Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:261/13.5 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:01/24/2024
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IVA.
HOLDING MISTA.
Sumário:O IVA suportado por uma sociedade no pagamento de prestação de serviços associados à aquisição de 100% do capital social de uma outra sociedade cuja actividade é distinta da primeira apenas é dedutível na medida em que se demonstre o nexo directo entre os custos incorridos e o exercício de actividade tributável. Tal pode suceder a partir do momento em que a primeira interfere na gestão da segunda, através da cobrança de fees de gestão.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais: Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO
O…………….. - PUBLICIDADE ………………., S.A., veio, em conformidade com o artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, de 25 de março de 2021, a qual julgou totalmente improcedente a impugnação judicial por si deduzida, contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado («IVA») e respetivos juros compensatórios, referente ao exercício de 2005, no valor total de € 2.297.693,26.
A Recorrente termina as alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
«(…) //
B. A Sentença recorrida padece de nulidade (i) por vício da falta de fundamentação nos termos dos artigos 123.º e 125.º ambos do CPPT e (ii) por vício de omissão de pronúncia nos termos do artigo 125.º do mesmo compêndio tributário e padece (iii) de manifesto erro de julgamento.
C. A decisão sub judice versou sobre a impugnação judicial deduzida pela Recorrente em face dos actos de liquidação adicional de IVA e de respectivos juros compensatórios emitidos pela AT, no valor global de € 2.297.693,26.
D. Nos termos que resultaram dos factos (ou, diga-se antes, dos documentos) considerados provados na Sentença recorrida, a Recorrente, no ano 2005, contratou a prestação de serviços junto do …………. B………… Investimento e da S ……………, C ……………… e Associados, Sociedade de Advogados.
E. Conforme descrito e demonstrado nos autos recorridos, os serviços em causa, contratados junto do …………….. B……….. Investimento resultam dos seguintes documentos:
iii) Proposta de assessoria financeira “no processo de eventual aquisição dos interesses da P………….. Serviços ……………….., SGPS, SA (…) na L ……………Serviços, SGPS (…)”, conforme resulta do documento apresentado inicialmente junto da C…………… e depois, na sequência de cessão de posição contratual desta, apresentado junto da Recorrente;
iv) Proposta adicional de “Assessoria Financeira”, que previa a necessidade de “ajustar os termos e condições a que fica sujeita a prestação de serviços de consultadoria efectuada pelo (… …… b……….Investimento à O l…………(…). Atendendo à complexidade da operação e ao conjunto de tarefas adicionais que foi necessário executar e que não estavam previstas no mandato (…)”;
v) Proposta de “prestação de serviços de organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo”, que previa “Vimos pela presente estabelecer os termos e condições a que fica sujeita a prestação de serviços de estruturação, organização e montagem pelo M……….. ………. Investimento (…) no âmbito do processo referido em epígrafe [organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo].
F. Na sequência da prestação dos diferentes serviços, o M……….. B…….. Investimento e a Sociedade de Advogados emitiram à Recorrente as notas de débito e factura:
· Nota de débito 2005/00269, referente a “Proposta de Assessoria Financeira (...) Comissão de Sucesso”, no valor de € 2.085.564,00, acrescido de € 437.968,44 de IVA;
· Nota de débito 2005/00270, referente a “Proposta de prestação de serviços de assessoria no âmbito do processo de restruturação financeira”, no valor de € 1.200.000,00, acrescido de € 252.000,00 de IVA;
· Nota de débito 2005/00271, referente a “Proposta de prestação de serviços de organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo”, no valor de € 5.544.000,00, acrescido de € 1.164.240,00 de IVA.
· Factura 1091, referente a “Nossos honorários por serviços profissionais prestados (...) do contrato final de aquisição com a P…….. M……………, SGPS, SA (…)”, no valor de € 575.000,00, acrescido de € 120.750,00 de IVA.
G. A Recorrente deduziu o IVA suportado na aquisição dos serviços acima descritos, no valor de € 1.974.958,44.
H. Contudo, no entendimento da AT, o IVA ali em causa não poderia ter sido deduzido, uma vez que, os serviços adquiridos “não se destinarem à realização de uma actividade económica”, mas sim “à aquisição de partes de capital” – em concreto, à aquisição de 100% das participações sociais da mencionada entidade –, pelo que emitiu os referidos actos tributários de liquidação adicional de IVA e de juros compensatórios, impugnados nos presentes autos.
I. O Tribunal a quo, através da Sentença recorrida, determinou a improcedência da pretensão da Recorrente e, consequentemente, a manutenção das liquidações em causa.
J. Contudo, nos termos infra, e salvo o devido respeito, a Sentença ora recorrida não pode ser aceite, porquanto a mesma padece de evidente vício de falta de fundamentação e de manifesto vício de omissão de pronúncia, bem como de erro de julgamento.
DO VÍCIO DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Discriminação da matéria de facto
K. O Tribunal a quo, na Sentença ora recorrida, discriminou os factos “com relevância para a decisão da causa” que considerou “provados” e que considerou “não provados” – cf. páginas 3 a 7 da Sentença recorrida.
L. Contudo, no que respeita aos alegados “factos provados”, o Tribunal a quo limitou-se a apresentar uma listagem de documentos, com meras enumerações, remissões e citações parciais, sem mais acrescentar.
M. Não existe na Sentença recorrida qualquer “matéria de facto dada como provada”, existindo apenas uma listagem de documentos, excertos e datas dados como “provados”, sem qualquer conclusão sobre quais os factos que esses documentos comprovam ou deixam de comprovar.
N. Os alegados “factos provados” apenas dão como provada a existência dos documentos em causa – i.e. comunicações, propostas, notas de débito, factura, relatório de inspecção, liquidações, reclamação graciosa, recurso hierárquico –, mas não dão como provados (ou não provados) quaisquer factos que deles possam resultar e que, eles sim, sejam relevantes “para a decisão da causa”.
O. E, de resto, ainda que “matéria de facto dada como provada” existisse (no que não se concede), nunca poderia ser aceite que a sua necessária “apreciação crítica” pelo Tribunal se limitasse a uma frase chave desprovida de qualquer conteúdo – como aqui pretendeu o Tribunal a quo.
P. Assim, resulta evidente que a Sentença recorrida padece de vício de falta de fundamentação, por falta de discriminação da matéria de facto, nos termos do disposto no artigo 123.º do CPPT, devendo a mesma ser declarada nula nos termos e com os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, cabendo a este Douto Tribunal, ao abrigo dos seus poderes de cognição, suprir aquela falta e decidir nos termos consagrados na lei.
Exame crítico dos factos não provados
Q. Se, relativamente à matéria de facto dada como provada, o Tribunal nem sequer enunciou os factos em causa – limitando-se a listar documentos e datas –, quanto à matéria de facto dada como “não provada”, limitou-se a enunciar factos, sem fundamentar ou de alguma forma expor os fundamentos subjacentes a este juízo.
R. O Tribunal a quo limitou-se a enunciar três factos não provados – sem fundamentar ou justificar o que o levou a fixar os mesmos nestes moldes.
S. E adiante pretendeu esclarecer que aquele juízo decorreu de “não terem sido carreados para os autos” elementos que permitissem concluir de outra forma.
T. Atenta a natureza dos factos dados como não provados, não pode ser aceite que tal convicção resulte de alegada falta de prova.
U. Resulta evidente que a Sentença recorrida padece de vício de falta de fundamentação, por falta de exame crítico dos factos dados como não provados, nos termos do disposto no artigo 123.º do CPPT, devendo a mesma ser declarada nula nos termos e com os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT, cabendo a este Douto Tribunal, ao abrigo dos seus poderes de cognição, suprir aquela falta e decidir nos termos consagrados na lei.
DO VÍCIO DE OMISSÃO DE PRONÚNCIA
V. Nos termos que resultaram dos factos (ou, diga-se antes, dos documentos) considerados provados na Sentença recorrida, a ora Recorrente, no ano 2005, contratou a prestação de diferentes serviços junto do M …………. B……….. Investimento e da S ………….., C …………… e Associados, Sociedade de Advogados – cf. factos provados 2) a 6), acima já detalhados.
W. Parte daqueles serviços de assessoria financeira e a totalidade dos serviços jurídicos foram adquiridos pela Recorrente no âmbito de um projecto de expansão e crescimento da sua área de media, o qual culminou com a aquisição de 100% das participações da L……………. Serviços SGPS.
X. Com efeito, os serviços decorrentes da (i) Proposta de assessoria financeira “no processo de eventual aquisição dos interesses da P… M…………… Serviços ……………….., SGPS, SA (…) na L……………. Serviços, SGPS (…)” e da (ii) Proposta adicional de “Assessoria Financeira”, respeitaram directamente àquela operação de aquisição de 100% das participações sociais.
Y. Tendo os mesmo sido facturados através da nota de débito 2005/00269 e 2005/00270.
Z. E, também os mencionados serviços jurídicos, prestados pela referida sociedade de advogados, respeitaram a esta mesma operação de aquisição de 100% das participações sociais, tendo os mesmos sido facturados através da factura n.º 1091.
AA. A Recorrente, considerando que o IVA incorrido nas referidas aquisições de serviços de assessoria financeira e serviços jurídicos associadas a esta operação de aquisição de 100% das participações sociais, no valor de € 810.718,44, se afigurava dedutível – entendimento que mantém –, procedeu à sua dedução integral.
