Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02506/18.6BEPRT
Data do Acordão:06/22/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:GUSTAVO LOPES COURINHA
Descritores:PRESCRIÇÃO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
IRS
Sumário:A citação do responsável solidário em processo de execução fiscal produz efeitos interruptivos da prescrição relativamente ao responsável originário.
Nº Convencional:JSTA000P29611
Nº do Documento:SA22022062202506/18
Data de Entrada:05/11/2022
Recorrente:A………… E OUTROS
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
A………. e B…………, melhor identificados nos autos, vêm recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a reclamação por eles apresentada contra a decisão proferida em 10/08/2018, pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3379200501026984, que indeferiu o pedido de declaração de prescrição da dívida respeitante a Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares, relativo ao ano de 2000 no valor de €275.212,02.
Apresentam as suas alegações de recurso com o seguinte conteúdo a fls. 884 a 906 do SITAF:
a) Não tendo a Executada e ora Recorrente A............ sido citada no âmbito do processo de execução fiscal nº 3379200501026984, não pode deixar de se concluir que, relativamente a ela, já há muito tempo ocorreu a prescrição da dívida de IRS, do ano de 2000, a que se refere aquele processo.
b) Sendo o IRS um imposto periódico, o prazo de prescrição (8 anos – art. 48º-1 da LGT) da dívida exequenda começou a contar-se a partir de 01/01/2001 (às 00:00 horas).
c) Tendo a Executada e ora Recorrente mulher, em 20/04/2005, deduzido impugnação judicial contra a liquidação respeitante à dívida de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) que está na origem da instauração dos referidos autos de execução com o nº 3379200501026984, a contagem do citado prazo de prescrição interrompeu-se nessa data (cfr. art. 49º-1 da LGT, na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho).
d) A partir dessa data (ou seja, a partir de 20/04/2005), o processo de impugnação judicial esteve parado por um período superior a um ano, por facto não imputável à Recorrente mulher, pelo que, decorrido esse período de um ano, sempre teria cessado o efeito interruptivo da prescrição decorrente da dedução da impugnação, devendo somar-se o tempo entretanto decorrido àquele que tinha decorrido até à data da autuação (cfr. art. 49º-2 da LGT, na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho).
e) Conforme decorre daquilo que, sob os pontos 5. a 7., foi dado como provado na Sentença recorrida, a impugnação judicial foi recebida no Tribunal em 20/04/2005, tendo sido aberta conclusão em 22/03/2007 e proferido despacho de admissão liminar em 03/05/2007, pelo que o efeito interruptivo da dedução da impugnação judicial cessou em 20/04/2006, devendo somar-se ao tempo decorrido até à data da autuação do processo de impugnação (que ocorreu em 20/04/2005 – cfr. ponto 5. dos factos dados como provados na Sentença recorrida) aquele que, depois da cessação daquele efeito, veio, entretanto, a decorrer (cfr. art. 49º-2 da LGT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho).
f) Do exposto decorre que, na data em que o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho (ou seja, em 10/08/2018), o prazo de prescrição de oito anos previsto no artigo 48º-1 da LGT já se havia completado.
g) Na verdade, entre 01/01/2001, às 00:00 horas (momento do início da contagem do prazo), e 20/04/2005 (data da autuação do processo de impugnação judicial – cfr. ponto 5. dos factos dados como provados na Sentença recorrida) decorreram 4 anos, 3 meses e 19 dias.
h) Por sua vez, entre 21/04/2006 (dia seguinte àquele em que cessou o efeito interruptivo da dedução da impugnação por força de se ter completado um ano de paragem do processo por facto não imputável à ora Recorrente mulher) e 06/04/2009 (data em que foi determinada a suspensão da execução nos termos do disposto no art. 169º do CPPT) decorreram 2 anos, 11 meses e 16 dias.
i) Por fim, desde 30/06/2017 (dia seguinte àquele em que transitou em julgado a Sentença que veio a incidir sobre a impugnação judicial deduzida pela Recorrente) e 10/08/2018 (data em o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho a considerar a dívida não prescrita) decorreu 1 ano, 1 mês e 11 dias.
j) Assim, mesmo na hipótese agora em análise, considerando todas as causas legais de interrupção e suspensão da prescrição, sempre teria de se concluir que, na supra citada data em que o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o despacho objecto da reclamação apresentada pelos ora Recorrentes, ou seja, em 10/08/2018, já haviam decorrido, relativamente à ora Recorrente mulher, 8 anos, 4 meses e 16 dias contados desde o termo do ano (2000) em que ocorreu o facto gerador da dívida de imposto para cuja cobrança coerciva foi instaurado o PEF nº 3379200501026984 (IRS respeitante ao ano fiscal de 2000), pelo que o prazo de oito anos previsto no artigo 48º-1 da LGT já se encontrava ultrapassado.
k) Tendo decorrido, relativamente à ora Recorrente mulher, o respectivo prazo legal de prescrição, a dívida para cuja cobrança coerciva foi instaurada a execução extinguiu-se (ou tornou-se inexigível, para quem entenda que a prescrição não é causa de extinção das obrigações, mas um fundamento da sua inexigibilidade), pelo que deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que declare a extinção da execução, com fundamento na prescrição da dívida exequenda.
