Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
496/22.0PDRT.S1
Nº Convencional: 3.ª SECÇÃO
Relator: LOPES DA MOTA
Descritores: TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES
TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE
REINCIDÊNCIA
MEDIDA CONCRETA DA PENA
Data do Acordão: 04/17/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário :

I. O artigo 25.º do DL n.º 15/93, de 22 de janeiro, remete para a previsão do artigo 21.º, com adição de elementos que atenuam a pena em resultado da verificação de uma diminuição considerável da ilicitude (cláusula geral), em função de circunstâncias referidas exemplificativamente – os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade e a quantidade das substâncias.

II. Torna-se necessária uma avaliação global do facto, nas suas circunstâncias particulares, as quais, no seu conjunto, devem permitir afirmar que as quantidades de estupefacientes detidas, vendidas, distribuídas, oferecidas ou proporcionadas a outrem (atividades que se incluem no tipo fundamental do artigo 21.º), são reduzidas; que a sua qualidade, aí se incluindo o potencial grau de danosidade para os bens jurídicos protegidos, também deverá ser reduzida; que os meios utilizados, o modo e as circunstâncias da ação deverão ser simples, não planeados, não organizados.

III. Configura-se uma situação que as investigações criminológicas identificam como uma típica atividade intermédia de tráfico, entre o «mercado abastecedor» e os vendedores locais, nas suas ramificações finais, essencial ao fornecimento de produtos estupefacientes para satisfação da procura de consumidores habituais de áreas geográficas determinadas, envolvendo vários indivíduos repartindo essa tarefa de abastecimento, organizada nos seus circuitos de comercialização e remunerada para o efeito.


IV. A quantidade de estupefacientes transportada, cocaína e heroína – produtos de elevada danosidade –, e o elevado número de doses individuais que esta proporcionava requeriam meios, planeamento e organização adequados, que foram efetivamente assegurados, de modo a proporcionar a sua venda a outra ou outras pessoas que, remunerando a arguida pela sua atividade, mediante o pagamento de 150 euros pelo transporte, asseguravam o funcionamento da cadeia de transporte e distribuição.

V. Tendo em conta estes fatores, relacionados com o contexto da ação, com o meio utilizado e com a quantidade e qualidade dos produtos estupefacientes, não se identificam elementos de facto que, no seu conjunto, permitam verificar correspondência com os critérios estabelecidos na alínea a) do artigo 25.º, suscetíveis de preencherem a cláusula geral de diminuição considerável da ilicitude.

VI. Na fundamentação da determinação da medida da pena, que não merece qualquer censura, o tribunal a quo, em consideração do disposto nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, levou devidamente em conta as circunstâncias que em concreto se mostram relevantes por via da culpa e da prevenção.

VII. Mostram-se verificados os pressupostos formais e materiais da reincidência exigidos pelo artigo 75.º do Código Penal: o tribunal a quo começou por determinar o limite da pena em função da moldura correspondente ao crime, ambos os crimes são dolosos, correspondem-lhes penas de prisão efetivas superiores e 6 meses, a condenação anterior já havia transitado em julgado quando o crime foi praticado, entre a prática do crime anterior e a prática do crime atual não tinham decorrido mais de 5 anos, e demonstra-se que o arguido deve ser censurado por a condenação anterior não lhe ter servido de suficiente advertência contra o crime.

VIII. Considerando a moldura abstrata da pena estabelecida por virtude da reincidência, mostrando-se ponderados os fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, que, evidenciam elevadas necessidades de prevenção geral, a considerar no limite da culpa, bem como de prevenção especial de ressocialização, não se surpreendem elementos que permitam constituir base de um juízo de discordância relativamente à pena aplicada, de 5 anos e 6 meses de prisão, a justificar intervenção corretiva, improcedendo o recurso.

Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 496/22.0PDPRT.S1

3.ª Secção

ACÓRDÃO

Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça:

I. Relatório

1. AA, arguida, com a identificação que consta dos autos, interpõe recurso do acórdão de ........2023 do tribunal coletivo do Juízo Central Criminal do Porto - ..., Tribunal Judicial da Comarca do ..., que a condenou pela prática, como coautora, sob a forma consumada e como reincidente, de um crime de tráfico e outras atividades ilícitas, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1, 26.º, 75.º, 76.º, do Código Penal e 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de ..., com referência às Tabelas I-A e I-B anexas àquele diploma, praticado em ...-...-2022, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão.

Foram também condenados os arguidos BB, CC e DD, nas penas de 2 anos, 1 ano e 6 meses e 1 ano e 6 meses de prisão, respetivamente, por comparticipação nos mesmos factos.

2. Discordando da qualificação jurídica dos factos, que reputa constituírem o crime de tráfico de menor gravidade, e da medida da pena, que pretende ver reduzida, apresenta motivação, de que extrai as seguintes conclusões (transcrição):

«1 – A conduta da arguida subsume-se à previsão do artigo 25.º do D.L 15/93 de 22-01

2 - E, fundamenta a sua pretensão nas seguintes razões:

3 - A conduta ilícita se subsumir ao dia da detenção e à apreensão do produto estupefaciente indicado no ponto 4 dos factos provados.

4 - Não se ter apurado vendas anteriores.

5- A inexistência de uma estrutura organizativa e/ou a redução do acto ilícito a um único transporte por conta de terceiros, sem recurso a qualquer técnica ou meio especial, dão uma matriz de simplicidade que, por alguma forma, conflui com a gravidade do ilícito.

6- Não se ter apreendido objectos relacionados com o manuseamento e dosagem do produto, tendo o tribunal dado como assente que a arguida iria obter €150,00 como contrapartida do referido transporte.

7 - A determinação da medida da pena parte do postulado de que as finalidades de aplicação das penas são, em primeiro lugar, a tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, a reinserção do agente na comunidade, constituindo a medida da culpa o limite inultrapassável da medida da pena.

8- Na determinação concreta da medida da pena, o julgador atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor do agente ou contra ele (art 71 do C.P.), ou seja, as circunstâncias do complexo integral do facto que relevam para a prevenção e para a culpa.

9 - Ponderada a globalidade da matéria factual provada, a conduta da arguida deveria ser subsumível à previsão do disposto no artigo 25.º, n.º 1, do D.L 15/93 de 22-01.

10 - Face aos critérios legais (artigos 70.º e 71.º) o recorrente deveria ser punida atento às razões aduzidas na motivação do recurso ora interposto, com relevo para o tempo em que decorreu a actividade ilícita, um dia, a sua confissão, capacidade crítica face ao ilícito cometido, apoio familiar, e abstinência do consumo de drogas, em medida não superior a 3 anos e 8 meses de prisão, pena esta deveria ser agravada nos termos do art.º 75.º do C.P. Ainda assim, deveria ser fixada próxima do mínimo legal.

11 - A decisão recorrida violou, nessa parte, os artigos 40.º, 50.º, 70.º e 71.º do C. P.

12 - Sem prescindir, mesmo entendendo que da conjugação dos factos provados e não provados, a conduta da arguida se subsume ao ilícito p.p no artigo 21.º, n.º 1, do DL15/93 de 22-01, haveria que atender ao circunstancialismo favorável apurado, designadamente, o já referido nos pontos 4 a 6 da motivação do recurso, com maior incidência, para a confissão com relevo para a descoberta da verdade material, apoio familiar, ser mãe de 3 filhos menores, manter-se abstinente e ter procurado adquirir competências profissionais no E.P

13- Ademais quer as razões de prevenção geral, quer as razões de prevenção especial se mostram atenuadas, na medida em que, a arguida admitiu a sua conduta, revela, capacidade crítica pelos actos cometidos, e procurou no decurso da medida de coacção que lhe foi imposta, assumir um comportamento ajustado, o que permite fazer um juízo de prognose favorável, quanto ao seu comportamento futuro. Tal denota, motivação por parte da arguida em querer alterar a sua trajectória de vida, que, se apoiada tecnicamente, poderá ser determinante na integração social da mesma. O crime cometido, foi ocasional, não teve continuidade no tempo, sendo que, o bem jurídico protegido, saúde pública, foi no caso em apreço, violado mas de forma muito menos grave, se se apurasse que a conduta do arguido era feita de uma forma regular e prolongada no tempo.

A arguida não era visada na investigação, a sua detenção foi ocasional e resultou de uma operação policial de rotina. O comportamento integra a forma mais simples do ilícito- detenção e transporte por conta de um terceiro. Não detinha consigo, objectos ligados ao doseamento do produto, sendo que, também não lhe foram apurados quaisquer sinais de riqueza.

14 - Pelo que, se entende, que ainda que seja mantido o enquadramento jurídico da sua conduta ilícita, agravado pela reincidência, o tribunal não deveria fixar uma pena superior ao mínimo legal

15 - A decisão recorrida violou, nessa parte, os artigos 40.º, 70.º e 71.º, do C. P.

