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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2333/07.6BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:03/14/2024
Relator:TÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Descritores:IRC
RETENÇÕES
PAGAMENTOS A NÃO RESIDENTES
TRANSPORTE E COMUNICAÇÕES
EQUIPAMENTOS
CDT
Sumário:I - Não são considerados obtidos em território português os rendimentos derivados de prestações de serviços de transporte e comunicações levadas a cabo por não residentes sem estabelecimento estável em Portugal.
II - A aquisição de equipamentos a sociedade não residente sem estabelecimento estável em Portugal não é considerada como rendimento obtido por esta em território nacional.
III - Há dispensa de retenção no caso de prestações de serviços levadas a cabo por não residentes, cujo estado de residência seja parte em CDT nos termos da qual os lucros são integralmente tributados no Estado de residência.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção tributária Comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão


I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 15.10.2020, no Tribunal Tributário de Lisboa, na parte em que foi julgada procedente a impugnação apresentada por M… – P… Televisão, Ld.a (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto a liquidação adicional de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC) e a dos respetivos juros compensatórios, relativas ao exercício de 2004.

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“A. Vem o presente Recurso contra a douta Sentença proferida pelo Tribunal “a quo” em 15/10/2020, o qual julgou procedente a Impugnação Judicial apresentada nos autos à margem referenciados e, por consequência, determinou: i) a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, quanto à parte do conteúdo do acto impugnado que foi abrangido por decisão de revogação parcial, no montante de € 11.250,00 a título de imposto e de € 1.070,14 a título de juros compensatórios; ii) a anulação dos acto de liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) – retenções na fonte - n.º 2007 6420000622, referente ao período de tributação de 2004, do montante de € 517.512,28, bem como do respectivo acto de liquidação de juros compensatórios n.º 2007 6420000622, no montante de € 47.981,99, que correspondem à nota de cobrança n.º 2007 68582, emitida em 27/04/2007.

B. A Representação da Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal “a quo” foi baseada numa errónea subsunção dos factos ao direito aplicável, padecendo de erro de julgamento da matéria de facto e da matéria de direito.

C. Com efeito, no que concerne aos serviços qualificados como serviços de transporte pela Impugnante, ora recorrida, que estiveram na contrapartida dos rendimentos colocados à disposição pela mesma no ano de 2004, impõe-se denotar que a douta sentença aceita, no ponto 12) da factualidade provada, a qualificação dada pela ora recorrida no libelo inicial, concluindo que do referido ponto do probatório resulta demonstrado que “à Impugnante foram prestados serviços de transporte dos equipamentos necessários aos locais dos respectivos eventos cuja cobertura e transmissão devia efectuar”, sem que resultem demonstrados factos que permitam fundamentar e sustentar tal conclusão.

D. Uma vez analisados os documentos n.ºs 7 a 14, 47, 64, 110 e 115 juntos com a petição inicial, constituídos por cópias das facturas emitidas à Impugnante, ora recorrida, pelos respectivos fornecedores no ano de 2004, verifica-se que:

1. as facturas correspondente aos documentos n.ºs 7, 8, 10, 12 e 14, emitidas pelo Grupo A…, apresentam como descrição “serviços prestados enero 2004” (doc. 7), “serviços prestados marzo 2004” (doc. 8), “serviços em Madrid durante el mês de outubre” (doc. 10), “serviços em Madrid durante el mês de noviembre” (doc. 12) e “serviços em Madrid durante el mês de deciembre” (doc. 14);

2. a factura correspondente ao documento n.º 64, emitida por J… apresenta como descritivo “por trabajos realizados en Qatar durante el mês de deciembre”.

E. Pelo supra exposto e contrariamente ao que entende o Ilustre Tribunal “a quo”, não resulta, portanto, demonstrada nos autos de primeira instância a natureza dos referidos serviços mencionados no artigo anterior, em termos que permita enquadrar, como fez o douto Tribunal, os mesmos como serviços de transporte ou comunicações e, consequentemente, excluí-los de tributação em Portugal com base na disposição legal do art. 4.º, n.º 3, al. c) subalínea 7), in fine, do CIRC.

F. Por outro lado, e no que concerne aos documentos qualificados pela Impugnante, ora recorrida, como demonstrativos de despesas com aquisição de material/ equipamento, de entre a totalidade dos documentos apresentados pela Impugnante, ora recorrida, para demonstrar as quantias pagas a título de aquisição de equipamento / material, o douto Julgador considerou que os documentos n.ºs 19 a 22, 41 a 43, 104, 126, 133 e 139 juntos com a petição inicial demonstram a contratação de verdadeiras prestações de serviços realizados ou utilizados em Portugal que se encontram abrangidas pela norma de incidência tributária do art. 4.º, n.º 3, al. c) subalínea 7) do CIRC e não se encontram afastados pela exclusão prevista na mesma norma, in fine, por não serem referentes a serviços de transportes, comunicações e actividades financeiras.

G. Não obstante, uma leitura atenta de todos os documentos n.ºs 15, 17 a 22, 41, a 43, 55, 62, 63, 98, 104, 119 a 121, 126, 130, 133 a 135, 139, 140, 144 e 165 juntos com a petição inicial, permite concluir que, além dos serviços mencionados nos documentos n.ºs 19 a 22, 41 a 43, 104, 126, 133 e 139, também os documentos n.ºs 15, 120 e 121 não constituem, senão na sua totalidade, pelo menos em parte, prova de aquisições de equipamentos / materiais pela Impugnante, ora recorrida, mas sim demonstram verdadeiras prestações de serviços, conforme se discrimina de seguida:

1. a factura correspondente ao documento n.º 15, emitida pela S…, tem como descritivo, além de outros elementos, “revisión de enlaces digitales S…en laboratório”;

2. as facturas correspondentes aos documentos n.ºs 120 e 121, emitidas por S… S.L. têm como descritivo, além de outros elementos, “servicios comerciales y de gestión”.

H. Por outro lado, no que concerne aos sujeitos passivo S…, C… – B… & M… e S… S.L, que emitiram as facturas que correspondem aos documentos n.ºs 15, 17, 18, 20, 21, 22 (SVP), bem como ao documento n.º 62 (C…) e aos documentos n.ºs 119, 120 e 121 (U…), todos juntos com a petição inicial, com base no teor do ponto V do Relatório Final de Inspecção elaborado no âmbito do procedimento inspectivo legitimado com base na Ordem de Serviço OI200605341, dever-se-á considerar provado, com força probatória plena que, segundo a base de dados do VIES, as sociedades S…, C… – B… & M…e S… S.L. não declararam, no ano de 2004, vendas intracomunitárias. (vide n.º 1 do art. 76.º da LGT, n.º 1 do art. 115º do CPPT, art. 371.º do Código Civil e n.º 5 do art. 607.º do CPC).

I. Pelo supra exposto, consideramos que, com base na prova documental junta aos presentes autos, o Ilustre Tribunal “a quo” deveria ter ido mais longe ao considerar que também os documentos n.ºs 15,17, 18, 62, 119, 120 e 121, juntos com o libelo inicial demonstram verdadeiras prestações de serviços sujeitas a tributação em Portugal, porquanto são suscetíveis de serem enquadrados no art. 4.º, n.º 3, al. c) subalínea 7) do CIRC, não se encontrando ainda demonstrado que tais serviços constituam serviços de transporte e de comunicações (produção televisiva), pelo que não se encontram reunidas, no caso concreto, as condições de exclusão de tributação previstas no art. 4.º, n.º 3, al. c) subalínea 7), in fine, do CIRC.

