Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0263/13.1BEMDL
Data do Acordão:04/11/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:TERESA DE SOUSA
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PETIÇÃO INICIAL
CONVITE
APERFEIÇOAMENTO
Sumário:Justifica-se admitir revista na qual se discute se devia ter havido lugar ao convite ao aperfeiçoamento da petição inicial, após no saneador se ter julgado improcedente a excepção da respectiva ineptidão, por ser questão de inegável relevância jurídica e capacidade expansiva, revestindo, como tal, importância fundamental.
Nº Convencional:JSTA000P32127
Nº do Documento:SA1202404110263/13
Recorrente:MUNICÍPIO DE MOGADOURO
Recorrido 1:A..., SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo

1. Relatório
Município de Mogadouro, Réu nos autos em que foi demandado por A..., SA (doravante A...), pedindo a respectiva condenação a pagar-lhe “a quantia de 161 215,22 (cento e sessenta e um mil, duzentos e quinze euros e vinte e dois cêntimos), valor acrescido dos competentes juros de mora, no valor de € 13 039,00 (treze mil e trinta e nove euros) …”, referente à prestação de serviços de saneamento e fornecimento de água pela A. ao Réu, vem interpor recurso de revista do acórdão proferido pelo TCA Norte em 30.11.2023, no qual se decidiu
conceder provimento ao recurso e anular a sentença recorrida.
O Réu interpõe o presente recurso de revista alegando que a situação sub judice se reveste de importância fundamental, visando uma melhor aplicação do direito.

Em contra-alegações, a Recorrida defende que a revista não deve ser admitida ou deve improceder.

2. Os Factos
Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. O Direito
O art. 150º, nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de uma importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Como resulta do próprio texto legal, e a jurisprudência deste STA tem repetidamente sublinhado, trata-se de um recurso excepcional, como, aliás, o legislador sublinhou na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando o preceito como uma “válvula de segurança do sistema”, que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

O TAF de Mirandela no despacho saneador proferido em 25.01.2017 julgou improcedente a excepção de ineptidão da petição inicial suscitada na contestação do R. Município.
Na sentença que proferiu em 30.06.2021, julgou a acção improcedente, tendo absolvido o Réu Município do pedido.

O TCA Norte, para o qual Autora apelou, pelo acórdão recorrido teve em atenção que o TAF julgara expressamente improcedente a excepção dilatória de ineptidão da p.i., tendo o despacho sobre essa questão transitado em julgado, operando caso julgado formal, tornando-se, por isso obrigatória essa decisão dentro do processo.
Expendeu, por isso, o seguinte: “Daí que, à data da prolação da sentença recorrida, por força do princípio do esgotamento do poder jurisdicional consequente ao proferimento da decisão em que julgou improcedente a exceção dilatória da ineptidão da p.i., de onde deriva, necessariamente, o entendimento que a apelante na p.i. tinha alegado todos os factos essenciais integrativos da causa de pedir por si eleita e de onde faz derivar o pedido a obter a condenação do réu a pagar-lhe a quantia que dele reclama, o Tribunal a quo encontrava-se impedido de julgar a ação improcedente por falta de alegação de factos essenciais integrativos dessa causa de pedir, sob pena de entrar em contradição frontal com o que anteriormente fora decidido.
Por conseguinte, ao julgar improcedente aquela exceção o Tribunal julgou que a autora alegou todos os factos essenciais integrativos dessa causa de pedir, pelo que a sentença sob sindicância apenas poderia ter concluído que a facticidade atinente às ditas Cláusulas Terceiras, de ambos os contratos, estava alegada nequele articulado inicial mas de forma imprecisa ou insuficiente.
Entendeu, assim, que o Tribunal devia ter convidado a Autora a aperfeiçoar a sua petição, atento o disposto no art. 590º, nºs 2, al. b) e 4 do CPC, e art. 87º, nºs 1, al. b), 2 e 3 do CPTA.
Assim, o acórdão recorrido decidiu conceder provimento ao recurso, anular a sentença recorrida, determinando a baixa dos autos à 1ª instância para ser formulado convite à A. para, querendo, concretizar a facticidade em falta, no prazo assinalado. E, sendo aceite o convite, “após decurso do prazo do contraditório que assiste ao apelado, e de se facultar às partes a possibilidade de apresentarem meios de prova quanto à matéria de facto que venha a ser concretizada, determina-se à 1.ª instância que reabra a audiência final estritamente limitada à facticidade que venha a ser aditada, e produza prova em relação à mesma, seguindo-se após a prolação de nova sentença.”

Na sua revista o Recorrente invocou que o acórdão recorrido teria incorrido em erro de julgamento ao considerar, contrariamente ao que defende o Recorrente, que se está perante caso julgado formal e que, por isso, o Tribunal a quo não estava impedido de decidir nos termos em que o fez. E que o acórdão recorrido teria incorrido em manifesto erro de aplicação do direito, efectuando uma incorrecta interpretação do art. 620º do CPC e art. 87º, nºs 1, al. b) e 3 do CPTA.
Pese embora, o acórdão recorrido esteja consistentemente fundamentado, tudo indicando estar em consonância com a jurisprudência que indica e com a doutrina mais autorizada, o certo é que a questão que se pretende discutir na revista tem inegável relevância jurídica e capacidade de se repetir, revestindo, como tal, importância fundamental.
Assim é de toda a conveniência que este Supremo Tribunal sobre ela se debruce com vista a uma melhor dilucidação da mesma, justificando-se admitir a revista.

4. Decisão
Pelo exposto, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Lisboa, 11 de Abril de 2024. – Teresa de Sousa (relatora) – José Veloso – Fonseca da Paz.