Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 1702/12.4BELSB |
Secção: | CA |
Data do Acordão: | 03/19/2024 |
Relator: | FREDERICO MACEDO BRANCO |
Descritores: | REGRESSÕES REMUNERATÓRIAS EXÉRCITO FUNDAMENTAÇÃO |
Sumário: | I– Estando em causa um ato que opera uma regressão na posição remuneratória do Recorrente, este ato sempre sempre teria de ser fundamentado, nomeadamente, à luz da alínea a), do n.º 1, do artigo 124.º, do CPA. Em qualquer caso, nada justifica que se enverede por uma solução de fundamentação da fundamentação. É do senso comum que a lei não impõe nem poderia impor a fundamentação da fundamentação (e assim sucessivamente) sob pena de o autor do ato administrativo se ver condenado, como um Sísifo moderno, a rolar o rochedo da fundamentação até à consumação do Tempo. O objetivo da fundamentação dos atos administrativos tem em vista que os destinatários os compreendam e deles possam discordar, e sendo caso disso, impugnar o ato. A fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio ato, podendo, no entanto, sê-lo por remissão, em qualquer caso, acessível e compreensível ao seu destinatário, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão. II– Em concreto, o ato controvertido identifica de modo suficientemente claro as progressões remuneratórias de militares que, na transição a que alude o artigo 31.°, ficaram posicionados em níveis remuneratórios automaticamente criados inferiores à 1.ª posição remuneratória da nova tabela remuneratória única, tendo transitado diretamente para a 2.ª posição remuneratória sem que tenham ocupado previamente a 1.ª posição remuneratória. Um ato estará devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade administrativa, e optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação” III– Quanto à falta de audiência prévia, a mesma traduz um direito dos interessados, a que corresponde um dever da Administração, a exercer depois de concluída a fase de instrução do procedimento, traduzindo uma manifestação do princípio do contraditório e traduzindo uma garantia efetiva de que a versão do interessado, do ponto de vista dos factos e do direito, será tomada em consideração na decisão a proferir representando a visão de uma Administração participativa. Só não há lugar a audiência prévia ou à sua dispensa, nos casos consagrados no artigo 103.°, do CPA, isto é, quando se verifique um qualquer dos pressupostos legais previstos no n.° 1 (situações de inexistência) ou n.° 2 (situações de dispensa). A urgência da decisão é, portanto, aferida em relação à situação objetiva, real, que a decisão procedimental se destina a regular, não em relação à urgência procedimental, que esta (em regra, pelo menos) não justifica a preterição de formalidades essenciais do procedimento.” (pp. 464, 465, ob. cit.) IV- O ato de processamento de vencimentos apenas pode ser considerado como um ato administrativo se traduzir uma definição inovatória e voluntária, por parte da Administração, no exercício do seu poder de autoridade, sobre um problema concretamente colocado. Não se pode, assim, considerar ato administrativo o processamento mecanizado mensal dos vencimentos, elaborados normalmente pelos serviços administrativos e financeiros, mas onde não existe uma qualquer definição sobre um problema concreto. O ato objeto de impugnação, produziu efeitos apenas para o futuro, em face do que não lhe pode ser assacado alcance revogatório relativamente aos precedentes atos de processamento de vencimento. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Indicações Eventuais: | Subsecção SOCIAL |
Aditamento: |
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Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I Relatório J……….., V…………. e L………..intentaram Ação Administrativo Especial contra o Estado-Maior do Exercito, na qual peticionaram que: “(…) deve a presente ação ser julgada procedente e, em consequência: a) Ser anulado o despacho n° ………./12, de 18 de Janeiro, que determinou as regressões remuneratórias dos AA. para a 1ª Posição - Nível 35 da Tabela Remuneratória aprovada pelo Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de Outubro, e os processamentos de vencimentos dos AA. respeitantes ao mês de Fevereiro de 2012; b) Serem anulados todos os atos de processamento subsequentes efetuados nos mesmos termos; c) Ser reconhecido o direito dos AA. a auferir a remuneração pela 2ª Posição Remuneratória - nível 37 da Tabela Remuneratória aprovada pelo Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de Outubro; d) Ser o R. condenado a restituir os montantes respeitantes à diferença remuneratória entre a remuneração efetivamente paga e a remuneração a que os AA. tinham direito nos meses de Fevereiro a Julho de 2012 e todas as diferenças remuneratórias cujo não pagamento venha a ocorrer no decurso da presente ação; e) Ser o R. condenado a pagar juros moratórios à taxa legal incidentes sobre as diferenças remuneratórias supra referidas não pagas, vencidas e vincendas até efetivo e integral pagamento.” Tendo o TAC de Lisboa, por Acórdão de 18 de setembro de 2018 julgado a Ação improcedente, veio apenas o Autor L………, Recorrer para esta instância em 23 de outubro de 2018, aí concluindo: “I. O ato impugnado, no entendimento do Recorrente, é ilegal porquanto o Recorrente tinha efetivamente direito a auferir pela 2ª Posição Remuneratória - Nível 37 da Tabela Remuneratória aprovada pelo Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de outubro e a não declarar esta ilegalidade a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento; II. Como resulta da factualidade provada, por força do artigo 31°, n°s 2 e 5, do Decreto-Lei n° 269/2009, de 14 de outubro, foi o Recorrente posicionado num NRAC, com efeitos a 1 de janeiro de 2010, continuando a auferir a mesma quantia que vinham então auferindo; III. Por força do disposto o artigo 31°, n°s 4 e 