Pelo que, deve ser revogada nos termos sobreditos.»

3. Respondeu o Ministério Público, pela Senhora Procuradora da República no tribunal recorrido, concluindo pela improcedência do recurso, nos seguintes termos:

«1. Em relação a arguida, ora recorrente, a imagem global dos factos não permite concluir pela considerável diminuição da ilicitude dos factos.

2. A nosso ver, considerando a quantidade de produto estupefaciente apreendido à arguida, ora recorrente, o tribunal a quo fez a qualificação correta dos factos dados como provados ao integrá-los nos elementos constitutivos do tipo legal de crime de tráfico, previsto e punido pelo artigo 21.º do DL 15/93.

3. As exigências de prevenção geral são elevadíssimas no que se refere ao referido crime de tráfico de estupefacientes e no que concerne à arguida AA são igualmente elevadíssimas as exigências de prevenção especial uma vez que a mesma é reincidente.

4. Tendo em atenção a moldura penal abstrata do tipo legal de crime de tráfico previsto e punido pelo artigo 21.º do DL 15/93, as apontadas exigências de prevenção geral e especial, afigura-se-nos que a pena aplicada à arguida, ora recorrente, foi adequada e proporcional e deverá ser mantida.»

4. Recebidos, foram os autos com vista ao Ministério Público, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 416.º, n.º 1, do CPP, tendo o Senhor Procurador-Geral Adjunto, em concordância com a posição do Ministério Público em 1.ª instância, emitido parecer, também no sentido da improcedência do recurso, acrescentando (transcrição):

«(…)

Mérito do Recurso.

A. - Tipicidade.

(…) com todo o respeito, cremos, mesmo perante o alegado, que a arguida preencheu, pelo seu comportamento, o tipo-de-ilícito de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. na disposição do art. 21.º/1 do DL-15/93, de 22/01, com referência à Tabela I-A anexa, e não na do referido art. 25.º do mesmo diploma legal.

Concretizando.

3. A natureza e quantidade das drogas traficadas (heroína e cocaína);

A ida de ... ao ...;

4. Estes dados, sujeitos a uma valoração autónoma do julgador, através de uma análise lógico-dialéctica complexiva e sob um prisma ético-social, não permitem, razoavelmente, concluir-se por uma acentuada diminuição do desvalor inerente à “imagem global do facto” cometido, de forma que possa enquadrar-se no “padrão de ilicitude que constitui o pressuposto da punição” relativo ao tipo-de-crime do art. 25º/1 do mesmo Decreto-Lei.

5. Na verdade, houvesse tido lucros avultados ou utilizado meios especiais para tal prática e os produtos estupefacientes adquiridos e transportados pela ora recorrente tivessem sido difundidos por uma área geográfica extensa ou por algumas dezenas de consumidores, e teria integrado a tipologia do crime agravado (cfr, o art. 24º do mesmo diploma legal);

Pelo que se concorda com a avaliação e ponderação nesta sede realizada pelo Colectivo.

6. Veja-se, nesta matéria, o Ac. do STJ de 21.12.2022, 77/20.2PEVIS.C1.S1:

“I – A análise dos tipos legais de tráfico de estupefacientes não deve ser dicotómica, apenas entre o tipo fundamental de ilícito (art. 21.º/1, DL 15/93) e o tipo privilegiado em razão da menor gravidade do facto (art. 25.º DL 15/93), mas estender-se ao art. 24.º, que prevê um tipo agravado de tráfico de estupefacientes, abrangendo situações de especial ilicitude do facto. Mesmo o art. 21.º deve ser considerado na sua completude, pois tem um âmbito de aplicação alargada, com agravação (nºs 2 e 3) e atenuação (n.º 4) de penas. Só uma ponderação global fornece uma visão integrada da resposta legislativa ao fenómeno do tráfico de estupefacientes: o tipo fundamental de tráfico no art. 21.º/1, um tipo de crime privilegiado no art. 25.º, e um tipo de crime qualificado no art. 24.º.

II – O tipo privilegiado de tráfico de menor gravidade (art. 25.º) pressupõe uma dimensão da ilicitude do facto, consideravelmente menor do que a ínsita no tipo fundamental (art. 21.º), enquanto o tipo qualificado, exigindo em regra uma ilicitude maior que a pressuposta no art. 21.º, beneficia de uma indicação taxativa de situações passíveis de integrar o tipo qualificado

III – Os pressupostos de aplicação da norma (art. 25.º) respeitam, todos eles, ao juízo sobre a ilicitude do facto, uns à própria ação típica (meios utilizados, modalidade, circunstâncias da ação), outros ao objeto da ação típica (qualidade – percentagem de presença do princípio ativo – ou quantidade do estupefaciente), pelo que não relevam, como diminuindo a ilicitude, fatores atinentes ao juízo sobre a culpa, quer relativos ao desvalor da atitude interna do agente, ou à sua personalidade. Nas contas da correta ou incorreta subsunção jurídica da conduta apurada não entram os antecedentes criminais do arguido, os períodos de tempo de prisão que já cumpriu e as suas modestas condições de vida.

IV – A menor ilicitude afere-se pela ponderação dos meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, o número de pessoas a quem foi realizada a venda, distribuição, cedência etc., ou o número de vezes em que tal ocorreu em relação à mesma pessoa.”

Não foi violado o disposto nos arts. 21.º/1 e 25.º do DL-15/93, de 22/01.

Medida da pena.

7. Diz, no essencial, a recorrente, em jeito de conclusão:

“Na verdade, a arguida confessou integral e sem reservas os factos, tendo em conta que foram estes que o tribunal deu como provado.

A sua confissão foi relevante para a descoberta da verdade material, uma vez que, todos os arguidos se remeteram ao silêncio.

Basta ler a motivação da decisão, para percecionar que a factualidade dada como provada, sustenta-se em grande parte nas declarações da arguida.

6 – A arguida mantém-se abstinente de consumo, estando a ser apoiada em termos psiquiátricos, mantém apoio do agregado familiar e tem 3 filhos de tenra idade, consta do relatório social, que o arguido manifesta consciência da ilicitude dos mesmos, bem como de eventuais danos que possam causar a terceiros. (…)

10 - Face aos critérios legais (arts 70.º e 71.º) o recorrente deveria ser punido atento ás razões aduzidas na motivação do recurso ora interposto, com relevo para o tempo em que decorreu a actividade ilícita, um dia, a sua confissão, capacidade crítica face ao ilícito cometido, apoio familiar, e abstinência do consumo de drogas, em medida não superior a 3 anos e 8 meses de prisão, pena esta deveria ser agravada nos termos do art 75.º do C.P.

Ainda assim, deveria ser fixada próxima do mínimo legal.”

8. Ou seja, de concreto, apenas poderia alegar:

A confissão;

A integração familiar.

9. Contrapomos nós, todavia, que as concretas circunstâncias da prática do crime, com relevância ao nível da formulação dos juízos de ilicitude e de culpa (que constam dos factos-provados e são ponderadas na douta fundamentação) – valoradas, pois, à luz dos critérios tipológicos previstos na disposição do art.º 71.º do Código Penal para a determinação da pena –, permitem a conclusão de que a pena concretamente aplicada (05 anos e 06 meses de prisão), se mostra, adentro da sua moldura abstracta, com a reincidência (05 anos e 04 meses a 12 anos de prisão), justa e criteriosa, dando expressão acertada ao princípio da culpa e às exigências da prevenção geral e especial (adequação e proporcionalidade).

10. Há, efectivamente, em vista das finalidades de prevenção (adentro da moldura da culpa), limites mínimos da punição que não devem ser ultrapassados, mesmo perante os ditames da ressocialização, sob pena de intolerável e perniciosa inversão de toda a lógica do sistema jurídico-penal.

11. Concretizando:

A amplitude da moldura penal abstracta;

A natureza (heroína e cocaína) e quantidade da droga adquirida, detida e transportada;

É o facto-crime (com seu desvalor ético-social) – e não a pessoa do seu agente, seu sujeito necessário – o que se revela como a primeira e decisiva etiologia do Direito Penal;

Foi aplicada pena a raiar o limite mínimo da moldura abstracta;

A confissão – que não foi integral em sem reservas, como é alegado, revelou-se, acima de tudo, como uma categoria e uma estratégia processual-penal, dada a prova claramente incriminatória já antes produzida;

A abstenção de consumos de estupefacientes é algo que é inerente ao estatuto prisional.

Não foi violada a disposição do art.º 71.º do Código Penal.

III. Em síntese:

Em face da questão-de-facto revelada, a arguida preencheu, pelo seu comportamento, o tipo-de-ilícito de “tráfico de estupefacientes”, p. e p. na disposição do art. 21.º/1 do DL-15/93, de 22/01, com referência à Tabela I-A anexa (em reincidência), e não na do referido art. 25.º do mesmo diploma legal (o primeiro, também na sua dicotomia face à disposição do art. 24.º);

O Tribunal “a quo”, ao aplicar a pena, apreendeu e valorou devidamente a natureza e gravidade do facto-crime e a personalidade da arguida, na sua relação dialéctica e expressão ético-social, aplicando uma sanção bem perto do seu limite mínimo abstracto.

