Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12/10.6 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:05/12/2022
Relator:PATRÍCIA MANUEL PIRES
Descritores:LIQUIDAÇÃO CORRETIVA
REPOSIÇÃO SITUAÇÃO EX ANTE
PRINCÍPIO DO INQUISITÓRIO
ANULAÇÃO DO VPT
Sumário:I - Os atos de apuramento de imposto subsequentes a uma liquidação adicional, resultantes, quer de petições apresentadas pelos sujeitos passivos, parcialmente atendidas, quer de revisão oficiosa por parte da AT, em razão dos quais se apure quantitativo de imposto inferior ao determinado na primitiva liquidação, mais não representam que liquidações corretivas, as quais não sendo lesivas dos interesses dos destinatários no segmento não corrigido, não permitem a reabertura de qualquer discussão contenciosa.
II - O princípio do inquisitório é um poder/dever do Juiz, não podendo, contudo, desvirtuar o ónus probatório que existe, a montante, sobre as partes. A intervenção ativa do julgador tem de ser sempre balizada pela igualdade processual das partes, e com o respeito pela justa repartição do ónus da prova.
III - Na sequência da anulação judicial do VPT, por padecer de erro sobre os pressupostos de facto e de direito, a AT deve proceder, oficiosamente, à anulação do IMI liquidado com base nesse valor, representando, aliás, essa asserção uma decorrência do consignado no artigo 100.º da LGT e 173.º do CPTA.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:l – RELATÓRIO

O Digno Representante da Fazenda Pública (DRFP) interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pela sociedade “C…, SA” contra os atos de liquidação adicional de Imposto Municipal de Imóveis (IMI), referentes aos anos de 2005, 2006, 2007 e 2008, e respeitantes aos artigos inscritos na matriz predial urbana da freguesia da Brandoa, sob os artigos U-34…, U-34…, U-34…, U-35…, U-35… e U-035…, nos montantes, respetivamente, de €359.416,95, € 233.135,65, € 233.135,65 e € 169.826,75, no valor global de €988.515,00.

Nas suas alegações de recurso formula as seguintes conclusões:

“A. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos identificados que julga procedente a impugnação deduzida pela impugnante C… S.A. dos actos de liquidação adicional de IMI n.º 2008 4350……, 2008 4350……, 2008 4350……. e 2008 435…….. referentes aos anos de 2005, 2006, 2007 e 2008 e aos prédios inscritos na matriz predial urbana da freguesia de Amadora sob os artigos U-34…, U-34…, U-3…, U-35…, U-3… E U-03… nos valores de € 359.416,95, € 233.135,65, € 233.135,65 e € 162.826,75, no valor global de € 988.515,00, e na sequência de segundas avaliações dos imóveis em apreço nos autos.

B. Discorda a Fazenda Pública, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto procede a uma errónea apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão, com consequente inadequado enquadramento jurídico.

C. Resulta da alínea D) dos factos assentes constantes da douta sentença terem sido emitidas a 14/11/2009 novas liquidações referentes aos mesmos anos e aos mesmos prédios urbanos, com a anulação parcial das aqui impugnadas, liquidações essas no valor de € 139.188,93, € 141.007,11, € 86.834,06 e €44.635,52 - que não se constituíram nos presentes autos como objecto de impugnação – mediante as quais foi dado acolhimento a parte das pretensões da impugnante o que determina, contrariamente ao decidido, uma inutilidade superveniente da lide parcial.

D. Por outro lado, sucede que, contrariamente ao afirmado na douta sentença de que dos autos não resultam quais os segmentos e fundamentos que determinaram a redução das liquidações, consta do processo administrativo tributário a fls. 338 a 341 factos referentes às revisões oficiosas ocorridas, pelo que, deveriam tais factos encontrar-se vertidos no probatório.

E. Factos esses que aqui enunciamos e que determinariam uma diversa apreciação do Tribunal: (i) conforme resulta do processo administrativo tributário, a fls. 338 e ss, e da informação constante dos autos, para a qual remete a contestação da Fazenda Pública, foram emitidas novas liquidações de IMI, com anulação das liquidações nos presentes autos sindicadas; (ii) as sindicadas liquidações foram objecto de uma revisão oficiosa, efectuada em 29/10/2009 (liquidação n.º 695……..); (iii) e, em tal liquidação ainda foi indevidamente considerado o prédio a que corresponde o artigo matricial 35…, relativamente ao qual foram liquidadas as importâncias de € 27.097,00, € 27.097,00 e € 21.677,60, respectivamente, para os anos de 2006, 2007 e 2008; (iv) No entanto, foi possível verificar que em 28/11/2009 foi emitida nova liquidação com o n.º 696……. notificada à impugnante por meio de carta registada em 07/12/2009, e mediante a qual se processa à correcção mediante a anulação das importâncias referidas no ponto antecedente; (v) e à data da interposição da presente impugnação, a 05/01/2010, havia já sido a impugnante notificada da revisão oficiosa ocorrida em Novembro de 2009; (vi) no referente aos artigos matriciais 3… e 34…, subsequentemente 35… e 35…, e não obstante a revisão oficiosa mencionada, continuou a subsistir lapso na liquidação aos mesmos referentes, porquanto a impugnante era proprietária de apenas 28%, motivo pelo qual foi efectuada nova revisão oficiosa materializada com a emissão da liquidação n.º 763……. em 24/04/2010 (cf. fls. 341 do processo administrativo apenso aos presentes autos); (vii) e quanto ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º 34….., tendo o mesmo sido efectivamente alienado mediante escritura pública outorgada a 03/01/2007, à ora impugnante apenas era exigível nos termos do artigo 8.º do CIMI o imposto referente aos anos de 2005 e de 2006, facto que determinou a anulação das liquidações referentes aos anos de 2007 e 2008, tendo a impugnante sido notificada da revisão oficiosa materializada na liquidação n.º 776………. em 24/04/2010 8cf. fls. 341 do processo administrativo apenso).