5, do Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de outubro, o Recorrente, por ter completado o módulo de 2 anos, previsto no artigo 13°, n° 2, do Decreto-Lei n° 328/99, de 18 de agosto, adquiriu o direito a ser reposicionados na 2° Posição - Nível 37 da Tabela Remuneratória publicada em anexo ao referido Decreto-Lei; IV. E, por isso, aquele ato de posicionamento na 2° PR era perfeitamente legal e o único admissível; V. Na verdade, muito embora o pagamento da remuneração por força da completude do módulo apenas tivesse lugar a partir de dia 1 de janeiro, o módulo completou-se em 31 de dezembro, data em que aquele diploma ainda se encontrava em vigor, entrando nessa data, na esfera jurídica do Recorrente, o direito a auferir por aquele escalão e, nessa medida, o Nível Remuneratório Automaticamente Criado (NRAC) deveria corresponder ao valor do índice 380 da escala indiciária, de acordo com o disposto nos artigos 13° e 14°, n° 2 do Decreto-Lei n° 328/99, de 18 de agosto; VI. Ainda que o artigo 14° refira que «a progressão é automática e oficiosa» (n° 1) e que «o direito à remuneração pelo escalão superior verifica-se no dia 1 do mês seguinte ao do preenchimento dos requisitos enunciados no artigo anterior, dependendo o seu abono da simples confirmação daqueles requisitos» (n° 2), considerando que a progressão no escalão não decorre de qualquer pedido do militar (como agora sucede com a subida de PR) o momento que nasce o direito em causa deverá ser o do preenchimento dos requisitos e não o dia 1 do mês seguinte, sendo o dia 1 apenas o momento da formalização do direito por parte da Administração - será esse o sentido do termo «verifica-se» usado no n° 2 do artigo 14° do Decreto-Lei n° 328/99, de 18 de agosto; VII. Inclusivamente, tal entendimento já foi reconhecido pelo Recorrido em Informação n° 8/2014 que mereceu o despacho de concordo do Senhor Chefe de Estado Maior do Exército, despacho que já foi objeto de ação executiva e provimento da mesma por douta sentença de 21.06.2018, proferido no âmbito do processo n° 2802/15.4BEPRT, que correu termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto; VIII. Não podia, por isso, o tempo adquirido de 731 dias de tempo relevado no escalão ter sido considerado gasto, como sustenta a douta sentença recorrida; IX. Por outro lado, a intenção do legislador, por trás dos n°s 1 e 2, não era a de que o NRAC fosse, ele mesmo, uma posição remuneratória na qual o Recorrente deveria permanecer pelo tempo considerado adequado e só então progredir para a PR 1; X. Se assim fosse, tal consistiria numa redução encapotada do vencimento do Recorrente, já que, se se mantivesse no anterior escalão, terminados os 2 anos progrediria para escalão, cujo montante pecuniário equivaleria à PR 2 - nível 37; XI. A única intenção do legislador (pelo menos a declarada) foi adaptar o sistema remuneratório dos militares ao sistema remuneratório dos trabalhadores em funções públicas, aplicando a mesma Tabela Remuneratória Única; XII. Se assim não se entender, a interpretação operada pela entidade demandada é inconstitucional porquanto, colocando em causa o direito à retribuição, previsto no artigo 59°, n° 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa (CRP), restringe o mesmo de forma manifesta desproporcional à finalidade pretendida, não se cumprindo, assim, as exigências plasmadas no artigo 18°, n° 2, da CRP na restrição de direitos fundamentais; XIII. Se assim não fosse, sempre a referida transição tinha que operar-se por força do n° 5 do artigo 104° da Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que determina que "No caso previsto no n° 2 [ou seja quando tenha sido criada uma posição remuneratória automaticamente criada equivalente à auferida], quando, em momento ulterior, os trabalhadores devam alterar a sua posição remuneratória na categoria, e da alteração para a posição seguinte resultasse um acréscimo remuneratório inferior a um montante pecuniário fixado na portaria referida no n° 2 do artigo 68°, aquela alteração tem lugar para a posição que se siga a esta, quando a haja."; XIV. Nos termos da portaria referida no n° 2 do artigo 68° desta Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, isto é, da Portaria n° 1553-C/2011, de 31 de dezembro, o montante pecuniário do artigo 104°, n° 5, é de 28 €, superior, por isso, à diferença de 8 € entre o NARC e a 1° Posição - Nível 35 da Tabela Remuneratória; XV. Ainda que, nos termos do n° 3 do artigo 2° da Lei n° 12-A/2008, de 27 de fevereiro, o regime nela consagrado não se aplica aos militares das Forças Armadas e da Guarda Nacional Republicana, cujos regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações constam de leis especiais, o n° 4 do mesmo artigo refere a obrigatoriedade das leis que regem estes regimes especiais obedecerem aos princípios consagrados nos vários preceitos aí referidos, nomeadamente no que concerne à transição para a tabela remuneratória única e porque no Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de outubro, não se plasmou norma semelhante, deverá aplicar-se aquele preceito ao caso em apreço; XVI. A douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento, ao considerar, a propósito da (im)possibilidade de revogação dos atos constitutivos de direitos que colocou o Recorrente, em 2010, na posição remuneratória constante da factualidade dada como provada que «veio definir apenas para o futuro a situação remuneratória de cada um dos AA. em termos do posicionamento remuneratória, mais concretamente, a partir de Fevereiro de 2012. Na verdade, como resulta da matéria de facto provada, o despacho, ora impugnado, e como precisamente alegado pela Entidade Demandada, não procedeu à revogação de qualquer ato administrativo anteriormente praticado, que definisse a situação jurídica de cada um dos AA.. O despacho em apreço constituiu uma primeira decisão administrativa que apreciou a situação concreta dos AA. e que sopesado o quadro legal definido no Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, nomeadamente, o regime de transição para as posições remuneratórias previsto no artigo 31.