Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3221/20.6T8PNF.P1.S1
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: JOSÉ EDUARDO SAPATEIRO
Descritores: RETIFICAÇÃO DE ERROS MATERIAIS
ARGUIÇÃO DE NULIDADES
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
ACÓRDÃO UNIFORMIZADOR DE JURISPRUDÊNCIA
DECISÃO
SUMÁRIO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Data do Acordão: 02/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA A ARGUIÇÃO DE NULIDADE.
Sumário :

I – O Aresto deste STJ mostra-se não apenas suficiente como devidamente fundado e fundamentado, no que concerne às diversas questões que, em termos de admissibilidade do recurso de Revista interposto pela empregadora, tinham de ser previamente apreciadas e julgadas, não havendo, nessa medida, da parte deste Supremo Tribunal qualquer obrigação jurídica e funcional de entrar na análise e decisão da matéria de direito que, no fundo, constitui o objeto de tal recurso e que apenas com a sua admissão liminar se justificava fazer, o que não foi o caso dos autos, dado este tribunal superior ter rejeitado a presente Revista.


II - A reclamante não tem qualquer razão ao pretender fundar tal nulidade de falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam o Aresto de 10/1/2024, na circunstância deste STJ ter desconsiderado o Sumário do Acórdão número 1/2019, para efeitos da recondução da situação vivenciada neste processo à alínea c) do número 2 do artigo 629.º do CPC/2013, na parte em que a Ré entende que o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto decidiu contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.


III - Tal Sumário, que deve ser elaborado pelo relator do Acórdão visa cumprir uma finalidade: o de fazer uma súmula, de uma maneira sintética e organizada por pontos e matérias ou questões, acerca do que de juridicamente relevante e pertinente ressalta da fundamentação – nas suas duas vertentes – de um dada decisão judicial, bem como desta última, enquanto resultado final derivado daquela, quando tal for igualmente pertinente, em sede de tal súmula.


IV - Este Sumário tem naturalmente uma eficácia interna, no plano do acórdão que visa resumir, no que ele tem de essencial, e em função das partes a quem aquele se direciona primordialmente, mas o seu maior impacto é externo, a nível judiciário, académico, profissional, económico e social, sem olvidar, finalmente, todas as ações judiciais com casos similares ou tangenciais, em que o dito Sumário tem por seus potenciais destinatários os litigantes das mesmas.


V – Não seria possível caracterizar o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, no que de concreto e específico julgou e decidiu, como violador das regras gerais de interpretação das convenções coletivas de trabalho que constam dos dois primeiros pontos do Sumário do Aresto do STJ n.º 1/2019, ainda que encaradas como integradoras da jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça vertida nesse Acórdão n.º 1/2019, dado tais princípios interpretativos das convenções coletivas serem, em si e só por si, manifestamente insuficientes para sustentar tal violação desse Acórdão do STJ por parte do aqui recorrido Acórdão do TRP de 8/5/2023.


VI - Os dois processos e arestos que aqui estão [aparentemente] em contraposição debruçam-se sobre questões de facto totalmente distintas [porque emergentes de setores e atividades económicas diferentes], aplicam naturalmente IRCT distintos e debatem questões jurídicas substancialmente diversas, não se podendo assim falar, em rigor e objetivamente, em decisões proferidas no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito e, no que respeita ao Acórdão do TRP, contra a jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal de Justiça no seu Aresto n.º 1/2019.


VII - Não basta, para o efeito, que se tratem em ambas as decisões de temáticas ligadas à retribuição e às diuturnidades, ainda que em contextos laborais, convencionais e jurídicos que não coincidem entre si – quando não estão mesmo distantes uns dos outros, em todas as vertentes que para aqui importam – para que se entenda estarem satisfeitos os requisitos da alínea c) do número 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil de 2013.


VIII - Muito embora admitamos que a litigância desenvolvida pela recorrente e seus ilustres mandatários judiciais, no quadro desta reclamação e face ao que se havia deixado sustentado no Aresto de 10 de janeiro de 2024, se pode caracterizar como imprudente, atrevida, temerária, também não podemos olvidar que a mesma assumiu uma natureza essencialmente jurídica [que, em nosso entender, consente às partes uma maior abertura e latitude no que se afirma e defende], o que não pode deixar de pesar neste juízo de verificação ou não de um cenário como o previsto no artigo 542.º do CPC/2013 [litigância de má-fé] e que, para o efeito e face ao exposto, entendemos não ocorrer no caso concreto.

Decisão Texto Integral:

RECURSO DE REVISTA N.º 3221/20.6T8PNF.P1.S1 (4.ª Secção) – RETIFICAÇÃO/ARGUIÇÃO DE NULIDADE


Reclamante: MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA


Reclamada: AA


(Processo n.º 3221/20.6T8PNF – Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este - Juízo do Trabalho de ...[Juiz ...])


ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO SOCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA:


I – RELATÓRIO


A Autora AA, devidamente identificada nos autos, propôs, no dia 4/12/2020, a presente ação declarativa de condenação, com processo comum laboral, contra a Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA., igualmente identificada nos autos, pedindo em, síntese, no final da sua Petição Inicial, que se reconheça e declare que:


i) A relação laboral entre as partes teve início em Março de 2004;


ii) A Autora tem direito a diuturnidades nos termos previstos no Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a ANIC/APIC e a FESAHT;


iii) A quantia anual de € 5.087,00 acordada com a Ré e por esta paga até Abril de 2020 constitui retribuição e, por consequência, deverá acrescentar à retribuição base atualmente paga, integrando € 363,38 líquidos na remuneração base mensal e subsídios de férias e Natal.


Requer ainda que seja a Ré condenada a pagar à Autora:


i) € 11.240,01 ilíquidos por diuturnidades vencidas desde Março de 2007 até Dezembro de 2020, acrescida de diuturnidades vincendas;


ii) € 3.095,50 líquidos por diferenças salariais vencidas entre Maio e Dezembro de 2020;


iii) € 6.109,28 a título de férias, subsídio de férias e Natal entre Março de 2004 e Outubro de 2005.


Mais pede que seja a Ré condenada a pagar as quantias vincendas respeitantes ao valor anual líquido de € 5.087,00, a ser integrado na retribuição, dividido pelos 12 meses de retribuição e pelos subsídios de férias e Natal.


Tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento.


***


Regularmente citada, veio a Ré deduzir contestação, na qual concluiu pela improcedência da ação e consequente absolvição da Ré dos pedidos.


***


Foi fixado à ação o valor de € 20.444,79 e elaborado despacho saneador, no qual foi dispensado o despacho previsto no artigo 596.º n.º 1 do CPC.


***


Realizada oportunamente a Audiência Final, foi proferida sentença, a qual julgou a ação nos seguintes termos:


“Pelo exposto, julga-se a ação parcialmente procedente e, em consequência:


A) Condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 4.064,82 a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2004, acrescida de juros de mora desde a citação da Ré até efetivo e integral pagamento;


B) Condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 1.418,42 a título de subsídio de Natal do ano de 2005, acrescida de juros de mora desde a citação da Ré até efetivo e integral pagamento;


C) Condena-se a Ré a pagar à Autora a quantia de € 2.762,78 a título de retribuição de férias e subsídio de férias de 2005, acrescida de juros de mora desde a citação da Ré até efetivo e integral pagamento;


D) Absolve-se a Ré dos demais pedidos formulados pela Autora.


Custas a cargo da Autora e da Ré, na proporção do respetivo decaimento (cf.. artigo 527.º n.ºs 1 e 2 do CPC).”


**


Inconformadas com tal sentença, a Autora e a Ré recorreram para o Tribunal da Relação do Porto, tendo a segunda o feito a título subordinado, vindo estes dois recursos de Apelação, após terem sido admitidos, a seguir a sua normal tramitação e a culminar no Acórdão de 8/5/2023, onde se decidiu o seguinte:


«Em face do exposto, acorda-se em:


A. Quanto ao recurso principal, interposto pela Autora, julgá-lo parcialmente procedente, em consequência do que se decide revogar a sentença recorrida na parte em que absolveu a Ré do pagamento de diuturnidades, que é substituída pelo presente acórdão em que se decide condenar a Ré, MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, S.A.:


A.1. A pagar à Autora, AA, a título de diuturnidades vencidas desde 01.11.2008 a 31.12.2020, a quantia global de € 9.123,78, bem como a pagar, sobre a mencionada quantia, juros de mora, à taxa legal, até efetivo e integral pagamento e desde a data da citação quanto às diuturnidades vencidas até 30.11.2020 e desde 01.01.2021 quanto às diuturnidades vencidas em dezembro de 2020.


A.2. A pagar à Autora as três diuturnidades vencidas mensalmente desde 01.01.2021 e vincendas, a liquidar em incidente de liquidação, bem como a pagar, sobre as quantias em dívida, juros de mora, à taxa legal, desde a data em que as diuturnidades deveriam ter siso pagas até efetivo e integral pagamento.


A.3. No mais impugnado no recurso principal, julgá-lo improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.


B. Quanto ao recurso subordinado, interposto pela Ré, em julgá-lo procedente, em consequência do que se revogam os segmentos decisórios constantes das als. A), B) e C) da decisão constante da sentença [em que se condenou a Ré a pagar à Autora as quantias de € 4.064,82 a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2004, de € 1.418,42 a título de subsídio de Natal do ano de 2005 e de € 2.762,78 a título de retribuição de férias e subsídio de férias de 2005 e respetivos juros de mora], decisão essa que é substituída pelo presente acórdão em que se decide absolver a Ré de tais pedidos.


Custas do recurso principal, pela Autora/Recorrente e pela Ré/Recorrida, na proporção do respetivo decaimento.


Custas do recurso subordinado pela A/Recorrida, não sendo, todavia, devida taxa de justiça na medida em que, ao não ter contra-alegado, não deu impulso processual ao recurso – art.º 6.º, n.º 1, do RCP.»


*


A Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA, inconformada com tal acórdão veio arguir a nulidade e interpor recurso do mesmo para este Supremo Tribunal de Justiça, que foi admitido [ainda que parcialmente] por despacho judicial de 11/10/2023, Referência 17318065, nos precisos termos do artigo 629.º, número 2, alínea c) do Código de Processo Civil, como de Revista [principal], a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo,


Foi igualmente admitido sem restrições [quanto aos fundamentos] e nos mesmos moldes formais do recurso independente o recurso de revista subordinado interposto igualmente pela Autora AA.

**

O Tribunal da Relação do Porto, em Acórdão de 12/7/2023, veio pronunciar-se sobre a nulidade do Acórdão recorrido, que foi invocada pela Ré no seu recurso de Revista, tendo, em Conferência, julgado improcedente a mesma.

**

A recorrente MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA apresentou alegações de recurso, que concluiu nos seguintes moldes:

“Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deverá ser:


(a) Declarada a nulidade do Acórdão por existência de contradição entre os fundamentos e a decisão do Acórdão Recorrido, nos termos do artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do CPC


(b) Admitido recurso de revista ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alínea c), ou, em alternativa, alínea d) do CPC;


e


(c) Julgada procedente a revista, revogando-se a decisão de condenação da Recorrente MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, S.A. no pagamento das diuturnidades vencidas e vincendas, mantendo-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância sobre esta matéria.”


*


A Autora AA apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, tendo concluído as mesmas nos seguintes moldes:


Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exa.,


(i) Deverá julgar-se o recurso interposto pela Ré, na parte que se refere às diuturnidades, totalmente improcedente e, em consequência, deverá manter-se o Acórdão recorrido na parte em que se condena a Ré a pagar à Autora diuturnidades vencidas e vincendas;


(ii) Deverá julgar-se o recurso subordinado totalmente procedente e, em consequência, deverá a Ré ser condenada a pagar à Autora as quantias de € 4.064,82 a título de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2004, de € 1.418,42 a título de subsídio de Natal do ano de 2005 e de € 2.762,78 a título de retribuição de férias e subsídio de férias de 2005 e respetivos juros de mora!»


*


O relator, neste Supremo Tribunal de Justiça, dos dois recursos de Revista em presença, proferiu, com data de 10/11/2023, despacho onde considerou que ambos tinham sido interpostos em prazo e por quem tinha legitimidade mas relativamente aos quais se suscitavam dúvidas quanto à admissibilidade da Revista principal, nos termos e para os efeitos do artigo 629.º, número 2, alínea c) do NCPC, tendo convidado o ilustre Procurador Geral Adjunto colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça, assim como as partes, a pronunciarem-se sobre tal questão, no prazo de 10 dias.


***


O ilustre Procurador Geral Adjunto colocado junto deste Supremo Tribunal de Justiça proferiu, ao abrigo do número 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho o seguinte Parecer, datado de 17/11/2023, que concluiu, no seguintes termos:


«Do acima transcrito é de concluir, e parece-nos que com bastante segurança, que a questão de direito essencial objeto dos arestos não é, de todo, idêntica, o que torna desnecessário apreciar a verificação dos restantes requisitos.


Não se regista, assim, qualquer confronto jurisprudencial na discussão e resolução das situações materiais litigiosas em causa.


Em consequência, afigura-se que o recurso da ré não deverá ser recebido, por falta dos pressupostos previstos no art.º 629.º, n.º 2, al. c), do CPC, o que implica também não o ser o recurso subordinado interposto pela autora, por força do disposto no art.º 633.º, n.º 3, do CPC.


Encontrando-se a admissão dos recursos por apreciar, cumpre, assim, e neste momento, emitir parecer somente sobre a matéria da sua admissibilidade, a fim de evitar pronúncia inútil, requerendo-se que, oportunamente, e caso venham a ser recebidos, sejam os autos remetidos para prosseguimento da emissão de parecer, nesse caso já quanto à procedência dos mesmos, nos termos do art.º 87.º, n.º 3, do CPT.»


***


Tendo as partes sido notificadas do teor de tal Parecer, veio a Ré pronunciar-se sobre o mesmo dentro do prazo legal de 10 dias, tendo sustentado, para o efeito, a admissão do recurso de revista por si interposto, ao contrário da Autora que veio aderir ao texto de tal Parecer, que defende a rejeição de ambos os recursos.