F. A constar tais factos do probatório, em conjunto com o facto vertido na alínea D), a solução necessária teria de ser a conclusão de que aquando da impugnação dos actos de liquidação nos presentes autos considerados já os mesmos haviam sido anulados por via da revisão oficiosa ocorrida, com emissão de novas liquidações, essas sim susceptíveis de se constituírem como objecto da impugnação, o que nos leva à falta de objecto dos presentes autos, a qual se constitui como excepção dilatória de conhecimento oficioso, determinante da absolvição da instância, nos termos do disposto nos artigos 278.º e n.º 2 do artigo 576.º, 577.º e 578.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

G. E mesmo que se considerasse ter a revisão oficiosa ocorrido na pendência da acção, deparar-nos-íamos com a impossibilidade superveniente da lide em virtude do subsequente desaparecimento dos actos impugnados, mercê da emissão de novas liquidações, com consequente extinção da instância por impossibilidade da lide pela falta superveniente de objecto, ao abrigo do disposto na 1.ª parte da alínea e) do artigo 277.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

H. Ainda, diz-nos a douta sentença que “(…) parte das questões suscitadas pela Impugnante foram já resolvidas dando origem a liquidações correctivas que reduziram o valor do IMI a pagar.”, sendo que importaria saber quais questões são essas suscitadas pela impugnante já resolvidas, incumbindo-lhe, à luz do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material, face à constatação patente na douta sentença de que dos autos não resultariam os segmentos e fundamentos da emissão de novas liquidações, averiguar dos motivos determinantes de tais alegadas liquidações correctivas.

I. Pelo que, incorreu o douto Tribunal na violação do princípio do inquisitório, de acordo com o qual o deverá diligenciar no sentido de alcançar o conhecimento de todos os factos pertinentes para a decisão, por se constituírem como pertinentes nos presentes autos os factos dos quais derivaram as revisões oficiosas documentadas no processo administrativo, por desde logo, poderem dar resposta às pretensões da impugnante, o que em tal caso implicaria a inutilidade superveniente da lide.

J. Por fim, e sem conceder, e quanto ao julgamento pelo Tribunal a quo de que não podem os actos de liquidação impugnados manter-se por inexistência de base tributável, na sequência da anulação dos actos de fixação dos VPT que serviram de base às liquidações, entendemos padecer a douta sentença de erro de julgamento de direito, por ser feita tal segunda avaliação à luz do n.º 3 do artigo 76.º do CIMI.

K. Norma essa da qual decorre terem relevância as avaliações a efectuar apenas em sede de IRS, IRC e IMT, por estar em causa a aplicação do método comparativo dos métodos de mercado, devendo assim manter-se as liquidações de IMI.

L. Nos termos expostos, a douta sentença ao julgar procedente a presente impugnação fê-lo incorrendo em erro de julgamento de facto, atenta a errónea apreciação dos factos pertinentes para a decisão, determinante de erro de julgamento de direito, face à não constatada falta de objecto dos autos, ou, caso assim não se entenda, à não constatada impossibilidade superveniente da lide decorrente de superveniente perda de objecto da mesma, ou ainda, caso assim não se entenda, à verificação da parcial inutilidade superveniente da lide.

M. Sendo que, mesmo que assim não se entenda, mais incorre a douta sentença, quanto ao julgamento procedente por inexistência de base tributável em virtude da anulação dos actos de fixação do VPT que serviram de base às liquidações impugnadas em erro de julgamento de direito por violação do disposto no n.º 3 do artigo 76.º do CIMI.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença ser revogada, com o julgamento improcedente da impugnação, com as legais consequências.

Sendo que V. Exas. decidindo farão a Costumada Justiça.”


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A Recorrida C…, SA, contra-alegou, concluindo do modo que segue:

“A) O presente recurso vem interposto pela Fazenda Pública contra a decisão judicial proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no âmbito do processo de impugnação judicial n.° 12/10.6BELRS, a qual julgou procedente a impugnação interposta pela ora Recorrida contra os atos de liquidação adicional de IMI n.°s 2008 435……, 2008 43……., 2008 4350……. e 2008 435…….., referentes, respetivamente, aos anos de 2005, 2006, 2007 e 2008 e aos prédios inscritos na matriz predial urbana da freguesia de Amadora sob os artigos U-34…, U-34…, U-34…, U-3…, U- 35… e U-03…., nos valores de € 359.416,95, € 233.135,65, € 233.135,65 e € 162.826,75;

B) Ora, o presente recurso assenta em fundamentos surpreendentes, por se resumirem a uma tentativa da Fazenda Pública imputar vícios aos atos de liquidação então sindicados que, apesar de resultarem de alegada factualidade já constante dos autos, só agora foram invocados, em sede de recurso, ainda que sob a veste das anteriores ilegalidades imputadas pela Fazenda Pública ou pela própria AT;

C) De facto, esta não é a sede própria para produzir uma alegação desta natureza, na medida em que a falta de objeto da ação nunca constituiu uma questão controvertida nos presentes autos;

D) Caso contrário, a Fazenda Pública teria certamente invocado anteriormente a inutilidade superveniente da lide, pugnando pela anulação, ainda que parcial, do objeto da ação, o que nunca fez; com os que se prendiam com a ilegalidade do ato de apuramento do VPT dos imóveis, decorrente por exemplo da sua falta de fundamentação ou da violação do disposto no artigo 76.° do CIMI;

E) Muito menos veio invocar que a ação já não tinha objeto no momento em que foi apresentada, tal como faz agora a Fazendo Pública em sede de recurso;

F) Os atos corretivos, alegadamente emitidos em 14/11/2009, terão consubstanciado uma mera revisão oficiosa dos atos de liquidação anteriormente emitidos, representando uma mera redução do valor tributável;

G) Mas a eventual redução daquele valor tributável não esteve relacionada com a totalidade dos vícios apontados pela Recorrida na impugnação judicial, e certamente não esteve relacionada da nos presentes autos;

H) Daí que o Tribunal a quo tenha - e bem - considerado que parte das questões suscitadas pela então Impugnante, ora Recorrida, já haviam sido resolvidas com a revisão oficiosa desses atos;

I) Mas uma coisa é também certa: é que, independentemente da data em que a AT e agora a Fazenda Pública, alegam que tais atos corretivos foram emitidos, a ora Recorrida não tinha, nem poderia ter, conhecimento da sua emissão no momento em que interpôs a presente ação;