°, fixou o montante pecuniário que era devido a cada um dos AA. e com efeitos a partir de Fevereiro de 2012»; XVII. Como resulta da factualidade dada como provada "[a] transição dos militares para a nova tabela remuneratória única deveria ser efetuada nos termos previstos no artigo 31° desse diploma legal e, com vista à execução desse regime transitório, foi aprovada a metodologia e as instruções técnicas constantes do anexo ao Despacho n° ………../2009, de 15 de Dezembro, do Chefe do Estado-Maior do Exército" (o sublinhado é nosso). E foi "[s]eguindo essas instruções técnicas" que "os serviços passaram a abonar mensalmente aos Autores ..."; XVIII. Como resultam daquelas instruções técnicas, os serviços ficaram mandatados para alterarem as posições remuneratórias, não se tendo condicionado a referida alteração à publicação das listas nominativas ou a um qualquer ato posterior de validação das operações de posicionamento efetuadas; XIX. Por isso mesmo, nenhum ato foi posteriormente praticado pelo CEME, devendo considerar-se que a alteração da posição remuneratória operada pelos serviços e vertida nos recibos de vencimento é, para todos os efeitos, um ato administrativo nos termos do disposto no artigo 120° do CPA (em vigor à data); XX. É este, aliás, o sentido do entendimento jurisprudencial dominante, de que é exemplo o douto Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 05.06.2008, proferido no âmbito do processo n° 01212/06, disponível em www.dgsi.pt; XXI. Considerou, ainda, o douto Acórdão do STA de 24.09.1996, proferido no âmbito do recurso n° 039625 e de 10.12.1996, proferido no âmbito de recurso n° 039.296, que "O ato de processamento de abonos e vencimentos é ato administrativo constitutivo de direito, quando não resulte de erro de cálculo ou deficiência de procedimento contabilístico, e correspondam a aplicação de regras definidas genericamente para a determinação da posição remuneratório do funcionário", o que foi o efetivamente sucedido com as orientações técnicas aprovadas pelo CEME; XXII. Ainda quanto à (im)possibilidade de revogação por não se tratar de ato revogatório mas apenas de ato com efeitos para o futuro a douta sentença recorrida também incorre em erro de julgamento, desde logo, porque se trata, efetivamente, de um ato ilegal que não respeita os normativos jurídicos aplicáveis, conforme demonstrado supra; XXIII. Por outro lado, o facto de não ter sido expressamente revogado o ato anterior não significa que tal ato não seja um ato revogatório, na medida, em que , como decidiu o douto Acórdão do STA de 05.11.1998, «a revogação de ato administrativo pode ser explícita ou implícita. A revogação implícita decorre da incompatibilidade jurídica entre a regulamentação da situação jurídica estabelecida pelo ato primário (o ato revogado) e a que do segundo resulta (ato revogatório)»; XXIV. É precisamente o que sucede no caso em apreço. Os atos impugnados são atos revogatórios dos atos que determinaram, em 2010, a transição do Recorrente para a Tabela Remuneratória Única e, como tal, apenas podiam ser praticados se cumpridos os requisitos do artigo 141° do Código de Procedimento Administrativo em vigor à data, o que não sucedeu porque há muito havia decorrido o prazo de um ano previsto naquele preceito normativo; XXV. Entendimento contrário põe em causa a segurança jurídica e o princípio da proteção da confiança, ínsitos num Estado de Direito Democrático constitucionalmente consagrado no artigo 2° da Constituição da República Portuguesa (CRP); XXVI. No que respeita à preterição da formalidade da audiência prévia, estando demonstrado que os atos impugnados eram ilegais, não colhe o argumento de que esta formalidade em dada alteraria a decisão impugnada, não havendo, assim degradação do vício numa mera irregularidade, sanável. Termos em que deve o presente recurso ser admitido e ao mesmo dado provimento, sempre com as legais consequências, com o que V. Ex.cias., Senhores Desembargadores, farão Justiça!” A Entidade Recorrida não veio apresentar Contra-alegações de Recurso. O Recurso veio a ser admitido por Despacho de 29 de outubro de 2018. O Ministério Público junto deste TCAS, notificado em 30 de janeiro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
N) Tendo os AA. requerido a fundamentação de facto e de direito (em 3 e 29 de Fevereiro e 5 de Março), e a consequente intimação para consulta de documentos e passagem de certidões, que correu termos neste tribunal com os n°s. 862/12.9BELSB, 865/12.3BELSB e 578/12.6BELSB, cfr. docs. 5 a 7, juntos com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido. O) Ao pedido de fundamentação de facto e de direito, os AA. obtiveram como resposta a remessa das cópias dos despachos conjuntos do Ministério das Finanças e da Administração Interna e da Defesa Nacional, para as quais se remeteu para a fundamentação do ato de regressão, cfr. docs. 8 a 10, juntos com a p.i., cujo teor se dá por integralmente reproduzido.” IV – Do Direito Como se afirmou já, peticionaram os então Autores que: “(…) deve a presente ação ser julgada procedente e, em consequência: a) Ser anulado o despacho n° ………../12, de 18 de Janeiro, que determinou as regressões remuneratórias dos AA. para a 1ª Posição - Nível 35 da Tabela Remuneratória aprovada pelo Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de Outubro, e os processamentos de vencimentos dos AA. respeitantes ao mês de Fevereiro de 2012; b) Serem anulados todos os atos de processamento subsequentes efetuados nos mesmos termos; c) Ser reconhecido o direito dos AA. a auferir a remuneração pela 2ª Posição Remuneratória - nível 37 da Tabela Remuneratória aprovada pelo