Em conclusão:

Motivo por que o Ministério Público dá Parecer que:

Deverá o presente recurso ser julgado não provido e improcedente, sendo de manter os termos da decisão recorrida.»

5. Notificada para responder, nos termos do artigo 417.º, n.º 2, do CPP, a arguida deu por reproduzida a sua motivação de recurso.

6. Colhidos os vistos e não tendo sido requerida audiência, o recurso foi à conferência, para julgamento – artigos 411.º, n.º 5, e 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP.

Apreciando e decidindo.

II. Fundamentação

7. O tribunal a quo julgou provados os seguintes factos:

«A.

1. No dia ... de ... de 2022, AA, BB, CC e DD, aqui arguidos, provindos da cidade de ..., onde residiam, deslocaram-se a esta cidade do ..., mais concretamente ao ..., no veículo automóvel da marca Renault, modelo Clio, com a matrícula AR-..-AB, propriedade dos arguidos CC e DD, que viviam como se fossem marido e mulher.

2. O dito veículo era conduzido pela arguida DD, seguindo ao seu lado o seu companheiro, o arguido CC, seguindo no banco traseiro atrás do lugar do condutor a arguida AA e ao lado desta, o arguido BB.

3. Pelas 17h45min desse mesmo dia, após a arguida DD estacionar aquela viatura na ..., no dito Bairro, os arguidos AA e BB saíram do interior da mesma e dirigiram-se para o interior do ..., tendo a arguida DD aguardado no interior do veículo e o arguido CC no exterior, junto àquele.

4. A arguida AA entregou a indivíduo não concretamente apurado, quantia não concretamente apurada, mas não inferior a 1 000 EUR, dele tendo recebido em troca:

- Vários pedaços de cocaína (éster metílico), com o peso líquido de 61, 770 g, com um grau de pureza de 46, 7 %, que permitiria preparar 961 doses médias individuais diárias;

- 72 embalagens de plástico de heroína, com o peso líquido de 8, 524 g, com um grau de pureza de 25, 6 %, que permitiria preparar 21 doses médias individuais diárias.

5. O arguido BB entregou a distinto indivíduo, também de identidade não apurada, quantia não concretamente apurada, dele tendo recebido em troca vários pedaços de cocaína (éster metílico), com o peso líquido de 6, 628 g, com um grau de pureza de 94, 3 %, que permitiria preparar 208 doses médias individuais diárias.

6. Após, os arguidos AA, BB e CC entraram no veículo acima identificado, ocupando os mesmos lugares.

7. De seguida, a arguida DD reiniciou a marcha do veículo que, pelas 19h20min, circulava na A20, sentido ..., nesta cidade do ....

8. No interior do dito veículo, o arguido BB trazia consigo aqueles pedaços de cocaína que havia adquirido e, por seu turno, a arguida AA trazia consigo aqueles pedaços de cocaína (éster metílico) e colocou, debaixo do tapete traseiro do veículo automóvel, aquela heroína, estupefacientes que havia adquirido.

9. A arguida AA tinha, ainda, na sua posse a quantia de 150 EUR repartida da seguinte forma:

-12 notas de 10 EUR; e

- 6 notas de 5 EUR.

10. A dita quantia era a recompensa dada à arguida AA pela sua deslocação ao ... para adquirir aqueles estupefacientes e transportá-los de volta para ....

11. O arguido CC, no interior do porta luvas daquele veículo automóvel, detinha uma balança de bolso digital, com resíduos de cocaína.

12. A arguida AA agiu sabendo e querendo adquirir, deter e transportar a heroína e cocaína, cujas características, natureza e efeitos conhecia, estando destinadas a serem vendidas por outrem a terceiros, sendo que, quanto ao transporte, agiu de comum acordo e em comunhão de esforços com os arguidos CC e DD.

13. O arguido BB agiu sabendo e querendo adquirir, deter e transportar cocaína, cujas características, natureza e efeitos conhecia e que pretendia, pelo menos em parte, vender a terceiros, no local da sua residência, sendo que, quanto ao transporte, agiu de comum acordo e em comunhão de esforços com os arguidos CC e DD.

14. Os arguidos CC e DD agiram, de comum acordo e em comunhão de esforços com a arguida AA, sabendo e querendo transportar cocaína e heroína adquiridas por esta, cujas características psicotrópicas, natureza e efeitos conheciam, sabendo ainda que estavam destinadas a serem vendidas a terceiros.

15. Os arguidos CC e DD agiram ainda, de comum acordo e em comunhão de esforços com o arguido BB, sabendo e querendo transportar cocaína adquirida por este, cujas características psicotrópicas, natureza e efeitos conheciam, sabendo ainda que estava destinada a ser vendida a terceiros.

16. Agiram livre e conscientemente, sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.

B.

I.

17. À data dos factos, a arguida AA vivia sozinha, desde outubro de 2022, na referida morada, apartamento de tipologia 2, em seu nome, inserido num aglomerado de habitações camarárias caracterizado pela elevada incidência de fenómenos relacionados com o crime, sobretudo, tráfico de estupefacientes, e com o consumo de drogas.

18. AA estava destituída de uma atividade ocupacional estruturada. Era comum dormir durante o dia e à noite socializar com o grupo de pares.

19. Sem rendimentos próprios, era a progenitora quem se responsabilizava pela manutenção da arguida, bem como pelas despesas e renda da habitação. O pai de AA está reformado por invalidez, auferindo uma reforma no valor de 800 EUR mensais, e à mãe é-lhe atribuído os montantes referentes ao abono dos filhos da arguida.

20. Em momento anterior aos factos e que corresponde ao período em que foi colocada em liberdade condicional, em ...-...-2021, AA integrou o agregado dos pais, com residência à Rua ..., conforme imposição de obrigações e regras de conduta vertidas na decisão judicial do Tribunal de Execução das Penas do .... A sua saída da casa dos pais está relacionada com o facto de sentir que os seus movimentos eram demasiadamente controlados por aqueles, pelo que, terminado o período da liberdade condicional, que se estendeu até ...-...-2022, mudou-se para a sua casa.

21. Os progenitores mantiveram a guarda dos três descendentes da arguida, com idades compreendidas atualmente entre os 4 e os 16 anos, com os quais AA continuou a privar mesmo após ter alterado a sua morada. O cônjuge, EE, cumpria pena de prisão, situação que ainda se mantém.

22. Apesar de a arguida cumprir com as suas funções e responsabilidades parentais, AA evidenciava dificuldade na relação com o filho mais velho, que não aceitava a autoridade da arguida.

23. Enquanto manteve acompanhamento pelos serviços de reinserção social, AA correspondeu às convocatórias para entrevistas. Foi encaminhada para o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP), tendo iniciado, em ...-...-2021, um curso de educação e formação profissional subsidiado com o valor de 320 EUR e que lhe possibilitaria a equivalência ao 6.º ano de escolaridade. Posteriormente, passou a beneficiar também do Rendimento Social de Inserção (RSI), no valor de 177 EUR. Contudo, em ..., desistiu do curso, alegando questões de saúde, nomeadamente sintomatologia depressiva, que implicou no corte daquele benefício pelos serviços da ação social. Em ..., ainda tentou realizar vendas online de vestuário e também em feiras num registo informal.

24. Ao nível da saúde, AA foi encaminhada para o CRI, conforme decisão judicial do TEP. Evidenciou resistência na adesão ao tratamento traduzida em faltas às consultas, tendo sido advertida solenemente pelo tribunal para a “necessidade e obrigatoriedade de cumprir escrupulosamente o acompanhamento clínico, designadamente, comparecendo às consultas e o tratamento terapêutico”. A arguida foi seguida no CRI de Braga até ...-...-2022.

25. Socialmente, a arguida detém uma imagem associada ao cônjuge e à família do mesmo, fortemente conotados com o estilo de vida desviante.

26. AA deu entrada no estabelecimento prisional de ... (feminino) em ...-...-2022 à ordem dos presentes autos.

27. AA beneficia, na medida do possível da visita da mãe e dos filhos mais novos. O filho mais velho e também o pai não a visitam. AA mantém a relação com o cônjuge, EE, cujos contactos são feitos através de videochamadas.

28. Em termos ocupacionais, a arguida desenvolve funções no sector das oficinas. Ao nível da saúde, beneficiou de uma consulta em psiquiatria em ...-...-2023, sendo seguida também em clínica geral.

29. A arguida apresenta diminutas competências pessoais, particularmente formativas e profissionais.

(…)

C.

I.

