória) se se jugar procedente o pedido de pagamento da autora, sem aguardar pela decisão naquele processo. 21. A decisão das questões ali colocadas irá influir, naturalmente, na decisão que nestes autos se vier a adoptar, designadamente, 22. Modificando, ou, mesmo, inutilizando os seus efeitos ou mesmo tirando razão de ser dos presentes autos. 23. Os autos do Proc. n.º 29/23.0T8FNC – acção para apresentação de bens, que corre termos no Juízo Local Cível do Funchal – Juiz 2, desta Comarca, constitui uma questão prejudicial prévia, relativamente ao objecto do presente litígio, nos termos e para os efeitos do artigo 272º do Código de Processo Civil, o que para todos os efeitos se invoca. 24. Razão pela qual deverão estes ser suspensos, nos termos legais. Entendimento diverso, redundaria em flagrante violação dos artigos 334º, º754º a 756º, e 1436.º, n.º1, n) do Código Civil, e o artigo 272.º, n.º1 do Código de Processo Civil. *** 25. O despacho que indeferiu o pedido de verificação de questão prejudicial, não ordenou a suspensão da instância, e ordenou o prosseguimento dos autos, deverá, por tudo o exposto, ser revogado”. Conclui, no sentido da total procedência do recurso, “devendo ser revogado o despacho que indeferiu o pedido de verificação de questão prejudicial, não ordenou a suspensão da instância, e ordenou o prosseguimento dos autos”. 8 – A Recorrida/Apelada não apresentou contra-alegações. 9 – O recurso foi admitido por despacho de 06/10/2023, como apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo. 10 – Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar, valorar, ajuizar e decidir. ** II – ÂMBITO DO RECURSO DE APELAÇÃO Prescrevem os nºs. 1 e 2, do artº. 639º do Cód. de Processo Civil [2], estatuindo acerca do ónus de alegar e formular conclusões, que: “1 – o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. 2 – Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar: a) As normas jurídicas violadas ; b) O sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas ; c) Invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada”. Por sua vez, na esteira do prescrito no nº. 4 do artº. 635º do mesmo diploma, o qual dispõe que “nas conclusões da alegação, pode o recorrente restringir, expressa ou tacitamente, o objecto inicial do recurso”, é pelas conclusões da alegação do Recorrente Apelante que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso. Pelo que, no sopesar das conclusões expostas, a apreciação a efectuar na presente sede determina aferir acerca: - Da eventual existência de uma relação de dependência e prejudicialidade entre os presentes autos e o processo de Apresentação de Coisas e Bens – nº. 29/23.0T8FNC -, que tramita no Juízo Local Cível do Funchal – Juiz 2, justificativa de suspensão da instância. ** III - FUNDAMENTAÇÃO A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A factualidade a ponderar é a que resulta do iter processual supra descrito. ** B - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO - Da suspensão da instância por determinação judicial Estatuem os nºs. 1 e 2, do artº. 272º, do Cód. de Processo Civil, prevendo acerca da suspensão da instância por determinação do juiz, que “o tribunal pode ordenar a suspensão quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. 2 – Não obstante a pendência de causa prejudicial, não deve ser ordenada a suspensão se houver fundadas razões para crer que aquela foi intentada unicamente para se obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens” (sublinhado nosso). Referencia Ary Elias da Costa e outros – Código de Processo Civil Anotado e Comentado, 3º Volume, Almedina, 1974, pág. 476 a 478 – contemplar o presente normativo os casos de suspensão judicial. Assim, enquanto “que nos casos de suspensão legal o tribunal tem o dever de ordenar a suspensão, esta é obrigatória, nos casos de suspensão judicial o tribunal pode ou não fazê-lo, conforme entenda”. Concatenando-se com o disposto na alínea c), do nº. 1, do artº. 269º, do mesmo diploma, num primeiro segmento do normativo, a suspensão pode ser ordenada quando a decisão em causa esteja dependente de outra já proposta. Ora, afirma-se “que uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira possa