BB. Não concordando com esta dedução, a AT efectuou a respectiva correcção, através da emissão dos actos tributários em causa nos autos recorridos, os quais a ora Recorrente contestou na impugnação judicial deduzida – de esclarecer que, os actos tributários em causa incluem ainda o valor do IVA da nota de débito 2005/00271, referente a outros serviços de assessoria adquiridos pela Recorrente.
CC. Neste contexto, o Tribunal a quo, na Sentença aqui recorrida, decidiu a pretensão da Recorrente, determinando a manutenção daqueles actos tributários.
DD. Contudo, o Tribunal a quo decidiu sem se pronunciar sobre o quanto foi alegado nos autos pela Recorrente e, de resto, contestado pela AT.
EE. De facto, na Sentença sub judice, depois da (alegada) discriminação da matéria de facto – cf. páginas 3 a 7 –, o Tribunal a quo desenvolve o Direito alegadamente aplicável nos autos, citando as regras gerais do direito à dedução do IVA, citando doutrina sobre este direito à dedução e finalmente jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”) (6 - Neste ponto, cumpre referir que o Tribunal a quo se limitou a citar (e apenas citar) jurisprudência do TJUE relativa a situações de aquisição de participações sociais em que não esteve em causa a totalidade das participações, i.e. situações em que foram adquiridas/transmitidas menos de 100% das participações sociais de uma entidade. Jurisprudência distinta tem vindo a ser divulgada pelo TJUE para as situções de aquisição de 100% das participações sociais de uma entidade.) – cf. páginas 7 a 10.
FF. Depois deste percurso, o Tribunal a quo parece pretender avançar para aquilo que seria o segmento decisório, por forma a apreciar a pretensão da ali Impugnante, aplicando ao caso concreto o direito, a doutrina e a jurisprudência anteriormente citadas: “face [ao] itinerário lógico apresentado, resta aplicar o mesmo raciocínio ao caso dos autos” – cf. página 10.
GG. Contudo, aparentemente chegado o momento de decidir sobre a pretensão da Impugnante – nos termos apresentados pela mesma e contestados pela AT –, o Tribunal a quo, com o devido respeito, não apreciou a questão essencial de direito ali (e aqui) em causa.
HH. Com efeito, depois de enunciar a lei, doutrina e jurisprudência que teriam aplicação in casu, o Tribunal a quo – numa única página, a página 11 da Sentença recorrida – conclui sucintamente que “expostas as alegações da Impugnante, verifica-se, contudo, que a pretensão que pretende prosseguir não colhe uma vez que não provou nenhuma delas (…)” (sublinhado nosso).
II. E, nesta senda, repete os factos dados como não provados, aqui com destaque para o seguinte: “(…) em a), não foram juntos aos autos quaisquer elementos que indiquem que a remuneração designada por fee de gestão seja paga pelas participadas às participantes”.
JJ. Para, finalmente, decidir: “Concluindo, não logrou a Impugnante apresentar justificação bastante para contrariar os fundamentos apresentados pela AT na correção efetuada e aqui discutida, pelo que esta terá de se manter”.
KK. Limitando-se a remeter para um facto não provado – i.e. o facto não provado a) –, o Tribunal a quo não atendeu a tudo o quando havia sido alegado e demonstrado pela Recorrente e não aplicou (ou sequer tentou aplicar) o direito, a doutrina e a jurisprudência ao caso concreto.
LL. Assim, relativamente ao tema aqui em análise, o Tribunal apenas decidiu pela não dedutibilidade do IVA aqui em causa (incorrido pela Recorrente no âmbito das duas notas de débito emitidas pelo M................. BCP Investimento e da factura emitida pela Sociedade de Advogados), alegando que não ficou provado que a remuneração designada por fee de gestão era efectivamente paga pelas participadas às participantes.
MM. Não só não justifica a alegada relevância daquele fee de gestão para a decisão da causa, como não atende às restantes alegações da ora Recorrente nos autos.
NN. Deste modo, e no que respeita à pretensão apresentada pela Impugnante, o Tribunal a quo reduziu a mesma à mera existência ou inexistência de prova dos designados fees de gestão, sem apreciar tudo o quanto foi alegado e demonstrado nos autos.
OO. Porém, resulta evidente que a questão da dedutibilidade do IVA ali em causa nunca poderia ter sido simplificada ou reduzida pelo Tribunal a quo nestes termos.
PP. De facto, o Tribunal, ao reduzir esta questão de direito à mera apreciação a (in)existência dos fees de gestão, deixou de apreciar o quanto foi alegado pela Impugnante, contestado pela AT e, de resto, abordado pelo próprio Tribunal no segmento expositivo constante da decisão recorrida.
QQ. Deste modo, o Tribunal não apreciou in casu, nem decidiu, sobre a natureza e o enquadramento em IVA a conferir à operação de aquisição de 100% das participações sociais da L............ Serviços, SGPS pela aqui Recorrente e sobre as consequências desse enquadramento no direito à dedução do imposto incorrido com os serviços acima descritos, o que se afigura fundamental para a apreciação e decisão da questão essencial sub judice.
RR. No fundo, a então Impugnante alegou, a AT contestou, o Tribunal a quo instruiu a sua decisão com doutrina e jurisprudência, mas depois não se pronunciou sobre esta questão essencial, deixando de decidir sobre a mesma e inquinando esta Sentença de um manifesto vício de omissão de pronúncia.
SS. Assim, resulta evidente que o Tribunal deixou de se pronunciar e deixou de decidir sobre uma questão essencial de Direito, deveras relevante para a conclusão sobre a dedutibilidade do IVA aqui em causa – i.e. sobre o enquadramento em IVA a conferir à operação de aquisição, por um sujeito passivo de IVA (que apenas desenvolve operações tributadas), de 100% das participações sociais de uma entidade que também ela desenvolve e continuara a desenvolver a sua actividade integralmente tributada em IVA – viciando assim a Sentença recorrida de manifesto vício de omissão de pronúncia, gerador de nulidade, nos termos e com os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e no artigo 615.º do CPC.
TT. Neste âmbito, sem prejuízo de reiterar o quanto já foi alegado pela ora Recorrente em sede de impugnação – e, de resto, contestado pela AT nos autos –, reforça-se aqui a questão de direito que, revelando-se essencial para a boa decisão da causa, não foi sequer apreciada pelo Tribunal a quo.
UU. Conforme consta da Impugnação Judicial deduzida, a operação de aquisição de 100% da L............ Serviços SGPS pela ora Recorrente visou alcançar os “objectivos de expansão e crescimento da actividade de media (…), numa perspectiva de continuidade futura desse negócio na sua esfera”, sendo que esta aquisição configurou, “sem qualquer dúvida, a compra de um negócio/actividade de media”.
VV. O objectivo que esteve na base da operação de aquisição da totalidade das participações sociais da L............ Serviços SGPS foi a compra do negócio da actividade de media em si, até aí desenvolvido por esta. De resto, desde a sua fase inicial – e porque, do ponto de vista material, o objectivo sempre foi o da compra efectiva de uma área de negócio (multimédia) e não o das acções da sociedade como um fim em si mesmo (de puro investimento financeiro) –, foram inclusivamente equacionadas diversas modalidades alternativas de aquisição, incluindo a própria compra directa dos activos e negócios respectivos.
WW. A própria proposta de prestação de serviços de Assessoria Financeira apresentada pelo M................. B….. Investimento no âmbito desta operação – junta nos autos –, previa expressamente: “vem submeter (…) uma proposta de assessoria financeira no processo de eventual aquisição dos interesses da P……………….Serviços …………………., SGPS, SA (…) na L............ Serviços, SGPS (…), operação que poderá assumir a forma de aquisição de participações sociais, créditos, activos/negócios, (…)” – sublinhado nosso.
XX. Assim, a Recorrente adquiriu a L............ Serviços SGPS como um todo, adquiriu o seu negócio/actividade, com o objectivo (concretizado) de dar continuidade ao mesmo.
YY. Não existindo qualquer dúvida de que esta operação de aquisição de 100% daquela sociedade configurou uma aquisição de uma unidade de negócio, com as necessárias implicações em matéria de IVA.
ZZ. Estava aqui em causa a necessária apreciação da natureza desta operação de “aquisição de participações sociais” e o respectivo enquadramento em IVA.
AAA. A cuidada apreciação da natureza desta operação afigurava-se essencial para a boa e fundamentada decisão da causa – contudo, sobre esta questão essencial o Tribunal a quo nada escreveu, nada apreciou, nada concluiu, o que não pode ser aceite.
BBB. Com efeito, tendo apreciado a prova junta nos autos, as alegações da Recorrente e a Contestação da ali Impugnada, não se pode entender como o Tribunal a quo pôde deixar de decidir sobre esta questão essencial: a natureza da operação de aquisição de 100% das participações sociais e o seu enquandramento em matéria de IVA!
CCC. O Código do IVA, prevê no n.º 4 do respectivo artigo 3.º que: “Não são consideradas transmissões as cessões a título oneroso ou gratuito do estabelecimento comercial, da totalidade de um património ou de uma parte dele, que seja susceptível de constituir um ramo de actividade independente, quando, em qualquer dos casos, o adquirente seja ou venha a ser, pelo facto da aquisição, um sujeito passivo do imposto de entre os referidos na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º”.
DDD. A finalidade desta delimitação negativa de incidência, ao estabelecer a não tributação das transmissões de empresas ou partes de empresas é, exactamente, simplificar a realização de tais operações e evitar “sobrecarregar a tesouraria do beneficiário através da dedução do IVA pago a montante”.
EEE. Esta “regra de não transmissão” prevista nos n.os 4 e 5, respectivamente, dos artigos 3.º e 4.º do Código do IVA, visa atingir dois objectivos essenciais, concretamente: (a) introduzir uma medida de simplificação no âmbito de operações significativas mas pontuais, não recorrentes; e (b) não onerar a tesouraria das empresas cedente e cessionária, uma vez que, em princípio, o adquirente, sendo sujeito passivo (ou passando a sê-lo) sempre poderia recuperar o IVA pago a montante através do mecanismo de dedução deste imposto – vide Acórdão proferido no Processo C-408/98 – Abbey National (§24 e §35) e, Acórdão proferido no Processo C-497-01 – Zita Modes (§37).
