Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:349/14.5BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:04/29/2021
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
ALÍNEA A), DO Nº 1 DO ARTIGO 24º DA LGT
Sumário:I - De acordo com a alínea a) do nº 1 do referido artigo 24º da LGT, para a efectivação da responsabilidade subsidiária do revertido não pode deixar de resultar provada a sua culpa na insuficiência do património da pessoa colectiva para a satisfação das dívidas tributárias, sendo que o ónus da prova cabe à Fazenda Pública.
II - Nestes casos, impõe-se que a AT alegue e demonstre, relativamente ao revertido, factos ilícitos e culposos que traduzam a violação de regras destinadas a proteger os credores da sociedade, sendo disso exemplo, a utilização de crédito contrária aos interesses da empresa, a disposição de bens da devedora originária em proveito próprio dos gerentes, a danificação/ ocultação de património societário.
III - A reversão operada, desacompanhada da prova da culpa do oponente pela insuficiência do património da sociedade para satisfazer as dívidas fiscais da devedora originária, como aqui sucedeu, basta para considerar verificado o fundamento de oposição à execução fiscal invocado – a alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

A Fazenda Pública, dizendo-se inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou procedente a oposição deduzida por C..., enquanto revertido, no âmbito da execução fiscal nº32472..., originariamente instaurada contra a sociedade I... – Sociedade Imobiliária, Lda., no que respeita à cobrança coerciva de dívida de IRC relativa ao exercício de 2008, no valor de €480.919,01, dela veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«I. Primeiramente nunca a douta sentença poderia concluir com a extinção do processo de execução fiscal, em causa nos presentes autos está uma reversão, e estando a decorrer outro processo, na 2.ª U.O., do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, outra reversão, sobre o mesmo processo de execução fiscal, em nome de outro Oponente, o Sr. L..., com o processo n°350/14.9B...NT, não poderá se manter a conclusão generalizada e determinada nesta decisão: "julgar procedente, por provada, a presente oposição intentada por C... e, em consequência, julgar extinta a presente execução Fiscal", devendo sempre se cingir a extinção em causa, ao ora Oponente, o que foi omitido ou olvidado.

II. Se bem a interpretamos, entendeu a sentença sob recurso que a Administração Tributária (AT) não invocou na decisão que ordenou a reversão, sobre a imputação da responsabilidade ao Oponente, pela situação de insuficiência patrimonial da devedora originária, apontando factos precisos e reveladores da atuação descuidada ou danosa por parte do Oponente, bem como considerou que não foram trazidos aos autos, elementos de prova que demonstrassem esse comportamento por parte do Oponente, tendo concluído que o Oponente deve ser considerado parte ilegítima na execução e nestes termos julga extinto o processo de execução.

III. Nada poderia estar mais errado, bastando verificar todos os elementos carreados no despacho de reversão, na contestação e no relatório de inspeção de onde são retirados diversos elementos escritos quer na informação do serviço de finanças quer na contestação, assim, não podendo a Fazenda Pública conformar-se com tal decisão, deduz o presente recurso, firmado na discordância com a apreciação da prova documental por si produzida por parte da Mma Juiz a quo e na violação dos princípios da verdade material e do inquisitório e no erro de julgamento.

IV. A AT serviu-se da base legal vertida na al. a) do n°2 do art°153 do C.P.P.T e no artigo 23° n°2, isto porque, realizou todas as diligências com vista à penhora de bens pertencentes à devedora originária, a fim de salvaguardar os créditos, todavia, não foi conseguido esse intuito, conforme se pode verificar dos autos de execução fiscal.

V. O órgão de execução fiscal verificou que a devedora originária não possuía prédios, viaturas, contas bancárias, tendo sido tomado em consideração, designadamente: a informação constante de certidão de diligências, datada de 16/04/2013, segunda a qual a devedora originária não exerce atividade na morada da sede, desconhecendo-se o local onde a exerce; a consulta ao Sistema Informático de Penhoras Eletrónicas e aos elementos constantes do processo; a consulta ao Sistema Informático de Imposto Municipal de Imóveis e de Imposto Único de Circulação, não tendo sido encontrados quaisquer prédios e veículos automóveis; a sentença proferida no âmbito do processo de oposição ao arresto dos gerentes da devedora originária, que correu termos sob o n°1024/12.9BELRS, na qual se dispõe que: «decorre do probatório que a I..., Lda., sendo uma sociedade do ramo imobiliário que não tem na sua titularidade qualquer bem imóvel nem qualquer outro bem conhecido e, por conseguinte, não oferece qualquer garantia na satisfação dos créditos fiscais aqui em causa».

VI. Importa realçar a escritura de compra e venda e Mútuo com Hipoteca celebrada pelo ora Oponente e pelo sócio-gerente A... em representação da sociedade devedora originária, foi declarado que «pela presente escritura, em nome da sociedade sua representada e pelo preço de QUATROCENTOS E SETENTA MIL EUROS, já recebido, vendem aos segundos outorgantes, em comum a fracção autónoma, destinada a habitação, individualizada pela letra "D" (...)».

VII. Ora desde logo por esta ação do Oponente, e este seu comportamento, se pode retirar a prova da culpa, uma vez que do facto acima descrito resulta a alienação do património da sociedade executada que assim se tornou insuficiente para responder pelas dívidas fiscais desta (alínea B. na fundamentação de facto).

VIII. Não obstante dessa escritura ter sido declarado que o montante de €470.000,00 já tinha sido recebido.

IX. E se é certo que esta alienação poderia ter servido para solver o crédito bancário (tal como é afirmado pelo Oponente no ponto 146° da PI), a verdade é que de acordo com o critério do «bónus pater familiae» qualquer pessoa colocada no seu lugar saberia que ao diminuir o património da devedora originária tornaria mais difícil a posição dos seus credores, designadamente da Administração Fiscal, o que demonstra claramente uma conduta culposa marcada por uma falta contra o dever jurídico que postula o cumprimento pontual de total das obrigações do devedor perante aqueles, (cfr. neste sentido Acórdão TCA Sul de 13/02/2014, Processo n°06961/13).

X. Refira-se, ainda, como aliás, é dito na informação do OEF que a culpa do ora Oponente também é demonstrada com o cuidado no pagamento da totalidade do empréstimo bancário, que não encontra paralelo no cumprimento das obrigações fiscais, mormente o pagamento do IRC resultante da atividade da sociedade, tal como aliás é afirmado pelo mesmo nos pontos 38° a 40° da sua PI.

XI. Além do que também não se encontra demonstrada que o Oponente tivesse erigido esforços no sentido de recuperar os alegados fundos apropriados pela construtora B... - Engenharia e Construção, SA, ou para que fossem ressarcidos do incumprimento generalizado por esta última sociedade das suas obrigações contratuais para com a devedora originária, responsabilizando-a pelos sucessivos atrasos na conclusão das obras previstas no contrato de empreitada.

XII. Aliás, muito pelo contrário, pois como também é afirmado pelo Oponente as receitas obtidas com a venda das frações foram utilizadas para «pagar a empreitada contratualizada com a B... -Engenharia e Construção, S.A.

