Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
645/12.6TVLSB.L1.S1
Nº Convencional: 2ª SECÇÃO
Relator: MARIA DA GRAÇA TRIGO
Descritores: DIREITO DE REGRESSO
PRESCRIÇÃO
INÍCIO DA PRESCRIÇÃO
SEGURADORA
INDEMNIZAÇÃO
CUMPRIMENTO
PAGAMENTO
DUPLA CONFORME
RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
FUNDAMENTOS
ÓNUS DE IMPUGNAÇÃO ESPECIFICADA
TRÉPLICA
ACIDENTE DE VIAÇÃO
SEGURO AUTOMÓVEL
Data do Acordão: 05/19/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática:
DIREITO CIVIL - DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / FONTES DAS OBRIGAÇÕES / RESPONSABILIDADE CIVIL / PRESCRIÇÃO DO DIREITO DE INDEMNIZAÇÃO.
DIREITO DOS SEGUROS - SEGURO OBRIGATÓRIO DE RESPONSABILIDADE CIVIL AUTOMÓVEL.
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / ARTICULADOS / RECURSOS / RECURSO DE REVISTA / DECISÕES QUE ADMITEM REVISTA.
Doutrina:
- Antunes Varela, Direito das Obrigações, 2000, 667.
Legislação Nacional:
CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 498.º, N.ºS 2 E 3.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGOS 590.º, 503.º.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (NCPC): - ARTIGO 671.º, N.º3.
D.L. N.º 522/85, DE 31-12: - ARTIGO 1.º, N.º1.
LEI N.º 100/97, DE 13 DE SETEMBRO: - ARTIGO 31.º, N.º 4.
Legislação Comunitária:
DIRECTIVA N.º 72/166 DO CONSELHO: - ARTIGO 3.º, N.º1.
Jurisprudência Nacional:
ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:

-DE 28/11/2013, PROC. N.º 106/11.0TBCPV.P1.S1, E DE 07/05/2015, PROC. N.º 15698/04.2YYLSB-C.L1.S1.
-DE 04/11/2008, PROC. N.º 08A3119, DE 27/10/2009, PROC. N.º 844/07.2TBOER.L1, DE 04/11/2010, PROC. N.º 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, 16/11/2010, PROC. N.º 2119/07.8TBLLE.E1.S1, DE 17/11/2011, PROC. N.º 1372/10.4T2AVR.C1.S1, DE 29/11/2011, PROC. N.º 1507/10.7TBPNF.P1.S1, DE 06/12/2011, PROC. N.º 797/07.7TBVCD.P1.S1 E DE 18/10/2012, PROC. N.º 56/10.8TBCVL-A. C1.S1, CONSULTÁVEIS EM WWW.DGSI.PT ; E AINDA, RELATIVAMENTE A SITUAÇÕES DE SUB-ROGAÇÃO LEGAL NO DIREITO DO LESADO, NOS ACÓRDÃOS DE 05/06/2012, PROC. Nº 32/09.3TBSRQ.L1.S1, DE 07/05/2014, PROC. N.º 8304/11.0T2SNT-AL1.S1, CONSULTÁVEIS EM WWW.DGSI.PT, E DE 03/12/2015, PROC. Nº 11173/12.0TBVNG.P1.S1, IN SUMÁRIOS, WWW.STJ.PT .
-DE 07/04/2011, PROC. N.º 329/064TBAGN.C1.S1, WWW.DGSI.PT ,
DE 04/11/2010, PROC. N.º 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, WWW.DGSI.PT .
Sumário :
I - O alargamento do prazo de prescrição previsto no n.º 3 do art. 498.º do CC não é aplicável ao prazo de prescrição do direito de regresso invocado pela seguradora – de três anos, segundo o n.º 2 do mesmo preceito –, por ser um direito novo, distinto do direito de indemnização do lesado, que não corresponde, em termos directos e imediatos, a uma situação de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

II - No caso de sucessão de actos de pagamento efectuados pela seguradora, o “dies a quo” da contagem do prazo de prescrição de três anos, referido em I, situa-se na data do último acto de pagamento de cada “núcleo indemnizatório autónomo identificado e juridicamente diferenciado”, em função de critérios funcionais e temporais.

III - A dupla conformidade relevante respeita à decisão e não aos seus fundamentos.

IV - Decidindo as instâncias, coincidentemente, absolver do pedido a interveniente seguradora, existe dupla conforme – art. 671.º, n.º 3, do CPC – obstativa do conhecimento, quanto a esta, do recurso subordinado interposto pela ré.

V - Não cumpre o ónus de impugnação a que alude o art. 490.º do CPC, anterior ao NCPC, a ré que, no articulado tréplica, não impugna os novos factos nem os documentos apresentados pela autora na réplica, pelo que se deve dar como assente que a cláusula 4.ª, al. f), das condições gerais do contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade – que prevê a exclusão de responsabilidade por “danos decorrentes de acidentes de viação e/ou provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro (…)” –, foi comunicada pela ré à autora e aceite por esta.

VI - O embate ocorrido numa via de acesso reservado, causado pela força motriz do veículo rebocador que, em virtude do gancho de encaixe se haver partido, atirou o reboque de encontro ao veículo conduzido pela vítima, deve qualificar-se como acidente de viação, nomeadamente, para efeitos de aplicação da cláusula referida em V.

VII - Excluída a responsabilidade referida em V, o sinistro mencionado em VI apenas poderia estar a coberto do seguro de responsabilidade civil automóvel (nos termos do art. 1.º, n.º 1, do DL n.º 522/85, de 31-12, em vigor à data do acidente).

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



1. AA Seguros, S.A., instaurou acção contra BB, CC - Sociedade Técnica de Limpezas, S.A., e DD Portugal, S.A., pedindo que sejam os RR. solidariamente condenados a pagar à A. a quantia de € 38.126,06, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, bem como de todos os montantes que a A. futuramente liquidar a EE, na sua qualidade de seguradora do acidente de trabalho, simultaneamente de viação, ocorrido na placa do aeroporto de Lisboa, que envolveu o veículo conduzido pela vítima e um atrelado que se soltou de veículo locado à R. CC, S.A., conduzido pelo R. BB, e seguro na R. DD, S.A.

O R. BB contestou: por excepção, invocando prescrição do direito da A., e ilegitimidade passiva; e por impugnação.

A R. DD, S.A., contestou: por excepção, invocando ilegitimidade, por na actividade de regularização de sinistros, ter actuado em representação da FF, e invocando a não cobertura do acidente dos autos pela apólice; e por impugnação.

A R. CC, S.A., contestou: por excepção, invocando prescrição do direito da A., e, supletivamente, ser a própria A. responsável pelo pagamento das quantias peticionadas devido à existência de contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade, celebrado entre A. e R.; e por impugnação. Requereu, a final, a intervenção principal provocada de GG Companhia de Seguros, S.A.., com a qual a R. CC celebrou um outro contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade; e de FF, em cuja representação a R. DD, S.A. alega ter actuado ao celebrar o contrato de seguro de responsabilidade civil pela utilização do veículo causador do acidente.

A A. replicou, pedindo que as excepções invocadas pelos RR. sejam julgadas improcedentes, e requerendo a intervenção principal provocada da FF e do Fundo de Garantia Automóvel.

Foi admitida a intervenção principal da GG Companhia de Seguros, S.A.., da FF e do Fundo de Garantia Automóvel. Os Intervenientes contestaram.

Por despacho saneador de fls. 466, foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelo R. BB e foram julgadas partes ilegítimas e absolvidos da instância a R. DD Portugal, S.A., e o Interveniente Fundo de Garantia Automóvel.

A A. requereu a ampliação do pedido no valor de € 7.743,38. A ampliação foi admitida e foi exercido o direito ao contraditório.

A fls. 803, foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente nestes termos:

“- condeno os RR BB e CC - Sociedade Técnica de Limpezas SA a pagar à A. a quantia de € 45.870,44, acrescida dos juros de mora vencidos desde a data de citação dos mesmos, à taxa de 4% ao ano e vincendos a esta mesma taxa e até integral pagamento, absolvendo os RR em causa do mais que era peticionado;

- absolvo as Intervenientes FF, Limited e GG - Companhia de Seguros SA do pedido contra as mesmas formulado.”