FFF. O raciocínio sufragado pela jurisprudência europeia e nacional em concretização do mecanismo de simplificação aplicado a estas transmissões de unidades de negócio pressupõe – apesar de estar em causa uma operação não sujeita para efeitos de IVA – , o exercício do direito à dedução por parte do adquirente, numa perspectiva de continuidade, porquanto assim se garantirá a inexistência de qualquer ganho ou perda fiscal entre os sujeitos passivos de IVA e as autoridades fiscais e, por conseguinte, a manutenção do imposto.
GGG. O TJUE já se pronunciou sobre a natureza (para efeitos de IVA) deste tipo de operações, esclarecendo que quando está em causa a transmissão ou aquisição de 100% das participações sociais de uma entidade, tal operação deve ser equiparada a uma transmissão da universalidade total de bens, a qual deve ser considerada uma actividade económica – neste sentido, por exemplo, Acórdão proferido no Processo C-29/08 – AB SKF (§35).
HHH. Na situação em apreço nos presentes autos e conforme resulta evidente do quanto foi expendido em sede de Impugnação Judicial e de Contestação, estamos perante a transferência de uma unidade de negócio para a esfera da Recorrente, i.e. a transferência de 100% das participações da L............ Serviços SGPS, com a intenção (concretizada) de assegurar a continuidade do negócio em causa.
III. Sempre deveria o Tribunal a quo ter-se proncunciado neste âmbito, apreciando e decidindo sobre o enquadramento desta operação para efeitos de IVA. E não o fez, de modo algum.
JJJ. Concluindo sobre o tema da natureza da operação em análise e do seu enquadramento em IVA – o que o Tribunal a quo não fez –, cumpriria concluir sobre o direito à dedução do imposto incorrido na realização da mesma – o que o Tribunal a quo também não fez.
KKK. O IVA incorrido com as despesas relacionadas com a aquisição de unidade de negócio afigurar-se-á dedutível nos termos gerais, i.e. será dedutível na medida do direito à dedução do sujeito passivo.
LLL. Conforme alegado e demonstrado nos autos, a Recorrente, adquirente da unidade de negócio em causa, desenvolve uma actividade totalmente tributada em IVA – “(…) a impugnante exercia e exerce actividades económicas a título principal e acessório, sendo pelas mesmas sujeita a IVA nos termos gerais, liquidando este imposto”.
MMM. Não conhecendo limites à dedução no âmbito da sua actividade, sempre assistiria à Recorrente o direito a deduzir integralmente o imposto em causa nos autos.
NNN. Tais custos devem considerar-se como integrantes das despesas gerais do sujeito passivo adquirente, sendo associados ao conjunto da sua actividade.
OOO. Tal como foram tratados in casu pela ora Recorrente – de facto, conforme alegado e demonstrado nos autos, os serviços de assessoria e os serviços jurídicos em causa “foram qualificados, escriturados e contabilizados de acordo com a sua natureza, como encargos (custos) gerais da actividade da impugnante, na conta geral de custos #622361, referente a trabalhos especializados, sem que tal qualificação tenha sido posta em crise pela Administração Tributária” – cf. ponto 48.º da Impugnação.
PPP. Neste sentido, o TJUE já decidiu que “não existe uma relação directa e imediata entre os vários serviços adquiridos por uma holding no quadro de uma tomada de participação numa filial e uma ou várias operações a jusante que confiram direito a dedução”, ao invés “os custos destes serviços fazem parte das despesas gerais do sujeito passivo e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos produtos de uma empresa. Portanto, estes serviços têm uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo (…)”, pelo que “as despesas efectuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo directo e imediato com o conjunto da sua actividade económica” – vide Acórdão proferido no Processo C-16/00 – Cibo Participations SA (§32 e §35).
QQQ. Reforce-se assim, conforme alegado e demonstrado nos autos – e não apreciado pelo Tribunal a quo –, “entende a Impugnante que há lugar à dedução do IVA incorrido com a aquisição de bens e serviços no contexto da aquisição (…), uma vez que: (a) essas aquisição e detenção de participações sociais se enquadram no contexto do exercício de uma actividade económica; (b) existe uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo (a impugnante); e (c) esta actividade económica (…) é tributada em IVA e, logo, confere o direito à dedução” – cf. ponto 51.º da Impugnação.
RRR. Deste modo, conforme então alegado pela ora Recorrente, “não aceitar a dedução do IVA pelo simples facto de a aquisição dos activos geradores da actividade tributável ter sido feita através da compra de uma sociedade que os detinha, levaria a um tratamento fiscal diferente de operações objectiva e substancialmente semelhantes, em violação do princípio da neutralidade fiscal” – cf. ponto 50.º da Impugnação.
SSS. Exactamente neste sentido, o TJUE pronunciou-se no sentido que: “atendendo ao facto de por um lado, a emissão de acções ser uma operação que não é abrangida pelo âmbito de aplicação da Sexta Directiva e de, por outro, essa operação ter sido efectuada pela Kretztechnik com vista a reforçar o seu capital em proveito da sua actividade económica geral, há que considerar que os custos das prestações adquiridas por esta sociedade no âmbito da operação em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivo do preço dos seus produtos”, concluindo que “estas operações têm, com efeito, uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo” – vide Acórdão proferido no Processo C-465/03 – Kretztechnik (§36).
TTT. Nestes termos, resultando por demais evidente a (total) omissão de pronúncia do Tribunal a quo quanto ao que foi alegado nos autos – e agora reiterado –, impõe-se que a Sentença recorrida seja declarada nula, não produzindo a mesma qualquer efeito.
DO ERRO DE JULGAMENTO
UUU. Sem prejuízo do que antecede e do que este Douto Tribunal ad quem venha a decidir sobre as nulidades arguidas, cumpre aqui demonstrar que a Sentença recorrida incorre em manifesto erro de julgamento da matéria de facto e de direito, devendo a mesma ser revogada nesta parte e substituída por outra que julgue este pedido procedente.
VVV. Conforme demonstrado nos autos, a Recorrente, em 2005, contratou com o M................. B……….. Investimento a prestação de diferentes serviços de assessoria financeira.
WWW. No que aqui releva, a Recorrente contratou com o M................. B……. Investimento a prestação dos serviços descritos na “Proposta de prestação de serviços de organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo” – conforme resulta do facto provado 4) da Sentença recorrida.
XXX. Conforme resulta desta proposta de prestação de serviços: “Vimos pela presente estabelecer os termos e condições a que fica sujeita a prestação de serviços de estruturação, organização e montagem pelo M................. ………. Investimento (…) no âmbito do processo referido em epígrafe [organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo]. Para este efeito, e pela prestação de serviços supra identificados, o M……………. Investimento propõe uma remuneração global no valor de € 5.544.000 (...)” – cf. facto provado 4), citando o documento junto nos autos recorridos, “cf. comunicação a págs. 25 do ficheiro a fls. 382 a 418 do SITAF”.
YYY. Estes serviços de assessoria no âmbito da “estruturação, organização e montagem” da operação de “financiamento de médio e longo prazo” foram facturados através da nota de débito 2005/00271.
ZZZ. Estes serviços de assessoria foram prestados, pelo M................. B…….. a par com outros serviços de assessoria distintos, incluídos noutra proposta totalmente autónoma (e respectiva proposta de aditamento) – descritas nos autos e acima mencionadas – e facturados através das notas de débito 2005/00269 e 2005/00270;
AAAA. Os dois serviços de assessoria corresponderam, assim, a dois processos de financiamento distintos – de facto, se um se destinou à “aquisição dos interesses (…) na L............ Serviços, SGPS” – nos termos detalhados nos autos e acima já descritos –, o outro destinou-se a este processo de “financiamento de médio e longo prazo”, agora aqui em causa.
BBBB. Foram dois financiamentos distintos e, no âmbito dos mesmos, foram prestados serviços de assessoria distintos – ainda que pela mesma entidade e no mesmo ano –, facturados através de documentos autónomos.
CCCC. Neste ponto em concreto, o que está em causa nos autos é aferir da legitimidade do direito à dedução do IVA incorrido pela Recorrente nestes últimos serviços de “estruturação, organização e montagem” da operação de “financiamento de médio e longo prazo”, facturados através da nota de débito 2005/00271”.
DDDD. Neste âmbito, a AT entendeu que estes últimos serviços estariam relacionados com os restantes serviços então prestados pelo M................. B………. Investimento – i.e. com os serviços de assessoria no âmbito do financiamento para aquisição de participações sociais – e que, como tal, os mesmos consubstanciariam também serviços relativos a uma operação de “aquisição de participações sociais” e, portanto, o correspondente IVA, no valor total de € 1.164.240,00, não poderia ter sido deduzido pela Recorrente.
EEEE. Ora, neste ponto o Tribunal a quo decidiu – no mesmo sentido da AT –, mas incorreu em grave erro de julgamento na sua decisão.
FFFF. De facto, o Tribunal a quo, tendo apreciado os documentos (i.e. propostas e notas de débito) acima identificados e tendo dado como demonstrado e provado o respectivo conteúdo – cf. factos provados 1) a 5) – nunca podia ter concluído que está em causa um serviço único, com uma alegada finalidade única (em concreto, a aquisição de participações sociais), contudo apresentado através de “propostas de prestação de serviços” autónomas e facturado através de notas de débito distintas!
