Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:021/15
Data do Acordão:04/29/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:TABELA DO IMPOSTO DE SELO
TERRENO PARA CONSTRUÇÃO
Sumário:Não tendo o legislador definido o conceito de prédio urbano com afectação habitacional mas resultando do artigo 6º do CIMI uma clara distinção entre prédios urbanos habitacionais e terrenos para construção, não podem estes ser considerados para efeitos de incidência do Imposto de Selo como prédios urbanos com afectação habitacional.
Nº Convencional:JSTA000P18919
Nº do Documento:SA220150429021
Data de Entrada:01/12/2015
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

1. A…………., S. A., identificado nos autos, deduziu impugnação judicial no TAF de Loulé, pedindo a anulação da liquidação nº. 2013003818873, referente a Imposto de Selo, no valor de € 14.266,50, invocando a errónea qualificação do facto tributário, uma vez que um terreno para construção não é um prédio afecto e funcionalmente apto para habitação, não estando, consequentemente, abrangido pela Lei nº. 55-A/2012, de 29/10 nem pela verba 28 e 28.1 do Código do Imposto de Selo e invocando ainda a violação do princípio da igualdade, a dupla tributação e a inconstitucionalidade daquela verba.

A impugnação foi julgada procedente pelo TAF de Loulé, considerando-se que “o facto do prédio do impugnante ser um prédio urbano, por se tratar de um terreno para construção (cfr. CIMI) não implica uma afectação habitacional subsumível à referida verba nº. 28.1 da Tabela do Imposto de Selo”.

2. Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso para o STA, terminando as suas alegações nos seguintes termos:

a) A questão decidenda é a interpretação da verba 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS) aditada pela Lei n.º 55-A/2012, de 29/10, em articulação com o art.º 6.º n.° 1 al. f) i) dessa mesma Lei;
b) Com a alteração introduzida pela citada Lei, o IS passou a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1 000 000,00 (vide verba n.º 28 da TGIS);
c) No CIS não há qualquer definição sobre os conceitos de prédio urbano, terreno para construção e afectação habitacional, pelo que terá que se aplicar o disposto no CIMI, para aferir da eventual sujeição a IS (Cfr. art.º 67.º n.º 2 do CIS redacção dada pela Lei n.º 55-A/2012);
d) O art.º 2.º n.º 1 do CIMI define o conceito de prédio e o art.º 6.º n.º 1 do CIMI dispõe acerca das espécies de prédios urbanos existentes, integrando neste conceito os terrenos para construção;
e) A noção de afectação do prédio urbano está subjacente à avaliação dos imóveis, corresponde ao valor incorporado ao imóvel em função da utilização a que está afecto, constituindo um facto de distinção determinante para efeitos de avaliação (coeficiente), porquanto;
f) Na avaliação dos terrenos para construção, o legislador optou pela aplicação da metodologia de avaliação dos prédios urbanos em geral, assim se devendo levar em consideração todos os coeficientes previstos no art.º 38.º do CIMI, nomeadamente, o coeficiente de afectação previsto no art.º 41.º desse código;
g) E tal resulta da imposição legal prevista no n.º 2 do art.º 45.º do CIMI, ao remeter para o valor das edificações autorizadas ou previstas no terreno para construção (Vide Ac. do TCA do Sul, 2012/02/14, proc. 04950/11 e Ac. do STA, 2010/02/10, proc. 01191/09);
h) Para efeitos de determinação do VPT dos terrenos para construção é clara a aplicação do coeficiente de afectação em sede de avaliação, pelo que a sua consideração para efeitos de aplicação da verba n.º 28 da TGIS não pode ser “desprezada”, já que;
i) Na aplicação daquele coeficiente deve levar-se em consideração a classificação dos prédios urbanos (cfr. art.º 6º n.º 2 do CIMI), norma que estabelece como critérios a eleger, com base nessa classificação dos prédios, em primeiro lugar, o licenciamento dos edifícios ou construções ou, na falta de licenciamento, o destino normal dos imóveis;
j) O regime de avaliação do valor patrimonial dos terrenos para construção está previsto no art.º 45.º do CIMI e o seu modelo é semelhante ao dos edifícios construídos, embora tenha como suporte o edifício a construir, tomando por base o respectivo projecto;
k) O valor do terreno para construção corresponde a uma expectativa jurídica, que se traduz num direito de nele se vir a construir um prédio com determinadas características e valor;
l) É essa expectativa consubstanciada na produção de uma riqueza materializada num imóvel a construir que faz aumentar o valor do património do proprietário do terreno para construção, logo que o imóvel passa a poder ser qualificado como terreno para construção;
m) O legislador, na avaliação dos terrenos para construção, separa 2 partes do terreno:
n) a parte do terreno onde vai ser implantado o edifício a construir, cuja área de implantação se situa dentro do perímetro previsto de fixação do edifício a construir no solo. A determinação do valor dessa parte do terreno resulta da avaliação do edifício a construir, como se já estivesse construído, utilizando-se para tal o projecto de construção aprovado. Efectuada essa determinação do valor, reduz-se o valor apurado a uma percentagem entre 15% e 45% (cfr. art.º 45º n.º 2 do CIMI) devido ao prédio ainda não estar concluído;