***


Tendo os autos ido aos vistos, foi prolatado Acórdão, por unanimidade, com data de 10/01/2024, que decidiu nos moldes seguintes:


«Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 679.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Supremo de Tribunal de Justiça em rejeitar, por legalmente inamissível, o presente recurso de Revista interposto, a título principal e ao abrigo do artigo 629.º, número 2, alínea c) do CPC/2013, pela Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA, assim como em não admitir o recurso subordinado interposto pela Autora AA, face ao estatuído no artigo 633.º, número 3 do mesmo diploma legal.


*


Custas dos presentes recursos a cargo da Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA, fixando-se as taxas de justiça em 2 UC - artigos 527.º, número 1 e 633.º, número 3 do Novo Código de Processo Civil.


*


Registe e notifique.»


*


A Ré recorrente, notificada de tal acórdão, veio pedir a retificação de um erro material constante do mesmo, assim como arguir a sua nulidade, nos termos dos artigos 666.º, 614.º e 615.º do NCPC, tendo, para o efeito alegado o seguinte:


«MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, S.A, Ré e Recorrente nos autos supra identificados em que é Autora e Recorrida AA, notificada do Acórdão datado de 10.01.2024 (Ref.ª 12093793), doravante abreviadamente “Acórdão”, vem, ao abrigo do disposto nos artigos 614.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1, alínea b), aplicáveis ao recurso de revista ex vi artigos 666.º e 685.º, todos do Código de Processo Civil, arguir erro material e nulidade do Acórdão e requerer a respetiva retificação do erro e suprimento da nulidade, o que faz nos termos e com os seguintes fundamentos:


I. Enquadramento


a) A alegação de recurso


1. Em 15.06.2023, a Recorrente interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 08.05.2023 (“Acórdão Recorrido”), ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alíneas c) e d) do Código de Processo Civil (“CPC”).


2. O recurso interposto foi admitido por despacho datado de 11.10.2023, apenas com base no fundamento invocado ao abrigo do número 2, alínea c) do artigo 629.º do CPC, tendo sido atribuído efeito devolutivo ao mesmo, remetendo-se posteriormente os autos para o Supremo Tribunal de Justiça.


3. Na alegação que a Recorrente apresentou junto deste Douto Tribunal sustentou-se, sucintamente, o seguinte (vide alíneas C., D., H., K., L., M., N., O., P., Q., R. e S. das conclusões de recurso):


C. Ora, o Acórdão Recorrido está, no domínio da mesma legislação e em relação à mesma questão fundamental de direito em contradição com o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, no âmbito do processo n.º 1148/16.5T8BRG.G1.S1, conforme disposto no artigo 629.º, n.º 1, alínea c) do CPC.


D. A questão fundamental de direito subjacente ao presente recurso é a de saber se as partes podem, por acordo (oral ou escrito), incluir o montante das diuturnidades na remuneração, sendo necessário, para este efeito, a interpretação das disposições constantes na Convenção Coletiva de Trabalho aplicável.


H. Ora, ficou demonstrado que, aquando da celebração do contrato, a Recorrente e a Recorrida celebraram um acordo oral, no sentido de a sua retribuição base ser superior ao somatório da retribuição base prevista na tabela salarial do CCT acrescida de diuturnidades.


K. O acordo oral sobre a inclusão das diuturnidades na retribuição que seja firmado na celebração do contrato de trabalho não contende com o clausulado do CCT, sendo admissível.


L. Assim, e atenta a falta de obstáculos no CCT a uma interpretação no sentido de que as partes podem acordar, oralmente, na inclusão do valor das diuturnidades na retribuição mensal do trabalhador, conquanto que mantenham níveis salariais iguais ou superiores aos previstos, não poderia o Tribunal da Relação do Porto ter decidido que a declaração escrita assinada (posterior) configura uma renúncia a créditos laborais e implica uma diminuição da retribuição.


M. Em bom rigor, a redação da cláusula do CCT permite a interpretação de nem sequer seria necessário acordo entre as Partes para os casos em que a retribuição fosse superior à tabela salarial para a categoria com a inclusão das diuturnidades, uma vez que a cláusula apenas visa garantir que as diuturnidades seriam pagas nos casos do pagamento da retribuição mínima do CCT.


N. Sem prejuízo, o Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão Recorrido, interpretou a cláusula do CCT sobre as diuturnidades como implicando necessariamente a existência de um acordo e obstando a que se firme um acordo oral entre a Recorrente e a Recorrida através do qual se incluiriam as diuturnidades na remuneração base mensal.


O. Assim, por um lado (e não sendo esse o caso em apreço), não se vislumbra do CCT a necessidade de um acordo nos casos em que a retribuição paga é superior à mínima (e na medida, faz-se notar em que a mesma seja ou se mantenha superior à soma da diuturnidade com a categoria mínima salarial do CCT).


P. Por outro, e admitindo-se a necessidade de acordo, não se alcança do elemento literal da cláusula do CCT, o requisito de que o mesmo teria necessariamente de ocorrer apenas no âmbito do contrato de trabalho e não poderia ocorrer através de uma declaração em momento posterior que confirmasse o mesmo.


Q. O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2019 fixou o seguinte quanto à interpretação de Convenções Coletivas de Trabalho: “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros”.


R. Conforme demonstrado, tal interpretação do CCT, é contrária não só à jurisprudência uniformizadora do Supremo Tribunal de Justiça, fixa no Acórdão n.º 1/2019, por não cumprir com as regras de interpretação, como à lei.


S. Em face do exposto, encontram-se preenchidos os requisitos de admissibilidade do presente recurso de revista previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea c), do CPC.


b) O Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça


4. No Acórdão proferido nos presentes autos por este Douto Tribunal, em 10.01.2024, decidiu-se o seguinte:


De todo o modo, não tendo a Ré recorrente reclamado oportunamente do despacho judicial prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto, não terá este Supremo Tribunal de Justiça, face ao disposto no número 6 do artigo 641.º do CPC/2013 de se pronunciar sobre o (não) preenchimento da alínea d) do número 2 do artigo 629.º do mesmo texto legal.


(…)


Chegados aqui, importa então abordar as questões que, a propósito na alínea d) do número 2 do artigo 269.º do NCPC, se suscitam nos autos (…).


e


Verifica-se, assim, que os dois processos e arestos que aqui estão em contraposição debruçam se sobre questões de facto totalmente distintas, aplicam IRCT distintos e debruçam-se sobre questões jurídicas diametralmente diferentes, não se podendo assim falar em decisões proferidas no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito e contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.


Logo, conforme é sustentado no bem elaborado parecer do magistrado do Ministério Público, não se mostram minimamente verificados os pressupostos de que o legislador faz depender a admissão do recurso que se mostrem elencados na referida alínea c) do número 2 do artigo 629.º do NCPC.”


“Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.º, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 679.º e 663.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, neste Supremo de Tribunal de Justiça em rejeitar, por legalmente inamissível, o presente recurso de Revista interposto, a título principal e ao abrigo do artigo 629.º, número 2, alínea c) do CPC/2013, pela Ré Monte D´Alva – Alimentação, S.A. (…).


II. Do erro material do Acórdão


O presente recurso foi interposto ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alíneas c) e d) CPC.


No entanto, por despacho judicial prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto, este apenas foi admitido com base no fundamento invocado ao abrigo da alínea c).


Tal decisão não admitia recurso, podendo apenas a Recorrente, querendo, impugnar o despacho através da reclamação prevista no artigo 643.º do CPC, o que optou não por fazer.


No teor do Acórdão de 10.01.2024, é feita a referência ao facto deste Tribunal não se poder pronunciar sobre o (não) preenchimento da alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 641.º do CPC.


No entanto, e certamente por lapso manifesto, o Acórdão faz referência ao artigo 629.º, n.º 2, alínea d) do CPC nos seus fundamentos.


Sendo esta fundamentação um claro lapso manifesto do Acórdão, requer-se a Vs. Exas. que se dignem a retificar o Acórdão proferido, fazendo constar a devida norma legal aplicável, a alínea c) do n.º 2 e não a alínea d).


III - Da nulidade do Acórdão por não especificação dos fundamentos de direito que justificam a decisão


O Acórdão ora sob censura é nulo por falta de fundamentação, na medida em que não explicita integralmente os fundamentos de direito que justificam a decisão de não admitir, por legalmente inamissível, o recurso de revista interposto pela Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n. º 1 do artigo 615.º do CPC.


O dever de fundamentação das decisões judiciais tem assento constitucional, decorrendo genericamente da garantia de tutela jurisdicional efetiva e do direito a um processo equitativo reconhecidos no artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa (“CRP”) e com consagração expressa no seu artigo 205.º, n.º 1, no qual se determina que “as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei”.


É indiscutível que a fundamentação das decisões serve para a clarificação e interpretação do conteúdo decisório, favorece o autocontrolo do juiz responsável pela sentença, dá melhor operacionalidade ao heterocontrolo efetuado por instâncias judiciais superiores e, em último termo, contribui para a própria justiça material praticada pelos tribunais.


No CPC, a falta de fundamentação é fonte de nulidade da sentença, nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, al. b), constando igualmente o dever de fundamentar as decisões judiciais do seu artigo 154.º.


Ora, verifica-se que o Douto Tribunal não cumpriu integralmente o dever de fundamentação que sobre si impendia.


Senão vejamos,


Após as considerações acerca do entendimento sustentado pela Recorrente e do entendimento defendido pela Recorrida, inicia o Tribunal a sua apreciação sobre a admissibilidade do recurso em revista apresentado pela Recorrente.


O Acórdão começa por evidenciar que o Acórdão Uniformizador foi proferido no quadro de uma ação de interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho, onde se avança com uma interpretação jurídica de uma ou mais cláusulas de uma dada convenção coletiva de trabalho.


Evidencia também que parte das alegações da Recorrente assentam no sumário e fundamentação elaborado para o Acórdão Uniformizador, quando este não fixa qualquer jurisprudência uniformizada “quanto ao critério geral de interpretação de cláusulas dos Contratos Coletivos de Trabalho”.


Versando, antes e apenas, sobre a interpretação jurídica de uma particular cláusula, integrada numa específica convenção coletiva, que nada tem a ver com a área de atividade em discussão nos presentes autos.


Concluindo que, os dois processos em contraposição se debruçam sobre questões jurídicas diferentes, não se podendo considerar como decisões proferidas no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito e contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.


Por esse motivo, entendeu o Douto Tribunal que não se mostram verificados os pressupostos de que o legislador faz depender a admissão de recurso que se mostram elencados na alínea c) do n.º 2 do artigo 269.º do CPC.


Salvo o devido respeito, não assiste qualquer razão a este Douto Tribunal ao pretender restringir o âmbito de aplicação do Acórdão Uniformizador apenas à concreta convenção coletiva em análise.


Contrariamente ao que foi o entendimento deste Tribunal, o Acórdão Recorrido encontra-se em efetiva contradição com o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, no âmbito do processo n.º 1148/16.5T8BRG.G1.S1., nos termos e para os efeitos do artigo 629.º, n.º 1, alínea c) do CPC.


Com efeito,


É verdade que os acórdãos uniformizadores de jurisprudência prolatados ao abrigo do artigo 183.º do Código de Processo de Trabalho (“CPT”) unificam a jurisprudência em relação à interpretação das cláusulas da concreta convenção coletiva aplicável.


No entanto, não podemos concordar com o entendimento de que tal julgamento aplicado ao Acórdão Uniformizador não possa ser aplicável a outras convenções coletivas.


É exatamente por tais acórdãos decorrerem de uma específica forma de conformação da vontade jurisdicional, para promoção da coerência jurisprudencial, que tal entendimento não deve ser sufragado.


A solenidade do julgamento, a qualidade dos seus protagonistas, a valia da fundamentação e o respeito generalizado que as instâncias têm vindo a demonstrar pelas soluções uniformizadoras, são factos demonstradores de que um Acórdão Uniformizador nunca poderá ter o seu âmbito de aplicação limitado à concreta convenção coletiva objeto da ação em causa.


O seu contrário deverá ser defendido, pela inerente autoridade e força persuasiva que decorre de uma decisão do Supremo Tribunal de Justiça que deveria, acima de tudo, procurar prevenir conflitos jurisprudenciais.


Deverá uniformizar-se o método jurídico aplicado em casos semelhantes, no enquadramento do mesmo tipo de fonte normativa, em defesa da unidade aplicativa do direito.


Com efeito, o entendimento do Acórdão Uniformizador fixado a final:


“I. A interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho deve obedecer às regras próprias da interpretação da lei, devendo partir-se do enunciado linguístico da norma, ou seja, da letra da lei, por ser o ponto de partida da atividade interpretativa uma vez que através dela se procura reconstituir o pensamento das partes outorgantes desse CCT.


II. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica.” não se encontra, de modo algum, restrito à interpretação das cláusulas constantes do CCT aplicável no caso do Acórdão Uniformizador, celebrado entre a APHP e a FESAHT, publicado no BTE n. 15.º, de 22.04.2010.


O facto de o CCT em análise no Acórdão Recorrido não ser o mesmo do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência em nada prejudica a sua aplicabilidade, não resultando tal proibição dos artigos 183.º e seguintes do CPT.


Aliás, não resulta desta norma que o dispositivo interpretativo propriamente dito seja o único que releve para efeitos uniformizadores.


Pela afinidade de cariz processual e substantivo, deverá ser utilizado o mesmo método interpretativo usado no Acórdão Uniformizador na cláusula do CCT aplicável ao caso dos autos.


Negar tal tratamento igualitário no exercício interpretativo de diferentes cláusulas, embora de convenções coletivas de trabalho diferentes, mas ainda assim onde o pensamento jurídico subjacente é o mesmo, seria admitir que no mesmo ordenamento jurídico, pudessem subsistir tratamentos desiguais por meio de uma interpretação despida dos formalismos necessários e concretizados no Acórdão Uniformizador, só porque não seria de aplicar o mesmo CCT.