XIII. De igual forma se verifica não ter usado da diligência devida, nomeadamente por não ter procurado acautelar a documentação respeitante ao empreendimento, a qual seria de extrema importância, designadamente para apurar o IRC a pagar.

XIV. Do exposto encontra-se concretizada quanto ao Oponente a culpa na insuficiência patrimonial, através de factos demonstrativos de uma gestão danosa do património da sociedade que se verificam quer através de ações, quer por omissões.

XV. No despacho de reversão efetuado pelo serviço de finanças de Lisboa 2, e devidamente sancionado pelo Chefe do serviço de finanças, conforme informação ínsita nos autos, consta efetivamente diversos factos, retirados de elementos concretos, ocorridos com o aval do ora Oponente e que são motivos de facto e de direito pelos quais o projeto de reversão seguiu os seus trâmites.

XVI. De todos estes factos, deveria o Tribunal a quo ter devidamente considerado e valorado, efetuado uma apreciação crítica de todas as provas carreadas para os autos;

XVII. Destarte, verifica-se culpa activa, responsabilidade, e gestão danosa do Oponente/Recorrido por uso indevido de dinheiros do Estado, cujas verbas tinha a responsabilidade e a obrigação únicas, de entrega nos cofres do Estado enquanto representante, administrador e gerente da sociedade.

XVIII. A douta sentença recorrida ao decidir com fundamento na falta de prova efetuada pela Fazenda Pública fez errada apreciação da prova, e viola o disposto no artigo 24° n°1 al. a) da LGT, os artigos 413° e 615°, n°1 do CPC, bem como os artigos 64°, 78°, 259º e 260° do CSC.

XIX. Além de que o Tribunal a quo não lidou com as suas eventuais incertezas, promovendo a junção aos autos de novos, adicionais e esclarecedores, seja pela Fazenda Pública, seja pelos serviços da AT, fosse, ainda, pelo Oponente, comprometendo, no final, a verdade material dos autos e violando o princípio da investigação ou do inquisitório, o qual consubstancia um poder-dever sobre a Juiz a quo no sentido da realização e promoção de diligências ou atos úteis ao apuramento da verdade dos autos.

XX. Na realidade julgou dispensável a prova testemunhal por despacho judicial de 09/07/2018.

XXI. Com todo o respeito, e é muitíssimo, a douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento, por deficiente avaliação da prova documental produzida pela AT, fazendo, por conseguinte, insuficiente e desacertada fixação do probatório e errónea interpretação dos normativos legais aplicáveis, designadamente, no artigo 24° n°1 al. a) da LGT, os artigos 413° e 615°, n°1 do CPC, bem como os artigos 64°, 78°, 259° e 260° do CSC e, ainda, violando o princípio do inquisitório - artigos 99°/1 da LGT e artigo 13°/1 do CPPT.

Termos em que, com o sempre mui douto suprimento de Vossas Exas, deverá ser concedido provimento ao presente, com o que se fará como sempre

JUSTIÇA»


*

O Recorrido, C..., apresentou as suas contra-alegações e, prevenindo a hipótese de o Tribunal conceder provimento ao recurso, requereu a título subsidiário e no uso da faculdade consentida pelo artigo 636º do CPC, a ampliação do objecto do recurso, tudo com base no seguinte quadro conclusivo:

«OBJETO E ENQUADRAMENTO

A. O Recurso Jurisdicional da Representação da Fazenda Pública tem por objeto a mui douta Sentença prolatada, em 05/02/2020, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a Oposição Judicial deduzida pelo Recorrido contra a reversão do processo de execução fiscal nº32472..., instaurado por uma alegada dívida de IRC, do exercício fiscal de 2008, da sociedade devedora originária I....

B. A mui douta Sentença julgou não estar provado o pressuposto legal da culpa na insuficiência patrimonial da I... necessário à responsabilização subsidiária do ora Recorrido.

C. Com efeito, tendo a reversão sido preparada e ordenada pela Autoridade Tributária nos termos do artigo 24º, nº l, alínea a) da LGT (cfr. alínea P. e ponto 3.2. da Fundamentação de Direito da Sentença) competia-lhe exclusivamente alegar e provar a culpa do ora Recorrido e demonstrar o nexo de causalidade com a alegada insuficiência patrimonial da I... e no não pagamento da obrigação tributária, o que não fez, como era seu ónus jurídico, como apreciado e decidido pelo douto Tribunal a quo (cfr. ponto 3.2. do ponto III da mui douta Sentença).

D. Neste contexto, as Alegações do Recurso Jurisdicional apresentadas pela Representação da Fazenda Pública assentam especificamente na "discordância com a apreciação da prova documental por si produzida por parte da Mma Juiz a quo e na violação dos princípios da verdade material e do inquisitório." no concreto âmbito da "imputação da responsabilidade ao Oponente, pela situação de insuficiência patrimonial da devedora originária" (...), comprometendo, no final, a verdade material dos autos e violando o princípio da investigação ou do inquisitório" (cfr. pontos 3.40., 41. e Conclusões II, XIX e XX das Alegações).

E. Porém, a Representação da Fazenda Pública não tem razão como passaremos a demonstrar.

CONTRA-ALEGAÇÕES

F. A mui douta Sentença decidiu: "Nos termos e com os fundamentos referidos, decide-se julgar procedente, por provada, a presente oposição intentada por C... e, em consequência, julgar extinta a presente execução fiscal."

G. Registe-se desde já que a extinção da presente execução fiscal nos termos ordenados pela mui douta Sentença, sendo feita exclusiva referência ao então Oponente, ora Recorrido, é consequência direta da decisão de mérito sobre a legalidade da reversão, tendo julgado procedente a Oposição Judicial (cfr. artigos 204º, nºl, alínea b) e 176º, nº1, alínea c) do CPPT).

H. Não se trata, pois, da declaração e reconhecimento de um mero vício de forma do ato de reversão ordenado pela Autoridade Tributária, mas, outrossim, de um vício substantivo que inquina irreversivelmente a reversão intencionada dada a ausência dos seus pressupostos legais cumulativos pelo que o ato de reversão não pode ser renovado, expurgado do vício substantivo que o inquina, por a tanto obstar a autoridade do caso julgado (neste sentido, o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo nº00044/12.OBEPNF, de 13/10/2016).

I. Neste contexto, deve entender-se que resulta da Decisão supra citada que a presente execução fiscal se julga extinta em relação ao então Oponente, ora Recorrido, único executado em causa nos presentes autos de Oposição Judicial, em resultado da sua ilegitimidade como revertido - não devendo o mesmo manter-se no processo de execução fiscal como sujeito passivo (revertido) da alegada obrigação de imposto, como vem, aliás, aceite pela Representação da Fazenda Pública no ponto 7 e Conclusão l das suas Alegações, merecendo assim aplauso o trecho decisório da mui douta Sentença que deve nestes termos manter-se na Ordem Jurídica.

FALTA DE CULPA NA INSUFICIÊNCIA DO PATRIMÓNIO

J. In casu, é facto documentalmente provado que a reversão operou nos termos do artigo 24º, nº1, alínea a) da LGT conforme projeto de reversão, despacho de reversão e citação (cfr. Alínea P. da Fundamentação de Facto e ponto 3.2. da Fundamentação de Direito da mui douta Sentença).