J) De resto, a Fazenda Pública em momento algum o demonstra, limitando-se a invocar que a ação já não tinha objeto ab initio e a remeter para documentos da lavra da própria AT, de prints informáticos, que nada provam quanto à emissão ou, sobretudo, à receção e efetivo conhecimento dos mesmos por parte da Recorrida;

K) Não ficou demonstrado nos autos nada mais do que a emissão de tais atos;

L) Ou seja, não apenas a Fazenda Pública já não pode, em termos processuais, invocar a falta de objeto da ação, como também é manifesto que a eventual revisão oficiosa dos atos de liquidação de IMI em crise não interferiu, ou modificou, os fundamentos invocados pela Recorrida em sede de impugnação judicial, nomeadamente, a ilegalidade do VPT anteriormente apurado pela AT no âmbito da 2a avaliação realizada;

M) Os atos de liquidação de IMI então impugnados foram emitidos na sequência da realização de uma 2a avaliação da qual resultou o apuramento de um VPT ilegal, e que não se podia manter na ordem jurídica, conforme foi inequivocamente declarado pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no processo de impugnação judicial n.° 1468/09.5BESNT, assim como, pelo Tribunal Central Administrativo Sul e pelo Supremo Tribunal Administrativo, em sede dos vários recursos apresentados pela Fazenda Pública dessa sentença e, por fim, pelo próprio Tribunal Constitucional, através da Decisão Sumária n.° 245/2013, proferida em 13/05/2013;

N) E, sem prejuízo de outros vícios a que já se fez referência e sobre os quais a Fazenda Pública agora se detém em exclusivo, foi precisamente este o principal fundamento invocado pela Recorrida para sustentar a ilegalidade dos atos de liquidação de IMI aqui em crise, isto é, a ilegalidade do respetivo VPT;

O) Nos presentes autos ficou por demais evidenciado que o destino que recairia sobre os atos de liquidação de IMI então sindicados se encontrava umbilicalmente conectado com o próprio destino que teriam os respetivos atos de fixação do VPT dos imóveis;

P) Pelo que, insista-se, não se compreende como pode haver anulação de uns sem a anulação de outros;

Q) O Tribunal Recorrido compreendeu isto, daí o sentido da sua decisão;

R) A Fazenda Pública, inexplicavelmente, não compreendeu, optando por sustentar que a Recorrida deveria ter contestado judicialmente outros atos de liquidação que não os aqui em crise, na tentativa de, com essa argumentação profundamente inovadora, anular todo o anteriormente processado, com fundamento numa exceção dilatória só agora "revelada";

S) Para além do exposto, o argumento agora patenteado pela Fazenda Pública, de que o Tribunal Recorrido incorreu num erro de julgamento, por violação do disposto no artigo 76.°, n.° 3, do CIMI, carece de qualquer fundamento e encontra-se inquinado ab initio de um vício de interpretação dos factos dados como assentes e dos pressupostos de aplicação dessa norma;

T) Com efeito, este argumento terá que ser desconsiderado logo à partida, na medida em que as decisões judiciais que recaíram sobre a impugnação judicial deduzida contra o VPT dos imóveis em causa, acima mencionadas, vieram expressamente confirmar a impossibilidade legal de aplicação do método comparável de mercado nesta situação - ou seja, do disposto no artigo 76.°, n.° 4, do CIMI (atual artigo 76.°, n.° 3);

U) Se não poderia ser aplicada essa forma de cálculo e de apuramento do VPT, então, como é evidente, também não tem aplicação a estatuição da norma constante do anterior n.° 4 do artigo 76.° do CIMI, ou seja, em momento algum a 2ª avaliação efetuada apenas poderia - caso fosse válida - produzir efeitos em sede de IRS, IRC e IMT;

V) Acresce que, não só não houve um pedido da Recorrida no sentido de circunscrever os efeitos da 2ª avaliação, excluindo o IMI desse âmbito, como também nunca poderia a AT ter recorrido aos indicadores que recorreu, conforme decidido nos autos de impugnação n.° 1468/09.5BESNT;

W) Razão pela qual não pode proceder o recurso agora apresentado pela Fazenda Pública, devendo em consequência manter-se a sentença proferida em primeira instância pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

TERMOS EM QUE deverá ser julgado improcedente, por infundado, o recurso apresentado pela Fazenda Pública, devendo, em consequência, manter-se a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra nos autos de impugnação judicial acima identificados, com as demais consequências legais.”


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O Digno Magistrado Ministério Público (DMMP), junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os Vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

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II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:

“Com relevância para a decisão, tendo em conta a documentação junta aos autos e constante do PAT, bem como a posição assumida pelas partes, consideramos provados os seguintes factos:

A) Em 20 de Outubro de 2009, foram emitidas pelo Serviço de Finanças de Amadora-2, as notificações das seguintes 2as avaliações, referentes a imóveis inscritos na matriz predial urbana da freguesia da Brandoa, concelho da Amadora:

1) Ficha N.º 0025……., referente ao artigo P 35…., com passagem a urbano em 5 de Maio de 2006, que fixou o VPT em € 5.419.400 – cf. Doc. A.1, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 615…., a fls. 81

2) Ficha N.º 00251……, referente ao artigo P 34…., com passagem a urbano em 24 de Junho de 2005, que fixou o VPT em € 51.062.530 – cf. Doc. A.2, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 6159….., a fls. 82

3) Ficha N.º 002518….., referente ao artigo P 34…., com passagem a urbano em 24 de Junho de 2005, que fixou o VPT em € 10.111.920 – cf. Doc. A.3, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 6159…., a fls. 83

4) Ficha N.º 00251……, referente ao artigo P 3497…, com passagem a urbano em 24 de Junho de 2005, que fixou o VPT em € 10.708.940 – cf. Doc. A.4, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 615….., a fls. 84

5) Ficha N.º 002……, referente ao artigo P 35…, com passagem a urbano em 5 de Maio de 2006, que fixou o VPT em € 49.777.080 – cf. Doc. A.5, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 615……, a fls. 85

6) Ficha N.º 0025……, referente ao artigo P 35…., com passagem a urbano em 5 de Maio de 2006, que fixou o VPT em € 11.220.500 – cf. Doc. A.6, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – Ofício n.º 615……, a fls. 86