Inconformados, apelaram os RR. CC - Sociedade Técnica de Limpezas, S.A., e BB.

Por acórdão de fls. 925, foi julgada parcialmente procedente a apelação da R. CC, S.A., e improcedente a apelação do R. BB, aproveitando-lhe, porém, a apelação interposta por aquela, e em consequência, alterando-se a sentença recorrida, decidiu-se:

a) Condenar solidariamente os RR. BB e CC -Sociedade Técnica de Limpezas, S.A,. a pagarem à A. AA Seguros, S.A.., a quantia de € 2.914,99, acrescida de juros de mora à taxa legal que está fixada em 4% ao ano, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento, e a quantia de € 7.131,12, acrescida de juros de mora à referida taxa, vencidos desde a data da notificação do requerimento de ampliação do pedido até integral pagamento, absolvendo-os do mais que era pedido;

b) Manter a absolvição das Intervenientes FF e GG - Companhia de Seguros, S.A.


2. A A. AA Seguros, S.A.., recorre para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões:

1. Atenta a factualidade provada nos autos, não se encontra[m] prescritos quaisquer pagamentos efectuados pela Apelante no âmbito do presente processo.

2. Da posição estribada no texto do Douto Acórdão resulta a ideia de que o legislador aquando da criação do normativo constante do art. 498°, n3 do CC, não usou a melhor técnica legislativa possível não se tendo sabido expressar convenientemente.

3. O art. 498°, n° 3 do CC aplica-se a todas as situações incluídas dentro do Livro das Obrigações, Secção V, subsecção I.

4. O legislador quis conceder a qualquer lesado e aqui a Apelante é lesada, uma prorrogação do prazo prescricional quando o responsável civil tenha praticado um acto que além de ilícito é criminalmente enquadrável.

5. Temos de partir do princípio interpretativo que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados (art.º 9º, n.° 3, do Cód. Civil), e que ao introduzir a disposição constante [do] n.° 3, pretende aplicá-la tanto ao n°1 como ao n°2.

6. Sustentar a não aplicação do alongamento do prazo de prescrição consagrado no n° 3 do art. 498° na natureza do pedido, considerando-o como um pedido diferente de uma indemnização por danos é sufragar um entendimento que não tem qualquer concordância no ordenamento jurídico português.

7. Não tivesse havido dano e não se chegaria sequer à questão da prescrição.

8. A Apelante teve de facto e de direito um dano, dano esse que merece tanto a tutela do direito como o dano sofrido pelo lesado, sob pena de por via de uma interpretação jurisprudencial se afastarem os normativos legais, criando entidades com mais e menos direitos perante a Lei.

9. A obrigação da Apelante tem como origem a ocorrência de um sinistro e todas elas derivam desse mesmo facto, razão pela qual, em termos reais, estamos perante uma única prestação, faseada e protelada ao longo do tempo.

10. Ainda que os pagamentos ao sinistrado tenham tido início em 2007, a obrigação da Apelante é única, ainda que fraccionada, uma vez que legalmente tem que proceder ao pagamento das várias prestações devidas, encontrando-se o seu pagamento diferido no tempo não só pela sua natureza mas também por imposição legal.

11. Não se encontrando o sinistrado, à data da propositura da presente acção, completa e definitivamente ressarcido de todos os danos ocasionados com o presente sinistro, ainda não se iniciou a contagem do prazo de prescrição do direito da Apelante uma vez que a sua obrigação ainda não cessou.

12. O douto Acórdão ora recorrido viola o disposto nos artigos 9º, n° 3 e 498° do Código Civil.

NESTES TERMOS e nos melhores de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, nos termos e pelos fundamentos supra expostos, revogando-se o Douto Acórdão recorrido, substituindo-se o mesmo por outra decisão que respeite a correcta aplicação dos normativos que subsumem a essência fáctica do caso dos autos.


A R. CC, S.A., contra-alegou:

(i) Invocando a excepção de caso julgado quanto à não aplicação do prazo de prescrição de cinco anos do nº 3, do art. 498º, do Código Civil, uma vez que a A. AA Seguros não apelou, em recurso subordinado, da decisão de não aplicação deste prazo contida na sentença da 1ª Instância;

(ii) Se assim não se entender, invocando a verificação de dupla conforme quanto à decisão da questão enunciada em (i);

(iii) Subsidiariamente, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido, na parte em que lhe é favorável.


A mesma R. CC interpôs recurso subordinado, formulando as seguintes conclusões:

1.ª CONHECENDO-SE DO MÉRITO DO RECURSO PRINCIPAL INTENTADO PELA AUTORA AA, DEVERÁ IGUALMENTE CONHECER-SE DO MÉRITO DO PRESENTE RECURSO SUBORDINADO;

2.ª 0 PRESENTE RECURSO SUBORDINADO TEM COMO OBJETO OS PONTOS DA DECISÃO DE DIREITO CONSTANTES DO DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO RELATIVAMENTE AOS QUAIS NÃO FOI CONSIDERADA PROCEDENTE A APELAÇÃO DA RECORRENTE CC, MAIS PRECISAMENTE SOBRE SE O SINISTRO ESTAVA OU NÃO COBERTO PELOS CONTRATOS DE SEGURO CELEBRADOS ENTRE A ENTÃO APELANTE E A APELADA AA E ENTRE A APELANTE E A INTERVENIENTE GG, RESPETIVAMENTE, PARA O AEROPORTO DE LISBOA;

3.ª AO CONTRÁRIO DO QUE SE PRECONIZA NA DOUTA DECISÃO RECORRIDA, O ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA DA COMUNICAÇÃO E ACEITAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS CORRESPONDENTES ÀS CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS DOS ALUDIDOS CONTRATOS DE SEGURO DA ATIVIDADE DE ASSISTÊNCIA EM ESCALA INCUMBIA A QUEM INVOCOU O CONTEÚDO DESSAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS, MAIS PRECISAMENTE DAS RESPETIVAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO DO SEGURO;

4ª COM TODO O RESPEITO POR DIFERENTE ENTENDIMENTO, NÃO ERA À ORA RECORRENTE QUE INCUMBIA O ÓNUS DE INVOCAR E DEMONSTRAR A SUA VINCULAÇÃO ÀS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS PELA RECORRIDA AA E PELA INTERVENIENTE GG;

5.ª AO PRECONIZAR QUE TAL ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA INCUMBIA À SEGURADA CC, A DOUTA DECISÃO RECORRIDA VIOLOU OU NÃO DEU DEVIDA APLICAÇÃO ÀS REGRAS SOBRE REPARTIÇÃO DOS ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA, DESCONSIDERANDO O DISPOSTO NO ARTIGO 5.°, N.° 1, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E O ARTIGO 342.°, N.° 1 E 2, DO CÓDIGO CIVIL E OS ARTIGOS 1.°, N.° 3 E 5.°, N.° 3, DO DECRETO-LEI N.° 446/85, DE 25 DE OUTUBRO;

6.ª FORAM AS SEGURADORAS ACIMA REFERIDAS QUE INVOCARAM AS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO CONSTANTES DAS ALEGADAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS, PELO QUE LHES INCUMBIA O ÓNUS DE PROVAR A COMUNICAÇÃO E ACEITAÇÃO DESSAS CLÁUSULAS PELA RECORRENTE CC, O QUE NÃO FIZERAM;

7.ª A ORA RECORRENTE ALEGOU QUE OS SINISTROS EM CAUSA ESTAVAM COBERTOS PELOS SEGUROS EM APREÇO, PELO QUE NÃO TINHA DE INVOCAR, NOS INCIDENTES DE INTERVENÇÃO DEDUZIDOS NA SUA CONTESTAÇÃO OU EM QUALQUER OUTRO MOMENTO PROCESSUAL, A NÃO COMUNICAÇÃO OU ACEITAÇÃO DAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS PELAS SEGURADORAS ACIMA IDENTIFICADAS;

8.ª A RECORRENTE NÃO TINHA O ÓNUS DE RESPONDER AO ALEGADO NA RÉPLICA DA AUTORA AA;

9.ª A RECORRENTE TAMBÉM NÃO TINHA O ÓNUS DE RESPONDER AO ALEGADO NA CONTESTAÇÃO DA INTERVENIENTE GG;

