Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
850/21.4PAMTJ.L1.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: JORGE GONÇALVES
Descritores: RECURSO PENAL
RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
DUPLA CONFORME
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
REJEIÇÃO PARCIAL
PENA ÚNICA
CÚMULO JURÍDICO
Data do Acordão: 04/11/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Sumário :

I - Não é admissível recurso para o STJ de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos, exceto no caso de decisão absolutória em 1.ª instância, pena que tanto é a parcelar, cominada para cada um dos crimes, como a pena única/conjunta, pelo que, aferindo-se a irrecorribilidade separadamente, por referência a cada uma destas situações, os segmentos dos acórdãos proferidos em recurso pela Relação, atinentes a crimes punidos com penas parcelares inferiores a 5 anos de prisão, são insuscetíveis de recurso para o STJ, nos termos do disposto no artigo 432.º, n.º1, b), do CPP.


II - Estando em causa penas – parcelares ou resultantes de cúmulo jurídico - superiores a 5 anos e não superiores a 8 anos de prisão, está vedado o recurso para o STJ de acórdão da Relação que haja confirmado – dupla conforme - a decisão da 1.ª instância, ou seja, é apenas admissível recurso para o STJ de decisão confirmatória da Relação – casos de “dupla conforme”, incluindo a confirmação in mellius –, quando a pena aplicada, seja parcelar ou pena única resultante de cúmulo jurídico, for superior a oito anos de prisão.


III - A irrecorribilidade para o STJ de acórdão proferido em recurso pelo tribunal da Relação abrange todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão, tais como os vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, respetivas nulidades (artigos 379.º e 425.º, n.º 4, do CPP) e aspetos relacionados com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aqui se incluindo as questões atinentes à apreciação da prova, à qualificação jurídica dos factos e com a determinação das penas parcelares ou única, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação a aplicação do regime de atenuação especial da pena previsto no artigo 72.º do Código Penal, bem como questões de inconstitucionalidade suscitadas nesse âmbito.


IV - À constatação da existência de dupla conforme não obsta a circunstância de uma das Juízas Desembargadoras ter lavrado declaração de voto, como parcialmente vencida relativamente à medida de algumas das penas, porquanto o regime de recursos em processo penal - e especificamente em matéria penal - é autónomo, não revelando qualquer espaço de não regulação em que seja necessário recorrer, nos termos do artigo 4.º do CPP, às normas do processo civil.


V - Num recurso interposto para o STJ de acórdão da Relação, este constitui a decisão impugnada no recurso e, por ser assim, a impugnação tem de conter-se no âmbito da decisão recorrida, pelo que o recorrente já não pode retomar a impugnação da decisão da 1.ª instância como se a Relação não tivesse decidido um recurso, com esse âmbito e objeto.

Decisão Texto Integral:







RECURSO n.º 850/21.4PAMTJ.L1.S1


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I – RELATÓRIO


1. No âmbito do Processo Comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, n.º 850/21.4 PAMTJ, do Juízo Central Criminal de Almada, foram julgados e condenados os arguidos:


1. AA, na pena única de 9 anos de prisão, em resultado do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares:


a) na pena de 7 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204.º, n.º1, f) e n.º 2, f) do Código Penal e 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendida BB);


b) na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado com agravação inoperante, previsto nos artigos 210.º, n.º1 e 2, b) e 204.º, n.º 2, f) do Código Penal e n.º 4 e artigo 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendido CC);


c) na pena de 8 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização, previsto nos artigos 3.º, n.º 1, e n.º 3, a), 34.º, n.º 2 e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro;


2. DD, na pena única de 9 anos de prisão, em resultado do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares:


a) na pena de 7 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204.º, n.º1, f) e n.º2, f) do Código Penal e 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendida BB);


b) na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado com agravação inoperante, previsto nos artigos 210.º, n.º1 e 2, b) e 204.º, n.º 2, f) do Código Penal e n.º 4 e artigo 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendido CC);


c) na pena de 8 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização, previsto nos artigos 3.º, n.º 1, e n.º 3, a), 34.º, n.º 2 e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro;


3. EE, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão, em resultado do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares:


a) na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204.º, n.º 1, f) e n.º 2, f) do Código Penal e 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendida BB);


b) na pena de 2 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado com agravação inoperante, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e 2, b) e 204.º, n.º 2, f) do Código Penal e n.º 4 e artigo 4.º do DL 48/95, de 15 de março (ofendido CC);


c) na pena de 6 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização, previsto nos artigos 3.º, n.º 1, e n.º 3, a), 34.º, n.º 2 e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro.


Os arguidos foram ainda solidariamente condenados:


- No pagamento a BB da quantia de 6 000,00€ a título de compensação por danos não patrimoniais (artigo 82.º-A do Código de Processo Penal);


- No pagamento a CC da quantia de 6 000,00€ a título de compensação por danos não patrimoniais (artigo 82.º-A do Código de Processo Penal).


2. Inconformados com a decisão condenatória, os três mencionados arguidos recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 3.10.2023, decidiu negar provimento aos recursos e, consequentemente, manter o acórdão recorrido.


3. Os arguidos AA e DD interpuseram recurso do referido acórdão para este Supremo Tribunal, formulando as conclusões que a seguir se transcrevem.


3.1. Recurso de AA (transcrição das conclusões):


I. A falta de fundamentação quanto aos factos 1., 3., 4., 5., 6., 9. e 10. dados como provados e quanto à determinação da medida da pena (Artigo 71.º do Código Penal).


1. Não obstante o decidido em sede de acórdão proferido em 3 de outubro de 2023 pelo Tribunal da Relação de Lisboa, mantemos o entendimento de que o acórdão proferido em primeira instância é nulo por falta de fundamentação.


2. O Tribunal a quo deu como provado que arguido AA foi um dos indivíduos que entrou na residência dos ofendidos, que empunhava dentro do imóvel, a arma apreendida, que remexeu nos móveis à procura de bens com valor e dinheiro, que retirou 70,00€ da mesa de cabeceira da ofendida BB, que com esta permaneceu no seu quarto.


3. Mais deu como provado que o valor do telemóvel de marca LG, modelo LM, tinha o valor de 169,90€.


4. Tendo em conta que o Tribunal recorrido indicou que “A assistente BB e o ofendido CC referiram que os três indivíduos que entraram na residência estavam encapuzados, de rosto coberto e o agente da PSP FF esclareceu que todos os indivíduos que fugiram do prédio usavam roupas escuras e gorros”, como e porque é que se concluiu que o recorrente esteve dentro da habitação, que empunhava a arma, que remexeu nos móveis e que permaneceu no quarto com a ofendida?


5. Havendo, pelo menos, 5 indivíduos vistos pela polícia e sendo certo que dois deles não foram detidos, qual a razão para se concluir que um dos três que entrou na habitação foi o arguido AA?


6. Não resulta da decisão recorrida o raciocínio lógico feito pelo Tribunal a quo para dar como provado que o recorrente foi um dos que entrou no imóvel onde residiam os ofendidos.


7. Sendo certo que o arguido AA afirma nunca ter entrado no imóvel.


8. O mesmo sucede quanto à fundamentação (ou falta dela, neste caso) relativa ao valor do telemóvel de marca LG, modelo LM e melhor descrito no ponto 10. dos factos dados como provados.


9. A ausência deste exame crítico deverá determinar a nulidade do acórdão (de acordo com o preceituado na alínea c) do n.º1 do Artigo 379.º do C.P.P.), revogando-se o acórdão recorrido.


A falta de fundamentação quanto à determinação da medida da pena (Artigo 71.º do Código Penal).


10. Segundo o disposto no n.º3 do Artigo 71.º do Código Penal, “Na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena” (sublinhado nosso).


11. O Tribunal a quo, em sede de determinação da medida da pena, refere que a conduta do recorrente é ilícita, que a atuação foi feita com dolo direto (de “intensidade muito significativa”), que o “ilícito assume intensidade muito significativa”, passando à análise das condições pessoais dos arguidos.


12. O Tribunal a quo deixou de se pronunciar, de forma crítica e objetiva, face aos factos dados como provados, quanto ao (a) modo de execução de gravidade das condutas, (b) aos sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram e quanto à (c) a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena.


13. Não foi elaborado qualquer juízo crítico e analítico quanto à atuação concreta dos arguidos e ao seu modo de atuação, por referência aos factos dados como provados.


14. O Tribunal formulou meramente um raciocínio meramente conclusivo, desconhecendo-se a verdadeira ponderação da matéria de facto dada como provada para determinar as penas quanto a cada crime - o que impossibilita o arguido de o entender e contestar.


15. Cabia ao Tribunal a quo concretizar e analisar, de forma expressa e crítica, os elementos referidos no n.º2 do Artigo 71.º do Código Penal, tendo por base a matéria de facto dada como provada.


16. A ausência deste exame crítico deverá determinar a nulidade do acórdão (de acordo com o preceituado na alínea c) do n.º1 do Artigo 379.º do C.P.P.), revogando-se o acórdão recorrido.


Se assim não se entender,


II. A violação do n.º 2 do Artigo 40.º e Artigo 71.º, ambos do Código Penal e a aplicação do regime de suspensão da pena de prisão, nos termos dos Artigos 50.º e 53.º do Código Penal.


17. O arguido considera que o Tribunal a quo violou o disposto no n.º2 do Artigo 40.º e Artigo 71.º, ambos do Código Penal, incorrendo em erro de aplicação ao caso concreto.


18. O recorrente concorda, em parte, com o douto voto de vencido da Sra. Juiz ... GG, no sentido da redução das penas parcelarmente aplicadas a cada um dos crimes e, por conseguinte, à pena única.


19. O arguido incorria, por força do Artigo 77.º do Código Penal, numa pena que deve ser fixada entre um mínimo de 3 anos e o máximo de 15 anos de prisão quanto ao crime de roubo agravado, 1 ano a 8 anos quanto a um crime agravado com agravação inoperante e uma pena de prisão até 2 anos quanto ao crime de detenção de arma proibida.


20. O Tribunal recorrido parece ter agravado o desvalor da conduta o facto de os crimes em causa terem sido executados com recurso a uma arma.


21. Essa circunstância utilização do revólver, não pode ser ponderada na determinação concreta da pena, pois já faz parte do tipo qualificado.