B) Em 29 de Outubro de 2009, foram emitidas as seguintes liquidações adicionais de IMI, dirigidas à Impugnante, C…, S.A., com o NIF n.º 502……., referentes a imóveis inscritos na matriz predial urbana da freguesia da B…, concelho da Amadora:

1) N.º 200843……, no valor de € 359.416,95, referente a 2005 e aos artigos U-03…, U-03…. e U-03…., respectivamente com os VPT de € 51.062.530, e 10.111.920 e € 10.708.940, mediante aplicação de taxa de 0,50%; – cf. Doc. 1 junto pela Impugnante - liquidação de fls. 36

2) N.º 200843……, no valor de € 233.135,65, referente a 2006 e aos artigos U-03…, U-3…, U-3… e U-3…., respectivamente com os VPT de € 10.708.940, € 5.419.400, € 24.888.540 e € 5.610.250, mediante aplicação de taxa de 0,50%; – cf. Doc. 2 junto pela Impugnante - liquidação de fls. 37

3) N.º 20084………., no valor de € 233.135,65, referente a 2007 e aos artigos U-03…, U-35…, U-3… e U-35…, respectivamente com os VPT de € 10.708.940, € 5.419.400, € 24.888.540 e € 5.610.250, mediante aplicação de taxa de 0,50%; – cf. Doc. 3 junto pela Impugnante - liquidação de fls. 38

4) N.º 20084……., no valor de € 186.508,52, referente a 2008 e aos artigos U-034…, U-3…, U-35… e U-3…, respectivamente com os VPT de € 10.708.940, € 5.419.400, € 24.888.540 e € 5.610.250, mediante aplicação de taxa de 0,50%; – cf. Doc. 3 junto pela Impugnante - liquidação de fls. 38

C) Em 28 de Dezembro de 2009, a Impugnante apresentou impugnação judicial dos actos de fixação do VPT, descritos na alínea A) supra. - cf. Doc. A.A, que integra o Anexo A, junto pela Impugnante – petição de Impugnação, de fls. 49 a 80

D) Em 14 de Novembro de 2009, o Serviço de Finanças da Brandoa, emitiu as seguintes liquidações correctivas:

1) da liquidação N.º 4350……, no valor de € 359.416,95, anulando o valor de € 220.228,02, e fixando o valor final em € 139.188.93;

2) N.º 200843……, no valor de € 233.135,65, anulando o valor de € 92.128,54, e fixando o valor final em € 141.007,11;

3) N.º 200843……, no valor de € 233.135,65, anulando o valor de € 146.301,59, e fixando o valor final em € 86.834,06;

4) N.º 200843……., no valor de € 186.508,52, anulando o valor de € 118.191,23, e fixando o valor final em € 44.635,52; – cf. Doc. junto pela Fazenda Pública – a fls. 366 e 367

E) Em 29 de Novembro de 2011, foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no processo n.º 1468/09.5BESNT, referente à impugnação descrita na alínea C) supra, que determinou a anulação dos actos tributários de "fixação do valor patrimonial tributário dos prédios urbanos (lotes de terreno para construção) inscritos na matriz predial urbana da Brandoa sob os artigos P35…, P34…, P34…, P35… e P35…". – cf. Doc. junto pela Impugnante, de fls. 338 a 358

F) Em 15 de Maio de 2012, foi proferido acórdão pelo TCAS, no recurso n.º 05465/12, referente à sentença descrita na alínea anterior, que decidiu não tomar conhecimento do recurso, por concluir que "se encontra transitada em julgado a decisão com o referido fundamento não questionado no recurso e considerando que os efeitos dela não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo (…) dado que a decisão se tem de manter com a anulação das avaliações em causa como nela se dispôs". – cf. Documento n.º 005283863, de 19-11-2014 (fls. 13 a 31, de 100), na plataforma SITAF

G) Em 19 de Junho de 2012, foi proferido acórdão pelo TCAS, no recurso n.º 05465/12, referente ao acórdão descrito na alínea anterior, que decidiu "desatender a invocada nulidade do acórdão bem como a invocada incompetência" daquele Tribunal". – cf. Doc. junto pela Impugnante, de fls. 396 a 400

H) Em 3 de Abril de 2013, foi proferido acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA), no recurso n.º 102/13, referente ao acórdão descrito na alínea anterior, que decidiu não apreciar a nulidade do acórdão proferido por já existir decisão transitada em julgado. – cf. Doc. junto pela Impugnante, de fls. 408 a 416

I) Em 13 de Maio de 2013, foi proferida Decisão Sumária n.º 245/2013 pelo Tribunal Constitucional, no recurso n.º 359/13, referente ao acórdão descrito na alínea anterior, que decidiu não conhecer do objecto do recurso por inconstitucionalidade, além do mais, por "a eventual decisão de provimento do" recurso ser "insusceptível de determinar a reforma da decisão recorrida". – cf. Doc. junto pela Impugnante, de fls. 418 e 419.


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Consta como factualidade não provada o seguinte:

“Não foram alegados quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.”


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A motivação da matéria de facto assentou no seguinte:

“A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos e das informações oficiais constantes dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, conforme indicado junto a cada facto.

Relativamente à alínea F) supra, consigna-se que a mesma foi aditada ao abrigo do disposto no artigo 412º n.º 2 do Código de Processo Civil (CPC), aplicável por remissão do artigo 2º alínea e) do CPPT, mediante consulta do Tribunal à plataforma SITAF e na sequência das decisões subsequentes juntas pela impugnante aos presentes autos, que deram origem às alíneas G) a I) da factualidade assente. Atento o disposto nos artigos 3º n.º 3 e 130º do CPC, considera-se desnecessária a junção de tal decisão aos presentes autos, bem como a sua prévia notificação às partes (coincidentes nos presentes autos), que da mesma foram notificadas no âmbito do respectivo processo.”


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Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, ex vi artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:

J) A 05 de janeiro de 2010, foi deduzida impugnação judicial junto do Tribunal Tributário de Lisboa, contra os atos de liquidação adicional de IMI evidenciados em B) (cfr. fls. 2 dos presentes autos);


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III.FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra os atos de liquidação adicional de IMI referentes aos anos de 2005, a 2008, respeitantes aos artigos inscritos na matriz predial urbana da freguesia da Brandoa, sob os artigos U-34…, U-34…, U-34…, U-35…, U-35… e U-035….