10.ª É TOTALMENTE IRRELEVANTE QUE A ORA RECORRENTE NÃO TENHA IMPUGNADO OS DOCUMENTOS QUE CONSTITUEM AS DITAS CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS JUNTAS AOS AUTOS POR AQUELAS SEGURADORAS POIS QUE TAIS DOCUMENTOS NADA DEMONSTRARAM ACERCA DA REALIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO E DA ACEITAÇÃO DE TAIS ALEGADAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO PELA RECORRENTE;

11.ª NENHUMA DAS SEGURADORAS ACIMA REFERIDAS JUNTOU AOS AUTOS A PROPOSTA DE SEGURO OU APRESENTOU, COMO LHE COMPETIA, QUALQUER OUTRO DOCUMENTO OU PROVA DE QUE A RECORRENTE TOMOU CONHECIMENTO E ACEITOU AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS CONTENDO AS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS

12.ª NA SUA CONTESTAÇÃO, A RECORRENTE ALEGOU APENAS A CELEBRAÇÃO DOS CONTRATOS DE SEGURO DE RESPONSABILIDADE CIVIL EM CAUSA, PARA DEMONSTRAR QUE TRANSFERIU A SUA RESPONSABILIDADE OBJETIVA NO SINISTRO EM CAUSA PARA A PRÓPRIA AUTORA E PARA A INTERVENIENTE;

I3.ª NÃO ERA À RECORRENTE QUE CABIA ALEGAR E PROVAR A NÃO COMUNICAÇÃO E ACEITAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS E ESPECIAIS QUE NÃO INVOCOU;

14.ª TENDO A ORA RECORRENTE ALEGADO QUE O SINISTRO ESTAVA COBERTO PELOS SEGUROS DE RESPONSABILIDADE CIVIL CELEBRADOS COM AS SEGURADORAS EM APREÇO, ACABOU POR NÃO SE CONSIDERAR VINCULADA ÀS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS PELA AUTORA E PELA INTERVENIENTE;

15.ª ACRESCE QUE A FALTA DE IMPUGNAÇÃO DOS DOCUMENTOS ONDE ALEGADAMENTE CONSTAM AS CONDIÇÕES GERAIS E ESPECIAIS DAS APÓLICES POR PARTE DA RECORRENTE ACARRETA APENAS QUE SEJA CONSIDERADO COMO PROVADO O TEOR DO DOCUMENTO EM CAUSA E NADA MAIS;

16.ª DAÍ NÃO PODE, POIS, INFERIR-SE, COMO ERRADAMENTE SE INFERE NA DOUTA DECISÃO RECORRIDA, QUE FICOU DEMONSTRADA A EXISTÊNCIA DE COMUNICAÇÃO E ACEITAÇÃO DAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS PELAS COMPANHIAS DE SEGURO EM APREÇO, O QUE SEMPRE TERIA DE SER DEMONSTRADO ATRAVÉS DE OUTROS ELEMENTOS DE PROVA ADICIONAIS, O QUE NÃO FOI FEITO POR NENHUMA DELAS;

17.ª OS DOCUMENTOS APRESENTADOS PELA AUTORA AA E PELA INTERVENIENTE GG NÃO SE ENCONTRAM ASSINADOS PELA RECORRENTE, NEM A SUA JUNÇÃO AOS AUTOS FOI ACOMPANHADA DE QUALQUER OUTRO DOCUMENTO QUE DEMONSTRE QUE MESMAS FORAM COMUNICADAS E ACEITES PELA SEGURADA;

18.ª NEM A RECORRIDA AA NEM A INTERVENIENTE GG JUNTARAM AOS AUTOS QUALQUER DOCUMENTO OU PROPOSTA ASSINADA PELA RECORRENTE DA QUAL CONSTE QUE ESTA SE VINCULOU ÀS CLÁUSULAS GERAIS E ESPECIAIS CITADAS NOS RESPETIVOS ARTICULADOS E, COMO TAL, ÀS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO RESPETIVAMENTE INVOCADAS;

19.ª ORA, PARA QUE AS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO EM APREÇO PUDESSEM CONSIDERAR-SE INCLUÍDAS NOS CONTRATOS DE SEGURO CHAMADOS À LIÇA, ERA NECESSÁRIA A DEMONSTRAÇÃO DA SUA COMUNICAÇÃO E ACEITAÇÃO PELA RECORRENTE, O QUE NÃO SUCEDEU;

20.ª RAZÃO PELA QUAL, TAL COMO SE SUSTENTOU EM SEDE DE APELAÇÃO, TAIS CLÁUSULAS DEVEM CONSIDERAR-SE EXCLUÍDAS DOS CONTRATOS DE SEGURO ACIMA REFERIDOS, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS;

21.ª ERROU, ASSIM, O TRIBUNAL RECORRIDO AO MANTER A APLICAÇÃO DAS CLÁUSULAS DE EXCLUSÃO INVOCADAS PELAS PREDITAS COMPANHIAS DE SEGURO E AO CONSIDERAR QUE O SINISTRO NÃO SE ENCONTRA COBERTO PELOS CONTRATOS DE SEGURO INVOCADOS PELA RECORRENTE;

22.ª IMPUNHA-SE E IMPÕE-SE, DESTE MODO, UMA DECISÃO INVERSA DA RECORRIDA, JULGANDO-SE O RESSARCIMENTO DAS INDEMNIZAÇÕES DECORRENTES DO SINISTRO OCORRIDO COBERTO PELOS SEGUROS DE RESPONSABILIDADE CIVIL CELEBRADOS ENTRE A RECORRENTE E AS COMPANHIAS DE SEGUROS ACIMA REFERIDAS, INCLUINDO AS INDEMNIZAÇÕES E DEMAIS QUANTIAS COMPROVADAMENTE DEVIDAS AO SINISTRADO EE;

23.ª SEM CONCEDER, AINDA QUANTO À RECORRIDA AA, SEMPRE SE DIRÁ QUE AS RESPETIVAS CONDIÇÕES PARTICULARES ESPECIAIS - CLÁUSULA 30.ª - DÃO PLENA COBERTURA AO SINISTRO EM APREÇO, POR INCLUÍREM, SEM QUALQUER RESTRIÇÃO OU DISTINÇÃO, O RISCO DE UTILIZAÇÃO DE MÁQUINAS PELA RECORRENTE NO AEROPORTO DE LISBOA;

24.ª AO CONTRÁRIO DO QUE SE PRECONIZA NO DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO, O VEÍCULO (REBOQUE) EM APREÇO NÃO PODE DEIXAR DE SER CONSIDERADO UMA MÁQUINA, NA MEDIDA EM QUE É UM VEÍCULO E, COMO TAL, UM EQUIPAMENTO DOTADO DE MECANISMOS QUE LHE CONFEREM A POSSIBILIDADE DE TRANSITAR ATRELADO A UM VEÍCULO A MOTOR E, IN CASU, CARREGAR LIXO;

25.ª NÃO SENDO FEITA QUALQUER DISTINÇÃO NAS CLÁUSULAS PARTICULARES ESPECIAIS APLICÁVEIS AO CONTRATO DE SEGURO EM APREÇO, A MENÇÃO À "UTILIZAÇÃO DE MÁQUINAS" SÓ PODE SER LIDA NO SENTIDO DE ABRANGER NECESSARIAMENTE O USO INDISTINTO DE TODO E QUALQUER MEIO/ENGENHO UTILIZADO PELA RECORRENTE NO EXERCÍCIO DA SUA ATIVIDADE, COMO É O CASO DO REBOQUE EM CAUSA;

26.ª COMO TAL, COM TODO O RESPEITO POR OPINIÃO DIVERSA, MESMO QUE SE CONSIDERASSE A RECORRENTE COMPROVADAMENTE VINCULADA ÀS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS INVOCADAS PELA RECORRIDA (NO QUE NÃO SE CONCEDE), O SEGURO EM CAUSA SEMPRE CONTEMPLARIA, NAS SUAS CONDICÕES ESPECIAIS PARTICULARES, A COBERTURA DO RISCO DECORRENTE DA UTILIZAÇÃO DOS ENGENHOS NECESSÁRIOS AO ATIVIDADE DA RECORRENTE NO AEROPORTO DE LISBOA, COMO É O CASO DO REBOQUE/ATRELADO DE RECOLHA DE LIXO EM AERONAVES EM APREÇO, DERROGANDO O QUE CONSTA DAQUELAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS;

