Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
991/18.5T8VLG.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: DESPEDIMENTO COLECTIVO
PAGAMENTO DA COMPENSAÇÃO E CRÉDITOS VENCIDOS
EMPRESA EM PROCESSO ESPECIAL DE REVITALIZAÇÃO
PLANO DE RECUPERAÇÃO
FUNDO DE GARANTIA SALARIAL
Nº do Documento: RP20210419991/18.5T8VLG.P2
Data do Acordão: 04/19/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE, CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Verifica-se a exceção inserida na parte final do artigo 383º, alínea c) do Código do Trabalho (CT) - ficando dispensada a exigência de colocar à disposição do trabalhador alvo de um despedimento coletivo a totalidade dos montantes em dívida até ao termo do prazo de aviso prévio – se a empregadora se submeteu a um Processo Especial de Revitalização (PER), no âmbito do qual foi decidido o despedimento coletivo, tendo este ficado previsto no plano de recuperação proposto e aprovado, tendo o trabalhador tido possibilidade de intervir no processo e no plano de pagamento do seu crédito.
II - Ocorrendo a cessação dos contratos de trabalho antes do plano de recuperação da Ré/entidade patronal ter sido homologado por sentença no âmbito do PER, através de um procedimento de despedimento coletivo, o pagamento da compensação devida e dos créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação tem lugar no âmbito do PER (artigo 363, nº 5 do CT).
III - Verificada aquela exceção ao dever do empregador de pagar até ao termo do prazo de aviso prévio a compensação e os créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, ao trabalhador abrangido pelo despedimento coletivo, a presunção prevista no artigo 366º, nº4 do Código do Trabalho, pode funcionar se ultrapassado aquele momento, como sucede no caso em que se previu o pagamento faseado da compensação pelo despedimento coletivo.
- Os nºs 4 e 5 do artigo 366º do Código do Trabalho, visam impor que o trabalhador tenha um comportamento ativo, concretizado pela devolução ou não aceitação da compensação, acompanhado de comportamento inequívoco e revelador dessa vontade. Tal comportamento é exigível ao trabalhador que tenha recebido a compensação em decorrência do artigo 336º do mesmo Código, ou seja, sendo o seu pagamento assegurado pelo Fundo de Garantia Social.
IV - Tendo a Entidade empregadora/Recorrida suspendido o pagamento da compensação, na sequência do peticionado pelos Trabalhadores/Recorrentes junto do Fundo de Garantia Salarial sobre os créditos garantidos por este, não é afastada a presunção prevista no artigo 366º, nº4 do Código do Trabalho.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 991/18.5T8VLG.P2
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho de Valongo – Juiz 1
Recorrentes:
-B…
-C…
-D…
-E…
-F…
-G…
-H…
-I…
-J…
Recorrido:
K…
Relatora: Teresa Sá Lopes
1º Adjunto: Des. António Luís Carvalhão
2º Adjunto: Des. Domingos Morais.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório:
Os Recorrentes B…, C…, D…, E…, F…, G…, H…, I…, J… intentaram ação de impugnação de despedimento coletivo contra o K… pedindo ao Tribunal que se digne (transcrição):
“ Deve a presente ação ser julgada procedente e provada, e, por via disso, deve:
a) Declarar-se a ilicitude do despedimento dos Autores;
b) Condenar-se a Ré a reintegrar os Autores no seu posto de trabalho com antiguidade, categoria e salário devido à data do despedimento, ou, em opção, pela compensação legal prevista e reconhecida no doc. nº 3;
c) Condenar-se a R. a pagar aos Autores as remunerações e mais prestações laborais que estes normalmente aufeririam desde a data do despedimento até à data da douta sentença;
d) Condenar-se a R. a pagar a cada um dos Autores uma indemnização por danos não patrimoniais em valor não inferior a 500€ (quinhentos euros);
e) Condenar-se a R. no pagamento dos juros, à taxa legal, sobre estas importâncias, desde a data de citação até efetivo pagamento.
f) Condenar-se a R. nas custas e mais encargos legais”.

A Ré contestou, requerendo a final dever:
“a) ser a presente instância declarada extinta por inutilidade superveniente da lide; Subsidiariamente,
b) ser julgada procedente e provada a exceção perentória da aceitação do despedimento pelos AA., absolvendo-se a R. dos pedidos por estes formulados; Ainda subsidiariamente,
c) ser a presente ação julgada totalmente improcedente de facto e de direito, absolvendo-se a R. relativamente a todos os pedidos formulados pelos AA., com os fundamentos acima expostos;
d) serem os AA. condenados nas custas e demais encargos.
Ainda subsidiariamente e sem prescindir, na hipótese da procedência do pedido formulado pelos AA. sob a alínea c), o que só por mera hipótese académica se concede, a R. só poderá ser condenada a pagar aos AA. as prestações pecuniárias líquidas que estes deixarem de auferir desde 30 dias anteriores à propositura da ação (10/04/18) até à data do trânsito em julgado da sentença a proferir nos presentes autos, deduzida do montante do subsídio de desemprego auferido pelos mesmos trabalhadores.
*
Posteriormente, foi proferido despacho saneador, no qual, por se entender que o estado dos autos o permitia desde já, foi proferida decisão, de cujo dispositivo consta:
“Pelo exposto, considerando a existência de tal exceção peremptória de não devolução da compensação recebida quer da Ré, quer do Fundo de Garantia Salarial, decido absolver a Ré do pedido.
Custas pelos Autores”(realce nosso).

2. Não se conformando com o assim decidido, apelaram os Autores, apresentando as respetivas alegações e aquelas que consideraram serem as conclusões, que aqui se transcrevem:
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A Recorrida contra-alegou finalizando com as seguintes conclusões:
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Nesta Relação foi emitido pelo Exm.º Procurador-Geral Adjunto parecer no sentido do recurso não obter provimento.
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Questão prévia:
Concluíram os Apelantes que a Juiz do Tribunal que julgou o PER (Juízo do Comércio de Santo Tirso), na decisão judicial datada de 7 de novembro de 2017, transitada em julgado, proferida nesse PER, fixou a cada um dos aqui Autores a indemnização de 30 dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano completo ou fração de antiguidade, estando sujeitos à condição suspensiva de verificação da ilicitude da cessação do contrato de trabalho, exorbitando o âmbito das suas competências ao proferir tal decisão, a qual estava, única e exclusivamente na esfera jurisdicional dos Tribunais do Trabalho.
Não é nestes autos que podia ser conhecida a questão da incompetência do Tribunal de Santo Tirso para a referida decisão.
Tal questão não será pois aqui analisada.