J. Por outro lado, no que diz respeito aos Certificados Modelos 12 RFI apresentados pela Impugnante, ora recorrida, com vista em obter a dispensa de retenção na fonte dos rendimentos em questão nos autos de primeira instância, sempre se dirá que, a partir da análise crítica de toda a prova documental produzida nos autos de primeira instância, nomeadamente dos documentos n.ºs 158 a 161 juntos com o libelo inicial e dos documentos que constam a fls. 449 a 485 dos autos, juntos com o requerimento da Impugnante de 30/12/2009, com a ref.ª SITAF 005152599, deveria o Ilustre Tribunal “a quo” ter considerado provado que não foram apresentados Certificados RFI relativamente às seguintes entidades e rendimentos que se identificam de seguida:

- “P… Limited”, cuja morada consta das facturas como sendo sita no Reino Unido, pela prestação de serviços de “manutenção de equipamento” titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 45 e 46 juntos com a petição inicial;

- “H… S.L.”, cuja morada consta das facturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços de “produção de televisão” titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 29 e 40 juntos com a petição inicial;

- “C…, S.L.”, cuja morada consta das facturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços de “produção de televisão” titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 57 e 60 juntos com a petição inicial;

- “S…, S.L.”, cuja morada consta das facturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços “comerciais e de gestão” e de “reparação” titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 120, 121 e 126 juntos com a petição inicial;

- “Grupo A…”, cuja morada consta das facturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços não especificados titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 7, 8, 10, 12 e 14 juntos com a petição inicial;

- “J…”, cuja morada consta da factura como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços não especificados titulados pela factura cujas cópia constam do documento n.º 64 junto com a petição inicial.

K. Por outro lado, com base na prova documental produzida nos autos de primeira instância, nomeadamente dos documentos n.ºs 1 a 161 juntos com o libelo inicial e dos documentos que constam a fls. 449 a 485 dos autos, juntos com o requerimento da Impugnante de 30/12/2009, com a ref.ª SITAF 005152599, encontra-se ainda demonstrado que, de entre as entidades não residentes sem estabelecimento estável em relação às quais foram apresentados Certificados RFI, o valor constante dos mesmos é inferior ao valor das efectivas prestações de serviços realizadas em 2004, nos seguintes casos:

- “V…/V..”, com sede em França, em que o valor constante do Certificado apresentado pela Impugnante, ora recorrida, é de € 13.426,11, sendo que o valor das prestações de serviços de “produção de televisão” tituladas pelas facturas constantes dos documentos n.ºs 152 e 153 juntos aos autos com a petição inicial totaliza € 14.470,00;

- “S…”, com sede em Espanha, em que o valor constante do Certificado apresentado pela Impugnante, ora recorrida, é de € 18.257,00, sendo que o valor das prestações de serviços não especificados, de serviços de revisões de equipamentos, bem como pela prestação de serviços “manutenção de equipamento”, “ tituladas pelas facturas constantes dos documentos n.ºs 15, 17, 18, 20, 21, 22 e 19 juntos aos autos com a petição inicial totaliza € 19.445,00.

L. Por outro lado, ao julgar provado o ponto 22) da douta Sentença, o Julgador incorreu em erro de valoração da prova produzida nos autos, na medida em que tal facto é dado como provado apenas com base em prova testemunhal, não existindo prova documental nos autos que o suporte, sendo que se impunha que o Ilustre Julgador produzisse um juízo crítico da prova testemunhal produzida nos presentes autos, em articulação com a prova documental apresentada, extraindo dos factos apurados as presunções impostas pelas regras de experiência (vide n.º 4 do art. 607.º do CPC).

M. Mais acresce que, pretendendo a Impugnante, ora recorrida, ser dispensada do pagamento de retenções na fonte ao Estado Português por alegadamente não ter colocado os rendimentos em questão à disposição das entidades não residentes sem estabelecimento estável em Portugal no ano de 2004, o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito impende sobre si, ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 74.º da LGT e do n.º 1 do art. 342.º do Código Civil.

N. Por outro lado, impunha-se ao Ilustre Tribunal “a quo” que esclarecesse, ao abrigo do princípio do inquisitório, por reporte a cada factura emitida à Impugnante, ora recorrida, no ano de 2004 e a cada serviço que lhe foi prestado, quais os valores que foram ou não efectivamente colocados à disposição das entidades prestadoras de serviços nesse ano (vide art. 99.º da LGT, 13.º do CPPT e 6.º e 7.º do CPC).

O. Assim sendo, ao invés do facto 22) da douta Sentença ter sido julgado provado, deveriam ter sido julgados como não provados os pontos de facto constantes dos artigos 106.º e 110.º do libelo inicial, atenta a inexistência de prova documental e mesmo testemunhal que os suporte.

P. Considerando tais factos, com a devida vénia, mal andou o Ilustre Tribunal “a quo” na interpretação das normas dos artigos 4.º, n.º 1 e 7.º, n.º 1, ambos das CDT celebradas entre Portugal, Espanha, França e Reino Unido, bem como dos artigos 4.º, n.º 3, alínea c), subalínea 7), 80.º, n.º 2, alínea f), 88.º, n.º 1, alínea g), 88.º, n.ºs 2, 3 alínea b), 5 e 6 e artigo 90.º, n.ºs 2, 3, 4 e 5, todos do Código do IRC, na versão em vigor à data dos factos, bem como do art. 90.º-A, n.º 6 do Código do IRC, na versão conferida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, bem como do artigo 48.º, n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro.

Q. O pagamento a entidades não residentes de «rendimentos derivados de outras prestações de serviços» – previstos na subalínea 7) da alínea c) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC – é uma realidade sujeita a tributação em Portugal sempre que o pagamento seja imputável a uma entidade residente em Portugal (ou a um estabelecimento estável de uma entidade não residente cá situado) e aqueles rendimentos sejam realizados ou utilizados em território nacional e não respeitem a transportes, comunicações ou actividades financeiras.

R. Da conjugação das normas dos artigos 80.º e 88.º do Código do IRC, na versão em vigor à data dos factos, resulta que o sistema de retenção na fonte impõe às entidades pagadoras dos rendimentos supra identificados o dever legal de reter o imposto devido por esses rendimentos e de o entregar nos cofres do Estado, uma vez que aqueles são considerados como rendimentos obtidos em território Português, nos termos do disposto no artigo 4.º, n.º, alínea c), subalínea 7) do Código do IRC.

S. Contudo, nos termos do disposto no artigo 90.º, n.ºs 2, 3, 4 e 5 do Código do IRC, na versão em vigor à data dos factos, os rendimentos supra mencionados podem ser dispensados de retenção na fonte, na totalidade, quando por força de uma CDT celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente do outro Estado contratante não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.

T. De acordo com as disposições legais supra mencionadas, para que esta dispensa possa efetivar-se os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte da verificação dos pressupostos que resultem da CDT, nomeadamente através da apresentação de documento emitido pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência que ateste a sua residência para efeitos fiscais no período em causa e a sua sujeição e imposto sobre o rendimento nesse Estado.

U. Como decorre da norma do art. 4.º das CDT celebradas entre Portugal, Espanha, França e Reino Unido, a certificação da residência para efeito do acionamento da CDT terá de ser feita pelas autoridades fiscais do Estado Contratante do qual o beneficiário dos rendimentos se considera residente.

V. Não obstante, não se podendo denegar o carácter interpretativo que foi conferido à norma do artigo 90.º-A, n.º 6 do Código do IRC pelo artigo 48.º, n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, dever-se-á entender que a norma do artigo 90.º-A, n.º 6 do Código do IRC tem aplicação ao caso concreto, pelo que a prova da verificação dos pressupostos que resultem de CDT ou de outro acordo de direito internacional ou ainda de legislação interna aplicável que se diz ter de efectuar-se através de formulário de modelo a aprovar por despacho do membro responsável da área das finanças, pode ser efectuada “a posteriori”, não tendo de ser feita exclusivamente através do formulário oficial e vigente à data dos factos.