K. Sendo que para além da verificação do requisito legal da insuficiência patrimonial do devedor originário, a lei exige que seja provada a culpa da conduta do devedor subsidiário na produção daquele resultado competindo ao credor tributário concretizar o nexo de imputação (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo nº00630/06.7BEPNF, de 11/01/2013 e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº282/11.2BEALM, de 08/03/2018.

L. O que significa que esta culpa - que no caso concreto não se presume! - deve ser aferida, por um lado, no âmbito do processo de execução fiscal (cfr. António Lima Guerreiro, pág. 141, citado no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo nº00630/06.7BEPNF, de 11/01/2013), e, por outro lado, no momento da reversão do processo de execução fiscal, não se admitindo a fundamentação a posteriori do ato tributário (cfr. artigos 23º, nº3 e 77º da LGT) - cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, Processo nº0511/16, de 03/05/2017.

M. Precisando que "Não é, pois, a mera falta de mérito da gestão que pode fundamentar a decisão de reversão. A gestão tem de traduzir-se em factos ilícitos e culposos, implicando a violação de normas concretas de proteção dos credores sociais." - cfr. António Lima Guerreiro, in LGT Anotada, Editora, Rei dos Livros, pág. 141 sendo que não há violação dos deveres de cuidado e lealdade se a atuação foi diligente prosseguindo com racionalidade económica o objeto social e os interesses da sociedade, e não, interesses pessoais ou de terceiros (cfr. artigo 64ºdo CSC).

N. No caso concreto, em nenhum dos elementos preparados pela Autoridade Tributária para operar a reversão vêm identificados os "factos precisos reveladores de uma actuação descuidada ou danosa por parte do Oponente (ora Recorrido) e que foi essa sua conduta que determinou a situação insuficiência patrimonial da devedora originária" nos termos sentenciados pelo Tribunal a quo (cfr. ponto 3.2. da Fundamentação de Direito da mui douta Sentença).

O. Com efeito, a Autoridade Tributária limitou-se a invocar a insuficiência do património da I... e o artigo 24º, nº1, alínea a) da LGT no Despacho de reversão e na Citação (cfr. Alíneas N. e Q. da Fundamentação de Facto da mui douta Sentença) não demonstrando ou concretizando a culpa do ora Recorrido na constituição da dívida subjacente aos autos.

P. Na verdade, a Representação da Fazenda Pública refere-se a "diversos factos, retirados de elementos concretos" para provar a culpa do ora Recorrido na insuficiência patrimonial da I..., mas não os especifica nem os demonstra (cfr. ponto 32. das suas Alegações) pelo que como bem decidido pela mui douta Sentença do Tribunal a quo, não está provado o pressuposto legal da prova da culpa na insuficiência patrimonial da I... e não estando observado o respetivo ónus da prova, o dissídio não pode senão resolver-se contra o credor tributário (cfr. artigo 742, nº1 da LGT e artigo 342° do CC.

Q. De todo o modo, se acaso dúvidas soçobrassem, sempre seriam valoradas a favor do contribuinte, ergo, o ora Recorrido nos termos legais pelo que falecem também assim os pontos 32. a 36., 38. a 40. e as Conclusões XV a XIX das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública.

R. Por outro lado, nem se diga que a culpa do então Oponente, ora Recorrido, se extrai da documentação aportada pela Autoridade Tributária mormente do Relatório de Inspeção Tributária (cfr. Alínea K. dos factos assentes na mui douta Sentença recorrida), o qual, esclarece-se, é omisso na alegação, especificação e concretização do pressuposto legal da culpa e respetivo nexo de causalidade do ora Recorrido na insuficiência do património da I....

S. Destarte, perante o invocado pela Representação da Fazenda Pública nas suas Alegações de Recurso nos pontos 8. a 22., cujo teor se impugna em toda a sua extensão, que são, nada mais nada menos, que uma repetição integral dos pontos 51 a 65 da sua Contestação, constante dos autos, para a qual se remete integralmente e aqui se dão por integralmente reproduzidas para todos os efeitos legais e, sem prejuízo, do quanto se alegou quer na Oposição Judicial (cfr. em particular, os artigos 132º a 151º), quer em sede de Alegações Finais (cfr. em particular, os artigos 7º,18º,49º a 73º), para as quais se remete integralmente, reiteramos nesta sede, o que já resulta provado documentalmente nos autos.

T. A I... foi objeto de uma inspeção tributária em sede de IRC ao exercício fiscal de 2008 (cfr. Alínea K), na qual o ora Recorrido colaborou ativamente e de boa fé (o que nunca foi controvertido, e resulta dos autos), tendo a Autoridade Tributária encontrado contabilidade organizada e um TOC que havia preparado a Declaração Periódica Modelo 22 de IRC com a informação existente, como resulta provado nos autos e confessado pela Representação da Fazenda Pública no ponto 26 das suas Alegações, o que se aceita especificadamente para não mais ser retirado nos termos do artigo 46º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2º, alínea e) do CPPT.

U. Com efeito, no exercício fiscal de 2008 foi apurado um resultado líquido negativo de €488.171,15 sendo que o esboço da Declaração Periódica Modelo 22 de IRC a entregar evidenciava prejuízos fiscais no montante de €23.634,03, o que foi explicado à Autoridade Tributária e resulta provado documentalmente (cfr. pág. 9 da Informação / Conclusão e pág. 6 do Relatório de Inspeção Tributária junto aos autos e Doc. 17 junto à Oposição Judicial).

V. Em primeiro lugar, os prejuízos apurados pela I... tiveram origem no incumprimento das obrigações contratuais pela construtora B... com quem a I... celebrou, em 09/11/2001, um contrato de Empreitada de Construção Civil para a execução e conclusão do "Condomínio R..." na Areia - Cascais (cfr. contrato de empreitada junto como Doc. 6 à Oposição Judicial).

W. Com efeito, ainda que tenha sido contratualizado que «Os trabalhos terão início em 15 de Novembro de 2001 e estarão concluídos em 15 de Maio de 2003.», ou seja volvidos 2 (dois) anos (cfr. ponto 3.1 da Cláusula Terceira do cit. Doc. 6 junto à Oposição Judicial), a verdade é que, atentos os consecutivos atrasos a cargo da B..., o Empreendimento da Areia foi apenas concluído 7 (sete) anos depois, precisamente em 2008, em plena crise financeira.

X. Assim sendo, não pode ser imputável ao ora Recorrido a responsabilidade pelas delongas na execução e conclusão da empreitada que, por culpa da B..., prejudicaram e oneraram financeiramente a I....

Y. Em segundo lugar, o preço globalmente acordado pela Empreitada celebrada em 09/11/2001 cifrou-se em €1.860.000, aí se incluindo a dação em pagamento de uma das frações autónomas a construir (a correspondente à letra H) - cfr. pontos 2 e 2.3 da Cláusula Segunda Preço do cit.Doc. 6 - que se estimava vender à data por um preço superior a €600.000, - e o valor total do empréstimo originariamente obtido, em 01/06/2001, pelo sócio-gerente A... junto do B... de €1.246.994.74 - cfr. Doc. 4 junto à Oposição Judicial.