53. No âmbito do Processo Comum Coletivo n.º 45/14.3PEGMR, do juízo central criminal de ... ..., a arguida AA foi em ...-...-2016 condenada na pena de 3 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos e 6 meses, pela prática desde meados de ... e até ...-...-2015 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de ..., tendo a respetiva decisão transitado em julgado em ...-...-2017.

54. A pena foi declarada extinta pelo decurso do respetivo período (...-...-2020).

55. No âmbito do Processo Comum Coletivo n.º 5/17.2..., do juízo central criminal de ... (... 3), a arguida AA foi em ...-...-2019 condenada na pena de 3 anos de prisão, pela prática entre ... e ...-...-2018 de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de ..., por referência às Tabelas I-A e I-B a ele anexas, tendo a respetiva decisão transitado em julgado em ...-...-2020.

56. Iniciou o cumprimento da pena em ...-...-2020, tendo-se mantida privada de liberdade até ...-...-2021.

57. Na verdade, por decisão de ...-...-2021, no âmbito do processo n.º 607/15.1TXPRT-C, do juízo de execução das penas do ... (... 5), foi concedida à arguida AA a liberdade condicional até ...-...-2022, tempo que lhe faltava então cumprir a título da pena aplicada no referido processo n.º 5/17.2...

58. Por decisão de ...-...-2023 a dita pena foi declarada extinta e cumprida com efeitos reportados a ...-...-2022, assim se convertendo em liberdade definitiva a liberdade condicional concedida.

59. Apesar da condenação sofrida no dito processo e da reclusão sofrida à sua ordem, a arguida AA não sentiu nem interiorizou a advertência ali contida no sentido de não voltar a cometer crimes que, assim, não teve sobre si qualquer efeito dissuasor.

60. Na verdade, a arguida AA voltou a dedicar-se à atividade de tráfico de estupefacientes, ainda que noutra vertente, como forma de obter proventos económicos, praticando os factos em causa nestes autos.

61. No âmbito do Processo Comum Singular n.º 1908/16.7T9GMR, do juízo local criminal de ... (... 2), a arguida AA foi em ...-...-2019 condenada na pena de 100 dias de multa à taxa diária de 5 EUR, pela prática em ...-...-2016 de um crime de denúncia caluniosa, p. e p. pelo art.º 365.º, n.º 1, do C.P., tendo a respetiva decisão transitado em julgado em ...-...-2019.

62. A dita pena de multa foi substituída pela sanção de dias de trabalho que foi cumprida até ...-...-2020.

(…)»

Objeto e âmbito do recurso

8. O recurso tem, pois, por objeto um acórdão proferido pelo tribunal coletivo que aplicou à recorrente uma pena de prisão superior a 5 anos.

Limita-se ao reexame de matéria de direito (artigo 434.º do CPP), não vindo invocados vícios ou nulidades que podem constituir fundamento do recurso [artigo 432.º, n.º 1, al. c), na redação da Lei n.º 94/2021, de ...].

O âmbito do recurso, que circunscreve os poderes de cognição deste tribunal, define-se pelas conclusões da motivação (artigos 402.º, 403.º e 412.º do CPP), sem prejuízo dos poderes de conhecimento oficioso, se for caso disso, em vista da boa decisão do recurso, de vícios da decisão recorrida a que se refere o artigo 410.º, n.º 2, do CPP (acórdão de fixação de jurisprudência n.º 7/95, DR-I, de ........1995), de nulidades não sanadas (n.º 3 do mesmo preceito) e de nulidades da sentença (artigo 379.º, n.º 2, do CPP, na redação da Lei n.º 20/2013, de ...), que não se verificam.

9. Tendo em conta as conclusões da motivação do recurso, as questões colocadas à apreciação e decisão deste tribunal dizem respeito:

(1) À qualificação jurídica dos factos provados, que o recorrente considera preencheram o tipo de crime de tráfico de menor gravidade (artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93) e não o de crime de tráfico p. e p. pelo artigo 21.º do mesmo diploma;

(2) À medida da pena, que pretende ver reduzida ao mínimo legal.

Quanto à qualificação jurídica dos factos [supra, 10(1)]

10. Concluiu o tribunal a quo que se mostra preenchido o tipo legal de crime p. e p. pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de ..., fundamentando a decisão nos seguintes termos (transcrição):

« Segundo o art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de ... cometerá o crime de tráfico e outras atividades ilícitas quem, sem para tal estar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no art.º 40.º, plantas, substâncias ou preparações, compreendidas nas tabelas I a III.

No entanto, segundo o art.º 25.º, do Decreto-Lei n.º 15/93, de ..., será cometido o crime de tráfico de menor gravidade se no caso do art.º 21.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações.

Da exegese do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro e da Convenção das Nações Unidas de 1988 é possível concluir que a incriminação do tráfico de estupefacientes visa proteger diversos bens jurídicos: saúde pública da população, a estabilidade económica, financeira, cultural e política da sociedade e a segurança e soberania do Estado, não sendo defensável a recondução de todos eles a um só bem jurídico aglutinador (cfr. ROCHA, João Luís de Moraes, in “Tráfico de estupefacientes e liberdade condicional”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 10, Fasc. 1.º, Janeiro-Março 2000, Coimbra Editora, pág. 106).

Para a Organização Mundial de Saúde o conceito de saúde corresponde ao “estado de completo bem-estar físico, psíquico e social, e não apenas a ausência de saúde ou enfermidade”. Na medida em que a droga pode afetar o bem-estar físico, psíquico e social de indivíduos de uma sociedade e que a sua presença nessa sociedade só é possível dado o tráfico ilícito, este surge como causa de perigo para a saúde da comunidade, entendida esta como a saúde de uma coletividade de indivíduos (cfr. HUIDOBRO, Rey, in El delito de tráfico de estupefacientes, Barcelona: Bosh, 1987, pág. 119 e segs.; RODRIGUEZ, Prieto, in El delito de trafico y el consumo de drogas en el ordenamento jurídico español, Pamplona: Arazandi, 1993, pág. 209 e segs.).

O tráfico, dado os seus avultados rendimentos ilícitos, mina as bases de uma economia legítima, ameaça a estabilidade, a segurança e a soberania dos Estados (cfr. KOPP, Pierre, in A Economia da Droga, Bertrand, Lisboa, pág. 91 e segs.).

Por outro lado, perante o tráfico ilícito perigam os próprios elos sociais, fundamentos do viver em sociedade (segurança, tranquilidade...).

Por fim, é sabido que o poder económico e as atividades criminosas ligadas ao tráfico ilícito podem assumir tal dimensão que a própria segurança e soberania do Estado seja posta em causa.

No crime de tráfico o legislador estabeleceu a punição das condutas aí especificadas porquanto as considerou em si mesmas perigosas, já que, segundo as regras da experiência comum são aptas a produzir efeitos danosos num número indeterminado de bens jurídicos (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de ... de ... de 1985, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 347, pág. 220).

Ora, desta forma, o crime de tráfico insere-se na categoria dogmática dos crimes de perigo comum já que o perigo que a conduta tipificada encerra constituiu tão só a motivação do legislador para a incriminar, não se tornando necessário que, no caso concreto, tal perigo se materialize já que não está previsto como efeito da ação típica.

Contudo, trata-se, igualmente, de um crime de perigo abstrato, pois não exige o dano nem a verificação, em concreto, de um perigo para qualquer um dos bens jurídicos protegidos com a incriminação, mas apenas a perigosidade da ação para aqueles, visando proteger a sociedade no seu conjunto afastando um fator que, eventualmente, poderia colocar a segurança desta em causa.

No entanto, o art.º 21.º, como tipo matricial que é, onde são elencadas as condutas proibidas, tem no art.º 24.º do citado diploma legal os casos de agravação da pena e no art.º 25.º do referido diploma o tráfico de menor gravidade.

Assim, nos tipos privilegiado e qualificado são elencados os elementos atenuativos ou agravativos que modificam o tipo base, pelo que só a verificação afirmativa desses elementos atenuativos ou agravativos é que permite o abandono do tipo simples (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25 de novembro de 2004, processo 04P3970, in www.dgsi.pt).

Para verificação do tipo atenuado exige a lei que a ilicitude do facto se mostre consideravelmente diminuída, tendo em conta, nomeadamente, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações.

Desde há vários anos o Supremo Tribunal de Justiça vem repetindo que, “(...) o advérbio “consideravelmente”, da cláusula geral, não está lá por acaso. No seu significado etimológico, prevalece a ideia de digno de consideração, notável, grande, importante ou avultado” (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 03-07-1996, in Coletânea de Jurisprudência STJ, Ano IV, Tomo II, pág. 206).

A tipificação do referido artigo 25.º permite ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza (de elevada gravidade considerando a grande relevância dos valores postos em perigo com a sua prática e a frequência desta), encontre a medida justa da punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, fica aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do artigo 21.º do mesmo diploma e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no artigo 25.º.

O crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art.º 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, como a sua própria denominação legal sugere, caracteriza-se por constituir um minus relativamente ao crime matricial, ou seja, ao crime do art.º 21.º, do citado Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro. Trata-se de um facto típico cujo elemento distintivo do crime tipo reside, apenas, na diminuição da ilicitude do facto, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como fatores aferidores de menorização da ilicitude do facto, a título meramente exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação e a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. É, pois, a partir do tipo fundamental, concretamente da ilicitude nele pressuposta, que se deve aferir se uma qualquer situação de tráfico se deve ou não qualificar como de menor gravidade.

Ora, a ilicitude do facto revela-se, essencialmente, no seu segmento objetivo, com destaque para o desvalor da ação e do resultado, pelo que a avaliação deverá ser feita a partir de todas as circunstâncias que, em concreto, se revelem e sejam suscetíveis de aumentar ou diminuir a quantidade do ilícito, quer do ponto de vista da ação, quer do ponto de vista do resultado.

Saliente-se que o legislador incriminou a detenção, o transporte, a cedência, a distribuição e a venda de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas, que será considerado tráfico desde que sobre as mesmas não se prove consumo (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 27 de junho de 1991, in Coletânea de Jurisprudência, Ano XVI, Tomo III, pág. 40).

Perscrutando a matéria de facto provada não se poderá deixar de concluir que a arguida AA adquiriu, detinha e transportou heroína e cocaína, destinadas a serem vendidas por outrem a terceiros, sendo que, quanto ao transporte, agiu de comum acordo e em comunhão de esforços com os arguidos CC e DD, integrando-se aquela na tabela I-A e esta na tabela I-B, ambas anexas ao Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

(…)

Ficou ainda demonstrado que todos agiram da forma descrita sem que para tal estivessem autorizados, agindo com dolo direto (cfr. art.º 14.º, n.º 1, do C.P.). No entanto, enquanto que os arguidos AA e BB conheciam as características dos estupefacientes que cada um deles adquiriu, já quanto aos arguidos CC e DD, embora tenha ficado demonstrado que conheciam as características psicotrópicas, natureza e efeitos dos estupefacientes que transportavam, não ficou demonstrado que soubessem o peso e grau de pureza dos mesmos.

A conduta levada a cabo por todos os arguidos limitou-se a um único dia, estando em causa, quanto a qualquer um deles, estupefaciente que integra as denominadas drogas duras e, assim, de maior lesividade. Contudo, as condutas dos arguidos AA, CC e DD referem-se a dois tipos distintos de estupefacientes, e as condutas do arguido BB apenas a um. (…)

A quantidade de estupefaciente e o número de doses que proporcionaria o adquirido pelo arguido BB é inferior à quantidade e ao número de doses que o adquirido pela arguida AA proporcionaria. No entanto, o grau de pureza daquele é superior ao do estupefaciente da mesma natureza detido pela arguida AA. Para além disso, o custo dos estupefacientes detidos pela arguida AA, bem como os lucros que proporcionariam, não sendo avultados, já eram de relevo, e bastante superiores aos referentes ao estupefaciente detido pelo arguido BB.

Deste modo, afigura-se que a conduta que se demonstrou ter sido levada a cabo pela arguida AA não se pautou por uma ilicitude que ficasse aquém ou excedesse a pressuposta pelo crime matricial do art.º 21.º, n.º 1, do citado diploma legal.

(…)

É autor imediato aquele que possuía o domínio da ação, na medida em que realizou ele próprio a ação típica, tomando assim a execução nas suas próprias mãos, de tal modo que dele depende decisivamente o se e o como da realização típica (cfr. primeira alternativa do art.º 26.º do C.P.).

Contudo, na realização do facto típico colaboram várias pessoas, uma pluralidade de agentes, usualmente designados como comparticipantes. Torna-se então necessário, para determinar a forma e a medida de punição, qualificar cada uma dessas intervenções, isto é, distinguir quem é autor da realização ilícita típica e quem nela apenas participa. Ora, o critério maioritariamente seguido pela doutrina assenta hoje na teoria do domínio do facto (cfr. ROXIN, Claus, in Täterschaft und Tatherrschaft, 1963), segundo a qual é autor o agente que toma a execução nas suas próprias mãos, de tal modo que dele depende decisivamente o se e o como da realização típica (cfr. DIAS, Jorge de Figueiredo, in “La instigación como autoria. Un requiem por la ‘participación’ como categoría de la dogmática jurídico-penal portuguesa?”, Homenage al Professor Dr. Gonzalo Rodríguez Mourullo, Thomson/Civitas, 2005, pág. 346), possuindo, pois, o domínio objetivo do facto e a vontade do dominar, numa unidade de sentido objetiva-subjetiva: o facto aparece numa sua vertente como obra de uma vontade que dirige o acontecimento, noutra vertente como fruto de uma contribuição para o acontecimento dotada de um determinado peso e significado.

Ora, na verdade, esse domínio pode exercer-se de diferentes formas e fundar, por conseguinte, diferentes modalidades de autoria, concretizadas no art.º 26.º do C.P.: o domínio da ação está presente na autoria imediata, na medida em que o agente realiza ele próprio a ação típica (primeira alternativa); o domínio da vontade do executante de quem o agente se serve para a realização típica firma a autoria mediata (segunda alternativa); o domínio funcional do facto constitui o sinal próprio da coautoria, em que o agente decide e executa o facto em conjunto com outro ou outros (terceira alternativa); e, finalmente, o domínio da decisão que constitui o sinal típico da instigação já que tendo produzido ou criado no executor a decisão de atentar com um certo bem jurídico-penal através da comissão de um concreto ilícito típico, não obstante este o executar livremente, ainda aparece como obra daquele (quarta alternativa).

No que se refere à arguida AA, a mesma não agiu isoladamente relativamente aos factos que se demonstrou ter praticado, partilhando com os arguidos CC e DD o domínio funcional dos mesmos, cada um deles contribuindo objetivamente para a execução de forma indispensável daqueles factos que a arguida e cada um daqueles decidiram cometer, não sendo a atuação de cada um deles uma mera participação na execução por outrem do crime. Na verdade, o papel que na execução do facto cabia a cada um dos arguidos é parte fundamental do processo de tráfico.

(…)

A coautoria tem sempre subjacente a si um acordo prévio que se projete na realização objetiva do facto, sendo certo que não é necessário que tal acordo seja expresso bastando que o mesmo se verifique de forma tácita (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 15-09-1993, in Boletim do Ministério da Justiça, 429, pág. 488; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 18-03-1993, in Coletânea de Jurisprudência, 1993, Tomo II, pág. 195).

Por seu turno, é necessário que a atuação de cada um dos agentes seja elemento do todo indispensável à produção do resultado, embora possa ser apenas parcial, já que não é necessário que cada um deles intervenha em todos os atos a praticar para a obtenção daquele resultado (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29-01-1992, in Boletim do Ministério da Justiça, 423, pág. 269).

No entanto, torna-se indispensável que pela reunião desses elementos se conclua que todos os agentes contribuíram objetivamente para a realização típica do crime em causa, projetando a consciência e vontade de colaboração na realização do resultado típico do mesmo (cfr. COSTA, José de Faria, in “Formas do Crime”, Jornadas de Direito Criminal, CEJ, pág. 170), pois só então cada arguido será responsável pelo resultado global verificado como se fosse autor singular do mesmo.

Contudo, cada um dos ditos arguidos terá que ser punido segundo a sua culpa, independentemente da punição ou do grau de culpa dos outros comparticipantes (cfr. art.º 29.º do C.P.).

(…)».

11. Dispõe o artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro:

«Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fizer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40.º, plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos».

Por sua vez, estabelece o artigo 25.º («tráfico de menor gravidade»), al. a), do mesmo diploma:

«Se, nos casos dos artigos 21.º e 22.º, a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações, a pena é de:

a) Prisão de um a cinco anos, se se tratar de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, V e VI; […]».

As substâncias em causa – heroína e cocaína – incluem-se nas tabelas I-A e I-B anexas ao Decreto-Lei n.º 15/93.

12. O artigo 25.º remete para a previsão típica do artigo 21.º, com adição de elementos respeitantes à ilicitude – que não à culpa –, que atenuam a pena.

Conforme se observou no recente acórdão de 31.01.2024, Proc. n.º 10/21.4GBFAF.P1.S1, seguindo o decidido em acórdãos anteriores (por todos, o acórdão de 19.01.2022, proferido no Proc. n.º 8/19.2PEFAR.S1, em www.dgsi.pt) e que aqui se segue muito de perto, a atenuação não resulta de um concreto elemento típico que acresça à descrição do tipo fundamental (artigo 21.º), mas sim da verificação de uma diminuição considerável da ilicitude, em função de circunstâncias referidas exemplificativamente – «os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da ação, a qualidade e a quantidade das substâncias».