Acresce referir que não será analisado o pedido formulado na alínea Z) das conclusões dos Apelantes “deve ser revogada e substituída a sentença do Tribunal “a quo” por Acórdão que condene a Recorrida no pagamento integral da indemnização devida aos trabalhadores aqui recorrentes, sem sujeição ao PER, e atento o seu despedimento coletivo, nos termos do disposto no artigo 366º do Código do Trabalho.
Assim como não será outrossim analisado o pedido formulado na parte final da alegação dos Apelantes de este tribunal “declarar o despedimento coletivo ilícito e condenar o K… às competente e integrais indemnizações”.
Com efeito, como concluiu a Apelada, aqueles pedidos extravasam a decisão contida na parte dispositiva do despacho recorrido, a qual se cingiu ao conhecimento da exceção perentória da não devolução da compensação recebida pelos Apelantes, julgando-a verificada, e, em consequência, absolveu a Recorrida dos pedidos.
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Cumpridas as formalidades legais e nada obstando ao conhecimento do mérito, cumpre decidir:

Questões a resolver:
Sendo pelas conclusões que se delimita o objeto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, as questão a decidir são as seguintes:
- da impugnação da decisão de facto;
- saber se a circunstância de ter sido, em processo especial de revitalização, homologado um plano de revitalização da empregadora que prevê o pagamento em prestações dos créditos ali relacionados relativos a compensações pelo despedimento coletivo de que foram alvo os recorrentes, implica não ter sido posta à sua disposição a compensação devida;
- não sendo assim, saber se ocorreu a exceção perentória de não devolução da compensação recebida quer da Ré, quer do Fundo de Garantia Salarial, como decidido em 1ª instância.

2. Fundamentação:
2.1. De facto:
Aquando do saneador, em que foi proferida a decisão impugnada, o Tribunal recorrido considerou a seguinte factualidade:
“A)
A Ré instaurou um Processo Especial de Revitalização, (PER) que corre termos com o nº 2582/17.9T8STS, no Juízo de Comércio de Santo Tirso – no Juiz 1
B)
No âmbito desse processo foi nomeado em 01/09/2017, como administrador judicial provisório, o Sr. Dr. L….
C)
Na pendência desse processo, a Ré, em 18 de agosto de 2017, comunicou, por escrito, aos Autores a decisão de despedimento coletivo.
D)
Nessas cartas informou-lhes que o pagamento das respetivas compensações, encontravam-se sujeitos ao regime previsto no Plano apresentado nesse PER e que no mesmo propunha o perdão integral dos retroativos relativos a progressão na carreira/atualizações salariais e o pagamento de 40 % dos créditos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, em 48 prestações mensais de igual valor, com início no último dia do mês seguinte ao trânsito em julgado da sentença homologatória do Plano.
E)
Através de cartas que lhes dirigiu, comunicou que havia dado início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar, caso assim o entendessem, nas negociações em curso e de que dispunham do prazo de vinte dias contados da publicitação no portal Citius do despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório, ocorrida em 05/09/2017, para reclamar créditos junto deste, para a morada ali indicada.
F)
Os aqui Autores reclamaram nesse PER créditos salariais e indemnização por despedimento ilícito, peticionando 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração.
G)
Na decisão judicial datada de 7 de novembro de 2017, transitada em julgado proferida nesse PER, foi fixada a cada um dos aqui Autores a indemnização de 30 dias de retribuição base e diuturnidades, por cada ano completo ou fração de antiguidade, estando sujeitos à condição suspensiva de verificação da ilicitude da cessação do contrato de trabalho.
H)
Os Autores foram objeto de despedimento coletivo, tendo os seus contratos de trabalho cessado em 15 de novembro de 2017.
I)
No âmbito do PER, a Ré reformulou os termos dos pagamentos devidos aos trabalhadores abrangidos pelo despedimento coletivo, comunicando-lhes o seguinte montante e momento de pagamento dos respetivos créditos:
a) Retroativos (diferenças salariais e diuturnidades): Perdão total de capital;
b) Créditos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho:
i) Perdão de 50% do capital em dívida;
ii) Pagamento de 50 % do capital em dívida em 48 prestações mensais e sucessivas, nos seguintes termos:
1) a 1.ª prestação será no valor de € 3.000,00;
2) a quantia correspondente a 25 % da dívida remanescente será paga em 23 prestações mensais e iguais (a que corresponderá a 2.ª à 24.ª mensalidade);
3) o capital restante será pago em 24 prestações mensais e iguais (a que corresponderá a 25.ª à 48.ª mensalidade);
4) Pagamento da primeira prestação até ao trigésimo dia do mês seguinte à data do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano de recuperação a apresentar e as restantes em igual dia dos meses subsequentes;
c) Perdão integral de juros vencidos e vincendos.
J) Essa proposta foi apreciada e votada, no âmbito do referido PER, tendo tido o voto favorável de 54,68 % dos credores votantes.
K)
No dia 9 de fevereiro de 2018 foi proferida nesse PER a sentença que homologou o plano de revitalização do “K…”, a qual foi confirmada por douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 13 de junho de 2018.
L)
Os Autores deram entrada à presente ação no dia 14 de maio de 2018.
M)
Em conformidade com o aprovado no PER a Ré pagou aos Autores entre os meses de agosto de 2018 a agosto de 2019, as seguintes quantias a título de créditos salariais correspondentes a 50% dos créditos exigíveis por efeito da cessação dos respetivos contratos de trabalho:
- D… – € 11.349,66;
- C… - € 8.828,14;
- G…. - € 10.638,76;
- I… - € 10.301,63;
- E… – € 11.024,31;
- B… - € 10.076,33;
- H… - € 10.717,57;
- F… - € 10.069,63;
- J… - € 10.438,57.
N)
Os Autores peticionaram no dia 23 de abril de 2018, ao Fundo de Garantia Salarial uma compensação pelo despedimento coletivo e receberam deste, a esse título, as seguintes quantias em 5 de julho de 2018:
- D… – € 10.026,00;
- C… - € 10.026,00;
- G… - 9.526,00;
- I… - € 8.976,00;
- E… – € 10.026,00;
- B… - € 9.676,00;
- H… - € 9.526,00;
- F… - € 9.526,00;
- J… - € 10.026,00.
O)
A título de remunerações foram ainda pagas pelo Fundo de Garantia Salarial aos seguintes Autores as seguintes quantias:
- G… - € 500,00
- I… - € 1.050,00
- B… - € 350,00
- H… - € 500,00.
- F… - € 500,00.