22. Tendo essa circunstância sido relevante para agravar ou qualificar o roubo e, definir a moldura penal mais grave (que, in casu, varia entre os 3 anos e os 15 anos de prisão), não pode agora ser ponderada para efeitos de determinação da pena a aplicar, sob pena de dupla ponderação da mesma agravante.


23. Tal ponderação mostra-se proibida, de acordo com disposto no art. 71.º, n.º 1, 1ª parte do Código Penal).


24. Assim, a penas aplicadas aos crimes de roubo terão de ser reduzidas, conforme infra se alegará.


25. Ademais, verifica-se que a conduta do arguido é circunscrita a uma única ocasião, mas com duas vítimas - sendo este o fator que faz exponenciar a pena abstratamente aplicável ao arguido.


26. Resulta da matéria de facto dada como provada que o recorrente não centrou a sua conduta, em momento algum, no ofendido CC, tendo até cedido ao pedido de BB (facto 9.).


27. Tal circunstância deverá ser devidamente ponderada, sob pena de aplicação de uma pena desproporcional à sua culpa.


28. Parece-nos, assim, que a conduta do arguido se circunscreve a uma única ocasião - o que, leia-se, o recorrente sabe que merece uma repressão judicial que assegure as exigências de prevenção geral e especial.


29. Estamos perante um arguido jovem que, à data dos factos, tinha completado 27 anos de idade há muito pouco tempo, com uma única condenação de relevo averbada e com um percurso escolar e profissional investido.


30. É nossa convicção que as circunstâncias em que o crime foi praticado (que se inserem numa única ocasião), o passado do arguido, a sua inserção familiar e social não foi devidamente ponderadas para efeitos de determinação da pena.


31. Entendemos ainda que, mesmo mantendo a pena parcelar de cada um dos crimes, deverá a pena única aplicada ser menor.


32. O arguido, para além da família que se encontra totalmente disponível para o apoiar em liberdade, dispõe competências escolares e profissionais que certamente o ajudarão a encontrar uma ocupação - o que atenua as exigências especiais que se fazem sentir, não havendo necessidade de aplicar ao arguido pena tão gravosa como aquela que foi aplicada.


33. Não estamos perante um cidadão que, olhado pela sociedade, a prisão em pena superior a metade da moldura penal corresponderia às exigências de prevenção geral, porquanto o mesmo dispõe de perspetival de um futuro que respeite os bens jurídicos.


34. Não será a pena de prisão de 9 anos que contribuirá para afastar o arguido de novos ilícitos, já que o mesmo possui um forte apoio familiar e competências essenciais à continuação da sua vida longe do mundo do crime.


35. Parece-nos que no caso concreto a medida da pena excedeu a medida da culpa e a gravidade das circunstâncias da conduta do arguido.


36. Considera-se que a aplicação de uma pena, para cada um dos crimes, junto ao limite da moldura penal (em 3 anos e 3 meses quanto ao crime de roubo agravado, 2 anos quanto ao crime de roubo agravado com agravação inoperante e 2 meses quanto ao crime de detenção de arma proibida) revela-se suficiente para assegurar as finalidades de punição, para efeitos do disposto no Artigo 71.º do Código Penal, ao contrário do que sucedeu.


37. Em cúmulo jurídico, deverá o arguido ser condenado numa pena de 5 anos de prisão.


38. Não obstante os antecedentes criminais averbados no CRC do arguido, cremos ser de se fazer uma prognose favorável ao seu comportamento futuro, sendo de suspender a pena de prisão, nos termos do disposto no artigo 50.º do Código Penal.


39. Em face do exposto, o Tribunal a quo, ao condenar o arguido na pena de 9 anos de prisão, com base nos fundamentos supra expostos, viola o disposto no n.º2 do Artigo 40.º, o Artigo 71.º e o Artigo 77.º, todos do Código Penal, devendo antes condenar o arguido numa pena de prisão junto ao limite mínimo aplicável ao caso concreto (em 3 anos e 3 meses quanto ao crime de roubo agravado, 2 anos quanto ao crime de roubo agravado com agravação inoperante e 2 meses quanto ao crime de detenção de arma proibida e, em cúmulo, em 5 anos de prisão que deverá ser suspensa na sua execução, sujeitando-se o arguido a um regime de prova, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 50.º e 53.º do Código Penal).


40. Caso assim não se entenda quanto à suspensão da referida pena, deverá o recorrente ser condenado numa pena de 4 anos e 9 meses de prisão efetiva.


41. Já se for de manter as penas aplicadas a cada um dos crimes, cremos que o Recorrente deverá ser condenado, em cúmulo e pelos mesmos motivos, numa pena única de 7 anos e 6 meses de prisão (não o tendo feito, o Tribunal violou o Artigo 77.º do Código Penal).


3.2. Recurso de DD (transcrição das conclusões):


I. Por Douto Acórdão, proferido a 30 de Março de 2023, foi o aqui recorrente/arguido condenado:- Por um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204º, nº1, f) e nº2, f) do Código Penal e 4º do DL. 48/95, de 15 de março (ofendida BB), a pena de 7 anos de prisão; - Por um crime de roubo agravado com agravação inoperante (artigos 210º, nº1 e 2, b) e 204º, nº2, f) do Código Penal e nº4 e artigo 4º do Decreto-Lei 48/95, de 15 de março, a pena de 3 anos e 6 meses de prisão; e - Por um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização (artigo 3.º, n.º 1, e nº 3, a), 34.º, n.º 2, alínea e) e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro), a pena de 8 meses de prisão. Em cúmulo jurídico das penas aplicadas condenar o arguido na pena única de 9 (nove) anos de prisão.


Por douto acórdão condenatório proferido a 03 de Outubro de 2023, o Venerando Tribunal da Relação Julgou improcedente o recurso do aqui recorrente, mantendo na integra o douto Acórdão proferido na primeira instância.


II.O Recorrente impugnou a matéria de facto dada como provada dos pontos 1 a 21. Como decorre do próprio Acórdão, o arguido DD só foi avistado noutra rua e não foi reconhecido por nenhuma testemunha, aliás, o reconhecimento feito em audiência é apenas como vizinho e não como o Autor dos factos. Acresce ainda que, o Recorrente prestou declarações e negou a prática dos factos quer em primeiro interrogatório judicial de arguido detido quer em julgamento. Contudo não foi dada uma resposta fundamentada ao arguido seu recurso.


III. O arguido deveria ter sido absolvido pela prática dos crimes de roubo agravado e detenção de arma proibida, como já referimos, nenhuma prova foi produzida em audiência que apontasse para a autoria material, por banda do recorrente, desta tipologia criminosa. Ao assim não proceder o douto acórdão violou, por erro interpretativo, o disposto nos art.º 127.º e 355.º do CPP.


IV. Assim deverá o douto acórdão ser renovado


V. Violou-se ainda o princípio da inocência previsto no art. 32º do CRP.


VI. Daí que, por todas as expostas razões no seu recurso, haja sido cometida a nulidade de insuficiência do exame crítico da prova, - em relação aos crimes pelo qual foi condenado - nulidade cominada no art.º 379.º n.º 1 alínea a) do CPP dado o não cumprimento integral do disposto, no recorrido acórdão do art.º 374.º n.º 2 do mesmo CPP. O Tribunal a quo não especifica, como é sua obrigação, a sua motivação de forma concreta, concisa, objectiva, dos motivos de facto e de direito que levara à condenação do arguido bem como a indicação e exame critico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal e condenar o arguido (exame crítico das provas que serviram de base para formar a convicção do Tribunal).


VII. Entendendo-se pela condenação do arguido, as penas parcelares e a pena única de 7 anos de prisão, parece-nos, salvo outro e melhor entendimento, ser tal condenação manifestamente exagerada, atentos os factos apurados, a culpa do agente, à ilicitude, os seus antecedentes, as suas perspetivas de reinserção social, bem como o universo de condenações em Portugal, por estes e outros crimes, forçoso será de concluir pela inadequabilidade de tal condenação.


VIII. A determinação da medida da pena deve ser feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção «ex vi» do disposto no art. 71º n.º 1 do Código Penal, para o efeito, o tribunal deverá atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, depuserem a favor ou contra o agente, por força do disposto no n.º 2 do mesmo artigo, não podendo a pena, em caso algum, ultrapassar a medida da culpa, sendo violado, por mero erro interpretativo o disposto nos artigos 40.º n.º 2 e 71.º ambos do Código Penal.


IX. Mesmo admitindo eventual condenação do recorrente pela prática dos crimes, não deveria a pena cumulatória e em concreto ter ultrapassado os 5 anos de prisão e a pena deverá ser suspensa na sua execução nos termos do art. 50º do Cód. Penal.


X. Neste sentido vem a declaração de voto: Voto de vencido da Juiz GG No que toca às penas parcelares e únicas dos arguidos AA e DD, apesar dos seus antecedentes, julgo que os considerandos acima expostos quanto ao circunstancialismo que rodeou a prática dos crimes justifica uma redução das penas nos seguintes termos: (…)


2. DD, na pena única de 8 anos de prisão, em resultado do cúmulo jurídico das seguintes penas parcelares: a) na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204º, nº1, f) e nº2, f) do Código Penal e 4º do DL. 48/95, de 15 de março (ofendida BB); b) na pena de 3 anos e dois meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado com agravação inoperante, previsto nos artigos 210º, nº1 e 2, b) e 204º, nº2, f) do Código Penal e nº4 e artigo 4º do Decreto-Lei 48/95, de 15 de março (ofendido CC); c) na pena de 8 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização, previsto nos artigos 3.º, n.º 1, e nº 3, a), 34.º, n.º 2, alínea e) e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro). No demais, adere a ora juiz-... ao teor do Acórdão supra. Extraído do Douto Acórdão que ora se recorre.


Violaram-se: os artigos, 18º, 32º da C.R.P. 40º, n.º 2, 50º, 70º, 71º e 72º, do C.P. e 127º, 410º, n.º 2, 379º, n.º 1, 374, n.º 2 do Cód. Proc. Penal.