Importa, desde logo, ter presente que em ordem ao consignado no artigo 639.º, do CPC e em consonância com o disposto no artigo 282.º, do CPPT, as conclusões das alegações do recurso definem o respetivo objeto e consequentemente delimitam a área de intervenção do Tribunal ad quem, ressalvando-se as questões de conhecimento oficioso.


Assim, ponderando o teor das conclusões de recurso cumpre aferir se a sentença:

Ø Padece de erro de julgamento de facto, por um lado, face à desconsideração de factualidade reputada relevante para a presente lide, e por outro lado, atenta a errónea interpretação da factualidade refletida no probatório;

Ø Incorreu em erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito, na medida em que a existência de revisões oficiosas dos atos tributários acarreta, desde logo, uma falta de objeto ou no limite uma inutilidade superveniente da lide;

Ø Assim não se entendendo, aquilatar se a procedência da impugnação judicial preteriu o consignado no artigo 76.º, nº3 do CIMI, atento o âmbito e alcance do julgado anulatório dos atos de segunda avaliação.

A Recorrente sustenta, desde logo, que deveriam ser aditados ao probatório os factos que infra se enumeram, que determinariam uma apreciação distinta por parte do Tribunal a quo:


(i) foram emitidas novas liquidações de IMI, com anulação das liquidações nos presentes autos sindicadas;


(ii) as sindicadas liquidações foram objecto de uma revisão oficiosa, efectuada em 29/10/2009 (liquidação n.º 695……..);


(iii) e, em tal liquidação ainda foi indevidamente considerado o prédio a que corresponde o artigo matricial 35…., relativamente ao qual foram liquidadas as importâncias de € 27.097,00, € 27.097,00 e € 21.677,60, respectivamente, para os anos de 2006, 2007 e 2008;


(iv) No entanto, foi possível verificar que em 28/11/2009 foi emitida nova liquidação com o n.º 6960….. notificada à impugnante por meio de carta registada em 07/12/2009, e mediante a qual se processa à correcção mediante a anulação das importâncias referidas no ponto antecedente;


(v) e à data da interposição da presente impugnação, a 05/01/2010, havia já sido a impugnante notificada da revisão oficiosa ocorrida em Novembro de 2009;


(vi) no referente aos artigos matriciais 34… e 349…, subsequentemente 354… e 354…, e não obstante a revisão oficiosa mencionada, continuou a subsistir lapso na liquidação aos mesmos referentes, porquanto a impugnante era proprietária de apenas 28%, motivo pelo qual foi efectuada nova revisão oficiosa materializada com a emissão da liquidação n.º 763…… em 24/04/2010 (cf. fls. 341 do processo administrativo apenso aos presentes autos);


(vii) e quanto ao prédio inscrito sob o artigo matricial n.º 34…, tendo o mesmo sido efectivamente alienado mediante escritura pública outorgada a 03/01/2007, à ora impugnante apenas era exigível nos termos do artigo 8.º do CIMI o imposto referente aos anos de 2005 e de 2006, facto que determinou a anulação das liquidações referentes aos anos de 2007 e 2008, tendo a impugnante sido notificada da revisão oficiosa materializada na liquidação n.º 77631……. em 24/04/2010 (cf. fls. 341 do processo administrativo apenso).


Ora, se o que está em causa é o Tribunal a quo ter errado o seu julgamento de facto, cumpre ter em conta a tramitação processual atinente à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto.


Para o efeito, importa começar por aferir se a Recorrente cumpriu os requisitos consignados no artigo 640.º do CPC.


Preceitua o aludido normativo que:

“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;

b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.

3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

Com efeito, no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao Recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorretamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adotada pela decisão recorrida (1).


Mais importa ter presente que nem todos os factos alegados pelas partes, ainda que provados, carecem de integrar a decisão atinente à matéria de facto, porquanto apenas são de considerar os factos cuja prova (ou não prova) seja relevante face às várias soluções plausíveis de direito. Por outro lado, cumpre distinguir entre factos provados e meios de prova, sendo que uns não se confundem com os outros.


Feitos estes considerandos iniciais, verifica-se que, in casu, a Recorrente impugna a matéria de facto, requerendo aditamentos por complementação, no entanto, conforme se verifica mediante o confronto das suas alegações com as conclusões, regra geral, não procede à concreta identificação do meio probatório, estabelecendo uma remissão absolutamente genérica para o PA e para a contestação do DRFP, a qual, por seu turno, remete para a respetiva informação oficial.


Com efeito, como é consabido não são permitidos recursos genéricos contra a matéria de facto assente pelo tribunal recorrido: o recurso não pode ser genérico atacando a matéria de facto no seu conjunto sem precisar os pontos concretos, nem pode ser genérico apontando para a prova em geral produzida no processo (2).


É, portanto, imperioso que se identifique com precisão qual o facto a aditar, que se particularize, especificamente, qual o concreto meio probatório e as razões subjacentes a essa alteração, não podendo existir uma remissão para um aglomerado de folhas do PA (388 e seguintes) e uma remissão, não concretizada, para articulados de defesa.


Assim, face ao supra aludido, ter-se-á de concluir que não foram cumpridos os aludidos requisitos da impugnação da matéria de facto relativamente às alíneas i) a v), apenas se podendo considerar cumpridos, na sua dimensão mínima, os aludidos pressupostos no respeitante às alíneas vi) e vii). Sem embargo do exposto, sempre se dirá que as alíneas i) e v), não apresentam, tão-pouco, a roupagem de um facto, sendo o primeiro genérico, sem a devida substanciação temporal e elementos identificativos do ato, e o segundo conclusivo.


Face ao supra aludido, vejamos, então, se devem ser aditados os factos evidenciados em vi) e vii), cujo suporte probatório é comum e radica nas fls. 341 do PA.


No concernente à alínea vi), e não obstante a mesma, em parte, ser conclusiva e opinativa, entendemos que face ao convocado meio de prova, apenas é possível aditar o facto que traduz a emissão do ato de revisão da liquidação com o seu teor integral, nada se podendo inferir, direta ou mediatamente, sobre os motivos atinentes à sua materialização, muito menos os aduzidos pela Recorrente.