P)
A Ré cessou os pagamentos que vinha efetuando aos Autores a partir do mês de setembro de 2019, por tais créditos terem sido cedidos ao Fundo de Garantia Salarial, por via da sub-rogação legal prevista no art.º 4.º do DL n.º 59/2015, de 21/04, em virtude do pagamento que este Fundo efetuou aos Autores dos mesmos créditos.”.

O Tribunal a quo, motivou a ponderação de tal factualidade “Tendo em consideração os documentos junto aos autos, cuja fidelidade e autenticidade não foi posta em causa”.

2.2. Alteração da decisão de facto:
De harmonia com o disposto no artigo 662º, nº1 do Código de Processo Civil (ex vi do artigo 1º, nº 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Os poderes da Relação sobre o julgamento da matéria de facto foram reforçados na atual redação do Código de Processo Civil.
Abrantes Geraldes, (in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, pág. 230) refere que, “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1.ª instância”. Apesar de (obra citada, pág. 245), “... a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não poder confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter”.
Na reapreciação da força probatória das declarações de parte, dos depoimentos das testemunhas e dos documentos, importa ter presente o princípio da livre apreciação, como resulta do disposto nos artigos 607º, nº5 e 466º, nº3, ambos do Código de Processo Civil e 396º e 366º.
Dito de outro modo, cabe à Relação, enquanto tribunal de 2ª instância, reapreciar, não apenas se a convicção expressa pelo tribunal de 1ª instância tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova e os restantes elementos constantes dos autos revelam, mas, também, avaliar e valorar, de acordo com o princípio da livre convicção, toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Preceitua ainda o artigo 640º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil:
1 – Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
a) Os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
b) A decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas;
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando nos meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de proceder à respetiva transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes
(…)”.
Como se lê no Acórdão do STJ de 01.10.2015, in www.dgsi.pt, “Quer isto dizer que recai sobre a parte Recorrente um triplo ónus:
Primo: circunscrever ou delimitar o âmbito do recurso, indicando claramente os segmentos da decisão que considera viciados por erro de julgamento;
Secundo: fundamentar, em termos concludentes, as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios probatórios constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, impliquem uma decisão diversa;
Tertio: enunciar qual a decisão que, em seu entender, deve ter lugar relativamente às questões de facto impugnadas.
Ónus tripartido que encontra nos princípios estruturantes da cooperação, da lealdade e boa fé processuais a sua ratio e que visa garantir, em última análise, a seriedade do próprio recurso instaurado, arredando eventuais manobras dilatórias de protelamento do trânsito em julgado da decisão. (…)”.
Servindo-nos também do texto do acórdão desta secção de 22.10.2018, proferido no processo 246/16.OT8VLG.P1, (Relatora Desembargadora Rita Romeira, no qual foi 1ª adjunta a aqui relatora):
«Verifica-se, assim, que o cumprimento do ónus de impugnação da decisão de facto, não se satisfaz com a mera indicação genérica da prova que na perspetiva do recorrente justificará uma decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal “a quo”, impõe-lhe a concretização quer dos pontos da matéria de facto sobre os quais recai a sua discordância como a especificação das provas produzidas que, por as considerar como incorretamente apreciadas, imporiam decisão diversa, quanto a cada um dos factos que impugna sendo que, quando se funde em provas gravadas se torna, também, necessário que indique com exatidão as passagens da gravação em que se baseia, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.
Além disso, nas palavras, (…) de (Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2014, 2ª edição, págs. 132 e 133), “O recorrente deixará expressa a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, como corolário da motivação apresentada, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência nova que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente, também sob pena de rejeição total ou parcial da impugnação da decisão da matéria de facto;”.
Sobre este assunto, no (Ac.STJ de 27.10.2016) pode ler-se: “…Como resulta claro do art. 640º nº 1 do CPC, a omissão de cumprimento dos ónus processuais aí referidos implica a rejeição da impugnação da matéria de facto.”…(…).».
Ainda a este propósito, lê-se no Acórdão desta secção de 15.04.2013 (relatora Paula Leal de Carvalho, in www.dgsi.pt, também citado no acórdão de 22.10.2018), “Na impugnação da matéria de facto o Recorrente deverá, pois, identificar, com clareza e precisão, os concretos pontos da decisão da matéria de facto de que discorda, o que deverá fazer por reporte à concreta matéria de facto que consta dos articulados (em caso de inexistência de base instrutória, como é a situação dos autos).
E deverá também relacionar ou conectar cada facto, individualizadamente, com o concreto meio de prova que, em seu entender, sustentaria diferente decisão, designadamente, caso a discordância se fundamente em depoimentos que hajam sido gravados, identificando as testemunhas por referência a cada um dos factos que impugna (para além “de indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respetiva transcrição.”».
Antes de mais importa esclarecer que atentas as conclusões dos Apelantes, quanto à seleção da matéria de facto pelo Tribunal a quo, aqueles insurgem-se apenas relativamente a um facto.
Concluíram os Apelantes que todos os trabalhadores/Autores aqui Recorrentes votaram desfavoravelmente o PER e há documentos no processo que o comprovam, pelo que tal facto terá de ser provado.
Em sede de alegações os Apelantes não concretizaram quais são esses documentos.
Todavia, uma vez que o Tribunal a quo motivou a decisão de facto, “Tendo em consideração os documentos junto aos autos”, não iremos atentar ao contra-alegado pela Apelada, no sentido da rejeição da impugnação por os Apelantes não indicarem os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa da recorrida.
Entendemos que a rejeição se justifica desde logo por um outro motivo.
Na verdade, importa atentar que o Tribunal a quo considerou provado que na pendência do PER, a Ré, em 18 de agosto de 2017, comunicou, por escrito, aos Autores a decisão de despedimento coletivo, informando-os de que o pagamento das respetivas compensações, encontravam-se sujeitos ao regime previsto no Plano ali apresentado e que fora proposto, comunicando-lhe que havia dado início a negociações com vista à sua revitalização, convidando-os a participar, caso assim o entendessem, nas negociações em curso e de que dispunham do prazo de vinte dias, contados da publicitação no portal Citius do despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório, ocorrida em 05/09/2017, para reclamar créditos junto deste, para a morada ali indicada (alíneas C), D) e E) dos factos provados).
Ainda que a proposta da Ré relativa aos pagamentos devidos aos trabalhadores pelo despedimento coletivo a que se reporta a alínea I) dos factos provados, foi apreciada e votada, no âmbito do referido PER, tendo tido o voto favorável de 54,68% dos credores votantes (alínea J) dos factos provados).