GGGG. E porque não entendeu o Tribunal a quo que aquelas propostas e aquelas notas de débito – totalmente distintas entre si – estariam relacionadas com um serviço único sim, mas um serviço de “organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo”?
HHHH. Uma vez que os serviços em causa são expressamente distintos entre si – tendo apenas as inevitáveis semelhanças decorrentes da natureza da actividade da entidade que os prestou e do ano em que foram prestados –, não pode ser aceite que o Tribunal a quo, com base nesta prova documental (da qual decorre expressamente a informação contrária), tenha decidido como decidiu.
IIII. Com efeito, tomando em consideração aquela prova, resulta da Sentença recorrida que a Recorrente alegou que “a terceira e última nota de débito da sociedade M................. B……….. Investimento refere-se aos serviços prestados por esta sociedade na organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo, face às carências de fundos do Grupo C ………….., e não no apoio ou assessoria à aquisição do Grupo L............ Media”.
JJJJ. E, ainda, que a ora Recorrente “refere que o débito de € 5.544.000,00, acrescido de IVA, se refere aos serviços prestados pelo M................. …….. Investimento na organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo face às carências de fundos do Grupo C…………………., cujo âmbito é totalmente diverso”; e mais, “mesmo que assim não se considere, afirma, somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ Serviços SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais, pelo que quanto ao restante teria de se imputar a outras operações e atividades, incluindo a aquisição de créditos por suprimentos e de prestações acessórias”.
KKKK. E, com respeito a estes factos e a estas alegações (relativos ao IVA incorrido nesta nota de débito em especial), o Tribunal a quo limitou-se a decidir como “não provado” que
“b) O Grupo C……………. tinha carências de fundos” e que “c) Somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ Serviços SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais”.
LLLL. Decidindo, nesta senda, sem mais acrescentar ou esclarecer, que “Expostas as alegações da Impugnante, verifica-se, contudo, que a pretensão que pretende prosseguir não colhe uma vez que não provou nenhuma delas” (…); “não foi feita prova, em b), que o Grupo C……………………. estava em situação de carência de fundos, não constando dos autos qualquer proposta relativa àquela operação de financiamento de médio e longo prazo”; “(…) não se prova em c) que somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ Serviços SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais, mas, não obstante, tal também não implica que o valor correspondente à restante percentagem tenha sido utilizado para os fins a que aludem os artigos 19.º e 20.º do CIVA”.
MMMM. Não pode ser aceite que estes factos não provados justifiquem ou fundamentem esta decisão do Tribunal a quo – a prova da carência de fundos era necessária para decidir de forma diferente? E a restante documentação junta e dada como “provada”, em nada aproveita para esta decisão? E quanto à repartição dos valores, caso não seja aceite como provada, apenas poderia ser considerada num segundo momento, depois de concluir que não existia outra forma de distinguir os serviços em causa.
NNNN. De facto, atenta a prova documental existente nos autos (e aceite como válida), a decisão do Tribunal a quo tinha que ser necessariamente distinta, sendo evidente que o Tribunal a quo incorreu em grave erro na apreciação da prova em causa.
OOOO. Resulta expressamente dos documentos nos autos (e, de resto, das alegações da Recorrente) que os serviços prestados pelo M................. BCP Investimento no âmbito daquela proposta e facturados através da Nota de Débito n.º……………, destinaram-se unicamente à obtenção de um “financiamento de médio e longo prazo” para pagamento de dívidas e para o exercício da actividade corrente da Recorrente – e não à aquisição de participações sociais.
PPPP. A natureza desta operação e, em especial, o direito à dedução do IVA ali incorrido pela Recorrente, nunca poderiam ficar limitados pela alegada equiparação da mesma a uma aquisição de serviços para uma operação de aquisição de participações sociais.
QQQQ. Resultando evidente que os serviços em causa foram adquiridos pela Recorrente no âmbito de um processo de financiamento da sua actividade – i.e. para pagamento de dívidas e para prossecução da sua actividade corrente – e resultando evidente que a Recorrente desenvolve uma actividade exclusivamente tributada em IVA (7 - A natureza exclusivamente tributada da actividade da Recorrente foi alegada no processo administrativo e nos presentes autos recorridos, nunca tendo sido contestada pela AT. De resto, este facto resulta do cadastro do regime de IVA que consta do portal da AT.), sempre seria de concluir que o IVA incorrido nestes serviços é integralmente dedutível.
RRRR. Neste âmbito, e apenas por dever de patrocínio se reforça que o TJUE esclareceu já reiteradamente que: “atendendo ao facto de, por um lado, a emissão de acções ser uma operação que não é abrangida pelo âmbito de aplicação da Sexta Directiva e de, por outro, essa operação ter sido efectuada pela Kretztechnik com vista a reforçar o seu capital em proveito da sua actividade económica geral, há que considerar que os custos das prestações adquiridas por esta sociedade no âmbito da operação em causa fazem parte das suas despesas gerais e são, enquanto tais, elementos constitutivos do preço dos seus produtos. Estas prestações têm, com efeito, uma relação directa e imediata com o conjunto da actividade económica do sujeito passivo (v. acórdãos já referidos BLP Group, n.° 25; Midland Bank, n.° 31; Abbey National, n.os 35 e 36, assim como Cibo Participations, n.° 33)” – vide Acórdão proferido no Processo C- 465/03 – Kietztechnik (§36).
SSSS. Concluindo que, “Daqui resulta que, nos termos do artigo 17.°, n.os 1 e 2, da Sexta Directiva, existe a favor da Kretztechnik um direito à dedução da totalidade do IVA que onerou as despesas efectuadas por esta sociedade relativamente às diferentes prestações que adquiriu no âmbito da emissão de acções por si efectuada, desde que, contudo, a integralidade das operações efectuadas por esta sociedade no âmbito da sua actividade económica seja constituída por operações tributadas (…) (acórdãos já referidos Abbey National, n.º 37, e Cibo Participations, n.º 34” – vide Acórdão proferido no Processo C-465/03 – Kietztechnik (§37).
TTTT. Ao decidir que, apesar da prova constante nos autos, os serviços aqui em causa teriam sido adquiridos no âmbito do processo de aquisição de participações – e que, como tal, a dedução do correspondente IVA não seria possível, no entender da AT – o Tribunal a quo limitou o direito à dedução do IVA pela Recorrente de forma abusiva e ilegal, em manifesta violação dos princípios norteadores deste imposto.
UUUU. Nestes termos, padecendo a Sentença recorrida de manifesto erro de julgamento dos factos acima descritos, deve a mesma ser revogada, como todos os efeitos legais, sendo reconhecido à Recorrente o direito à dedução integral do IVA suportado na aquisição dos serviços incluídos na Nota de Débito n.º ……………, no valor total de € 1.164.240,00.
VVVV. A título subsidiário, e sem jamais conceder no quando ficou expendido supra e devidamente demonstrado (e provado) nos autos, caso este Tribunal ad quem, decidindo aqui sobre o mérito da pretensão da ora Recorrente, entenda que os serviços prestados pelo M................. B….. I………. e facturados através do documento supra respeitam à prestação de um único serviço, i.e. o serviço de apoio à aquisição de 100% das participações sociais da L............ Serviços SGPS – o que, reforce-se, não se aceita por manifestamente contrário a toda a prova feita nos autos –, sempre será de decidir que, dada a manifesta diferença entre o valor total dos empréstimos concedidos e o valor de aquisição daquelas participações sociais, nem todo o financiamento se destinou àquela operação de aquisição de participações sociais.
WWWW. Nestes termos, e sem conceder, sempre será de decidir que, nos termos da prova também apresentada nos autos, apenas 71,55% do valor total dos empréstimos concedidos se destinou à aquisição daquelas participações sociais, sendo que 28,45% do valor total daqueles empréstimos não foi afecto àquela operação (tendo sido utilizado antes no âmbito da actividade habitual da Recorrente), pelo que também 28,45% do IVA incorrido pela Recorrente na globalidade dos serviços prestados pelo M................. BCP Investimento deve ser aceite como integralmente dedutível, porque incorrido no âmbito da actividade tributada da Recorrente - esta repartição resulta, de resto, do Contrato junto nos autos e aqui junto novamente como Documento 2, o qual o Tribunal a quo desconsiderou totalmente na sua análise, não se pronunciando sobre o mesmo e não extraindo do mesmo qualquer informação ou elemento.
DO REENVIO PREJUDICIAL
XXXX. Não obstante, na medida em que não seja claro para o presente Tribunal o alcance das normas da Directiva IVA que possam, em seu juízo, interferir com a boa solução deste caso, deverá então o Tribunal promover o reenvio prejudicial, das questões que entenda suscitar, para o TJUE nos termos do artigo 267.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia, relativamente (i) à admissibilidade de dedução do IVA incorrido na aquisição de serviços de assessoria e consultoria no âmbito de uma operação de aquisição, por uma sociedade que desenvolve uma actividade exclusivamente tributada em IVA, de 100% das participações sociais de uma outra sociedade, nos moldes aqui em análise e (ii) à admissibilidade de dedução do IVA incorrido na aquisição de serviços de assessoria e consultoria no âmbito de uma operação de financiamento de médio e longo prazo, por uma sociedade que desenvolve uma actividade exclusivamente tributada em IVA.