Quanto à similitude da questão de direito objeto dos arestos, também neste ponto, e salvo o devido respeito, que é muito, não poderemos subscrever o entendimento do Douto Tribunal no acórdão recorrido.


A questão fundamental de direito subjacente nos autos é a de saber se as partes podem, por acordo, incluir o montante das diuturnidades na remuneração.


Tornando-se necessário, para este efeito, a interpretação das disposições constantes no CCT aplicável para, posteriormente, através da sua aplicação, determinar, se as partes podem, por acordo, incluir o montante das diuturnidades na remuneração.


Tal como resulta do referido Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça “a interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho deve obedecer às regras próprias da interpretação da lei, devendo partir-se do enunciado linguístico da norma, ou seja, da letra da lei, por ser o ponto de partida da atividade interpretativa uma vez que através dela se procura reconstituir o pensamento das partes outorgantes desse CCT.” e ainda “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros”.


O Acórdão Recorrido entendeu que a declaração assinada pela Recorrida em abril de 2016 configurou uma renúncia ao recebimento das diuturnidades, acarretando uma diminuição de retribuição.


Porém,


Não resulta do CCT aplicável ao caso concreto qualquer disposição que obste à celebração de acordos – orais ou escritos – aquando da celebração do contrato de trabalho ou na pendência do mesmo, para inclusão do valor das diuturnidades na retribuição mensal do trabalhador, conquanto que os trabalhadores abrangidos pelo mesmo mantenham níveis salariais iguais ou superiores.


Não existindo qualquer obstáculo a essa interpretação no seu elemento literal, tão pouco resulta alguma objeção do pensamento legislativo subjacente, ou da unidade do sistema jurídico, ou das circunstâncias em que a lei foi elaborada ou até mesmo das condições específicas do tempo em que é aplicada.


Aliás, nada obsta à interpretação de que retribuições superiores poderiam incluir as diuturnidades, desde que superiores à soma de ambas.


Em bom rigor, não resulta do CCT qualquer limitação à interpretação de que seria possível acordar a inclusão de diuturnidades na retribuição sem necessidade de qualquer acordo expresso para o efeito, bastando apenas assegurar que as retribuições sempre seriam superiores às constantes da tabela (com a inclusão das diuturnidades devidas).


Em suma, a questão fundamental do direito subjacente ao presente recurso é, em primeiro lugar, a interpretação da norma do CCT e foi exatamente neste ponto que o Acórdão Recorrido apenas atentou ao elemento literal para interpretar a norma aplicável às diuturnidades.


De igual modo, no Acórdão Uniformizador, a questão essencial de direito discutida também se centrava na definição e aplicação das regras de interpretação das disposições constantes de um contrato coletivo, determinando o sentido de uma cláusula necessária para resolução de um conflito.


Neste Acórdão, discutia-se uma interpretação efetuada pelo Tribunal da Relação de Guimarães, interpretação, exclusivamente, ao elemento literal da norma, não tendo valorizado os elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica da mesma.


Foi nesse sentido que o Acórdão Uniformizador veio afirmar que: “Deve a interpretação da convenção coletiva de trabalho seguir as regras da interpretação da lei [artigos 9.º e 10.º, do Código Civil] ou as regras da interpretação do negócio jurídico [artigos 236.º e 239.º, também do CC]?”.


E fixou que: “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros” e “Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica.”


Conclui-se que tanto no Acórdão Recorrido como no recurso do Acórdão Uniformizador, existiu uma interpretação exclusiva do elemento literal das correspondentes normas aplicáveis, por parte do Tribunal, quando, para a correta aplicação das disposições dos respetivos CCT, seria necessário proceder à interpretação das mesmas, analisando todos os elementos fornecidos.


Não estando, assim, limitada a questão essencial do Acórdão Uniformizador à simples apreciação sobre como deve ser efetuada a reclassificação e progressão dos auxiliares de ação médica.


Pois atento o teor dos dois Acórdãos, em ambos os casos o objeto do recurso versou sobre regras de interpretação de cláusulas de convenções coletivas.


Não sendo possível concluir se não que os dois processos em contraposição se debruçam sobre a mesma questão fundamental de direito: a definição e aplicação das regras de interpretação das disposições constantes de um contrato coletivo, determinando o sentido de uma cláusula necessária para resolução de um conflito.


Sem prejuízo, o Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão Recorrido, interpretou a cláusula do CCT sobre as diuturnidades como implicando necessariamente a existência de um acordo e obstando a que se firme um acordo oral entre a Recorrente e a Recorrida através do qual se incluiriam as diuturnidades na remuneração base mensal.


Tal interpretação do CCT, é contrária não só à jurisprudência uniformizadora do Supremo Tribunal de Justiça onde se fixa os fatores interpretativos a ter em conta no exercício interpretativo de normas de convenções coletivas de trabalho, ou seja, por não cumprir com as regras de interpretação constantes do artigo 9.º do Código Civil (“CC”), como é ainda contrária à letra da lei.


Na verdade, e como refere o referido Acórdão Uniformizador “No domínio da interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho deve-se atribuir uma importância acrescida ao elemento literal, pois a letra do acordo é o ponto de partida e a baliza da interpretação.”


Ora, a letra do clausulado, não só permite a inexistência de acordo (conquanto que o valor da remuneração pago seja superior ao valor da diuturnidade e salário), como permite a celebração de acordos (orais ou escritos) sobre a matéria que garantam o desiderato do pagamento de montantes superiores aos previstos no CCT.


Como tal, o acordo celebrado entre a Recorrente e a Recorrida e confirmado posteriormente com uma declaração da Recorrida não configura uma renúncia ao recebimento das diuturnidades e muito menos acarretou uma diminuição da sua retribuição, antes pelo contrário.


É evidente que o Tribunal da Relação do Porto não atendeu ao estipulado no artigo 9.º do CC para interpretar a cláusula do CCT aplicável e bem assim o acordo celebrado entre a Recorrente e Recorrida, em abril de 2016.


Como tal, o Acórdão Recorrido está em contradição com a jurisprudência uniformizadora do Supremo Tribunal de Justiça, fixa no Acórdão n.º 1/2019 e com as disposições do CC, no que concerne à interpretação do clausulado de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho.


Toda a fundamentação do Acórdão se centra no facto do Acórdão Uniformizador não fixar qualquer jurisprudência uniformizadora “quanto à interpretação de Convenções Coletivas de Trabalho, versando sobre uma questão jurídica totalmente diferente da discutida no presente caso”, no entanto – e salvo o devido respeito - ignorando, por completo, a fundamentação de direito existente que sustenta o contrário, uma vez que as duas situações em apreço trata-se da mesma realidade.


Ora a (falta de) fundamentação da decisão quanto à matéria de direito que sustenta a proximidade das duas questões, e consequentemente a desconformidade do Acórdão Recorrido com o Acórdão Uniformizador, que pelo presente recurso se impugna, impossibilita à ora Recorrente de compreender os motivos subjacentes à não admissibilidade do presente Recurso.


Face ao exposto, vem a Recorrente, arguir a nulidade da sentença por falta de fundamentação decorrente da omissão parcial de indicação pelo Tribunal dos fundamentos de direito pelos quais o Tribunal considerou o presente Recurso inadmissível.


O objetivo último da fundamentação das decisões judiciais é a compreensão e conformação com as mesmas pelos seus destinatários (as partes), objetivo que, com os termos da decisão do Tribunal, não foi cumprido no presente processo, devendo, em consequência, declarar-se a nulidade do Acórdão, por falta de fundamentação, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 1 alínea b) do CPC e por violação da garantia fundamental do acesso à justiça e do direito a uma justiça efetiva, assegurados pelos artigos 20.º e 205.º da CRP e consequentemente, por se encontrarem preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso de revista previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea c), do CPC, ser admitido o presente Recurso.


Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, deve:


(i) Nos termos do artigo 613.º, n.º 2, aplicável ao recurso de revista ex vi artigos 666.º e 685.º do CPC, ser retificado o erro material do Acórdão (vide artigos 614.º, n.º 1, 666.º e 685.º, todos do CPC);


(ii) Nos termos do artigo 613.º, n.º 2, aplicável ao recurso de revista ex vi artigos 666.º e 685.º do CPC, ser suprida a nulidade do Acórdão por não especificação dos fundamentos de direito que justificam a decisão (vide artigos 615.º, n.º 1, alínea b), 666.º e 685.º, todos do CPC);


(iii) Concluir-se, a final, pela admissibilidade do Recurso apresentado pela Recorrente.»


*


A Autora respondeu a tal reclamação dentro do prazo legalmente previsto para esse efeito, nos seguintes moldes:


«O douto Acórdão do STJ foi proferido em 11.01.2024.


A Ré MONTE D'ALVA - ALIMENTAÇÃO, S.A. dispunha de 10 dias para, querendo reclamar ou arguir qualquer nulidade.


O prazo de 10 dias terminou em 25.01.2024.


Logo o requerimento apresentado em 29.01.2024 é extemporâneo.


Acresce que, tanto a reclamação como a arguição de nulidade, estão sujeitas à liquidação prévia de taxa de justiça.


Sabendo disso, a Ré MONTE D'ALVA - ALIMENTAÇÃO, S.A. optou deliberadamente por não liquidar previamente a taxa de justiça!


Por fim, salta à vista que a Ré MONTE D'ALVA - ALIMENTAÇÃO, S.A. litiga de má-fé pois não tem outro objetivo se não o de protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão! (art.º 542.º, n. 2, al. d) do CPC).


Aliás, foi precisamente no dia 29.01.2024 que a Autora requereu a emissão de certidão de trânsito em julgado da decisão (Doc. 1).


Uma horas depois (e não foi mera coincidência), a Ré apresenta o requerimento!


A Ré MONTE D'ALVA - ALIMENTAÇÃO, S.A. atua com dolo intenso, bem sabendo que não tem razão!


A atuação da Ré MONTE D'ALVA - ALIMENTAÇÃO, S.A. não é alheia à conduta dos seus advogados.


Com efeito, a Ré disse que “o tema em causa está a ser acompanhado pelo nosso advogado e aguardamos indicações em relação a próximos passos.” (Doc. 2).


Salta à vista que o próximo passo – isto é, o requerimento apresentado em 29.01.2024 – teve o envolvimento direto dos advogados subscritores – teve o contributo direto dos advogados BB e CC.


Tais advogados sabem perfeitamente que “não [podem] advogar contra o direito, [nem] usar de meios ou expedientes ilegais, nem promover diligências reconhecidamente dilatórias, inúteis ou prejudiciais para a correta aplicação de lei” (art.º 90.º, n. 2, al. a) do E.OA.)


Sabendo disso, não restam dúvidas de que, voluntariamente, quiseram agir daquele modo.


Estamos perante um caso evidente em que os mandatários têm responsabilidade direta (art.º 545.º do CPC).


Diga-se, em abono da verdade, que a interposição de recurso de revista já configura, em si mesma, um mecanismo dilatório que a Ré, em conjunto com os seus advogados, encontrou para protelar o trânsito em julgado do Ac. do TRP.


Não satisfeita, a Ré persiste com um novo requerimento, onde viola as mais elementares regras processuais (prazo de 10 dias e liquidação prévia de taxa de justiça).


*


A este respeito, ANTÓNIO ABRANTES GERALDES [1], recorda que “no âmbito de um recurso de revista n.º 2324-07.7TBVCD.P1.S1, depois de ter sido deduzido incidente de aclaração de natureza claramente dilatória, relatou o signatário no acórdão de 24-4-13:


Justifica-se ainda a condenação do requerente como litigante de má-fé, perante tantas e tão graves falhas de sustentação da sua pretensão e em face da sua atuação processual gravemente negligente.


Com efeito, além de a pretensão carecer de fundamento legal, a atuação do reclamante denota a vontade de evitar o trânsito em julgado e de entorpecer a ação da justiça, nos termos e para efeitos do art.º 456.º do CPC.


Tal comportamento, eivado de culpa grave, não pode ser consentido. Tal como não pode ser consentido que o uso abusivo de expedientes processuais tenha como objetivo o arrastamento do fim de um já longo processo cuja decisão já poderia — e deveria — ter sido estabilizada com a chancela do caso julgado material.


7. Face ao exposto, acorda-se em indeferir a reclamação.


Condena-se o requerente como litigante de má-fé na multa de 7 UC.


Custas incidentais a cargo do requerente, com taxa de justiça de 3 UC.


Mais se consigna que qualquer outro requerimento que porventura seja apresentado pelo A. será tramitado em separado, operando aquilo que está previsto no art.º 720.º, n.º 2, do CPC".


Também neste caso o processo terminou sem mais desenvolvimentos.


Não há dúvida que a única via capaz de pôr termo à conduta da Ré é a sua condenação como litigante de má-fé e a advertência que qualquer outro requerimento que porventura seja apresentado pela Ré deverá ser tramitado em separado.


TERMOS EM QUE,


i) O requerimento apresentado em 29.01.2024 não deve ser admitido por ser extemporâneo;


ii) Deve a Ré ser condenada em multa exemplar pela dedução do incidente;


iii) Deve a Ré, por ter atuado como litigante de má-fé, ser condenada, solidariamente com os advogados BB e CC, em multa e em indemnização exemplar a favor da Autora, a definir segundo o prudente arbítrio do Tribunal.


iv) Ordenar a emissão de certidão com trânsito em julgado da decisão em data anterior a 29.01.2024.


v) Qualquer outro requerimento que porventura seja apresentado pela Ré deverá ser tramitado em separado.


vi) Dever-se-á dar conhecimento à Ordem dos Advogados para que possa aplicar aos advogados BB e CC as sanções disciplinares que tiver por adequadas.»