27.ª TAIS CONDIÇÕES ESPECIAIS PARTICULARES (QUE INCLUEM O RISCO DE UTILIZAÇÃO DE MÁQUINAS – SEM QUALQUER DIFERENCIAÇÃO OU LIMITAÇÃO), PREVALECEM SOBRE AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS GERAIS E, COMO TAL, PREVALECEM SOBRE A CLÁUSULA DE EXCLUSÃO INVOCADA PELA RECORRIDA AA - CFR., NESTE SENTIDO, O DOUTO ACÓRDÃO DESSE VENERANDO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 4 DE DEZEMBRO DE 2014 (PROCESSO N.° 919/13.9TVLSB.L1.S1, DISPONÍVEL WWW.DGSI.PT);

28.ª TEMOS, ASSIM, QUE, COMO DECORRE DAS ANTEDITAS CONDIÇÕES ESPECIAIS PARTICULARES, O CONTRATO DE SEGURO EM APREÇO (CELEBRADO ENTRE A RECORRENTE E A RECORRIDA AA) INCLUÍA A COBERTURA DOS DANOS CAUSADOS PELA UTILIZAÇÃO DE MÁQUINAS PELA SEGURADA, COMO É O CASO DA UTILIZAÇÃO DO REBOQUE EM APREÇO QUE ERA FEITA PELA RECORRIDA NO MOMENTO E NO LOCAL EM QUE OCORREU O SINISTRO.

 

A AA Seguros contra-alegou em relação ao recurso subordinado da R. CC, SA, formulando as seguintes conclusões:

1. Foi a Recorrente que na sua Contestação chamou à colação o contrato de seguro celebrado com a Recorrida.

2. A Recorrente, tendo essa possibilidade, não treplicou, não alegando que as Condições gerais e especiais da apólice não lhe haviam sido comunicadas ou aceites, nem tampouco impugnou o teor da mesma quando juntas ao processo.

3. Competia então à Recorrente, então Contestante, apresentar na sua Tréplica a defesa que só agora em sede de recurso veio alegar.

4. Não há nenhuma presunção de que num contrato de adesão as condições ou cláusulas do mesmo não são comunicadas, negociadas e aceites.

5. Só após tal alegação em contrario é que o ónus se inverte e passa a ser a parte que quer prevalecer-se do seu conteúdo, quem tem de provar que tais cláusulas foram comunicadas, negociadas e aceites.

6. A Recorrente não alegou o desconhecimento e aceitação das Condições Gerais e Especiais, como, quando confrontada com as mesmas, não impugnou o seu teor, valendo tal omissão como um reconhecimento, pelo menos processual, de que o conhecia.

7. A questão da cláusula de exclusão ser ou não aplicável ao presente sinistro já foi alvo de duas decisões concordantes, uma vez que tanto a sentença do Tribunal de 1° Instância como o Acórdão do Tribunal " a quo" decidiram pela aplicabilidade da cláusula de exclusão ao presente sinistro. Tais decisões, por serem concordantes tornam a presente revista inadmissível nos termos do disposto no art. 671°, n° 3 do NCPC. DUPLA CONFORME

8. De todo o modo e em jeito de conclusão sempre se dirá que tal questão, a da exclusão ser ou não aplicável ao presente sinistro já foi alvo de duas decisões concordantes, uma vez que tanto a sentença do Tribunal de 1ª Instância como o Acórdão do Tribunal " a quo" decidiram pela aplicabilidade da cláusula de exclusão ao presente sinistro. DUPLA CONFORME

9. Nos termos do disposto no art. 671°, n° 3 do NCPC a presente revista não pode ser admitida. DUPLA CONFORME

10. A Recorrente não alegou nunca nenhum facto que caracteriza o reboque em causa como uma máquina, nem tal matéria poderá ser apreciada nesta Douta Instância.


A Interveniente GG, S.A., contra-alegou, invocando a ocorrência de dupla conforme quanto à sua absolvição.

O R. BB não contra-alegou.


Cumpre decidir.


3. Vem provado o seguinte:


1 - A A. exerce a indústria de seguros em vários ramos;

2 - No exercício da sua actividade, a mesma celebrou com a HH Portugal Serviços de Catering, Lda, um contrato de seguro do ramo de Acidentes de Trabalho, titulado pela Apólice n° 64/…47;

3 - Nos termos do contrato referido em 2-, a A. assumiu a Responsabilidade Civil emergente de acidentes de trabalho sofridos pelos trabalhadores por conta da HH Portugal Serviços de Catering, Lda, onde se inclui EE;

4 - No dia 12 de Setembro de 2007, cerca das 21h 55m, ocorreu um embate no caminho de circulação entre a placa Alfa e a placa Juliete, no Aeroporto de Lisboa, lado Ar, entre o veículo de matrícula …-…-XU, conduzido por EE, trabalhador da HH e o reboque do lixo que estava acoplado ao veículo de matrícula …-EE-…, conduzido pelo R. BB;

5 - Por documento outorgado em 13 de Agosto de 2007, intitulado "Contrato de Aluguer e Administração" II Portugal - Comércio e Aluguer de Automóveis e Equipamentos, Lda, declarou dar em locação à R. CC - Sociedade Técnica de Limpezas, SA, o veículo de matrícula …-EE-…, pelo prazo de 36 meses e com início em 13/08/2007, tendo a R. em causa declarado que aceitava a locação;

6 - Consta da proposta enviada à II Portugal - Comércio e Aluguer de Automóveis e Equipamentos, Lda, para efeitos da celebração do contrato de aluguer, proposta essa que esta veio a aceitar, que o veículo a que veio a ser atribuída a matrícula …-EE-… tinha como equipamento opcional estofos em napa e pirilampo;

7 - Na data aludida em 4-, a responsabilidade civil pela circulação do veículo de matrícula …-EE-… encontrava-se transferida para a Interveniente FF, mediante contrato de seguro titulado pela apólice n° 10…55;

8 - Não foi dado conhecimento à Interveniente FF que o veículo de matrícula …-EE-… dispunha de um gancho, comumente designado "bola de reboque", destinado a ter atrelado um reboque;

9 - O local onde ocorreu o embate caracteriza-se por ser uma curva com inclinação para o lado direito, atento o sentido placa Juliete/placa Alfa e com boa visibilidade;

10 - É composto por duas vias de circulação, uma em cada sentido;

11 - O piso é betuminoso e encontrava-se em bom estado de conservação;

12 - O veículo XU circulava em direcção à placa Alfa, a velocidade não superior a 40 Km/h;

13 - Quando o mesmo se aproximava dos caixotes do lixo, colocados junto à berma do lado direito da via em que circulava, surgiu, proveniente do lado esquerdo e da via contrária àquela em que circulava o veículo XU, o reboque do lixo que se tinha soltado do veículo …-EE-…;

14 - O reboque soltou-se do veículo …-EE-… em virtude do gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-… se ter partido;

15 - O condutor do veículo …-…-XU apenas se apercebeu que o reboque se tinha soltado do veículo quando viu o mesmo surgiu à frente do veículo que conduzia;

16 - Após se ter apercebido da presença do reboque à frente do veículo que conduzia, o condutor deste, EE, não teve tempo para proceder à realização de qualquer manobra, destinada a evitar o embate do referido reboque no veículo;

17 - Em consequência do embate do atrelado, a frente do veículo …-…-XU ficou completamente destruída e o condutor do mesmo teve que ser desencarcerado de dentro do veículo pelos Bombeiros Sapadores do Aeroporto de Lisboa;

18 - No mesmo dia 12 de Setembro de 2007, cerca das 20h20m, o veículo de matrícula …-EE-… tinha embatido num objecto concretamente não identificado, tendo ficado com uma mossa do lado esquerdo;

19 - Em momento anterior ao embate referido em 4-, o gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-… encontrava-se torcido, o que era do conhecimento do R. BB e da R. CC - Sociedade Técnica de Limpezas, SA;

20 - A quebra do gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-… ocorreu em virtude do que consta em 19-

21 - Aquando do embate aludido em 4-, o R. BB conduzia o veículo …-EE-… sob as ordens e direcção da R. CC -Sociedade Técnica de Limpezas, SA;

22 - Em consequência do embate aludido em 4-, o condutor do veículo …-…-UX, EE, sofreu politraumatismos com rotura da bexiga e contusão do joelho e coxa direitos;

23 - Em virtude das lesões referidas em 22, EE foi transportado de urgência para o Hospital de São José, em Lisboa e foi submetido a vários tratamentos, consultas e assistência médica e medicamentosa;

24 - Igualmente em virtude das aludidas lesões, EE ficou impedido de se deslocar pelos seus próprios meios e teve que recorrer à utilização de táxis;

25 (alterado pela Relação) - Por força do contrato de seguro referido em 2 e em virtude das lesões referidas em 22, a A. suportou o pagamento das seguintes quantias:

- com medicamentos ministrados a EE: 27,60 € em 11/02/2011 e 10,43 € em 04/12/2007;

- com consultas médicas a que EE foi submetido: a) 50 € em 28/04/2008; b) 150 € em 11/02/2009; c) 150 € em 23/03/2010; d) 120 € em 18/08/2009.

