Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:093/14.3BEBJA
Data do Acordão:02/08/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:JOSÉ VELOSO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROFESSOR
PROGRESSÃO
Sumário:Não é de admitir a revista se a questão suscitada desmerece tanto por não se divisar a necessidade de uma melhor aplicação do direito, como por, face aos contornos particulares do caso concreto, ela não ter vocação «universalista».
Nº Convencional:JSTA000P31918
Nº do Documento:SA120240208093/14
Recorrente:AA
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em «apreciação preliminar», na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
1. AA - autora desta acção administrativa «comum» - vem, invocando o artigo 150º do CPTA, interpor «recurso de revista» do acórdão do TCAS - de 26.10.2023 - que - indeferindo a sua «reclamação para a conferência da decisão sumária» proferida pelo Relator - negou provimento à sua apelação e confirmou o saneador-sentença do TAF de Beja - de 06.10.2019 - que julgou improcedente a acção administrativa - então dita «comum» - em que demandou o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO - então da «Educação e Ciência» - visando a correcção do índice de progressão como professora a partir de 24.06.2010, com as consequências legais em termos de retribuição e de recálculo da pensão de aposentação.

Alega que o recurso de revista deverá ser admitido em nome da «necessidade de uma melhor aplicação do direito» e em nome da «importância fundamental» da questão.

A entidade demandada - MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO - contra-alegou, defendendo, além do mais, a não admissão da revista por falta de verificação dos pressupostos legais - artigo 150º, nº1, do CPTA.

2. Dispõe o nº1, do artigo 150º, do CPTA, que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Deste preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s, no uso dos poderes conferidos pelo artigo 149º do CPTA - conhecendo em segundo grau de jurisdição - não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar: i) Quando esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental; ou, ii) Quando o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

3. A autora da acção - AA - demandou o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO pedindo ao tribunal três coisas: - que declarasse o seu direito a progredir para o índice 299 da categoria de professor a partir de 24.06.2010; - que condenasse o réu a pagar-lhe as diferenças salariais desde 24.06.2010 até à data em que comece a receber a pensão de aposentação, com juros de mora legais; - que informe a Caixa de Aposentações do novo índice para recálculo da sua pensão de aposentação.

O tribunal de 1ª instância - TAF de Beja - julgou improcedente a sua pretensão, ou seja, considerou que foi correctamente posicionada no índice 272, a partir de 24.06.2010, não lhe assistindo, pois, o pretendido direito ao índice 299, e considerou prejudicada, face a esta constatação jurídica, a apreciação dos outros dois pedidos.

O tribunal de 2ª instância - TCAN - negou provimento à apelação da autora, e confirmou integralmente o julgamento de direito efectuado na sentença aí recorrida. Após citar boa parte desta sentença, escreve-se no acórdão do tribunal de apelação o seguinte: O DL nº75/2010, de 23.06, relativo à transição de carreira docente, prevê o seguinte, no que para aqui releva: 1- Os docentes que, independentemente da categoria, se encontram posicionados nos escalões da estrutura da carreira docente prevista no DL nº15/2007, de 19.01, alterado pelo DL nº270/2009, de 30.09, transitam para a categoria de professor da nova estrutura de carreira para índice a que corresponda montante pecuniário de remuneração base idêntico ao que actualmente auferem. 2- Excepcionam-se do disposto no número anterior: a) Os docentes que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, se encontram abrangidos pelo regime transitório constante dos nºs 1, 2, 5 e 6 do artigo 10º do DL nº15/2007, de 19.01, os quais completam o tempo de serviço docente para efeitos de progressão na carreira e avaliação do desempenho aí exigido, findo o qual transitam para a nova estrutura de carreira nos seguintes escalões: i) 1º escalão para os docentes abrangidos pelos nºs 1 e 2 do artigo 10º do DL nº15/2007, de 19.01; ii) 5º escalão para os docentes abrangidos pelos nºs 5 e 6 do artigo 10º do DL nº15/2007, de 19.01, sem prejuízo das regras fixadas no Estatuto da Carreira Docente para a progressão a este escalão; b) Os docentes que, à data de entrada em vigor do presente decreto-lei, sejam detentores da categoria de professor titular, posicionados no índice 245 há mais de quatro anos e menos de cinco para efeitos de progressão na carreira, transitam para a categoria de professor da nova estrutura da carreira reposicionados no índice 272, desde que cumulativamente: i) Tenham obtido no ciclo de avaliação do desempenho de 2007-2009 no mínimo a menção qualitativa de Bom; ii) Tenham obtido na última avaliação do desempenho efectuada nos termos do Decreto Regulamentar nº11/98, de 15.05, classificação igual ou superior a Satisfaz; c) Os docentes que, à data de entrada em vigor do presente decreto-lei, estejam, independentemente da categoria, posicionados no índice 245 há pelo menos seis anos para efeitos de progressão na carreira, transitam para a categoria de professor da nova estrutura da carreira reposicionados no índice 299, desde que cumulativamente: i) Tenham obtido no ciclo de avaliação do desempenho de 2007-2009 no mínimo a menção qualitativa de Bom; ii) Tenham obtido na última avaliação do desempenho efetuada nos termos do Decreto Regulamentar nº11/98, de 15.05, classificação igual ou superior a Satisfaz. E o respectivo artigo 8º, nº1, relativo ao regime especial de reposicionamento indiciário, prevê o seguinte: Os docentes que, à data de entrada em vigor do presente decreto-lei, estejam, independentemente da categoria, posicionados no índice 245 há mais de cinco anos e menos de seis para efeitos de progressão na carreira, são reposicionados no índice 299 de acordo com as seguintes regras cumulativas: a) No momento em que perfizerem seis anos de tempo de serviço no índice para efeitos de progressão na carreira; b) Tenham obtido no ciclo de avaliação do desempenho de 2007-2009 no mínimo a menção qualitativa de Bom; c) Tenham obtido na última avaliação do desempenho efetuada nos termos do Decreto Regulamentar nº11/98, de 15.05, classificação igual ou superior a Satisfaz. Este diploma legal entrou em vigor no dia 24.06.2010, ver respectivo artigo 19º. Releva ainda que o artigo 1º, nº1, da Lei nº43/2005, de 29.08, veio impor que o tempo de serviço prestado pelos funcionários, agentes e outros trabalhadores da Administração Pública central, regional e local e pelos demais servidores do Estado entre a data de entrada em vigor da presente lei e 31.12.2006 não é contado para efeitos de progressão, em todas as carreiras, cargos e categorias, incluindo as integradas em corpos especiais. Congelamento que veio a ser prorrogado pela Lei nº53-C/2006, de 29.12, até 31.12.2007. Decorre do probatório que no dia 26.02.2004, a autora foi reposicionada no 8º escalão - índice 245 da escala indiciária da carreira docente - e no dia 01.08.2007, a autora acedeu à categoria de professora titular, mantendo-se no índice 245. Conforme já assinalado, por força da Lei nº43/2005, e da Lei nº53-C/2006, entre 30.08.2005 e 31.12.2007, o tempo de serviço da autora não é contado para efeitos de progressão. Assim, tal como consta do ponto E do probatório, o tempo de serviço da autora no referido escalão tem de ser contabilizado como segue: - entre 26.02.2004 e 31.08.2004 são de contabilizar 186 dias; - no ano lectivo de 2004/2005 são de contabilizar 363 dias [até 30.08.2005]; - no ano lectivo de 2007/2008 são de contabilizar 244 dias [a partir de 01.01.2008]; - no ano lectivo de 2008/2009 são de contabilizar 361 dias; - acresce-lhe bonificação de um ano de serviço [parte curricular do mestrado] de 365 dias; - no ano lectivo de 2009/2010 são de contabilizar 297 dias [até 24.06.2010]. Num total de 1816 dias. Vale isto por dizer que, à data de entrada em vigor do DL nº75/2010, de 23.06 [24.06.2010], a autora não contabilizava ainda cinco anos integrais de tempo de serviço total, no escalão atinente ao índice 245 da carreira docente. Era pois, à data, professora titular com mais de quatro anos e menos de cinco anos de tempo de serviço no escalão correspondente ao índice 245 da carreira, pelo que necessariamente teria de ser reposicionada no índice 272 e não no índice 299. Pelo que bem andou a decisão recorrida, ao concluir precisamente neste sentido.