W. Voltando ao caso concreto, e conforme supra mencionamos, dever-se-á considerar que, da prova documental e testemunhal produzida nos autos de primeira instância, não se encontra demonstrada, no caso concreto, a verificação dos pressupostos materiais que resultam das CDT celebradas entre Portugal, Espanha, França e Reino Unido e que permitem ao Estado Português aplicar a dispensa da retenção na fonte, pela ora recorrida, na qualidade de substituto tributário, os rendimentos colocados à disposição no ano de 2004 das seguintes entidades beneficiárias: “P…”; “H… S.L.”; “C…, S.L.”; “S…, S.L.”; “Grupo A…”; “J…”; “V…/V…” e “S…”.

X. Neste conspecto, importa ter presente que é sobre a Impugnante, ora recorrida, que recai o ónus da prova dos factos que invoca no sentido de dar cobertura legal à dispensa de retenção na fonte de IRC (artigo 74.º, n.º 1, da LGT).

Y. Pelo supra exposto, a solução de mérito alcançada no caso concreto consubstancia violação das normas dos artigos 4.º, n.º 1 e 7.º, n.º 1 das CDT celebradas entre a República Portuguesa e Espanha, França e Reino Unido, bem como dos artigos 4.º, n.º 3, alínea c), subalínea 7), 80.º, n.º 2, alínea f), 88.º, n.º 1, alínea g), 88.º, n.ºs 2, 3 alínea b), 5 e 6 e artigo 90.º, n.ºs 2, 3, 4 e 5, todos do Código do IRC, na versão em vigor à data dos factos, bem como do art. 90.º-A, n.º 6 do Código do IRC, na versão conferida pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, bem como do artigo 48.º, n.º 4 da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro.

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e acostumada JUSTIÇA!”.

A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

“I. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, recaem sobre a Recorrente especiais ónus, nos termos do artigo 640.º do Código de Processo Civil, devendo obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, bem como os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.

II. Ora, a Recorrente contesta, nomeadamente, a qualificação como despesas de transporte e de aquisição de equipamentos de um conjunto de faturas, mas não indicou quais os concretos meios probatórios que impunham decisão diferente e, tendo o Tribunal a quo formada a sua convicção igualmente com base em prova testemunhal, não indicou qualquer passagem da gravação que permita concluir de qualquer erro na apreciação da prova. Também quanto à decisão que no seu entender devia ser tomada, não indicou a sua dimensão quantitativa em termos do imposto liquidado.

III. De igual modo, quanto aos factos provados no ponto 22 da douta Sentença, perante o vasto material probatório constante dos autos, a Recorrente não indicou quais os concretos meios probatórios que impunham decisão diferente, isto é, que documentos evidenciam que as faturas correspondentes a concretos fornecedores identificados na Petição Inicial de Impugnação estavam pagas e, tendo o Tribunal a quo formada a sua convicção igualmente com a prova testemunhal, não indicou qualquer passagem da gravação que permita concluir de qualquer erro na apreciação da prova.

IV. Em consequência, o Recurso deve ser rejeitado.

V. Todavia e sem prescindir não assiste razão à Recorrente quanto ao alegado.

VI. Relativamente às despesas de transporte, como resulta do descritivo das correspondentes faturas estão em causa serviços de transporte, e, mesmo nos casos em que essa descrição não é tão exaustiva, sendo esse o objeto social do prestador de serviços, tem de concluir-se que é essa a natureza do serviço.

VII. Quanto às faturas que correspondem à aquisição de equipamentos, a Recorrente, genericamente, não contesta que consubstanciam aquisições de material/equipamento, como aliás é facilmente percetível do seu descritivo. Limita-se apenas a concluir que, pelo facto de os fornecedores não terem declarado transmissões intracomunitárias, então a aquisição de equipamentos deve ser considerada uma prestação de serviços.

VIII. Ora, não há qualquer regra de direito ou presunção que permita concluir que uma aquisição de bens se transforma numa prestação de serviços, pelo mero facto da correspondente operação não constar do VIES.

IX. Competiria à Recorrente provar que não estamos perante aquisições de bens, o que manifestamente não fez, pelo que bem decidiu o Tribunal a quo ao considerar tais documentos como relativos a uma aquisição de bens.

X. Considera a Recorrente no artigo 29.º do Recurso, que o ilustre Tribunal a quo deveria ter considerado provado que não foram apresentados diversos Certificados RFI relativamente a entidades que emitiram identificados documentos que correspondem a faturas.

XI. Todavia, a Recorrente não cumpriu com o seu ónus de identificação do motivo justificativo da falta de tais Certificados, já que nos autos encontram-se provados factos que excluem o dever da sua apresentação, em particular, por se tratar de faturas relativas a despesas de transporte, de faturas relativas à aquisição de equipamentos, bem como de faturas que não estavam pagas e, consequentemente ainda não se havia verificado o momento da obrigação de retenção na fonte, mas que a inspeção tributária considerou ilegalmente como sujeitas a imposto, e, relativamente às quais não é exigível qualquer Certificado, como resulta da Sentença do Tribunal a quo.

XII. Relativamente aos identificados erros na indicação do montante do rendimento em 2 Certificados, para além de tal não corresponder à realidade relativamente a um dos certificados, tal indicação é meramente informativa e não é pressuposto de que dependa a aplicação de qualquer convenção para evitar a dupla tributação, como aliás já foi reconhecido pela jurisprudência.

XIII. A Recorrente alega ainda que a ora Recorrida não fez prova da inexistência de pagamento de várias faturas, procurando transformar uma questão de direito numa questão de facto, imputando ao Tribunal a quo a falta de realização oficiosa das diligências instrutórias para o conhecimento dos factos alegados.

XIV. Ora, foi precisamente a Recorrente que não consultou o correspondente processo administrativo, do qual constam os extratos das contas correntes, com o correspondente registo das faturas e do seu eventual pagamento, que a ora Recorrida forneceu no âmbito do procedimento inspetivo e no direito de audição, sendo que a inspeção tributária considerou que a retenção na fonte devia corresponder à “data de registo em conta corrente e de apuramento quantitativo do custo”.

XV. Por isso, passou a estar em causa uma questão de direito, saber em que momento nasce a obrigação de retenção na fonte, sendo que, de qualquer modo estão identificadas nos autos as controvertidas faturas que não foram pagas.

XVI. Relativamente aos rendimentos derivados de serviços de produção televisiva, a Recorrente limita-se a identificar os documentos comprovativos de serviços de produção televisiva realizados ou utilizados em Portugal, considerando que não têm enquadramento nem na exceção prevista na parte final da alínea c) subalínea 7) do n.º 3 do artigo 4.º do CIRC nem na exceção prevista no n.º 4 da referida norma.

XVII. Todavia, a ora Recorrida relativamente aos prestadores de serviços em causa apresentou os correspondentes Certificados que juntou ao Processo de Impugnação Judicial, facto que, aparentemente a Recorrente não teve em consideração, já que no Recurso se limita a constatar uma regra de sujeição a imposto, face às normas de direito interno, mas não retira as devidas ilações do facto de a ora Recorrida ter apresentado à posteriori, como consta dos factos provados da Sentença, os correspondentes Certificados RFI, como veio a ser permitido, nos termos do artigo 48.º da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro.

Nestes termos, deve ser rejeitado o Recurso e, sem prescindir, deve ser mantida a Sentença do Tribunal a quo, por não assistir razão à Recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA”.

O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Foram os autos com vista ao Ilustre Magistrado do Ministério Público, nos termos do art.º 288.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que emitiu parecer, no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Colhidos os vistos legais (art.º 657.º, n.º 2, do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT), vem o processo à conferência.

São as seguintes as questões a decidir:

a) Verifica-se erro na decisão proferida sobre a matéria de facto?

b) Há erro de julgamento, porquanto as situações elencadas no relatório de inspeção tributária (RIT) pela administração tributária (AT) estão sujeitas a retenção na fonte?