o) e a parte do terreno adjacente à área de implantação, o valor desta parte do terreno é apurado da mesma forma que se determina o valor da área do terreno livre e da área do terreno excedente para efeitos de qualquer imóvel urbano, levando em consideração o disposto no art.º 40.° n.º 4 do CIMI;
p) Daqui ser forçoso concluir que, a utilização do coeficiente de afectação na determinação do VPT dos terrenos para construção deriva da Lei, quando estabelece que o valor da área da implantação é determinado em função do valor das edificações autorizadas ou previstas, resultando tal da aplicação do sistema geral de avaliações de prédios urbanos ao projecto de construção em causa, na avaliação do valor patrimonial dos terrenos para construção;
q) Além disso, a indicação da afectação habitacional dos terrenos para construção decorre da iniciativa do contribuinte, nos termos do art.º 37º do CIMI, ou decorre da avaliação geral, com base nos elementos fornecidos pela Câmara Municipal;
r) O entendimento da AT é que o conceito de “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28 da TGIS, compreende quer os prédios edificados quer os terrenos para construção, desde logo atendendo ao elemento literal da norma, já que,
s) O legislador não refere “prédios destinados a habitação” antes tendo optado pela noção “afectação habitacional”. Expressão diferente e mais ampla cujo sentido há-de ser encontrado na necessidade de integrar outras realidades para além das identificadas no art.º 6.º n.º 1 al. a) do CIMI;
t) Por outro lado, muito antes da efectiva edificação do prédio, é possível apurar e determinar a afectação do terreno para construção, através do alvará de licença para a realização de operações urbanísticas e, muitas vezes, do estabelecido nos Planos Directores Municipais que estabelecem o modelo de organização espacial do território municipal;
u) Logo, contrariamente ao decidido na douta sentença, a afectação habitacional, para efeitos de aplicação da verba 28, não implica necessariamente a existência de edifícios ou construções, aplicando-se, portanto, a terrenos para construção com essa afectação;
v) Embora, a douta sentença tenha acompanhado de perto a fundamentação constante da decisão do CAAD de 02/10/2013, proc. 53/2013-T, que decidiu que um “prédio com afectação habitacional” não poderá ser apenas um prédio licenciado para habitação ou destinado a esse fim (isto é, não bastará que seja um “prédio habitacional”), tendo de ser um prédio que tenha já efectiva afectação a esse fim, consideramos que,
w) Salvo melhor opinião, tal entendimento não resulta nem do pensamento legislativo nem tem o mínimo de correspondência verbal com a Letra da lei aqui em causa;
x) A douta sentença padece de erro de julgamento de direito, quando decidiu considerar que um terreno para construção não implica uma afectação habitacional subsumível à verba n.º 28 da TGIS, violando, assim, o disposto nos art.ºs 41.º, 45.º, 37.º e 38.º todos do CIMI, artº 9.º n.º 1 do CC e art.º 11.º n.º 1 da LGT.
Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, mantendo-se a liquidação impugnada, assim se fazendo JUSTIÇA.