E bem assim que nesse PER, a 9 de fevereiro de 2018 foi proferida sentença que homologou o plano de revitalização do Apelado, a qual foi confirmada por douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 13 de junho de 2018 (alínea K dos factos provados).
Ora o sentido do voto dos Apelantes em nada releva para a decisão a proferir nestes autos uma vez que o plano insolvência homologado vincula todos os credores incluindo os afetados pela supressão ou alteração do valor dos seus créditos e inerentes garantias, sejam comuns, sejam privilegiados.
Como alegou a Apelada nas contra-alegações, decorre do artigoº 197º do CIRE (aplicável ex vi nº 7 do artigo 17º-F do CIRE) que não é necessária a unanimidade do voto dos credores, incluindo os afetados pela supressão ou alteração do valor dos seus créditos e inerentes garantias, ainda que privilegiados, para que o plano de insolvência homologado vincule todos os credores, sejam comuns, sejam privilegiados.
Na verdade, como infra se deixará demonstrado, o que importava apurar e resultou assente é que os Apelantes tiveram oportunidade de participar nas negociações com vista à revitalização da Ré e de reclamarem os seus créditos salariais e indemnização por despedimento ilícito (alíneas E) e F) dos factos provados).
Ora, tratando-se de matéria inócua impõe-se que este Tribunal indefira a reapreciação da decisão da matéria de facto, do aludido facto.
Neste sentido cfr. Acórdão desta Relação de 19.5.2014 (Relator Desembargador Carlos Gil, in www.dgsi.pt), em cuja sumário se lê: “II- A reapreciação da decisão da matéria de facto visa obter um sustentáculo fáctico para uma certa solução para uma dada questão de direito, pelo que se a matéria de facto cuja reapreciação se requer é inócua à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, deve o tribunal ad quem indeferir essa pretensão, por força da proibição da prática no processo de actos inúteis.”
Indefere-se a assim a pretendida reapreciação da decisão da matéria de facto, a respeito do alegado facto.

2.3. Do direito:
Foi esta a fundamentação da decisão recorrida:
“Comecemos pela questão de os Autores não terem, apesar de terem conhecimento de existência do PER, se não concordavam com o valor e o método de pagamento dos seus créditos, deviam-no ter reclamado no âmbito do processo especial de revitalização em curso, sendo no âmbito do PER que tal questão seria dirimida, dado a cessação dos contratos de trabalho ter ocorrido ainda antes do plano de recuperação ter sido homologado por sentença.
Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária a questão não pode ser colocada nesses moldes no caso em apreço.
É que os Autores já defendiam no âmbito desse PER que o despedimento coletivo era ilícito, com as inerentes consequências que tal acarreta.
Diga-se a este propósito, que, na pendência desta ação, os Autores vieram optar pelo recebimento da indemnização por antiguidade em detrimento da reintegração.
Ora, a discussão relativa à licitude do despedimento coletivo, foi pelo despacho judicial transitado em julgado, efetuado no âmbito daquele PER datado de 7 de novembro de 2017, relegado para ação a instaurar no foro laboral a impugnação da licitude de tal despedimento, com a cambiante de nesse despacho ter sido já fixado que a indemnização devida por cada ano ou fração de ano, em caso de ilicitude ascendia a 30 dias de remuneração.
Por força de tal decisão judicial os créditos relativos a tal indemnização não podiam ser objeto de discussão ou votação por parte dos credores, pelo que a este respeito nada obsta à instauração da presente ação.
Passemos assim à questão da não devolução da compensação recebida pelos Autores, quer por parte da Ré, quer por parte do Fundo de Garantia Salarial.
Aqui, repensando a questão, entendo caber razão à Ré ao defender que os Autores ao receberem (e não devolverem) o valor total das compensações pagos quer por parte da Ré em cumprimento do Plano, quer por parte do FGS, adotaram uma conduta contraditória com o propósito de recusa do despedimento.
Dispõe o artigo 366º do Código do Trabalho de 2009 no seu nº 4 que “Presume-se que o trabalhador aceita o despedimento quando recebe a compensação prevista neste artigo” e no seu nº 5 que “A presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, à disposição do empregador a totalidade da compensação pecuniária recebida”.
Como bem se salienta no Acórdão do S.T.J. de 3 de abril de 2013 “Decorre desta norma que a elisão da presunção de aceitação do despedimento exige a devolução ou a colocação à disposição da entidade empregadora do montante da compensação recebida, não se bastando com quaisquer tomadas de posição no sentido da não aceitação pelo trabalhador, ou mesmo com a simples impugnação do despedimento. No fundo está subjacente a esta norma o princípio de que a aceitação da compensação é incompatível com a rejeição do despedimento.
(…) Na verdade, a disponibilização da compensação não visa antecipar o pagamento de quaisquer indemnizações a que o trabalhador se sinta com direito decorrente de uma eventual ilicitude do despedimento, ou resolver os problemas sociais derivados do despedimento, conforme acima se referiu, não conferindo o sistema jurídico qualquer direito sobre esse quantitativo ao trabalhador despedido que pretenda impugnar o despedimento e não concorde com o mesmo.
A devolução do quantitativo disponibilizado surge, assim, como um imperativo decorrente do princípio da boa-fé nas relações entre as partes na relação de trabalho, sendo a respetiva retenção ilícita, nos casos em que o trabalhador não concorde com o despedimento”.
No caso em apreço, os Autores não só receberam da Ré a compensação nos moldes como tinha sido aprovada no P.E.R., como ainda reclamaram do Fundo de Garantia Salarial a compensação devida pelo despedimento coletivo, o que aliás fizeram ainda antes de instaurar a presente ação, vindo a receber do FGS tal montante compensatório, sendo certo que não devolveram tais montantes, pois nem sequer o alegaram.
É sabido que o Código do Trabalho de 2009 não coloca qualquer restrição no que respeita à propositura da ação de impugnação do despedimento, mesmo nos casos de recebimento da indemnização por parte do trabalhador, pois que como bem se refere no Ac. da Relação do Porto de 7 de Maio de 2012, “configurando a presunção do recebimento da compensação, não ilidida, como exceção perentória, repercute os seus efeitos apenas ao nível do direito substantivo, da licitude do despedimento e não, como na LCCT, versão original, logo ao nível do respetivo direito de ação”.
E, a meu ver, nada impede que tal exceção perentória seja superveniente à instauração da ação, e assim, o facto de os Autores terem feito sua a compensação já na pendência desta ação, não é impeditivo para a exceção funcionar, com a consequente absolvição da Ré do pedido”.
Em sede do direito, os Apelantes insurgem-se contra a decisão recorrida numa argumentação em que é possível identificar 3 segmentos:
1º segmento:
- O despedimento coletivo concretizou-se após a apresentação do PER em Tribunal.