II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

II.A. O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto:

“1. A Impugnante é uma sociedade comercial por quotas com sede em Portugal, que se dedica ao exercício de “Actividades de Rádio e Televisão”, enquadrada em regime normal mensal de IVA e em regime geral de tributação para efeitos de IRC, cuja atividade se iniciou em 9.11.1998;

(não contestado);

2. No exercício da sua atividade de transmissão televisiva de eventos, no estrangeiro e em Portugal, a Impugnante fez pagamentos, no exercício de 2004, em contrapartida de prestações de serviços provenientes de entidades não residentes sem estabelecimento estável em Portugal, relativamente a transportes, comunicações, aquisição de material e equipamento, e alojamento;

(cfr. docs. 1 a 153 juntos com a petição inicial);

3. A Impugnante foi sujeita a uma ação inspetiva interna, aberta pela Ordem de Serviço OI200605341, datada de 12.9.2006, que incidiu sobre o exercício económico de 2004, e que culminou com as Conclusões do Relatório, que se dão por reproduzidas e das quais se extrai o seguinte:

“(…)

III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL

Relativamente ao exercício de 2003, conforme extractos da conta 62121 e 62131, verifica-se o registo do custo nas 2 contas com base numa única factura. A factura em causa respeita a custo suportado por aquisições de serviços, ao fornecedor G… – M… & E…, S.A., no valor de € 10 328,80. A este respeito importa referir que na nossa notificação de 25-09-2006, ofício nº 76561, foi pedida a entrega da Declaração da Substituição modelo 22/IRC. Na sequência do nosso pedido o S.P. não entregou a Declaração solicitada e não justificou o erro, com base em custo anulado em contas da contabilidade e com referência ao exercício de 2003.

Por tudo isto, porque se verifica a duplicação do custo no exercício de 2003, procedemos ao acréscimo de € 10 328,80, ao lucro tributável declarado.

III.2 Retenção de imposto por pagamento a não residentes – Na verificação da contabilidade detectamos pagamentos a não residentes por serviços prestados, razão porque em notificação foram solicitados: a entrega do imposto devido, o apuramento do imposto, as facturas recebidas dos titulares do rendimento e os extractos de contabilidade. Não obstante o nosso pedido não entregaram imposto por pagamento de serviços a entidades não residentes, Cfr. cópias anexas. Assim, com base nos extractos e facturas remetidas procedemos ao cálculo do imposto devido, conforme apuramento efectuado em anexos ao presente relatório.

O imposto apurado é de € 128 171,57 e € 521 988,55, para os anos de 2003 e 2004, respectivamente, resultante da aplicação da taxa de 15%, conforme prevê o artigo 80º do Código do IRC.

(…)

Do que precede é efectuada a seguinte tributação:

Exercício de 2003

Acréscimo ao lucro tributável - € 10 328,80

Retenções na fonte por pagamento a entidades não residentes - € 128 171,57.

Exercício de 2004

Retenções na fonte por pagamento a entidades não residentes - € 517 512,28

(…)”

(cfr. PAT a fls. 361 a 376);”.

4. O Relatório aludido no ponto anterior colheu o seguinte Despacho, da Diretora de Finanças Adjunta:

“Concordo

Em face do Relatório e parecer da chefe de equipa nada a opor.

Dos fundamentos deles constante resulta que se encontram verificados os pressupostos legais para, mantendo-se a avaliação directa da matéria colectável, proceder às correcções técnicas propostas, nos termos da parte final dos artigos 16º, nº 1, e 17º, n.º 1, do Código do IRC, bem como dos artigos 81º a 84º da LGT.

Desta forma, com os fundamentos referenciados, determino que se proceda à alteração da matéria colectável conforme vontade declarada, nos termos propostos.

Da conclusão da acção inspectiva, demonstra-se com suficiência, que foram praticadas omissões com reflexo no apuramento do imposto devido a final e consequentemente entrega do imposto nos cofres do Estado, em sede de retenções de IRC (retenções na fonte), Retenções não efectuada por rendimentos pagos a “Não Residentes”.

(…)».

(cfr. PAT a fls. 358-A);

5. Em resultado das correções empreendidas pelo Serviço de Inspeção Tributária, constantes do documento de correção único n.º 390313/2004, a AT emitiu e dirigiu à Impugnante, que a recebeu, uma demonstração de compensação/liquidação de retenções na fonte de IRC, n.º 2007 00000068582, com data de 27.4.2007, referente ao exercício de 2004, contendo uma liquidação oficiosa de IRC, n.º 2007 6420000622, no valor de € 517.512,28 e uma demonstração de liquidação de juros compensatórios, no total de € 47.981,99, de tudo apurando um valor a pagar de € 565.494,27; (cfr. doc. 154 junto com a petição inicial e docs. a fls. 519 a 524 do suporte físico dos autos);

6. A Impugnante juntou com a petição inicial Declarações Modelo 12-RFI – Outros Rendimentos, relativas às entidades prestadoras de serviços, não residentes e sem estabelecimento estável em Portugal, relativas ao exercício de 2004, com a seguinte descrição:

- Beneficiário efetivo dos rendimentos: “T…, S.A.”, descrição dos rendimentos: “SERVICIOS”, total do rendimento bruto: 5.560,00, certificação das autoridades fiscais do Estado da residência do beneficiário: “España”;

- Beneficiário efetivo dos rendimentos: “V…”, descrição dos rendimentos: “SERVICES”, total do rendimento bruto: 13.426,11, certificação das autoridades fiscais do Estado da residência do beneficiário: “FRANCE”;

- Beneficiário efetivo dos rendimentos: “G…, S.L.”, descrição dos rendimentos: “PRESTACION DE SERVICIOS”, total do rendimento bruto: 878.612,66, certificação das autoridades fiscais do Estado da residência do beneficiário: “España”;

- Beneficiário efetivo dos rendimentos: “I…, S.L.”, descrição dos rendimentos: “prestação de serviços”, total do rendimento bruto: 27.510,00, certificação das autoridades fiscais do Estado da residência do beneficiário: “Espanha”;

(cfr. docs 158 a 161 juntos com a petição inicial)

7. Citada para o processo de execução fiscal, relativa à dívida de IRC dos exercícios de 2003 e 2004, a Impugnante prestou garantia bancária no valor de 909.589,86€, em 8.8.2008, tendo suportado os respetivos encargos;

(cfr. doc. 163, a fls. 346 a 349, junto com a petição inicial, e docs. 3 e 4 anexos ao pedido de revisão oficiosa junto com o requerimento da Impugnante de 30.12.2009, com a ref.ª SITAF 005152599);

8. Em 14.12.2009, a Impugnante procedeu ao pagamento à AT dos valores de € 7.232,70 e de € 33.835,29, relativos a juros de mora;

(cfr. pedido de revisão oficiosa e docs. 42 e 43 juntos com o requerimento da Impugnante de 30.12.2009, com a ref.ª SITAF 005152599);

9. Em 22.12.2009, a Impugnante apresentou junto da AT um pedido de revisão oficiosa do ato tributário de liquidação de retenções na fonte de IRC n.º 200700000068581 e 200700000068582, cujo teor se dá por reproduzido, em que solicita ao Sr. Diretor de Serviços do IRC, da AT, seja mandada processar a revogação e emissão de novas notas de liquidação;

(cfr. doc. junto com o requerimento da Impugnante de 30.12.2009, com a ref.ª SITAF 005152599);

10.Em 30.12.2009, a Impugnante veio juntar aos autos as Declarações Modelo 12-RFI – Outros Rendimentos, relativas às entidades prestadoras de serviços, sem residência fiscal em Portugal, relativas ao exercício de 2004, identificadas por:

“A…, S.A.” – Suíça

“G… M… & E…” – Suíça

“M…, S.L.” – Espanha “M…SERVICIOS” – Espanha

“SOCIEDAD E…, S.L.” – Espanha

“M…, S.L.” – Espanha

“S…, S.L.” – Espanha

“V…/V…” – França

“V…” – Espanha;

“E…, S.L.” – Espanha;

“T…, S.A.” – Espanha;

“M… NOTICIAS, S.A.” – Espanha;

“J…” – Espanha;

“M…, S.L.” – Espanha;

“R… – R… GALEGAS, S.A.” – Espanha;

“T…, S.A.” – Espanha;

“C… -B…” – Alemanha;

“E… - U…” – Suíça;

“G… S.L.” – Espanha;

“HOTEL P…” – Espanha;

“I…, S.L.” – Espanha;

(cfr. docs. de fls. 449 a 485 juntos com o requerimento da Impugnante de 30.12.2009, com a ref.ª SITAF 005152599);

11.A atividade da Impugnante assenta na prestação de serviços de captação de sinal de satélite e transmissão televisiva, cobrindo eventos de diversa natureza ocorridos em Portugal e em outros países; (cfr. docs. 125 a 127 juntos com a petição inicial);

12. A Impugnante recorreu no exercício da sua atividade económica a serviços de transporte, designadamente de transporte de material de e/ou para o estrangeiro, prestados por, entre outras, as empresas “Grupo A…”, “P...” e “S…, S.L.”;

(cfr. docs. 7 a 14, 47, 64, 110 e 115 juntos com a petição inicial e depoimento das testemunhas J… e J…);

13.O valor que a Impugnante pagou pelos serviços de transporte referidos no ponto anterior, no exercício de 2004, ascendeu a € 27.441,65, em relação ao qual a Autoridade Tributária liquidou um imposto de € 4.116,25, a título de retenções na fonte de IRC, na sequência das correções consecutivas ao Relatório de Inspeção;

(docs. 7 a 14, 47, 64, 110 e 115 juntos com a petição inicial, fls. 465 a 467 do PAT e depoimento das testemunhas J… e J…);

14. A Impugnante recorreu no exercício da sua atividade económica a serviços de comunicações no estrangeiro, traduzidos nomeadamente na transmissão de satélite (transporte e receção de sinal e tempo de utilização do mesmo), que lhe eram prestados, entre outras, pelas empresas “M…, SL” e “G…, SL”;

(cfr. docs. 1 a 6, 26, 50, 65, 68, 87 a 93, 125, 127 a 132, 136 a 138, e 141 a 145 juntos com a petição inicial e depoimento das testemunhas J… e J…);

15.O valor que a Impugnante pagou pelos serviços de comunicação referidos no ponto anterior, no exercício de 2004, ascendeu a € 714.267,02, em relação ao qual a Autoridade Tributária liquidou um imposto de € 107.140,05, a título de retenções na fonte de IRC, na sequência das correções consecutivas ao Relatório de Inspeção;

(cfr. docs. 1 a 6, 26, 50, 65, 68, 87 a 93, 125, 127 a 132, 136 a 138, e 141 a 145 juntos com a petição inicial, fls. 465 a 467 do PAT e depoimento das testemunhas J… e J…);

16. A Impugnante adquiriu no exercício de 2004, para utilizar no contexto da sua atividade, equipamento para transmissão e uma viatura-satélite automóvel e respetiva antena à empresa “G…, SL”, câmaras de filmar de alta definição marca “T…” e outro equipamento profissional audiovisual à empresa “S…, S.L.”, assim como contratou a transformação de camiões e unidades móveis para receber o equipamento de televisão à empresa “I…, S.L.” e vários serviços de reparação;

(cfr. docs. docs. 15, 17 a 22, 41 a 43, 55, 62, 63, 98, 104, 119 a 121, 126, 130, 133 a 135, 139, 140, 144 e 165 juntos com a petição inicial e depoimento das testemunhas J… e J…);

17. O valor que a Impugnante despendeu nas aquisições de material e equipamento, e serviços de reparação e transformação referidas no ponto anterior, no exercício de 2004, ascendeu a € 1.515.996,70, em relação ao qual a Autoridade Tributária liquidou um imposto de € 227.399,51, a título de retenções na fonte de IRC, na sequência das correções consecutivas ao Relatório de Inspeção;

(docs. 15, 17 a 22, 41 a 43, 55, 62, 63, 98, 104, 119 a 121, 126, 130, 133 a 135, 139, 140, 144 juntos com a petição inicial, fls. 465 a 467 do PAT e depoimento das testemunhas J… e J…);

18. As empresas “C… Y S….”, “C… Y S…”, “G…, S.A.”, “S…, S.L.”, “M…, S.” e “N…” são empresas sediadas em território estrangeiro, não residentes e sem representação em Portugal, e que prestaram os respetivos serviços à Impugnante no estrangeiro, que consistiam em produção televisiva e segurança;

(cfr. docs. 48, 56, 59, 67, 100, 122, 123 juntos com a petição inicial e depoimento das testemunhas J… e J…);

19.O valor que a Impugnante pagou pelos serviços diversos inteiramente prestados no estrangeiro, referidos no ponto anterior, no exercício de 2004, ascendeu a € 134.339,69, em relação ao qual a Autoridade Tributária liquidou um imposto de € 20.150,95, a título de retenções na fonte de IRC, na sequência das correções consecutivas ao Relatório de Inspeção;

(cfr. docs. 48, 56, 59, 67, 100, 122, 123 juntos com a petição inicial, fls. 465 a 467 do PAT e depoimento das testemunhas J… e J…);

20.As despesas de alojamento da Impugnante, constantes das faturas juntas aos autos, foram realizadas em pagamento de serviços de alojamento fora do território nacional, de que beneficiaram trabalhadores da sociedade Impugnante nas suas deslocações ao estrangeiro;

(cfr. docs. 27, 28, 61, 99, 112 e 147 juntos com a petição inicial e depoimento das testemunhas J… e J…);

21.As despesas que a Impugnante suportou com alojamento, referidas no ponto anterior, no exercício de 2004, ascenderam a € 13.790,77, em relação ao qual a Autoridade Tributária liquidou um imposto de € 2.068,62, a título de retenções na fonte de IRC, na sequência das correções consecutivas ao Relatório de Inspeção;

(cfr. docs. 27, 28, 61, 99, 112 e 147 juntos com a petição inicial, fls. 465 a 467 do PAT e depoimento das testemunhas J… e J…);

22.Várias faturas contabilizadas no exercício de 2004 pela Impugnante e relacionadas na nota de liquidação impugnada e incluídas na tributação, não foram pagas durante o exercício de 2004, por questões de prazo de pagamento;

(depoimento das testemunhas J… e A…);

23.A Impugnante não conseguiu obter de vários dos seus prestadores de serviços os formulários de RFI referentes aos serviços de 2004 antes do pagamento e faturação;

(depoimento das testemunhas J… e A…);

24.Muitos dos países onde eram prestados serviços à Impugnante não facultavam declarações ou atestados fiscais de residência das suas empresas;

(depoimento da testemunha A…)”.

II.B. Refere-se ainda na sentença recorrida:

“Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa”.

II.C. Foi a seguinte a motivação da decisão quanto à matéria de facto:

“A decisão da matéria de facto teve por base o exame dos elementos documentais e informações oficiais constantes dos autos, a que foi sendo feita referência em cada uma das alíneas do probatório, bem como da prova testemunhal produzida em audiência.

O depoimento das testemunhas J… (Diretor Operacional da Impugnante), J… (Diretor Financeiro da Impugnante) e A… (consultora financeira que no passado prestou serviços à Impugnante), revelou-se convincente e esclarecedor quanto à matéria de facto, mostrando-se convergente e corroborado pelos elementos documentais juntos aos autos.