3. A recorrida veio contra-alegar, concluindo de acordo com o que se segue:

A. O thema decidendum do recurso respeita em saber se no âmbito objectivo de incidência da verba 28. e 28.1. da TGIS, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 55-A/2012, se devem incluir os terrenos para construção com valor patrimonial tributário igual ou superior a 1 milhão de Euros.
B. Para a Recorrida, os terrenos para construção não se incluem na previsão da norma constante da verba 28 e 28.1. da TGIS, redacção conferida pela Lei n°55-A/2012 de 29.10, por não possuírem afectação habitacional.
C. O Prédio da Recorrida é um terreno para construção, sem qualquer edificação, projecto ou processo de licenciamento ou de comunicação prévia para construção elaborado ou submetido às entidades competentes e sem licença de utilização emitida.
D. O conceito de “prédio com afectação habitacional” formulado no CIS na verba 28 e 28.1 do TGIS [na redacção da Lei nº 55-A/2012] não tem equivalente terminológico ou jurídico com qualquer outro conceito usado em legislação de natureza tributária, em particular no CIMI, código de aplicação subsidiária expressa ex vi artigo 3° da Lei nº 55-A/2012.
E. O legislador distingue no CIMI aquilo que é a classificação de prédios urbanos, prevista e descrita no artigo 6° do CIMI, e a lista fechada dos tipos de afectação dos prédios edificados incluída no artigo 41º nº 1 do CIMI aplicável para efeitos de avaliação patrimonial dos prédios edificados.
F. A classificação do artigo 6° do CIMI é mais abrangente e estrutural do que a aplicação do coeficiente de afectação do artigo 41º nº 1 prevista no mesmo código, sendo que esta apenas se aplica à avaliação patrimonial dos prédios edificados para efeitos de CIMI enquanto a primeira é mais ampla e releva para outras matérias como taxas de IMI e IMT, Estatuto dos Benefícios Fiscais e para efeitos da verba 28 e 28.1. do TGIS.
G. O artigo 6° do CIMI e a sistémica ínsita nesse código não autorizam a interpretação de que o legislador com a redacção conferida pela Lei nº 55-A/2012 de 29.10 à verba 28.1. do TGIS ao utilizar o conceito “prédio com afectação habitacional” teria procurado ampliar as espécies e classificação de prédios urbanos definida no artigo 6° nº 1 do CIMI ou até criar um tertio genus, conforme é referido pela Recorrente no artigo 24° das suas alegações.
H. O artigo 45° do CIMI é o preceito legal definidor do valor patrimonial dos terrenos para construção de acordo com um modelo de avaliação matemático que pondera um conjunto de coeficientes com base nas potenciais características de uma realidade que ainda não existe e que não está afecta imediata e concretamente ao terreno.
I. A “afectação habitacional” implica a efectiva e concreta afectação de um prédio urbano a esse fim - sendo esse o seu destino normal - e não apenas uma expectativa ou potencialidade de um prédio urbano de um dia, mediante determinadas condições, vir a ter uma afectação habitacional.
J. A “afectação habitacional” inculca uma “ideia de funcionalidade real e presente”.
K. Os terrenos para construção, sem edificação, não cumprem por si esta afectação habitacional (i) ou porque não tem licença de utilização ou (ii) porque, de acordo com a natureza das coisas, não estão em condições de serem habitados, sendo o seu destino normal serem objecto de construção a edificar.
L. Além do elemento literal da verba 28.1 da TGIS, os elementos histórico e o teleológico que permitem compreender a ratio legis e occasio legis que presidiram à elaboração, redacção e inserção da verba 28 e 28.1 na TGIS, conferindo-lhe uma conotação de interpretação autentica como é exemplo a apresentação pelo Governo na Assembleia da República da proposta de lei nº 96/XII/2ª de 20.09.2012 - que deu origem à Lei n° 55-A/2012 de 29.10 e a alocução do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais nessa Câmara legislativa no dia 11.10.2012.
M. Desde o momento da entrada em vigor da Lei nº 55-A/2012 (e na redacção conferida por esta) os arestos arbitrais e jurisprudenciais identificados supre tem sido unânimes na interpretação da não incidência objectiva da verba nº 28 e 28.1 da TGIS aos terrenos para construção urbana.
N. O artigo 194° da Lei nº 83-C/2013 de 31.12. procedeu à alteração da verba nº 28.1 da TGIS, passando a incluir na sua previsão os terrenos para construção.
O. A alteração legislativa operada pelo artigo 194° da Lei nº 83-C/2013 de 31.12 é reveladora que o legislador não tinha incluído na previsão da norma e no âmbito objectivo de incidência da verba 28.1. da TGIS na redacção da Lei nº 55-A/2012, os terrenos de construção.
P. A Lei nº 83-C/20l3 de 31.12, não contém qualquer afirmação ou referência expressa ao carácter interpretativo no texto ou no preâmbulo do referido diploma legal, pelo que é uma norma inovadora e não interpretativa, não incidindo sobre factos passados.Q. A obediência do legislador ao princípio constitucional da proibição da retroactividade da lei fiscal plasmado no artigo 103º nº 3º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e cujo corolário se materializa no artigo 12º nº 1º da LGT afasta a aplicação [ou interpretação] retroactiva da nova lei aos factos ocorridos anteriormente à sua entrada em vigor (1 de Janeiro de 2014), tal como é a situação dos presentes autos.
R. Neste sentido, deverá ser mantida a decisão do Tribunal a quo, em razão da não incidência objectiva da norma constante das verbas 28 e 28.1. da TGIS (na redacção conferida pela Lei n° 55-A/2012 de 29.10) aos terrenos de construção.
S. E consequentemente, confirmar a decisão do Tribunal a quo de anulação total da liquidação do imposto de selo relativa ao Prédio, declarando a sua ilegalidade e anulação, em razão da errónea qualificação do facto tributário e erro sobre os pressuposto de direito ex vi artigo 99° a) do CPPT e dos artigos 4° e 6° da Lei nº 55-A/2012 (por interpretação a contrario do disposto na verba 28 e 28.1 do Tabela Geral de Imposto de Selo, quanto à afectação habitacional de terrenos de construção) e ainda o artigo 135° do Código do Procedimento Administrativo.
Nestes termos, e nos mais de direito aplicáveis, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser considerado improcedente o recurso apresentado pela Recorrente, e assim, confirmada e mantida a douta Sentença recorrida, que determinou a ilegalidade e anulação total da liquidação do imposto de selo identificada nos autos, só assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