Termos em que, e pelo mais que V. Ex.ªs mui doutamente suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, e, em consequência, deverá ser o arguido ser absolvido da prática dos crime dos crimes de roubo agravado e detenção de arma proibida, a ser condenado deverão as penas parcelares serem diminuídas, assim como a pena única e ser suspensa na sua execução se a medida da pena permitir, e , assim, se fará a devida JUSTIÇA!


4. O Ministério Público, junto da Relação, respondeu aos recursos e concluiu como a seguir se transcreve.


4.1. Resposta ao recurso de AA (transcrição das conclusões):


1. O arguido interpôs recurso do acórdão condenatório do Tribunal da Relação de Lisboa de 3 de outubro de 2023, que negou provimento ao recurso e manteve a decisão proferida em 1ª instância.


2. O acórdão recorrido encontra-se devidamente fundamentado de facto e de direito, não padece da invocada nulidade, por falta de fundamentação, prevista no art. 379º, nº 1, c), ex. vi art. 425º, nº 4, todos do C.P. Penal.


3. A ilicitude é elevada e muito elevado o grau de culpa;


4. As penas foram fixadas considerando o critério e circunstâncias previstas nos arts. 40º e 71º, do C Penal.


5. As penas parcelares e única aplicadas mostram-se corretas, adequadas e não padecem de excesso, perante toda a factualidade criminosa provada e as superiores exigências de prevenção geral e especial inerentes a este tipo de criminalidade.


6. Devem, pois, ser mantidas.


O recurso não merece provimento, devendo, em nosso entender, ser confirmado o acórdão recorrido.


4.2. Resposta ao recurso de DD (transcrição das conclusões):


1. O recorrente interpôs recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido a 3 de outubro de 2023, que negou provimento ao recurso e manteve a decisão proferida em 1ª instância.


2. O acórdão recorrido encontra-se devidamente fundamentado de facto e de direito, não padece da invocada nulidade, por falta de exame crítico da prova.


3. A ilicitude é elevada e muito elevado o grau de culpa, bem como de intensidade particularmente elevada as exigências de prevenção geral e especial;


4. As penas foram fixadas considerando o critério e circunstâncias previstas nos arts. 40º e 71º, do C Penal.


5. Tais penas, parcelares e única, em que o recorrente foi condenado mostram-se corretas, adequadas e não padecem de excesso, perante toda a factualidade criminosa provada e as superiores exigências de prevenção geral e especial inerentes a este tipo de criminalidade.


6. Devem, consequentemente, ser mantidas.


O presente recurso não merece provimento, devendo, em nosso entender, ser confirmado o acórdão recorrido.


5. Neste Supremo Tribunal de Justiça (doravante STJ), o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto, na intervenção a que se reporta o artigo 416.º do Código de Processo Penal (diploma que passaremos a designar de CPP), emitiu parecer no sentido de que os recursos não merecem provimento, devendo, em consequência, ser confirmado o acórdão recorrido.


6. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º2, do CPP, não foram apresentadas respostas ao parecer. Procedeu-se a exame preliminar, após o que, colhidos os vistos, os autos foram à conferência, por deverem ser os recursos aí julgados, de harmonia com o preceituado no artigo 419.º, n.º3, do mesmo diploma.


II – FUNDAMENTAÇÃO


1. Dispõe o artigo 412.º, n.º 1, do CPP, que a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido, constituindo entendimento constante e pacífico que o âmbito do recurso é definido pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, que delimitam as questões que o tribunal ad quem tem de apreciar, sem prejuízo das que sejam de conhecimento oficioso.


Atentas as conclusões apresentadas, que traduzem de forma condensada as razões de divergência com a decisão impugnada, as questões que os recorrentes suscitam são as seguintes:


A) Recurso de AA


- Nulidade por falta de fundamentação / exame crítico da prova;


- Falta de fundamentação quanto à determinação da pena;


- Determinação da pena, invocando-se a violação do n.º2 do artigo 40.º e do artigo 71.º do Código Penal, pugnando o recorrente pela redução das penas parcelares e da pena única resultante do cúmulo jurídico, que pretende, se possível, seja suspensa na sua execução.


B) Recurso de DD


- Nulidade por falta de exame crítico da prova;


- Falta de prova da prática pelo arguido/recorrente dos crimes de roubo agravado e detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização / presunção de inocência;


- Determinação da pena, pugnando o recorrente, caso não seja absolvido, pela redução das penas parcelares e da pena única resultante do cúmulo jurídico, que pretende, se possível, seja suspensa na sua execução.


2. Do acórdão recorrido


2.1. O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos:


1. Os arguidos AA, DD, HH e dois indivíduos combinaram entrar na residência sita na Rua ..., sem autorização dos proprietários/utilizadores, munidos de uma arma de fogo, revólver, e com recurso à intimidação através da mesma e da sua superioridade física e numérica, e, sendo necessário, à violência, para fazerem seus os bens e dinheiro que lá encontrassem.


2. Em execução do plano previamente delineado entre si, os arguidos e os dois outros indivíduos, no dia 06.10.2021, cerca das 00h00, munidos de uma arma de fogo, revólver, carregado com cinco munições, sem número de série e inscrições visíveis, estacionaram o veículo de marca RENAULT, modelo R, com a matrícula AF-..-JM, propriedade do arguido AA, na ..., situada nas traseiras da Rua ..., e dirigiram-se à residência sita na Rua ...


3. Aí chegados, dois dos indivíduos do grupo de cinco onde se incluíam os arguidos ficaram no exterior da residência atentos às movimentações nas imediações para que todos fossem bem sucedidos no seu plano conjunto e três deles, onde se incluem os arguidos AA e DD, entraram no prédio n.º 88 da Rua ..., encapuzados, trajando um cachecol tipo gola colocada de forma a tapar rosto, mantendo apenas visível os olhos e a testa, e tocaram à campainha do 1.º esquerdo, residência da ofendida/assistente BB, que abriu a porta, convencida de que seria o seu irmão, que esquecera a chave.


4. Nesse mesmo instante, o arguido AA, empunhando uma arma de fogo (revólver), o arguido DD e mais um dos cinco indivíduos do grupo onde se incluíam os arguidos, de forma inesperada e sem que nada o pudesse prever, forçaram a entrada na referida residência, contra a vontade de BB, e ordenaram-lhe que fosse imediatamente para o seu quarto, o que a ofendida aterrorizada fez, e aí disseram-lhe “senta-te aí; não vamos fazer mal; onde guardas as coisas?


5. No quarto da ofendida, os arguidos AA e DD e mais um dos cinco elementos do grupo onde se incluíam os arguidos, remexeram nos móveis à procura de bens com valor e dinheiro e retiraram da mesa de cabeceira a quantia de €70,00 (três notas de € 20,00 e uma nota de € 10,00), propriedade de BB.


6. De seguida, o arguido DD e mais um dos elementos do grupo que se encontrava no interior da residência, dirigiram-se ao quarto do ofendido CC, nascido em ........2005, com 16 anos de idade, e o arguido AA permaneceu no quarto da ofendida, com a arma de fogo, revólver, na mão, obrigando-a a manter-se aí.


7. No quarto de CC, o arguido DD e mais um dos elementos do grupo de cinco onde se incluíam os arguidos, ordenaram ao ofendido que se sentasse na cama, remexeram os móveis à procura de bens com valor e dinheiro, e retiraram um mealheiro com um desenho de notas de duzentos euros, que continha moedas de 1 cêntimo, de 2 cêntimos e algumas de 5 cêntimos, no valor total de € 4,62, pertencentes a CC.


8. Um dos elementos do grupo composto por cinco onde se incluíam os arguidos desferiu uma chapada na face do ofendido CC que, com o medo e receio que sentiu, urinou nas calças.


9. Ouvindo o seu filho bastante assustado e em pânico, a ofendida BB implorou ao arguido AA que a deixasse ir ter com ele, ao que aquele acabou por ceder, mas permaneceu sempre junto a ela com a arma de fogo, revólver, nas mãos, visível.


10. De seguida, os arguidos AA, DD e o outro elemento do grupo de cinco onde se incluíam os arguidos, dirigiram-se à sala de estar, onde se encontrava II, ex-companheiro da ofendida a dormir, e aí ordenaram à ofendida BB que lhes entregasse o telemóvel de marca LG, modelo LM, com o cartão com o n.º .......23 no seu interior, e com o IMEI .............27, com o valor de €169,90 propriedade de II, o que a ofendida fez, temendo pela sua vida e integridade física.


11. Na posse do telemóvel de marca LG, modelo LM, com o cartão com o n.º .......23 no seu interior, e com o IMEI .............27, com o valor de €169, dos €70,00 e do mealheiro com o desenho de uma nota de duzentos euros contendo moedas de cêntimos, perfazendo o total de € 4,62, os arguidos AA e DD e mais um elemento do grupo de cinco onde se incluíam os arguidos abandonaram a referida residência.


12. Os arguidos e mais dois indivíduos cuja identidade encetaram fuga apeada em direção à Rua ..., onde se encontrava estacionado o veículo com a matrícula AF-..-JM, propriedade de AA.


13. O arguido AA transportava consigo, com o conhecimento e concordância de todos os arguidos, uma arma de fogo curta (revólver), com comprimento total de 23 centímetros, de repetição, com tambor, percussão central, com cão, calibre 9,1 mm Abadie, sem marca e sem números, com um cano de 11 centímetros, com o interior estriado, fabricada em 1878, em mau estado de conservação, mas funcional, municiada com cinco munições de várias marcas, calibre .38 SPL WADCUTTER, de projétil único, próprias para armas de cano estriado, em razoável estado de conservação e utilização, que atirou para uma zona de vegetação durante a perseguição encetada pelos agentes da PSP.


14. O telemóvel LG referido supra, os a quantia de € 70,00 e o mealheiro contendo € 4,62, foram recuperados na posse do arguido DD.


15. Como consequência direta e necessária das condutas ora descritas dos arguidos e dos dois indivíduos cuja identidade não se logrou apurar, os ofendidos sentiram receio e medo pela sua integridade física e vida e o ofendido CC sofreu dor na face.


16. Os arguidos não são titulares de licença de uso e porte de arma, nem de autorização emitida pela autoridade legalmente competente ou qualquer outro documento que permita a aquisição e detenção das referidas munições.