26 (alterado pela Relação) - Em virtude das lesões e por força do contrato de seguro referido em 2 a A. pagou a EE as seguintes quantias a título de indemnização por incapacidade temporária para o trabalho num total de 7.339,50 €:

a) em 04/12/2007: 750,38 €, referente ao período de 09/11/2007 a 04/12/2007 (ITA);

b) em 04/01/2008: 894,69 €, referente ao período de 05/12/2007 a 04/01/2008 (ITA);

c) em 07/02/2008: 981,27 €, referente ao período de 05/01/2008 a 07/02/2008 (ITA);

d) em 03/03/2008: 721,62 €, referente ao período de 08/02/2008 a 03/03/2008 (ITA);

e) em 03/04/2008: 591,64 €, referente aos períodos de 04/03/2008 (ITA), 10/03/2008 a 24/03/2008 (ITP) e 25/03/2008 a 03/04/2008 (ITA);

f) em 29/04/2008: 490,63 €, referente aos períodos de 04/04/2008 a 17/04/2008 (ITA) e 18/04/2008 a 27/04/2008 (ITP);

g) em 20/06/2008: 141,98 €, referente ao período de 28/04/2008 (ITA) e ao período de 29/04/20008 a 23/6/2008 (ITP);

h) em 30/04/2010: 781,95 €, referente ao período de 08/04/2010 a

30/04/2010 (ITA);

i) em 21/05/2010: 591,55 €, referente aos períodos de 05/04/2010 a

07/04/2010 (ITA), 01/05/2010 a 10/05/2010 (ITA) e 11/05/2010 a

21/05/2010 (ITP);

j) em 02/08/2010: a quantia de 339,96 €, referente aos períodos de 09/07/2010 a 18/7/2010 (ITP), 19/07/2010 a 19/07/2010 (ITA), 20/07/2010 a 29/07/2010 (ITP) e 30/07/2010 (ITA);

l) em 11/02/2011: 1.053,93 €, referente ao período de 12/01/2011 a 11/02/2011.)».

27 - Por sentença proferida na acção emergente de acidente de trabalho que correu termos no 5º Juízo, 2ª secção, do Tribunal de Trabalho de Lisboa sob o n° 2419/08.OTTLSB, a A. foi condenada a pagar a EE, por força das lesões referidas em 22, a pensão anual e vitalícia de €1.029,67, com início em 25.06.2008, acrescida de juros de mora, até integral pagamento e €9.35, a título de despesas de transporte;

28 (alterado pela Relação) - Em 03/03/2009, a A. procedeu ao pagamento a EE das seguintes quantia: € 13.814,19 € a título de capital de remição, 413,29 € a título de juros de mora e 9,35 € a título de despesas de transporte.

29 - A A. pagou à empresa que procedeu à averiguação das causas do embate referido em 4- a quantia de € 217,80;

30 (eliminado pela Relação)

31 - Após a mesma data de 21/03/2012, a A. pagou a EE, a título de pensões, incluindo retroactivos devidos a esse título desde 06/09/2011, a quantia de € 7.040,46 e a quantia de € 91,12, a título de juros;

32 - A R. CC - Sociedade Técnica de Limpezas, SA, celebrou com a A. um contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração, cobrindo a actividade de assistência em escala, contrato esse titulado pela apólice n° 095/…16, contrato esse que foi celebrado por um ano, renovável e com início em 11 de Dezembro de 2006;

33 - Consta do artigo 4º, alínea f), das Condições Gerais do contrato aludido em 30-, sob a epígrafe "Exclusões":

"O presente contrato exclui sempre:

(…)

f) danos decorrentes de acidentes de viação e/ou provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro (…)”

34 - A R. CC- Sociedade Técnica de Limpezas, SA, celebrou com a Interveniente GG - Companhia de Seguros, SA, o contrato de seguro do ramo responsabilidade civil - exploração, contrato esse titulado pela apólice n° 13…81, contrato esse celebrado por ano, renovável e com início em 08/02/2007;

35 - Consta do artigo 2º das Condições Gerais da Apólice:

"1. O presente contrato tem por objecto a garantia da responsabilidade extracontratual que, ao abrigo da lei civil e desta apólice, seja imputável ao Segurado na qualidade ou no exercício da sua actividade expressamente mencionadas nas respectivas Condições Particulares e Especiais.

2. Até ao limite do Capital Seguro e Seguradora garante o pagamento das indemnizações que sejam exigíveis ao Segurado por danos patrimoniais e não patrimoniais directa e exclusivamente decorrentes de lesões corporais e materiais involuntária, fortuita e inesperadamente causados a terceiros que ocorram dentro do período do seguro e do âmbito territorial estabelecidos, tudo de acordo com as declarações exaradas nas Condições Particulares e Especiais desta apólice";

36 - Consta do artigo 3º, n°s 1, alínea c) e 2, alíneas s), t) e v) das mesmas Condições Gerais da Apólice:

"Sem prejuízo das exclusões porventura consignadas nas Condições

Particulares e Especiais, esta Apólice não garante:

1. Em caso algum, o pagamento de indemnizações decorrentes de:

(...)

c) Acidentes de viação provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro;

(...)

2. Não garante, salvo convenção em contrário expressa nas Condições Particulares, o pagamento de indemnizações decorrentes de: s) Danos que devam ser cobertos por um seguro obrigatório de responsabilidade civil; t) Danos resultantes: i) da posse ou uso por ou da parte do Segurado, de veículos, aeronaves, embarcações ou outros meios de locomoção ou de transporte terrestre, aéreo ou aquático, equipados ou não como motor, bem como pelos objectos por eles transportados; (...) v) Danos consequenciais indirectos, como sejam lucros cessantes e ou perdas económicas ou financeiras de qualquer natureza, sofridos por terceiros que decorram de facto que implique responsabilidade civil extra-contratual do Segurado; (...)".


4. Tendo em conta o disposto no nº 4, do art. 635º, do Código de Processo Civil, no recurso principal da A. está em causa a seguinte questão:

- Prescrição do direito da A.


5. No recurso subordinado da R. CC, S.A., estão em causa as seguintes

questões:

- Cobertura do sinistro pelo contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade celebrado entre a R. CC e a A. AA;

- Cobertura do sinistro pelo contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade celebrado entre a R. CC e a Interveniente Lusitânia.


6. Invoca a R. CC, Recorrida no recurso principal, excepção de caso julgado relativamente à determinação do prazo de prescrição aplicável ao caso dos autos porque, no recurso de apelação, a A. AA não recorreu subordinadamente desta matéria, apenas contra-alegou, pondo em causa a aplicação do prazo de três anos do art. 498º, nº 2. Invoca também a Recorrida CC a verificação de dupla conforme nesta mesma matéria pelo que não poderia ser discutida em sede de recurso de revista.

        A segunda pretensão não tem qualquer fundamento porque a dupla conforme só ocorre quanto a decisões e não quanto a fundamentos das decisões.

       Quanto aos limites objectivos do caso julgado, nesta hipótese dos limites do caso julgado formal, não existe plena concordância na jurisprudência deste Supremo Tribunal acerca de neles se incluir apenas a parte decisória ou também os seus fundamentos de facto ou de direito (cfr. os acórdãos de 28/11/2013, proc. nº 106/11.0TBCPV.P1.S1, e de 07/05/2015, proc. nº 15698/04.2YYLSB-C.L1.S1). Independentemente da orientação seguida, certo é que, no caso dos autos, se sufraga a posição de aplicação do prazo de prescrição de três anos do direito de regresso da A. Recorrente AA.