Z. Mas, em 04/11/2003 - quando a obra já deveria estar concluída em 15/05/2003 (cfr. ponto 3.1 da Cláusula Terceira do cit. Doc. 6) - a I... foi levada a reforçar o empréstimo em mais €498.000,00 para a B... para a conclusão da obra (cfr. Doc. 7 junto à Oposição Judicial), tendo sido requerida por P... e A..., em missiva enviada ao B... datada de 20/08/2007, a prorrogação do empréstimo (cfr. Doc. 8 junto à Oposição Judicial).

AA. Porquanto quem mantinha os contactos e a linha de crédito aberta junto do Banco era o atual sócio-gerente A... e a primitiva sócia-gerente P... - provado nos autos cit. Doc. 7 junto à Oposição Judicial.

BB. E era efetivamente o atual sócio-gerente A..., enquanto promotor imobiliário, quem geria administrativa e financeiramente a I... tratando diretamente dos assuntos relacionados com a tesouraria, contabilidade, fornecedores, clientes, bancos e entidades públicas sendo o ora Recorrido competente pela parte técnica e arquitectónica.

CC. Facto reconhecido por este Venerando Tribunal no Processo nº07028/13 como se pode ler no douto Acórdão (cfr. Doc. 3 junto à Oposição Judicial, ponto 21 de fls. 21): "A sociedade I... Lda., era, ao tempo, gerida per A... no que respeita à parte administrativa e pelos Oponentes (Arquitectos) no que se refere à parte técnica (arquitectónica) - cfr. prova testemunhal.", o que desde já se invoca à luz do princípio da eficácia extraprocessual das provas previsto no atual artigo 421º do CPC, aplicável ex vi do artigo 29, alínea e) do CPPT.

DD. Por conseguinte, não pode o ora Recorrido ser responsabilizado pelo recurso ao crédito bancário em nome da I... para fazer face aos gastos incorridos com os atrasos na conclusão da Empreitada, o que é, outrossim, imputável ao atual sócio-gerente A... e primitiva sócia-gerente P... como resulta provado nos autos (cit. Doc. 7 junto à Oposição Judicial).

EE. Em terceiro lugar, foi em plena crise do mercado imobiliário, que se conseguiram vender as frações mas a um preço de mercado muito inferior ao esperado servindo para pagar a empreitada e os financiamentos, reforços bancários e encargos associados, o que está provado nos autos por documento (cfr. cit. Docs. 4, 6 e 7 juntos à Oposição Judicial).

FF. Com efeito, "o cuidado no pagamento da totalidade do empréstimo bancário" - parafraseando a Representação da Fazenda Pública (cfr. ponto 18 e IX das suas Alegações de Recurso, que se impugnam em toda a sua extensão) - era, reitere-se, obrigatório para a obtenção dos distrates no momento da outorga das escrituras públicas, o que sucedeu também quanto à alienação da "fração D", o que se esclarece por referência aos pontos 13 a 16 e Conclusões VI e IX das Alegações da Representação da Fazenda Pública, que se impugnam em toda a sua extensão.

GG. Efetivamente, a obtenção dos distrates era condição contratual obrigatória do financiamento obtido no B... (cfr. Doc. 4 junto à Oposição Judicial) pois que o B... detinha um direito de garantia real traduzido numa primeira hipoteca - com preferência pois sobre as demais garantias que pudessem vir a constituir-se - que incidia sobre os lotes e respetivas construções.

HH. Por conseguinte, qualquer homem médio colocado no lugar do ora Recorrido, de acordo com o critério do «bónus pater familiae», saberia que, à data, não poderia deixar de prosseguir o seu objeto social e também de cumprir as suas obrigações com os credores através do produto das vendas e que o Banco B..., além de credor, era também parte interveniente obrigatoriamente nos atos jurídicos dessas vendas, pois detinha, no momento da venda, recorde-se, um direito real de garantia sobre a(s) fração(ões) que poderia executar em caso de incumprimento contratual.''.

II. Ex adverso, para o mesmo homem médio, não faria sentido simplesmente não prosseguir o objecto social e entrar em insolvência por ausência de receitas, com a consequente diminuição adicional do património imobiliário em caso de execução pelo Banco B....

JJ. Acresce ainda que não é o produto da alienação da fração "D" que está na origem do imposto que viria a alegadamente constituir-se 4 (quatro) anos volvidos, nem é esta alienação causa adequada a uma diminuição patrimonial da I... que impedisse o pagamento do IRC que a Autoridade Tributária alega ser devido.

KK. Na verdade, nunca reverteram para o ora Recorrido quaisquer dos pagamentos realizados pelas vendas das frações, as quais serviram exclusivamente para pagar a empreitada, o financiamento ; bancário e os juros (cfr. cit. Doc. 8 junto à Oposição Judicial), satisfazendo assim a posição dos seus credores que eram principalmente a B... e o B....

LL. Assim, para pagar uma empreitada de €1.860.000, para a qual foi obtido um financiamento de €1.246.994.74 e contratualizada uma dação em pagamento da fração autónoma H (cfr. cit. Doc. 6 junto à Oposição Judicial), cuja venda se estimava em mais de €600.000, mas alienada, em plena crise imobiliária, somente por €425.000 conforme documentalmente provado nos autos, face ainda ao reforço do empréstimo bancário de €498.000 bem como à prorrogação do empréstimo solicitado por A... e P..., com o consequente acréscimo dos juros do financiamento (cfr. cit. Docs. 7 e 8 juntos à Oposição Judicial) e às vendas das frações ocorridas muito mais tarde e por um montante inferior ao próprio VPT, com uma diferença total para menos de €478.185,16 - cfr. pág. 5 do Relatório de Inspeção Tributária - pouco ou nada sobrou.

MM. Era assim esperado que nesse exercício de 2008 o resultado da I... fosse negativo como o foi e assim refletido na contabilidade, não sendo assim expectável face a um juízo de prognose póstuma, à data da alienação da fração "D" e perante as circunstâncias expostas e em termos de causalidade adequada, qualquer dívida existente ou em formação à Autoridade Tributária, ressalvando-se ainda que teria sido desastroso para a I... retardar a venda do(s) lote(s) da empreitada celebrada em 2001 face aos encargos de financiamento que se avolumavam e à crise financeira iniciada em 2007/2008 que se estendeu até aos anos de 2012/2013, pelo que se impugna, em particular, o invocado no ponto 14. e Conclusão VII das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública.

NN. Destarte, também não pode ser imputável ao ora Recorrido a responsabilidade pela crise financeira que impactou negativamente o mercado imobiliário desvalorizando a venda das fracões do Empreendimento da Areia em prejuízo da I....

OO. Acresce ainda, a falta de documentos da B... pela ausência de recibos que comprovariam custos muito superiores suportados com a Empreitada e o desvio de fundos em €500.000,00 por via de pagamentos feitos para a conta bancária do Eng. P... (filho de M... e P...), o qual foi também designado gerente da B... (cfr. Declaração junta ao cit. Doc. 8 junto à Oposição Judicial).