As testemunhas inquiridas foram coerentes na afirmação de que as entidades prestadoras de serviços não têm residência fiscal ou estabelecimento estável em território nacional, tendo realizado efetivamente as prestações de serviços ou fornecimento de bens descritos nas faturas consideradas na liquidação e ora juntos aos autos, identificando-os por referência ao tipo de serviço em causa nas faturas.

Denotaram, também, consistência quanto ao facto de muitos dos bens ou serviços faturados não estarem pura e simplesmente disponíveis no nosso país, tendo mesmo alguns deles sido inteiramente prestados no estrangeiro. Mais se retirou do depoimento testemunhal que a Impugnante se deparou com sérias dificuldades na obtenção dos formulários RFI preenchido em muitos, senão mesmo em todos, os países com quem Portugal tem convenção para evitar a dupla tributação internacional, o que em vários casos impossibilitou a sua disponibilização (ou a disponibilização atempada) à AT.

Os depoimentos prestados, pese embora a ligação profissional, atual ou pretérita, dos depoentes à sociedade impugnante, mostram-se credíveis, sinceros e dotados de razão de ciência”.

II.D. Da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto

Desde logo, entende a Recorrente que o Tribunal a quo errou o seu julgamento de facto, nos seguintes termos:

a) Quanto aos factos 12) e 16), os documentos referidos não permitem sustentar o julgamento efetuado;

b) Dever-se-á considerar provado, com força probatória plena, que, segundo a base de dados do VIES, as sociedades S…, C… – B… & M… e S… S.L. não declararam, no ano de 2004, vendas intracomunitárias;

c) Deve considerar-se provado que não foram apresentados os certificados RFI relativamente às seguintes entidades e rendimentos:

- “P… Limited”, cuja morada consta das faturas como sendo sita no Reino Unido, pela prestação de serviços de “manutenção de equipamento” titulados pelas faturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 45 e 46 juntos com a petição inicial;

- “H… S.L.”, cuja morada consta das faturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços de “produção de televisão” titulados pelas facturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 29 e 40 juntos com a petição inicial;

- “C… e S…, S.L.”, cuja morada consta das faturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços de “produção de televisão” titulados pelas faturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 57 e 60 juntos com a petição inicial;

- “S…, S.L.”, cuja morada consta das faturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços “comerciais e de gestão” e de “reparação” titulados pelas faturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 120, 121 e 126 juntos com a petição inicial;

- “Grupo A…”, cuja morada consta das faturas como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços não especificados titulados pelas faturas cujas cópias constam dos documentos n.ºs 7, 8, 10, 12 e 14 juntos com a petição inicial;

- “J…”, cuja morada consta da fatura como sendo sita em Espanha, pela prestação de serviços não especificados titulados pela fatura cujas cópia constam do documento n.º 64 junto com a petição inicial;

d) Encontra-se demonstrado que, de entre as entidades não residentes sem estabelecimento estável em relação às quais foram apresentados certificados RFI, o valor constante dos mesmos é inferior ao valor das efetivas prestações de serviços realizadas em 2004, no caso das entidades mencionadas na conclusão K);

e) O ponto 22) não podia ter sido sustentado apenas em prova testemunhal.

Considerando o disposto no art.º 640.º do CPC, ex vi art.º 281.º do CPPT, a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto carateriza-se pela existência de um ónus de alegação a cargo do Recorrente, que não se confunde com a mera manifestação de inconformismo com tal decisão (1-Cfr. António dos Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5.ª Edição, Almedina, Coimbra, 2018, p. 169.).

Assim, o regime vigente atinente à impugnação da decisão relativa à matéria de facto impõe ao Recorrente o ónus de especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considere incorretamente julgados [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. a), do CPC];

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem, em seu entender, decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. b), do CPC], sendo de atentar nas exigências constantes do n.º 2 do mesmo art.º 640.º do CPC;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas [cfr. art.º 640.º, n.º 1, al. c), do CPC].

Especificamente quanto à prova testemunhal, dispõe o n.º 2 do art.º 640.º do CPC:

“2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.

Como tal, não basta ao Recorrente manifestar de forma não concretizada a sua discordância com a decisão da matéria de facto efetuada pelo Tribunal a quo, impondo­-se-lhe os ónus já mencionados (2-V., a título exemplificativo, o Acórdão deste TCAS, de 27.04.2017 (Processo: 638/09.0BESNT) e ampla doutrina e jurisprudência no mesmo mencionada.).

Transpondo estes conceitos para o caso dos autos, verifica-se que tais ónus não foram integralmente cumpridos e, quando o foram, não se afigura pertinente o requerido.

Especifiquemos:

a) No tocante ao facto 12), a convicção do Tribunal sustentou-se igualmente em prova testemunhal, pelo que não foi cabalmente impugnado o facto em causa, dado não ser feita qualquer referência a tal meio de prova. O nosso julgamento abrange o constante da conclusão I), onde, sem se referir que concretos factos deviam ter sido considerados provados, se remete para os documentos que sustentam o facto 16), o qual se motivou, como referido, também em prova testemunhal. Como tal, rejeita-se o recurso nesta parte;

b) No que respeita à falta de declaração no VIES por parte das S…, C… – B… & M… e S… S.L., apesar de reunidos os pressupostos do art.º 640.º do CPC, carece de pertinência o aditamento requerido, por resultar do RIT e por não ter qualquer impacto na decisão, como melhor será explanado infra;

c) Quanto à falta de apresentação de certificados RFI, carece de pertinência o seu aditamento, porquanto já resulta provado que certificados foram apresentados;

d) Quanto à diferença entre o que resulta dos certificados RFI e o valor faturado, trata-se de uma conclusão e não de um facto, pelo que se rejeita o recurso nesta parte;

e) Quanto ao ponto 22., não estando nós perante uma situação de prova vinculada e, à falta de cabal impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, dado não ter sido minimamente explanada a motivação inerente à não suficiência dos depoimentos prestados, rejeita-se o recurso, o que abrange o pedido de aditamento dos factos não provados constantes dos art.ºs 106.º e 110.º da petição inicial e a alegada necessidade de esclarecimento adicional, ao abrigo do princípio do inquisitório.

III. FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

III.A. Do erro de julgamento, dada a existência de obrigação de retenção

Considera a Recorrente que o Tribunal a quo laborou em erro, dado que, na sua perspetiva, as situações elencadas no RIT deveriam ter sido objeto de retenção na fonte por parte da Recorrida.

Vejamos, então.

Nos termos do art.º 4.º do Código do IRC (CIRC – redação à época):

“1 - Relativamente às pessoas coletivas e outras entidades com sede ou direção efetiva em território português, o IRC incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.

2 - As pessoas coletivas e outras entidades que não tenham sede nem direção efetiva em território português ficam sujeitas a IRC apenas quanto aos rendimentos nele obtidos.