*


A reclamante, face à resposta da Autora, veio apresentar Requerimento com o seguinte teor:


«MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, S.A, Ré e Recorrente nos autos supra identificados, notificada do requerimento apresentado pela Autora e Recorrida AA, vem expor o seguinte:


1. Salvo o pedido que se encontra agora em apreço, a Recorrente foi exemplarmente absolvida de todos os pedidos apresentados pela Recorrida, tendo sido esses, em particular um deles, o cerne de toda a extensa produção de prova em audiência de julgamento.


2. Em rigor, a condenação da Recorrente em segunda instância no pedido que agora se encontra em discussão resulta, não da (inexistente) prova produzida pela Recorrida – não foi tema a que tenha sido relevância em audiência de julgamento - mas antes, salvo o devido respeito, da pré-convicção formada pelo Tribunal da Relação do Porto sobre uma questão jurídica cuja fundamentação utilizada foi, quase na sua totalidade, totalmente distinta ao inconsequente e omisso argumentário apresentado pela Recorrida sobre a matéria.


3. Tratou-se, portanto, de uma condenação surpreendente, tanto mais que o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto ignorou liminarmente a prova produzida pela Recorrente sobre a matéria e partiu de pressupostos não constantes da fundamentação da Sentença do Tribunal de primeira instância.


4. Neste contexto, e por não concordar com os fundamentos do Acórdão agora proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça que rejeitou a admissibilidade do Recurso interposto pela Recorrente e por ser legalmente admissível nos termos do disposto nos artigos 614.º, n.º 1 e 615.º, n.º 1 alínea b), aplicáveis ex vi artigos 666.º e 685.º, todos do Código de Processo Civil (“CPC”), a Recorrente arguiu erro material e nulidade do Acórdão e requereu a respetiva retificação do erro e suprimento da nulidade, o que, constitui, verificando-se os pressupostos – como é o entendimento da Recorrente –, um direito que processualmente lhe assiste.


5. Para o efeito, a Recorrente dispunha de um prazo de 10 dias úteis, o qual terminava, efetivamente, no dia 25.01.2024.


6. Todavia, nos termos do artigo 139.º, n.º5 do CPC, e independentemente de justo impedimento, qualquer ato pode ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa.


7. Assim, e nos termos do artigo 139.º, n.º 5 do CPC, a Recorrente poderia apresentar a sua resposta até ao dia 30.01.2024.


8. Como tal, tendo a Recorrente apresentado o seu requerimento no dia 29.01.2024, o mesmo não está ferido de extemporaneidade, contrariamente ao indicado pela Recorrida, cujo grosseiro, e salvoodevido respeito, perturbadore embaraçoso desconhecimento do normativo legal relativo à contagem de prazos evidenciado é, naturalmente, alheio à Recorrente.


9. Adicionalmente, a Recorrida alega falsamente que a Recorrente “optou deliberadamente por não liquidar previamente a taxa de justiça.


10. Conforme consta do formulário do CITIUS que antecede o requerimento apresentado pela Recorrente no dia 29.01.2024 (com a Ref.ª 47805348), foi efetuado o pagamento da taxa de justiça e da multa correspondente ao 2.º dia útil subsequente ao termo do prazo, conforme previsto na alínea b) do n.º 5 do artigo 139.º do CPC.


11. Não obstante, e por tal não ter sido percetível ao mandatário da Recorrida, a Recorrente junta como documento n.º 1 os comprovativos do pagamento da taxa de justiça e da multa.


12. Mais alega a Recorrida que a Recorrente apenas apresentou a sua reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça por ter tido conhecimento do requerimento de emissão de certidão de trânsito em julgado da decisão pela Recorrida.


13. Sucede que – e embora seja irrelevante para os presentes efeitos - a Recorrente, nem requer tinha, nem podia ter, conhecimento de tal requerimento até a questão ter sido solicitada pela Recorrida no requerimento a que agora se responde.


14. Aliás, tal requerimento não consta da plataforma CITIUS dos mandatários da Recorrente:





15. O que torna, novamente, manifestamente, evidente, não só o grosseiro desconhecimento do normativo legal sobre a matéria, como a má-fé da Recorrida ao invocar que a Recorrente apenas presentou a sua reclamação – na sua ótica de forma extemporânea e sem pagamento dos custos judiciais devidos, o que já ficou demonstrado que não tem qualquer correspondência coma verdade – para reagir ao requerimento de emissão de trânsito em julgado da decisão pela Recorrida, pela simples razão de tal ter acontecimento no mesmo dia, com algumas horas de diferença.


16. É, mais uma vez, uma alegação da Recorrida lamentável, sem qualquer sentido e completamente deslocada do âmbito de um processo judicial, não se alcançando a sua real motivação, à qual, a Recorrente apenas reage por dever de patrocínio.


17. A Recorrente desconhece, portanto, a justificação para as reiteradas teorias efabuladas da Recorrida sobre as intenções da Recorrente neste processo, todavia, e salvo o devido respeito, entende que as mesmas possivelmente são apenas manifestações de um compreensível descontentamento da Recorrida pelo eventual desfecho final do processo, o qual se encontra bem longe do peticionado e do anunciado como sendo inevitável.


18. Por último, e embora não seja necessário sublinhar, como é evidente os mandatários da Recorrente pretendem, única e exclusivamente, defender os interesses da Recorrida, não podendo ser acusados de recorrer a meios ou expedientes ilegais ou de promover diligências dilatórias simplesmente por não se conformarem com as decisões e fazendo uso dos meios legalmente admissíveis e ao dispor para o efeito, no âmbito do seu patrocínio.


19. Aliás, nem se compreende a alegação da Recorrida ao invocar que o próprio recurso de revista apresentado pela Recorrente já configurou um mecanismo dilatório para protelar o trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto quando a própria Recorrente apresentou recurso subordinado do mesmo Acórdão…


20. Pelo que, resulta evidente que a Recorrente e os seus mandatários não litigam de má-fé, por não verificação dos pressupostos legalmente previstos.


21. Inversamente, não pode a Recorrente deixar de salientar a gravidade da atuação da Recorrida e do seu mandatário - e que não se pode justificar apenas pelo patente desconhecimento das normas - nas (falsas) acusações formuladas ao longo do processo –-, as quais, essas sim, justificariam uma liminar condenação por litigância de má-fé e o acionamento dos mecanismos de sancionamento disciplinar junto da Ordem dos Advogados, o que os mandatários da Recorrente ponderam acionar na sede apropriada para o efeito.


22. Em jeito de conclusão e quanto ao mais, a Recorrente lamenta o infeliz requerimento apresentado pela Recorrida e solicita a melhor compreensão dos Exmos. Venerandos Juízes Conselheiros para a necessidade resposta da Recorrente imposta apenas por dever de patrocínio.»


*


Cumpre decidir, em Conferência.


II – OS FACTOS


Os factos a considerar encontram-se descritos no Relatório do presente acórdão e no aresto aqui arguido de nulidade, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, na parte que releva.


III – OS FACTOS E O DIREITO


A – FUNDAMENTAÇÃO DO ACÓRDÃO RECLAMADO


O Acórdão reclamado possui a seguinte Fundamentação Jurídica:


«É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e 639.º e 635.º, n.º 4, ambos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.º n.º 2 do NCPC).


Importa referir desde já, por força da remissão que o número 6 do artigo 81.º e os números 1 e 2 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho fazem para o regime comum do recurso de revista contido no Código de Processo Civil, em tudo o que não se ache especialmente regulado no Código do Processo do Trabalho [o que nos reconduz fundamentalmente ao disposto nos artigos 80.º e número 3 do artigo 87.º do CPT], que o valor da presente ação, que foi fixado por despacho judicial já transitado em julgado, em € 20.444,79, por ser inferior ao valor da alçada do tribunal da relação [30.000,00 €, de acordo com o disposto pelo artigo 44.º, n.º 1 da Lei da Organização do Sistema Judiciário] sempre obstaria à interposição do recurso de revista ordinário, nos termos e para os efeitos do número 1 do artigo 629.º do CPC/2013 [ou mesmo à interposição do recurso de revista excecional do artigo 672.º do mesmo diploma legal, por, sem prejuízo de não estarmos face a uma situação de dupla conforme, os requisitos gerais desse mesmo número 1 do artigo 629.º também aqui terem de se dar por verificados].


Logo, restava à empregadora lançar mão de qualquer um dos cenários do número 2 do artigo 629.º do NCPC.


A Ré recorrente veio, de facto, invocar, para a interposição do presente recurso de Revista, as alíneas c) e d) do artigo 629.º, número 2 do CPC.


O Tribunal da Relação rejeitou, contudo, o fundamento vertido na alínea d) de tal dispositivo legal, o qual prevê que há sempre recurso “do acórdão da Relação que esteja em contradição com outro, dessa ou de diferente relação, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito e do qual não caiba recurso ordinário por motivo estranho à alçada do Tribunal, salvo se tivesse sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme”.


Conforme se referiu, o valor da causa é inferior ao valor da alçada, não estando assim preenchido o pressuposto geral do valor da causa, pelo que não estamos perante um caso em que o recurso não seja admitido “por motivo estranho à alçada”.


De todo o modo, não tendo a Ré recorrente reclamado oportunamente do despacho judicial prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto, não terá este Supremo Tribunal de Justiça, face ao disposto no número 6 do artigo 641.º do CPC/2013 [e até por confronto com o teor do seu número 5, quando ao despacho de admissão do recurso, que não vincula, em regra, o tribunal superior] de se pronunciar sobre o (não) preenchimento da alínea d) do número 2 do artigo 629.º do mesmo texto legal.


A Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA/AA veio, nessa medida, interpor recurso de revista ao abrigo apenas do disposto no artigo 629.º, número 2, alínea c) do Código de Processo Civil de 2013, que reza o seguinte: «2 - Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso: […] c) Das decisões proferidas, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.»


O [alegado] Acórdão Uniformizador de Jurisprudência que a recorrente considera ter sido violado pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, que aqui é objeto deste recurso de Revista, é o Acórdão n.º1/2019, que foi proferido no quadro de uma Ação de Interpretação de Cláusulas de Convenções Coletivas de Trabalho, que segue a tramitação e a forma de processo especial, conforme previstas nos artigos 4.º e 183.º e seguintes do Código de Processo do Trabalho, remetendo o artigo 186.º deste último diploma legal para o regime do recurso ampliado de revista regulado nos artigos 686.º e 687.º do NCPC [2].


Tal Acórdão n.º 1/2019 de 28 de setembro de 2017, publicado no Diário da República n.º 55/2019, Série I, de 2019/03/19, decidiu, em síntese, o seguinte:


«Decidindo:


Pelo exposto, decide-se negar a revista, confirmar o acórdão recorrido e, consequentemente, fixar à cláusula 68.ª, alínea b), do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a “APHP — ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA” e a “FESAHT — FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL”, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 15, de 22 de Abril de 2010, a interpretação que por aquele aresto lhe foi dada, a qual se consigna nos seguintes termos:


«Devem ser inseridos na categoria profissional de auxiliar de ação médica especialista, os trabalhadores oriundos da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que à data de entrada em vigor do contrato coletivo de trabalho (CTT publicado no BTE n.º 15, de 22/04/10) reuniam o requisito referente à antiguidade».


Estava em causa, no âmbito de tal Aresto - que deriva de um recurso de revista extraordinário, que foi convertido pela formação de juízes prevista no número 3 do artigo 672.º do CPC/2013, em recurso ordinário de revista, conforme previsto nos artigos 185.º, número 2, do Código de Processo do Trabalho e 672.º, número 1 do NCPC -, a reclassificação de trabalhadores de um estabelecimento comercial de saúde para tratamento de doentes com e sem internamento, que detinham a categoria de empregado de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise, no âmbito de um determinado Contrato Coletivo de Trabalho e que passaram para a categoria de auxiliares de ação médica por aplicação da cláusula 68.º, alínea b) do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a APHP — ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA e a FESAHT — FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL.


O Acórdão n.º 1/2019 não decorreu assim de um recurso excecional de uniformização de jurisprudência e da emanação por parte do Pleno formado por todos os Juízes-Conselheiros da Secção Social do correspondente Acórdão Uniformizador de Jurisprudência mas antes da propositura da referida ação com processo especial, cuja preparação e proferição do aresto por este Supremo Tribunal de Justiça demandaram a aplicação de alguns dos procedimentos adjetivos finais que se mostram previstos para o recurso com valor ampliado de revista, nos termos dos artigos 186.º do C.P.T. e 686.º e 687.º do NCPC, tendo o pleno da Secção Social decidido por unanimidade no sentido da interpretação que se mostra espelhada na parte decisória do mesmo e que antes reproduzimos a negrito.


O Aresto prolatado ao abrigo do artigo 186.º do Código de Processo do Trabalho geralmente avança com uma primeira e original interpretação jurídica de uma mais ou cláusulas de uma dada convenção coletiva de trabalho [como terá ido o caso do Acórdão n.º 1/2019] mas também nada impede [ainda que não conheçamos nenhum caso, na área laboral] que o Supremo Tribunal de Justiça possa confirmar ou alterar a interpretação jurídica antes consagrada por ele, no âmbito de uma anterior Ação com processo especial de Interpretação de Cláusulas de Convenções Coletivas de Trabalho, obrigando o artigo 186.º do CPT que se publique no Diário da República e do Boletim do Trabalho e Emprego a sua decisão final e respetiva fundamentação, em qualquer um dos casos antes mencionados [muito embora ao legislador interesse fundamentalmente a publicação do Acórdão que procede a uma interpretação distinta da anterior].


LUÍS GONÇALVES DA SILVA, em «Da ação de Anulação e Interpretação de Cláusulas de Convenções Coletivas de Trabalho», Coleção Cadernos Laborais, número 7, Edição do Instituto de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, agosto de 2021, Almedina, páginas 176 e seguintes, refere o seguinte a este respeito:


«I. Estando a cargo dos tribunais a declaração de nulidade, o CPT1999 [3], no quadro do regime especial de impugnação da convenção coletiva, depois da declaração de inconstitucionalidade dos assentos [4] e na esteira da alteração ao anterior Código de Processo Civil [5], limita-se a afirmar, como vimos, que o aresto "... tem o valor ampliado da revista em processo civil..." [6] (artigo 186.º) [7].