PP. Registe-se que a B... tinha como administradores M..., A... e P... (cfr. cit. Doc. 15 junto à Oposição Judicial), sendo esta última também gerente da (cfr. fls. 17 dos autos), estando incumbida da gestão da construção do Empreendimento da Areia.

QQ. Fazemos notar igualmente que nos anos de 2001 a 2006 a contabilidade da I... era assumida por S... com domicílio profissional na Rua H..., 4435-280 Rio Tinto (cfr. cit. Doc. 13 junto à Oposição Judicial) que era quem tratava simultaneamente da contabilidade da construtora B....

RR. Posteriormente, a contabilidade que passaria para A... que à data era contabilista da CVPI com o NIF 5... (cfr. cit. Doc. 13 junto à Oposição Judicial), sociedade (também) gerida por A... (cfr. cit. Doc. 16 junto à Oposição Judicial), acabou por transitar, para a atual contabilidade "A... Contabilidade e Fiscalidade", que logo assinalou a falta de documentação do Empreendimento da Areia, imputável às contas da B....

SS. Neste contexto, gestão culposa e danosa existiu por parte de P... e A..., que através de incumprimentos, apropriações, desvios e outras malfeitorias que em proveito pessoal se favoreceram e também à B... na qual tinham interesse direto.

TT. E certo é que a primitiva sócia-gerente P... foi destituída do exercício de funções da I... vendo a sua quota arrestada pela Fazenda Pública (cfr. a fls. 19 dos autos) e o atual sócio-gerente A... desapareceu deixando insolventes as sociedades por ele geridas na qualidade de promotor imobiliário (como exemplo, a B... foi declarada insolvente em 15/07/2009 - Processo nº751/06.6TYLSB - e a CVPI, em 24/06/2011, - Processo nº12084/11.1T2SNT - cfr. cit. Docs. 15 e 16 juntos à Oposição Judicial.

UU. Sendo que também a sociedade MPA (NIF 507 397 487), da que era administrador único o Eng. P... (filho de M... e P...) foi declarada insolvente em 08/07/2009 (Processo nº456/09.6TYLSB) - cfr. cit. Doc. 14 junto à Oposição Judicial.

VV. Foi neste contexto não só muito prejudicada a I... mas também o ora Recorrido dado que além de não ter recebido o que havia sido acordado com o sócio-gerente A... pela prestação dos seus serviços como Arquiteto, viu o seu património pessoal arrestado por via de uma Providência Cautelar de Arresto Tributário decretada em 2012 (cfr. cit. Doc. 3 junto à Oposição Judicial), que se mantém nesta data, apesar de requerido e da obrigação legal de cancelamento oficioso a cargo da Autoridade Tributária (cfr. artigo 183º-B do CPPT), mercê da prolação da mui douta Sentença do Tribunal a quo integralmente favorável ao ora Recorrido.

WW. Neste contexto, apesar da ausência de faturação da B... e da cumplicidade do sócio-gerente A... que controlava as contas e a gestão financeira da I..., perante o seu desaparecimento, e tendo o ora Recorrido vindo a descobrir o rasto de incumprimentos por ele deixado conforme exposto acima, envidou todos os seus esforços para manter a contabilidade do Empreendimento da Areia o mais completa possível, embora no limite das suas capacidades pois ao ora Recorrido competia tão só tratar da componente arquitetónica conforme resulta provado nos autos nos termos supra demonstrados, e, bem assim, considerando que "durante o ano de 2008, o Oponente esteve sujeito a diversos internamentos, dentro e fora do País, por lhe ter sido diagnosticado um Linfoma de Burkitt -provado por documento, a fls. 125” - cfr. alínea J. da Fundamentação de Facto da mui douta Sentença.

XX. Em conformidade, não pode por esta via ser imputável ao ora Recorrido a responsabilidade pela gestão culposa e danosa da I... que existiu por parte de P... e A... nos termos alegados e demonstrados supra.

YY. Nesta senda, impugna-se, em particular, o ponto 23. das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública referente ao teor do doutíssimo Acórdão prolatado por este Venerando Tribunal no Processo nº07028/13, no âmbito da Providência Cautelar de Arresto Tributário em que era Requerido o ora Recorrido (cfr. cit. Doc. 3 junto à Oposição Judicial).

ZZ. Desde logo, importa esclarecer que os fundamentos de facto subjacentes ao Aresto deste Venerando Tribunal não adquirem valor de caso julgado no âmbito dos presentes autos e o princípio da eficácia extraprocessual das provas a tal não conduz (cfr. atual artigo 421º do CPC aplicável ex vi do artigo 2º, alínea e) do CPPT) - vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Processo nº05B691, de 05/05/2005 e o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo n.e 00006/2003.TFPRT.31, de 16/03/2017.

AAA. Ademais, registe-se que os pressupostos legais subjacentes à Providência Cautelar de Arresto Tributário não encontram respaldo no caso sub judice uma vez que, à data, este Venerando Tribunal julgou que a verificação do requisito legal do fundado receio da diminuição de garantia de cobrança do crédito tributável se bastava com a descaracterização do valor do património pessoal do então Requerido em razão de hipotecas anteriormente constituídas, não exigindo qualquer comportamento, ato, desígnio ou intento praticados no sentido de frustrar a cobrança do crédito (cfr. cit. Doc. 3 junto à Oposição Judicial), pese embora o entendimento do Digno Magistrado do Ministério Público e do 1º Adjunto da formação do douto 2º Juízo, 2ª secção deste Venerando Tribunal (cfr. cit. Doc. 3 junto à Oposição Judicial).

BBB. O que com o devido e merecido respeito, que é muitíssimo, não deve operar nestes autos dado que a responsabilidade subsidiária do revertido, ora Recorrido, tem como pressuposto legal a culpa na insuficiência do património da sociedade devedora originária e que seja provada a culpa da sua conduta na produção daquele resultado com o qual se estabelece um nexo causal, nos termos do preceituado no artigo 24º, nº1, alínea a) da LGT cujo ónus probatório compete inequivocamente ao credor tributário, como já invocado.

CCC. Assim sendo, a responsabilidade subsidiária do ora Recorrido pela alegada dívida tributária não pode fundamentar-se no teor do sobredito Aresto como o pretende a Representação da Fazenda Pública para deste modo escamotear o incumprimento do ónus probatório.

DDD. Porque, ab initio, a Autoridade Tributária, a quem foram explicadas as dificuldades da I... em reorganizar todos os documentos de suporte contabilístico e que poderia ter comprovado os esclarecimentos avançados pelo TOC em relação às contas da B..., designadamente verificando ela mesma, diretamente, mormente por via das Declarações Periódicas Modelo 22 e/ou de Informação Empresarial Simplificada ou por acesso à constas bancárias da B..., que estão na sua disponibilidade (cfr. artigo 74º, nº2 da LGT), sustentando-se na sua capacidade de investigação administrativa dos elementos contabilísticos e documentais (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº06309/13, de 21/05/2013) e esgotando todos os meios de prova disponíveis para realizar uma tributação de acordo com o lucro real da I..., também em cumprimento do princípio do inquisitório que encontra fundamento no princípio da legalidade tributária (artigos 8º e 58º da LGT) e na tributação pelo lucro real constituindo a concretização de um princípio constitucional de igualdade (artigo 104º da Constituição da República Portuguesa) - nada fez.