17. Os arguidos e os outros dois indivíduos agiram sempre e em tudo em comunhão de esforços e vontades, com o propósito comum de fazerem seus os bens de valor e dinheiro que encontrassem na residência sita na Rua ..., bem sabendo que para tal tinham de aceder ao interior da mesma contra a vontade dos seus proprietários/utilizadores, o que quiseram, bem sabendo que tais objetos não lhes pertenciam e que atuavam contra a vontade dos seus legítimos donos.


18. Recorrendo para tal, concertadamente, à força física e violência, também com recurso à intimidação por meio de uma arma de fogo, revólver, e em razão da sua superioridade física e numérica contra quem se opusesse a tal, munindo-se da referida arma, que exibiram aos ofendidos, de molde a provocar-lhes, como provocaram, medo e receio pela sua integridade física e até pela sua vida, para concretização dos seus intentos.


19. Bem sabiam os arguidos que a sua conduta era idónea a intimidar e constranger os ofendidos, fazendo-os recear pela sua integridade física e vida e, que tal constrangimento era apto a impedi-los de resistir e a fazê-los entregar os bens que aqueles exigiram.


20. Os arguidos conheciam as características das munições que, concertadamente entre todos, o arguido AA detinha e transportou consigo, bem sabendo que não as podiam ter na sua posse por não terem autorização legal para o efeito e, não obstante, quiseram tê-las consigo, o que representaram e conseguiram.


21. Agiram sempre os arguidos de forma livre, voluntária e consciente e tendo liberdade para agir de forma diferente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas pela lei penal


(Mais se provou):


22. Em consequência da ação dos arguidos, a assistente sofreu insónias e perturbação do sono, necessitando de tomar medicamentos durante um mês, passando a trancar a porta do quarto de dormir e sentia medo de abrir a porta de casa quando alguém tocava a campainha.


(Dos certificados de registo criminal):


23. Do certificado de registo criminal do arguido JJ não constam condenações.


24. Do certificado de registo criminal do arguido AA consta condenação:


a) Por sentença de 12/01/2012, transitada em julgado em 26/03/2012, processo sumário 96/12.2..., do juízo de pequena instância criminal de ..., por um crime de detenção de arma proibida, praticado em 11/01/2012, na pena de 250 dias de multa à taxa diária de 5,00 €, extinta por prescrição em 26/03/2016.


b) Por acórdão de 09/04/2013, transitado em julgado em 09/05/2013, processo comum coletivo 358/11.6..., da ... vara criminal de ..., por quatro crimes de roubo praticados em 14/12/2011, na pena única de 3 anos e 3 meses de prisão, suspensa por igual período, com regime de prova, extinta em 09/08/2016.


c) Por acórdão de 05/12/2017, transitado em julgado em 04/01/2018, processo comum coletivo 21/17.4..., juízo central criminal de ..., juiz ..., por um crime de homicídio na forma tentada e um crime de detenção de arma proibida, praticados em 19/02/2017, na pena única global de 6 anos de prisão, beneficiando da concessão de liberdade condicional por despacho de 12/02/2021.


25. Do certificado de registo criminal do arguido DD consta condenação:


a) Por Acórdão de 13/12/2016, transitado em julgado em 13/02/2017, processo comum coletivo 463/16.2..., do juízo central criminal de ..., juiz ..., por um crime de roubo, praticado em 2016, na pena de 7 meses de prisão suspensa na sua execução por um ano, com regime de prova.


b) Por acórdão de 05/05/2017, transitado em julgado em 22/06/2017, processo comum coletivo 120/16.0..., do juízo central criminal de ..., juiz ..., por dois crimes de roubo praticados em 06/02/2016, na pena de 3 anos e 4 meses de prisão efetiva, sendo que, por despacho de 11/04/2020, foi declarada perdoada a pena de prisão remanescente e restituído o arguido à liberdade.


c) Por sentença de 21/06/2017, transitada em julgado em 02/10/2017, processo comum singular 1/17.0..., do juízo local de pequena criminalidade de ..., juiz ..., por dois crimes de roubo praticados em 01/07/2017, na pena de 18 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, extinta em 21/10/2019.


(Dos relatórios sociais):


26. Natural de ..., no Brasil, AA é o único filho de uma relação esporádica da progenitora, a qual nunca viveu com o pai do arguido, que cresceu apoiado essencialmente pela mãe e família materna.


27. O agregado residia numa cidade do estado de ..., onde a progenitora garantia a sua subsistência trabalhando como ... e ... a partir de casa, dispondo o agregado de condições económicas para fazer face ás despesas quotidianas.


28. Quando tinha cerca de 8 anos, a mãe emigrou para Portugal em busca de melhores condições de vida, tendo o arguido permanecido junto de uns tios., que assumiram o seu processo educativo.


29. Possui boas recordações da infância e do convívio com outras crianças, quer na rua como na escola, onde completou o equivalente ao 5º ano de escolaridade, antes de vir para Portugal aos 12 anos.


30. Quando se juntou à progenitora em Portugal, esta já se encontrava casada com outra pessoa, mas sem filhos desta relação.


31. A sua adaptação a uma nova cultura decorreu sem dificuldades relevantes, apesar de alguns indicadores de que teria uma conduta rebelde, sobretudo relativamente ao padrasto.


32. O casamento da mãe viria a terminar ao fim de um ano, ficando o arguido a viver apenas com a progenitora, com a qual sempre manteve uma relação de proximidade.


33. Em Portugal reintegrou a escola no 6º ano de escolaridade, embora revelando dificuldades de adaptação, motivadas por uma conduta rebelde e agressiva, justificada pelas fontes como a expressão de sentimentos de revolta face ao abandono paterno.


34. Em compensação, começou a treinar futebol em clubes locais, o que lhe permitiu preencher o tempo livre e criar alguns laços de amizade locais.


35. Surgiram, contudo, dificuldades com a regularização da sua documentação na época, o que não lhe permitiu participar nos jogos da equipe, facto que, acrescido à distância do local de treino e incompatibilidade de horários com os da escola, o levou a abandonar a pratica da modalidade ao fim de um ano.


36. A desvinculação dessa atividade desportiva e a maior desocupação do tempo contribuiu para criar proximidade a grupos de pares locais.


37. Refletiu-se igualmente em maior desmotivação para a escola, onde veio a reprovar e ser alvo de expulsões, estando conotado com práticas agressivas com colegas.


38. Foi orientado então para cursos profissionalizantes com equivalência ao 9º ano de escolaridade, tendo frequentado um curso de Acompanhante de Crianças, em 2011, que não concluiu.


39. Procurou outras alternativas similares, sem sucesso, e permaneceu numa situação de desocupação e sem motivação para desempenhar uma atividade laboral.


40. Mantinha não obstante uma relação positiva e próxima com a progenitora, a qual, segundo uma avaliação realizada na época pela DGRSP, parecia, contudo, alheada em relação ao estilo de vida do filho, verificando-se igualmente que, não obstante as suas tentativas para orientar e incutir em AA sentido de responsabilidade na vida, a mesma tendia igualmente a assumir uma postura desculpabilizante relativamente ao seu modo de vida.


41. Paralelamente, o facto de a progenitora trabalhar durante todo o dia como ..., acresceu dificuldades para efetuar uma supervisão próxima do filho.


42. Constatou-se igualmente que na época o agregado residia em casa própria localizada numa zona tradicional de ..., mas com proximidade a um bairro de realojamento camarário, onde o arguido mantinha relações de amizade.


43. AA apresentava-se na época como um jovem imaturo, impulsivo e com fraco sentido critico relativamente ao grupo de pares de convívio.


44. Assim, o estilo de vida instável assumido pelo arguido que resultou em contactos com a justiça, a necessidade de o afastar do meio socio residencial, levaram á opção de o enviar para o Brasil com 18 anos, para junto do progenitor e da família constituída pelo mesmo.


45. AA permaneceu cerca de dois anos no país de origem, onde retomou a escola e completou o 9º e 10º ano de escolaridade.


46. Quando regressou a Portugal, a mãe integrou-o a trabalhar como rececionista, num ... que explorava na ápoca, proporcionando-lhe um salário pelos serviços prestados.


47. Contudo o mesmo nos tempos livres, manteve proximidade aos amigos, e no contexto de atividades desenvolvidas junto destes, foi preso em 19/02/2017 e condenado ao cumprimento de 6 anos de prisão, por um crime de homicídio na forma tentada e detenção de arma proibida.


48. Na sequencia da prisão do filho a mãe mudou de casa, da zona de ... para a zona de ..., para proporcionar ao filho outro contexto socio residencial.


49. Paralelamente e na sequência de um relacionamento estabelecido com um cidadão dinamarquês, com o qual veio posteriormente a casar, passou a viver períodos de tempo na ..., onde realizava cursos de formação profissional na área de estética e outros em Portugal.


50. Não obstante visitava o filho com a regularidade possível e mantinha total disponibilidade para o apoiar em liberdade.


51. AA cumpriu pena no EP ..., onde reiniciou a escolaridade, beneficiou de 2 LSJ e passou à situação de RAVE, sendo libertado aos 2/3 da pena, em fevereiro de 2021.


52. Em liberdade, AA dispunha à partida de condições objetivas de suporte externo, nomeadamente habitação própria, cujas despesas eram garantidas pela progenitora, assim como suporte económico para as despesas pessoais, também proporcionadas pela mãe, que dispunha à data de um rendimento médio de 2.500 euros, mas também se necessário, da ajuda do cônjuge, que teria, segundo as fontes, uma boa situação financeira.


53. Embora se tenha deparado com dificuldades na obtenção de enquadramento laboral, AA não evidenciou motivação para se inscrever no Instituto de Emprego e Formação profissional, privilegiando a realização de atividades não contratualizadas, obtidas através de amigos.


54. Nesse contexto, trabalhou na área de jardinagem e posteriormente à comissão no sector de entregas, para uma amiga da progenitora.


55. Ocupava o tempo livre em passeios e convívios com namoradas e amigos, tendo neste contexto de vida conhecido a atual namorada, uma jovem estudante trabalhadora, com a qual estabeleceu uma forte vinculação afetiva e que o apoiou significativamente neste período.


56. Pese embora tenha admitido, em contexto de acompanhamento da sua LC, que alguns dos pares de convívio teriam ligações ao sistema de administração da justiça, assumiu na época uma postura de desvinculação relativamente aos comportamentos dos mesmos, considerando ter capacidade para gerir a pressão do grupo.