Decreto-Lei n° 296/2009, de 14 de Outubro; d) Ser o R. condenado a restituir os montantes respeitantes à diferença remuneratória entre a remuneração efetivamente paga e a remuneração a que os AA. tinham direito nos meses de Fevereiro a Julho de 2012 e todas as diferenças remuneratórias cujo não pagamento venha a ocorrer no decurso da presente ação; e) Ser o R. condenado a pagar juros moratórios à taxa legal incidentes sobre as diferenças remuneratórias supra referidas não pagas, vencidas e vincendas até efetivo e integral pagamento.” Correspondentemente, decidiu-se em 1ª Instância julgar improcedente a presente ação administrativa especial e, em consequência, absolver a Entidade Demandada dos pedidos. Vejamos: Refira-se, desde já que se adere plenamente ao teor do Discurso fundamentador da decisão de 1ª Instância, o qual responde pontualmente às alegações de Recurso do Autor aqui Recorrente, sendo que se acompanhará de perto a fundamentação aí aduzida. Efetivamente vieram recursivamente suscitados os seguintes vícios: “(…) erro de julgamento na apreciação dos vícios de falta de fundamentação, preterição da audiência prévia, violação de lei e violação do artigo 141° do Código de Procedimento Administrativo”, matérias que foram expressa e adequadamente tratadas em 1ª Instância. Vejamos: Falta de Fundamentação: Alega o Recorrente que apenas foi informado dos fundamentos de facto e de direito que estiveram subjacentes à regressão das suas posições remuneratórias após a apresentação dos respetivos pedidos de intimação para consulta de documentos e passagem de certidões intentadas para o efeito. Mais expressa o Recorrente que os ofícios enviados em resposta pela Entidade Demandada não cumpriram as exigências do n.° 1, do artigo 124.°, quanto às respetivas regressões remuneratórias, pelo que os atos objeto de impugnação deverão ser anulados por falta de fundamentação, nos termos do disposto no artigo 135.° do CPA. Estando em causa um ato que opera uma regressão na posição remuneratória do Recorrente, este ato sempre teria de ser fundamentado, nomeadamente, à luz da alínea a), do n.º 1, do artigo 124.º, do CPA. Em qualquer caso, como se sumariou, entre muitos outros, no Acórdão deste TCAS nº 2001/22.9BELSB, de 11-05-2023, “Nada justifica que se enverede por uma solução de fundamentação da fundamentação. É do senso comum que a lei não impõe nem poderia impor a fundamentação da fundamentação (e assim sucessivamente) sob pena de o autor do ato administrativo se ver condenado, como um Sísifo moderno, a rolar o rochedo da fundamentação até à consumação do Tempo.” A fundamentação visa pois identificar o percurso lógico na decisão tomada que impõe, na expressão da realidade intelectual seguida pelo decisor, pela indicação do iter cognoscitivo seguido, permitir a sindicabilidade da decisão, em particular no que se refere ao respeito por aqueles princípios gerais a que está sujeito o exercício da função administrativa. O objetivo da fundamentação dos atos administrativos tem em vista que os destinatários os compreendam e deles possam discordar, e sendo caso disso, impugnar o ato. A fundamentação deve ser expressa o que significa que inexistem fundamentações implícitas ou sem qualquer concretização mínima. A fundamentação gizada pelo legislador ordinário faz apelo a uma fundamentação suficiente, clara e coerente. Suficiente, contendo todos os elementos essenciais, clara porque inteligível e sem meros conceitos vagos e coerente porque está numa relação de adequação e proporcionalidade com a decisão que dela se extraia. A fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio ato, podendo, no entanto, sê-lo por remissão, em qualquer caso, acessível e compreensível ao seu destinatário, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão. Em concreto, tendo presente os factos dados como provados, nomeadamente, o teor do Despacho impugnado, o extrato do anexo D respeitante ao Recorrente, do Despacho Conjunto n.° 12713/2011, de 09/09/2011 para o qual o mesmo remeteu, bem como da remessa do acervo de documentos pela Entidade Demandada ao Recorrente, em resposta aos pedidos formulados ao abrigo do artigo 61.° e seguintes, do CPA e para eventual efeito do artigo 60.°, n.° 2, do CPTA, é de concluir que o Recorrente ficou ciente dos fundamentos de facto e de direito que determinaram a prática do ato consubstanciado no Despacho n.° ……./2012, de 18/01, do Chefe do Estado-Maior do Exército, bem como dos subsequentes atos de processamento de vencimentos. Efetivamente, da leitura do citado Despacho Conjunto, decorre que na sequência da auditoria financeira de controlo e avaliação da gestão de recursos humanos e da realização de despesa, incidindo a mesma, concretamente, sobre as remunerações dos militares dos três ramos das Forças Armadas a que se refere o artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, em especial no que respeita aos termos e efeitos da transição para a nova tabela remuneratória única, prevista nos artigos 31.° e 32.° do mesmo Decreto-Lei, realizada pela Inspeção-Geral de Finanças (IGF), foram identificadas situações decorrentes da aplicação do regime de transição que consubstanciavam a prática de ilegalidades e/ou irregularidades. O ato descrito identifica de modo suficientemente claro as progressões remuneratórias de militares que, na transição a que alude o artigo 31.°, ficaram posicionados em níveis remuneratórios automaticamente criados inferiores à 1.ª posição remuneratória da nova tabela remuneratória única, tendo transitado diretamente para a 2.ª posição remuneratória sem que tenham ocupado previamente a 1.ª posição remuneratória. Assim, em face da factualidade dada como provada, atento o teor do Despacho Conjunto n.° 12713/2011, de 09/11, que integrava, para além do Despacho Conjunto n.