EEE. Por conseguinte, não resulta que o ora Recorrido tenha alienado, ocultado, transferido ou dissipado o património da I..., nem que tenha disposto dos bens da sociedade em proveito próprio, de modo a diminuir o seu acervo patrimonial ou acumulado dívidas para frustrar a satisfação do alegado crédito tributário nem está provado que tenha omitido ou dissipado a contabilidade da I... ou que manteve ou ordenou a manutenção de uma contabilidade fictícia ou quaisquer atos ou comportamentos que conduziriam à frustração da cobrança do alegado crédito tributário.

FFF. Por conseguinte, não estando provado pelo credor tributário a culpa do ora Recorrido na insuficiência patrimonial da I... mas, outrossim, provada que está nos autos a ausência de culpa do ora Recorrido na insuficiência patrimonial da I..., improcede também, por esta via, o alegado pela Representação da Fazenda Pública nos pontos 19, 21,32. a 36., 38. a 40. e nas Conclusões XI, XIII, XV a XIX das suas Alegações de Recurso.

FALTA DE CULPA NO NÃO PAGAMENTO DO IMPOSTO

GGG. Na verdade, também não existe culpa do ora Recorrido pelo não pagamento do imposto nos termos do artigo 24º, nº l, alínea a) da LGT, como passaremos a demonstrar através da prova documental aportada aos autos mormente no Relatório de Inspeção Tributária, perante o invocado nos pontos 25 a 28 das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública (que remetem para o teor do capítulo III do Relatório de Inspeção) os quais se impugnam, seguindo, para tanto, a argumentação já expendida na Oposição Judicial (cfr. em particular, os artigos 152º a 189º) e nas respetivas Alegações Finais (cfr. em particular, os artigos 7º, 18º, 49º a 73º) para as quais se remete integralmente e que nesta sede reiteramos.

HHH. Do Relatório de Inspeção Tributária junto aos autos decorrem correções aritméticas à matéria coletável do IRC de 2008 da I... no montante de €1.616.406,49.

III. Desde logo, estas correções baseiam-se em parte na tributação de um facto caducado uma vez que a Autoridade Tributária efetuou uma correção positiva no Relatório de Inspeção Tributária (cfr. ponto 1. Área de Proveitos) incrementando os proveitos da I... em €425.000 com origem na alienação - sob a forma de dação em pagamento - da fração autónoma "H".

JJJ. Acontece que a alienação da fração autónoma "H" ocorreu em 14/08/2007 pelo que a Autoridade Tributária não poderia incluir um facto caducado nas correções aritméticas à matéria coletável da I... do exercício fiscal de 2008 porquanto o facto tributário de que depende o direito de liquidação da Autoridade Tributária ocorreu em 14/08/2007 exigindo-se assim que o mesmo fosse exercido no prazo legal de caducidade de 4 (quatro) anos, ergo, até 31/12/2011, o que não sucedeu, tendo sobrevindo somente em 2012.

KKK. O que se vem de alegar constitui causa de pedir no Processo de Impugnação Judicial nº87/17.7BELRS que corre termos na 3ª Unidade do Tribunal Tributário de Lisboa, não obstante vir nestes autos alegados, concretizando-se também por esta via a inexistência de culpa do ora Recorrido pelo não pagamento do tributo, e, bem assim, por a dívida ser inexigível, constituindo tanto quanto se entende fundamento de Oposição à execução nos termos do artigo 204º, nº1, alínea e) e/ou i) do CPPT uma vez que a citação de reversão do ora Recorrido foi efetuada após o decurso do prazo legal de caducidade de 4 anos (artigo 45º, nºl, da LGT).

LLL. Acresce sobremaneira que, a Autoridade Tributária efetuou também uma liquidação de imposto presumido, rectius forfetário, assente numa dupla ficção jurídica traduzida (i) ao nível dos proveitos, na rejeição do valor declarado das frações nas escrituras notariais de venda, E (ii) ao nível dos custos, na rejeição do VPT na aquisição das frações.

MMM. Ao nível dos proveitos, a Autoridade Tributária acresceu €478.185,16 à matéria tributável, onde se inclui a fração autónoma "H", obtido por via da diferença positiva entre o VPT definitivo das frações autónomas, (i.e., €3.179.128,26) e o valor de venda das frações autónomas declarado nas escrituras notariais (i.e, €2.700.943,10) considerando o VPT das frações (que se afigura ser de montante muito superior) e rejeitando assim o valor real declarado e escriturado.

NNN. Ora, tanto quanto se sabe, todos os valores declarados nas escrituras notariais de venda são valores verdadeiros, correspondentes aos preços efetivamente pagos nas transmissões, conforme resulta provado documentalmente dos autos e não tendo sido impugnados, pelo que restringir a prova do preço efetivo de venda das frações autónomas ao procedimento previsto nos termos do atual artigo 1399 (ex-artigo 1299 do Código do IRC) - cfr. capítulo III do Relatório de Inspeção referido no ponto 27 das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública) que se afigura como o único meio legal de prova admissível para ilidir a presunção legal do artigo 64º, nº3, alínea a) do Código do IRC, constitui, ad minus, uma restrição ilegítima aos demais meios de prova, mormente a prova testemunhal, perante a proibição constitucional de presunções legais absolutas derivada do princípio da capacidade contributiva (cfr. artigo 104º da Constituição da República Portuguesa e artigo 73º da Lei Geral Tributária).

OOO. Não obstante, desconhecendo se o atual sócio-gerente A... apresentou ou não o Requerimento do procedimento do artigo 139º (ex-artigo 129º do Código do IRC) e atento o seu desaparecimento, o ora Recorrido estava impedido de o desencadear uma vez que o procedimento exige a autorização de acesso à informação bancária da sociedade e dos gerentes.

PPP. Sendo que o ora Recorrido já não era gerente da I..., por ter renunciado ao exercício da gerência em 10/04/2008- provado documentalmente nos autos e assente na Fundamentação de Facto da mui douta Sentença (cfr. Alínea C. - ponto III, 3.1.) - faltando-lhe assim, os poderes de representação legal (cfr. artigo 252º do CSC) e, por inerência, a legitimidade procedimental para desencadear o procedimento de demonstração do preço efetivo de alienação das frações autónomas.

QQQ. Assim, ainda que se conceba que o procedimento do artigo 139º do CIRC é o único meio de prova admissível estava o ora Recorrido impedido de a ele recorrer tratando-se na verdade de um meio de prova impossível, estando fora do seu controlo e domínio.

RRR. E, sempre se diga que face ainda aos Princípios da Tributação do Lucro Real e da Proporcionalidade (cfr. artigo 104º, n°2, da Constituição da República Portuguesa), os preços pagos nas transmissões das frações autónomas deveriam prevalecer para efeitos de determinação do lucro sujeito a IRC da I....

SSS. Acresce que, não podendo fazer prova do valor real da venda, nem essa prova sendo admissível segundo a Autoridade Tributária, também não pode ser imputada responsabilidade ao responsável subsidiário por uma dívida apurada pela Autoridade Tributária por via presuntiva quanto ao devedor principal.