Com efeito, o direito de regresso da A. Recorrente funda-se no nº 4, do art. 31º, da Lei nº 100/97, de 13 de Setembro, no qual se dispõe: “A entidade empregadora ou a seguradora que houver pago a indemnização pelo acidente tem o direito de regresso contra os responsáveis referidos no nº 1, se o sinistrado não lhes houver exigido judicialmente a indemnização no prazo de um ano a contar da data do acidente.” O prazo para o exercício do direito de regresso encontra-se directamente previsto no nº 2, do art. 498º, do Código Civil: “Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.” Pretende a Recorrente AA que se aplique ao caso o alargamento do nº 3 do mesmo preceito: “Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável”. Alega que: “Atenta a factualidade provada nos autos, não se encontra[m] prescritos quaisquer pagamentos efectuados pela Apelante no âmbito do presente processo.”; O art. 498°, n° 3 do CC aplica-se a todas as situações incluídas dentro do Livro das Obrigações, Secção V, subsecção I.” pelo que “O legislador quis conceder a qualquer lesado e aqui a Apelante é lesada, uma prorrogação do prazo prescricional quando o responsável civil tenha praticado um acto que além de ilícito é criminalmente enquadrável.”

       O problema do eventual alargamento do prazo de prescrição tem sido resolvido, de forma reiterada, em sentido negativo pela jurisprudência deste Supremo Tribunal (cfr. os acórdãos de 04/11/2008, proc. nº 08A3119, de 27/10/2009, proc. nº 844/07.2TBOER.L1, de 04/11/2010, proc. nº 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, 16/11/2010, proc. nº 2119/07.8TBLLE.E1.S1, de 17/11/2011, proc. nº 1372/10.4T2AVR.C1.S1, de 29/11/2011, proc. nº 1507/10.7TBPNF.P1.S1, de 06/12/2011, proc. nº 797/07.7TBVCD.P1.S1 e de 18/10/2012, proc. nº 56/10.8TBCVL-A. C1.S1, consultáveis em www.dgsi.pt; e ainda, relativamente a situações de sub-rogação legal no direito do lesado, nos acórdãos de 05/06/2012, proc. nº 32/09.3TBSRQ.L1.S1, de 07/05/2014, proc. nº 8304/11.0T2SNT-AL1.S1, consultáveis em www.dgsi.pt, e de 03/12/2015, proc. nº 11173/12.0TBVNG.P1.S1, in sumarios.stj.pt).

Enuncia-se, de forma breve, a argumentação utilizada para se recusar o alargamento do prazo por aplicação do nº 3, do art. 498º, do CC: (i) O direito de regresso da seguradora é um direito novo, distinto do direito de indemnização do lesado, estando o prazo de prescrição daquele direito expressamente previsto no nº 2, do art. 498º, do CC, pelo que o seu eventual alargamento nunca se poderia admitir por aplicação automática do regime de prescrição do direito do lesado, antes exigiria encontrar justificação autónoma; (ii) Ora, na acção de regresso “não está já em causa, em termos directos e imediatos, a responsabilidade civil extracontratual derivada do facto voluntário, culposo, ilícito, causal e lesivo, que, em rigor, já estará definida mas antes um segundo momento, subsequente à definição, em concreto, da dita responsabilidade, não se vislumbrando necessidade ou motivo, quer em termos fácticos como jurídicos, para proceder a tal ampliação do prazo” (acórdão do Supremo Tribunal de 27/10/2009, cit.); (iii) Em última análise, sendo o direito da seguradora um direito novo, que não corresponde a uma situação de responsabilidade civil extracontratual, não se verifica a ratio legis do art. 498º, nº 3, do CC. Com efeito, “A razão de ser da introdução do preceito do nº 3 em causa visou alargar o prazo de prescrição do lesado quando o facto lesante constituía crime de gravidade acentuada que leve a que o prazo de prescrição do crime seja superior aos três anos fixados no nº 1. É que se não pode esquecer a existência do princípio da adesão da dedução da indemnização civil no processo criminal e se o prazo de prescrição criminal ainda não decorreu, se não compreenderia que se extinguisse o direito à indemnização civil – conexa com o crime - e ainda estivesse a decorrer o prazo para a prescrição penal operar, onde o legislador entendeu dever ser deduzido o pedido de indemnização civil – dentro de certas limitações constantes das normas penais” (acórdão do Supremo Tribunal de 05/06/2012 (proc. nº 32/09.3TBSRQ.L1.S1, cit.), explicação que, ainda que inserida em caso relativo ao direito do FGA, sub-rogado no direito do lesado, é válida em termos gerais.

Assim sendo, conclui-se, nas palavras da sentença de 1ª Instância, “(…) esta ratio não concorre quando se está perante o exercício do direito de regresso. Neste caso, e dado que a obrigação já foi cumprida no confronto do lesado, não vale o argumento de que desde que o facto ilícito pode ser discutido em sede penal deve também poder ser apreciado no âmbito da actuação da respectiva responsabilidade civil. Nenhuma razão existe, pois, para se lhe aplicar um alargamento do prazo que pressupõe justamente que a medida dessa responsabilidade possa ser ainda discutida em sede penal por mais tempo.


7. Problema diverso é o da determinação do ‘dies a quo’ da contagem do prazo de prescrição de três anos. A Recorrente AA alega nos termos seguintes: “Ainda que os pagamentos ao sinistrado tenham tido início em 2007, a obrigação da Apelante é única, ainda que fraccionada, uma vez que legalmente tem que proceder ao pagamento das várias prestações devidas, encontrando-se o seu pagamento diferido no tempo não só pela sua natureza mas também por imposição legal.”; “Não se encontrando o sinistrado, à data da propositura da presente acção, completa e definitivamente ressarcido de todos os danos ocasionados com o presente sinistro, ainda não se iniciou a contagem do prazo de prescrição do direito da Apelante uma vez que a sua obrigação ainda não cessou.”

Dispõe o nº 2, do art. 498º, do CC, que “Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.” A letra da lei não permite resolver, sem mais, as situações frequentes e complexas em que, relativamente aos danos resultantes de um mesmo sinistro, existe uma sucessão de actos de pagamento efectuados pela seguradora. O problema foi devidamente identificado pelas instâncias, referindo-se às diferentes interpretações possíveis: por um lado, entender-se que o prazo de prescrição se conta a partir de cada acto de pagamento, atomisticamente considerado; por outro lado, considerar-se que o prazo se conta apenas a partir do último acto de pagamento. Defendendo-se, porém, que o último acto de pagamento correspondente ao cumprimento pelo titular do direito de regresso é o último acto de pagamento que – nas palavras do acórdão recorrido – integre “um mesmo núcleo indemnizatório juridicamente diferenciado de outros valores indemnizatórios”. Foi esta a orientação seguida pelas instâncias, louvando-se na desenvolvida fundamentação do acórdão deste Supremo Tribunal de 07/04/2011 (proc. nº 329/064TBAGN.C1.S1, www.dgsi.pt), cuja conclusão aqui se cita: “Em suma: se não parece aceitável a autonomização do início de prazos prescricionais, aplicáveis ao direito de regresso da seguradora, em função de circunstâncias puramente aleatórias, ligadas apenas ao momento em que foi adiantada determinada verba pela seguradora, já poderá ser justificável tal autonomização quando ela tenha subjacente um critério funcional, ligado à natureza da indemnização e ao tipo de bens jurídicos lesados, com o consequente ónus de a seguradora exercitar o direito de regresso referentemente a cada núcleo indemnizatório autónomo e juridicamente diferenciado, de modo a não diferir excessivamente o contraditório com o demandado, relativamente à causalidade e dinâmica do acidente, em função da pendência do apuramento e liquidação de outros núcleos indemnizatórios, claramente cindíveis do primeiro.”