As conclusões terminam com o pedido de procedência do recurso; a declaração de nulidade da sentença por falta de fundamentação nos termos e com os efeitos previstos nos artigos 123.º e 125.º do CPPT e por vício de omissão de pronúncia, nos termos e com os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e no artigo 615.º do CPC; e, «sem prejuízo do que antecede», o pedido de revogação da sentença, «por manifesto erro de julgamento» e substituição «por outra que aprecie o mérito da pretensão da ora recorrente».

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A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.
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No despacho de admissão de recurso, o Tribunal a quo pronunciou-se sobre a alegada nulidade da sentença recorrida por falta de fundamentação, invocada pela Impugnante, aqui Recorrente, nos seguintes termos:

«(…) Ora, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 615.º, n.º 4, e 617.º, n.º 1, ambos do CPC, ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT, cremos, pelos fundamentos ali vertidos, não ocorrer a invocada nulidade.

Com efeito, foram enunciados na sentença em crise os requisitos de que dependia a dedução de IVA constante das notas de débito e da fatura, não tendo sido provado nos autos, como se evidenciou, que os serviços delas constantes se destinarem a consultadoria financeira e jurídica relacionados com a aquisição de partes de capital.

Mais se diga que através da matéria de facto assente se subsumiram as conclusões de direito alcançadas, como uma leitura da sentença facilmente revela, não padecendo a mesma de qualquer vício.

Ainda na sentença é referida a jurisprudência fundamentante da decisão, que responde a todas as questões, tendo, no final, sido efetuada a necessária aplicação aos autos, pelo que não existe qualquer falta de fundamentação.

Do exposto se extrai que a sentença em crise não padece de qualquer nulidade.»


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Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido de improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto
A sentença recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
1) Em 31-01-2005 a sociedade M................. B…….. Investimento dirigiu à C………………. SGPS, S.A., uma comunicação com assunto “Proposta de Assessoria Financeira” da qual se extrai, nomeadamente, o seguinte:
«[...] Na sequência dos contactos havidos, o [...] M................. bcp investimento [...] vem submeter à apreciação da C……………… SGPS SA [...] uma proposta de assessoria financeira no processo de eventual aquisição dos interesses da P…………………… [...] na L............ Serviços SGPS SA [...]
I -Âmbito dos trabalhos a desenvolver
No entendimento do M................. bcp investimento, os trabalhos a desenvolver poderão compreender três fases distintas:
- Assessoria na preparação da proposta non binding;
- Assessoria na preparação da proposta binding e negociação;
- Assessoria na execução. [...]
III - Remunerações
Ao M................. bcp investimento, pelos trabalhos desenvolvidos no âmbito da Fase 1 será devida uma comissão de €15.000 (quinze mil euros). Pela assessoria prestada no âmbito da Fase 2 será devida uma comissão de €80.000 (oitenta mil euros), ainda que por decisão da C..................... não seja apresentada uma proposta binding.
Uma vez que a C..................... prossiga para a Fase 3, serão devidas comissões mensais de €40.000 (quarenta mil euros).
Caso o Projecto se venha a concretizar, independentemente do âmbito e forma que a Transacção venha a tomar, acresce uma comissão de sucesso de 1.2% sobre o valor de transacção com um mínimo de €1.500.000 (um milhão e quinhentos mil euros), à qual serão deduzidas as comissões no âmbito da fase 3, até à sua concorrência. [...]» (cf. comunicação a págs. 17 a 23 do ficheiro a fls. 382 a 418 do SITAF);
2) Em 25-08-2005, a sociedade C..................... SGPS, SA dirigiu uma comunicação à sociedade M.................... Investimento da qual se retira, por extrato, o seguinte:
«[...] Nos termos oportunamente acordados entre as partes, a C..................... SGPS, SA cede, pela presente, a sua posição contratual no Acordo identificado em epígrafe (de que se junta cópia m anexo), à O……………. -- Publicidade, Televisão e Media, SA [...]» (cf. comunicação a págs. 16 do ficheiro a fls. 382 a 418 do SITAF);
3) Na mesma data, a sociedade M................. ……….. I…………… dirigiu à Impugnante uma comunicação com assunto “Proposta de Assessoria Financeira no âmbito do processo de restruturação financeira” da qual se extrai, nomeadamente, o seguinte:
«Vimos pela presente ajustar os termos e condições a que fica sujeita a prestação de serviços de consultadoria efectuada pelo [...] M................. b………. I…………. à O................... no âmbito do processo de restruturação financeira.
Atendendo à complexidade da operação e ao conjunto de tarefas adicionais que foi necessário executar e que não estavam previstas no mandato por V. Exas [...] vimos propor uma remuneração adicional às remunerações previstas no referido mandato, de 1.200.000 [...]» (cf. comunicação a págs. 24 do ficheiro a fls. 382 a 418 do SITAF);
4) Ainda na mesma data, a sociedade M................. bcp Investimento dirigiu à Impugnante uma comunicação com assunto “Proposta de prestação de serviços de organização de montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo” da qual se extrai, nomeadamente, o seguinte:
«Vimos pela presente estabelecer os termos e condições a que fica sujeita a prestação de serviços de estruturação, organização e montagem pelo [...] M................. bcp Investimento no âmbito do processo referido em epígrafe.
Para este efeito, e pela prestação de serviços supra identificados, o M................. bcp Investimento propõe uma remuneração global no valor de € 5.544.000 [...]» (cf. comunicação a págs. 25 do ficheiro a fls. 382 a 418 do SITAF);
5) Ainda em 25-08-2005, a sociedade M................. b……… Investimento emitiu em nome da Impugnante as seguintes notas de débito:
«Quadro no original»
6) Em 31-10-2005 a sociedade S …………., C ……………… e Associados, Sociedade de Advogados emitiu em nome da Impugnante a seguinte fatura:
«Quadro no original»

7) Em 13-11-2009 os serviços da AT elaboraram em nome da Impugnante o relatório de inspeção tributária (RIT) sob a ordem de serviço n.º OI200902983 para o exercício de 2005, resultando do mesmo correções em sede de IVA quanto às faturas descriminadas em 5) e 6) com a seguinte fundamentação:
«[...] O estabelecimento de uma relação entre um determinado input (neste caso, os serviços prestados pelo M................. e pela Sociedade de Advogados na operação de aquisição da L............) e um também determinado output, (neste caso serviços prestados pela O................... aos seus clientes) requereria, para que o direito à dedução do IVA que onerou o primeiro fosse assegurado, a demonstração de que o valor desse input se integra no preço praticado no output. O sujeito passivo não apresentou qualquer evidencia de que isso acontecesse neste caso.
Os serviços prestados que tiveram na base da emissão dos documentos descritos, respeitam a operações que na esfera da O................... caem fora do conceito de actividade económica previsto no nº 2 do Artigo 4º da Sexta Directiva e Artigo 1º do CIVA. Com efeito, e face às descrições apresentadas nos documentos, os serviços prestados surgem associados a assessoria financeira e jurídica para a concretização de negócios que se consubstanciariam na aquisição de partes de capital e que, numa fase posterior, o proveito que daí adviesse seria ou através da venda dessa participação (mais-valias) ou dividendos.
Estes proveitos, concretizando-se ou não, ao não resultarem da sua exploração, mas sim da sua mera posse, não se encontra por isso sujeita a IVA. E, consequentemente, as despesas incorridas na sua obtenção, ainda que sujeitas a IVA e dele não isentas, não poderão ser deduzidas pela O................... (Artigos 19º e 20º do CIVA, Artigos 17º da Sexta Directiva). [...]» (cf. RIT a págs. 5 a 74 do ficheiro a fls. 308 a 418 do SITAF);
8) Os serviços da AT emitiram em nome da Impugnante as seguintes liquidações no valor total de € 2.297.693,26:
«Quadro no original»

9) Em 10-03-2010 deu entrada nos serviços da AT um requerimento em nome da Impugnante do qual se extrai ter em vista deduzir reclamação graciosa das liquidações descritas em 8) (cf. requerimento a fls. não numeradas do PA apenso aos autos);
10) Em 25-05-2011 a reclamação graciosa descrita em 9) foi totalmente indeferida (cf. despacho a fls. não numeradas do PA apenso aos autos);
11) Em 28-06-2011 deu entrada nos serviços da AT um requerimento em nome da Impugnante do qual se extrai ter em vista deduzir recurso hierárquico da decisão descrita em 10) (cf. requerimento a págs. 1 a 20 do ficheiro a fls. 224 a 264 do SITAF);
12) Em 23-10-2012 o recurso hierárquico descrito em 11) foi totalmente indeferido (cf. despacho a págs. 17 do ficheiro a fls. 265 a 307 do SITAF);
13) Em 08-02-2013, deram entrada os presentes autos neste Tribunal (cf. registo do SITAF).
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Factos não provados

Não se consideram provados os seguintes factos:
a) As sociedades que encabeçam o Grupo C..................... cobram uma remuneração designada fee de gestão às sociedades participadas;
b) O Grupo C..................... tinha carências de fundos;
c) Somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ Serviços SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais.

Não existem outros factos, provados ou não, com interesse para a decisão da causa.

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Motivação da matéria de facto // «A convicção do Tribunal relativamente à matéria de facto dada como provada, conforme discriminado nos vários pontos do probatório, resulta dos factos alegados pelas partes e da análise dos documentos por estas juntos, que não foram impugnados, dando-se por integralmente reproduzido o teor dos mesmos bem como o do PA apenso aos autos. // Os factos não provados resultam de não terem sido carreados para os autos qualquer elemento no sentido pugnado, nomeadamente contratos, acordos, documentos contabilísticos ou outros dos quais se pudessem retirar os elementos alegados.»

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Os elementos referidos nas alíneas a) e b), da matéria de facto não provada, não se podem manter.
O quesito da alínea a) é desmentido por elementos de prova que demonstram a asserção inversa (doc. 24 junto com a reclamação graciosa).
O quesito da alínea b), corresponde a uma asserção genérica que requer uma concretização ulterior, a qual não foi feita.
X
Ao abrigo do artigo 662.º do CPC, adita-se a seguinte matéria de afcto:
14) Do relatório inspectivo consta o seguinte:
«II.3.1. Caracterização do sujeito passivo - Enquadramento jurídico e fiscal
O sujeito passivo exerce a título principal a actividade constante do CAE: 73110 - Agências de publicidade e acessoriamente outras actividades desportivas (CAE: 93192). Segundo informação prestada pela empresa constitui o seu objecto social a “(…) exploração económica do fenómeno desportivo, através de diversas formas, tais como a aquisição e comercialização de direitos do espectáculo desportivo, particularmente jogos de futebol, neles se incluindo os direitos de comunicação audiovisual, nas suas múltiplas formas de reprodução e difusão - televisão e multimédia, incluindo a Internet, a televisão interactiva, serviços móveis e outras plataformas - e a exploração comercial de publicidade estática e virtual, patrocínios e sponsorização referentes a tais espectáculos, abrangendo ainda a comercialização de artigos e prestação de outros serviços relacionados com o desporto."»