A norma em apreço determina, portanto, a força jurídica do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. De facto, tendo por base o CPC 2013 (artigos 682.º e 683.º) [8], a doutrina tem sustentado que os acórdãos de uniformização de jurisprudência,"... apenas valem no processo, não tendo eficácia externa (fora dos tribunais) e interna (dentro dos mesmos)" [9], situação em que ficam "... os tribunais inferiores com total liberdade de adotar posição diferente" [10], pelo que, saliente-se, o regime "...não produz jurisprudência uniformizada estável, atenta a generosa possibilidade de alteração dos acórdãos que tenham essa função" [11].


Trata-se, em suma, de arestos que em virtude de decorrerem de uma específica forma de conformação da vontade jurisdicional "promovem a coerência jurisprudencial" [12], tendo o legislador, como atrás se referiu aquando da citação do preâmbulo do diploma de 1995, apostado na autoridade e força persuasiva decorrente de uma decisão do Supremo [13].


II. É ainda relevante ter presente que a "...exclusão da audiência prévia e da tentativa de conciliação" (artigo 185.º, n.º 2) não preclude o exercício do direito de contratação coletiva no decurso do processo. Na verdade, apesar de a citada norma afastar o recurso àquele mecanismo, as partes outorgantes da convenção coletivas podem, a qualquer momento, celebrar um novo instrumento; tal afirmação mantém-se mesmo após a decisão judicial, cujos efeitos podem ser "paralisados" através do exercício da autonomia coletiva, respeitando, naturalmente, as regras imperativas.


III. Mas terá a decisão do tribunal a mesma força jurídica do que a cláusula apreciada?


Julgamos que face ao prescrito no artigo 186.º do CPT1999, a resposta é negativa. Com efeito, este preceito confere, ao acórdão em causa o "valor ampliado de revista em processo civil" (artigos 686.º e 687.º do CPC 2013), daqui resultando que estamos ante "...um modelo de uniformização de jurisprudência essencialmente configurado segundo um sistema de precedente judicial qualificado, cujo valor «persuasório» para toda a comunidade jurídica radica na especial natureza e particular autoridade do órgão de que dimana - análogo ao que, entre nós, vem sendo...representado, com resultados perfeitamente satisfatórios no plano prático, pelos acórdãos das secções reunidas do Supremo Tribunal de Justiça ..." [14].


Trata-se de, no quadro descrito, uniformizar o conteúdo da fonte convencional em defesa da unidade aplicativa, valor essencial de qualquer ordem jurídica, reiterando-se que nada impede que outro tribunal ou jurisdição se pronuncie de forma diferente.».


Afigura-se-nos mais ou menos óbvio que os Arestos prolatados pelo Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do artigo 186.º do CPT se revestem de características próprias e que o autonomizam e distanciam dos Arestos tirados pelos Plenos das Secções Social, Civil ou Criminal, no âmbito do recurso ampliado de revista ou no quadro do recurso extraordinário de Uniformização de Jurisprudência, não apenas em função da ação de raiz com processo especial que o legislador laboral previu [15], como ainda das normas jurídicas visadas pela pretendida interpretação [cláusulas de convenções coletivas de trabalho, resultantes da negociação coletiva entre as associações sindicais e patronais ou entre as primeiras e grupos de empregadores ou entidades patronais isoladas, privadas ou públicas], como, finalmente, da sua eficácia jurídica restrita e relativa, pois como diz, desde logo, LUÍS GONÇALVES DA SILVA, no excerto antes transcrito, nada obsta a que as entidades subscritoras do instrumento de regulação coletiva de trabalho venham a chegar a um acordo superveniente quanto ao pedido formulado na ação, quer durante a sua pendência, quer mesmo após a prolação do Acórdão pelo STJ, nos termos do artigo 186.º do CPT.


Entendemos, no entanto e como tem sido posição mais ou menos uniforme entre a nossa doutrina e jurisprudência – designadamente, deste Supremo Tribunal de Justiça – que existe, apesar de fundo, uma afinidade, de cariz processual e substantivo, que justifica que se encarem os Arestos proferidos pelo STJ ao abrigo do artigo 186.º do CPT como Acórdãos Uniformizadores da interpretação de uma ou mais cláusulas dos mencionados instrumentos de regulamentação coletiva [ver mesmo o autor citado, obra transcrita, “Ponto 6.4. Efeitos Objetivos”, páginas 179 e 180 e página 204, Ponto II, quanto à possibilidade do STJ, por um lado, se pronunciar quanto à validade de outras cláusulas que não as peticionadas, caso aquelas se encontrem numa relação de dependência face a estas últimas e, por outro, à faculdade de integrar lacunas de interpretação do clausulado convencional].


Ora, a ser assim e não obstante tais especialidades, afigura-se-nos que se pode e deve entender que a referência a “jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça” que consta da parte final da alínea d) do número 2 do artigo 629.º do CPC/2013 deva incluir os Arestos resultantes dos julgamentos ampliados de revista previstos no artigo 186.º do Código de Processo do Trabalho, como será o caso do Acórdão n.º1/2019.


Chegados aqui, importa então abordar as questões que, a propósito na alínea d) do número 2 do artigo 629.º do NCPC, se suscitam nos autos, começando logo por se realçar o seguinte, no que parece ser um equívoco de interpretação da recorrente, dado esta última radicar uma parte das suas alegações no Sumário que foi elaborado para tal Acórdão n.º1/2019 [16] e que consta também do site deste Supremo Tribunal de Justiça, quando o mesmo, em rigor, não fixa qualquer jurisprudência uniformizada “quanto à interpretação de Convenções Coletivas de Trabalho”, quando afirma, no seu Ponto I, que “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros”.


Este trecho transcrito pela Recorrente/Ré como correspondendo ao objeto da “fixação” é, afinal, extraído da fundamentação e do sumário do Acórdão e não do dispositivo interpretativo propriamente dito e que é o único que releva para efeitos uniformizadores, de acordo com o disposto no artigo 186.º do CPT e em função do pedido e da causa de pedir que foram invocados na Petição Inicial e das alegações que vieram a ser depois apresentadas e cuja falta nem sequer tem efeitos cominatórios.


Com efeito, o Acórdão n.º 1/2019 fixa “apenas” o sentido de interpretação da cláusula 68.ª, alínea b) do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a APHP — ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA e a FESAHT — FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL e fá-lo nos termos acima reproduzidos.


Ou seja, o Acórdão n.º 1/2019 não fixa jurisprudência quanto ao critério geral de interpretação das cláusulas dos Contratos Coletivos de Trabalho mas versa antes sobre a interpretação jurídica daquela particular cláusula integrada naquela específica convenção coletiva que foi celebrada, para o setor da saúde, entre aquela concreta Associação de Empregadores e aquela concreta Federação Sindical, que nada têm a ver com a área de atividade, contratação coletiva, entidades celebrantes e clausulado que está em questão nos presentes autos.


Ora, conforme sustenta LUÍS GONÇALVES DA SILVA, obra citada, página 217, no “Ponto 6.6. Efeitos Subjetivos”:


«I. Quando as cláusulas convencionais são invalidadas ou interpretadas os efeitos da decisão têm de abranger - sob pena de criar uma duplicidade de regimes face à convenção em análise - os mesmos destinatários da convenção coletiva. Note-se, aliás, que incidindo a decisão diretamente sobre a fonte, naturalmente que ao conformar os efeitos desta, aquela incluirá todos os destinatários; ou seja, “...esta tomada de posição relativamente à convenção coletiva vale para todos os contratos de trabalho por ela regulados…” [17].


O âmbito dos efeitos erga omnes terá de ter uma conexão com a regra da legitimidade. Com efeito, consideramos que todos os que estiverem excluídos da norma que confere legitimidade não poderão ser abrangidos pela decisão judicial. Não seria coerente, do ponto de vista da unidade jurídica, que um trabalhador ou empregador impedido de agir ou intervir judicialmente fosse abrangido por essa mesma decisão.»


A ser assim, como nos parece óbvio, nunca poderá a Ré recorrente pretender ver aplicada às relações laborais que estabeleceu com os seus trabalhadores – e designadamente com a Autora AA - a referida interpretação jurídica da cláusula 68.ª, alínea b) do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a APHP — ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA e a FESAHT — FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL.


Recorde-se o que a recorrente, nas suas conclusões e a este respeito, alega:


«E. Ora, a Recorrente e a Recorrida celebraram um contrato de trabalho em 01.11.2005 (vd. Ponto D) dos factos provados da sentença), ao qual eram aplicáveis as Convenções Coletivas de Trabalho (doravante “CCT”) celebradas entre a ANIC e o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Comércio de Carnes do Sul, bem como entre a APIC e a FESAHT eram aplicáveis ao contrato de trabalho da Recorrida.


F. Da análise do CCT aplicável, resulta que a Recorrida teria direito a auferir diuturnidades.


G. A Cláusula 40.ª, n.º 1 do CCT entre APIC – Associação Portuguesa dos Industriais de Carnes e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal e outros, publicado no BTE n.º 34/2008 e objeto de Portaria publicada no BTE n.º 8/2009, prevê o seguinte: “Às retribuições mínimas estabelecidas neste contrato será acrescida uma diuturnidade por cada três anos de permanência em categoria sem acesso obrigatório, até ao limite de três diuturnidades, de valor correspondente a 4,1% estabelecido no nível IX do anexo II.»


Verifica-se, assim, que os dois processos e arestos que aqui estão em contraposição debruçam-se sobre questões de facto totalmente distintas, aplicam IRCT distintos e debruçam-se sobre questões jurídicas diametralmente diferentes, não se podendo assim falar em decisões proferidas no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito e contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.


Logo, conforme é sustentado no bem elaborado parecer do magistrado do Ministério Público, não se mostram minimamente verificados os pressupostos de que o legislador faz depender a admissão do recurso [de apelação ou de revista] que se mostram elencados na referida alínea c) do número 2 do artigo 629.º do NCPC.


*


A Autora AA interpôs um recurso subordinado de revista que, por força do não conhecimento do recurso independente da Ré MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA, tem de se considerar caducado, nos termos do número 3 do artigo 633.º do Código de Processo Civil de 2013, muito embora as correspondente custas recaiam sobre a primeira recorrente.


Logo, também não pode este Supremo Tribunal de Justiça conhecer e julgar tal recurso subordinado.


Sendo assim e em conclusão, embora por fundamentos distintos, não se admitem os dois recursos de revista interpostos nos autos.»


**


B – RETIFICAÇÃO DO ACÓRDÃO RECLAMADO


A Ré recorrente vem assacar um erro material ao Acórdão prolatado por este Supremo Tribunal de Justiça no dia 10 de janeiro de 2024, fazendo-o nos seguintes moldes:


«O presente recurso foi interposto ao abrigo do artigo 629.º, n.º 2, alíneas c) e d) CPC.


No entanto, por despacho judicial prolatado pelo Tribunal da Relação do Porto, este apenas foi admitido com base no fundamento invocado ao abrigo da alínea c).


Tal decisão não admitia recurso, podendo apenas a Recorrente, querendo, impugnar o despacho através da reclamação prevista no artigo 643.º do CPC, o que optou não por fazer.


No teor do Acórdão de 10.01.2024, é feita a referência ao facto deste Tribunal não se poder pronunciar sobre o (não) preenchimento da alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, nos termos do disposto no n.º 6 do artigo 641.º do CPC.


No entanto, e certamente por lapso manifesto, o Acórdão faz referência ao artigo 629.º, n.º 2, alínea d) do CPC nos seus fundamentos.


Sendo esta fundamentação um claro lapso manifesto do Acórdão, requer-se a Vs. Exas. que se dignem a retificar o Acórdão proferido, fazendo constar a devida norma legal aplicável, a alínea c) do n.º 2 e não a alínea d).»


Se atentarmos no seguinte excerto do Aresto de 10 de janeiro de 2024, verifica-se que aí se faz menção à alínea d) do número 2 do artigo 629.º do NCPC, quando, manifestamente e como resulta da própria fundamentação jurídica do Acórdão em análise, se quer aí sempre fazer referência à alínea c) do mesmo número e disposição legal, pois somente tal alínea radica o recurso de revista:


«Chegados aqui, importa então abordar as questões que, a propósito na alínea d) do número 2 do artigo 629.º do NCPC, se suscitam nos autos, começando logo por se realçar o seguinte, no que parece ser um equívoco de interpretação da recorrente, dado esta última radicar uma parte das suas alegações no Sumário que foi elaborado para tal Acórdão n.º1/2019 [18] e que consta também do site deste Supremo Tribunal de Justiça, quando o mesmo, em rigor, não fixa qualquer jurisprudência uniformizada “quanto à interpretação de Convenções Coletivas de Trabalho”, quando afirma, no seu Ponto I, que “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros”.»


Sendo assim, nos termos dos artigos 249.º do Código Civil e 685.º, 614.º e 666.º do NCPC, vai deferida a requerida retificação de tal erro de escrita, devendo aí passar a ler-se alínea c) e não alínea d) do número 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil de 2013.


C – ARGUIÇÃO DE NULIDADE DO ACÓRDÃO RECLAMADO


A recorrente e reclamante veio também arguir a nulidade do Aresto do dia 10/1/2024, nos seguintes termos:


«Nos termos do artigo 613.º, n.º 2, aplicável ao recurso de revista ex vi artigos 666.º e 685.º do CPC, ser suprida a nulidade do Acórdão por não especificação dos fundamentos de direito que justificam a decisão (vide artigos 615.º, n.º 1, alínea b), 666.º e 685.º, todos do CPC»


O artigo 615.º, número 1, alínea b) do Código de Processo Civil estatui que “É nula a sentença: b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, ao passo que o artigo 607.º, nos seus números 2 e 3, estatui que «A sentença começa por identificar as partes e o objeto do litígio, enunciando, de seguida, as questões que ao tribunal cumpre solucionar», seguindo-se «os fundamentos, devendo o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes, concluindo pela decisão final.”