l) A isto não obsta a circunstância de a Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, ter revogado o nº 2 do art. 49º da LGT, porquanto, por força da norma transitória do art. 91º desse diploma, o regime de transformação do efeito interruptivo em suspensivo consagrado nesse preceito se manteve em vigor para os casos, como o dos autos, em que já tivesse decorrido o período de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.
m) Ao raciocínio acabado de expor não obsta igualmente a circunstância de a Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, ter acrescentado um nº 4 ao art. 49º da LGT, uma vez que, contrariamente àquele que foi o entendimento da Sentença recorrida, o que a citada norma prevê é que a pendência de impugnação judicial só suspende a contagem do prazo de prescrição nos casos em que a dedução dessa mesma impugnação judicial determine “a suspensão da cobrança da dívida”, sendo que tal só sucede quando “for prestada garantia adequada” (cfr. art. 103º-4 do CPPT).
n) No caso sub judice tal só ocorreu em 06/04/2009, tendo, então, sido determinada a suspensão da execução nos termos do disposto no art. 169º do CPPT (cfr. pontos 41. a 43. da Sentença recorrida), pelo que, até essa data – 06/04/2009 –, a mera pendência da impugnação judicial deduzida pela Recorrente não implicou a suspensão da contagem do prazo de prescrição.
o) A igual conclusão terá de se chegar no que respeita ao Executado e ora Recorrente B.............
p) Conforme é sabido, antes da alteração do Código do IRS operada pela Lei nº 82-E/2014, de 31/12 – em que vigorava o regime imperativo da tributação conjunta do agregado familiar para cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens – o imposto (IRS) incidia necessariamente sobre o conjunto dos rendimentos das pessoas que constituíssem o agregado familiar (regra de incidência objectiva), considerando-se como sujeitos passivos ambos os cônjuges (regra de incidência subjectiva), os quais não podiam ser considerados sujeitos passivos autónomos (cfr. artigo 13º-6 do CIRS).
q) Assim, até à entrada em vigor dessa Lei nº 82-E/2014, de 31/12, existindo agregado familiar integrado, como acontecia no caso dos Recorrentes, por cônjuges não separados judicialmente de pessoas e bens, os sujeitos passivos eram eles os dois, por a eles competir a direcção do agregado familiar.
r) Com efeito, dando concretização legal ao preceito constitucional em que se encontrava previsto que o imposto sobre o rendimento pessoal devia ter “em conta as necessidades e os rendimentos do agregado familiar” (cfr. art. 104º-1 da CRP), o legislador ordinário estabeleceu que o agregado familiar constituía a unidade económica relativamente à qual se aferia a tributação, que, nesse caso, teria de conjunta e não separada (cfr. art. 104º-1, da CRP), sendo as dívidas de IRS da responsabilidade de ambos os cônjuges – desde que o agregado familiar fosse integrado por consortes não separados de pessoas e bens – quando se verificassem os pressupostos do facto tributário relativamente aos mesmos e independentemente da titularidade de cada parcela do rendimento englobado para efeitos de tributação (cfr. art. 21º-1 da LGT e art. 13.º-2 do CIRS).
s) Assim, existindo agregado familiar, o cumprimento dos deveres fiscais deste e relativos à tributação do seu rendimento cabe às pessoas que exerçam a sua direcção (em regra os cônjuges), verificando-se uma titularidade plural das obrigações fiscais e uma responsabilidade solidária de ambos os cônjuges pela dívida de imposto, podendo qualquer deles praticar todos os actos relativos à situação tributária do agregado familiar e aos bens e interesses do outro cônjuge, nos termos do art. 16° da LGT.
t) Levando em consideração o exposto, se, como sucedeu no caso sub judice, um dos cônjuges deduzir impugnação judicial com vista à discussão da legalidade de uma liquidação relativa a uma dívida de IRS do agregado familiar, tal acto, respeitando à situação tributária do agregado familiar e aos bens e interesses do outro cônjuge, produz necessariamente efeitos relativamente a ambos os cônjuges.
u) Tal como se apenas um dos cônjuges tiver sido notificado de uma liquidação de imposto antes de ter decorrido o prazo de caducidade do direito à liquidação é o bastante para que essa caducidade não ocorra, ainda que o outro não tenha sido notificado dentro desse prazo, também o facto de a anulação do acto tributário em consequência da impugnação judicial deduzida apenas por um dos cônjuges opera relativamente a ambos os cônjuges, isto é, também relativamente àquele que não deduziu impugnação.
v) Posto isto, tendo a Recorrente A............, no caso sub judice, impugnado uma liquidação (de IRS respeitante ao ano fiscal de 2000) emitida em nome dela e do seu marido, o Recorrente B……….. (conforme decorre do ponto 1. dos factos dados como provados na Sentença recorrida), é esse facto interruptivo ocorrido em 20/04/2005, por ter sido o primeiro a verificar-se, que deverá ser levado em consideração, também relativamente a ele, para efeitos de contagem do prazo de prescrição, e não a data em que foi efectuada a sua citação, por a mesma ter ocorrido posteriormente àquela data (concretamente, em 08/07/2005).
w) Assim, pelos motivos supra expostos (e que aqui se dão por reproduzidos por razões de economia processual) relativamente à Recorrente mulher, também relativamente ao Recorrente marido não pode deixar de se concluir que, em 10/08/2018, ou seja, quando o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho, o prazo de oito anos previsto no artigo 48º-1 da LGT já se havia completado.