fazer desaparecer o fundamento ou a razão de ser da segunda”, conforme se extrai do nº. 2, do artº. 276º, ainda do Cód. de Processo Civil. Por outro lado, resulta da legal estatuição que “a causa prejudicial há-de estar já proposta no momento em que a suspensão é ordenada”, não bastando, assim, “invocar que vai ser proposta uma causa prejudicial”, sendo, todavia, bastante “que a causa prejudicial esteja proposta no momento em que se ordena a suspensão ; nada importa que o não tivesse ainda na data em que se intentou a causa dependente. A frase «já proposta» refere-se manifestamente ao momento em que o juiz profere o despacho de suspensão, visto estar em correlação com esta outra: «o tribunal pode ordenar a suspensão»”. No que concerne à segunda parte do nº. 2, do transcrito normativo, referenciam os mesmos Autores prevenir “a hipótese da causa dependente se encontrar em fase adiantada, como por exemplo, estra prestes a ser discutida e julgada, no momento em que se requereu a sua suspensão com o fundamento de se encontrar pendente uma causa prejudicial. O tribunal deve indeferir o requerimento, porque o seu deferimento causaria prejuízo superior à vantagem da suspensão” – ob. cit., pág. 481 e 482. Aduz Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida – Direito Processual Civil, Vol. I, 2ª Edição, Almedina, 2017, pág. 534 a 536 – que “o termo verbal «pode» logo sugere tratar-se de um poder não vinculado, mas em todo o caso de um poder-dever ao qual devem subjazer preocupações de economia e celeridade processuais e de eficácia das decisões”. Assim, “a lei dá ao juiz a faculdade, mas lhe não impõe a obrigação, de suspender a instância quando haja pendência de causa prejudicial. Poder esse balizado pelo condicionalismo imposto no preceito: a existência de causa prejudicial (quando não se verifique o caso do nº. 2) ou a ocorrência de motivo justificativo. A suspensão pode, em tais circunstâncias, ser ordenada ex-officio (logo que o juiz se aperceba do facto gerador da suspensão) ou a requerimento das partes. (…) Vem, a este propósito, assinalar que os nºs. 1 e 2 do art. 272º se reportam a toda e qualquer questão prejudicial, enquanto que o art. 92º se refere apenas à dependência da decisão da causa subordinada relativamente a uma decisão da competência do foro criminal ou administrativo. O critério aferidor decisivo dessa relação ou «nexo de dependência» reside em vir controvertida na causa prejudicial uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica relevante para a decisão de outro pleito” (sublinhado nosso). Assim, no caso do artº. 92º trata-se de “uma questão, e não de uma outra causa, de cuja decisão depende o conhecimento da acção e para a qual o juiz da causa não é normalmente competente”. Relativamente à noção ou caracterização de questão ou causa prejudicial (já supra definimos a noção daquela), afirma-se que “uma causa é prejudicial em relação a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda”. Acrescenta Alberto dos Reis - Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. 3º, 1946, Coimbra Editora, pág. 268 e 269 - que “segundo o Prof. Andrade, verdadeira prejudicialidade e dependência só existirá quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental, como teria de o ser, desde que a segunda causa não é reprodução, pura e simples, da primeira. Mas nada impede que se alargue a noção de prejudicialidade, de maneira a abranger outros casos. Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal. Estamos de acordo. Há efectivamente casos em que a questão pendente na causa prejudicial não pode discutir-se na causa subordinada ; há outros em que pode discutir-se nesta, mas somente a título incidental. Na primeira hipótese o nexo de prejudicialidade é mais forte, na segunda, mais frouxo ; na primeira há uma dependência necessária, na segunda, uma dependência meramente facultativa ou de pura conveniência”. Por sua vez, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre – Código de Processo Civil Anotado, Vol. 1º, 4ª Edição, Almedina, pág. 550 e 551 – referenciam ocorrer legal admissibilidade de suspensão da instância quando penda causa prejudicial, entendendo-se esta como a que tem “por objeto pretensão que constitui