- O despedimento não constava no Plano quando o PER foi requerido e nele não estavam inscritas as dívidas inerentes ao despedimento dos AA. que viria a ocorrer mais tarde.
2º segmento:
- A presunção do nº 4 do artigo 366º do Código do Trabalho só opera se a totalidade do valor da compensação estiver à disposição do trabalhador (no caso, dos trabalhadores/Autores) e por parte da entidade empregadora (a devedora), o que não aconteceu.
3º segmento:
- Não houve uma insolvência da devedora, continuando esta a laborar e permanecendo devedora aos aqui Recorrentes.
Quanto ao 1º segmento, referimos tão só que não foi impugnada a esse respeito a decisão de facto. Trata-se aliás de questão nova que se prende com a ilicitude do despedimento, não foi analisada pelo tribunal a quo e como tal não será aqui analisada.
No 3º segmento é também levantada questão que se prende com a ilicitude do despedimento e que não foi objeto de decisão pelo Tribunal a quo, tratando-se de questão nova não será aqui conhecida.
Em conformidade, a nossa análise recairá no 2º segmento.
Para além do que se salientou já, concluíram, em suma e de relevante, os Apelantes:
- competia ao K…, Entidade empregadora, o pagamento da totalidade do valor da compensação aos Trabalhadores/Apelantes;
- as compensações ou indemnizações devidas por um despedimento (coletivo) iniciado após o início de um PER, não podem ser pagas em prestações segundo um plano aprovado apenas pelos credores que já existiam antes do início do processo e/ou por credores que não os trabalhadores vindos de abranger por um despedimento coletivo posterior;
- o Tribunal a quo não podia concluir que, pelo facto de os Trabalhadores terem requerido o Fundo de Garantia Salarial aceitaram o despedimento.
Vejamos:
Ao caso sub judice aplica-se o Código do Trabalho de 2009, na versão que lhe foi conferida pelas Leis nº 23/2012, de 25/06 e nº 69/2013, de 30/08 (e também Leis nº 27/2014, de 08/05 e Lei nº 55/2014, de 25/08).
Acompanhamos a fundamentação do acórdão da Relação de Guimarães de 02.02.2017, (Relator Desembargador Antero Veiga, in www.dgsi.pt), no excerto que se transcreve:
“Refere o artigo 366.º do CT:
Compensação por despedimento coletivo
1 - Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
2 - A compensação prevista no número anterior é determinada do seguinte modo: (…)
3 - O empregador é responsável pelo pagamento da totalidade da compensação, sem prejuízo do direito ao reembolso, por aquele, junto do fundo de compensação do trabalho ou de mecanismo equivalente e do direito do trabalhador a acionar o fundo de garantia de compensação do trabalho, nos termos previstos em legislação específica.
(…)
Por sua vez o artigo 383.º refere:
Ilicitude de despedimento coletivo
O despedimento coletivo é ainda ilícito se o empregador:

c) Não tiver posto à disposição do trabalhador despedido, até ao termo do prazo de aviso prévio, a compensação por ele devida a que se refere o artigo 366.º e os créditos vencidos ou exigíveis em virtude da cessação do contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na parte final do n.º 5 do artigo 363
O artigo 363.º ressalva algumas situações.
Refere o normativo quanto ao prazo aludido, no seu nº 5:
5 - O pagamento da compensação, dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho deve ser efectuado até ao termo do prazo de aviso prévio, salvo em situação prevista no artigo 347.º ou regulada em legislação especial sobre recuperação de empresas e reestruturação de sectores económicos.
A expressão legal “posto à disposição” sob pena de ser esvaziada de conteúdo, tem um sentido de que o trabalhador deve poder receber a quantia devida até ao termo daquele prazo, deve ter essa possibilidade efetiva. Bernardo Xavier, Despedimento coletivo no Dimensionamento da Empresa, pág. 542 refere que o recebimento pode depender de um ato simples do trabalhador, como a passagem pela tesouraria ou pelos serviços administrativos da empresa. Ponto é que se retenha que a disponibilidade implica uma efetiva possibilidade por parte do trabalhador no recebimento da quantia. Vd. Ac. RL de 28/3/2012, processo nº 165/11.6TTVFX.L1-4.
Dizer ao trabalhador que o pagamento será efetuado de acordo com um plano já elaborado, não é o mesmo que colocar à disposição, antes representando o contrário, “não disponibilizamos a compensação porque o pagamento será efetuado noutros termos, o constante do plano”.
Assim importa apenas ver se ocorre alguma exceção permitida no nº 5 do artigo 363º do CT.
O artigo 347º do CT apenas se aplica aos casos de insolvência, não obstante a sua epígrafe poder sugerir entendimento diverso. A norma regula a cessação do (…) contrato em consequência do encerramento do estabelecimento em caso de insolvência ou promovida pelo administrador de insolvência antes de tal encerramento. O texto da norma não deixa dúvidas. A recuperação a que ali se alude é aquela que possa surgir no âmbito do processo especial de insolvência, após o decretamento desta. Ora a ré não foi declarada insolvente.
O PER apresenta regras próprias, aplicando-se a situações distintas, já que neste não ocorre ainda uma situação de insolvência (nos termos do artigo 3º do CIRE), destinando-se a devedores que comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja suscetível de recuperação- artigo 1º, nº 2 e 17º-A do CIRE.
No âmbito deste normativo (347º do CT), fazendo-se cessar os contratos por despedimento coletivo, não implica ilicitude o não pagamento da compensação, dado o disposto no nº 5 do artigo 363º.
Contudo o aludido nº 5 refere ainda “ salvo em situação… regulada em legislação especial sobre recuperação de empresas e reestruturação de sectores económicos”. O PER enquadra-se na referência “legislação especial sobre recuperação de empresas e reestruturação de sectores económicos”.
Uma interpretação literal parece apontar para a inaplicabilidade ao PER. O nº 5 aludido refere “situação prevista no artigo 347º ou situação regulada em legislação especial…”. No artigo 347º vêm previstas as situações de despedimento por encerramento e por iniciativa do administrador caso a colaboração do trabalhador não seja indispensável ao funcionamento da empresa, o mesmo não se passa no “regime “ do PER.
O normativo, nº 5 do artigo 363º do CT, parece exigir que a situação seja “regulada em legislação”, ou seja, que na legislação especial se preveja tal despedimento à semelhança do que ocorre com o artigo 347º do CT. Ora o regime do PER não prevê, não regula qualquer despedimento. A questão contudo demanda mais estudo, tendo em atenção as razões que determinam o regime excecional, e que terão cabimento nas situações abrangidas pelo PER. (…).