° 2602/2012, de 30/12/2011, a certidão de documentos remetida individualmente a cada Autor, tal permitiu que o aqui Recorrente tenha podido em tempo conhecer das razões subjacentes à prolação do Despacho objeto de impugnação, concluindo-se que o mesmo se encontra suficientemente fundamentado, inverificando-se o vicio de falta de fundamentação vindo de analisar. Como se sumariou no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 02/12/2010, Processo n.° 0554/10, a que se adere, “Um ato estará devidamente fundamentado sempre que um destinatário normal possa ficar ciente do sentido dessa mesma decisão e das razões que a sustentam, permitindo-lhe apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade administrativa, e optar conscientemente entre a aceitação do ato ou o acionamento dos meios legais de impugnação” Da falta de audiência prévia Entende o Recorrente originariamente que a mera invocação de necessidade de contenção da despesa pública não constituiu fundamento suficiente para a dispensa da audiência dos interessados, nos termos do disposto no artigo 110.°, do CPA, sendo que não resultou do conteúdo do ato de regressão remuneratória que essa dispensa se devesse à verificação das situações elencadas no artigo 103.°, do CPA. O Despacho n.° …………/12, de 18/01, objeto de impugnação, faz menção expressa ao Despacho n.° 12713/2011, de 09/11, dos Ministros de Estado e das Finanças e da Defesa Nacional, bem como ao Despacho n.° 2602/2012, de 30/12, dos Ministros de Estado e das Finanças e da Defesa Nacional e, como tal, não foi precedido de audiência prévia, alicerçando-se precisamente no disposto no n.° 5 deste último Despacho que dispunha vinculativamente que “[n]ão deverá haver lugar à audiência prévia nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 103.° do CPA, com fundamento no facto de estar em causa a necessidade de contenção da despesa pública, podendo a mesma comprometer a execução e utilidade do presente despacho.” Como referem Mário Esteves de Oliveira, Pedro Gonçalves e João Pacheco de Amorim in “Código do Procedimento Administrativo Comentado”, 2ª Edição, Edições Almedina, 2007, p.449, “[o] direito de audiência é também, sob pena de se lhe retirar grande parte do seu significado prático, o direito a ver ponderadas na decisão final as razões, a “causa de pedir”, suscitadas por cada interessado e contrainteressado. Nem que seja para as repudiar. O direito de audiência dos interessados no procedimento constitui uma concretização legislativa do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões administrativas que lhe disserem respeito, consagrado no art. 267.°, n.° 4, da CRP, e aplicável à generalidade dos procedimentos (...).” Assim, a audiência prévia traduz um direito dos interessados, a que corresponde um dever da Administração, a exercer depois de concluída a fase de instrução do procedimento, traduzindo uma manifestação do princípio do contraditório e traduzindo uma garantia efetiva de que a versão do interessado, do ponto de vista dos factos e do direito, será tomada em consideração na decisão a proferir representando a visão de uma Administração participativa. Só não há lugar a audiência prévia ou à sua dispensa, nos casos consagrados no artigo 103.°, do CPA, isto é, quando se verifique um qualquer dos pressupostos legais previstos no n.° 1 (situações de inexistência) ou n.° 2 (situações de dispensa). Em qualquer caso, não é impeditivo da apresentação de uma fundamentação suficiente relativamente a situação de facto subsumível num desses pressupostos legais e que seja justificativa da não realização de audiência de interessados ou da sua eventual dispensa. Mais referem os citados Autores que “[na] fundamentação do juízo referido, exige-se, quanto aos casos de decisão urgente, a indicação dos factos que relevam não apenas essa urgência, como também que ela é tal que aniquila a possibilidade de realizar a audiência no prazo mínimo da lei - bem como a eventual ponderação da sua substituição por outras medidas provisórias. (...). E também não são razões ligadas com a necessidade de cumprimento do prazo legal de conclusão do processo ou com a necessidade de prevenir o aparecimento de atos tácitos - pelo menos, em que tais efeitos têm contrainteressados -, que podem ser invocadas para justificar o preenchimento dos pressupostos da urgência da decisão. Para prevenir ou remediar essas situações, a Administração dispõe, com efeito, de poderes situados no âmbito do princípio da informalidade e da celeridade, mas não pode, obviamente, sacrificar posições e direitos procedimentais dos interessados, com cariz deste. A urgência da decisão é, portanto, aferida em relação à situação objetiva, real, que a decisão procedimental se destina a regular, não em relação à urgência procedimental, que esta (em regra, pelo menos) não justifica a preterição de formalidades essenciais do procedimento.” (pp. 464, 465, ob. cit.) No caso em presença, os fundamentos para não haver lugar a audiência prévia inserem-se no contexto de contenção da despesa pública reportada a Janeiro de 2012, como resulta do ponto 4, do Despacho n.° 2602/2012, de 30/12/2011 ao se referir que “atentas as dificuldades técnicas verificadas na execução das determinações constantes do n.° 1 do despacho n.° 12713/2011, que impossibilitaram o cumprimento do prazo de 31 de Outubro de 2011, a reconstituição casuística das situações identificadas nesses número é reportada a 1 de janeiro de 2012.” Acresce que os fundamentos aduzidos encontram correspondência com o concreto contexto histórico vivido em Portugal coincidente com o período denominado de “emergência pública”, que se prolongou até 2014 e precisamente porque Portugal vivia, então, em plena fase de ajuda financeira externa. Neste sentido, veja-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 07/05/2003, Processo n.