pressuposto da formulada” (sublinhado nosso). Assim, exemplificam que “a ação de nulidade dum contrato é, por exemplo, prejudicial relativamente à ação de cumprimento das obrigações dele emergentes”, sendo que a “suspensão só pode ser ordenada se, no momento do despacho, a ação prejudicial estiver efetivamente proposta”, cessando quando estiver definitivamente julgada a causa prejudicial (cf., o artº. 276º, nº. 1, alín. c), do CPC). Por fim, consignam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa – Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, Almedina, 2019, pág. 314 e 315 – dever “comprovar-se uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto de outra decisão (v.g. ação para cumprimento de um contrato e ação em que se invoque a nulidade desse contrato)”. Acrescentam que “o nexo de prejudicialidade define-se assim: estão pendentes duas ações e dá-se o caso de a decisão de uma poder afetar o julgamento a proferir noutra ; a razão de ser da suspensão, por pendência de causa prejudicial é a economia e a coerência de julgamentos (…)”. Todavia, ressalvam, “ainda que esses dois requisitos se verifiquem, o juiz deve negar a suspensão fundada na prejudicialidade quando se demonstrar que a ação foi intentada precisamente para se obter a suspensão da outra ou, independentemente disso, quando o estado da causa tornar gravemente inconveniente a suspensão. É que não pode ignorar-se que a suspensão obsta a que a instância prossiga naturalmente, o que pode revelar-se gravoso para os interesses que o autor procurou acautelar. Daí que, nessas situações, cumpra apreciar na ação todas as questões que tenham sido suscitadas” (sublinhado nosso). O despacho apelado raciocinou nos seguintes termos: - o Réu deduz incidente de verificação de uma causa prejudicial, alegando, em síntese, ter proposto contra a Autora duas acções: Ø Uma, onde reclama a entrega dos documentos e bens, referente ao período em que exerceu funções de administradora de condomínio ; Ø A segunda, de prestação de contas do respectivo exercício, as quais sendo procedentes, fará antever que os serviços prestados não em dívida ; - a Autora contesta a pretensão, pugnando pelo indeferimento da suspensão, por considerar que as acções não conflituam com o direito de crédito que pretende fazer valer ; - apreciando o deduzido incidente, consigna que as acções propostas pelo Réu Condomínio contra a Autora não conflituam com o exercício do direito de crédito que esta pretende fazer valer nesta acção ; - por outro lado, não obsta ao exercício do direito de defesa do Réu, nem impede que o Tribunal conheça das excepções por si invocadas ; - acresce que, tendo já sido designada data para a realização da audiência final, e atendendo ao estado adiantado dos autos, atento o disposto no nº. 2, do artº. 272º, do Cód. de Processo Civil, inexistem razões para serem suspensos ; - o que determina indeferimento do requerido, por falta de fundamento legal, determinando-se o prosseguimento dos autos com designação da data para realização da audiência final. No excurso recursório apresentado, o Recorrente Condomínio pugna pela revogação de tal despacho, que indeferiu o pedido de verificação de questão prejudicial, não ordenou a suspensão da instância e determinou o prosseguimento dos autos, argumentando, em síntese, nos seguintes termos: a. O processo de Apresentação de Coisas e Bens – nº. 29/23.0T8FNC, que tramita no Juízo Local Cível do Funchal (Juiz 2) – constitui questão prejudicial prévia relativamente ao objecto do presente litígio, nos termos e para os efeitos do artº. 272º, do Cód. de Processo Civil ; b. Da necessidade de salvaguardar o efeito útil daquela acção para apresentação de coisas e bens, que o verá inutilizado, caso seja julgado, na presente acção, procedente o pedido deduzido pela Autora ; c. Da impossibilidade do exercício do direito de defesa por parte do Réu, decorrente do facto da Autora recusar-lhe a entrega de documentação, nomeadamente a concreta impugnação dos créditos ou a simples alegação do pagamento ; d. O que se potencia pela circunstância de ser impossível ao Réu, na presente forma processual, poder formular requerimentos de prova, nomeadamente de documentos na posse de