Neste aresto indica-se expressamente ter-se partido da posição assumida no acórdão deste Supremo Tribunal de 04/11/2010 (proc. nº 2564/08.1TBCB.A.C1.S1, www.dgsi.pt) em cujo sumário se concluiu que, “Relativamente ao mesmo sinistrado e ressalvados os casos de indemnização sob a forma de renda, o prazo prescricional da seguradora para exercer o direito de regresso relativamente a indemnização que pagou, faseadamente, no âmbito do seguro obrigatório automóvel, começa a contar-se da data em que foi efectuado o último pagamento”. Ainda que neste acórdão não seja convocada a ideia de núcleos indemnizatórios autónomos, em ambas as decisões se identifica como dies a quo a data do último acto de pagamento.

No caso dos autos, aprecie-se a forma como o acórdão recorrido decidiu, dando como provados núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados em função de critérios funcionais e temporais:


“Nos art. 42° e 43° da p. i alegou a apelada que suportou despesas no montante de 8.322,56 €, correspondendo à soma das seguintes parcelas: 322,90 € com medicamentos, 1.081,80 € com transportes, 1.005 € com fisioterapia, 5.912,77 € com consultas médicas, tendo-se dispensado de indicar as datas dos pagamentos; nos art. 46° e 47° desse articulado alegou que pelos períodos de incapacidade sofridos pelo sinistrado despendeu desde 09/10/2007 até 20/07/2011 a quantia de 15.348,7 €; nos art. 48° e 49° alegou que foi condenada a pagar ao sinistrado uma pensão anual e vitalícia com início em 25/06/2008 acrescida de juros de mora e despesas de transporte, tendo pago o capital de remição em 03/03/2009; no art. 50° alegou que despendeu a quantia de 217,80 € com a averiguação do acidente.

No que respeita às indemnizações por incapacidades temporárias, decorre do que está provado no ponto 26 - conforme decidido neste acórdão - que foram efectuados pagamentos em dois períodos: entre 04/12/2007 e 20/06/2008 foram pagas indemnizações por incapacidades temporárias desde 09/11/2007 a 20/06/2008; entre 30/04/2010 e 11/02/2011 foram pagas indemnizações por incapacidades temporárias desde 08/04/2010 até 11/02/2011.

Portanto, não temos um só período de incapacidades temporárias e respectivas indemnizações, o que se percebe, pois foi atribuída ao sinistrado incapacidade permanente parcial por sentença de 16/01/2009 e foi condenada a apelada a pagar o capital de remição da pensão devida desde 25/06/2008 (cfr doc. 3 junto com a p. i.), pagamento que efectuou em 03/03/2009 como está provado no ponto 28 (com a redacção dada neste acórdão).

Os pagamentos de indemnizações para reparação de incapacidades temporárias e o pagamento do capital de remição para reparação da incapacidade permanente, embora tenham como causa a lesão da integridade física do sinistrado, são núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados, justificando-se, por isso, que o prazo de prescrição do direito de regresso da apelada se tenha iniciado de modo autónomo relativamente a cada um deles. E mesmo no que respeita às indemnizações por incapacidades temporárias não se vê razão para integrar num só núcleo indemnizatório aquelas que foram pagas antes do pagamento do capital de remição e aquelas que foram pagas posteriormente, pois respeitam a períodos temporais claramente demarcados.

Por outro lado, resulta da sentença do Tribunal do Trabalho de 10/12/2012 (doc. 525/526 junto pela apelada em 06/11/2013) e conforme alegado no requerimento de ampliação do pedido (apresentado em 29/01/2014) que devido a agravamento da incapacidade permanente do sinistrado foi aumentada a pensão e condenada a apelada pagar uma pensão vitalícia não remível com início em 06/09/2011, levando-se em conta o capital de remição já pago. Embora estas duas rubricas - capital de remição e pensão vitalícia não remível - se reportem à reparação de incapacidade permanente do sinistrado, não se encontra justificação para considerar que o capital de remição pago em 03/03/2009 e a pensão vitalícia cujo pagamento foi iniciado após 21/03/2012 constituem um único núcleo indemnizatório, diferindo o exercício do direito de regresso para o momento em que esteja integralmente paga a pensão vitalícia, pois após o pagamento do capital de remição ainda foram pagas indemnizações por incapacidades temporárias. Aliás, mesmo que se considerasse que o capital de remição e a pensão vitalícia integram um único núcleo indemnizatório, sempre seria de entender que, à semelhança dos casos de renda vitalícia, o prazo de prescrição do direito de regresso inicia-se e corre autonomamente em relação a cada pagamento parcelar, sob pena de ser quase imprescritível o direito da seguradora.

No que respeita às despesas com medicamentos e consultas médicas (mencionadas no ponto 25 da matéria de facto como decidido neste acórdão) e despesa com a averiguação do sinistro (que, segundo a apelada foi paga em 03/12/2007, pois apesar de não o alegar na p. i. é essa a data que fez constar no doc. 6 junto com esse articulado), entendemos que não têm autonomia relativamente ao ressarcimento dos danos decorrentes das lesões sofridas pelo sinistrado, pelo que devem integrar-se nos núcleos indemnizatórios dos períodos em que aquelas despesas foram pagas. Concluindo, na data em que a apelada foi citada (26/03/2012), estava já prescrito o seu direito de regresso, pelo decurso do prazo de três anos desde o cumprimento, relativamente aos seguintes créditos:

a) as indemnizações para reparação de incapacidades temporárias que pagou até 20/06/2008 mencionadas no ponto 26 al. a) a g) da matéria de facto;

b) as despesas com medicamentos que pagou em 04/12/2007 no valor de 10,47 €, mencionadas no ponto 25 da matéria de facto;

c) as despesas com consultas médicas que pagou em 28/04/2008 no valor de 50 € e em 11/02/2009 no valor de 150 €, mencionadas no ponto 25 da matéria de facto;

d) o capital de remição, juros de mora e despesas de transporte pagos em 03/03/2009, mencionados no ponto 28 da matéria de facto, ficando assim prejudicada a questão da alegada inexistência de direito de regresso quanto a esses juros de mora;

e) a despesa de 217,80 € com a averiguação do sinistro (tendo em conta a data de pagamento de 03/12/2007 como acima referido) mencionada no ponto 29 da matéria de facto.”

        

Afigura-se que a Relação identificou, de forma inteiramente correcta, núcleos indemnizatórios autónomos e juridicamente diferenciados, atribuindo relevância à data do último pagamento de cada um desses núcleos. Com um único reparo que não tem, contudo, consequências decisórias. A despesa de €217,80, respeitante à averiguação das causas do sinistro, sempre seria de considerar separadamente – com a consequente prescrição do direito de regresso da A. – porque corresponde a pagamento efectuado a entidade distinta da vítima do sinistro.

      Reafirme-se que a aceitação, no caso dos autos, da contagem do prazo de prescrição a partir da data do último pagamento de cada núcleo indemnizatório autónomo, não entra em contradição com a decisão do acórdão de 04/11/2010 (cit.), no qual, ainda que sem se fazer apelo à ideia de núcleo indemnizatório autónomo, se seguiu igualmente o critério da data do último pagamento ao lesado.

8. Como se indicou, supra, no recurso subordinado da R. CC, S.A., estão em causa as seguintes questões:

- Cobertura do sinistro pelo contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade celebrado entre a R. CC e a A. AA;

- Cobertura do sinistro pelo contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade celebrado entre a R. CC e a Interveniente GG.

Nas contra-alegações a A., aqui Recorrida, AA, invoca dupla conforme quanto à aplicação ao sinistro dos da cláusula de exclusão constante do art. 4º, al. f) Condições Gerais do contrato. Tendo em conta que, como já se afirmou supra, a dupla conforme respeita à decisão e não aos seus fundamentos, não se verifica dupla conforme.

A Interveniente GG Seguros, por sua vez, contra-alega, invocando ter-se verificado dupla conforme na sua absolvição. Tem razão porque está em causa a decisão coincidente de absolvição do pedido da sentença de 1ª Instância e do acórdão da Relação, pelo que, quanto àquela Interveninente – e nos termos do nº 3, do art. 671º, do CPC –, o recurso subordinado da R. CC não pode ser conhecido.