° 0373/03, no qual se concluiu que quanto à audiência do interessado, bem como relativamente à concretização do conceito de urgência enquanto causa justificativa de preterição da audiência prévia, nos pontos 1 a 3 do seu sumário o seguinte: “I - O cumprimento do disposto no artigo 100° do CPA visa não só garantir a participação do interessado nas decisões que o afetam, como ainda contribuir para o acerto das decisões administrativas, permitindo a quem tem de decidir ”o melhor conhecimento possível das realidades”. II - Trata-se de formalidade essencial, de cumprimento obrigatório em todos os casos, a não ser que se esteja perante alguma das situações previstas no art. 103o, n°1 , alíneas a), b) e c) do Código do Procedimento Administrativo, ou quando ocorra alguma das hipóteses contempladas nas alíneas a) e b) do n° 2 do mesmo artigo, que permitem ao órgão instrutor dispensar a audiência; em tais casos, deverá a Administração proferir decisão fundamentada, da qual constem os motivos pelos quais entenda não haver lugar a audiência ou dever a mesma ser dispensada. III - A urgência deve ser objetiva, baseada em factos concretos, que legitimem a preterição da formalidade da audiência prévia nas circunstâncias do caso (...).” Do vindo de expender decorre que o Despacho objeto de impugnação não viola o disposto na alínea a), do n.° 1, do artigo 103.°, do CPA, improcedendo, assim, igualmente o vicio vindo de analisar. Do vício de violação de lei Alegam originariamente os Autores, entre os quais o aqui Recorrente, que os atos objeto de impugnação padecem do vício de violação de lei, porquanto tinham efetivamente direito a auferir pela 2.ª posição remuneratória, nível 37, da Tabela Remuneratória, aprovada pela Lei n.° 296/2009, de 14/10. Mais aduziram que pelo artigo 31.°, n.° 2 foram posicionados numa posição remuneratória, automaticamente criada (PRAC), com efeitos a 01/01/2010 e, por sua vez, em Fevereiro de 2010, por força do disposto no artigo 31.°, n.°s 3 e 4, adquiriram o direito a ser posicionados na posição remuneratória 2, nível 37, da referida Tabela, por terem completado, nessa data, o módulo de 2 anos, previsto no artigo 13.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 328/99, de 18/08. Alegaram ainda os então Autores, que “passaram, assim, diretamente da NARC (nível remuneratório automaticamente criado) para a 2.ª Posição Remuneratória, sem passar pela 1.ª Posição Remuneratória” o que obrigou à criação de um regime transitório tendente à mudança das posições remuneratórias. Objetivamente, em 01/01/2010 entrou em vigor o regime remuneratório aplicável aos militares dos quadros permanentes e em regime de contrato e de voluntariado dos três ramos das Forças Armadas, conforme previsto no artigo 35.° do referido diploma legal. No seu preâmbulo é explicitado que “o presente decreto-lei obedece aos princípios consagrados nos artigos 66.° e seguintes da Lei n.° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, alterada pela Lei n.° 64-A/2008, de 31 de Dezembro, que define os regimes de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas”. Por sua vez, o artigo 31.°, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10 estabeleceu o regime de transição dos militares para a nova tabela remuneratória única, tendo como epígrafe “Regime de transição para as posições remuneratórias” e dispondo do seguinte modo: “1 - A transição para a nova tabela remuneratória única é efetuada nos seguintes termos: a) O militar é reposicionado na posição a que, no respetivo posto, corresponda nível remuneratório cujo montante pecuniário seja igual ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que tem direito, incluindo adicionais e diferenciais de integração eventualmente devidos; b) Na falta de identidade, o militar é reposicionado na posição remuneratória, automaticamente criada, cujo montante pecuniário seja igual ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que atualmente tem direito, incluindo adicionais e diferenciais de integração eventualmente devidos. 2 - Quando, na transição efetuada nos termos do número anterior, a remuneração base, incluindo adicionais e diferenciais de integração eventualmente devidos, seja inferior à primeira posição remuneratória prevista no anexo I ao presente decreto-lei, do qual faz parte integrante, para o respetivo posto, o militar é transitoriamente posicionado no nível remuneratório, automaticamente criado, de montante pecuniário igual à remuneração a que tem direito à data de entrada em vigor do presente decreto-lei. 3 - Quando da aplicação conjugada das regras de reposicionamento, mencionadas nos números anteriores, com as regras de promoção e progressão estatutariamente previstas, resulte, pela primeira vez, uma situação remuneratória igual ou superior a militares do mesmo posto e maior antiguidade, estes, por despacho do respetivo Chefe de Estado-Maior, transitam para a mesma posição. 4 - Para efeitos de mudança de posição remuneratória releva todo o tempo de serviço contado na data de entrada em vigor do presente decreto-lei, bem como para efeitos de aplicação do previsto no número anterior. 5 - O regime de transição previsto nos números anteriores aplica-se também aos militares na situação de reserva e aos deficientes das Forças Armadas. 6 - A execução orçamental do disposto nos n.ºs 2 e 3 é assegurada por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da defesa nacional.” Como decorre da matéria de facto provada, pelo Despacho n.° ………../2009, de 15/12, do Chefe do Estado-Maior do Exército foi aprovada a metodologia e as instruções técnicas para a aplicação do novo regime remuneratório, definindo a sua forma de execução. Correspondentemente, o aqui Recorrente L………foi promovido ao posto de major, com efeitos a 16/10/2006, tendo sido posicionado no 1.° escalão - índice 365 da estrutura remuneratória anexa ao DL n° 328/99, de 18/08. Em qualquer caso, em 01/01/2010, com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, nomeadamente o aqui Recorrente já não poderia progredir para o 2.