x) Deste modo, tendo a Recorrente mulher, no caso sub judice, impugnado uma dívida (IRS do ano fiscal de 2000) relativa ao seu agregado familiar e pela qual era igualmente responsável o Recorrente marido (dívida essa que foi objecto de uma única liquidação emitida em nome de ambos), verifica-se, que, pelas razões supra expostos quanto à Recorrente mulher (razões essas que aqui se dão por integralmente reproduzidos), também relativamente ao Recorrente marido não pode deixar de se concluir que, em 10/08/2018, ou seja, quando o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho, o prazo de oito anos previsto no artigo 48º-1 da LGT já se havia completado.
y) Considerando-se, nos termos acima expostos relativamente à Recorrente mulher, todas as causas legais de interrupção e suspensão da prescrição, sempre terá de se concluir que, na supra citada data em que o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o despacho objecto da reclamação apresentada pelos ora Recorrentes, ou seja, em 10/08/2018, já haviam decorrido, também relativamente ao Recorrente marido, 8 anos, 4 meses e 16 dias contados desde o termo do ano (2000) em que ocorreu o facto gerador da dívida de imposto para cuja cobrança coerciva foi instaurado o PEF nº 3379200501026984 (IRS respeitante ao ano fiscal de 2000).
z) Ainda que se entenda que, relativamente ao Recorrente marido, não se verificou, como efectivamente verificou, o efeito interruptivo da prescrição em 20/04/2005, ou seja, na da data da autuação do processo de impugnação judicial (no que não se concede e apenas se admite por cuidados de patrocínio), mesmo que apenas se tivesse em consideração que o mesmo foi citado em 08/07/2005, também relativamente a ele sempre teria de se concluir que, de forma contrária àquele que foi o entendimento do Tribunal “a quo”, em 10/08/2018, ou seja, na data em que, pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5, foi proferido o despacho que considerou que a dívida exequenda não se encontrava prescrita, já efectivamente ocorrera a prescrição dessa mesma dívida para cuja cobrança coerciva havia sido instaurado o referido PEF nº 3379200501026984.
aa) Muito embora a partir da data da referida citação (ou seja, a partir de 08/07/2005) se tenha interrompido a contagem do citado prazo de prescrição (cfr. art. 49º-1 da LGT, na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho), a verdade é que o processo de execução fiscal esteve parado por um período superior a um ano por facto não imputável aos Recorrentes, pelo que, decorrido esse período de um ano, sempre teria cessado o efeito interruptivo da prescrição decorrente da citação, devendo somar-se o tempo entretanto decorrido àquele que tinha decorrido até à data da autuação (cfr. art. 49º-2 da LGT, na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho).
bb) Os únicos actos que, no ano seguinte à citação, foram praticados no supra citado processo de execução fiscal são os que se encontram exclusivamente relacionados com a apreciação do pedido de prestação de garantia formulado pelos Recorrentes, não tendo sido levada a cabo pelo órgão de execução fiscal qualquer diligência coerciva tendente à concretização do direito da Administração Tributária à arrecadação da dívida de IRS em causa.
cc) É evidente, pois, a inércia da Administração Tributária durante o ano seguinte à citação, sendo certo que essa inércia jamais poderá ser imputada ao Recorrente.
dd) Assim, entre 01/01/2001, às 00:00 horas (momento do início da contagem do prazo), e 28/06/2005 (data da autuação do processo de execução fiscal – cfr. nº 3 dos factos dados como provados na Sentença recorrida) decorreram 4 anos, 5 meses e 27 dias.
ee) Por sua vez, entre 09/07/2006 (dia seguinte àquele em que cessou o efeito interruptivo da citação por força de se ter completado um ano de paragem do processo por facto não imputável ao ora Recorrente) e 06/04/2009 (data em que foi determinada a suspensão da execução nos termos do disposto no art. 169º do CPPT) decorreram 2 anos, 8 meses e 29 dias.
ff) Por fim, desde 30/06/2017 (dia seguinte àquele em que transitou em julgado a Sentença que veio a incidir sobre a impugnação judicial deduzida pela Executada e ora Recorrente mulher) e 10/08/2018 (data em o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho a considerar a dívida não prescrita) decorreu 1 ano, 1 mês e 11 dias.
gg) Pelo exposto, considerando todas as causas legais de interrupção e suspensão da prescrição, sempre teria de se concluir que, na supra citada data em que o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o despacho objecto da reclamação apresentada pelos ora Recorrentes, ou seja, em 10/08/2018, já haviam decorrido, relativamente ao Executado e ora Recorrente marido, 8 anos, 4 meses e sete dias contados desde o termo do ano (2000) em que ocorreu o facto gerador da dívida de imposto para cuja cobrança coerciva foi instaurado o PEF nº 3379200501026984 (IRS respeitante ao ano fiscal de 2000).
hh) A isto não obsta igualmente a circunstância de a Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, ter revogado o nº 2 do art. 49º da LGT, porquanto, conforme acima referido relativamente à Executada e ora Recorrente mulher, por força da norma transitória do art. 91º desse diploma, o regime de transformação do efeito interruptivo em suspensivo consagrado nesse preceito se manteve em vigor para os casos, como o dos autos, em que já tivesse decorrido o período de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo.
ii) Pelas razões supra expostas, a Sentença recorrida violou, v.g., as normas dos artigos 48º-1 e 49º-1-2 da LGT (na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho) e 175º do CPPT, as quais deveriam ter sido interpretadas e aplicadas com o sentido exposto nas presentes alegações e conclusões.