57. Não obstante e para obter mais rendimentos, tentou aderir à plataforma UBER, para efetuar transportes personalizados, projeto que terá sido inviabilizado pelos seus antecedentes criminais.


58. Todavia passou a realizar deslocações, a titulo particular para amigos que o solicitavam.


59. Encontra-se preso preventivamente no EP... desde outubro de 2021, pelo presente processo, sem averbamentos disciplinares registados, mas dada a sua situação como preventivo, ainda se encontra desocupado.


60. Face aos acontecimentos que determinaram a sua prisão, AA demonstra distanciamento dos mesmos e estranheza perante a sua nomeação como arguido neste processo.


61. Apresenta uma postura critica quanto às autoridades, mas fraco sentido avaliativo quanto às fragilidades pessoais que contribuíram para a presente situação jurídico penal.


62. Revela-se um jovem impulsivo, com alguma imaturidade socio afetiva e dificuldades no âmbito da antecipação das consequências dos seus atos.


63. A sua atual prisão constituiu-se um choque para a família e particularmente para a progenitora e namorada, que se constituem presentemente as figuras mais próximas, embora o facto não tivesse alterado a disponibilidade de ambas para lhe dar suporte, quer em situação de reclusão como em meio livre.


64. O projeto futuro de AA passa por, em liberdade, tirar um curso de inglês com a namorada e emigrarem ambos para a ..., onde a mãe e atual cônjuge dispõem, segundo as fontes, de uma situação de vida estável, e de condições para os acolher e integrar no mercado de trabalho local.


65. DD, natural de ..., é o mais velho de dois filhos, tendo o seu processo de socialização decorrido junto da progenitora que assume como figura vinculativa, não detendo qualquer ligação com o seu progenitor.


66. Posteriormente, a progenitora iniciou uma relação pautada numa dinâmica disfuncional que conduziu aos mesmos a uma casa abrigo, situada no ..., quando contava com cerca de 10 anos de idade, sendo a condição socioeconómica familiar frágil.


67. Quanto ao seu percurso escolar, o arguido começou a apresentar a partir do 3.º ano problemas de comportamento, assumindo uma atitude de desafio perante os educadores, tendo concluído o 6.º ano de escolaridade.


68. Quando tinha cerca de 14 anos de idade, detinha um estilo de vida ocioso e marginal que veio a determinar a aplicação de uma medida de internamento educativo, com regime aberto, na Associação de Educação E Inserção de Jovens, porém, depois de várias tentativas, decorridos dois anos, acabou por abandonar aquela instituição, regressando ao agregado familiar.


69. Na instituição frequentou uma formação de práticas administrativas e informática que não concluiu.


70. Quanto ao seu percurso laboral, apresentam percurso incipiente marcado pela irregularidade, registando períodos alternativos entre inatividade laboral e desempenho de atividades de curta duração focado na área da restauração, tendo o seu último trabalho num restaurante em ..., auferindo cerca de 175,00 € euros por semana, sem vinculo contratual, tendo sido despedido por razões de conflito com a entidade patronal.


71. Para além deste trabalho, reporta trabalhos esporádicos na distribuição.


72. Aos 18 anos decidiu autonomizar-se, mudando-se para casa de uns amigos, em ..., tendo, entretanto, sido preso pouco depois numa situação sociofamiliar disfuncional e precária que facilitou a adoção de um estilo de vida associal.


73. Em termos judiciais, o arguido aos dezanove anos foi condenado numa pena de prisão efetiva de 3 (três) anos e 6 (seis) meses, pela prática de um crime de roubo agravado, cumprindo pena de prisão no Estabelecimento Prisional ....


74. Durante a reclusão frequentou o curso de hotelaria que lhe daria equivalência ao 9º ano de escolaridade não o tendo concluído.


75. Não se conhecem problemas de saúde ao arguido.


76. Quanto aos comportamentos aditivos reporta consumos de estupefacientes, nomeadamente, haxixe, desde a adolescência em contexto de pares, desvalorizando qualquer intervenção a este nível.


77. Após o cumprimento de pena de prisão, DD, foi viver com a mãe, e com o seu irmão de dezasseis anos, no ..., numa residência camarária, de tipologia T2, ao qual atribui adequadas condições de habitabilidade, onde o agregado mantém residência atualmente.


78. Todavia, o arguido decidiu abandonar a residência da família, tendo posteriormente, arrendado um quarto na zona de ..., com renda de 250,00 € mensais, encontrando-se, em situação de desemprego.


79. Do ponto de vista das suas características pessoais, o arguido sugere apresentar-se como um individuo imaturo, com manifestas dificuldades do foro reflexivo e consequencial, que aliadas ao seu envolvimento com indivíduos com comportamentos anti normativos se configuram como relevantes fatores de risco a ter em conta.


80. Em liberdade, aquando da sua saída do Estabelecimento Prisional, o arguido, não detém qualquer proposta de emprego formalizada, facto que não deixará de constituir um fator de risco, comprometedor de uma inserção socialmente responsável.


81. DD, encontra-se preso preventivo no Estabelecimento Prisional ... à ordem dos presentes autos, beneficiando visitas regulares da namorada tendo a progenitora registado apenas uma visita.


82. Relativamente ao percurso prisional do arguido regista uma ocorrência disciplinar que se encontra em fase de averiguações, não se encontrando integrado em qualquer atividade laboral ou formativa no Estabelecimento Prisional ....


83. Face ao presente processo, DD afirma não se rever nos factos pelos quais se encontra acusado, demonstra uma atitude de desvinculação perante o presente processo jurídico penal, avaliando que o crime que é indiciado é de natureza grave.


84. O arguido, tem a sua situação jurídica indefinida, estando a decorrer a aguardar audiência de discussão e julgamento no âmbito do processo 832/20.3... do Tribunal Judicial da Comarca de ... Juízo Central Criminal de ... Juiz ..., tendo sido imputado ao arguido, em coautoria, um crime de tráfico agravado.


(85 a 97 – factos relativos ao arguido JJ)


Factos dados como não provados pelo Tribunal de 1.ª Instância :


Não se provou que, na ocasião referida em 11 dos factos provados, os arguidos AA e DD e mais um elemento do grupo de cinco foram avisados de que nas imediações se encontrava a PSP.


2.2. Na fundamentação de direito do acórdão recorrido, consta, na parte relativa à determinação das penas (transcrição):


«A aplicação da pena visa a protecção dos bens jurídicos violados (prevenção geral positiva) e a reintegração do agente na sociedade (ressocialização), não podendo a medida concreta da pena exceder a culpa do agente (artigo 40º do Código Penal), atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem contra e a favor do agente (nº 2 do artigo 72º do Código Penal).


O tribunal recorrido condenou os arguidos AA e DD, na pena única de 9 anos de prisão [em resultado do cúmulo jurídico das penas parcelares de 7 anos de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado, previsto nos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b) e 204º, nº1, f) e nº2, f) do Código Penal e 4º do DL. 48/95, de 15 de março, punível com pena de prisão de 3 a 15 anos, com referência à ofendida BB, de 3 anos e 6 meses de prisão, pela prática de um crime de roubo agravado com agravação inoperante, previsto nos artigos 210º, nº1 e 2, b) e 204º, nº2, f) do Código Penal e nº4 e artigo 4º do Decreto-Lei 48/95, de 15 de março, punível com pena de prisão de 1 a 8 anos, com referência ao ofendido CC, e de 8 meses de prisão, pela prática de um crime de detenção de munições de arma de fogo sem licença ou autorização, previsto nos artigos 3.º, n.º 1, e nº 3, a), 34.º, n.º 2, alínea e) e 86.º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias] e o arguido EE, na pena única de 6 anos e 6 meses de prisão [em resultado do cúmulo jurídico das penas parcelares de 5 anos e 6 meses de prisão, de 2 anos de prisão e de 6 meses de prisão, pela prática dos mesmos ilícitos que os co-arguidos], com base na seguinte argumentação (transcrição parcial):


«Mostram-se particularmente elevadas as exigências de prevenção geral.


Agiram com dolo direto, certo que, representando a ilicitude das suas condutas, não se abstiveram de as empreender (artigo 14, nº1 do Código Penal).


O ilícito assume intensidade muito significativa, atendendo ao modo de execução e às consequências dele resultantes em sede de lesão de bens pessoais, também no caso da detenção de arma proibida, uma vez que as munições estavam efetivamente inseridas no tambor do revólver utilizado pelos arguidos, não obstante não terem sido realizados disparos.


Impõe-se, neste ponto, não perder de vista que se trata de crime de perigo comum, sobre o qual, já se lia no ponto 31 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 400/82, de 23-09, que aprovou o Código Penal de 1982: O ponto crucial destes crimes (…) reside no facto de que condutas cujo desvalor é de pequena monta se repercutem amiúde num desvalor de resultado de efeitos não poucas vezes catastróficos. Clarifique-se que o que neste capítulo está primacialmente em causa não é o dano, mas sim o perigo. A lei penal, relativamente a certas condutas que envolvem grandes riscos, basta-se com a produção do perigo (concreto ou abstracto) para que dessa forma o tipo legal esteja preenchido. O dano que se possa vir a desencadear não tem interesse dogmático imediato. Pune-se logo o perigo, porque tais condutas são de tal modo reprováveis que merecem imediatamente censura ético - social. Adiante-se que devido à natureza dos efeitos altamente danosos que estas condutas ilícitas podem desencadear, o legislador penal não pode esperar que o dano se produza para que o tipo legal de crime se preencha. Ele tem de fazer recuar a protecção para momentos anteriores, isto é, para o momento em que o perigo se manifesta».


O dolo, atenta a reflexão necessária ao empreendimento da ação, assume intensidade muito significativa.


Beneficia o arguido JJ de bom comportamento, consubstanciado na inexistência de condenações anteriores, embora tenha apenas 23 anos de idade, pelo que são de acautelar exigências de prevenção especial de intensidade média a reduzida.


Beneficia ainda de boa inserção familiar e laboral.