° escalão. Com efeito, com a entrada em vigor do novo regime remuneratório aplicável aos militares dos três ramos das Forças Armadas, constante do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, nos termos do regime de transição para a tabela remuneratória única, do artigo 31.°, o reposicionamento remuneratório não podia gerar qualquer acréscimo remuneratório. Assim, nos termos das regras do reposicionamento remuneratório do artigo 31.°, do D.L. n.° 296/2009, de 14/10, o reposicionamento deveria ser efetuado para a posição remuneratória a que correspondesse um nível remuneratório que permitisse auferir uma remuneração base idêntica à que na data da transição o militar vinha auferindo, de modo a não determinar qualquer aumento remuneratório. Efetivamente, o artigo 31.°, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10 emprega a expressão “igual”, quando a Lei n.° 12/-A/2008, de 27/02 relativamente às regras de posicionamento remuneratório, utilizava a expressão «idêntica», o que faz toda a diferença. Assim, o reposicionamento remuneratório operado ao abrigo das novas regras de transição deveria ser efetuado para a posição remuneratória a que correspondesse um nível remuneratório que permitisse aos militares auferirem uma remuneração base que deveria ser “igual” à que na data da transição os mesmos vinham auferindo, de modo a não determinar qualquer majoração remuneratória. Como também dispõe o normativo legal em apreço, na ausência dessa mesma “identidade”, os militares deveriam ser reposicionados na posição remuneratória, automaticamente criada (PRAC), fazendo-se corresponder o respetivo montante pecuniário a auferir à remuneração base que os militares, na data da transição vinham auferindo. Do mesmo modo, decorre do n.° 2, do artigo 31.°, que caso a remuneração base auferida fosse inferior à 1.ª posição remuneratória, para o respetivo posto, os militares deveriam, transitoriamente, ser posicionados na posição remuneratória, automaticamente criada (PRAC), de montante pecuniário “igual” à remuneração a que teriam direito à data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10. Não obstante o vindo de referir, a Entidade Recorrida passou a abonar mensalmente aos Autores pela 2.ª posição remuneratória, nível 37, do posto de major, da tabela remuneratória, constante do anexo 1, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, o que determinou que, nomeadamente o Recorrente, em virtude de contar mais de dois anos de serviço, tenha passado diretamente do 1.° escalão do posto de major para a 2.ª posição remuneratória da tabela remuneratória única. Em face do acima discorrido, em 01/01/2010, ao abrigo do novo regime remuneratório, o Recorrente deveria ter transitado para o “nível remuneratório cujo montante pecuniário seja igual ao montante pecuniário correspondente à remuneração base a que tem direito" (cfr. artigo 31.°, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10) sendo que, considerando o tempo de serviço de dois anos, progrediria para a posição seguinte. Como se viu, o Recorrente, em qualquer caso, não poderia ter beneficiado de uma “progressão” do 1.° escalão para a 2.ª posição remuneratória, sem antes “transitar”, ao abrigo do novo regime remuneratório, para uma posição remuneratória, automaticamente criada (PRAC) de montante pecuniário “igual” à remuneração a que teria direito à data de entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, pois que o montante remuneratório previsto para a 1.ª posição era superior ao montante remuneratório que o Recorrente auferia à data da transição. Aqui chegados, resulta que o controvertido Despacho n.° …………/2012, de 18/01/2012, do Chefe de Estado-Maior do Exército, visou restabelecer a legalidade, tendo, nomeadamente, o Recorrente transitado para a posição remuneratória, automaticamente criada, correspondente ao valor da remuneração que vinham auferindo até 31/12/2009, ao abrigo do artigo 31.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10 e, tendo por base os dois anos de tempo de serviço, progrediram, nessa mesma data, para a 1.ª posição remuneratória, tal como dispõe o n.° 4 do mesmo normativo. Importa não perder de vista, em qualquer caso, que durante os anos de 2011 e 2012 ficou suspensa a contagem do tempo de serviço, para efeitos de progressão remuneratória, por força do disposto no artigo 24.°, da Lei n.° 55-A/2010, de 31/12 (Orçamento do Estado para 2011) e no artigo 20.°, da Lei n.° 64-B/2011, de 30/12 (Orçamento do Estado para 2012), o que inviabilizou a progressão no tempo inicialmente previsto. Assim, o Despacho objeto de impugnação n.° …………./2012, de 18/01, do Chefe do Estado- Maior do Exército, mostra-se conforme com o quadro normativo aplicável, designadamente, com o princípio da legalidade e com o disposto no artigo 31.°, do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, não se mostrando violado o disposto no artigo 119.°, da Lei n.° 67-A/2007, de 31/12, o artigo 13.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 328/99, o artigo 24.°, da Lei n.° 55-A/2010, de 31/12, bem como o artigo 20.°, da Lei n.° 64-B/2011, de 30/12. Improcede, pois, igualmente o vicio vindo de analisar, de violação de lei. Da violação do artigo 141.°, do CPA O Recorrente entende, entre o mais, que os atos que determinaram a sua regressão remuneratória para a 1.ª posição remuneratória, nível 35, revogando os atos que, por sua vez, o posicionaram na posição remuneratória 2, nível 37 constituiu um ato revogatório de ato constitutivo de direitos. Em bom rigor, o Despacho n.° …………/2010, de 18/01 veio determinar, no seu ponto 2, o seguinte: “O Comando de Pessoal, através da Direção de Serviços de Pessoal, deve proceder ao processamento das remunerações dos militares abrangidos pelos n.°s 1 e 2 do Despacho Conjunto n° 121 73/2011, de 9 de Setembro, e pelo n.