De resto, sempre se dirá que fls. 341 do PA, nada contempla quanto aos artigos 35… e 354…, apenas fls. 342 faz essa genérica alusão, no entanto, uma vez que integra o mesmo documento-ainda que com errada identificação- o mesmo foi aquiescido por este Tribunal ad quem.


Assim, face ao exposto, adita-se o seguinte facto:


L) A 24 de abril de 2010, foi emitido documento denominado de “demonstração da revisão oficiosa da liquidação-detalhe”, com o número de liquidação 763……. e com o teor que infra se descreve:


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


«Imagem no original»


(cfr. fls. 341 e 342 do PA apenso e cujo conteúdo se dá por integralmente reproduzido);


No respeitante ao facto evidenciado em vii), face à identidade do meio probatório e à enumeração e aditamento supra expendidos, resulta prejudicado o requerido, nos moldes propugnados pela Recorrente.


Sem embargo do exposto, atentas as razões explanadas anteriormente, as quais damos por integralmente reproduzidas, sempre se afirma e releva que do aludido documento nada se pode, naturalmente, retirar quanto ao título de alienação, aos motivos atinentes à revisão e à concreta notificação, sendo que no atinente a esta última asserção de cognoscibilidade, apenas é feita menção singela, na epígrafe do documento, a um registo privativo dos CTT, com data de emissão de 24 de abril de 2010, o qual sem qualquer elemento adicional não permite, de todo, dar como provada a notificação de um ato de liquidação.


Assim, face ao supra aludido, rejeita-se a impugnação dos pontos i) a v), admite-se o aditamento do facto elencado em vi), com a roupagem realizada por este Tribunal e indefere-se o aditamento do facto consignado em vii).



***




Aqui chegados, uma vez estabilizada a matéria de facto, importa, então, aferir se assiste razão à Recorrente quanto ao arguido erro de julgamento por errónea interpretação dos pressupostos de facto e de direito.


Vejamos, então.


A Recorrente defende, desde logo, que aquando da dedução da presente impugnação já tinha sido decretada e materializada a anulação parcial dos atos impugnados, com emissão de novas liquidações –únicas, no seu entendimento, sindicáveis- acarretando, consequentemente a falta de objeto dos presentes autos, donde a ocorrência de exceção dilatória de conhecimento oficioso, determinante da absolvição da instância, nos termos do disposto nos artigos 278.º e n.º 2 do artigo 576.º, 577.º e 578.º do CPC, aplicável ex vi alínea e) do artigo 2.º do CPPT.


Aduz ainda que, no limite, tal anulação parcial dos atos impugnados e subsequente emissão de novos atos acarreta, per se, uma inutilidade/impossibilidade superveniente da lide parcial.


Propugnando, ainda, que o Tribunal a quo incorreu em violação do princípio do inquisitório e da descoberta da verdade material, porquanto competia ao Tribunal averiguar os motivos determinantes da emissão das liquidações corretivas.


Sustenta, in fine, que, de todo o modo, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento de direito, na medida em que a nova avaliação terá de ser realizada à luz do artigo 76.º, nº3 do CIMI, donde não relevará para efeitos de IMI, mas apenas em sede de IRS, IRC e IMT, por estar em causa a aplicação do método comparativo dos métodos de mercado, com a consequente manutenção das liquidações.


Dissente a Recorrida propugnando pela manutenção da decisão recorrida, na medida em que não padece dos erros de julgamento que lhes são assacados, sendo certo que as alegações de recurso são incompreensíveis e mesmo extemporâneas, porquanto nunca foi arguida e controvertida a questão atinente à falta de objeto da lide.


Ademais, sublinha que as evidenciadas revisões oficiosas mais não representaram que uma redução do valor tributável, donde subsistiam ilegalidades a dirimir nos autos, sendo certo que, não resulta qualquer prova da receção e efetivo conhecimento dos mesmos por parte da Recorrida.


Reclamando, a final, pela inexistência da arguida violação do artigo 76.º, nº3 do CIMI, visto que tendo sido anulados os respetivos atos de fixação do VPT dos imóveis, e estando os mesmos umbilicalmente conectados com os atos impugnados, terá, necessariamente, de acarretar a sua anulação.


Apreciando.


Comecemos por atentar no acervo fático dos autos e aferir o que dele promana.


A 20 de outubro de 2009, a Recorrida foi notificada das segundas avaliações referentes aos imóveis inscritos na matriz predial urbana da freguesia da Brandoa, concelho da Amadora, melhor identificados em A). Por seu turno, a 29 de outubro de 2009, foram emitidas as liquidações adicionais de IMI respeitantes a esses artigos matriciais, sendo que, a 14 de novembro de 2009, foram emitidas liquidações corretivas de IMI, consubstanciando redução do valor tributável.


Não se conformando com o resultado das segundas avaliações, a Recorrida, a 28 de dezembro de 2009, deduziu impugnação judicial a qual correu termos no TAF de Sintra sob o nº de processo 1468/09.5BESNT, tendo sido julgada procedente com a consequente anulação dos respetivos atos impugnados, e objeto de confirmação mediante a prolação de Acórdão deste Tribunal datado de 15 de maio de 2012.


Por sua vez, a Recorrida, deduziu a 05 de janeiro de 2010, impugnação judicial contra os atos de liquidação adicionais de IMI, identificados em B) do probatório, que deu origem aos presentes autos.


Dimanando, in fine, que a 24 de abril de 2010, foi emitido um documento denominado de demonstração da revisão oficiosa da liquidação, que acarretou nova anulação parcial dos atos impugnados.


Ora, tendo presente a aludida realidade fática improcede, desde logo, a arguida falta de objeto da lide, e isto por duas ordens de razão, primeiro, porque inexistiu uma anulação total dos atos de liquidação de IMI, segundo porque, não obstante ter existido a aludida revisão oficiosa dos aludidos atos de liquidação, nada resulta dos autos no seguinte da receção e assunção de conhecimento por parte da Recorrida.


No caso vertente, existiu, tão-só, uma anulação parcial da dívida, com a consequente emissão de atos corretivos e executórios. Acresce que, contrariamente ao defendido pela Recorrente, a emissão dos atos corretivos não reabre a possibilidade de discussão contenciosa da legalidade da dívida.