Admitindo por raciocínio a possibilidade de a compensação por despedimento coletivo no decurso do PER não implicar a obrigação de disponibilização da compensação como a prevê o artigo 366º do CT, sempre haverá que verificar em face do próprio regime do PER, se o caso dos autos se enquadra nos pressupostos de tal possibilidade.
Importa que o credor (trabalhador visado) tenha tido oportunidade de intervir no processo, e (…) no plano de pagamento do seu crédito, sem embargo do direito de contestar o despedimento (…)”.
Em concreto, referimos já que da factualidade considerada provada resulta que os Trabalhadores/Apelantes tiveram oportunidade de intervir no processo e no plano de pagamento dos respetivos créditos – alíneas C), D), E) e F) dos factos provados - no processo especial de revitalização, no qual foi homologado um plano de revitalização da Empregadora/ Recorrida, prevendo o pagamento em prestações dos créditos ali relacionados, relativos a compensações pelo despedimento colectivo de que aqueles foram alvo.
Focando-nos no entendimento (que sufragamos) de ao PER ser aplicável o disposto no artigo 363º nº5 do Código do Trabalho, transcrevemos também um excerto do acórdão da Relação de Lisboa de 26.02.2020 (Relatora Maria José Costa Pinto, in www.dgsi.pt), onde se lê no mesmo sentido: “Não se nos suscitam dúvidas quanto a enquadrar, em abstracto, nesta segunda excepção à regra geral do n.º 5 do artigo 363.º, o processo especial de revitalização (PER) que, como dispõe o n.º 1 do artigo 17º-A do Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas[17] (CIRE), se destina “a permitir ao devedor que, comprovadamente, se encontre em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, mas que ainda seja susceptível de recuperação, estabelecer negociações com os respectivos credores de modo a concluir com estes acordo conducente à sua revitalização”.
Cremos que nestas águas navega também Pedro Furtado Martins, ao referir que a exigência de colocar à disposição a totalidade dos montantes em dívida, não sendo admissíveis formas parciais de cumprimento da obrigação, é dispensada, no caso de despedimento colectivo, “quando este for realizado no contexto de um processo de insolvência ou de processos de recuperação de empresas ou de reestruturação de sectores económicos”[(…)”.
Vejamos então o que resulta do assim entendido, para a questão que cumpre conhecer no âmbito do segmento da argumentação dos Apelantes em análise.
Importa atentar ao requisito do pagamento da compensação e dos créditos vencidos e exigíveis no prazo do aviso prévio.
“O regime jurídico do despedimento coletivo confere aos trabalhadores abrangidos o direito a uma “compensação pela perda do emprego”[12] correspondente a 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade [artigo 366.º do Código do Trabalho, na versão da Lei n.º 69/2013, a aplicável], devendo aplicar-se as normas transitórias dos artigos 5.º e 6.º da Lei n.º 69/2013 no cálculo da compensação para os contratos cuja data de celebração é anterior às alterações ao Código do Trabalho de 2012 e 2013”, lê-se ainda no já citado acórdão da Relação de Lisboa de 26.02.2020.
A questão a análisar prende-se com o disposto no artigo 366º, nº4 do Código do Trabalho, onde se prevê que “Presume-se que o Trabalhador aceita o despedimento quando recebe do empregadora totalidade da compensação prevista neste artigo».
A pergunta cuja resposta não se nos afigura linear e que se coloca agora, não é pois saber se a Empregadora/Recorrida pagou até ao termo do prazo de aviso prévio a compensação e os créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho aos Trabalhadores/Apelantes, abrangidos como foram pelo despedimento coletivo.
Isto porque se nos afigura pacífico que a Recorrida não pôs à disposição dos Recorrentes a totalidade da compensação, a que se refere o artigo 366º do Código do Trabalho, até ao termo do aviso prévio.
Com efeito, no processo especial de revitalização, instaurado pela Ré, foi judicialmente homologado o plano contemplando o pagamento faseado da compensação pelo despedimento coletivo (alíneas A), I) e K) dos factos provados).
Tal a nada obsta, face ao entendimento seguido (como supra se consignou) de ser aplicável ao PER a exceção, prevista no artigo 363º, nº5 do Código do Trabalho, à regra de não serem admissíveis formas de pagamento faseado ou em prestações de compensação dos créditos vencidos e dos exigíveis por efeitos da cessação do contrato de trabalho, até ao termo do prazo de aviso prévio, (salvo se tal for convencionado por acordo entre as partes).
Ou seja, verificada aquela exceção ao dever do empregador de pagar até ao termo do prazo de aviso prévio a compensação e os créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação do contrato de trabalho, ao trabalhador abrangido pelo despedimento coletivo, a presunção prevista no artigo 366º, nº4 do Código do Trabalho, pode funcionar se ultrapassado aquele momento, como sucedeu no caso em que se previu o pagamento faseado da compensação pelo despedimento coletivo.
Como se lê no acórdão do STJ de 31.05.2016, (in www.dgsi.pt, referenciado e citado pela Apelada nas contra-alegações), “(…) subjacente àquele tipo de procedimentos – especiais, como a lei os designa (o PER) – o que se pretendeu foi dar flexibilidade e eficiência ao processo especial de revitalização para recuperação de empresas em situações de debilidade ou inviabilidade económica, o que envolve necessariamente a satisfação, dentro do quadro que se acordar, de todas as dívidas a fornecedores, clientes e trabalhadores”.
Como concluiu a Apelada, na esteira do entendimento vertido em tal aresto, ocorrendo a cessação dos contratos de trabalho antes do plano de recuperação da Ré/entidade patronal ter sido homologado por sentença no âmbito do Processo Especial de Revitalização (PER), através de um procedimento de despedimento coletivo – como sucedeu in casu -, o pagamento da compensação devida e dos créditos vencidos e exigíveis por efeito da cessação tem lugar no âmbito do PER (art.º 363, n.º 5 do CT).
Doutro modo, como concluiu ainda, a este respeito, a Apelada, estaria a lei a tratar de forma diferente o recebimento da compensação pelos trabalhadores quando a mesma ocorresse nos termos da primeira parte do nº 5 do artigo 363º do Código do Trabalho ou nos termos da segunda parte da mesma disposição legal, sem qualquer fundamento razoável ou justificação objetiva, o que acarretaria a violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa.
Realçamos que resulta outrossim da factualidade provada que o despedimento foi promovido/ realizado no âmbito do mesmo processo especial de revitalização – alíneas C), D), E), F), G, H) e I) dos factos provados - e previsto no plano de revitalização que veio a ser homologado – alíneas J), K) e M) dos factos provados.