4. O magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, de acordo com o parecer que se transcreve:

1 - O objecto do recurso.
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso — artigos 608º, n.º 2, 635.º, n.ºs 2 e 3 e 639º, todos do Código de Processo Civil (C.P.C.).
Analisando as conclusões apresentadas, resulta ser o mesmo relativo à da aplicação em 2012 do previsto na verba 28.1 da Tabela Geral de Imposto de Selo (I.S.) na redação da Lei n.º 55-A/2012, de 29/10, quanto à propriedade terrenos de construção, bem como no seu art. 6.º, e ainda no art. 46.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (C.I.M.I.).
Acaba a recorrente a indicar como violados o dito art. 28.º os arts. 37.º, 38.º, 41.º e 45.º do C.I.M.I. e o n.º 1 do art. 11.º da Lei Geral Tributária.
2 - O caso concreto.
Do conjunto de factos dados como provados a fls. 74, e ainda de fls. 20 e 21, resulta ter sido liquidado I.S. relativo ao ano de 2012 relativo a prédio urbano inscrito na matriz como terreno para construção, o qual tinha avaliado em € 1 426 650,00.
3. Direito aplicável.
Conforme resulta do princípio da legalidade tal como se encontra previsto no art. 103.º n.º 2 da C.R.P., e sendo a norma em causa de incidência, não se pode através da via interpretativa afirmar um resultado que não se encontra expresso na lei, conforme resulta do princípio da legalidade previsto no art. 103.º n.º 2 da Constituição. Aliás, da proposta da dita Lei n.º 55-A/2012, de 29/10, tal como se encontra disponível para consulta no Diário da Assembleia da República, I série, nº 9/XII/2, de 11 de outubro de 2012, foram apenas indicadas as necessidades de obter receitas para fazer face à situação orçamental deficitária, sem que da mesma não resulta qualquer referência à possibilidade de aplicar também a dita taxa também quanto a terreno para construção.
E da discussão da dita proposta acessível no mesmo Diário colhe-se apenas referência à aplicação de uma “taxa especial” a pagar apenas pelos proprietários de “prédios urbanos” de “muita elevada vaiar” au “de luxo”, vulgarmente designados como “casas”.
Acresce que sobre o objeto do recurso, tem-se pronunciado reiteradamente e de forma uniforme o Supremo Tribunal Administrativo, no seguinte sentido:
“Não tendo o legislador definido o conceito de “prédios (urbanos) com afectação habitacional”, e resultando do artigo 6.º do Código do IMI - subsidiariamente aplicável ao Imposto do Selo previsto na nova verba n.º 28 da Tabela Geral - uma clara distinção entre “prédios urbanos habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto do Selo (Verba 28.1 da TGIS, na redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro), como prédios urbanos com afectação habitacional.”
Assim, nomeadamente, pelos acórdãos de 9-7-14 e de 23-4-2014 nos processos n.º 271/14-30 e 467/14-30, cujo teor é acessível em www.dgsi.pt, a que se seguiram vários outros.
Poderá ser de proferir decisão sumária, nos termos do art. 656.º do C.P.C., aplicável subsidiariamente.
4. Concluindo:
O recurso é de julgar improcedente por manifestamente infundado, com os fundamentos constantes dos acima referidos acórdãos.

5. Cumpre apreciar e decidir.

II. Fundamentos

De facto

A) A Impugnante é proprietária de um lote de terreno de construção inscrito na matriz urbana sob o artigo 9585 da freguesia de ………, Concelho de Loulé (cfr. fls. 21 dos autos);
B) O valor patrimonial do prédio referido na alínea anterior, aquando da emissão da liquidação era de €1.426.650,00 (cfr. fls. 20 e 21 dos autos);
C) O prédio referido na alínea A) está descrito na caderneta predial com “valor patrimonial actual de “€1.426.650,00” e “Tipo de coeficiente de localização: Habitação.” (cfr. fls. 21 dos autos);
D) Por avaliação feita em 22/02/2013, o Serviço de Finanças de Loulé - 1 fixou o valor patrimonial em €1.426.650,00 (cfr. fls. 21 dos autos);
E) O prédio em causa é um terreno para construção (cfr. fls. 21 dos autos);
F) Em 14/07/2013 foi emitida liquidação nº 2013003818873 referente a Imposto de Selo, no valor de €14.266,50 (cfr. fls. 21 dos autos);


De direito

Considerando o mº juiz “ a quo” que o terreno para construção fora objecto da incidência da norma da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo na redacção anterior à que lhe foi dada pela Lei do Orçamento de Estado para 2014 incidência cuja legalidade a impugnante questionava, entendeu face aos factos dados como provados que esta norma de incidência não abrangia os terrenos para construção cuja edificação seja para habitação, pelo que a liquidação deste imposto violou essa mesma norma e, por ilegal, este acto administrativo não podia manter-se na ordem jurídica, razão pela qual o anulou.