15) A actividade da Reclamante inseria-se no quadro mais geral da actividade do Grupo empresarial de que fazia parte integrante, e que se mantém com estabilidade, doravante denominado GRUPO C......................
16) O GRUPO C..................... era (e ainda é) encabeçado pela sociedade C....................., SGPS, S.A que, por sua vez, detinha o controlo da sociedade Sportinveste, SGPS, S.A., a qual era titular de um conjunto diversificado de sociedades, de entre as quais se destaca a impugnante, cujo capital era detido a 100% pela sociedade Sportinveste, SGPS, S.A., conforme graficamente se ilustra com o organigrama seguinte:
« Quadro no original»

- v Documento 8 junto à reclamação administrativa.
17) Antes da aquisição do Grupo L............ Media, pela impugnante, os títulos detidos por ambos os grupos são os seguintes:
«Quadro no original»

Em resumo:
(a) O GRUPO C..................... na área de media possuía (antes da aquisição do GRUPO L............ MEDIA) uma presença no sector da imprensa escrita, através do diário desportivo “O Jogo” e detinha uma participação de 50% no canal de televisão codificado “SPORT TV”;
(b) Com a aquisição dos negócios do GRUPO L............ MEDIA o GRUPO C..................... perspectivava, por um lado, um importante incremento no sector da imprensa escrita e, por outro lado, uma presença no mercado da radiodifusão, até aí inexistente na sua esfera, com destaque particular para a aquisição do activo “TSF” (v. notificação prévia de operação de concetração à Autoridade da Concorrência – doc. 10, junto com a reclamação graciosa.
18) Assim, em 31 de Janeiro de 2005, o M................. bcp Investimento apresentou à C....................., SGPS, S.A. uma Proposta de Assessoria Financeira relativa ao processo de eventual aquisição dos interesses da P ………………. - Serviços de ……………….., SGPS, S.A. na L............ SERVIÇOS, SGPS, S.A.. Nesta proposta menciona-se de forma expressa que a transacção assessorada pode vir a “assumir a forma de aquisição de participações sociais, créditos, activos/negócios” - (Cópia da Proposta de Assessoria Financeira apresentada pelo M................. bcp Investimento – doc. 12, junto com a reclamação graciosa.
19) A Proposta de Assessoria Financeira em apreço foi aceite e o respectivo âmbito incluía 3 fases, a saber:
Fase 1 - preparação da proposta non binding (alocação de valor aos vários activos detidos pela L............ SERVIÇOS, SGPS, S.A. e apoio na elaboração da proposta indicativa);
Fase 2 - preparação da proposta binding e negociação (avaliação da empresa e apoio nos pontos relacionados com as condições económico-financeiras da aquisição a propor à PTM); e
Fase 3 - Execução (organização e coordenação das actividades dos assessores jurídicos, auditores e outros consultores internos/externos necessários à conclusão da operação).
A remuneração das fases 1 e 2 consistia numa comissão de € 15.000 e € 80.000 (respectivamente). No tocante à fase 3, a mesma geraria comissões mensais de € 40.000 e uma comissão de sucesso de 1,2% sobre o valor de transacção com um mínimo de € 1.500.000 (ao qual seriam deduzidas as comissões mensais) – doc. 12, junto com a reclamação graciosa.
20) Em 28 de Fevereiro de 2005, a C....................., SGPS, S.A. celebrou um “Contrato Promessa de Compra e Venda de Acções e Cessão de Créditos” com a PT – M……………… - SERVIÇOS …………….., SGPS, S.A. para a aquisição das participações sociais que lhe dariam acesso às empresas e activos do GRUPO L............ MEDIA – v. contrato definitivo de compra e venda de acções junto com as alegações de recurso.
21) De seguida, em 9 de Março de 2005, como procedimento prévio necessário à concretização da compra do negócio do GRUPO L............ ……… foi, também, apresentada à Autoridade da Concorrência, a notificação prévia da operação de concentração doc. 12, junto com a reclamação graciosa.
22) Em 25 de Agosto de 2005, o M................. ….. Investimento: (a) Ajustou os termos e condições da prestação de serviços de consultadoria efectuada à O................... (ora impugnate) no âmbito da Proposta de Assessoria Financeira referida, prevendo uma remuneração suplementar de €1.200.000 pela complexidade da operação e tarefas adicionais empreendidas; (b) Formalizou as propostas de prestação de serviços de: // Organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo, pela remuneração global de € 5.544.000; e de // Agenciamento no âmbito dos Contratos de Financiamento celebrados em 25 de Agosto de 2005 (data de aquisição do GRUPO …………….) // A remuneração destes serviços foi fixada, numa base anual, no valor correspondente a 7.5 bps (basis points) do montante dos créditos em dívida na(s) data(s) de referência. // propostas que foram aceites doc. 19, junto com a reclamação graciosa.
23) Em 25 de Agosto de 2005, a impugnante adquiriu: // (a) A totalidade das participações sociais da sociedade L............ ……….., SGPS, S.A., que detinha acções representativas de 80,91% dos direitos de voto da L............ …….., SGPS, S.A., e era, directa ou indirectamente, titular de participações sociais de um conjunto de sociedades que actuava na área dos media, designadamente imprensa, rádio e novos media, detendo diversos meios de comunicação social -pelo valor de €111.691.092,24 (o valor original de € 121.493.897,24 foi abatido em €9.802.805,00, em Setembro de 2006, em virtude do accionamento de cláusulas de garantia previstas no contrato de compra e venda de acções); // Créditos por suprimentos, no montante de € 40.703.102,76, pelo valor nominal; e // Prestações acessórias, na importância de € 11.600.000,00. pelo valor nominal, cifrando-se a operação na importância final de € 163.994.195,00 (doc. 20, junto com a reclamação graciosa).
24) Com a concretização da compra do GRUPO L............ …….. o GRUPO C..................... passou a ter a seguinte configuração:
«Quadro no original»

25) A impugnante procedeu à modificação do objecto estatutário, em 11 de Agosto de 2005, ampliando-o, atenta a diversificação de áreas de actividade e o novo papel como sociedade detentora do novo sub-grupo de sociedades na área dos media. O referido objecto passou a consistir na “exploração e comercialização de direitos ao espectáculo desportivo, comunicação audiovisual, publicidade, marketing, patrocínios e imagem, bem como a produção, edição, comercialização e distribuição de publicações editoriais, sob qualquer suporte, físico ou electrónico, artes gráficas e, de um modo geral, o exercício da comunicação social e da indústria gráfica, por si ou através de participações noutras sociedades já constituídas ou a constituir ” (doc. 7, junto com a reclamação graciosa).
26) Por meio de contrato de compra e venda de acções e cessões de crédios da L............ Serviços, SGPS., SA, celebrado entre a P……. – ………….. – Serviços de ………….., SGPS, SA e a O................... – publicidade, televisão e Média, SA., a primeira vendeu à segunda a totalidade do capital social da L............ Serviços, SGPS – (doc. 2 junto com as alegações de recurso).
27) Nos exercícios de 2005 a 2008, o grupo C....................., SGPS, S.A. facturou à C ………….., SGPS, fees de gestão – (doc. 24, junto com a reclamação graciosa).

X

II.2. De Direito
2.1.1. A presente intenção recursória centra-se sobre os alegados vícios da sentença seguintes:
i) Falta de especificiação/fundamentação da matéria de facto provada e da matéria de facto não provada [conclusões K) a U)].
ii) Omissão de pronúncia, dado que o tribunal recorrido não apreciou a articulação fáctica-jurídica oferecida pela recorrente para sustentar a pretensão in judicio, relativa à natureza e o enquadramento em IVA a conferir à operação de aquisição pela recorrente de 100% das participações sociais da L............ Serviços, SGPS, e sobre as consequências desse enquadramento no direito à dedução do imposto incorrido com os serviços acima descritos, o que se afigura fundamental para a apreciação e decisão da questão essencial sub judice [conclusões V) a TTT)].
iii) Erro de julgamento na apreciação da matéria de facto e quanto ao enquadramento jurídico da causa, porquanto «[r]esulta expressamente dos documentos nos autos (e, de resto, das alegações da Recorrente) que os serviços prestados pelo M................. B……. Investimento no âmbito daquela proposta e facturados através da Nota de Débito n.º ……………, destinaram-se unicamente à obtenção de um “financiamento de médio e longo prazo” para pagamento de dívidas e para o exercício da actividade corrente da Recorrente – e não à aquisição de participações sociais» [conclusões UUU) a WWWW)]
iv) Do reenvio prejudicial [conclusão XXXX].