A questão mais controversa a decidir prende-se como se adiantou já com o disposto no artigo 366º nº 4 do Código do Trabalho.
Lê-se no referido acórdão da Relação de Lisboa:
Está em causa a questão da presunção de aceitação do despedimento prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho de 2009.
Estabelece o n.º 4 deste preceito de natureza substantiva uma presunção de que o trabalhador aceita o despedimento “quando recebe do empregador a totalidade da compensação prevista neste artigo” e o seu n.º 5 que “[a] presunção referida no número anterior pode ser ilidida desde que, em simultâneo, o trabalhador entregue ou ponha, por qualquer forma, a totalidade da compensação paga pelo empregador à disposição deste último”.
Desta solução legal depreende-se, ao menos em via de princípio, que “se a colocação da «compensação de antiguidade» à disposição do trabalhador despedido constitui um requisito indispensável, uma condição necessária para a licitude do despedimento, o recebimento de tal compensação pelo trabalhador perfila-se como condição suficiente para a respetiva licitude, como sanando quaisquer vícios, procedimentais ou substanciais, de que este enferme» [6].
A aceitação do despedimento por força do recebimento da compensação constitui facto impeditivo do direito do trabalhador de impugnar o despedimento e constitui, por isso, uma excepção peremptória, da qual resulta a absolvição do pedido nos termos do preceituado nos artigos 571.º, n.º 2, in fine e 576.º, n.º 3 do Código de Processo Civil .
(…)
Na verdade, esta excepção peremptória da aceitação do despedimento por força do recebimento da compensação não é oficiosamente cognoscível, encontrando-se a mesma prevista em matéria submetida à livre disponibilidade das partes e dependente de invocação expressa por parte do interessado [8]. (…)
(…)
Deve acrescentar-se, ainda, que, para que opere a presunção de aceitação do despedimento contemplada no n.º 5 do artigo 366.º, é necessário que o trabalhador receba do empregador a “totalidade da compensação prevista neste artigo”. Ou seja, a presunção de aceitação do despedimento “apenas opera se, e quando, o trabalhador recebe a totalidade da compensação” [10](…).
(…)”.
Em concreto, a questão da aceitação do despedimento em resultado do funcionamento da presunção de aceitação prevista no artigo 366º, nº 4 do Código do Trabalho foi suscitada pela Recorrida nos autos.
Ora, resulta ainda da matéria assente que a Empregadora/Recorrida não colocou à disposição dos Trabalhadores/Apelantes a totalidade das quantias a título de créditos salariais correspondentes a 50% dos créditos exigíveis por efeito da cessação dos respetivos contratos de trabalho, em conformidade com o aprovado no PER, sendo que a Ré cessou os pagamentos que vinha efetuando aos Autores, a partir do mês de setembro de 2019, por tais créditos terem sido cedidos ao Fundo de Garantia Salarial, por via da sub-rogação legal prevista no artigo 4º do Decreto lei nº 59/2015, de 21.04., em virtude do pagamento que este Fundo efetuou aqueles dos mesmos créditos – alíneas I), M), N), O), P) dos factos provados.
O artigo 336º do Código do Trabalho prevê que o pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, que não possam ser pagos pelo empregador, por motivo de insolvência ou de situação económica difícil, é assegurado pelo Fundo de Garantia Salarial, nos termos previstos em legislação específica.
O Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril aprovou um novo regime do Fundo de Garantia Salarial, previsto no artigo 336º do Código do Trabalho.
Importa atender aqui ao «Regime material do Fundo de Garantia Salarial», transcrevendo-se parte do mesmo:
«Artigo 1.º
Situações abrangidas
1 - O Fundo de Garantia Salarial, abreviadamente designado por Fundo, assegura o pagamento ao trabalhador de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação, desde que seja:
a) Proferida sentença de declaração de insolvência do empregador;
b) Proferido despacho do juiz que designa o administrador judicial provisório, em caso de processo especial de revitalização;
c) Proferido despacho de aceitação do requerimento proferido pelo IAPMEI - Agência para a Competitividade e Inovação, I. P. (IAPMEI, I. P.), no âmbito do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o Fundo é notificado nos seguintes casos:
a) No âmbito do processo especial de insolvência, o tribunal judicial notifica o Fundo da sentença de declaração de insolvência do empregador, a qual deve ser acompanhada de cópia da petição inicial e dos documentos identificados nas alíneas a) e b) do artigo 24.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE);
b) No âmbito do processo especial de revitalização, o administrador judicial provisório notifica o Fundo da apresentação do requerimento previsto no artigo 17.º-C do CIRE com cópia dos documentos indicados nas alíneas a) e b) do artigo 24.º do CIRE e referidos na alínea b) do n.º 3 do artigo 17.º-C do CIRE, bem como do despacho do juiz que o designa;
c) No âmbito do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, o IAPMEI, I. P., notifica o Fundo da apresentação do requerimento de utilização do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (SIREVE), do despacho de aceitação deste requerimento, da celebração e cessação do acordo e da extinção do procedimento.
3 - O Fundo assegura o pagamento dos créditos referidos no n.º 1 ao trabalhador que exerça ou tenha exercido habitualmente a sua atividade em território nacional ao serviço de empregador com atividade no território de dois ou mais Estados-Membros, ainda que este seja declarado insolvente por tribunal ou outra autoridade competente de outro Estado-Membro da União Europeia ou outro Estado abrangido pelo Acordo sobre o Espaço Económico Europeu.
Artigo 2.º
Créditos abrangidos
1 - Os créditos referidos no n.º 1 do artigo anterior abrangem os créditos do trabalhador emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação.
2 - Aos créditos devidos ao trabalhador referidos no número anterior deduzem-se:
a) Os montantes de quotizações para a segurança social, da responsabilidade do trabalhador;
b) Os valores devidos pelo trabalhador correspondentes à retenção na fonte do imposto sobre o rendimento.
3 - O Fundo entrega às entidades competentes as importâncias referidas no número anterior.
4 - O Fundo assegura o pagamento dos créditos previstos no n.º 1 que se tenham vencido nos seis meses anteriores à propositura da ação de insolvência ou à apresentação do requerimento no processo especial de revitalização ou do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas.
5 - Caso não existam créditos vencidos no período de referência mencionado no número anterior ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.º 1 do artigo seguinte, o Fundo assegura o pagamento, até este limite, de créditos vencidos após o referido período de referência.