I.2 – Contra-alegações
Não foram proferidas contra alegações no âmbito da instância.

I.3 – Parecer do Ministério Público
Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer a fls. 921 a 931 do SITAF com o seguinte conteúdo:
“A............ e B............, vieram interpor recurso para o STA da sentença proferida pelo TAF de Porto que julgou improcedente a Reclamação nos termos do artigo 276.º do CPPT que apresentaram do despacho do Órgão de Execução Fiscal proferido em 10-08-2018, que indeferiu o seu pedido de declaração de prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal 3379200501026984, respeitante a Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Singulares, relativo ao ano de 2000 no valor de €275.212,02.
Os fundamentos do Recurso constam das Alegações apresentadas pelos Recorrentes, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.
Invocam, em síntese, os recorrentes que deve ser extinta a execução fiscal contra a recorrente mulher por ter decorrido o prazo de prescrição da divida antes de ter sido proferido o despacho reclamado, o mesmo se verificando em relação ao cônjuge marido a quem aproveita o facto interruptivo decorrente da instauração da impugnação em 20-04-2005 e a cessação de tal efeito em virtude da paragem da impugnação por período superior a um ano nos termos do artigo 49º nºs 1 e 2, na redacção da Lei nº 100/99, de 26 de Julho, sendo este facto interruptivo ocorrido em 20/04/2005 que se deverá ter em consideração por ter sido o primeiro a verificar-se e não a data em que foi efectuada a sua citação por a mesma ter ocorrido posteriormente àquela data - em 08/07/2005 - mais defendendo que a suspensão da execução nos termos do disposto no art. 169º do CPPT só ocorreu em 06/04/2009 pelo que, até essa data, a mera pendência da impugnação judicial deduzida pela Recorrente não implicou a suspensão da contagem do prazo de prescrição, tendo concluído que a sentença recorrida fez uma interpretação errada das normas dos artigos 48º-1 e 49º-1-2 da LGT (na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho) e 175º do CPPT.
A questão a apreciar consiste em saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento de direito ao ter julgado improcedente a Reclamação por ter considerado não ter ocorrido o prazo de prescrição da divida proveniente de IRS de 2000, quer em relação ao reclamante marido quer em relação à recorrente mulher.
Importa, assim, de acordo com a factualidade dada como provada, apreciar a se ocorreu, ou não, a prescrição da divida proveniente de IRS de 2000, cujo prazo de 8 anos foi o considerado pela sentença recorrida.
Todavia, antes de mais, haverá que considerar que:
- estando em causa divida de IRS, dúvidas não poderão existir de que por força da solidariedade existente, de acordo com os arts. 21.º e 49.º n.º 3 da L.G.T., as causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam a ambos os cônjuges ( cfr. doutos Acórdãos do STA proferidos em 9-5-2012, no proc. 282/12 , em 30-4-2013 no proc. 443/13 e em 17-06-2020 no proc. 0833/14.0BECBR);
- “ Verificando-se uma sucessão cronológica de causas de interrupção da prescrição antes de 1 de Janeiro de 2007 (data em que entrou em vigor a redacção dada ao art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), cada uma delas tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que ocorra quando a anterior ainda está a produzir efeitos.” - cfr. douto Acórdão do Pleno do STA proferido em 03-04-2019, no processo 02369/15.3BEPNF .
Da factualidade dada como provada resulta que o primeiro facto interruptivo da prescrição, previsto no artigo 49º da LGT quer na redacção conferida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho quer na conferida pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro, é a dedução da Impugnação em 20-04-2005, conforme 4. e 5. do probatório.
De acordo com a factualidade vertida em 6. Do probatório verifica-se que o processo de impugnação esteve parado, por facto não imputável ao contribuinte, desde a sua apresentação em 20-04-2005 até 22-03-2007 – data em que foi aberta conclusão, o que fez cessar o efeito interruptivo daquela causa interruptiva, nos termos do n.º 2 do artigo 49.º da LGT, na redacção anterior à que lhe veio a ser conferida pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro porquanto aquele prazo de um ano (considerado relevante pela norma) se completou em 20-04-2006, antes da entrada em vigor da já citada Lei n.º 53.º-A/2006.
Tomando em consideração a cessação do efeito interruptivo da Impugnação, o prazo de prescrição iniciou-se em 1.1.2001, correndo livremente até à data da instauração da impugnação e acrescendo ao prazo que se inicia em 20-04-2006 (data em que se completou um ano de paragem) sendo certo que de 1.1.2001 até ao facto interruptivo ocorrido 20-04-2005, decorreram 4 anos, 3 meses e 19 dias.
No entanto, em 08-07-2005, conforme 5. do probatório, ocorreu a citação do cônjuge marido no processo executivo, não se verificando ter cessado o seu efeito de inutilizar o tempo decorrido e de obstar ao reinicio da contagem do prazo de prescrição (produzindo efeitos na esfera do cônjuge mulher em face do que acima se referiu com apelo aos arts. 21.º e 49.º n.º 3 da L.G.T) por o processo executivo ter parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte uma vez que as diligências efectuadas até 2009, data em que foi suspensa a execução ao abrigo do disposto no artigo 169º do CPPT (35. do probatório) não configuram actos de cobrança mas sim actos tendentes a concretizar o pedido de prestação de garantia efectuado pelos ora recorrentes, que não podem configurar uma paragem do processo executivo, como se decidiu no douto Acórdão do STA proferido nestes autos em 08-09-2021, onde se exarou:
“ se é certo que estas intervenções não configuram actos de cobrança coerciva proprio sensu, nem por isso podem passar a configurar uma “paragem do processo executivo”, como se pretende, uma vez que a interdependência quanto à sua extensão entre o processo executivo e a fixação da garantia para suspensão dos efeitos do mesmo é, por demais, manifesta.
Aliás, a sugestão constante das alegações de que uma tal paragem só não se verificaria se, em paralelo á constituição dos termos da garantia, o OEF promovesse atos de cobrança coerciva concretos (os quais, a ocorrer, iriam em última análise inutilizar o desiderato da prestação da própria garantia) não pode ser aceite. …”.
Como também acima se consignou, designadamente, no sumário do douto Acórdão do Pleno do STA já acima citado, proferido 03-04-2019 no proc. 2369/15:
“ … Sempre no pressuposto de que os factos que constituem causa de interrupção ocorreram antes de 1 de Janeiro de 2007, a citação para a execução fiscal, ainda que efectuada quando se encontrava pendente reclamação graciosa, produz os seus efeitos logo que cessarem os decorrentes da reclamação graciosa.
III - Esses efeitos da causa de interrupção são: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC.
IV - Estando demonstrado que a execução fiscal não parou por mais de um ano por motivo não imputável ao sujeito passivo antes de 1 de Janeiro de 2007, não há sequer que ponderar a degradação do efeito interruptivo em efeito suspensivo à luz do n.º 2 do art. 49.º da LGT, na redacção anterior à que lhe foi dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro e atento o disposto no respectivo art. 91.º.”
Importará também considerar para a apreciação da prescrição, no caso em análise, que:
Nos termos do artigo 49.º, n.º 1, da LGT (na redacção dada pela Lei n.º 100/99, de 26 de Julho) a citação, a reclamação, o recurso hierárquico, a impugnação e o pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo interrompem a prescrição, sendo que, até à entrada em vigor da Lei n.º 53-A/2006, de 31/12 (em 01/01/2007), a paragem do processo por período superior a um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo, também fazia cessar o efeito interruptivo, somando-se, neste caso, o tempo decorrido após esse período ao que tivesse decorrido até à data da autuação (cfr. art.º 49.º, n.º 2, da LGT).
Assim, a interrupção da prescrição elimina o prazo anteriormente decorrido para a prescrição (efeito instantâneo), obstando a que o novo prazo de prescrição decorra na pendência do processo que deu causa à interrupção (efeito duradouro), salvo se este processo esteja parado por mais de um ano, por facto não imputável ao sujeito passivo (artigos 326.º, nº 1 e 327.º, nº 1 do CC e 49.º, n.º 2 da LGT)., caso em que desaparece o efeito próprio da interrupção, de inutilização do tempo decorrido anteriormente, e tudo se passa como se o facto que era interruptivo fosse um facto suspensivo.
A LGT, na redacção inicial, atribui efeito interruptivo a vários factos, sendo que, face ao regime anterior a 01/01/2007, quando ocorre mais de uma causa de interrupção da prescrição em relação ao mesmo prazo de prescrição, as causas de interrupção posteriores à primeira têm o seu efeito próprio, independentemente de ter ou não ocorrido qualquer outra interrupção.
No caso dos autos, o prazo prescricional da divida de IRS do ano de 2000 é de 8 anos, independentemente de qualquer causa de interrupção ou suspensão do prazo, contando-se desde 01/01/2001 e terminaria em 01/01/2009.
O prazo de 8 anos de prescrição foi interrompido em 20.04.2005 com a apresentação da impugnação Judicial que esteve parada por mais de ano, a partir daquela data.
Contudo, antes de se ter completado um ano de paragem do processo de impugnação (que ocorreria em 20-04-2006), e do efeito suspensivo se ter produzido, cessando os efeitos da segunda interrupção, ocorreu nova causa de interrupção em 08.07.2005 com a citação do ora recorrente marido no âmbito do processo de execução fiscal, a qual produz os seus efeitos próprios, obstando a que o novo prazo decorra na pendência do novo processo.
Com a citação, esta nova interrupção elimina para a prescrição o tempo já decorrido, sendo indiferente que existisse um período que eventualmente estivesse eliminado pelo efeito suspensivo, obstando ao decurso da prescrição até ao termo do processo, uma vez que não cessou o seu efeito interruptivo e começando a contar o novo prazo apenas após o trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo de execução fiscal (cfr. Jorge Lopes de Sousa, in Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Prática, Áreas Editora, págs. 68, 69 e 70).
Em consequência, no caso em apreço, quando ocorreu o facto interruptivo decorrente da citação ocorrida em 8-04-2005, ainda não se tinha completado o prazo de prescrição de 8 anos, verificando-se não ter ocorrido a prescrição da divida à data do despacho reclamado.
Ainda que com fundamentos não inteiramente coincidentes sempre seria concluir, salvo melhor juízo, pela não verificação da prescrição como decidiu a douta sentença recorrida.
Pelo exposto, emito parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.”