3 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos imputáveis a estabelecimento estável aí situado e, bem assim, os que, não se encontrando nessas condições, a seguir se indicam:

a) Rendimentos relativos a imóveis situados no território português, incluindo os ganhos resultantes da sua transmissão onerosa;

b) Ganhos resultantes da transmissão onerosa de partes representativas do capital de entidades com sede ou direção efetiva em território português, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital e, bem assim, o valor atribuído aos associados em resultado da partilha que, nos termos do artigo 75º do Código do IRC, seja considerado como mais-valia, ou de outros valores mobiliários emitidos por entidades que aí tenham sede ou direção efetiva, ou ainda de partes de capital ou outros valores mobiliários quando, não se verificando essas condições, o pagamento dos respetivos rendimentos seja imputável a estabelecimento estável situado no mesmo território;

c) Rendimentos a seguir mencionados cujo devedor tenha residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado:

1) Rendimentos provenientes da propriedade intelectual ou industrial e bem assim da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico;

2) Rendimentos derivados do uso ou da concessão do uso de equipamento agrícola, industrial, comercial ou científico;

3) Outros rendimentos de aplicação de capitais;

4) Remunerações auferidas na qualidade de membros de órgãos estatutários de pessoas coletivas e outras entidades;

5) Prémios de jogo, lotarias, rifas, totoloto e apostas mútuas, bem como importâncias ou prémios atribuídos em quaisquer sorteios ou concursos;

6) Rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos;

7) Rendimentos derivados de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras;

8) Rendimentos provenientes de operações relativas a instrumentos financeiros derivados;

d) Rendimentos derivados do exercício em território português da atividade de profissionais de espetáculos ou desportistas.

d) Rendimentos derivados do exercício em território português da atividade de profissionais de espetáculos ou desportistas.

e) Incrementos patrimoniais derivados de aquisições a título gratuito respeitantes a:

1) Direitos reais sobre bens imóveis situados em território português;

2) Bens móveis registados ou sujeitos a registo em Portugal;

3) Partes representativas do capital e outros valores mobiliários cuja entidade emitente tenha sede ou direção efetiva em território português;

4) Direitos de propriedade industrial, direitos de autor e direitos conexos registados ou sujeitos a registo em Portugal;

5) Direitos de crédito sobre entidades com residência, sede ou direção efetiva em território português;

6) Partes representativas do capital de sociedades que não tenham sede ou direção efetiva em território português e cujo ativo seja predominantemente constituído por direitos reais sobre imóveis situados no referido território.

4 - Não se consideram obtidos em território português os rendimentos enumerados na alínea c) do número anterior quando os mesmos constituam encargo de estabelecimento estável situado fora desse território relativo à atividade exercida por seu intermédio e, bem assim, quando não se verificarem essas condições, os rendimentos referidos no nº 7 da mesma alínea, quando os serviços de que derivam, sendo realizados integralmente fora do território português, não respeitem a bens situados nesse território nem estejam relacionados com estudos, projetos, apoio técnico ou à gestão, serviços de contabilidade ou auditoria e serviços de consultoria, organização, investigação e desenvolvimento em qualquer domínio.

5 - Para efeitos do disposto neste Código, o território português compreende também as zonas onde, em conformidade com a legislação portuguesa e o direito internacional, a República Portuguesa tem direitos soberanos relativamente à prospeção, pesquisa e exploração dos recursos naturais do leito do mar, do seu subsolo e das águas sobrejacentes”.

Por seu turno, o art.º 88.º prescrevia que:

“1 - O IRC é objeto de retenção na fonte relativamente aos seguintes rendimentos obtidos em território português:

a) Rendimentos provenientes da propriedade intelectual ou industrial e bem assim da prestação de informações respeitantes a uma experiência adquirida no sector industrial, comercial ou científico;

b) Rendimentos derivados do uso ou da concessão do uso de equipamento agrícola, industrial, comercial ou científico;

c) Rendimentos de aplicação de capitais não abrangidos nas alíneas anteriores e rendimentos prediais, tal como são definidos para efeitos de IRS, quando o seu devedor seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à atividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade;

d) Remunerações auferidas na qualidade de membro de órgãos estatutários de pessoas coletivas e outras entidades;

e) Prémios de jogo, lotarias, rifas e apostas mútuas, bem como importâncias ou prémios atribuídos em quaisquer sorteios ou concursos;

f) Rendimentos referidos na alínea d) do nº 3 do artigo 4º obtidos por entidades não residentes em território português, quando o devedor dos mesmos seja sujeito passivo de IRC ou quando os mesmos constituam encargo relativo à atividade empresarial ou profissional de sujeitos passivos de IRS que possuam ou devam possuir contabilidade;

g) Rendimentos provenientes da intermediação na celebração de quaisquer contratos e rendimentos de outras prestações de serviços realizados ou utilizados em território português, com exceção dos relativos a transportes, comunicações e atividades financeiras.

h) Rendimentos referidos no nº 4 do artigo 101º do Código do IRS, nas condições aí previstas.

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, consideram-se obtidos em território português os rendimentos mencionados no nº 3 do artigo 4º, excetuados os referidos no nº 4 do mesmo artigo.

3 - As retenções na fonte têm a natureza de imposto por conta, exceto nos seguintes casos em que têm carácter definitivo:

a) Quando, nos termos dos artigos 9º e 10º, ou nas situações previstas no Estatuto dos Benefícios Fiscais, se excluam da isenção de IRC todos ou parte dos rendimentos de capitais;

b) Quando, não se tratando de rendimentos prediais, nem dos rendimentos previstos na alínea h) do nº 1, o titular dos rendimentos seja entidade não residente que não tenha estabelecimento estável em território português ou que, tendo-o, esses rendimentos não lhe sejam imputáveis.

4 - As retenções na fonte de IRC são efetuadas às taxas previstas para efeitos de retenções na fonte de IRS, relativas a residentes em território português, aplicando-se aos rendimentos referidos na alínea d) do nº 1 a taxa de 20%.

5 - Excetuam-se do disposto no número anterior as retenções que, nos termos do nº 3, tenham carácter definitivo, em que são aplicáveis as correspondentes taxas previstas no artigo 80º

6 - A obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC ocorre na data que estiver estabelecida para obrigação idêntica no Código do IRS ou, na sua falta, na data da colocação à disposição dos rendimentos, devendo as importâncias retidas ser entregues ao Estado até ao dia 20 do mês seguinte àquele em que foram deduzidas e essa entrega ser feita nos termos estabelecidos no Código do IRS ou em legislação complementar.

7 - Tratando-se de rendimentos de valores mobiliários sujeitos a registo ou depósito, emitidos por entidades residentes em território português, a obrigação de efetuar a retenção na fonte é da responsabilidade das entidades registadoras ou depositárias”.

Ademais, o então art.º 90.º do CIRC prescrevia que:

“1 - Não existe obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC, quando este tenha a natureza de imposto por conta, nos seguintes casos:

a) Juros e quaisquer outros rendimentos de capitais de que sejam titulares instituições financeiras sujeitas, em relação aos mesmos, a IRC, embora dele isentas;

b) Juros ou quaisquer acréscimos de crédito pecuniário, resultantes da dilação do respetivo vencimento ou de mora no seu pagamento, quando aqueles créditos sejam consequência de vendas ou prestações de serviços de pessoas coletivas ou outras entidades sujeitas, em relação aos mesmos, a IRC, embora dele isentas;

c) Lucros obtidos por entidades a que seja aplicável o regime estabelecido no nº 1 do artigo 46º, desde que a participação financeira tenha permanecido na titularidade da mesma entidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição e essa permanência constitua condição de aplicação do referido regime;

d) Rendimentos referidos nas alíneas b) e g) do nº 1 do artigo 88º, quando obtidos por pessoas coletivas ou outras entidades sujeitas, relativamente aos mesmos, a IRC, embora dele isentas;

e) Rendimentos obtidos por sociedades tributadas segundo o regime definido no artigo 63º, de que seja devedora sociedade do mesmo grupo abrangida por esse regime, desde que esses rendimentos respeitem a períodos a que o mesmo seja aplicado e, quando se trate de lucros distribuídos, estes sejam referentes a resultados obtidos em períodos em que tenha sido aplicado aquele regime;

f) Remunerações referidas na alínea d) do nº 1 do artigo 88º, quando auferidas por sociedades de revisores oficiais de contas que participem nos órgãos aí indicados;

g) Rendimentos prediais referidos na alínea c) do nº 1 do artigo 88º, quando obtidos por sociedades que tenham por objeto a gestão de imóveis próprios e não se encontrem sujeitas ao regime de transparência fiscal, nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 6º, e, bem assim, quando obtidos por fundos de investimento imobiliários;

h) Rendimentos obtidos por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS), de que seja devedora sociedade por elas participada durante pelo menos um ano e a participação não seja inferior a 10% do capital com direito de voto da sociedade participada, quer por si só, quer conjuntamente com participações de outras sociedades em que as SGPS sejam dominantes, resultantes de contratos de suprimento celebrados com aquelas sociedades ou de tomadas de obrigações daquelas.