Os coarguidos AA e DD sofreram diversas condenações anteriores, por crimes de idêntica natureza, além do mais, em penas de prisão efetivas, sendo que AA, relativamente à pena única global de 6 anos de prisão em que foi condenado, beneficiou da concessão de liberdade condicional por despacho de 12/02/2021, isto é, cerca de oito meses antes da prática dos factos objeto da presente condenação e o DD praticou os mesmos factos depois de ter sido restituído à liberdade, no âmbito do cumprimento da pena de 3 anos e 4 meses de prisão efetiva, por despacho de 11/04/2020, que declarou o perdão da pena de prisão remanescente.


Assim, relativamente a estes arguidos, as exigências de prevenção especial revestem intensidade particularmente elevada.


Não resulta da factualidade assente qualquer fundamento atendível de atenuação da culpa, sendo, pelo contrário, atento o modo de execução, muito elevada a reprovabilidade e a censurabilidade ético-jurídica das condutas.


Acresce que, relativamente ao DD, são fatores de risco, a ausência de apoio familiar social, a inexistência de hábitos de trabalho e de um emprego estruturante que viabilize a sua independência financeira, o défice de competências pessoais e profissionais e os hábitos de consumo de estupefacientes.


E, quanto ao arguido AA, os fatores de risco futuro estão associados sobretudo à permeabilidade do arguido aos grupos de pares e ao baixo sentido critico sobre os mesmos, um fraco sentido avaliativo sobre as fragilidades pessoais em contexto de grupo bem como de antecipação das consequências dos seus atos.»


Convocando os factos provados relevantes para a aferição da adequação e proporcionalidade das penas parcelares [e únicas] concretamente fixadas [que objectivamente apenas se situam um pouco acima da metade das molduras abstractas aplicáveis relativamente aos arguidos AA e DD e apenas quanto ao roubo agravado], não poderemos deixar de validar o juízo de ponderação que, através da conjugação dos vários valores e princípios que concorrem na operação de determinação concreta da pena, o Tribunal recorrido efectuou.


Contrariamente ao alegado pelos recorrentes a ilicitude dos factos é elevada, quer na vertente do desvalor da acção como do resultado [actuação em grupo, de noite, apanhando as vítimas, mãe e filho menor, absolutamente desprevenidas no recato do lar e durante o descanso nocturno], não se mostrando atenuada pelo facto por não terem ocorrido lesões físicas graves ou os bens subtraídos não serem de grande monta. O abalo e perturbação emocional causada nos ofendidos [um com a especial vulnerabilidade inerente aos seus 16 anos e outro pela posição de garante que detinha relativamente ao filho menor], que perdura no tempo, não pode ser equiparado a um susto.


O mesmo se diga relativamente ao grau de culpa que, como correctamente foi afirmado pelo Tribunal a quo, se apresenta muito elevado [elevada reprovabilidade e censurabilidade ético-jurídicas das condutas], evidenciando uma personalidade mal formada e uma total indiferença pelos outros, que exige superior reacção penal.


Não procede igualmente a crítica assacada pelo recorrente AA de dupla valoração do desvalor inerente à utilização da arma, que não encontra na fundamentação do Tribunal recorrido o menor eco.


Foram igualmente ponderadas e valoradas nas medidas das penas, as circunstâncias que militam a favor dos arguidos [as que existem].


Concluindo, analisada a factualidade provada relativa às condutas ilícitas, bem como os factos pessoais provados e os antecedentes criminais, conclui-se terem sido correctamente ponderados os elementos que concorrem na operação de determinação concreta das penas parcelares e unitárias e adequadamente apreciadas as necessidades de prevenção geral e especial, ambas indiscutivelmente muito elevadas e apenas mitigadas no caso do arguido JJ.


Atentas as penas de prisão definitivamente fixadas, fica prejudicada a apreciação da possibilidade da sua suspensão (artigo 50º do Código Penal) reclamada pelos recorrentes.»


*


3. Apreciando


3.1. Das questões colocadas nos recursos no seu confronto com a delimitação legal da recorribilidade para o STJ


Estabelece o artigo 400.º, n.º1, alíneas e) e f), do CPP:


«1 - Não é admissível recurso:


(…)


e) De acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, que apliquem pena não privativa da liberdade ou pena de prisão não superior a 5 anos, exceto no caso de decisão absolutória em 1.ª instância;


f) De acórdãos condenatórios proferidos, em recurso, pelas relações, que confirmem decisão de 1.ª instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos;


(…).»


O segmento final da transcrita alínea e) resulta da redação introduzida pela Lei n.º 94/2021, de 21/12, que para o caso não importa.


Por sua vez, dispõe o artigo 432.º, do CPP, sob a epígrafe “Recursos para o Supremo Tribunal de Justiça”:


« 1 - Recorre-se para o Supremo Tribunal de Justiça:


a) De decisões das relações proferidas em 1.ª instância, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º;


b) De decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400.º;


c) De acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou pelo tribunal coletivo que apliquem pena de prisão superior a 5 anos, visando exclusivamente o reexame da matéria de direito ou com os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º;


d) De decisões interlocutórias que devam subir com os recursos referidos nas alíneas anteriores.


2 - Nos casos da alínea c) do número anterior não é admissível recurso prévio para a relação, sem prejuízo do disposto no n.º 8 do artigo 414.º».


Finalmente, o artigo 434.º, sob a epígrafe “Poderes de cognição”, preceitua que «O recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça visa exclusivamente o reexame de matéria de direito, sem prejuízo do disposto nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 432.º», resultando o segmento final da redacção dada pela Lei n.º 94/2021.


Da conjugação destas disposições resulta, numa formulação sintética, que só é admissível recurso de acórdãos das relações, proferidos em recurso, que apliquem:


- penas superiores a 5 anos de prisão, quando não se verifique dupla conforme;


- penas superiores a 8 anos de prisão, independentemente da existência de dupla conforme.


Tal significa só ser admissível recurso de decisão confirmatória da Relação no caso de a pena aplicada ser superior a 8 anos de prisão, quer estejam em causa penas parcelares ou singulares, quer penas conjuntas ou únicas resultantes de cúmulo jurídico (cf., entre muitos arestos que estão disponíveis para consulta, os acórdãos do STJ: de 10.10.2018, Proc. 144/09.3JABRG.G1.S1; 9.10.2019 Proc. 24/17.9JAPTM-E1.S1; 10.3.2021, Proc. 330/19.8GBPVL.G1.S1; 11.03.2021, Proc. 809/19.1T9VFX.E1.S1; 02.12.2021, Proc. 923/09.1T3SNT.L1.S1; 12.01.2022, Proc. 89/14.5T9LOU.P1.S1; 20.10.2022, Proc. 1991/18.0GLSNT.L1.S1; 30.11.2022,~Proc. 1052/15.4PWPRT.P1.S1, todos consultáveis em www.dgsi.pt, como outros que sejam citados sem diversa indicação).


Na verdade, como vem sendo entendido por este Supremo Tribunal, não é admissível recurso de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que apliquem pena de prisão não superior a 5 anos, exceto no caso de decisão absolutória em 1.ª instância (artigo 400.º, n.º 1, al. e), do CPP), pena que tanto é a parcelar, cominada para cada um dos crimes, como a pena única/conjunta, pelo que, aferindo-se a irrecorribilidade separadamente, por referência a cada uma destas situações, os segmentos dos acórdãos proferidos em recurso pela Relação, atinentes a crimes punidos com penas parcelares inferiores a 5 anos de prisão, são insuscetíveis de recurso para o STJ, nos termos do disposto no artigo 432.º, n.º1, b), do CPP (cf., entre outros, acórdão de 4.07.2019, Proc. 461/17.9GABRR.L1.S1).


Por outro lado, estando em causa penas – parcelares ou resultantes de cúmulo jurídico - superiores a 5 anos e não superiores a 8 anos de prisão, está vedado o recurso para o STJ de acórdão da Relação que haja confirmado – dupla conforme - a decisão da 1.ª instância.


Quer isto dizer que apenas é admissível recurso para o STJ de decisão confirmatória da Relação – casos de “dupla conforme”, incluindo a confirmação in mellius –, quando a pena aplicada, seja parcelar ou pena única resultante de cúmulo jurídico, for superior a oito anos de prisão (neste sentido, comentário de Pereira Madeira ao artigo 400.º - Henriques Gaspar et alii, Código de Processo Penal Comentado, para além da jurisprudência supra citada).


A irrecorribilidade para o STJ de acórdão proferido em recurso pelo tribunal da Relação, nos termos referidos, abrange todas as questões processuais ou de substância que digam respeito a essa decisão, tais como os vícios indicados no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, respetivas nulidades (artigos 379.º e 425.º, n.º 4, do CPP) e aspetos relacionados com o julgamento dos crimes que constituem o seu objeto, aqui se incluindo as questões atinentes à apreciação da prova, à qualificação jurídica dos factos e com a determinação das penas parcelares ou única, consoante os casos das alíneas e) e f) do artigo 400.º do CPP, incluindo nesta determinação a aplicação do regime de atenuação especial da pena previsto no artigo 72.º do Código Penal, bem como questões de inconstitucionalidade suscitadas nesse âmbito (cf. a jurisprudência citada no acórdão de 12.01.2022, Proc. 9/14.5T9LOU.P1.S1).


Em suma, resultando da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do CPP, não ser recorrível acórdão da Relação que confirme decisão condenatória da 1.ª instância e aplique pena de prisão (parcelar ou única) não superior a 8 anos, o STJ não pode conhecer de qualquer questão referente aos crimes parcelarmente punidos com pena de prisão inferior a 8 anos, apenas podendo conhecer do respeitante aos crimes que concretamente tenham sido punidos com pena de prisão superior a 8 anos, e bem assim da matéria relativa ao concurso de crimes, em caso de condenação em pena única superior àquele limite.


Assinale-se que as garantias de defesa do arguido em processo penal não incluem o duplo grau de recurso, bastando-se a Constituição da República Portuguesa (CRP), no seu artigo 32.º, com o duplo grau de jurisdição, já concretizado no presente processo através do recurso para a Relação.


O Tribunal Constitucional decidiu, em Plenário, no seu acórdão n.º 186/2013, «não julgar inconstitucional a norma constante da alínea f), do n.º 1, do artigo 400.º, do Código de Processo Penal, na interpretação de que havendo uma pena única superior a 8 anos, não pode ser objeto do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a matéria decisória referente aos crimes e penas parcelares inferiores a 8 anos de prisão».