I.4 - Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cabe apreciar.


II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – De facto
O tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria de facto:
1. Foi efetuada a liquidação n.º 20045004311453, relativa a IRS de 2000, dos sujeitos passivos B............ e A……….. - informação prestada pelo OEF;
2. Da qual resultou a nota de cobrança no valor de €275.212,02, com data limite de pagamento de 22.01.2005 - fls. 300 e ss.;
3. Por falta de pagamento foi instaurado no Serviço de Finanças do Porto 5, contra os reclamantes, em 28.06.2005, o processo de execução fiscal n.º 3379200501026984 - fls. 300 e ss.;
4. Em 20.04.2005 a reclamante A……….. deduziu impugnação judicial da referida liquidação, que correu termos sob o n.º 843/05.9BEPRT - fls. 13 de 368 e sitaf;
5. A referida impugnação judicial foi recebida no Tribunal em 20.04.2005 - sitaf;
6. Em 22.03.2007 foi aberta conclusão naqueles autos - sitaf;
7. Em 03.05.2007 foi proferido despacho judicial de admissão liminar da referida impugnação - sitaf;
8. O processo de impugnação judicial 843/05.9BEPRT foi objeto de decisão de improcedência, com trânsito em julgado em 29.06.2017 - sitaf;
9. Ao reclamante B……….. foi enviada, pelo órgão de execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3379200501026984, carta com o teor de “citação”, registada com aviso de receção cujo aviso foi assinado em 08.07.2005 - fls. 305;
10. Em 08.08.2005, os reclamantes apresentaram requerimento no processo executivo n.º 3379200501026984 a solicitar informação sobre o montante da garantia a prestar, por ter sido apresentada impugnação judicial da liquidação - fls. 306;
11. Em 25.08.2005 o órgão de execução fiscal elaborou a conta para efeitos de prestação de garantia - fls. 310;
12. Na mesma data o órgão de execução fiscal fixou o valor da garantia em €375.195,39 - fls. 311;
13. Em 26.08.2005 o órgão de execução fiscal remeteu ofício aos reclamantes dando conta do montante da garantia a prestar - fls. 312;
14. Em 31.08.2005 os reclamantes receberam carta dando-lhes conta de que o montante da garantia a prestar ascendia a €375.195,39 - fls. 312 e ss.;
15. No seguimento da notificação anterior os reclamantes apresentaram requerimento junto do órgão de execução fiscal oferendo à penhora 30.000 ações da C…………., SA, NIPC ………… para garantia - fls. 316;
16. Em 13.10.2005 órgão de execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3379200501026984, ordenou a penhora nos termos de fls. 315, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
17. Em 11.01.2006, no processo de execução fiscal n.º 3379200501026984, foi elaborada pelo órgão de execução fiscal a informação de fls. 318, referente ao requerimento mencionado no ponto 13, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
18. Na mesma data foi determinada a remessa do requerimento à Direção de Finanças do Porto para apreciação do mesmo - fls. 318;
19. O que ocorreu em 13.01.2006 - fls. 320 e ss.;
20. Em 19.01.2006 foi elaborada, pelo órgão de execução fiscal, a informação complementar de fls. 2, de pág. 322, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
21. Em 16.02.2006, órgão de execução fiscal, foi proferido despacho de indeferimento da garantia apresentada - fls. 24, de 322;
22. Em 15.03.2006 a reclamante recebeu carta contendo o despacho referido no ponto anterior - cfr. fls. 27 e ss., de 322;
23. Em 07.04.2006 os reclamantes vieram ao processo executivo apresentar outros bens em garantia, nos termos de fls. de 30, de 322, cujo teor se dá aqui por reproduzido;
24. Em 10.07.2006, pelo órgão de execução fiscal foi prestada a informação de fls. 60, de 345 que aqui se dá por reproduzida;
25. Em 11.07.2006 o requerimento foi remetido à Direção de Finanças do Porto para apreciação - cfr. fls. 61 e ss., de 345;
26. Em 01.02.2007 foi junto ao processo executivo o despacho da Diretora de Finanças Adjunta do Porto a solicitar elementos adicionais para a apreciação da garantia, tendo sido remetido ao Serviço de Finanças - pág. 368;
27. Em 22.10.2007 os reclamantes apresentaram audição prévia no seguimento da notificação do cancelamento dos benefícios fiscais referentes ao IRS de 2006 por existência de dívidas às Finanças - fls. 6, de 368;
28. Em 11.04.2008 foi elaborado auto de penhora de um quarto indiviso do prédio urbano inscrito na matriz sob o n.º …. da freguesia de Jovim do Concelho de Gondomar - fls. 20, de pág. 391;
29. Em abril de 2008 o órgão de execução fiscal requereu elementos sobre o prédio nos termos de fls. 18, de pág. 414;
30. Em 17.04.2008 foi remetido o pedido de registo da referida penhora à Conservatória do Registo Predial de Gondomar - fls. 2, de pág. 414;
31. Na mesma data os reclamantes foram notificados do despacho de fls. 4, de pág. 414 para oferecer outros bens à penhora;
32. Na mesma data os reclamantes foram notificados da penhora e da nomeação da reclamante A…………, NIF …………, como fiel depositária - fls. 6 e ss., de pág. 414;
33. Em 5.05.2008 os reclamantes apresentaram o requerimento de fls. 12, de pág. 414 relativamente à notificação referida no ponto 31;
34. Na mesma data foi enviada carta aos reclamantes para esclarecerem factos do requerimento apresentado - cfr. fls. 19, de pág. 414;
35. Em 15.05.2008 houve troca de correspondência entre o órgão de execução fiscal e a conservatório do registo civil sobre o prédio penhorado nos autos - pág. 437;
36. Em 15.5.2008 os reclamantes responderam ao referido no ponto 34 nos termos de fls. 7, de pág. 437;
37. Em 27.05.2008 foi proferido despacho para apresentação de mais bens para garantia do processo executivo, tendo em vista a suspensão da execução - fls. 10, de pág. 460;
38. Em 04.06.2008 os reclamantes responderam nos termos de fls. 15, de pág. 460, que aqui se dá por reproduzido;
39. Em 01.07.2008 foi proferido despacho pelo órgão de execução fiscal para que os reclamantes registassem a hipoteca voluntária sobre os prédios por si indicados - fls. 17, de pág. 460;
40. Em 24.07.2008 os reclamantes responderam nos termos de fls. 21, de pág. 460;
41. Em 06.04.2009 os reclamantes apresentaram ao órgão de execução fiscal comprovativo da constituição das hipotecas - pág. 483;
42. No processo de execução fiscal em apreço, em 06.04.2009, foi prestada informação pelo órgão de execução fiscal de fls. 15, de pág. 506;
43. Na mesma data o órgão de execução fiscal proferiu despacho a deferir a suspensão da execução - fls. 15, de pág. 506;
44. Em 18.04.2013 o órgão de execução fiscal determinou a remessa dos autos para registo da suspensão - pág. 506;
45. Por ofício de 30.10.2013 foi devolvido o processo de execução fiscal ao órgão de execução fiscal - pág. 529;
46. Por ofício de 16.06.2017 o Tribunal notificou a RFP da sentença de improcedência proferida no processo de impugnação 843/05 - fls. 17, de pág. 529;
47. Em fevereiro de 2018 foi prestada a informação de pág. 552 sobre a qual recaiu o despacho ali constante;
48. Em 07.06.2018 a reclamante requereu ao órgão de execução fiscal a declaração de prescrição das dívidas - cfr. fls. 17 de pág. 552;
49. Em 10.08.2018 foi proferido despacho pelo órgão de execução fiscal de não verificação de prescrição das dívidas - cfr. fls. 4, de pág. 575;
50. Por ofício de 13.08.2018 a reclamante foi notificada do despacho de indeferimento - fls. 12, de pág. 575;
51. O aviso de receção da notificação anteriormente referida foi assinado em 16.08.2018 - fls. 13, de pág. 575;
52. A presente reclamação foi apresentada em 13.09.2018 - fls. 3;
53. Em 29.11.2018 a reclamante arguiu a nulidade da citação no processo de execução - pág. 575;
54. Em 06.11.2019, a pedido da reclamante, o órgão de execução fiscal emitiu certidão da qual consta que no processo de execução fiscal que deu origem aos presentes autos não consta que a reclamante tenha sido citada, mas que tem vindo a intervir nos autos desde 5.08.2005 - cfr. fls. 12, de pág. 667;
55. Em 07.1.2020 a reclamante foi notificada de que podia consultar o processo - pág. 644;
56. Em 10.01.2020 a reclamante requereu ao exequente que se pronunciasse sobre a nulidade arguida - cfr. fls. 8, de pág. 644;
57. Por ofício de 29.01.2020 foi indeferido o pedido de confiança do processo - pág. 667.