terceiros, nos termos do artº. 432º, do Cód. de Processo Civil ; e. Do artº. 60º do requerimento da Autora de 04/11/2022, e da existência de manifesto abuso de direito por parte da mesma. Apreciemos. Em primeiro lugar, urge consignar que, apesar de no deduzido incidente de verificação de causa ou questão prejudicial se aludir à existência de causa prejudicial por referência a dois processos judiciais intentados – nº. 29/23.0T8FNC, de apresentação de coisas e bens e nº. 31/23.2T8FNC, de prestação de contas -, no âmbito da presente apelação (e, mais concretamente, nas conclusões recursórias apresentadas) tal alegada prejudicialidade é apenas referenciada relativamente ao primeiro dos processos identificados. Pelo que, será com esta amplitude ou âmbito que se conhecerá do delimitado objecto recursório. Ora, o identificado processo de Apresentação de Coisas e Bens – nº. 29/23.0T8FNC, que tramita no Juízo Local Cível do Funchal (Juiz 2) – constitui causa prejudicial prévia relativamente ao objecto do presente litígio ? Ou seja, a apreciação do litígio na presente acção (acção ou causa dependente) está concretamente condicionado pelo que venha a decidir-se naquela acção (acção ou causa prejudicial) ? De forma mais incisiva, a decisão que venha a ser prolatada naquele processo de Apresentação de Coisas e Bens pode realmente afectar o julgamento nos presentes autos ? Avançemos, desde já, que não cremos, claramente, que tal nexo de prejudicialidade seja reconhecível. Nos presentes autos, exercita a Requerente/Autora um alegado direito de crédito relativamente ao Réu, decorrente de um contratualizado acordo de prestação de serviços, no âmbito do qual afirma ter-lhe prestado serviços de administração, jardinagem, limpeza e material de escritório, no valor global de capital de 7.999,36 €. Por sua vez, naquela acção apontada como prejudicial, o ora Réu Condomínio, que ali figura como Requente/Autor, pretende a condenação da Requerida (ora Autora) a entregar-lhe bens e documentos que alegadamente lhe pertencem, aduzindo que, caso venha a ser julgada procedente, “poderá encontrar evidência da quantia ora peticionada ter sido já paga”. Decorre, assim, do exposto que a eventual decisão a proferir na aludida causa prejudicial – acção de apresentação de coisas e bens – nunca poderia fazer desaparecer a razão de ser ou o fundamento da presente acção reivindicada como dependente, ou seja, a resolução da controvérsia em litígio naquela causa, alegadamente prejudicial, nunca modificaria, de forma juridicamente relevante, a decisão a prolatar nos presentes autos, pois a pretensão afirmada no objecto daquela não constitui pressuposto da pretensão reivindicada nos presentes autos. Efectivamente, um putativo juízo de procedência daquela aludida causa prejudicial, não determinaria a perda da razão de ser da presente causa aludidamente dependente, pois o ali decidido nenhuns reflexos jurídicos relevantes provocaria na apreciação da questão em controvérsia na presente acção. O que, por si só, inviabilizaria a reclamada verificação de causa prejudicial, determinante de suspensão judicial da instância. Todavia, conforme vimos, o Recorrente Condomínio Réu configura tal prejudicialidade como que em termos de potencialidade probatória, ao aduzir que, sem aquela documentação que reclama na catalogada causa prejudicial, vê-se impossibilitado de exercer o seu direito de defesa na presente acção, reclamada como dependente, nomeadamente no que concerne à impugnação dos créditos reclamados ou mera alegação do seu pagamento. O que considera, ainda, ser constatável com maior incisividade, atenta a impossibilidade de, na presente forma processual, poder formular requerimentos de prova, nomeadamente de prova documental na posse de terceiros, nos termos do artº. 432º, do Cód. de Processo Civil. Ora, conforme referenciámos, a suspensão judicial por pendência de causa prejudicial, prevista no nº. 1, do artº. 272º, do Cód. de Processo Civil, não tem por fundamento eventual potencialidade probatória a adquirir por via da resolução da causa prejudicial. Pelo que, com tal fundamento ou desiderato, nunca seria reconhecível fundamentação para a requerida suspensão. Todavia, em abstracto, poder-se-ia equacionar