Com efeito, os atos de apuramento de imposto subsequentes a uma liquidação adicional, resultantes, quer de petições apresentadas pelos sujeitos passivos, parcialmente atendidas, quer de revisão oficiosa por parte da AT, em razão dos quais se apure quantitativo de imposto inferior ao determinado na primitiva liquidação, mais não representam que liquidações corretivas, as quais não sendo lesivas dos interesses dos destinatários no segmento não corrigido, não permitem a reabertura de qualquer discussão contenciosa. Noutra formulação dir-se-á que, os eventuais vícios anulatórios cometidos no ato de liquidação adicional apenas podem ser apreciados no ato de sindicância do mesmo e não já na dos atos corretivos (3).


É certo que, a primeira revisão oficiosa é prévia à dedução da impugnação judicial, mas é, igualmente, certo que, como visto, nada resulta provado no sentido do seu conhecimento por parte da Recorrida.


Não se podendo, igualmente, propugnar por uma inutilidade/impossibilidade superveniente da lide, e isto porque, não obstante ter ocorrido uma nova revisão oficiosa do ato tributário cuja temporalidade é, efetivamente, posterior à dedução da presente impugnação judicial, a verdade é que para que se pudesse afiançar no sentido da inutilidade, ainda que parcial, era imperioso que a AT demonstrasse que tal anulação coincidiu com a procedência, ainda que em parte, das causas de pedir convocadas nos autos.


Sendo que, contrariamente ao aduzido pela Recorrente, inexistiu qualquer violação do princípio do inquisitório na medida em que o ónus de tal realidade circunscreve-se na esfera jurídica da AT.


Como doutrinado no Aresto deste Tribunal (4), prolatado pelo mesmo coletivo “O princípio do inquisitório é um poder/dever do Juiz, não podendo, contudo, desvirtuar o ónus probatório que existe, a montante, sobre as partes. A intervenção ativa do julgador tem de ser sempre balizada pela igualdade processual das partes, e com o respeito pela justa repartição do ónus da prova.”


Note-se, neste e para este efeito, que a AT nunca veio, espontaneamente, aos autos informar de qualquer anulação parcial. Com efeito, apenas em 28 de fevereiro de 2012, e só após despacho de interpelação do Juiz de direito atinente ao efeito, veio -de forma conclusiva e sem extrair qualquer consequência ou requerer qualquer cominação- informar que “as liquidações terão sido parcialmente anuladas”, juntando, singularmente, um print com alusão à antedita revisão ocorrida em período temporal anterior à dedução da impugnação, a saber, 14 de novembro de 2009.


Ademais, sempre importa relevar que as reputadas diligências defendidas pela AT seriam, perfeitamente, inócuas para o desfecho da presente lide-nem tão-pouco em termos de custas poderiam ter algum relevo- na medida em que, como visto, os atos de avaliação dos VPT que subjazem à emissão dos atos de liquidação impugnados foram julgados integralmente procedentes. Com efeito -e conforme densificaremos em sede própria- atenta a prejudicialidade dos visados atos, e enquanto ato consequente, sempre a presente ação teria de proceder, na íntegra.


Com efeito, e como bem aduzido na decisão recorrida e que, ora, secundamos:


“Resultando dos autos que os actos de fixação dos VPT que serviram de base às liquidações impugnadas foram anulados (cf. alíneas A), B) e E) supra),

E que os serviços irão proceder a nova avaliação dos imóveis, forçoso será concluir que a base tributável em que assentam os actos impugnados não persiste na ordem jurídica.

Deste modo, não poderão tais actos manter-se por inexistência de base tributável - o VPT, sem prejuízo da sua repetição, se legalmente admissível após a fixação dos novos valores, os quais serão reportados à data a que respeitavam os actos de fixação anulados.”

É certo que a Recorrente, como visto, defende que tal interpretação acarreta uma violação do artigo 76.º, nº3 do CIMI, porém não lhe assiste razão.


Senão vejamos.


À data o citado normativo no seu nº4, a que corresponde, quase na íntegra, ao atual nº 3, dispunha que:

“4 - Não obstante o disposto no n.º 2, desde que o valor patrimonial tributário, determinado nos termos dos artigos 38.º e seguintes, se apresente distorcido relativamente ao valor normal de mercado, a comissão efetua a avaliação em causa e fixa novo valor patrimonial tributário que releva apenas para efeitos de IRS, IRC e IMT, devidamente fundamentada, de acordo com as regras constantes do n.º 2 do artigo 46.º, quando se trate de edificações, ou por aplicação do método comparativo dos valores de mercado no caso dos terrenos para construção e dos terrenos previstos no n.º 3 do mesmo artigo.”

Mas a verdade é que, não obstante o citado normativo regulamente que a distorção do valor normal de mercado determina a realização de nova avaliação, com fixação de novo VPT, com reflexos apenas para efeitos de IRS, IRC e IMT, tal realidade não tem aplicação ao caso vertente, e isto porque no âmbito do processo de impugnação judicial nº 1468/09 (alínea E) e conforme dimana inequívoco do teor do Acórdão deste Tribunal (alínea F) que confirmou essa mesma decisão, o que foi ajuizado é que o VPT padecia de vício de violação de lei, por dois motivos, concretamente violação da errónea quantificação do VPT, na medida em que foram considerados coeficientes, mormente, de afetação e qualidade que são estranhos ao cálculo do VPT dos terrenos para construção, e bem assim pela falta de aplicação do método comparativo dos valores de mercado, determinando, assim, a anulação dos atos de avaliação.


Com efeito, diz-nos o aludido Acórdão que “como já se referiu, a procedência da impugnação baseou-se no facto de nas avaliações dos terrenos para construção se terem levado em linha de conta coeficientes (ca e cq) que são estranhos ao cálculo do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, o que consubstancia vício de violação de lei na fixação do vpt, que conduz à anulação da 2ª avaliação e no facto de ao ter-se invocado no requerimento da 2ª avaliação que o valor patrimonial tributário atribuídos aos prédios eram desproporcionais aos valores de mercado, pelo que não poderia a Comissão de Avaliação, deixar de proceder à aplicação do método comparativo dos valores de mercado nos termos da lei, conforme preceitua o art. 76 do CIMI pelo que, não o tendo feito, as avaliações não se podem manter.” (destaques e sublinhados nossos).