II.2 – De Direito
I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo TAF do Porto que julgou improcedente a reclamação interposta pelos reclamantes, ora Recorrentes, A............ e B............, contra o despacho proferido pelo órgão de execução fiscal, em 10.08.2018, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 3379200501026984, que indeferiu o requerimento por eles apresentado arguindo a prescrição da dívida relativa a IRS de 2000 no valor de € 275.212,02.
A douta sentença recorrida julgou improcedente a reclamação então deduzida, no entendimento de que não se verifica a alegada prescrição da dívida sob recurso, uma vez que ocorreram factos interruptivos da prescrição nomeadamente a citação do PEF, ocorrida a 8.7.2005, que por sua vez fez desaparecer todo o tempo decorrido em relação ao reclamante B…………. Por seu turno, a instauração da impugnação judicial por parte da ora Recorrente A………… que ocorreu em 20.04.2005, que interrompeu aquela prescrição viu os seus efeitos cessar por paragem superior a um ano nos termos do n.º 2 do artigo 49.º da LGT, mas foi sucedida por suspensão nos termos do n.º 4 do artigo 49.º da LGT em resultado da pendência do processo de impugnação judicial.

II. Inconformados com o assim decidido, alegam em síntese que a Recorrente A…………, tendo deduzido a impugnação judicial em 20.04.2005 contra a liquidação de IRS, a contagem do citado prazo de prescrição interrompeu-se nessa data de acordo com o artigo 49.º, n.º 1 da LGT, na redação introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho.
Como o processo de impugnação judicial esteve parado por um período superior a um ano por facto não imputável à Recorrente A…………, decorrido esse período de um ano, cessou por sua vez, o efeito interruptivo da prescrição decorrente da dedução da impugnação “…devendo somar-se o tempo entretanto decorrido àquele que tinha decorrido até à data da autuação (cfr. art. 49º-2 da LGT, na versão introduzida pela Lei nº 100/99, de 26 de Julho).
Consideram, ainda, que “na data em que o Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Porto 5 proferiu o seu despacho (ou seja, em 10/08/2018), o prazo de prescrição de oito anos previsto no artigo 48º-1 da LGT já se havia completado” e que conclusão aproveita ao Recorrente B…………

III. Vejamos se têm razão.
E começamos por sublinhar, relativamente ao Recorrente B…………, que não se verificam causas que possam obstar ao efeito interruptivo da prescrição, nada mais se tendo apurado de relevante a este respeito que possa alterar aquilo que por nós já antes foi decidido. Assim, reiteramos que “Temos, assim, por certo que, quanto ao Recorrente B………… e pelas razões acabadas de referir, não se verificou o circunstancialismo previsto no, então, n. 2 do artigo 49.º da LGT, nos termos alegados perante este Supremo Tribunal.

IV. Importa, em seguida, fazer idêntica análise relativamente à Recorrente A………….
E, a este respeito, cabe registar que a sentença ora Recorrida se apercebeu – e bem (por ser muito significativo) – da verificação de uma causa de obstáculo à produção do efeito interruptivo derivado da paragem do processo de impugnação, nos termos do n. 2 do artigo 49.º da LGT, entre 20.04.2005 e 22.03.2007.
Mas mais se apercebeu a sentença recorrida que, sem prejuízo da inutilização do efeito interruptivo, ocorria um outro efeito que se verifica e que estava associado à pendência da impugnação judicial, nos termos do n.º 4 do artigo 49.º da LGT. É o que a seguinte passagem da sentença esclarece: “Com a entrada em vigor da nova redação dada pela Lei n.º 53-A/2006 desaparece este n.º 2 e pelo n.º 4 o prazo de prescrição legal suspende-se em virtude de pagamento de prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida.
Por conseguinte, entre 1.01.2001 e 01.01.2007 não decorreu o prazo de prescrição que, entretanto, se suspendeu pela pendência da impugnação judicial apresentada pela reclamante até ao trânsito em julgado, inviabilizando a prescrição das dívidas.