6 - A compensação devida ao trabalhador por cessação do contrato de trabalho que seja calculada nos termos do artigo 366.º do Código do Trabalho, diretamente ou por remissão legal, é paga pelo Fundo, com exceção da parte que caiba ao fundo de compensação do trabalho (FCT), ao fundo de garantia de compensação do trabalho (FGCT) ou a mecanismo equivalente (ME), após o seu acionamento, salvo nos casos em que este não possa ter lugar.
7 - O disposto nos números anteriores não exime o empregador da responsabilidade pelo cumprimento das respetivas obrigações fiscais e contributivas de segurança social.
8 - O Fundo só assegura o pagamento dos créditos quando o pagamento lhe seja requerido até um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
9 - O prazo previsto no número anterior suspende-se com a propositura de ação de insolvência, a apresentação do requerimento no processo especial de revitalização e com a apresentação do requerimento de utilização do procedimento extrajudicial de recuperação de empresas, até 30 dias após o trânsito em julgado da decisão prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º ou da data da decisão nas restantes situações.
Artigo 3.º
Limites das importâncias pagas
1 - O Fundo assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, referidos no n.º 1 do artigo anterior, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida.
2 - Quando o trabalhador seja titular de créditos correspondentes a prestações diversas, o pagamento é prioritariamente imputado à retribuição base e diuturnidades.
Artigo 4.º
Sub-rogação legal
1 - O Fundo fica sub-rogado nos direitos e nos privilégios creditórios do trabalhador, na medida dos pagamentos efetuados, acrescidos de juros de mora vincendos.
2 - Sendo os bens da massa insolvente insuficientes para garantir o pagamento da totalidade dos créditos laborais, são graduados os créditos em que o Fundo fica sub-rogado a pari com o valor remanescente dos créditos laborais.
Artigo 5.º
Requerimento
1 - O Fundo efetua o pagamento dos créditos garantidos mediante requerimento do trabalhador, do qual constam, designadamente, a identificação do requerente e do respetivo empregador e a discriminação dos créditos objeto do pedido.
2 - O requerimento é instruído, consoante as situações, com os seguintes documentos:
a) Declaração ou cópia autenticada de documento comprovativo dos créditos reclamados pelo trabalhador, emitida pelo administrador de insolvência ou pelo administrador judicial provisório;
b) Declaração comprovativa da natureza e do montante dos créditos em dívida declarados no requerimento pelo trabalhador, quando o mesmo não seja parte constituída, emitida pelo empregador;
c) Declaração de igual teor, emitida pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, quando não seja possível obtenção dos documentos previstos nas alíneas anteriores.
3 - O requerimento é certificado pelo administrador da insolvência, pelo administrador judicial provisório, pelo empregador ou pelo serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área do emprego, consoante o caso, sendo a certificação feita:
a) Através de aposição de assinatura eletrónica; ou
b) Através de assinatura manuscrita no verso do documento.
4 - O requerimento é apresentado em qualquer serviço da segurança social ou em www.seg-social.pt, através de modelo aprovado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas do emprego e da segurança social.» (realce e sublinhado nossos).
Como referido no acórdão desta secção proferido no processo nº 15/14.1TTOAZ.1.P1, de 14.07.2020 (mesma relatora deste e com intervenção do aqui 2º Adjunto, in www.dgsi.pt), “(…) nos termos do artigo 2º do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril - verificados certos requisitos- o FGS assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho ou da sua violação ou cessação.
Todavia como resulta dos preceitos legais transcritos (…), essa sua responsabilização não é automática, já que está dependente de requerimento do trabalhador nesse sentido, (artigo 5º do citado Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril) devendo observar-se para tanto os termos e trâmites aí previstos, estando ainda limitada temporal e quantitativamente (artigo 2º nºs 6 e 8 do Decreto-Lei nº 59/2015, de 21 de abril)”.
Em concreto, resulta da factualidade provada que foi na sequência dos Autores/Apelantes terem requerido ao Fundo de Garantia Salarial o pagamento dos créditos garantidos por este que a Ré não deu continuidade, a partir do mês de setembro de 2019, ao pagamento que vinha efetuando aos Autores, da totalidade das quantias, a título de créditos salariais, correspondentes a 50% dos créditos exigíveis por efeito da cessação dos respetivos contratos de trabalho, em conformidade com o aprovado no PER.
Concluiu a Apelada, a este respeito, nomeadamente que os nºs 4 e 5 do artigo 366º do Código do Trabalho, visam impor que o trabalhador tenha um comportamento ativo, concretizado pela devolução ou não aceitação da compensação, acompanhado de comportamento inequívoco e revelador dessa vontade e nada justifica que não se exija a adotação de tal comportamento ao trabalhador que tenha recebido a compensação em decorrência do artigo 336º do mesmo Código, ou seja, sendo o seu pagamento assegurado pelo Fundo de Garantia Social, como neste caso sucedeu.
Revemo-nos nesta argumentação.
Não é por a Recorrida ter suspendido o pagamento da compensação, na sequência do peticionado pelos Autores/Recorrentes junto do Fundo de Garantia Salarial sobre os créditos garantidos por este que é afastada a presunção prevista no artigo 366º, nº4 do Código do Trabalho.
Com efeito, nos termos do disposto no artigo 366º, nº3 do Código do Trabalho, «O empregador é responsável pelo pagamento da totalidade da compensação, sem prejuízo do direito ao reembolso, por aquele, junto do fundo de compensação do trabalho ou de mecanismo equivalente e do direito do trabalhador a acionar o fundo de garantia de compensação do trabalho, nos termos previstos em legislação específica», (realce e sublinhado nossos).
Ainda, como salientado pelo o Tribunal a quo na decisão recorrida “os Autores não só receberam da Ré a compensação nos moldes como tinha sido aprovada no P.E.R., como ainda reclamaram do Fundo de Garantia Salarial a compensação devida pelo despedimento coletivo, o que aliás fizeram ainda antes de instaurar a presente ação, vindo a receber do FGS tal montante compensatório, sendo certo que não devolveram tais montantes, pois nem sequer o alegaram.
(…)
E (…) nada impede que tal exceção perentória seja superveniente à instauração da ação, e assim, o facto de os Autores terem feito sua a compensação já na pendência desta ação, não é impeditivo para a exceção funcionar (…)”, (realce e sublinhado nossos).
Não vemos face a tudo o exposto como pode deixar de funcionar a presunção.
Em conformidade, impõe-se confirmar na sua totalidade a decisão recorrida.

3. Decisão:
Acordam os juízes que integram a Secção social do Tribunal da Relação do Porto em considerar improcedente o recurso, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos Autores Apelantes.

Porto, 19 de Abril de 2021.
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
Domingos Morais