2 - Não existe ainda obrigação de efetuar a retenção na fonte de IRC, no todo ou em parte, consoante os casos, relativamente aos rendimentos referidos no nº 1 do artigo 88º, quando os sujeitos passivos beneficiem de isenção total ou parcial ou, por força de uma convenção destinada a eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a competência para a tributação dos rendimentos auferidos por um residente do outro Estado contratante não seja atribuída ao Estado da fonte ou o seja apenas de forma limitada.

3 - Nas situações referidas no número anterior, os beneficiários dos rendimentos devem fazer prova perante a entidade que se encontra obrigada a efetuar a retenção na fonte, da verificação dos pressupostos legais de que depende a isenção ou dos que resultem de convenção destinada a eliminar a dupla tributação, consistindo neste último caso, na apresentação de um formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças certificado pelas autoridades competentes do respetivo Estado de residência.

4 - Quando não seja efetuada a prova até ao termo do prazo estabelecido para a entrega do imposto, fica o substituto tributário obrigado a entregar a totalidade do imposto que deveria ter sido deduzido nos termos da lei.

5 - O sujeito passivo não residente, quando não tenha efetuado a prova no prazo referido no número anterior, pode requerer à Direcção-Geral dos Impostos o reconhecimento dos benefícios resultantes de convenção destinada a eliminar a dupla tributação e solicitar o reembolso do imposto retido na fonte, no prazo de dois anos a contar da data da verificação do facto gerador do imposto, mediante apresentação de formulário de modelo a aprovar por despacho do Ministro das Finanças”.

In casu, como decorre do RIT, a AT identificou pagamentos a não residentes, em relação aos quais considerou haver obrigação de retenção na fonte, retenção essa que inexistiu, motivo pelo qual procedeu a correção de imposto a esse título (retenções de pagamentos feitos a não residentes).

Começando pelos serviços de transportes, considerou o Tribunal a quo que resultou provada em 12. a realização de tais serviços de transporte de material de e/ou para o estrangeiro. Como vimos supra, a Recorrente não logrou impugnar cabalmente o que resultou provado em 1.ª instância.

Nos termos do art.º 4.º, n.º 3, al. c), 7), do CIRC, não são considerados obtidos em território português os rendimentos derivados de prestações de serviços de transporte a devedor com residência, sede ou direção efetiva em território português ou cujo pagamento seja imputável a um estabelecimento estável nele situado, como foi o caso.

Como tal, nesta parte, não há qualquer obrigação de retenção na fonte, pelo que carece de razão a Recorrente.

No tocante aos serviços de comunicações, designadamente transmissão de satélite (transporte e receção de sinal e tempo de utilização), resultou provada a sua prestação à Recorrida, como decorre de 14. do probatório. Em bom rigor, tal não vem posto em causa pela Recorrente, como decorre da leitura das respetivas alegações, pelo que nada há a apontar ao julgamento efetuado pelo Tribunal a quo quanto à correção que se menciona em 14.e 15. do probatório.

No que respeita à aquisição de equipamentos, como decorre de 16. e 17. do probatório, não cabalmente impugnados, a mesma resulta provada, consubstanciando-se em equipamento para transmissão, viatura-satélite automóvel e respetiva antena, câmaras de filmar de alta definição e outro equipamento profissional audiovisual.

Tal como é referido pelo Tribunal a quo, tal aquisição a entidades não residentes não encontra enquadramento no art.º 4.º do CIRC, como decorre da apreciação do respetivo teor.

Acrescente-se que é irrelevante, para o efeito, o facto de as fornecedoras terem ou não declarado, no sistema VIES, tais transmissões, uma vez que foi provada a sua existência e tal é o que basta para o presente julgamento.

Quanto à parte mencionada em 16 do probatório, relativa a prestação de serviços, considerou o Tribunal a quo que se trata de rendimentos unicamente tributáveis em Espanha, dispensados de retenção, ao abrigo do art.º 90.º-A, n.ºs 1 e 2, do CIRC.

Como resulta provado, tratou-se de prestações efetuadas pela G…, S.L e pela I…, S.L., sociedades residentes em Espanha.

Nos termos do art.º 7.º da Convenção entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento (CDT Portugal/Espanha), aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 6/95, de 28 de janeiro, os lucros de uma empresa de um estado contratante só podem ser tributados nesse estado, exceto se o exercício da sua atividade no outro estado contratante for feito por meio de um estabelecimento estável aí situado, o que não foi o caso. Nos termos do então art.º 90.º, n.º 2, do CIRC (e não do art.º 90.º-A, apenas em vigor a partir de 2006 – cfr. art.º 11.º, n.º 2, do DL n.º 211/2005, de 7 de dezembro), não há obrigação de retenção quando, por força de CDT, a competência para a tributação dos rendimentos seja do outro Estado contratante. Ora, tal é o caso dos autos, tendo, como refere o Tribunal a quo, sido demonstrada a reunião dos respetivos pressupostos.

Quanto às demais situações em que a Recorrente refere que não foram apresentados Certificados Modelos 12 RFI, no tocante à sociedade “C… e S…, S.L.” está provado (cfr. facto 18) ser não residente em território português e ter prestado os seus serviços no estrangeiro. Quanto ao “Grupo A…” e a “J…”, como resulta da decisão proferida sobre a matéria de facto, tratou-se de serviços de transportes, pelo que, nos termos já referidos, há dispensa de retenção. Ademais, refira-se que a qualidade de não residente dos emitentes das faturas nunca foi posta em causa pela AT, como decorre do RIT.

Nos demais casos, relembre-se que, em sede de RIT, nunca foi posto em causa tratar-se de não residentes. Ademais, em linha com o alegado pela Recorrida na sua petição inicial, houve situações de faturas não pagas, relativas aos fornecedores referidos pela Recorrente, em relação às quais o Tribunal a quo considerou inexistir obrigação de retenção, o que não foi posto em causa, designadamente em termos de factualidade que sustentou essa decisão, dado que, quanto à mesma, não houve adequada impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, mas uma mera manifestação de algum inconformismo e uma alegação de necessidade de esclarecimento, que não afasta o que resultou provado. Como tal, o alegado, per se, carece de pertinência, por não ter sido afastado o decidido pela 1.ª instância.

Finalmente, quanto às alegadas diferenças entre os valores indicados nos certificados RFI e as faturas emitidas, carece tal de pertinência, dado que o que de essencial se retira dos mencionados documentos é que é atestada a residência fiscal das sociedades em causa.

Como tal, carece de razão a Recorrente.

Nos termos do art.º 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais (RCP), “[n]as causas de valor superior a (euro) 275 000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento”.

Ora, considera-se que o valor de taxa de justiça devido, calculado nos termos da tabela I.b., do RCP, é excessivo. Assim, não obstante se entender que, face à complexidade / extensão das questões envolvidas e à tramitação dos autos, não deve haver dispensa total do pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda os 275.000,00 Eur., entende-se ser adequado e proporcional, face às caraterísticas concretas dos autos, dispensar o pagamento da taxa de justiça, na parte que exceda 300.000,00 Eur.

IV. DECISÃO

Face ao exposto, acorda-se em conferência na Subsecção Tributária Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

a) Negar provimento ao recurso;

b) Custas pela Recorrente, com dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte em que exceda os 300.000,00 Eur.;

c) Registe e notifique.


Lisboa, 14 de março de 2024

(Tânia Meireles da Cunha)

(Patrícia Manuel Pires)

(Ana Cristina Carvalho)