Como tem sido sublinhado (assim, designadamente, o acórdão de 2.10.2014, Proc. 45/12.8SWSLB.S1, em www.dgsi.pt), o tipo de crime de tráfico de estupefacientes (artigo 21.º) “é um crime de perigo abstracto, protector de diversos bens jurídicos pessoais, como a integridade física e a vida dos consumidores, mas em que o bem jurídico primariamente protegido é o da saúde pública”, que se realiza com a colocação em perigo do bem jurídico protegido. “O bem jurídico primordialmente protegido pelas previsões do tráfico é o da saúde e integridade física dos cidadãos vivendo em sociedade, mais sinteticamente a saúde pública. (…) Em segundo lugar, estará em causa a protecção da economia do Estado, que pode ser completamente desvirtuada nas suas regras (…) com a existência desta economia paralela ou subterrânea erigida pelos traficantes” (Lourenço Martins, Droga e Direito, Aequitas/Editorial Notícias, 1994, p. 122).

O tipo fundamental da previsão do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, contém a descrição típica do crime de tráfico de estupefacientes, de “maneira compreensiva” e de “largo espectro”. Trata-se de um tipo plural, com atividade típica ampla e diversificada, abrangendo desde a fase inicial do cultivo, produção, fabrico, extração ou preparação dos produtos ou substâncias até ao seu lançamento no mercado consumidor, passando pelos outros elos do circuito, mas em que todos os atos têm entre si um denominador comum, que é a sua aptidão para colocar em perigo os bens e os interesses protegidos com a incriminação (neste sentido, reafirmando jurisprudência constante, para além de outros mais recentes, os acórdãos de 8.9.2021, Proc. 17/19.1PESTR.E1.S1, de 23.9.2021, Proc. 29/15.4PEVNG.S1, e de 11.11.2021, Proc. 40/20.3PBRGR.S1).

A construção do crime de «tráfico de menor gravidade», surgido na sequência da revisão da “lei da droga”, de 1993, que levou ao desaparecimento do anterior crime de “tráfico de quantidades diminutas” (cfr. Proposta de Lei n.º 32/VI, que deu origem à Lei n.º 27/92, de 31 de Agosto, que concedeu ao Governo a autorização legislativa necessária à aprovação do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na sequência da ratificação da Convenção das Nações Unidas contra o Tráfico Ilícito de Estupefacientes e Substâncias Psicotrópicas, Viena, 1988), assenta na técnica do uso de uma cláusula geral, expressa no conceito de «ilicitude consideravelmente diminuída», com recurso a circunstâncias exemplificativas relativas aos elementos da ilicitude da ação.

A disposição do artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93 é usada pelo legislador “como uma espécie de válvula de segurança do sistema em ordem a evitar que situações efetivas de menor gravidade sejam tratadas com penas desproporcionadas, no propósito de uma maior maleabilidade na escolha da medida da reação criminal”, estando a sua aplicação “de certo modo parametrizada mediante a verificação das circunstâncias aí indicadas a título exemplificativo, o que aponta para a necessidade de uma valorização dos factos imputados ao arguido e provados, não podendo deixar de se ter em conta todos os tópicos a que o preceito se refere, aditados de outros, se os houver”, salienta-se no acórdão deste Tribunal de 2.6.1999 (proc. n.º 269/99).

A jurisprudência deste Tribunal tem afirmado a necessidade de uma “avaliação global do facto”, nas suas circunstâncias particulares, as quais, consideradas no seu conjunto, devem permitir afirmar que as quantidades de estupefacientes, nomeadamente as detidas, vendidas, distribuídas, oferecidas ou proporcionadas a outrem (atividades que se incluem na definição do tipo de crime fundamental, da previsão do artigo 21.º), são reduzidas; que a sua qualidade, aí se incluindo o potencial grau de danosidade para os bens jurídicos protegidos pela incriminação, também deverá ser reduzida; que os meios utilizados, o modo e as circunstâncias da ação deverão ser simples, não planeados, não organizados (cfr., entre outros, o acórdão de 11.10.2023, Proc. n.º 10/21.4GALLE.S1, e a abundante jurisprudência nele citada, sempre insistindo na necessidade de avaliação global da conduta, bem como, entre outros, o acórdão de 13.03.2019, Proc. 227/17.6PALGS.S1, em www.dgsi.pt, citado na fundamentação da decisão recorrida, enumerando um conjunto de circunstâncias relevantes, em densificação dos critérios normativos do artigo 25.º).

Tudo confluindo no sentido de se concluir que só nestas circunstâncias do caso concreto se poderá afirmar que a ilicitude se revela não só diminuída, mas diminuída de forma considerável, apreciável, substancial e claramente reduzida face ao desvalor das condutas que constituem elementos descritivos do tipo de crime do artigo 21.º, de modo a preencher a cláusula geral do artigo 25.º, que permite subtrair o caso à previsão daquele tipo fundamental por via da consideração daqueles fatores da ilicitude de baixa intensidade.

A propósito destes fatores, salienta-se que os “meios utilizados” hão de reportar-se à organização e à logística de que o agente lançou mão, que quanto à “modalidade ou circunstâncias da ação” será de avaliar o grau de perigosidade revelado em termos de difusão das substâncias, que, quanto à “qualidade” das substâncias, não deve esquecer-se que a organização e colocação nas tabelas segue, como princípio, o critério da sua periculosidade intrínseca e social e que, quanto à “quantidade”, importa considerar o nível dos riscos de difusão, devendo a sua ponderação ser efetuada através de uma “apreciação complexiva, finalística, isto é, dirigida à obtenção de um resultado final, qual seja o de saber se objetivamente a ilicitude da ação é de relevo menor que a verificada” no tipo fundamental (Lourenço Martins, loc. cit, p. 153).

13. Antecipando a conclusão, por confronto com estes critérios, não se encontram nas circunstâncias da matéria de facto dada como provada (supra, 7) elementos que, diversamente do decidido no acórdão recorrido, numa avaliação global do facto, permitam afastar o caso do âmbito de previsão da norma incriminadora do tipo fundamental do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro.

14. Na alegação da recorrente, a diminuição da ilicitude resultaria do facto de «a conduta ilícita se subsumir ao dia da detenção e à apreensão do produto estupefaciente indicado no ponto 4 dos factos provados», não se terem «apurado vendas anteriores», à «inexistência de uma estrutura organizativa e/ou a redução do acto ilícito a um único transporte por conta de terceiros, sem recurso a qualquer técnica ou meio especial, dão uma matriz de simplicidade», «não se ter apreendido objectos relacionados com o manuseamento e dosagem do produto, tendo o tribunal dado como assente que a arguida iria obter €150,00 como contrapartida do referido transporte».

15. A matéria de facto provada reconduz-se, em síntese, a uma atividade que, embora limitada a um único transporte num só dia, requereu a organização, em conjunto, de uma viagem de automóvel entre a cidade de ... e o ..., na cidade do ..., para abastecimento de produtos estupefacientes destinados à venda, por outrem, a terceiros, na cidade de ..., em conjugação de esforços com os outros três arguidos, tendo a arguida adquirido e transportado «cocaína (éster metílico), com o peso líquido de 61, 770 g, com um grau de pureza de 46, 7 %, que permitiria preparar 961 doses médias individuais diárias» e «72 embalagens de plástico de heroína, com o peso líquido de 8, 524 g, com um grau de pureza de 25, 6 %, que permitiria preparar 21 doses médias individuais diárias».

Surpreende-se, nestas circunstâncias, uma situação que as investigações criminológicas identificam como uma típica atividade intermédia de tráfico, entre o «mercado abastecedor» e os traficantes (vendedores locais), nas suas ramificações finais, essencial ao fornecimento de produtos estupefacientes para satisfação da procura de consumidores habituais de áreas geográficas determinadas, envolvendo vários indivíduos repartindo essa tarefa de abastecimento, necessariamente organizada nos seus circuitos de comercialização e remunerada para o efeito.

A quantidade de estupefacientes transportada, cocaína e heroína – produtos de elevada danosidade –, e o elevado número de doses individuais que esta proporcionava requeriam meios, planeamento e organização adequados, que foram efetivamente assegurados, de modo a proporcionar a sua venda a outra ou outras pessoas que, remunerando a arguida pela sua atividade, mediante o pagamento de 150 euros pelo transporte, asseguravam o funcionamento da cadeia de transporte e distribuição.

Assim, tendo em conta todos estes fatores, relacionados com o contexto da ação, com o meio utilizado e com a quantidade e qualidade dos produtos estupefacientes, em concordância com o decidido e com o defendido pelo Ministério Público, impõe-se concluir que não se identificam elementos de facto que, no seu conjunto, permitam verificar correspondência com os critérios estabelecidos na alínea a) do artigo 25.º, suscetíveis de, nos termos anteriormente expostos, preencherem a cláusula geral de diminuição considerável da ilicitude.