A Fazenda Pública como se pode ver das suas alegações e conclusões de recurso sustenta que a incidência desse imposto decorre da abrangência do conceito de prédio urbano ínsita no artigo 2 nº 1 do CIMI cujas espécies o artigo 6º do mesmo diploma legal distingue e onde os terrenos para construção aparecem qualificados como sendo também prédios urbanos para efeitos do CIMI.
Refere que sendo os terrenos para construção tidos como prédios urbanos em sede IMI nada obsta que tendo presente que o conceito de prédios com afectação habitacional a que alude o disposto no verba n 28 da TGIS compreenda também os terrenos para construção pois esse conceito não implica necessariamente a existência prévia de edifícios ou construções.
A sentença recorrida porque interpretou o disposto na verba 28 do TGIS de forma a excluir a afectação habitacional dos terrenos para construção enferma de erro de julgamento de direito pelo que deve ser revogada.

A recorrida considera que o Tribunal “a quo” fez uma correcta interpretação do disposto na verba n.28 do TGIS pelo que a sentença recorrida é de manter.
Vejamos:

Trata-se de questão que foi já por várias vezes apreciada por esta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo que considerando estar em causa a interpretação da norma de incidência objectiva constante da verba 28.1 da TGIS na redacção da Lei 33-A/2012 de 29 de Outubro ou seja na redacção anterior à lei do Orçamento de Estado para 2014 que veio a integrar de modo expresso os terrenos para construção na referida verba no 28 do TGIS.
Efectivamente antes da Lei do Orçamento de Estado para 2014 os terrenos para construção não eram abrangidos directamente na verba 28 da TGIS.
E porque o legislador não tem uma definição de prédio urbano com afectação habitacional nem a lei do Orçamento para o ano de 2014 tem carácter interpretativo há que decidir da bondade da sentença recorrida e das razões do recurso.
Porque a questão tem sido objecto de múltiplas decisões desta Secção do Contencioso Tributário do STA e não se vê razão alguma para decidir diferentemente chamamos à colação a doutrina do acórdão do STA de onde interviemos como adjunto e que passaremos a transcrever na parte que ao caso importa:

“A questão que se coloca no presente é a de saber qual o âmbito de incidência da verba nº 28.l. da Tabela Geral de Imposto de Selo (TGIS), na redacção dada pela Lei nº 55-A/2012, de 29 de Outubro, particularmente se ela inclui terrenos para construção, ou, mais precisamente, se os terrenos para construção com valor patrimonial tribunal igual ou superior a € 1.000.000 podem subsumir-se no conceito de prédios urbanos “com afectação habitacional” a que alude a referida verba.

A sentença recorrida, julgou procedente a impugnação deduzida pela ora recorrida contra o acto de liquidação de Imposto do Selo relativo a 2012, no valor de €6.572,41, anulando-o e determinando a restituição à impugnante do imposto pago acrescido de juros indemnizatórios, no entendimento de que mostrando-se provado que o prédio objecto de tributação é um terreno para construção, a liquidação enferma de vício de violação daquela verba n.º 28.1, por erro sobre os pressupostos de direito, que justifica a declaração da sua ilegalidade e anulação.

Discorda do decidido a Fazenda Pública, imputando à sentença recorrida erro de julgamento por errada interpretação e aplicação da verba 28.1 da TGIS, no entendimento segundo o qual naquela norma de incidência estão abrangidos os terrenos para construção que tenham como destino definido a construção dum edifício habitacional, como alegadamente resulta da letra da lei.
A recorrida defende a manutenção do julgado recorrido

Vejamos.