9. A questão da cobertura do sinistro pelo contrato de seguro de responsabilidade civil de exploração de actividade celebrado entre a A. e a R. desdobra-se em duas sub-questões: (i) a da prova da comunicação e aceitação das Condições Gerais, em cuja cláusula 4ª, alínea f), se prevê a exclusão dos “danos decorrentes de acidentes de viação e/ou provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro (…)”; (ii) a da interpretação da cláusula 30 das Condições Particulares da apólice: “Mediante a contratação da presente cobertura, o contrato garante, até aos limites fixados nestas condições particulares, as indemnizações que, ao abrigo da lei civil, sejam exigíveis ao segurado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados a terceiros, decorrentes de lesões corporais e/ou lesões materiais, em consequência do exercício da sua actividade de empresa prestadora de serviços de limpeza, nomeadamente: (...)

- Pela utilização das máquinas necessárias à sua actividade; (...).”

    A discussão sobre se foi ou não feita prova da comunicação e aceitação da cláusula 4ª, alínea f), das Condições Gerais do contrato resulta do facto de estas terem sido juntas na réplica pela A. AA, e não impugnadas pela R. CC.

    Alega a R. CC, aqui Recorrente: “Ao preconizar que tal ónus de alegação e prova incumbia à segurada CC, a douta decisão recorrida violou ou não deu devida aplicação às regras sobre repartiçãoo dos ónus de alegação e prova, desconsiderando o disposto no artigo 5º, nº 1, do Código de Processo Civil e o artigo 342º, nº 1 e 2 do Código Civil e os artigos 1º, nº 3, e 5º, nº 3, do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro.”; “Foram as seguradoras acima referidas que invocaram as cláusulas de exclusão constantes das alegadas cláusulas contratuais gerais, pelo que lhes incumbia o ónus de provar a comunicação e aceitação dessas cláusulas pela Recorrente CC”; “A Recorrente não tinha o ónus de responder ao alegado na réplica da autora AA”; “Tendo a ora Recorrente alegado que o sinistro estava coberto pelos seguros de responsabilidade civil celebrados com as seguradoras em apreço, acabou por não se considerar vinculada às cláusulas de exclusão invocadas pela autora e pela interveniente”; “Acresce que a falta de impugnação dos documentos onde alegadamente constam as Condições Gerais e Especiais das apólices por parte da Recorrente acarreta apenas que seja considerado como provado o teor do documento em causa e nada mais.”

    Não tem razão. O ónus de impugnação (art. 490º, do CPC em vigor ao tempo dos articulados) vale também para a tréplica (art. 503º, do CPC, na redacção anterior), devendo a R. refutar, tomando posição definida, os novos factos apresentados pela A., o que não foi feito pela R. CC. Esta exigência não é dispensada pelo facto de estarem em causa cláusulas abrangidas pelo regime legal das cláusulas contratuais gerais. Nem se pode entender que apenas se pode dar como provado o teor dos documentos juntos com a réplica e não impugnados, porque, na verdade, compulsada a réplica, se verifica que a A. não se limitou a juntar o documento das Condições Gerais e Especiais, antes alega (articulados 58º a 67º) no pressuposto de que estas integram o contrato de seguro celebrado entre as partes.

    Confirma-se, assim, o entendimento do acórdão recorrido no sentido de a cláusula 4ª, alínea f), das Condições Gerais do contrato excluir a cobertura do sinistro dos autos por estarem em causa “danos decorrentes de acidentes de viação e/ou provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro”.


10. Por último, quanto à pretensão da R. CC, aqui Recorrente, de que, independentemente da solução dada à questão anterior, sempre o acidente estaria abrangido pelo contrato de seguro celebrado com a A. AA, pela cláusula 30 das Condições Particulares da apólice, uma vez que, conforme alega, “Tais Condições Especiais Particulares (que incluem o risco de utilização de máquinas – sem qualquer diferenciação ou limitação), prevalecem sobre as cláusulas contratuais gerais e, como tal, prevalecem sobre a cláusula de exclusão invocada pela Recorrida AA”.

        Na referida cláusula 30 prevê-se o seguinte:

Mediante a contratação da presente cobertura, o contrato garante, até aos limites fixados nestas condições particulares, as indemnizações que, ao abrigo da lei civil, sejam exigíveis ao segurado pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados a terceiros, decorrentes de lesões corporais e/ou lesões materiais, em consequência do exercício da sua actividade de empresa prestadora de serviços de limpeza, nomeadamente: (...)

- Pela utilização das máquinas necessárias à sua actividade; (...).”

      Afigura-se ser de responder negativamente à questão de saber se um “reboque/atrelado de recolha de lixo em aeronaves” constitui ou não uma “máquina”, tendo em conta que não se provou que o reboque/atrelado possuísse qualquer mecanismo próprio, mas antes que se movia por força do veículo rebocador. Vejamos os factos provados quanto à dinâmica do acidente, que aqui se reproduzem:

- O reboque soltou-se do veículo …-EE-… em virtude do gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-… se ter partido;

- O condutor do veículo …-…XU apenas se apercebeu que o reboque se tinha soltado do veículo quendo viu o mesmo surgiu à frente do veículo que conduzia;

- Após se ter apercebido da presença do reboque à frente do veículo que conduzia, o condutor deste, EE, não teve tempo para proceder à realização de qualquer manobra, destinada a evitar o embate do referido reboque no veículo;

- Em consequência do embate do atrelado, a frente do veículo …-…-XU ficou completamente destruída e o condutor do mesmo teve que ser desencarcerado de dentro do veículo pelos Bombeiros Sapadores do Aeroporto de Lisboa;

- Em momento anterior ao embate referido em 4. [acidente dos autos], o gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-…encontrava-se torcido, o que era do conhecimento do R. BB e da R. CC - Sociedade Técnica de Limpezas, SA (facto 19.);

- A quebra do gancho através do qual o reboque encaixava no veículo …-EE-…ocorreu em virtude do que consta em 19.

Fica patente que o sinistro não foi causado pelo reboque/tractor de recolha de lixo em virtude de força motriz própria, mas sim pela força motriz do veículo rebocador …-EE-…, que, associada ao defeito de conservação do gancho traseiro do mesmo veículo, atirou o reboque de encontro ao veículo conduzido pela vítima.

Tal como entendeu o acórdão recorrido, o acidente dos autos integra a previsão da cláusula 4ª, alínea f), das Condições Gerais do contrato de seguro de responsabilidade civil celebrado entre a A. e a R. CC, na qual se prevê a exclusão da cobertura dos danos decorrentes de acidentes de viação e/ou provocados por veículos que, nos termos da legislação em vigor, sejam obrigados a seguro (…)”. Exclusão que, no caso dos autos, ocorre tanto pela primeira como pelo segunda parte da cláusula.

      Na verdade, e segundo o entendimento tradicional no direito português (cfr. Antunes Varela, Direito das Obrigações, 2000, pág. 667) não obsta à qualificação como acidente de viação o facto de o sinistro ocorrer não numa via pública, mas numa via de acesso reservado, como no caso dos autos.

      Por outro lado, sempre a utilização do veículo causador do sinistro, em reboque ou com reboque, estava abrangida pela imposição legal de seguro de responsabilidade civil, nos termos do art. 1º, nº 1, do Decreto-Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro (em vigor à data do acidente – 12/09/2007 – uma vez que o Decreto-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto só entrou em vigor 60 dias após a sua publicação): “Toda a pessoa que possa ser civilmente responsável pela reparação de danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes de lesões corporais ou materiais causadas a terceiros por um veículo terrestre a motor, seus reboques ou semi-reboques, deve, para que esses veículos possam circular, encontrar-se, nos termos do presente diploma, coberta por um seguro que garanta essa mesma responsabilidade.” Esta exigência resulta, aliás, de imposição das Directivas Comunitárias em matéria de seguro automóvel (cfr. art. 3º, nº 1, da Directiva 72/166 do Conselho) que tem sido interpretada de forma muito ampla pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

     Concluindo, não tendo sido tempestivamente impugnada a comunicação e aceitação das Condições Gerais do contrato de seguro celebrado entre a A. e a R. CC, o sinistro dos autos só poderia ser coberto pelo seguro de responsabilidade civil automóvel. Questão que, contudo, já transitou em julgado na 1ª Instância.


11. Pelo exposto, negam-se as revistas da A. e da R., confirmando-se o acórdão recorrido.


Custas pelas Recorrentes, em partes iguais.


Lisboa, 19 de Maio de 2016


Maria da Graça Trigo (Relatora)

João Bernardo

Oliveira Vasconcelos