V. Ora, a decisão recorrida julgou correctamente – no sentido da não verificação da prescrição – embora com os fundamentos errados.
Tal sucede por duas razões.
Em primeiro lugar, porque na verificação das causas de suspensão, a sentença não cuidou de que tal efeito apenas ocorre quando o evento suspensivo decorrente da impugnação determine “a suspensão da cobrança da dívida”, como estabelecia o n.º 4 do artigo 49.º da LGT (na linha, aliás, do que já previa o n.º 3 daquele mesmo artigo, anteriormente às alterações introduzidas pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro).
Ora, vertendo à factualidade carreada para os autos, denota-se que um tal efeito suspensivo da execução só foi logrado em 6 de Abril de 2009, como resulta dos pontos 42 e 43 do Probatório.
Assim, logo se conclui que a contagem da prescrição se teria por forçosamente verificada, atentos os efeitos interruptivo e suspensivo, decorrentes da Impugnação Judicial.
Com efeito, entre o seu início a 01.01.2001 e 20.04.2005 (data da autuação do processo de impugnação judicial) decorreram 4 anos, 3 meses e 19 dias. Entretanto, entre 21.04.2006 (dia seguinte àquele em que cessou o efeito interruptivo da dedução da impugnação por força de se ter completado um ano de paragem do processo por facto não imputável à ora Recorrente mulher) e 06.04.2009 (data em que foi determinada a suspensão da execução nos termos do disposto no artigo 169.º do CPPT) decorreram 2 anos, 11 meses e 16 dias. Por fim, desde 30.06.2017 (trânsito em julgado da Sentença que veio a incidir sobre a impugnação judicial deduzida pela Recorrente) e 10.08.2018 (data do despacho de indeferimento da Reclamação sindicada) decorreu 1 ano, 1 mês e 11 dias. Ultrapassa-se, pois, para além de qualquer dúvida, o prazo legal de 8 anos.

VI. Todavia – e temos agora a segunda razão pela qual a sentença é correta, embora por outros fundamentos – importa considerar outras causas interruptivas da prescrição, uma vez que essa consideração era de exigir quanto aos prazos em curso anteriormente à redacção introduzida pela Lei n.º 53.º-A/2006, de 29 de Dezembro, ao artigo 49.º da LGT, com a introdução de um (novo) número 3 que previa: “Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a interrupção tem lugar uma única vez, com o facto que se verificar em primeiro lugar.
É que, como este Supremo Tribunal Administrativo veio já esclarecer: “Verificando-se uma sucessão cronológica de causas de interrupção da prescrição antes de 1 de Janeiro de 2007 (data em que entrou em vigor a redacção dada ao art. 49.º da LGT pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro), cada uma delas tem a virtualidade de interromper o prazo prescricional, ainda que ocorra quando a anterior ainda está a produzir efeitos.” – cfr. Acórdão de 3 de Abril de 2019, lavrado no Processo n.º 2369/15 – e que “Ocorrendo sucessivas causas de interrupção da prescrição, antes da entrada em vigor da referida redacção do nº 3 do art. 49º da LGT, devem todas elas ser consideradas autonomamente, para efeitos de contagem do respectivo prazo, desde que susceptíveis de influir no seu decurso.” – cfr. Acórdão de 30 de Abril de 2013, lavrado no Processo n.º 443/13 (disponíveis em www.dgsi.pt).
Ora, tal significa que importa ponderar acerca da verificação de efeitos interruptivos da execução fiscal em causa nos autos na contagem do prazo de prescrição.

VII. E, a este respeito, verifica-se um tal efeito interruptivo, por força do disposto no n.º 2 do artigo 28.º da LGT, quando dispõe que: “As causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitam igualmente ao devedor principal e aos responsáveis solidários ou subsidiários.
Recorde-se a interpretação dada a esta norma por este Supremo Tribunal, no Acórdão proferido no processo n.º 0573/10, de 03 de novembro de 2010: “Segundo é jurisprudência corrente (…) a citação do responsável subsidiário acarreta a interrupção da prescrição em relação a ele e também em relação ao devedor originário. O que quer dizer que as causas de suspensão ou interrupção da prescrição produzem efeito de igual modo em relação ao responsável subsidiário, isto é, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele e também em relação ao devedor originário – cf., por todos, neste sentido, os acórdãos desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 15-04-2009, e de 20-05-2009, proferidos respectivamente nos recursos n.º 149/09 e n.º 206/09.” (disponível em www.dgsi.pt).
Idêntico sentido é extraível de recente jurisprudência dos restantes tribunais superiores tributários – cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.º 1406/19: “V - A citação do responsável subsidiário acarreta a interrupção da prescrição em relação a ele e também em relação ao devedor originário.”, ou Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, no Processo n.º 00178/05.7BEBRG: “IV - Assim, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5.º ano, se ele for citado até ao fim do 8.º ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário), por força da regra do n.º 2 do artigo 48.º da LGT.” – decisões disponíveis em www.dgsi.pt.
Assim sendo, e por força do regime da solidariedade de dívidas de IRS – actualmente, vd. artigo 102.º-C do Código do IRS (cfr. Acórdão deste Supremo Tribunal, de 13 de Novembro de 2013, lavrado no Processo n.º 215/12, disponível em www.dgsi.pt) – temos por verificada a previsão legal daquela norma, pelo que as conclusões que retirámos a respeito do Recorrente B………… são aqui válidas a respeito da Recorrente A…………, impedindo assim a verificação da prescrição da dívida exequenda pelas razões que supra se referiram.


III. CONCLUSÕES
A citação do responsável solidário em processo de execução fiscal produz efeitos interruptivos da prescrição relativamente ao responsável originário.


IV. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em negar provimento ao presente recurso.


Custas pelos Recorrentes.


Lisboa, 22 de Junho de 2022. - Gustavo André Simões Lopes Courinha (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - José Gomes Correia.