Desde já se adianta que o presente recurso não merece provimento e que a sentença deve ser confirmada pelas razões que ficaram devidamente explicitadas nos acórdãos proferidos por esta Secção no dia 9 de Abril 2014, nos processos nºs 1870/13 e 48/14, e no dia 23 de Abril de 2014, nos processos nº 270/14, 271/14 e 272/14 (Sendo que nos quatro primeiros acórdãos citados o ora relator interveio como 2º Adjunto) nos quais se decidiu que os “terrenos para construção” não podem ser considerados, para efeitos de incidência do Imposto do Selo prevista na Verba 28.1 (na redacção da Lei n.º 55-A/2012), como prédios urbanos com afectação habitacional.
Trata-se de jurisprudência que também aqui se acolhe, por com ela continuarmos a concordar integralmente, pelo que nos limitaremos a reproduzir o que sobre a questão ficou dito no referido acórdão proferido no processo nº 1870/13:

«O conceito de “prédio (urbano) com afectação habitacional” não foi definido pelo legislador. Nem na Lei n.º 55-A/2012, que o introduziu, nem no Código do IMI, para o qual o n.º 2 do artigo 67.º do Código do Imposto do Selo (igualmente introduzido por aquela Lei), remete a título subsidiário. E é um conceito que, provavelmente mercê da sua imprecisão – facto tanto mais grave quanto é em função dele que se recorta o âmbito de incidência objectiva da nova tributação -, teve vida curta, porquanto foi abandonado aquando da entrada em vigor da Lei do Orçamento do Estado para 2014 (Lei n.º 83-C/2013, de 31 de Dezembro), que deu nova redacção àquela verba n.º 28 da Tabela Geral, e que recorta agora o seu âmbito de incidência objectiva através da utilização de conceitos que se encontram legalmente definidos no artigo 6.º do Código do IMI.
Esta alteração - a que o legislador não atribuiu carácter interpretativo, nem nos parece que o tenha –, apenas torna inequívoco para o futuro que os terrenos para construção cuja edificação, autorizada ou prevista, seja para habitação se encontram abrangidos no âmbito da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (desde que o respectivo valor patrimonial tributário seja de valor igual ou superior a 1 milhão de euros), nada esclarecendo, porém, em relação às situações pretéritas (liquidações de 2012 e 2013), como a que está em causa nos presentes autos.
Ora, quanto a estas, não parece poder perfilhar-se a interpretação da recorrente, porquanto não resulta inequivocamente nem da letra, nem do espírito da lei que a intenção desta tenha sido, ab initio, a de abranger no seu âmbito de incidência objectiva os terrenos para construção para os quais tenha sido autorizada ou prevista a construção de edifícios habitacionais, como resulta hoje inequivocamente da verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo.
Da letra da lei nada de inequívoco decorre, aliás, pois ela própria ao utilizar um conceito que não definiu e que também não se encontrava definido no diploma para o qual remeteu a título subsidiário prestou-se, desnecessariamente, a equívocos, em matéria – de incidência tributária - em que a certeza e a segurança jurídica deviam também ser preocupações cimeiras do legislador.
E do seu “espírito”, apreensível na exposição de motivos da proposta de lei que está na origem da Lei n.º 55-A/2012 (Proposta de Lei n.º 96/XII – 2.ª, Diário da Assembleia da República, série A, n.º 3, 21/09/2012, p. 44, disponível em www.parlamento.pt) nada mais decorre senão a preocupação de angariar novas receitas fiscais, sobre fontes de riqueza “mais poupadas” no passado à voragem do Fisco que os rendimentos do trabalho, em particular os rendimentos de capitais, mais-valias mobiliárias e a propriedade, motivos estes que nenhum contributo relevante trazem ao esclarecimento do conceito de “prédios (urbanos) com afectação habitacional”, porquanto o dão como assente, sem preocupação alguma de o esclarecer. Tal esclarecimento terá, porém, surgido - como informado na Decisão Arbitral proferida em 12 de Dezembro de 2013, no processo n.º 144/2013-T, disponível na base de dados do CAAD -, aquando da apresentação e discussão na Assembleia da República daquela proposta de lei, nas palavras do Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que terá referido expressamente, conforme se colhe do Diário da Assembleia da República (DAR I Série n.