Tal orientação foi reafirmada pelo Tribunal Constitucional nos acórdãos n.ºs 212/2017, 599/2018.


No caso em apreço, não está em causa recurso de decisão da Relação proferida em 1.ª instância, nem recurso direto de decisão proferida por tribunal do júri ou coletivo de primeira instância, não se tratando de um recurso de primeiro grau. Trata-se, sim, de um recurso interposto de acórdão da Relação que decidiu recurso anterior, o que determina a impossibilidade de o recurso poder ter os fundamentos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 410.º do CPP.


As diversas penas parcelares em que os arguidos / recorrentes foram condenados são todas inferiores a 8 anos de prisão, sendo de 7 anos, 3 anos e 6 meses e 8 meses, para cada um deles.


Só as penas únicas de cada recorrente, resultantes do cúmulo jurídico das penas parcelares, são superiores a 8 anos de prisão.


Por conseguinte, verificando-se que nenhuma das penas parcelares aplicadas aos arguidos/ora recorrentes em 1.ª instância, confirmadas pela Relação de Lisboa, é superior a 8 anos de prisão, o recurso interposto do acórdão recorrido para o STJ não é admissível nesta parte, deixando precludido o conhecimento das questões conexas que as integram e respetivos crimes, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 399.º, 400.º, n.º 1, al. e) e f), e 432.º, n.º 1, al. b), do CPP.


À constatação da existência de dupla conforme não obsta a circunstância de uma das Juízas Desembargadoras ter lavrado declaração de voto, como parcialmente vencida relativamente à medida de algumas das penas, porquanto o regime de recursos em processo penal - e especificamente em matéria penal - é autónomo, não revelando qualquer espaço de não regulação em que seja necessário recorrer, nos termos do artigo 4.º do CPP, às normas do processo civil.


Conclui-se que o acórdão da Relação é apenas recorrível para o STJ relativamente às penas únicas, fixadas em cúmulo jurídico, de 9 anos de prisão para cada um dos recorrentes, rejeitando-se os recursos, porque inadmissíveis, no que concerne às demais questões por eles suscitadas.


Ainda assim, em ordem à eventual deteção oficiosa de vícios previstos no artigo 410.º, n.º 2, do CPP, não deixou de se proceder à leitura integral do acórdão recorrido, consignando-se, consequentemente, não se evidenciar a presença de tais vícios, o que significa que a correta decisão de direito não se mostra impossibilitada pela presença de vício decisório que este Supremo Tribunal possa e deva conhecer oficiosamente.


3.2. Recurso de AA


3.2.1. Face ao exposto quanto à delimitação legal da recorribilidade para o STJ, facilmente se conclui que não pode ser acolhida a pretensão do arguido/recorrente no sentido de lhe serem reduzidas as penas parcelares aplicadas pela 1.ª instância e confirmadas pela Relação, por se tratar de matéria em que o recurso é inadmissível.


No que concerne à alegada nulidade por falta de fundamentação / exame crítico da prova, invoca o arguido a falta de fundamentação quanto aos factos 1., 3., 4., 5., 6., 9. e 10. dados como provados, dizendo que, não obstante o decidido no acórdão recorrido, “mantemos o entendimento de que o acórdão proferido em primeira instância é nulo por falta de fundamentação”.


Trata-se, assim, de reapresentar questão anteriormente submetida à Relação, que, apreciando-a, fundamentou a sua decisão no sentido de que o tribunal de 1.ª instância “identificou, pois, os meios de prova em que ancorou a sua convicção relativamente aos factos provados, nomeadamente os 1, 3, 4, 5 ,6, 9 e 10, analisou-os e correlacionou-os, com recurso a uma explicação clara, suficiente e indiscutivelmente inteligível.


Ainda relativamente ao ponto 10, cumpre acrescentar que a questão suscitada pelo recorrente não consubstancia qualquer nulidade - por falta de fundamentação – mas apenas divergência interpretativa das provas produzidas, que apenas pode ser atacada por via da impugnação da matéria de facto (art. 412.º, n.º 3 CPP) e nessa sede será apreciada.”


Está vedado, pois, ao recorrente, reeditar no presente recurso, relativamente ao acórdão da 1.ª instância, a questão da alegada falta de fundamentação / exame critico da prova, concretamente apreciada e decidida pela Relação, reportada a crimes cujas penas parcelares aplicadas não admitem recurso.


Importa também reter que o acórdão da Relação constitui a decisão impugnada no recurso interposto para o STJ e, por ser assim, a impugnação tem de conter-se no âmbito da decisão recorrida.


O que significa que, num recurso interposto para o STJ de acórdão da Relação, o recorrente já não pode retomar a impugnação da decisão da 1.ª instância como se a Relação não tivesse decidido um recurso, com esse âmbito e objeto. Julgado, pela Relação, o recurso interposto da decisão proferida em 1.ª instância, o recorrente, inconformado com a decisão da 2.ª instância, já só esta pode impugnar e não (re)introduzir no recurso para o STJ a impugnação da decisão da 1.ª instância (acórdão de 02.10.2014, Proc. 87/12.3SGLSB.L1.S1).


Finalmente, acresce que também o acórdão recorrido satisfaz as exigências legais de fundamentação.


Como tem sido sublinhado na jurisprudência deste Supremo, as exigências de pronúncia e fundamentação da sentença prescritas no artigo 374.º, n.º 2, do CPP, não são diretamente aplicáveis aos acórdãos proferidos pelos tribunais superiores, por via de recurso, mas tão só por força da aplicação correspondente do artigo 379.º, ex vi artigo 425.º, n.º 4, razão pela qual aquelas decisões não são elaboradas nos precisos termos previstos para as sentenças proferidas em 1.ª instância, o que bem se compreende visto que o seu objeto é a decisão recorrida e não diretamente a apreciação do objeto do processo (o já indicado acórdão do STJ, de 02.10.2014, e demais jurisprudência nele citado).


É que a fundamentação decisória da Relação é exercida sobre uma outra decisão que, por seu turno, já motivou a convicção; nesse sentido, não é uma fundamentação originária, mas uma fundamentação derivada, sendo-lhe lícito, ao sindicar a decisão recorrida, recorrer também à fundamentação desta para justificar as suas próprias razões.


Como já se disse supra, resta a este Supremo Tribunal a questão da medida da pena única e sua eventual substituição, porquanto a pena única que foi aplicada ao recorrido é superior a 8 anos de prisão – concretamente, 9 anos.


A pena única corresponde a uma pena conjunta, segundo um princípio de cúmulo jurídico, pelo qual a partir das penas parcelares que foram aplicadas a cada um dos crimes é construída a moldura penal do concurso, tendo como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, e, como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas, sem, todavia, exceder os 25 anos de pena de prisão (artigo 77.º n.º 2, do Código Penal).


No caso em apreço, a moldura do concurso é de 7 (sete) anos (parcelar mais elevada) a 11 (onze) anos e 2 (dois) meses de prisão (soma de todas as penas parcelares).


Quer isto dizer que a pretendida suspensão da execução da pena nem sequer é uma possibilidade suscetível de ponderação, porquanto mesmo que a pena conjunta fosse fixada no mínimo da moldura, não admitiria a aplicação dessa pena de substituição, face ao disposto no artigo 50.º, n.º1, do Código Penal, que consagra como pressuposto formal de aplicação que a medida da prisão não seja superior a 5 anos.


A determinação da pena envolve diversos tipos de operações, resultando do preceituado no artigo 40.º do Código Penal que as finalidades das penas se reconduzem à proteção de bens jurídicos (prevenção geral) e à reintegração do agente na sociedade (prevenção especial).


Hoje não se aceita que o procedimento de determinação da pena seja atribuído à discricionariedade não vinculada do juiz ou à sua “arte de julgar”. No âmbito das molduras legais predeterminadas pelo legislador, cabe ao juiz encontrar a medida da pena de acordo com critérios legais, ou seja, de forma juridicamente vinculada, o que se traduz numa autêntica aplicação do direito (cf., com interesse, Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As consequências jurídicas do crime, Editorial Notícias, 1993, pp. 194 e seguintes).


Tal não significa que, dentro dos parâmetros definidos pela culpa e pela forma de atuação dos fins das penas no quadro da prevenção, se chegue com precisão matemática à determinação de um quantum exato de pena.


Estabelece o artigo 71.º, n.º1, do Código Penal, que a determinação da medida da pena, dentro da moldura legal, é feita «em função da culpa do agente e das exigências de prevenção». O n.º2 elenca, a título exemplificativo, algumas das circunstâncias, agravantes e atenuantes, relevantes para a medida concreta da pena, pela via da culpa e/ou pela da prevenção, dispondo o n.º3 que na sentença são expressamente referidos os fundamentos da medida da pena, o que encontra concretização adjetiva no artigo 375.º, n.º1, do C.P.P., ao prescrever que a sentença condenatória especifica os fundamentos que presidiram à escolha e à medida da sanção aplicada.


Estando em causa a determinação da medida concreta da pena conjunta do concurso, aos critérios gerais contidos no artigo 71.º, n.º1, acresce um critério especial fixado no artigo 77.º, n.º1, 2.ª parte, do Código Penal: “serão considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente”.


Na consideração dos factos (do conjunto dos factos que integram os crimes em concurso) está ínsita uma avaliação da gravidade da ilicitude global, como se o conjunto de crimes em concurso se ficcionasse como um todo único, globalizado, que deve ter em conta a existência ou não de ligações ou conexões e o tipo de ligação ou conexão que se verifique entre os factos em concurso.


Refere Cristina Líbano Monteiro (A Pena «Unitária» do Concurso de Crimes, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 16, n.º 1, págs. 151 a 166) que o Código rejeita uma visão atomística da pluralidade de crimes e obriga a olhar para o conjunto – para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente, estando em causa a avaliação de uma «unidade relacional de ilícito», portadora de um significado global próprio, a censurar de uma vez só a um mesmo agente.


Como se diz no acórdão do STJ, de 31.03.2011, proferido no Processo 169/09.9SYLSB.S1, a pena conjunta tenderá a ser uma pena voltada para ajustar a sanção - dentro da moldura formada a partir de concretas penas singulares – à unidade relacional de ilícito e de culpa, fundada na conexão auctoris causa própria do concurso de crimes.