Importa esclarecer que segundo a nossa doutrina e jurisprudência, tal nulidade de sentença [aqui encarada em sentido lato] não se satisfaz ou preenche com uma mera insuficiência ou até com uma mais ou menos clara escassez de fundamentação de facto e/ou de direito mas apenas se mostra integrada, nos seus diversos elementos típicos, com a sua falta absoluta [logo, com a inexistência objetiva da especificação dos motivos de facto e de direito que justificam aquela decisão judicial em concreto].


Acerca deste vício de natureza formal que deixámos enunciado, convirá ouvir ainda que no âmbito do anterior regime processual comum, FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA [19], quando afirma o seguinte: “A falta de motivação suscetível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito (…)”, bem como JAIME OCTÁVIO CARDONA FERREIRA [20], ao defender o seguinte: “Omissão dos fundamentos de facto e de Direito que justificam a decisão (cfr. art.º 158.º); não é o mesmo que fundamentação insuficiente, inadequada ou, até, errada (…)”.


Ainda a propósito desta causa de nulidade da sentença, ensina o Prof. ALBERTO DOS REIS, em C.P.C., Anotado, volume V, pág. 140, o seguinte: «(…) Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto (…)».


No mesmo sentido, pronunciou-se o Prof. ARTUR ANSELMO DE CASTRO, em Direito Processual Civil Declaratório, volume III, págs. 141-142, segundo o qual «(…) Também a falta de fundamentação constitui causa de nulidade da sentença, quer a omissão respeite aos fundamentos de facto, quer aos de direito. Da falta absoluta de motivação jurídica ou factual – única que a lei considera como causa de nulidade – há que distinguir a fundamentação errada, pois esta, contendo apenas com o valor lógico da sentença, sujeita-a a alteração ou revogação em recurso, mas não produz nulidade (…)».


Pensamos, face a tal conceituada doutrina e no que concerne à nulidade invocada pela Ré, que o pretenso vício que a recorrente imputa ao Acórdão recorrido não tem qualquer razão de ser, pois tal Aresto mostra-se não apenas suficiente como devidamente fundado e fundamentado, no que concerne às diversas questões que, em termos de admissibilidade do recurso de Revista interposto pela empregadora, tinham de ser previamente apreciadas e julgadas, não havendo, nessa medida, da parte deste Supremo Tribunal de Justiça qualquer obrigação jurídica e funcional de entrar na análise e decisão da matéria de direito que, no fundo, constitui o objeto de tal recurso e que apenas com a sua admissão liminar se justificava fazer, o que não foi o caso dos autos, dado este tribunal superior ter rejeitado a presente Revista [se o fizesse, assistir-se-ia a uma verdadeira inversão lógica e cronológica da abordagem ao recurso por parte deste STJ].


Também não tem qualquer razão a reclamante quando pretende fundar tal falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam o Aresto de 10/1/2024, na circunstância deste STJ ter desconsiderado o Sumário do Acórdão número 1/2019, para efeitos da recondução da situação vivenciada neste processo à alínea c) do número 2 do artigo 629.º do CPC/2013, na parte em que a MONTE D’ALVA – ALIMENTAÇÃO, SA entende que o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto decidiu contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça.


Se olharmos para a parte decisória desse Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça prolatado em 28/9/2017 e publicado apenas no Diário da República 55/2019, Série I de 2019-03-19, no âmbito da ação regulada pelos artigos 183.º a 186.º do Código de Processo do Trabalho, verificamos que aquela se reconduz apenas ao seguinte:


«Decidindo:


- Pelo exposto, decide-se negar a revista, confirmar o acórdão recorrido e, consequentemente, fixar à cláusula 68.ª, alínea b), do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a "APHP - ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA" e a "FESAHT - FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL", publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 15, de 22 de Abril de 2010, a interpretação que por aquele aresto lhe foi dada, a qual se consigna nos seguintes termos:


- «Devem ser inseridos na categoria profissional de auxiliar de ação médica especialista, os trabalhadores oriundos da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que à data de entrada em vigor do contrato coletivo de trabalho (CTT publicado no BTE n.º 15, de 22/04/10) reuniam o requisito referente à antiguidade»


- Custas do recurso de revista a cargo da recorrente.


- Transitado em julgado, publique-se no Diário da República e no Boletim do Trabalho e Emprego, nos termos do artigo 186.º do Código de Processo do Trabalho».


O Sumário - que segundo o número 7 do artigo 663.º do NCPC, aplicável, por força do artigo 679.º do mesmo diploma legal aos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça cabe apenas ao relator do dito Aresto [7 - O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo.] – não se confunde com nem substitui a parte decisória do Aresto.


Bastará pensar em todas aquelas decisões judiciais coletivas que, por não justificarem a elaboração do dito Sumário [como as da anulação de uma Decisão sobre Matéria de Facto com vista à sua ampliação, por razões puramente casuísticas e materiais] não o possuem, não ficando as mesmas, não obstante e por tal motivo, minimamente deficitárias, quer em termos de conteúdo, alcance e sentido, quer em termos de validade e eficácia jurídicas.


Podemos mesmo ir mais longe e admitir cenários em que, por lapso do seu autor [errar, mesmo para os juízes, é humano e compreensível], o Sumário redigido pelo relator não traduz com fidelidade, fidedignidade e objetividade o teor do Acórdão, quer no que toca ao seu julgamento final, como no que concerne à sua fundamentação de facto e de direito.


Será que, segundo a perspetiva da recorrente, deverão as partes e os terceiros a quem, posteriormente, interessar a doutrina sustentada em tal decisão judicial, dar prevalência e citar esses Sumários, em desfavor e prejuízo do que foi efetivamente decidido e argumentado na dita sentença judicial? A resposta a tal dúvida parece-nos óbvia…


Impõe-se repisar, aliás, o que antes já se deixou aventado e que entronca e consiste na finalidade que, para o legislador processual, o Sumário cumpre: o de fazer uma súmula, de uma maneira sintética e organizada por pontos e matérias ou questões, acerca do que de juridicamente relevante e pertinente ressalta da fundamentação – nas suas duas vertentes – de um dada decisão judicial, bem como desta última, enquanto resultado final derivado daquela, quando tal for igualmente pertinente, em sede de tal súmula.


Tal Sumário tem naturalmente uma eficácia interna, no plano do acórdão que visa resumir, no que ele tem de essencial, e em função das partes a quem aquele se direciona primordialmente, mas o seu maior impacto é externo, a nível judiciário, académico, profissional, económico e social, sem olvidar, finalmente, todas as ações judiciais com casos similares ou tangenciais, em que o dito Sumário tem por seus potenciais destinatários os litigantes das mesmas [ainda que, as mais das vezes, por interposta pessoa, como será o caso dos advogados ou dos magistrados do Ministério Público que as patrocinam].


Mas consideremos, ainda assim, a tese sustentada pela recorrente e que nos remete para os dois seguintes Pontos do Sumário do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça com o número 1/2019 e que se reconduzem ao seguinte:


«I. Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros.


II. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica.»


Será que estas duas afirmações, de cariz abstrato e genérico e que são relativamente comuns a muitas outras decisões judiciais - sejam sentenças, sejam acórdãos da 2.ª instância e do Supremo Tribunal de Justiça [21] – têm a virtualidade jurídica de sustentar, só por si, um Aresto proferido ao abrigo dos artigos 183.º a 186.º do CPT?


É óbvio que não, pois só a decisão propriamente dita de interpretação da cláusula do CCT concreta em presença é que lhe dá, verdadeiramente, autonomia, significado e propósito para existir no mundo judiciário e jurídico [- Pelo exposto, decide-se negar a revista, confirmar o acórdão recorrido e, consequentemente, fixar à cláusula 68.ª, alínea b), do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a "APHP - ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE HOSPITALIZAÇÃO PRIVADA" e a "FESAHT - FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL", publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 15, de 22 de Abril de 2010, a interpretação que por aquele aresto lhe foi dada, a qual se consigna nos seguintes termos:


- «Devem ser inseridos na categoria profissional de auxiliar de ação médica especialista, os trabalhadores oriundos da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que à data de entrada em vigor do contrato coletivo de trabalho (CTT publicado no BTE n.º 15, de 22/04/10) reuniam o requisito referente à antiguidade»].


Nessa medida, seria possível caracterizar o aqui impugnado Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, no que de concreto e específico julgou e decidiu, como violador daquelas regras gerais, quando encaradas como integradoras da tal jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça vertida no dito Acórdão n.º 1/2019?


A resposta teria de ser inevitavelmente negativa, pois tais princípios interpretativos das convenções coletivas seriam, em si e só por si, manifestamente insuficientes para sustentar tal contradição entre o Acórdão do STJ n.º 1/2019 e o aqui recorrido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 8/5/2023 e que, muito significativamente, tem o seguinte Sumário:


«I. A retribuição base e as diuturnidades têm, ambas, natureza retributiva, mas são realidades distintas, tendo-se em vista, com as diuturnidades, compensar o trabalhador por estar inserido em categoria profissional sem ou de difícil progressão (este o caso dos autos) ou a ligação do trabalhador à empresa.


II. Se a Autora, ao longo da relação laboral, auferiu apenas a retribuição base, mas se, além desta, deveria ter auferido diuturnidades, a posterior declaração da mesma (assinada volvidos vários anos) e durante a pendência do contrato de trabalho, de que considerava que, naquela (retribuição base), estavam também incluídas as diuturnidades, mas sem que a retribuição base haja sido aumentada do valor correspondente a estas, tal declaração consubstancia diminuição ilícita da retribuição proibida nos termos do art.º 129.º, n.º 1, al. d), do CT/2009.


III. As ajudas de custo e reembolso de despesas não se confundem: nestas, o trabalhador efetua uma concreta despesa cujo valor lhe deverá ser reembolsado/devolvido pelo empregador; naquelas, como o seu nome indica, é pago ao trabalhador um valor que constitui uma ajuda para suportar um custo que o trabalhador, presumida ou previsivelmente, tem ou poderá ter que suportar ao serviço do empregador, como ocorre quando o trabalhador (no caso vendedor) para o exercício da sua atividade tem de efetuar recorrentes deslocações, mas sem que, necessariamente, tenha que haver uma correspondência entre esse valor e o efetivo custo e, até, independentemente da existência desse efetivo custo, apresentando estas, ajudas de custo, alguma semelhança com o subsídio de refeição.


IV. As ajudas de custo não integram a retribuição, salvo se verificar a situação prevista na segunda parte do n.º 2 dos art.ºs 260.º do CT/2003 e CT/2009.


V. Provando o empregador a verificação dos pressupostos justificativos da atribuição das ajudas de custo para alimentação e dormida, concretamente a necessidade de recorrentes deslocações que o trabalhador, vendedor, tem de efetuar para o exercício da sua atividade, cabe a este alegar e provar que as mesmas excederiam o custo normal das despesas que as deslocações presumida ou previsivelmente acarretariam.


VI. Importando apreciar da natureza da relação jurídica existente entre a Autora e Ré no período de 01.03.2004 a 31.10.2005, é aplicável o CT/2003, na sua redação original.» [22]


Sendo assim, como já se afirmou no Aresto deste Supremo Tribunal de Justiça de 10 de janeiro de 2004, os dois processos e arestos que aqui estão [aparentemente] em contraposição debruçam-se sobre questões de facto totalmente distintas [porque emergentes de setores e atividades económicas diferentes], aplicam naturalmente IRCT distintos e debatem questões jurídicas substancialmente diversas, não se podendo assim falar, em rigor e objetivamente, em decisões proferidas no domínio da mesma legislação, sobre a mesma questão fundamental de direito e em que a dos autos vai contra jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal de Justiça [a daquela emanada do Acórdão n.º 1/2019].


Não basta, para o efeito, que se tratem em ambas as decisões de temáticas ligadas à retribuição e às diuturnidades, ainda que em contextos laborais, convencionais e jurídicos que não coincidem entre si – quando não estão mesmo distantes uns dos outros, em todas as vertentes que para aqui importam – para que se entenda estarem satisfeitos os requisitos da alínea c) do número 2 do artigo 629.º do Código de Processo Civil de 2013.


Logo, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, publicado em 10 de janeiro de 2024, não se mostra ferido da arguida nulidade de sentença prevista na alínea b) do número 1 do artigo 615.º do NCPC.


D – CONDENAÇÃO DA RECLAMANTE COMO LITIGANTE DE MÁ-FÉ


A Autora sustenta a existência de má-fé no que toca a esta Reclamação deduzida pela Ré e pede a sua condenação, assim como dos seus ilustres mandatários, como litigantes de má-fé, nos termos do artigo 456.º do NCPC [iii) Deve a Ré, por ter atuado como litigante de má-fé, ser condenada, solidariamente com os advogados BB e CC, em multa e em indemnização exemplar a favor da Autora, a definir segundo o prudente arbítrio do Tribunal.]


A este respeito, importa atentar no que determinam os artigos 456.º e 457.º do Código de Processo Civil e que é o seguinte:


ARTIGO 542.º


(Responsabilidade no caso de má-fé - Noção de má-fé)


1. Tendo litigado de má-fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir.


2. Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:


a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;


b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;


c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;


d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão.


3. Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admitido recurso, em um grau, da decisão que condene por litigância de má-fé.


Artigo 543.º


Conteúdo da indemnização


1 - A indemnização pode consistir:


a) No reembolso das despesas a que a má-fé do litigante tenha obrigado a parte contrária, incluindo os honorários dos mandatários ou técnicos;


b) No reembolso dessas despesas e na satisfação dos restantes prejuízos sofridos pela parte contrária como consequência direta ou indireta da má-fé.


2 - O juiz opta pela indemnização que julgue mais adequada à conduta do litigante de má-fé, fixando-a sempre em quantia certa.