Improcede, pois, o recurso, nesta parte.

Quanto à determinação e medida da pena

16. A determinação da pena assenta na seguinte fundamentação:

«O crime de tráfico e outras atividades ilícitas cometido é punido com uma pena de prisão de 4 a 12 anos (cfr. art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro).

O crime de tráfico de menor gravidade é punido com uma pena de prisão de 1 a 5 anos (cfr. art.º 25.º, al. a), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro).

A determinação da medida de cada uma das penas tem como critérios a culpa do agente e as exigências de prevenção, sendo a função desempenhada por cada um destes critérios definida de acordo com a chamada teoria da moldura da prevenção ou da defesa do ordenamento jurídico (cfr. art.º 71.º, n.º 1, do C.P. e ANTUNES, Maria João, in Consequências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2013, pág. 41 e segs.).

Deste modo, a prevenção geral de integração está incumbida de fornecer o limite mínimo, que tem como fasquia superior o ponto ótimo de proteção dos bens jurídicos e inferior o ponto abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem pôr em causa a sua função tutelar (cfr. art.º 40.º, n.º 1, do C.P.).

Por seu turno, a culpa, entendida em sentido material e referida à personalidade do agente expressa no facto, surge como limite inultrapassável de toda e qualquer consideração preventiva (cfr. art.º 40.º, n.º 2, do C.P.).

Ora, dentro desses limites cabe à prevenção especial a determinação da medida concreta da pena, sendo de atender à socialização do agente.

Assim, na determinação da medida da pena, o tribunal encontra-se vinculado à observância de três proposições político-criminais:

- O direito penal é um direito de proteção de bens jurídicos;

- A culpa é tão-só limite da pena, mas não seu fundamento; e

- A socialização é a finalidade da aplicação da pena (cfr. RODRIGUES, Anabela Miranda, in “Medida da pena de prisão – desafios na era da inteligência artificial”, Revista de Legislação e Jurisprudência, n.º 4021, Ano 149.º, março-abril de 2020, pág. 260).

Assim, importa ter em conta, dentro dos limites abstratos definidos pela lei, a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo legal de crime, deponham a favor ou contra os arguidos, na medida em que se mostrem relevantes para a culpa ou para exigências preventivas.

São acentuadamente elevadas as exigências de prevenção geral no que se refere ao crime de tráfico de estupefacientes face à urgente necessidade de desmotivar a sua prática tendo em conta o alarme social e o repúdio que suscita na nossa sociedade e os efeitos nefastos que nesta provoca, constituindo um dos fatores de maior perturbação social, quer pelos riscos para bens e valores fundamentais como a saúde física e psíquica dos destinatários de tal atividade, quer pelas ruturas familiares e fraturas na coesão social que provoca, com a proliferação de uma vasta criminalidade associada ao consumo de estupefacientes.

Assim, o crime em causa gera na comunidade um forte sentimento demandando uma solene punição dos seus agentes a fim de ser recuperada a confiança na vigência e validade das normas violadas.

Os arguidos agiram com a modalidade mais intensa de dolo, que se mostra direto, pelo que, sendo a forma mais gravosa de dolo, representa maior desvalor.

A conduta dos arguidos limitou-se a um dia, mas denota firme resolução criminosa, persistência na resolução tomada e já alguma reflexão sobre os meios empregues. Na verdade, desde logo, não se poderá esquecer as dezenas de quilómetros que separam ... do .... Só a atuação da arguida AA e do arguido BB se traduziu em várias condutas típicas, e embora nenhuma delas a mais grave prevista no tipo legal (…). Todos se envolveram com estupefaciente que integra as denominadas drogas duras e, assim, mais nocivo. No entanto, o arguido BB apenas com um e os restantes com diferentes tipos distintos.

A arguida AA já não era primária à data dos factos. No entanto, os arguidos BB, CC e DD eram primários à data dos factos.

A arguida AA admitiu os factos que ficaram demonstrados, embora isso não possua grande poder atenuante face ao facto de ter sido detida em flagrante delito.

Os arguidos AA, BB e CC são assumidamente consumidores de estupefacientes, vivendo este em comunhão com a arguida DD, sendo precária a sua situação económica, circunstâncias que são inegáveis fatores de risco de voltarem a delinquir, quanto mais não seja para obterem dinheiro.

O percurso da arguida AA é pautado pelo baixo investimento escolar, formativo e/ou profissional, bem como pela dependência da atribuição de subvenções sociais.

(…)

Tudo ponderado, afiguram-se adequadas às circunstâncias do caso as seguintes penas:

- a pena de 4 ANOS E 6 MESES DE PRISÃO para a arguida AA;

(…) a arguida AA cometeu o crime em causa após ter cometido três crimes, dois dos quais da mesma natureza, tendo-lhe sido aplicadas diversas penas, incluindo uma pena alternativa não detentiva e uma pena de substituição não detentiva, esta pela prática de crime da mesma natureza, o que não a afastou da prática de crimes.

Nestas condições, afigura-se que a tutela dos bens jurídicos em causa, a estabilização das expectativas da comunidade na validade e vigência da norma violada e as exigências de socialização que o caso denota não se bastam com a ameaça da pena de prisão e, assim, com a aplicação de uma pena de substituição não detentiva.

Deste modo, não seria de suspender a execução da pena de prisão aplicada à arguida AA (cfr. art.º 50.º do C.P.).

Assim, quanto à arguida AA verifica-se que quer o crime em causa no Processo Comum Coletivo n.º 5/17.2PEGMR, do juízo central criminal de ... (... 3) quer o crime aqui em apreço foram cometidos dolosamente, tendo sido punidos com penas de prisão efetivas superiores a seis meses. Acresce que a decisão condenatória proferida naquele outro processo já havia transitado em julgado quando o crime aqui em apreço foi cometido, sendo certo que entre a prática do crime em causa naquele processo (10-05-2018) e o aqui em causa (02-12-2022) não decorreram mais de cinco anos, período que será ainda mais estreito descontado o tempo durante o qual a arguida AA esteve a cumprir medida processual e pena privativa de liberdade. Por outro lado, o crime em apreço neste processo, face àquele anterior, demonstra uma evidente culpa agravada da arguida AA por esta haver desconsiderado a solene advertência contida na condenação anterior no sentido de não voltar a cometer crimes, uma mais grave traição da tarefa existencial de conformação da personalidade do agente com o tipo de personalidade suposta pela ordem jurídica, tendo até em conta a mesma natureza dos crimes em causa.

O crime anterior e o ora em causa relevam que não se trata de uma delinquente pluriocasional, não tendo o cometimento do crime aqui em causa se ficado a dever a causas meramente fortuitas ou excecionais.

Na verdade, cumpre salientar que a mesma esteve privada de liberdade à ordem do dito processo de ...-...-2020 a ...-...-2021, e apesar de lhe ter sido então concedida liberdade condicional que vigorava até ...-...-2022, tal não a impediu de cometer o crime aqui em apreço em ...-...-2022.

Ora, perante tais factos, outra não pode ser a conclusão senão a de que a recidiva se explica por a arguida não ter sentido e interiorizado a admonição contra o crime veiculada pela anterior condenação transitada em julgado e que conduz à falência desta no que respeita ao desiderato dissuasor. Na verdade, esta inequivocamente não o inibiu de renovar o seu propósito de delinquir.

Deste modo, verificam-se todos os pressupostos formais e também o pressuposto material determinante da punição do arguido como reincidente (cfr. art.º 75.º do C.P.).

Verificados os pressupostos da reincidência, importa, em segundo lugar, construir a moldura penal da reincidência, a qual tem como limite máximo o limite máximo previsto pela lei para o respetivo crime e como limite mínimo o limite mínimo legalmente previsto para o tipo em causa elevado de um terço, em razão do desrespeito na condenação ou condenações anteriores (cfr. art.º 76.º, do C.P.).

Deste modo, quanto ao crime em causa, incorre a arguida AA numa pena de 5 anos e 4 meses a 12 anos de prisão, moldura dentro da qual se terá que determinar a medida concreta da pena, observando os critérios gerais previstos no art.º 71.º do C.P.

Quanto à determinação da medida concreta da pena dentro dessa moldura, no presente caso, há que ter em conta que o limite máximo da pena concreta consentido pela culpa da arguida é mais elevado, as exigências de prevenção encontram-se acrescidas, sendo elevado o grau de desrespeito pela condenação anterior, pelo que se afigura adequado aplicar à arguida (…) a pena de 5 anos e 6 meses de prisão.».

17. O crime da previsão do artigo 21.º («tráfico e outras actividades ilícitas») do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos, moldura a partir da qual há que determinar a pena concreta, de acordo com os critérios e fatores estabelecidos na Parte Geral do Código Penal (artigo 48.º daquele diploma).

18. Nos termos do artigo 40.º do Código Penal, que se refere às finalidades das penas, “a aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade” e “em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa”.