III. Ao nível dos custos, a Autoridade Tributária no Relatório de Inspeção desconsiderou o montante de €1.352.222,45 ao nível dos custos contabilizados na conta 6121 referente às mercadorias vendidas e matérias consumidas, por entender que se encontrava suportado por documento interno recusando que fosse aí considerado o VPT das frações alienadas pela I... dado que as mesmas vinham sendo alegadamente valorizadas segundo o seu custo histórico.

UUU. Ora, sem desatender que, em matéria de IRC, a Doutrina e a Jurisprudência são unânimes em admitir o recurso à substituição ou a meios complementares de prova, mormente a testemunhal, para a justificação do custo suportado, a Autoridade Tributária não tem razão em recusar a submissão da Declaração Periódica Modelo 22 do IRC que contabilizou os custos das frações pelos seus VPTs nos termos em que estava preparada.

VVV. Retomando o que já se havia alegado, o Empreendimento da Areia teve origem num prédio rústico adquirido pela I... que, após o respetivo loteamento e divisão em propriedade horizontal, resultou num conjunto de frações autónomas sendo que na passagem de rústico para urbano, ao referido prédio foi atribuído o valor de €1.703.000 conforme Escritura Pública de Constituição de Propriedade Horizontal (cfr. cit. Doc.18 junto à Oposição Judicial).

WWW. Porém, a contabilidade da I... foi confrontada com a parca possibilidade de conseguir computar todos os custos de aquisição/produção associados às referidas frações autónomas, classificadas na classe 3 "inventários e ativos biológicos" (i.e., "existências" no POC), conforme resulta do Relatório de inspeção Tributária junto aos autos.

XXX. Primus, pela dificuldade em atribuir às respetivas frações autónomas um "valor de aquisição/produção", por resultarem precisamente de uma operação de loteamento e subsequente divisão em propriedade horizontal.

YYY. Secundus, por faltar muita informação nas contas da I..., por culpa da construtora B... e do sócio-gerente A..., conforme demonstrado supra e dado que a contabilidade estava a cargo de S... que tratava também da contabilidade da construtora B... (cit. cit. Doc. 13 junto à Oposição Judicial).

ZZZ. Neste contexto, a atual contabilidade considerou os VPT's atribuídos às frações autónomas como demonstração material e mais fiel dos seus custos de aquisição/produção, os quais estão na verdade ínsitos na determinação do respetivo cálculo dos VPTs porquanto o VPT traduz, o mais fielmente possível, o real valor patrimonial das frações à luz dos princípios da capacidade contributiva e da igualdade (artigo 104º, n.ºs 2 e 3 da Constituição da República Portuguesa).

AAAA. Por conseguinte, na ausência dos elementos de suporte dos gastos associados ao loteamento do Empreendimento da Areia, cabia à Autoridade Tributária aceitar como valorimetria das existências a aplicação do critério legal do VPT determinado à data, ou, ad minus, o recurso a avaliação indireta e aos rácios de margem/rentabilidade para o sector em causa (artigo 88º da LGT e artigo 59º do Código do IRC).

BBBB. E sendo aplicável o artigo 26º, nº1, alínea b) do Código do IRC o VPT é determinado precisamente com recurso a custos padrões (vide, v.g., o coeficiente de localização).

CCCC. Aqui chegados, ainda que se admita que as sobreditas frações autónomas foram valorizadas pelo seu custo de aquisição/produção nos termos do disposto no artigo 26º, nºl, alínea a) do Código do IRC e embora a lei seja recalcitrante no que respeita à mudança do método de valorimetria adotado (cfr. artigo 27º, nº1 do Código do IRC) certo é que, essa mudança é admitida sempre que se justifique por razões de natureza económica ou técnica, sem prejuízo da sua aceitação pela Autoridade Tributária, o que se verifica (cfr. artigo 27º, n.º2 do Código do IRC).

DDDD. Esta solução corresponde também à aplicável em sede de IRS, embora aí por via legal e não por via interpretativa/integradora do artigo 46º, nº3 do Código do IRS (versão à data) prevalecendo o VPT como custo de aquisição sempre que for superior aos custos devidamente comprovados.

EEEE. Destarte, seja diretamente, seja por analogia, seja por recurso à «norma que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema» (artigo 11º da LGT e artigos 9º, nº l e 10º, nº3 do CC), deve ser considerado o VPT como custo de aquisição.

FFFF. O que se vem de alegar constitui causa de pedir no Processo de Impugnação Judicial nº 87/17.7BELRS que corre termos na 3ª Unidade do Tribunal Tributário de Lisboa não obstante vir nestes autos alegados, concretizando-se também por esta via a inexistência de culpa do ora Recorrido pelo não pagamento do tributo que lhe é imputável nestes autos.

GGGG. Assim, improcedem, em particular, os pontos 19., 21., 25. a 28., 32. a 36., 38. a 40. e as Conclusões XI, XIII, XV a XIX das Alegações de Recurso da Representação da Fazenda Pública.

HHHH. E, não havendo prova da culpa na insuficiência do património da devedora originária nem culpa na falta do pagamento da alegada dívida de IRC, imputáveis ao Recorrido nestes autos, verifica-se uma situação de ilegitimidade do Recorrido para a execução, enquadrável no artigo 204º, nº1, alínea b) do CPPT pelo que deve ser negado provimento ao Recurso da Representação da Fazenda Pública e manter-se na ordem jurídica a mui douta Sentença recorrida que não merece qualquer juízo de censura.

SUBSIDIARIAMENTE.

PEDIDO DE AMPLIAÇÃO DO ÂMBITO DO RECURSO

IIII. Caso este Venerando Tribunal conceda provimento ao Recurso da Representação da Fazenda Pública, o que se admite por estrito dever de patrocínio, requer-se subsidiariamente a ampliação do objeto do Recurso Jurisdicional nos termos do artigo 636º do CPC, aplicável ex vi do artigo 2º, alínea e) do CPPT em particular, quanto ao fundamento da ilegitimidade baseada na não gerência de facto em que o então Oponente, ora Recorrido, decaiu, atenta a Fundamentação de Direito (ponto 3.2.) da mui douta Sentença, prevenindo assim a necessidade da sua apreciação.

JJJJ. Com efeito, pode ler-se na douta Sentença sob recurso: "Ou seja, não basta à AT alegar (ou provar) que, ao longo do exercício a que se reporta a dívida em causa nos autos (2008), o Oponente, apesar da renúncia às funções de gerente, continuou a exercer - de facto - o cargo para o qual foi nomeado, como resulta da matéria de facto alegada nos arts.31.º a 36.º da contestação da Fazendo Pública ou no despacho que ordenou a reversão."

KKKK. Assim, atenta a pluralidade de fundamentos de defesa, é permitido ao ora Recorrido requerer, na respetiva alegação, ainda que subsidiariamente, que este Colendo Tribunal conheça do fundamento em que decaiu, mediante reapreciação da decisão da matéria de facto, o que somente sucederá caso procedam os argumentos invocados no Recurso Jurisdicional admitindo-se também que o ora Recorrido possa arguir a nulidade da Sentença ou impugnar concretos pontos da matéria de facto assente na Sentença, ainda que não impugnados pela Representação da Fazenda Pública (cfr. artigo 636º, nºs l e 2 do CPC) - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº147/08.5BELRA, de 05/06/2019.