Aliás, foi precisamente por esse motivo e pela falta de ataque eficaz à decisão recorrida que este Tribunal consignou que baseando-se a decisão também no facto de nas avaliações dos terrenos para construção se terem levado em linha de conta coeficientes (ca e cq) que são estranhos ao cálculo do valor patrimonial tributário dos terrenos para construção, e entendendo-se, na mesma, que isso consubstancia vício de violação de lei na fixação do vpt, que conduz à anulação da 2ª avaliação, matéria esta não questionada no recurso e que não é de conhecimento oficioso e sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões das alegações temos que esta questão que levou também à procedência da impugnação com a consequente anulação dos actos tributários transitou em julgado. Temos, assim, que com este fundamento não objeto de recurso se mostra transitada em julgado.” (destaques e sublinhados nossos).


Avançando, inclusive, in fine que “[a]tenta a fundamentação da decisão, teria bastado para esta só o fundamento não considerado no recurso, pelo que o outro fundamento considerado na decisão não seria necessário ter sido apreciado.” (destaques e sublinhados nossos).


Pelo que, contrariamente ao aduzido pela Recorrente inexiste qualquer errónea interpretação e aduzida violação do artigo 76.º, nº4 do CIMI, mormente, ao seu âmbito e abrangência face, como supra exposto, ao decidido e transitado no aludido processo.


Destarte, nenhuma censura merece a decisão recorrida ao julgar procedente a impugnação decretando a anulação dos atos de liquidação de IMI face à anulação judicial dos atos de segunda avaliação.


Como doutrinado no Aresto do STA, prolatado no âmbito do processo nº 02748/15, de 28 de outubro de 2020, referente a liquidações de IMT mas transponível para o caso vertente:

“Na sequência da anulação judicial do VPT, por ter sido fixado em montante excessivo, a AT deve proceder oficiosamente à anulação do IMT liquidado com base nesse valor.”

Note-se, aliás, que esta asserção mais não representa que uma decorrência do consignado no artigo 100.º da LGT e 173.º do CPTA.


Com efeito, como evidenciado por Diogo Leite Campos e Outros (5):

“[a] anulação judicial do acto tributário implica a anulação de todos os seus efeitos ex tunc, pelo que tudo se deve passar como se ele não houvera sido praticado. Sendo assim, a anulação acarreta também a anulação de todos os actos consequentes que hajam sido praticados tendo por base ou pressuposto jurídico-prático o acto tributário anulado.

A administração está assim obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria se não houvera sido objecto de um seu acto lesivo ou de uma ofensa por si cometida contra os direitos e interesses legalmente protegidos dos administrados. Trata-se, aliás, de uma simples explicitação do princípio geral de direito de que devem ser apagados todos os efeitos jurídico-práticos consequentes do acto ilícito, reconstituindo-se a situação que existiria se ele não houvera ocorrido, princípio esse que informa igualmente o comando do art.º 562.º do C. Civil.

O sentido deste princípio encontra-se actualmente assumido expressamente no art.º 173.º do CPTA.

Importando a reparação, em grande número de casos, a prática de actos administrativos consequentes e tendo estes actos a natureza de actos de administração activa, é lógico que lhe caiba, segundo os princípios do direito administrativo continental, em primeira mão e em primeiro lugar, a possibilidade de emenda dos efeitos lesivos provocados ao particular”. (destaques e sublinhados nossos).

No mesmo sentido, vide Acórdão deste Tribunal prolatado no âmbito do processo nº 174/08, de 10 de fevereiro de 2022, que qualifica o ato de liquidação de IMI como ato consequente, e doutrinando, para o efeito, que “[a] anulação judicial do acto tributário implica a anulação de todos os seus efeitos ex tunc, pelo que tudo se deve passar como se ele não houvera sido praticado.”


Assim, face a todo o exposto, nenhuma censura merece a decisão recorrida que decretou a anulação dos atos de liquidação impugnados face à precedente anulação de ato de fixação de VPT que o antecede e fundamenta.



***




Resta, ora, analisar a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º, nº 7 do RCP.


No Aresto do STA, proferido no processo nº 01953/13, de 07 de maio de 2014 (6): resulta claramente que: “A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade”.


No caso sub judice, considera-se que o valor de taxa de justiça devida a final, calculado nos termos do tabela I.B., do RCP, é excessivo. Porquanto, ponderadas as circunstâncias do caso vertente à luz dos critérios escolhidos pelo legislador, em especial, o comportamento processual das partes litigantes, sem qualquer reparo negativo a apontar, a complexidade do processo – atendendo a que as questões decidendas não exigiram do julgador especiais e diversos conhecimentos técnicos e jurídicos, antes se mantiveram dentro de parâmetros normais e comuns, encontra-se preenchido o circunstancialismo do n.º 7, do artigo 6.º do RCP, decretando-se a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça.






***

IV. DECISÃO

Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SEGUNDA SUBSECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em:

-NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.

Custas pela Recorrente, com a dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que excede os €275.000,00.


Registe. Notifique.


Lisboa, 12 de maio de 2022

(Patrícia Manuel Pires)

(Cristina Flora)

(Luísa Soares)


_________________________
(1) António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 5ª edição, pp 165 e 166; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; Vide, designadamente, Acórdão do TCA Sul, proferido no processo nº 6505/13, de 2 de julho de 2013.
(2) Vide Acórdão do TCA Norte, proferido no processo nº 02324/04.9 BEPRT, datado de 31.05.2012 e bem assim Aresto do TCA Sul, proferido no processo nº 618/10.3 BELRS de 07.06.2018.
(3) Vide, Arestos prolatados pelo TCAS no âmbito dos processos nº 02981/09, e 20008/16, datados de 25.11.2009 e 28.10.2021.
Proferido no processo nº 5/07, de 25.11.2021.
(4) Proferido no processo nº 5/07, de 25.11.2021.
(5) LGT – Anotada e comentada, 4.ª edição 2012, em anotação ao artigo 100.º.
(6) integralmente disponível para consulta em www.dgsi.pt.