Em suma, para a determinação da medida concreta da pena conjunta é decisivo que se obtenha uma visão de conjunto dos factos que tenha em vista a eventual conexão dos mesmos entre si e a relação com a personalidade de quem os cometeu.


As conexões ou ligações fundamentais, na avaliação da gravidade do ilícito global, são as que emergem do tipo e número de crimes; da maior ou menor autonomia e frequência da comissão dos delitos; da igualdade ou diversidade de bens jurídicos protegidos violados; da motivação subjacente; do modo de execução, homogéneo ou diferenciado; das suas consequências e da distância temporal entre os factos – tudo analisado na perspetiva da interconexão entre todos os factos praticados e a personalidade global de quem os cometeu, de modo a destrinçar se o mesmo tem propensão para o crime, ou se, na realidade, estamos perante um conjunto de eventos criminosos episódicos, devendo a pena conjunta refletir essas singularidades da personalidade do agente.


A revelação da personalidade global emerge essencialmente dos factos praticados, mas também importa ponderar as condições pessoais e económicas do agente e a sua recetividade à pena e suscetibilidade de ser por ela influenciado, elementos particularmente relevantes no apuramento das exigências de prevenção.


Revertendo ao caso, verificamos que os factos foram cometidos numa mesma ocasião.


O ilícito assume intensidade muito significativa, atendendo ao modo de execução e às consequências dele resultantes em sede de lesão de bens pessoais.


O dolo mostra-se intenso.


O arguido/recorrente AA sofreu diversas condenações anteriores, nomeadamente por crimes de idêntica natureza – roubo -, tendo sido condenado, mais recentemente, por acórdão de 05.12.2017, transitado em julgado em 04.01.2018, por um crime de homicídio na forma tentada e um crime de detenção de arma proibida, praticados em 19.02.2017, na pena única de 6 anos de prisão, beneficiando da concessão de liberdade condicional por despacho de 12.02.2021, isto é, cerca de oito meses antes da prática dos factos objeto dos presentes autos.


Face aos acontecimentos que determinaram a sua prisão, o arguido demonstra distanciamento dos mesmos e estranheza perante a sua nomeação como arguido neste processo; apresenta uma postura crítica quanto às autoridades, mas fraco sentido avaliativo quanto às fragilidades pessoais que contribuíram para a presente situação jurídico-penal; revela-se um jovem impulsivo, com alguma imaturidade socio afetiva e dificuldades no âmbito da antecipação das consequências dos seus atos.


As exigências de prevenção especial são muito significativas, o mesmo acontecendo com as de prevenção geral que se revelam intensas, pois estamos face a criminalidade que causa um grande alarme social e instabilidade comunitária, exigindo uma resposta firme do sistema de justiça.


Considerando a moldura penal abstrata aplicável, os factos praticados e a personalidade do arguido que ressalta desses mesmos factos, na ponderação dos fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, entendemos não merecer censura a pena única aplicada pelo tribunal de 1.ª instância e que a Relação confirmou.


3.3. Recurso de DD


3.3.1. Alega o recorrente ter impugnado no recurso para a Relação a matéria de facto dada como provada dos pontos 1 a 21.


Não diz, porém, que a Relação entendeu não ter sido cumprido o ónus de especificação dos concretos pontos da matéria de facto que o arguido pretendia ver reexaminados e a identificação dos meios de prova que imporiam decisão diversa ou relativamente aos quais foi violado o princípio da livre apreciação da prova, razão por que, tendo a Relação considerado não se verificarem quaisquer vícios da decisão de facto, foi definitivamente fixada a factualidade dada como provada pela 1.ª instância.


Face ao supra exposto quanto à delimitação legal da recorribilidade para o STJ, facilmente se conclui estar fora da competência deste Supremo a reapreciação da decisão de facto, sendo manifestamente desprovida de fundamento a invocação de uma alegada violação do disposto nos artigos 127.º e 355.º do CPP, que pressupõe a pretensão de que o Supremo sindique a valoração das provas que foi efetuada pelas instâncias.


Neste contexto, a alegação de que foi violado o princípio da presunção de inocência, tendo apenas por base o inconformismo do arguido/recorrente com a decisão de facto da 1.ª instância que a Relação confirmou, carece de qualquer sustentação.


Também não pode ser acolhida a pretensão do arguido/recorrente de que lhe sejam reduzidas as penas parcelares aplicadas pela 1.ª instância e confirmadas pela Relação, por se tratar de matéria em que o recurso é, pelas razões já explanadas, inadmissível.


No que concerne à alegada nulidade por falta de fundamentação / exame crítico da prova, mais não faz o arguido do que reapresentar questão anteriormente submetida à Relação, que, apreciando-a, fundamentou a sua decisão no sentido de que o tribunal de 1.ª instância “identificou os meios de prova em que ancorou a sua convicção relativamente aos factos provados, analisou-os e correlacionou-os, com recurso a uma explicação clara, suficiente e indiscutivelmente inteligível. O mesmo se diga da fundamentação de direito, no âmbito da qual dissecou os elementos integradores dos tipos de ilícito em questão e efectuou a subsunção fáctico-jurídica das condutas que a eles são subsumíveis”.


Está vedado, pois, ao recorrente, reeditar no presente recurso, relativamente ao acórdão da 1.ª instância, a questão da alegada falta de fundamentação / exame critico da prova, apreciada e decidida pela Relação.


Se não nos cumpre reapreciar a alegada falta de fundamentação da decisão da 1.ª instância, não deixamos de assinalar que o acórdão recorrido satisfaz as exigências legais de fundamentação.


Como se disse supra, resta a este Supremo Tribunal a questão da medida da pena única e sua eventual substituição, porquanto a pena única que foi aplicada ao recorrido é superior a 8 anos de prisão – concretamente, 9 anos.


Como já se disse em 3.2.1., a pena única corresponde a uma pena conjunta, segundo um princípio de cúmulo jurídico, pelo qual a partir das penas parcelares que foram aplicadas a cada um dos crimes é construída a moldura penal do concurso, tendo como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, e, como limite máximo, a soma das penas concretamente aplicadas, sem, todavia, exceder os 25 anos de pena de prisão (artigo 77.º n.º 2, do Código Penal).


A moldura do concurso é, por conseguinte, de 7 (sete) anos (parcelar mais elevada) a 11 (onze) anos e 2 (dois) meses de prisão (soma de todas as penas parcelares).


Inequivocamente, a pretendida suspensão da execução da pena não constitui uma possibilidade suscetível de ponderação, porquanto mesmo que a pena conjunta fosse fixada no mínimo da moldura, não admitiria a aplicação dessa pena de substituição, face ao disposto no artigo 50.º, n.º1, do Código Penal, que consagra como pressuposto formal de aplicação que a medida da prisão não seja superior a 5 anos.


No que toca aos critérios de determinação da pena conjunta do concurso, remetemos, evitando inúteis repetições, para o já exposto, em termos gerais, em 3.2.1.


“In casu”, os factos foram cometidos numa mesma ocasião.


O ilícito assume intensidade muito significativa, atendendo ao modo de execução e às consequências dele resultantes em sede de lesão de bens pessoais.


O dolo mostra-se intenso.


O arguido/recorrente DD sofreu condenações por crimes de roubo, em pena de prisão suspensa na execução com regime de prova e em pena de prisão (efetiva), de 3 anos e 4 meses de prisão, esta última por dois crimes de roubo praticados em 06.02.2016, sendo que, por despacho de 11.04.2020, foi declarada perdoada a pena de prisão remanescente e restituído o arguido à liberdade. Por sentença de 21.06.2017, transitada em julgado em 02.10.2017, por dois crimes de roubo praticados em 01.07.2017, foi condenado na pena de 18 meses de prisão suspensa na sua execução por igual período, com regime de prova, extinta em 21.10.2019.


Do ponto de vista das suas características pessoais, o arguido sugere apresentar-se como um individuo imaturo, com manifestas dificuldades do foro reflexivo e consequencial, que aliadas ao seu envolvimento com indivíduos com comportamentos anti-normativos se configuram como relevantes fatores de risco a ter em conta.


Não detém qualquer proposta de emprego formalizada, facto que não deixará de constituir um fator de risco, comprometedor de uma inserção socialmente responsável.


Demonstra uma atitude de desvinculação perante o presente processo.


Acresce que, relativamente ao arguido DD, constituem fatores de risco a ausência de apoio familiar e social efetivo, a inexistência de hábitos de trabalho e de um emprego estruturante que viabilize a sua independência financeira, o défice de competências pessoais e profissionais e os hábitos de consumo de estupefacientes.


As exigências de prevenção especial são muito significativas, o mesmo acontecendo com as de prevenção geral, pois estamos face a criminalidade que causa um grande e justificado alarme social.


Considerando a moldura penal abstrata aplicável, os factos praticados e a personalidade do arguido que ressalta desses mesmos factos, na ponderação dos fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, entendemos não merecer censura a pena única aplicada pelo tribunal de 1.ª instância e que a Relação confirmou.


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III - DECISÃO


Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça em:


A) - rejeitar, por inadmissibilidade legal, o recurso do arguido AA na parte referente às penas parcelares (abrangendo todas as questões conexas, de natureza substantiva ou processual a elas respeitantes) e, ainda, negar provimento ao recurso na parte relativa ao quantum da pena única, desta forma confirmando inteiramente o acórdão recorrido;


B) - rejeitar, por inadmissibilidade legal, o recurso do arguido DD na parte referente às penas parcelares (abrangendo todas as questões conexas, de natureza substantiva ou processual a elas respeitantes) e, ainda, negar provimento ao recurso na parte relativa ao quantum da pena única, desta forma confirmando inteiramente o acórdão recorrido.


Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um em 5 UC`s, a que acresce a condenação no pagamento de uma importância igual a 3 UC’s, por cada um, nos termos previstos no artigo 420.º, n.º 3, do CPP (artigo 513.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, e artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).


Supremo Tribunal de Justiça, 11 de abril de 2024


(certifica-se que o acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do artigo 94.º, n.ºs 2 e 3 do CPP)


Jorge Gonçalves (Relator)


Jorge Reis Bravo (1.ª Adjunto)


Vasques Osório (2.º Adjunto)