De novo a autora, e apelante, discorda, e pede revista do assim decidido no acórdão do tribunal de apelação imputando-lhe «erro de julgamento de direito». Alega que foi feita errada interpretação e aplicação da lei, mormente do «artigo 7º, nº2 alínea c), do DL nº75/2010, de 23.06» que, na leitura do acórdão recorrido, deve fazer-se tomando em consideração o «congelamento das progressões» decorrente da Lei nº43/2005, de 29.08, e da Lei nº53-C/2006, de 29.12, sendo certo que a redacção da referida norma apenas toma em consideração o facto de o funcionário estar há pelo menos 6 anos no índice 245, independentemente, alega, de a progressão do mesmo para o subsequente estar ou não congelada.

Compulsados os autos, importa apreciar «preliminar e sumariamente», como compete a esta Formação, se estão verificados os «pressupostos» de admissibilidade do recurso de revista - referidos no citado artigo 150º do CPTA - ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica ou social» assume «importância fundamental», ou se a sua apreciação por este Supremo Tribunal é «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

Ora, cumprirá ressaltar, à cabeça, que os dois tribunais de instância foram «unânimes» na decisão proferida, bem como na sua respectiva fundamentação, o que, obviamente, sem garantir a correcção do assim julgado, não deixa de constituir «sinal relevante» do seu aparente acerto. Dois tribunais, quatro juízes, convergiram num mesmo sentido, e fizeram-no, diga-se, alicerçados «numa análise jurídica dos factos provados» e «numa interpretação e aplicação do regime jurídico chamado a intervir» que se mostra lógica, coerente, sem contradições e sem erros manifestos, e, enquanto tal, justificativos da admissão da revista em nome da «clara necessidade de melhor aplicação do direito». E acrescente-se que as alegações de revista, que insistem no julgamento de procedência das pretensões da autora, não se mostram suficientemente convincentes, e, portanto, capazes de fazer sucumbir a fundamentação levada à decisão unânime das instâncias. Também não se evidencia - atentos os concretos contornos da factualidade apurada nos autos - qualquer conflito com jurisprudência existente nos tribunais superiores da jurisdição.

Ademais, admitir este recurso seria abrir uma 3ª instância, o que não é permitido pela lei, sendo certo que a «questão» que a recorrente pretende continuar a debater não se perfila de importância fundamental em termos de relevância jurídica ou social.

Importa, pois, manter a regra da excepcionalidade dos recursos de revista, e recusar a admissão do aqui interposto por AA.

Nestes termos, e de harmonia com o disposto no artigo 150º do CPTA, acordam os juízes desta formação em não admitir a revista.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 8 de Fevereiro de 2024. – José Veloso (relator) – Teresa de Sousa – Fonseca da Paz.