se aquela apontada finalidade probatória justificaria a determinação de suspensão da instância pela ocorrência de outro motivo justificado, nos termos da parte final do mesmo normativo. Ora, também por esta via não consideramos justificar-se decisão judicial de suspensão da instância. O que, in casu, resulta claro e evidente. Com efeito, atento o teor da oposição apresentada pelo Requerido/Réu à pretensão acional deduzida pela Autora, não se vislumbra, minimamente, donde decorrerá a aludida impossibilidade do direito de defesa. Por outro lado, não temos por pacífica ou incontroversa a afirmação de que, na presente forma processual, e apesar do disposto no nº. 4, do artº. 3º, do Regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos – aprovado pelo artº. 1º do DL nº. 269/98, de 01/09 [3] (diploma preambular que aprovou o regime dos procedimentos para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância) -, as partes encontram-se impedidas de recorrer ao mecanismo previsto no artº. 429º, do Cód. de Processo Civil – requerimento para uso de documentos em poder da parte contrária (sendo este efectivamente o mecanismo em equação, e não o indicado pelo Recorrente de apresentação de documentos em poder de terceiro, equacionado no artº. 432º, do mesmo diploma). Donde, esta argumentação, desde logo pelo seu não reconhecimento, não se enquadra ou tipifica como outro motivo justificado, fundante de pertinente suspensão judicial da instância. Por fim, no que concerne ao imputado abuso de direito por parte da Autora, ora Recorrida, decorrente do exposto no artº. 60º do seu requerimento de 04/11/2022, consta deste que “não é da decisão judicial sobre a entrega da documentação do réu condomínio pela autora que depende a decisão sobre se a autora é credora do réu porquanto o réu tem como aceder à conta bancária e aos cheques e a todos os débitos realizados na conta bancária e dessa forma tem como saber que deve todos os valores em causa na presente acção”. Ora, não se descortina como, na presente acção, tal constitua abuso de direito, pois não é objecto desta aferir-se se a ora Autora, enquanto administradora ou ex-administradora do Réu Condomínio, é ou não titular de direito de retenção sobre a documentação do Condomínio, a qual se recusará a entregar, nos termos dos artigos 754º a 756º, do Cód. Civil. O que é igualmente verdade no que concerne aos efeitos daquela alegada recusa para eventual sancionamento em sede do imputado abuso de direito. E isto, independentemente dos efeitos probatórios retiráveis de tal alegado comportamento, potencialmente a aferir nos presentes autos na decorrência da alegada falta de colaboração da Autora, enquadráveis nos termos do artº. 417º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil. Donde, no reconhecimento da falência dos argumentos recursórios, resta, sem ulteriores delongas, concluir pela total improcedência da apelação, com consequente confirmação da decisão recorrida/apelada. * Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo em consideração o decaimento observado, as custas devidas serão suportadas pelo Apelante/Recorrente/Requerido/Réu. *** IV. DECISÃO Destarte e por todo o exposto, acordam os Juízes desta 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa em: a) Julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelo Requerido/Réu/Recorrente/Apelante Condomínio.................., em que figura como Requerente/Autora/Recorrida/Apelada A…………………….., LDA. ; b) Em consequência, confirma-se o despacho recorrido/apelado ; c) Nos quadros do artº. 527º, nºs. 1 e 2, do Cód. de Processo Civil, tendo em consideração o decaimento observado, as custas devidas serão suportadas pelo Apelante/Recorrente/Requerido/Réu. -------- Lisboa, 11 de Julho de 2024 Arlindo Crua Laurinda Gemas José Manuel Monteiro Correia _______________________________________________________ [1] A presente decisão é elaborada conforme a grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990, salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original. [2] Todas as referências legais infra, salvo expressa menção em contrário, reportam-se ao presente diploma. [3] Na vigente redacção, decorrente do DL nº. 107/2005, de 01/07. |