3 - Se não houver elementos para se fixar logo na sentença a importância da indemnização, são ouvidas as partes e fixa-se depois, com prudente arbítrio, o que parecer razoável, podendo reduzir-se aos justos limites as verbas de despesas e de honorários apresentadas pela parte.


4 - Os honorários são pagos diretamente ao mandatário, salvo se a parte mostrar que o seu patrono já está embolsado.


ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES [23], acerca deste instituto da litigância de má-fé e da tipificação dos comportamentos que ao mesmo podem ser reconduzidos, sustenta o seguinte:


«b) Dedução de oposição cuja falta de fundamento se não devia ignorar


(…) O exercício do direito de defesa, normalmente assegurado também pela intervenção do patrono, não admite o uso de qualquer meio. Deve ter subjacente a alegação de factos ou de normas jurídicas de onde seja razoável concluir-se pela razão do demandado. (…)


c) Alteração da verdade dos factos


Um dos deveres processuais que vincula ambas as partes é o da verdade, não sendo legítimo a qualquer delas, de forma consciente ou gravemente culposa, afirmar factos que não sejam verdadeiros, do mesmo modo que é vedada a negação de factos que a parte sabe que são verdadeiros ou em relação aos quais lhe era claramente exigível esse conhecimento.


Embora a adjetivação da “relevância” dos factos apenas surja no segundo segmento da norma, julgamos que também no que concerne à primeira parte não será qualquer alteração da verdade que justificará a cominação legal, exigindo-se igualmente alguma importância no contexto da ação ou da defesa, deste modo se desvalorizando a simples alteração do factualismo inócuo para a ação ou para a defesa. (…)»


Como se decidiu também no acórdão deste mesmo Tribunal da Relação de Lisboa, de 16.12.2003 (texto integral disponível na base de dados do Ministério da Justiça, no endereço http://www.dgsi.pt) “O direito de ação é um dos vários direitos que está compreendido no direito fundamental de acesso aos tribunais (art.º 20.º da C.R.P.). É hoje conceção dominante que o direito de ação é um direito subjetivo autónomo e distinto do direito material que se pretende fazer atuar em juízo, pelo que o seu exercício não está dependente de qualquer requisito prévio de demonstração da existência do direito substancial. Mas para o seu exercício, em concreto, existe uma exigência de ordem moral: é necessário que o litigante esteja de boa-fé ou suponha ter razão. Porque se litiga com má-fé, exerce uma atividade ilícita e, como tal, incorre em responsabilidade civil processual subjetiva com base na culpa (art.º 456.º do C.P.C.), por um exercício abusivo do direito de ação ou de defesa. Fora do caso de litigância de má-fé, quem litiga sem direito, mas o faz convicto de que tem razão substancial, ainda que a não tenha, não comete qualquer ilícito, respondendo apenas objetivamente pelas custas (art.º 446.º do C.P.C.) …”.


Ora, tendo em atenção o regime legal acima transcrito, a interpretação que dele faz a nossa doutrina e jurisprudência e os factos alegados pela Ré, constata-se que a recorrente não apenas veio pedir a retificação de um genuíno erro material na fundamentação do nosso Acórdão de 10/1/2024 como não se nos afigura que se ache suficientemente demonstrado no processo que a conduta adjetiva deixada transcrita e analisada e pela Reclamante [e seus mandatários judiciais] levada a cabo se traduziu numa alteração intencional dos factos constantes dos autos e/ou num uso manifestamente reprovável da via recursória, de maneira a conseguir um objetivo que sabia, à partida, ser claramente inviável e ilegal (admissão deste recurso de Revista ao abrigo da alínea c) do número 2 do artigo 629.º do NCPC, quando tal lhe estava, à evidência e em absoluto, juridicamente vedado).


Logo, muito embora admitamos que a litigância desenvolvida pela recorrente, no quadro desta reclamação e face ao que se havia deixado sustentado no Aresto de 10 de janeiro de 2024, se pode caracterizar como imprudente, atrevida, temerária, também não podemos olvidar que a mesma assumiu uma natureza essencialmente jurídica [que, em nosso entender, consente às partes uma maior abertura e latitude no que se afirma e defende], o que não pode deixar de pesar neste juízo de verificação ou não de um cenário como o previsto no artigo 542.º do CPC/2013 e que, para o efeito e face ao exposto, entendemos não ocorrer no caso concreto.


Sendo assim, atento o que se deixou acima explanado, este Supremo Tribunal de Justiça não condena a Ré, nem os seus ilustres mandatários, como litigantes de má-fé, indeferindo-se, nessa medida, o correspondente pedido deduzido pela Autora .


E - CONCLUSÃO


Logo, pelos fundamentos constantes do Aresto reclamado e deste Acórdão, defere-se apenas à retificação do erro material daquele constante, não se acolhendo já a verificação da nulidade de sentença [Acórdão] imputado ao mesmo pela recorrente, assim como não se considerando que tenha havido da parte desta última e dos advogados uma conduta processual que possa ser qualificada juridicamente como litigância de má-fé.


IV – DECISÃO


Em conclusão e pelos fundamentos expostos, nos termos do número 1 do artigo 83.º do Código do Processo do Trabalho e dos artigos 679.º, 666.º, 614.º e 615.º do Novo Código de Processo Civil, acorda-se, em conferência, em deferir a retificação do erro material indicado pela Recorrente e em indeferir a arguição de nulidade do Acórdão prolatado por este Supremo Tribunal de Justiça no dia 10 de janeiro de 2024.


Custas a cargo da Reclamante – artigo 527.º, número 1 do Novo Código de Processo Civil.


Não se considera que a conduta da recorrente e dos seus ilustres mandatários judiciais, expressa na sua reclamação, possa ser qualificada juridicamente como litigância de má-fé [artigo 542.º do CPC/2013].


Notifique e registe. D.N.


Lisboa, 21 de fevereiro de 2024


José Eduardo Sapateiro (Relator)


Domingos José de Morais


Ramalho Pinto





________________________________________

1. «Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2013, p. 272.» - NOTA DE RODAPÉ DA RESPOTA TRANSCRITA, COM O NÚMERO 1.↩︎

2. Tais disposições legais possuem a seguinte redação:

I – CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO

Artigo 4.º

Anulação e interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho

As associações sindicais e as associações de empregadores outorgantes de convenções coletivas de trabalho, bem como os trabalhadores e os empregadores diretamente interessados, são partes legítimas nas ações respeitantes à anulação e interpretação de cláusulas daquelas convenções.

SECÇÃO VI

Ação de anulação e interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho

Artigo 183.º

Requisitos da petição

1 – Nas ações respeitantes à anulação e interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho, deve o autor, na petição, identificar todas as entidades outorgantes e expor os fundamentos da sua pretensão.

2 – Com a petição é junta cópia do Boletim do Trabalho e Emprego onde esteja publicada a convenção coletiva e oferecida a prova pertinente.

Artigo 184.º

Alegações

1 – Os outorgantes são citados para, no prazo de 20 dias, apresentarem as suas alegações por escrito.

2 – Com as alegações é oferecida toda a prova.

3 – A falta de alegações não tem efeitos cominatórios.

Artigo 185.º

Forma, valor do processo e efeitos do recurso

1 - As ações a que se referem os artigos anteriores seguem, depois dos articulados, os termos do processo comum, com exclusão da audiência prévia e da tentativa de conciliação.

2 - Da decisão final cabe sempre recurso de revista até ao Supremo Tribunal de Justiça.

3 – O recurso da decisão de mérito tem efeito suspensivo.

Artigo 186.º

Valor do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça

O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça sobre as questões a que se refere o artigo 183.º tem o valor ampliado da revista em processo civil e é publicado na 1.ª, Série-A do jornal oficial e no Boletim do Trabalho e Emprego.

I – CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

SECÇÃO III

Julgamento ampliado da revista

Artigo 686.º

Uniformização de jurisprudência

1 - O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça determina, até à prolação do acórdão, que o julgamento do recurso se faça com intervenção do pleno das secções cíveis, quando tal se revele necessário ou conveniente para assegurar a uniformidade da jurisprudência.

2 - O julgamento alargado, previsto no número anterior, pode ser requerido por qualquer das partes e deve ser proposto pelo relator, por qualquer dos adjuntos, pelos presidentes das secções cíveis ou pelo Ministério Público.

3 - O relator, ou qualquer dos adjuntos, propõe obrigatoriamente o julgamento ampliado da revista quando verifique a possibilidade de vencimento de solução jurídica que esteja em oposição com jurisprudência uniformizada, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

4 - A decisão referida no n.º 1 é definitiva.

Artigo 687.º

Especialidades no julgamento

1 - Determinado o julgamento pelas secções reunidas, o processo vai com vista ao Ministério Público, por 10 dias, para emissão de parecer sobre a questão que origina a necessidade de uniformização da jurisprudência.

2 - Se a decisão a proferir envolver alteração de jurisprudência anteriormente uniformizada, o relator ouve previamente as partes caso estas não tenham tido oportunidade de se pronunciar sobre o julgamento alargado, sendo aplicável o disposto no artigo 681.º.

3 - Após a audição das partes, o processo vai com vista simultânea a cada um dos juízes que devam intervir no julgamento, aplicando-se o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 657.º.

4 - O julgamento só se realiza com a presença de, pelo menos, três quartos dos juízes em exercício nas secções cíveis.

5 - O acórdão proferido pelas secções reunidas sobre o objeto da revista é publicado na 1.ª série do Diário da República.↩︎

3. «Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 9 de Novembro, com diversas alterações.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 501↩︎

4. «Ac. do TC. n° 743/96, de 28 de Maio, www.tribunalconstitucional.pt, por violar o artigo 112.°, n.º 6, da CRP, o Tribunal Constitucional decidiu "... declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 2.º do Código Civil, na parte em que atribui aos tribunais competência para fixar doutrina com força obrigatória geral..." Este aresto surge na sequência de três decisões (n.ºs 810/93, de 7 de Dezembro, onde se realiza uma análise histórica, bem como das principais posições doutrinárias sobre o instituto; 407/94, de 17 de Maio; e 410/94, de 18 de Maio, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt) de inconstitucionalidade tiradas em fiscalização concreta (artigo 281.º, n.º 3, da CRP). Sobre a problemática da inconstitucionalidade, ou não, dos assentos, vd., entre outros, como um dos principais defensores da sua inconstitucionalidade CASTANHEIRA NEVES, “O Problema da Constitucionalidade dos Assentos (Comentário ao Acórdão n.º 810/93 do Tribunal Constitucional)”, separata da Revista de Legislação e Jurisprudência, Coimbra Editora, 1994, passtm; em sentido contrário, MENEZES CORDEIRO "Anotação ao Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal de Justiça, de 31 de Janeiro de 1996 - Venda com Reserva de Propriedade; Incorporação de Elevadores: Novo Regime dos Assentos", cit., pp. 307 e ss. Para uma análise da matéria, vd. também TEIXEIRA DE SOUSA "Sobre a Constitucionalidade da Conversão do Valor dos Assentos" cit., pp. 707 e segs., LOPES DO REGO A Uniformização da Jurisprudência no Novo Direito Processual Civil, LEX, Lisboa, 1997, passtm. - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 502↩︎

5. «Trata-se das modificações realizadas ao CPC de 1961 (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 44129, de 28 de Dezembro, com diversas alterações) pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro - artigo 4.º, n.º 2, que revogou o artigo 2.° do CC -, objeto de inovações mediante o Decreto-Lei n.º 180/96, de 25 de Setembro.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 503↩︎

6. «Sobre o julgamento ampliado da revista, vd. LOPES DO REGO “A Uniformização da Jurisprudência no Novo Direito Processual Civil”, cit., maxime, pp. 19 e segs.; TEIXEIRA DE SOUSA, “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, cit., pp. 556 e segs.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 504↩︎

7. «Acontece que acerca da decisão com valor de assento do Supremo Tribunal de Justiça (artigo 180.º do então CPT 1981), que versava sobre a anulação e interpretação de convenções coletivas, o Tribunal Constitucional, nada disse. De facto, o Tribunal Constitucional sobre o assento particular do Direito do Trabalho não emitiu qualquer juízo de valor, uma vez que o julgamento apenas se referia aos assentos que estavam previstos no CPC de 1961, pelo que não tendo sido a questão apreciada ainda estaria, no mínimo, em aberto, cf.. ROMANO MARTINEZ, “Direito do Trabalho”, cit., 2019, pp. 189 e segs., em especial, pp. 191-192. Também COUTINHO DE ABREU, “Os Regulamentos Administrativos em Direito do Trabalho” cit., p. 25, nota 43, afirma – em data anterior ao acórdão do Tribunal Constitucional - que os assentos laborais não colidem, com o artigo 112.°, n.º 6, da CRP, uma vez que não está em causa qualquer preceito legal.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 505↩︎

8. «Correspondem, respetivamente, aos artigos 732.°-A (uniformização de jurisprudência) e 732.º-B (especialidades no julgamento) do anterior CPC de 1961.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 506↩︎

9. «Depois de um amplo desenvolvimento histórico e dogmático, MENEZES CORDEIRO, “Tratado de Direito Civil”, volume I, cit., pp. 622 e segs,, conclui do modo indicado (p. 656).» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 507↩︎

10. «GALVÃO TELLES, “Introdução ao Estudo do Direito”, volume I, cit., p. 93.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 508↩︎

11. «ISABEL ALEXANDRE, "Problemas Recentes da Uniformização da Jurisprudência em Processo Civil", Revista da Ordem dos Advogados, 2000, volume I, p. 161. Vejam-se também, salientando o carácter não vinculativo do acórdão de uniformização, FREITAS DO AMARAL, “Manual de Introdução ao Direito”, volume I, cit., pp. 466, em especial, pp. 471 e segs; ABRANTES GERALDES, "Uniformização de Jurisprudência", AAVV, Colóquio sobre o Novo Código de Processo Civil, 2015, https://www.stj.pt, p.1, invocando o artigo 4.º, n.º 1, da LOSJ 2013, bem como, do mesmo Autor, "Valor da Jurisprudência Cível", cit., pp. 9 e segs; LOPES DO REGO, “A Uniformização da Jurisprudência no Novo Direito Processual Civil”, cit., pp. 10 e segs., em particular, pp. 19-20; COSTA E SILVA, "Uniformazione delia Giurisprudenza nel Diritto Portoghese", cit., pp. 418 e segs., maxime, pp. 441-442; TEIXEIRA DE SOUSA, “Estudos sobre o Novo Processo Civil”, cit., pp. 556 e segs., em especial, pp. 558-559.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 509↩︎