Estabelece o n.º 1 do artigo 71.º do Código Penal que a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, devendo o tribunal atender a todas as circunstâncias relacionadas com o facto praticado (facto ilícito típico) e com a personalidade do agente (manifestada no facto) – fatores relativos à execução do facto, à personalidade do agente e à conduta do agente, anterior e posterior ao facto –, relevantes para avaliar da medida da pena da culpa e da medida da pena preventiva, que, não fazendo parte do tipo de crime (proibição da dupla valoração), deponham a favor do agente ou contra ele considerando, nomeadamente, as indicadas no n.º 2 do mesmo preceito.

Como se tem afirmado, encontra este regime os seus fundamentos no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição, segundo o qual «a lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos». A privação do direito à liberdade, por aplicação de uma pena (artigo 27.º, n.º 2, da Constituição), submete-se, tal como a sua previsão legal, ao princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso, que se desdobra nos subprincípios da necessidade ou indispensabilidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito, de acordo com o qual a pena deve ser encontrada na “justa medida”, impedindo-se, deste modo, que possa ser desproporcionada ou excessiva.

19. Para a medida da gravidade da culpa há que, de acordo com o artigo 71.º, considerar os fatores reveladores da censurabilidade manifestada no facto, nomeadamente, nos termos do n.º 2, os fatores capazes de fornecer a medida da gravidade do tipo de ilícito objetivo e subjetivo – indicados na alínea a), primeira parte (grau de ilicitude do facto, modo de execução e gravidade das suas consequências), e na alínea b) (intensidade do dolo ou da negligência) – e os fatores a que se referem a alínea c) (sentimentos manifestados no cometimento do crime e fins ou motivos que o determinaram) e a alínea a), parte final (grau de violação dos deveres impostos ao agente), bem como os fatores atinentes ao agente, que têm que ver com a sua personalidade – indicados na alínea d) (condições pessoais e situação económica do agente), na alínea e) (conduta anterior e posterior ao facto) e na alínea f) (falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto).

Na consideração das exigências de prevenção, destacam-se as circunstâncias relevantes em vista da satisfação de exigências de prevenção geral – traduzida na proteção do bem jurídico ofendido mediante a aplicação de uma pena proporcional à gravidade dos factos, reafirmando a manutenção da confiança comunitária na norma violada – e, sobretudo, de prevenção especial, as quais permitem fundamentar um juízo de prognose sobre o cometimento, pelo agente, de novos crimes no futuro, e assim avaliar das suas necessidades de socialização. Incluem-se aqui as consequências não culposas do facto [alínea a), v.g. frequência de crimes de certo tipo, insegurança geral ou pavor causados por uma série de crimes particularmente graves], o comportamento anterior e posterior ao crime [alínea e), com destaque para os antecedentes criminais] e a falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto [alínea f)]. O comportamento do agente [circunstâncias das alíneas e) e f)] adquire particular relevo para determinação da medida concreta da pena em vista da satisfação das exigências de prevenção especial, em função das necessidades individuais e concretas de socialização do agente, devendo evitar-se a dessocialização.

Como se tem sublinhado, é na presença e em função destes fatores que deve avaliar-se a concreta gravidade da lesão do bem jurídico protegido pela norma incriminadora, materializada na ação levada a efeito pelo arguido pela forma descrita nos factos provados, de modo a verificar se a pena aplicada respeita os mencionados critérios de adequação e proporcionalidade que devem pautar a sua aplicação (por todos, o acórdão de 8.6.2022, Proc. 430/21.4PBPDL.L1.S1, e jurisprudência e doutrina nela citadas, em www.dgsi.pt.).

20. Embora aceitando a punição como reincidente, considera a recorrente, em síntese, que, a manter-se a condenação pela prática do crime de tráfico da previsão do artigo 21.º do Decreto-lei n.º 15/93, «haveria que atender ao circunstancialismo favorável apurado, designadamente, o já referido nos pontos 4 a 6 da motivação do recurso, com maior incidência, para a confissão com relevo para a descoberta da verdade material, apoio familiar, ser mãe de 3 filhos menores, manter-se abstinente e ter procurado adquirir competências profissionais no E.P» e a que «se mostram atenuadas as razões de prevenção geral na medida em que, a arguida admitiu a sua conduta, revela, capacidade crítica pelos actos cometidos, e procurou no decurso da medida de coacção que lhe foi imposta, assumir um comportamento ajustado», «o crime cometido, foi ocasional, não teve continuidade no tempo», «o comportamento integra a forma mais simples do ilícito - detenção e transporte por conta de um terceiro», «não detinha consigo, objectos ligados ao doseamento do produto, sendo que, também não lhe foram apurados quaisquer sinais de riqueza

21. Ora, como se vê da decisão recorrida, na fundamentação da determinação da medida da pena, que, antecipando a conclusão, não merece qualquer censura, o tribunal a quo, em consideração do disposto nos artigos 40.º e 71.º do Código Penal, levou devidamente em conta as circunstâncias que em concreto se mostram relevantes, quer por via da culpa quer por via da prevenção (supra, 16 e 19).

Não conferiu o valor pretendido à confissão, por a considerar de pouco relevo uma vez que a arguida foi detida em flagrante delito.

Levou em conta todas as circunstâncias relativas ao facto, interessando essencialmente por via da culpa, nomeadamente a circunstância de se tratar de um único transporte, praticado num só dia, a intensidade e persistência do dolo, a precariedade da suas condições pessoais e económicas, a sua situação pessoal e o seu percurso de vida, e o comportamento anterior ao crime (anteriores condenações por factos idênticos e a revelada insensibilidade às penas, que cumpriu, não detentivas e de prisão), circunstâncias estas, relacionadas com a personalidade manifestada na prática do facto, com grande relevância pelas necessidades de prevenção.

22. Para além disso, como rigorosamente considerou a decisão recorrida, mostram-se verificados os pressupostos formais e materiais da reincidência exigidos pelo artigo 75.º do Código Penal (sobre este ponto cfr. o acórdão de 12.10.2022, Proc. 17/21.1GABCL.S1, em www.dgsi.pt, que se segue).

Seguindo a metodologia imposta pelo n.º 1 do artigo 75.º do Código Penal, o tribunal a quo começou por determinar o limite da pena em função da moldura correspondente ao crime do artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, na consideração dos fatores indicados no artigo 71.º, concluindo pela aplicação de uma pena superior a 6 meses. Ambos os crimes são crimes dolosos, correspondem-lhes penas de prisão efetivas superiores e 6 meses, a condenação anterior já havia transitado em julgado quando o crime destes autos foi praticado e entre a prática do crime anterior e a prática do crime atual não tinham decorrido mais de 5 anos,

Mostra-se igualmente verificado o pressuposto material da reincidência estabelecido na parte final do n.º 1 do artigo 75.º do Código Penal, revelador de «maior culpa», o qual requer que, de acordo com as circunstâncias do caso, o agente deva ser censurado por a condenação ou condenações anteriores não lhe terem servido de suficiente advertência contra o crime

Pelo que, tendo presente a moldura abstrata da pena aplicável, de 5 anos e 4 meses a 12 anos de prisão, por virtude da reincidência – artigo 76.º, n.º 1, do Código Penal, que conduz à elevação do limite mínimo da pena em um terço –, lhe aplicou a pena de 5 anos e 6 meses de prisão, ou seja, uma pena que se situa em medida muito próxima do limite mínimo e que respeita o critério de proporcionalidade estabelecido na parte final do n.º 1 do artigo 76.º do Código Penal, segundo o qual a agravação não pode exceder a medida da pena mais grave aplicada na condenação anterior.

23. Assim sendo, considerando a moldura abstrata da pena estabelecida por funcionamento da reincidência, mostrando-se ponderados os fatores relevantes por via da culpa e da prevenção, que, como considera o acórdão recorrido, evidenciam elevadas necessidades de prevenção geral, a considerar no limite da culpa, bem como de prevenção especial de ressocialização, não se surpreendem elementos que permitam constituir base de um juízo de discordância relativamente à pena aplicada, a justificar intervenção corretiva.

Improcede, assim também, o recurso nesta parte.

Quanto a custas

24. Nos termos do disposto no artigo 513.º do CPP, só há lugar ao pagamento da taxa quando ocorra condenação em 1.ª instância e decaimento total em qualquer recurso. A taxa de justiça é fixada entre 5 e 10 UC, tendo em conta a complexidade do recurso, de acordo com a tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais.

III. Decisão

25. Pelo exposto, acorda-se na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente o recurso interposto pela arguida AA, mantendo-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 UC.

Supremo Tribunal de Justiça, 17 de abril de 2024.

José Luís Lopes da Mota

(Juiz Conselheiro Relator)

Ana Maria Barata de Brito

(Juíza Conselheira Adjunta)

Pedro Manuel Branquinho Dias

(Juiz Conselheiro Adjunto)