°2 do Despacho Conjunto de 30 de Dezembro de 2011, ambos de Suas Exas. os Ministros de Estado e das Finanças e da Defesa Nacional, refletindo os seus efeitos a partir de fevereiro de 2012, inclusive.” Veio assim o referido despacho definir para o futuro a situação remuneratória, no caso, do Recorrente, em termos do posicionamento remuneratória, mais concretamente, a partir de Fevereiro de 2012. Com efeito, como resulta da matéria de facto provada, o despacho objeto de impugnação não procedeu à revogação de qualquer ato administrativo anteriormente praticado, que definisse a situação jurídica do Recorrente. Efetivamente, o referido Despacho constitui singelamente uma primeira decisão administrativa apreciativa da situação, no caso, do Recorrente, atento o quadro legal constante do Decreto-Lei n.° 296/2009, de 14/10, de modo a dar cumprimento ao regime de transição para as posições remuneratórias previsto no artigo 31.°. Não se mostrando provada a existência de qualquer precedente ato administrativo que tenha decidido sobre a concreta situação remuneratória do Recorrente, quanto aos posicionamento remuneratório aquando da transição funcional, importa concluir que o ato objeto de impugnação é insuscetível de determinar a revogação de ato anterior constitutivo de direitos. Com relevância para a presente questão, alude-se ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 03/11/1999, proferido no Processo N.° 040611, no qual se sumariou: “I - Não há um direito adquirido a uma remuneração, quando não tenha havido uma decisão autoritária que tenha apreciado a situação correta e ponderando o quadro legal tenha definido de forma autoritária e unilateral, o "quantum" devido ao funcionário, tendo o processamento da remuneração sido feito na sequência desta deliberação. II - Não tendo havido um ato desta natureza, o ato que posicionou a funcionária num escalão diferente (inferior) aquele por que vinha a ser remunerada não oferece qualquer direito anterior, pois pretende unicamente definir uma posição para o futuro.” Do mesmo modo, sumariou-se no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22/11/2011, Processo n.° 0547/11, o seguinte: “I - Os atos de processamento de vencimentos dos funcionários públicos são verdadeiros atos administrativos, isto é, consubstanciam decisões, ao abrigo de normas de direito público, que produzem efeitos jurídicos, numa situação individual e concreta (art. 120.° CPA), quanto às questões sobre as quais tenham tomado posição com vontade de unilateralidade decisória.” Também com pertinência para o caso em apreço, veio o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, de 18/11/2016, Processo n.° 00554/12.9BEVIS, no qual o aqui Relator interveio como adjunto, sumariar o seguinte: “O ato de processamento de vencimentos apenas pode ser considerado como um ato administrativo se traduzir uma definição inovatória e voluntária, por parte da Administração, no exercício do seu poder de autoridade, sobre um problema concretamente colocado. Não se pode, assim, considerar ato administrativo o processamento mecanizado mensal dos vencimentos, elaborados normalmente pelos serviços administrativos e financeiros, mas onde não existe uma qualquer definição sobre um problema concreto.” Sublinha-se, mais uma vez que o ato objeto de impugnação, produziu efeitos apenas para o futuro, em face do que não lhe pode ser assacado alcance revogatório relativamente aos precedentes atos de processamento de vencimento. Atenda-se finalmente ao discorrido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 19.11.2015, no Procº nº 1259/15, citado no Acórdão deste TCAS nº 738/12.0BELSB, de 5 de Maio de 2022, exatamente face a questão idêntica àquela que aqui se mostra controvertida: "... No caso em apreço, o problema central era, e é, o do posicionamento remuneratório dos autores. Essa matéria foi analisada pelas duas instâncias de modo conforme. O TAF apreciou-a detalhadamente e concluiu que se mostrava «conforme com a lei, com a Constituição da República Portuguesa, com o princípio da legalidade e com o disposto no art. 31.° do DL n.° 296/2009, o posicionamento efetuado pelo despacho impugnado, de 18.1.2012». «Aqui chegados considera-se que os Autores não têm direito a auferir a remuneração pela 2ª posição remuneratória - nível 37 da Tabela Remuneratória aprovada pelo DL n° 296/2009, de 14.10. É que a decisão impugnada limitou-se a aplicar o disposto no art. 31° do DL 296/2009, sem ofender o conteúdo essencial de qualquer direito fundamental, nem padecer de vício de lei ou de forma». Complementarmente, referiu que mesmo quanto aos vícios meramente geradores de anulabilidade tinha caducado a possibilidade da sua impugnação contenciosa. No Tribunal Central, sem se proceder, embora, a nova apreciação detalhada, acompanhou-se o sustentado no TAF: «O que está em causa, como bem se refere na decisão recorrida, prende-se com a circunstância de os ora recorrentes, até à prolação do despacho impugnado, terem beneficiado da ilegal colocação na segunda posição remuneratória sem terem passado pela primeira e sem se ter verificado a circunstância do art° 31°, n° 3, do DL 296/2009, situação corrigida pelo despacho impugnado». Atenta a citada jurisprudência errou o Tribunal a quo ao julgar que o despacho impugnado padecia de vício de violação de lei, concretamente do disposto no artigo 140.° do CPA, pelo que o presente recurso tem de ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida, julgando-se a ação intentada (…) totalmente improcedente". Pelo exposto, o alegado vício é também julgado improcedente. * * * Deste modo, acordam os Juízes que compõem a Subsecção Social da Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, negar provimento ao Recurso, confirmando-se a decisão proferida em 1ª instância. Custas pelo aqui Recorrente. Lisboa, 19 de março de 2024 Frederico de Frias Macedo Branco Teresa Caiado Rui Pereira |