A sentença julgou improcedente a impugnação, mantendo na ordem jurídica o acto tributário impugnado (Liquidações adicionais de IVA, 2005).
Ponderou, em síntese, o seguinte:
«(…) afirma a Impugnante que as sociedades que encabeçam o Grupo C..................... e os seus subgrupos definem e levam a efeito uma estratégia de gestão articulada, sendo devido pelas sociedades participadas uma remuneração designada por fee de gestão. // Segundo esta, o referido fee de gestão representa de forma inequívoca a interferência das sociedades de topo na gestão das sociedades participadas, estando assim verificado o desiderato pretendido pelo TJUE. // Mais refere que o débito de € 5.544.000,00, acrescido de IVA, se refere aos serviços prestados pelo M................. ……… Investimento na organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo face às carências de fundos do Grupo C....................., cujo âmbito é totalmente diverso. // Mas, mesmo que assim não se considere, afirma, somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ ……… SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais, pelo que quanto ao restante teria de se imputar a outras operações e atividades, incluindo a aquisição de créditos por suprimentos e de prestações acessórias. // Expostas as alegações da Impugnante, verifica-se, contudo, que a pretensão que pretende prosseguir não colhe uma vez que não provou nenhuma delas, como decorre dos factos não provados em a), b) e c). // Como resulta dos factos não provados em a), não foram juntos aos autos quaisquer elementos que indiquem que a remuneração designada por fee de gestão seja paga pelas participadas às participantes. // Porém, mesmo que assim não fosse, não se pode concluir, como pretende a Impugnante, que a referida remuneração é, por si, consubstanciadora da interferência das sociedades de topo na gestão das sociedades participadas. // Igualmente não foi feita prova, em b), que o Grupo C..................... estava em situação de carência de fundos, não constando dos autos qualquer proposta relativa àquela operação de financiamento de médio e longo prazo. // Por último não se prova em c) que somente 71,55% do valor do financiamento obtido para compra da sociedade L............ ……… SGPS SA respeita à aquisição de partes sociais, mas, não obstante, tal também não implica que o valor correspondente à restante percentagem tenha sido utilizado para os fins a que aludem os artigos 19.º e 20.º do CIVA. // Concluindo, não logrou a Impugnante apresentar justificação bastante para contrariar os fundamentos apresentados pela AT na correção efetuada e aqui discutida, pelo que esta terá de se manter».

2.1.2. Antes de entramos na apreciação do objecto do recurso, cumpre referir que a recorrente, juntamente com as alegações, pretende juntar aos autos dois documentos. Trata-se da petição inicial da presente impugnação judicial, bem como de cópia do contrato de compra e venda de acções e cessões de crédios da L............ ……….., SGPS., SA, celebrado entre a P……… – …………. – Serviços ………………, SGPS, SA e a O................... – publicidade, televisão e Média, SA.
Atento o disposto no artigo 651.º do CPC, não se afigura ser de admitir a junção da petição inicial, porquanto a mesma já consta dos autos. O mesmo já não se pode dizer em relação ao de contrato de compra e venda de acções e cessões de crédios. O mesmo deve ser junto aos autos. Impõe-se ordenar a devolução da cópia da petição inicial à apresentante.
Notifique.
2.1.3. No que respeita ao fundamento do recurso referido em i), a recorrente invoca que a sentença é nula por falta de especificação da matéria de facto assente e por falta de fundamentação da decisão da matéria de facto não provada.
Apreciação. É nula a sentença quando esta não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (artigo 615.º/1/b), do CPC). Para tal «é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente»; a lei considera nula a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito, não «a mera insuficiência ou mediocridade da motivação», que pode «afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade».(1)
Mais se refere que, no que se refere à matéria de facto, a nulidade «abrange não só a falta de discriminação dos factos provados e não provados, exigida pelo n.º 2 do art.º 123.º do CPPT, como a falta de exame crítico das provas previsto no artigo [607.º/4], do CPC. // Com efeito, esta falta não pode deixar de reportar-se à fundamentação de facto exigida [pelo CPPT], exige-se não só a indicação dos factos provados, mas também dos não provados. Trata-se de uma exigência suplementar de fundamentação de facto… que é a discriminação da matéria de facto não provada, cumulativamente com a provada. Na previsão desta norma, a indicação da matéria de facto não provada deve ser feita indissociavelemente da indicação da matéria de facto provada (…)» (2).
No caso em exame, a sentença contém um acervo probatório, que inclui treze alíneas, relativas aos factos provados e três alíneas relativas aos factos não provados. Acresce ainda a explicitação da convicção probatória (3). Pelo que os critérios da decisão da matéria de facto mostram-se acessíveis a um destinatário médio, colocado na posição da recorrente.
No que respeita à alegada falta de exame crítico da prova, por referência à matéria de facto não provada, cumpre referir que não se detecta tal vício. A decisão da matéria de facto encontra-se esteada segundo razões acessíveis ao destinatário médio, colocado na posição da recorrente. Outra questão respeita ao eventual acerto de tal decisão. Esta útima extravasa, todavia, o âmbito da questão de nulidade suscitada.
Motivo porque se rejeita a presente imputação.