12. «MENEZES CORDEIRO, "Anotação ao Acórdão do Pleno do Supremo Tribunal de Justiça, de 31 de Janeiro de 1996 - Venda com Reserva de Propriedade; Incorporação de Elevadores: Novo Regime dos Assentos", cit., p. 313.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 510↩︎

13. «Escreve a propósito ABRANTES GERALDES, "Uniformização de Jurisprudência", cit., p. 2: "...força persuasiva de tais arestos que é projetada pela conjugação de diversos fatores: a solenidade do julgamento (Pleno das Secções Cíveis), a qualidade dos seus protagonistas e a valia da fundamentação, o que é demonstrado pelo generalizado respeito que as instâncias vêm demonstrando pelas soluções uniformizadoras que acabam por impor-se às polémicas jurisprudenciais que as precedem ou que procuram prevenir", Itálico no original.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 511↩︎

14. «LOPES DO REGO, “A Uniformização no Novo Direito Processual Civil”, cit., p. 19.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 512↩︎

15. Ainda que a redação da lei adjetiva dos artigos 183.º a 186.º, com especial destaque para esta última disposição legal, esteja longe de ser clara e atual, por referência às alterações introduzidas no direito processual geral e comum, quanto ao regime dos recursos e da figura dos acórdãos uniformizadores de jurisprudência.↩︎

16. «Interpretação de Convenção Coletiva de Trabalho – I. Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros. II. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica. III. A cláusula 68.ª, alínea b), do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a «APHP – Associação Portuguesa de Hospitalização Privada» e a «FESAHT – Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal», publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 15, de 22 de Abril de 2010, na parte impugnada [categoria e nível a atribuir aos trabalhadores da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que, à data da reclassificação, têm 8 ou mais anos de antiguidade na categoria] deve ser interpretada da seguinte forma: «Devem ser inseridos na categoria profissional de auxiliar de ação médica especialista, os trabalhadores oriundos da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que à data de entrada em vigor do contrato coletivo de trabalho (CTT publicado no BTE n.º 15, de 22/04/10) reuniam o requisito referente à antiguidade»↩︎

17. «ROMANO MARTINEZ, “Direito do Trabalho”, cit., 2019, p. 192. Também no sentido da eficácia erga omnes da decisão judicial, JOÃO CORREIA, ALBERTINA PEREIRA, “Código de Processo do Trabalho Anotado à Luz da Reforma do Processo Civil”, cit., p. 44 (5); JOANA VASCONCELOS, “Direito Processual do Trabalho”, cit., p. 28.» - NOTA DE RODAPÉ DO TEXTO TRANSCRITO, COM O NÚMERO 609↩︎

18. «Interpretação de Convenção Coletiva de Trabalho – I. Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros. II. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica. III. A cláusula 68.ª, alínea b), do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a «APHP – Associação Portuguesa de Hospitalização Privada» e a «FESAHT – FEDERAÇÃO DOS SINDICATOS DA AGRICULTURA, ALIMENTAÇÃO, BEBIDAS, HOTELARIA E TURISMO DE PORTUGAL», publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 15, de 22 de Abril de 2010, na parte impugnada [categoria e nível a atribuir aos trabalhadores da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que, à data da reclassificação, têm 8 ou mais anos de antiguidade na categoria] deve ser interpretada da seguinte forma: «Devem ser inseridos na categoria profissional de auxiliar de ação médica especialista, os trabalhadores oriundos da categoria de empregada de enfermaria, bloco operatório, esterilização e auxiliar de hemodiálise que à data de entrada em vigor do contrato coletivo de trabalho (CTT publicado no BTE n.º 15, de 22/04/10) reuniam o requisito referente à antiguidade»↩︎

19. Em “Manual dos Recursos em Processo Civil”, Setembro de 2005, 6.ª Edição, Almedina, páginas 52 e seguintes.↩︎

20. Em “Guia de Recursos em Processo Civil – o novo regime recursório civil”, Coimbra Editora, Novembro de 2007, página 54.↩︎

21. Vejam-se, a título de mero exemplo, os seguintes Arestos do Supremo Tribunal de Justiça:

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/11/1994, Processo n.º 004027, Relator: DIAS SIMÃO, publicado em ECLI:PT:STJ:1994:004027.E3 [ASSENTO 1/95 DR I.ª SÉRIE A 04-01-1995, PÁG. 42 A 46], com o seguinte Sumário parcial:

I - Os comandos jurídicos, que emanam das normas de conteúdo objetivo das convenções coletivas de trabalho, são de natureza geral e abstrata, destinando-se a um número indeterminado de pessoas, pelo que podem considerar-se autênticas normas jurídicas sujeitas às regras gerais de interpretação da lei.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/01/2007, Processo n.º 06S2577, Relator: LAURA DIAS LEONARDO, publicado em ECLI:PT:STJ:2007:06S2577.30, com o seguinte Sumário parcial:

I - As convenções coletivas seguem as regras próprias de interpretação e de integração da lei, embora admitindo ponderações subjetivas quando estejam em causa aspetos que apenas respeitam às partes que as hajam celebrado.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/07/2008, Processo n.º 08S1329, Relator: ALVES CARDOSO, publicado em ECLI:PT:STJ:2008:08S1329.D9, com o seguinte Sumário parcial:

I – Na interpretação e integração das normas de carácter regulativo das convenções coletivas, devem seguir-se as regras próprias da interpretação e integração da lei, designadamente, o disposto no art.º 9.º do CC, uma vez que os seus comandos jurídicos são de natureza geral e abstrata e produzem efeitos em relação a terceiros.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/05/2011, Processo n.º 4319/07.1TTLSB.L1.S1, Relator: PINTO HESPANHOL, publicado em ECLI:PT:STJ:2011:4319.07.1TTLSB.L1.S1.63 [DR, I SÉRIE, N.º 112, 9 DE JUNHO DE 2011, P.3087], com o seguinte Sumário parcial:

1. Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros.

2. Na fixação do sentido e alcance de uma norma, a par da apreensão literal do texto, intervêm elementos lógicos de ordem sistemática, histórica e teleológica.

- Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/04/2012, Processo n.º 142/09.7TTCSC.L1.S1, Relator: FERNANDES DA SILVA, publicado em ECLI:PT:STJ:2012:142.09.7TTCSC.L1.S1.65, com o seguinte Sumário parcial:

I – A interpretação das normas de Direito do Trabalho obedece, em geral, aos cânones hermenêuticos constantes do art.º 9.º do Cód. Civil, assim sucedendo concretamente quanto às Convenções Coletivas de Trabalho, na sua vertente regulativa, cuja feição se aproxima das características próprias da Lei (generalidade e abstração, dirigindo-se o seu comando a um número indeterminado de potenciais destinatários).

Quanto à sua componente obrigacional, de conteúdo tipicamente negocial, deverão convocar-se prevalentemente as regras de interpretação dos negócios jurídicos, as constantes dos art.ºs 236.º e seguintes da mesma Codificação, embora, no essencial, não existam diferenças fundamentais entre umas e outras.

II – Representando o enunciado linguístico da norma – a que se deve atender enquanto ponto de partida da atividade interpretativa – apenas o seu conteúdo possível, a tarefa interpretativa seguinte visará descobrir o sentido que está por detrás da expressão utilizada, sempre que esta possa conter sentidos diversos, por forma a eleger a verdadeira significação que se pretendeu conferir-lhe.↩︎

22. Se lermos as alegações de recurso da Ré, facilmente se percebe que ela, a partir dos dois primeiros pontos do Sumário do Aresto do STJ n.º 1/2019, dá um salto lógico para o pleito dos autos com o único e concreto objetivo de introduzir na discussão recursória o litígio concreto dos autos, sob a aparente contradição entre a correta e devida aplicação, em tese e em termos gerais, daqueles princípios interpretativos das convenções coletivas de trabalho e o que havia sido feito, na prática pelos juízes Desembargadores do TRP, no acórdão recorrido, conforme ressalta das seguintes conclusões:

«(i) Contradição com Acórdão Uniformizador de Jurisprudência

C. Ora, o Acórdão Recorrido está, no domínio da mesma legislação e em relação à mesma questão fundamental de direito em contradição com o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, no âmbito do processo n.º 1148/16.5T8BRG.G1.S1, conforme disposto no artigo 629.º, n.º 1, alínea c) do CPC.

D. A questão fundamental de direito subjacente ao presente recurso é a de saber se as partes podem, por acordo (oral ou escrito), incluir o montante das diuturnidades na remuneração, sendo necessário, para este efeito, a interpretação das disposições constantes na Convenção Coletiva de Trabalho aplicável.

E. Ora, a Recorrente e a Recorrida celebraram um contrato de trabalho em 01.11.2005 (vd. Ponto D) dos factos provados da sentença), ao qual eram aplicáveis as Convenções Coletivas de Trabalho (doravante “CCT”) celebradas entre a ANIC e o Sindicato dos Trabalhadores da Indústria e Comércio de Carnes do Sul, bem como entre a APIC e a FESAHT eram aplicáveis ao contrato de trabalho da Recorrida.

F. Da análise do CCT aplicável, resulta que a Recorrida teria direito a auferir diuturnidades.

G. A Cláusula 40.ª, n.º 1 do CCT entre APIC – Associação Portuguesa dos Industriais de Carnes e a FESAHT – Federação dos Sindicatos da Agricultura, Alimentação, Bebidas, Hotelaria e Turismo de Portugal e outros, publicado no BTE n.º 34/2008 e objeto de Portaria publicada no BTE n.º 8/2009, prevê o seguinte: “Às retribuições mínimas estabelecidas neste contrato será acrescida uma diuturnidade por cada três anos de permanência em categoria sem acesso obrigatório, até ao limite de três diuturnidades, de valor correspondente a 4,1% estabelecido no nível IX do anexo II.

H. Ora, ficou demonstrado que, aquando da celebração do contrato, a Recorrente e a Recorrida celebraram um acordo oral, no sentido de a sua retribuição base ser superior ao somatório da retribuição base prevista na tabela salarial do CCT acrescida de diuturnidades.

I. Não se tendo revelado necessário reduzir a escrito os pressupostos para a definição da remuneração mensal da Recorrida, porquanto os mesmos foram discutidos com a Recorrente.

J. O que, nos termos da lei, não só é perfeitamente admissível – à luz da interpretação do CCT e do Código do Trabalho -, como era a prática a Empresa para conseguir recrutar trabalhadores num mercado caracterizado pela escassez de mão de obra, por se traduzir numa proposta mais vantajosa para estes.

K. O acordo oral sobre a inclusão das diuturnidades na retribuição que seja firmado na celebração do contrato de trabalho não contende com o clausulado do CCT, sendo admissível.

L. Assim, e atenta a falta de obstáculos no CCT a uma interpretação no sentido de que as partes podem acordar, oralmente, na inclusão do valor das diuturnidades na retribuição mensal do trabalhador, conquanto que mantenham níveis salariais iguais ou superiores aos previstos, não poderia o Tribunal da Relação do Porto ter decidido que a declaração escrita assinada (posterior) configura uma renúncia a créditos laborais e implica uma diminuição da retribuição.

M. Em bom rigor, a redação da cláusula do CCT permite a interpretação de nem sequer seria necessário acordo entre as Partes para os casos em que a retribuição fosse superior à tabela salarial para a categoria com a inclusão das diuturnidades, uma vez que a cláusula apenas visa garantir que as diuturnidades seriam pagas nos casos do pagamento da retribuição mínima do CCT.

N. Sem prejuízo, o Tribunal da Relação do Porto, no Acórdão Recorrido, interpretou a cláusula do CCT sobre as diuturnidades como implicando necessariamente a existência de um acordo e obstando a que se firme um acordo oral entre a Recorrente e a Recorrida através do qual se incluiriam as diuturnidades na remuneração base mensal.

O. Assim, por um lado (e não sendo esse o caso em apreço), não se vislumbra do CCT a necessidade de um acordo nos casos em que a retribuição paga é superior à mínima (e na medida, faz-se notar em que a mesma seja ou se mantenha superior à soma da diuturnidade com a categoria mínima salarial do CCT).

P. Por outro, e admitindo-se a necessidade de acordo, não se alcança do elemento literal da cláusula do CCT, o requisito de que o mesmo teria necessariamente de ocorrer apenas no âmbito do contrato de trabalho e não poderia ocorrer através de uma declaração em momento posterior que confirmasse o mesmo.

Q. O Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 1/2019 fixou o seguinte quanto à interpretação de Convenções Coletivas de Trabalho: “Na interpretação das cláusulas de conteúdo regulativo das convenções coletivas de trabalho regem as normas atinentes à interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do Código Civil, visto tais cláusulas serem dotadas de generalidade e abstração e serem suscetíveis de produzir efeitos na esfera jurídica de terceiros”.

R. Conforme demonstrado, tal interpretação do CCT, é contrária não só à jurisprudência uniformizadora do Supremo Tribunal de Justiça, fixa no Acórdão n.º 1/2019, por não cumprir com as regras de interpretação, como à lei.

S. Em face do exposto, encontram-se preenchidos os requisitos de admissibilidade do presente recurso de revista previsto no artigo 629.º, n.º 2, alínea c), do CPC.»↩︎

23. Em «Temas Judiciários - 1- Citações e Notificações em Processo Civil. 2 - Custas Judiciais e Multas Cíveis.», Volume I, 1998, Almedina, páginas 303 e seguintes.↩︎