º 9/XII – 2, de 11 de Outubro, p. 32) que: «O Governo propõe a criação de uma taxa especial sobre os prédios urbanos habitacionais de mais elevado valor. É a primeira vez que em Portugal é criada uma tributação especial sobre propriedades de elevado valor destinadas à habitação. Esta taxa será de 0,5% a 0,8% em 2012 e de 1% em 2013, e incidirá sobre as casas de valor igual ou superior a 1 milhão de euros” (sublinhados nossos), donde se colhe que a realidade a tributar tida em vista são, afinal, e não obstante a imprecisão terminológica da lei, “os prédio (urbanos) habitacionais”, em linguagem corrente “as casas”, e não outras realidades.
O facto de se poder considerar que na determinação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos classificados como terrenos para construção se deve levar em conta a afectação que terá a edificação para ele autorizada ou prevista para determinação do respectivo valor da área de implantação (cfr. os nºs 1 e 2 do artigo 45.º do CIMI), não determina que os terrenos para construção possam ser classificados como “prédios com afectação habitacional”, porquanto a afectação habitacional” surge sempre no Código do IMI referida a “edifícios” ou “construções”, existentes, autorizados ou previstos, porquanto apenas estes podem ser habitados, o que não sucede no caso dos terrenos para construção, que não têm, em si mesmos, condições para tal, não sendo susceptíveis de serem utilizados para habitação senão se e quando neles for edificada a construção para eles autorizada e prevista (mas nesse caso não serão já “terrenos para construção” mas outra espécie de prédios urbanos – “habitacionais”, “comerciais, industriais ou para serviços” ou “outros” – artigo 6.º do CIMI).
Estranho seria, aliás, que a determinação do âmbito da norma de incidência tributária da verba n.º 28 da Tabela Geral do Imposto do Selo se encontrasse, ao fim e ao cabo, nas normas de determinação do valor patrimonial tributário do Código do IMI, e que a imprecisão terminológica do legislador na redacção daquela regra fosse, afinal, elucidada e finalmente esclarecida por via de uma remissão, indirecta e equívoca, para o coeficiente de afectação estabelecido pelo legislador em relação a prédios edificados (artigo 41.º do Código do IMI).
Assim, atendendo a que um terreno para construção – qualquer que seja o tipo e a finalidade da edificação que nele será, ou poderá ser, erigida – não satisfaz, só por si, qualquer condição para como tal ser licenciado ou para se poder definir como sendo a habitação o seu destino normal, e referindo-se a norma de incidência do imposto do selo a prédios urbanos com “afectação habitacional”, sem que seja estabelecido qualquer conceito específico para o efeito, não pode dela extrair-se que na mesma se contenha uma potencialidade futura, inerente a um distinto prédio que porventura venha a ser edificado no terreno.
Conclui-se pois, em conformidade com o decidido na sentença sob recurso que, resultando do artigo 6.º do Código do IMI uma clara distinção entre prédios urbanos “habitacionais” e “terrenos para construção”, não podem estes ser considerados como “prédios com afectação habitacional” para efeitos do disposto na verba n.º 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo, na sua redacção originária, que lhe foi conferida pela Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro». (fim de citação)

Reitera-se esta jurisprudência, uma vez que a recorrente não aduz nova fundamentação que infirme a orientação jurisprudencial supra assinalada.

Conclui-se que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar a sentença recorrida.
A sentença ora sob recurso ao julgar procedente a impugnação fez uma interpretação de acordo com a jurisprudência exposta.

E essa interpretação é de confirmar.

Decisão:

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente Fazenda Pública.

Lisboa, 29 de Abril de 2015. – Fonseca Carvalho (relator) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.