2.1.4. No que respeita ao fundamento do recurso referido em ii), a recorrente alega o Tribunal recorrido não apreciou a questão essencial de direito em causa nos autos. Afirma que «resulta evidente que o Tribunal deixou de se pronunciar e deixou de decidir sobre uma questão essencial de Direito, deveras relevante para a conclusão sobre a dedutibilidade do IVA aqui em causa – i.e. sobre o enquadramento em IVA a conferir à operação de aquisição, por um sujeito passivo de IVA (que apenas desenvolve operações tributadas), de 100% das participações sociais de uma entidade que também ela desenvolve e continuará a desenvolver a sua actividade integralmente tributada em IVA – viciando assim a Sentença recorrida de manifesto vício de omissão de pronúncia, gerador de nulidade, nos termos e com os efeitos previstos no n.º 1 do artigo 125.º do CPPT e no artigo 615.º do CPC».
Apreciação. A omissão de pronúncia sobre questões de que o tribunal devesse tomar conhecimento é fundamento da nulidade da sentença (artigo 615.º/1/d), CPC). O conceito de questões respeita a «tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das excepções e da causa de pedir e às controvérsias que as partes sobre elas suscitem» (4).
Compulsadas as alegações da recorrente, por um lado, e o teor da sentença recorrida, por outro lado, impõe-se concluir no sentido da não verificação da invocada omissão de pronúncia sobre questão de que cumpre conhecer. A sentença apreciou e decidiu a questão suscitada nos autos, a qual consiste em saber se o IVA incorrido pela recorrente com a aquisição das prestações de serviços discriminados nos n.os 5 e 6 do probatório são dedutíveis, por assumirem (ou não) uma relação directa com a sua actividade económica (tributável). O tribunal confirmou a validade da correcção imposta pela Administração Tributária, por entender que o IVA em causa não tem relação directa com o exercício da actividade económica da impugnante. Donde se extrai que a alegada omissão de pronúncia não se comprova nos autos.
Pelo exposto, impõe-se julgar improcedente a presente imputação.
2.1.5. No que respeita ao fundamento do recurso referido em iii), a recorrente alega que: «em 2005, contratou com o M................. ….. Investimento a prestação de diferentes serviços de assessoria financeira»; «[que] contratou com o M................. …….. Investimento a prestação dos serviços descritos na “Proposta de prestação de serviços de organização e montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo” – conforme resulta do facto provado 4) da Sentença recorrida»; que «[e]stes serviços de assessoria foram prestados, pelo M................. ….. a par com outros serviços de assessoria distintos, incluídos noutra proposta totalmente autónoma (e respectiva proposta de aditamento) – descritas nos autos e acima mencionadas – e facturados através das notas de débito …………… e …………»; que «[f]oram dois financiamentos distintos e, no âmbito dos mesmos, foram prestados serviços de assessoria distintos – ainda que pela mesma entidade e no mesmo ano –, facturados através de documentos autónomos»; que «[n]este ponto em concreto, o que está em causa nos autos é aferir da legitimidade do direito à dedução do IVA incorrido pela Recorrente nestes últimos serviços de “estruturação, organização e montagem” da operação de “financiamento de médio e longo prazo”, facturados através da nota de débito …………”».
Apreciação. A fundamentação da correcção em exame consta do ponto 7. do probatório.
Está em causa a questão de saber se o IVA associado aos custos incorridos pela impugnante com a aquisição de serviços de consultadoria (financeira e jurídica (5)), a aquando da aquisição de 100% do capital social da L............, Media justificam a dedução do IVA suportado na mesma.
A questão tem merecido uma resposta concludente por parte da jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia – [TJUE], no sentido de que devem tais custos (e o IVA associado) ter uma relação directa com o exercício de actividade económica tributável por parte do sujeito passivo. O facto de a impugnante ser uma sociedade holding, no sentido em que exerce a sua actividade através da aquisição e detenção de participações sociais noutras sociedades não prejudica a asserção em causa.
Fazendo uma síntese da referida jurisprudência, o STA, através de Acórdão de 31/05/2023, P. 0385/21.5BELLE, teve ocasião de sublinhar o seguinte:
«As simples operações de aquisição, detenção e transmissão das participações sociais não constituem em si mesmas uma actividade económica na acepção do artigo 9.º, n.º 1, da Directiva 2006/112/CE, uma vez que a simples tomada de participações financeiras noutras empresas não constitui uma exploração de um bem com o fim de auferir receitas com carácter de permanência, porque o eventual dividendo, fruto de tal participação, resulta da simples propriedade do bem e não é a contrapartida de qualquer actividade económica. // Só deve ser admitida a dedução do IVA suportado em alienações ou aquisições de participações sociais quando as despesas relativas às referidas transmissões de participações sociais estão numa relação directa e imediata com a actividade principal desenvolvida pelo transmitente». (6)
Outra é a solução encontrada pela jurisprudência nacional e europeia, quando a sociedade holding interfere na gestão das sociedades participadas, cobrando pelos serviços prestados os denominados fees de gestão. Neste caso, a interferência da holding no exercício da actividade económica da participada, associado à cobrança de comissões ou preços pelos serviços prestados, torna a sociedade holding uma sociedade prestadora de serviços, que, como tal, é sujeito passivo do IVA, deduzindo o imposto suportado a montante, o qual ostenta uma relação directa com o exercício da actividade tributável por parte da referida sociedade.
Como se refere no Acórdão do TJUE, de 17/09/2001, P. C-16/00,
«A interferência de uma holding na gestão das sociedades em que tomou participações constitui uma actividade económica na acepção do artigo 4.°, n.° 2, da Sexta Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de Maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios - Sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado: matéria colectável uniforme, na medida em que implique a realização de transacções sujeitas ao imposto sobre o valor acrescentado nos termos do artigo 2.° dessa directiva, tais como o fornecimento, pela holding às suas filiais, de serviços administrativos, financeiros, comerciais e técnicos. // As despesas efectuadas por uma holding com os vários serviços que adquiriu no âmbito de uma tomada de participação numa filial fazem parte das suas despesas gerais, pelo que têm, em princípio, um nexo directo e imediato com o conjunto da sua actividade económica. Portanto, se a holding efectuar tanto operações com direito a dedução como operações sem direito a dedução, decorre do artigo 17.°, n.° 5, primeiro parágrafo, da Sexta Directiva 77/388 que pode unicamente deduzir-se a parte do imposto sobre o valor acrescentado proporcional ao montante respeitante à primeira categoria de operações» (7).
No caso em exame, a fundamentação da não aceitação da dedução do IVA suportado assenta no seguinte:
«[...] O estabelecimento de uma relação entre um determinado input (neste caso, os serviços prestados pelo M................. e pela Sociedade de Advogados na operação de aquisição da L............) e um também determinado output, (neste caso serviços prestados pela O................... aos seus clientes) requereria, para que o direito à dedução do IVA que onerou o primeiro fosse assegurado, a demonstração de que o valor desse input se integra no preço praticado no output. O sujeito passivo não apresentou qualquer evidencia de que isso acontecesse neste caso. // Os serviços prestados que tiveram na base da emissão dos documentos descritos, respeitam a operações que na esfera da O................... caem fora do conceito de actividade económica previsto no nº 2 do Artigo 4º da Sexta Directiva e Artigo 1º do CIVA. Com efeito, e face às descrições apresentadas nos documentos, os serviços prestados surgem associados a assessoria financeira e jurídica para a concretização de negócios que se consubstanciariam na aquisição de partes de capital e que, numa fase posterior, o proveito que daí adviesse seria ou através da venda dessa participação (mais-valias) ou dividendos. // Estes proveitos, concretizando-se ou não, ao não resultarem da sua exploração, mas sim da sua mera posse, não se encontra por isso sujeita a IVA. E, consequentemente, as despesas incorridas na sua obtenção, ainda que sujeitas a IVA e dele não isentas, não poderão ser deduzidas pela O................... (Artigos 19º e 20º do CIVA, Artigos 17º da Sexta Directiva). [...]» (8)
A presente fundamentação não pode ser aceite à luz do Direito da União Europeia. Estão em causa os custos elencados nos pontos 5) e 6) do probatório. Da análise dos mesmos resulta que, salvo no que respeita à prestação de serviços associada à montagem da operação de financiamento de médio e longo prazo (9), os demais custos apresentam relação com a aquisição do capital social da L............, Media. Em relação a estes custos, o IVA suportado deve ser assumido pela contribuinte, porquanto não existe actividade económica tributável que ostente um nexo directo (ou indirecto) e necessário, entre tais custos e a mesma. Tal como resulta do probatório, a compra da totalidade do capital social da L............, Media, por parte da recorrente constituíu uma forma de reestrutruação da actividade da mesma (10), a qual, só por si, não consubstancia o exercício de qualquer actividade económica, desde logo, porque correspondeu a uma alteração do objecto social da impugnante. Com efeito, a mesma, antes da aquisição das acções, tinha como objecto societário o seguinte:
- “(…) exploração económica do fenómeno desportivo, através de diversas formas, tais como a aquisição e comercialização de direitos do espectáculo desportivo, particularmente jogos de futebol, neles se incluindo os direitos de comunicação audiovisual, nas suas múltiplas formas de reprodução e difusão - televisão e multimédia, incluindo a Internet, a televisão interactiva, serviços móveis e outras plataformas - e a exploração comercial de publicidade estática e virtual, patrocínios e sponsorização referentes a tais espectáculos, abrangendo ainda a comercialização de artigos e prestação de outros serviços relacionados com o desporto." (11).
Depois da aquisição das participações na L............, Media, o objecto societário da impugnante passou a ser o seguinte:
- “exploração e comercialização de direitos ao espectáculo desportivo, comunicação audiovisual, publicidade, marketing, patrocínios e imagem, bem como a produção, edição, comercialização e distribuição de publicações editoriais, sob qualquer suporte, físico ou electrónico, artes gráficas e, de um modo geral, o exercício da comunicação social e da indústria gráfica, por si ou através de participações noutras sociedades já constituídas ou a constituir”(12).
Tal facto, associado à inexistência de actividade por parte da recorrente no âmbito da comunicação social, fora do domínio desportivo, mostra que até à aquisição da totalidade do capital social da L............, ………., os custos de consultadoria incorridos pela recorrente com a aquisição do negócio da L............, ………. - o qual incide sobre a imprensa escrita e falada, relativa a vários aspectos da vida em sociedade e não apenas relativa à actividade desportiva - não assumem uma relação direta ou indirecta com a sua actividade económica, dado que, como a própria assume, a operação em causa permitiu-lhe o alargamento do seu objecto societário e a restruturação do grupo empresarial por si dominado. Até à aquisição das participações sociais em causa, a impugnante é uma sociedade holding, o que significa que não exerce actividade económica tributável relevante associada à referida aquisição. Não existe qualquer relação entre a actividade económica até aí exercida pela recorrente e os custos incorridos com a referida aquisição de participações sociais. A jurisprudência europeia que cita não permite outra conclusão, porquanto da mesma se extrai que a aquisição de participações sociais por sociedades holding só admite a dedução do imposto suportado quando se comprove a ocorrência de uma participação directa ou indirecta na gestão das sociedades participadas ou o exercício de uma actividade económica tributável por parte da holding que se relacione com as despesas incorridas a montante, o que no caso em exame, não ocorre, até à aquisição das referidas participações sociais. A sociedade impugnante tinha por actividade económica a exploração dos direitos associados ao fenómeno desportivo, incluindo os emergentes da actividade de comunicação social desenvolvida nesse âmbito.
Outra é a situação relativa aos custos incorridos pela impugnante após a aquisição da totalidade do capital social da L............, ………... Esta última com uma presença efectiva na imprensa escrita e de radiodifusão (13). Neste contexto, a impugnante assume o exercício da actividade económica da sociedade incorporada, e através da prestação de serviços de gestão àquela, pelos quais cobra fees de gestão (14), interfere na condução da actividade da mesma. Deste modo, os custos (e o imposto) associados ao financiamento de médio e longo prazo (15) não podem deixar de ser dedutíveis, dado que ostentam uma relação directa com o exercício de actividade tributável por parte da recorrente, directamente, ou através das suas participadas.
Em face do exposto, a correção em exame não se pode manter na sua totalidade, dado que o imposto suportado pela recorrente com a nota de débito n.º 2005/00271 (16) deve ser considerado dedutível e aceite a sua dedução. A sentença que assim não decidiu deve ser substuída por decisão que julgue procedente a impugnação, nesta parte.
Termos em que se provê parcialmente o presente recurso.
2.1.6. No que respeita ao fundamento do recurso referido em iv), cumpre referir o seguinte. A recorrente suscita a questão do reenvio prejudicial ao TJUE com vista à correcta aplicação do Direito da União Europeia.
O artigo 267.º (ex artigo 234.º) (17) do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia [TFUE] estabelece que «[s]empre que uma questão [sobre a interpretação do Direito Europeu] seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal» (18). O presente acórdão é passível de recurso.
Mais se refere que da orientação que resulta da jurisprudência do TJUE não é passível de dúvida, para efeito do exercício do direito à dedução, a necessidade da existência de um nexo entre o IVA suportado por uma sociedade que adquire o capital social de uma outra sociedade e o exercício por tal sociedade, nas relações com a sociedade adquirida, de uma actividade económica tributada (19).
Pelo que não estão reunidos os pressupostos de aplicação da obrigação de reenvio prejudicial em referência.
Motivo porque se rejeita a presente alegação.

III – DECISÃO
Termos em que, acordam os Juízes da 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder parcial provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, na parte referida em 2.1.5., julgando procedente a impugnação, nessa parte, e confirmando a sentença quanto ao mais.

Custas pela recorrente e pela recorrida, fixando-se o decaimento em 2/4, para a primeira e 2/4 para segunda, a qual é dispensada da taxa de justiça, dado não ter contra-alegado.

Registe e notifique.

Lisboa, 24 de Janeiro de 2024

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[Jorge Cortês]

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[Luísa Soares]

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[Vital Lopes]

(1) Acórdão do STA, 09/03/2022, P. 0152/12.7BEAVR.
(2) Jorge Lopes de Sousa, CPPT, Anotado, 6.º Ed., Vol. II, p. 358.
(3) v. supra.
(4) Jorge Lopes Sousa, CPPT Anotado, vol. II, p. 363.
(5) N.º 5 e 6, do probatório.
(6) Acórdão do STA, de 31/05/2023, P 0385/21.5BELLE.
(7) Acórdão do TJUE, de 27/09/2001, P. C-16/00. No mesmo sentido, v. Acórdão do TJUE, P. C-28/16, de 12/01/2017 e Acórdão do TJUE, de 16/07/2015, P. C-108/14 e C-109/14.
(8) N.º 7 do probatório.
(9) Nota de débito 2005/271.
(10) N.os 14, 16, 17, 24 e 25, do probatório.
(11) N.º 14 do probatório.
(12) N.º 25 do probatório.
(13) N.º 17 do probatório.
(14) N.º 27 do probatório.
(15) Nota de débito n.º 2005/00271.
(16) v. n.º 6 do probatório.
(17) Publicado no JOUE, 26.10.2012, https://eur-lex.europa.eu/legal-content/ PT/TXT/ ?uri= celex %3 A12012E%2FTXT.
(18) Acórdão do TJUE, de 09.12.2015, P. C-160/14, §§37 a 39.
(19) V.g., Acórdão do TJUE, de 27/09/2001, P. C-16/00; Acórdão do TJUE, P. C-28/16, de 12/01/2017 e Acórdão do TJUE, de 16/07/2015, P. C-108/14 e C-109/14.