LLLL. Deste modo, o Tribunal de recurso pode, no exercício do seu poder de cognição, conduzir à modificabilidade da decisão da matéria de facto assente pelo Tribunal a quo não podendo, no entanto, realizar um novo julgamento (cfr. artigo 662º, nºl do CPC, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, Processo nº 00162/07.6BEPNF, de 12/05/2016 e Aresto do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº159/08.9BECTB, de 14/02/2019.

MMMM. Em causa está o fundamento da ilegitimidade do ora Recorrido, traduzido na não gerência de facto, nos termos já alegados na Oposição Judicial (cfr. artigos 8º, 14º a 20º, 44º a 55º, 93º a 129°) e em sede de Alegações Finais (cfr. artigos 7º a 48º), para as quais se remete integralmente.

NNNN. Atenta a Fundamentação de Facto fixada na douta Sentença, a "Motivação da Decisão de Facto" e a Fundamentação de Direito (cfr. pontos 3.1. e 3.2.), ao julgar provada a gerência de facto do ora Recorrido na I..., a douta Sentença incorre em erro de julgamento quanto à matéria de facto fazendo uma errada valoração da prova documental aportada aos autos que impunha decisão diversa, ou, subsidiariamente, em erro de julgamento por défice instrutório porque o Tribunal a quo não realizou as "diligências de prova susceptíveis de conduzir à fixação de factos capazes de alterar a decisão de direito" - cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº1054/18.9B...NT, de 28/02/2019.

OOOO. Quanto ao erro de julgamento da matéria de facto por errada valoração da prova documental, importa ressalvar que bem andou a Sentença do Tribunal a quo em reconhecer a renúncia do ora Recorrido à gerência da I..., em 10/04/2008 (cfr. Alínea C. da Fundamentação de Facto - ponto 3.1. da douta Sentença), facto que não vem aliás impugnado, em lado nenhum, pela Representação da Fazenda Pública.

PPPP. Ademais, como já alegado, o registo comercial não é constitutivo tendo outrossim efeito meramente declarativo (cfr. artigo 3º, nºl, alínea m) do CRC em conjugação com o artigo 12º, alínea b) do Regulamento do Registo Comercial) - cfr. Pº C.Co.53/2010 SJC-CT.

QQQQ. E sempre se diga que da gerência de direito não se presume a gerência de facto (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, Processo nº159/08.9BECTB, de 14/02/2019).

RRRR. Acresce que o Tribunal a quo também não merece censura ao fixar a Alínea J. da Fundamentação de Facto da mui douta Sentença por estar provado por documento (cfr. cit. Docs. 9,10,11 e 12 juntos à Oposição Judicial) que durante o ano de 2008 o ora Recorrido esteve entre a vida e a morte, devido a um Linfoma de Burkitt que lhe foi diagnosticado, tendo estado sujeito a agressivos tratamentos e sucessivos internamentos hospitalares em Portugal e no estrangeiro.

SSSS. Retomando o hilo condutor, é factualidade assente que, em 25/02/2008, a Dra. L... confirmou o diagnóstico de cancro, o que deixou o ora Recorrido muito transtornado levando a que realizasse com urgência exames ao tórax no dia seguinte, em 26/02/2008, e ao abdómen no dia 28/02/2008 (cfr. Declaração Médica - cit. Doc. 9 junto à Oposição Judicial).

TTTT. Neste contexto, o ora Recorrido não tem em verdade presente o momento nem a assinatura da Escritura Pública, datada de 27/02/2008, constante dos autos, organizada pelo sócio-gerente A..., tendo executado tudo quanto este último lhe pedira e a tê-lo feito foi em situação de incapacidade acidental em condições psíquicas que não lhe permitiam entender e querer aquele ato (cfr. artigo 257º, nºl do CC).

UUUU. Neste contexto, impugna-se em concreto o facto vertido na Alínea B. da Fundamentação de Facto da Decisão recorrida nos termos do artigo 636º, nº2 do CPC.

VVVV. Na sequência, em 18/03/2008, realizadas as investigações adicionais que se revelaram necessárias, foi confirmado pela Dra. M..., médica do Departamento de Biologia e de Patologia Médicas do Instituto Gustdve-Roussy em Villejuif, França, tratar-se de um LINFOMA DE BURKITT (cfr. cit. Doc. 10 junto à Oposição Judicial).

WWWW. Esclarece-se que o LINFOMA DE BURKITT (ou Linfoma Não-Hodgkin) é uma neoplasia maligna, um tumor primário do sistema linfático, altamente agressivo e mortal, que implicou para o ora Recorrido um estado físico muito debilitado também pela toxicidade da quimioterapia e um estado anímico alterado, desesperante e depressivo.

XXXX. Efetivamente, a terapêutica deste cancro é muito agressiva levando a períodos de aplasia tendo ficado o ora Recorrido muito vulnerável a quaisquer agressões que podem tornar-se fatais uma vez que os tratamentos causam um elevado nível de toxicidade no sangue e outros efeitos secundários que se prendem com uma grande debilidade física e psíquica, com perda de peso, fadiga muscular e raciocínio afetado, associado a um elevado risco de infeção e de morte.

YYYY. Assim, esteve o ora Recorrido entre exames, tratamentos e internamentos em períodos intermitentes que se sucederam ao longo de 10 meses em 2008 no hospital de P..., em França, entre março e dezembro de 2008, tendo aí sido acompanhado pelo Doutor D... quer ainda, das poucas vezes que se deslocou a Portugal, no hospital C..., entre 17/05/2008 e 28/05/2008 e entre 20/07/2008 e 24/07/2008, como foi atestado (cfr. cit. Docs. 11 e 12 junto à Oposição Judicial).

ZZZZ. Neste particular, impugna-se especificamente nos termos do artigo 636º, nº 2 do CPC o facto vertido na Alínea D. da factualidade assente na Decisão recorrida.

AAAAA. Com efeito, o ora Recorrido não reconhece a mencionada assinatura como sendo sua, reiterando, com relevância nesta sede, que na data em que alegadamente assinou aquele documento (ergo, 23/05/2008) o ora Recorrido estava internado no Hospital C... desde o dia 17/05/2008 tendo aí permanecido até ao dia 28/05/2008 por Neutropénia febril a realizar tratamentos de quimioterapia muito violentos que recebia através de injeções na medula óssea conforme resulta provado nos autos (cfr. cit. Doc. 12 junto à Oposição Judicial) pelo que não pode ter assinado o sobredito documento, em Cascais conforme vem aí aposto, não tendo tão pouco presente o momento em que o teria assinado atento o seu internamento.

BBBBB. Acresce ainda que o nome que vem aí assinado é "W..." não correspondendo ao nome do ora Recorrido "W..." resultando bem distinta da assinatura constante, designadamente, da Procuração Forense, por ele efetivamente assinada, constante dos autos.

CCCCC. Neste contexto, o ora Recorrido impugna também expressamente os factos vertidos nas Alíneas E., G. e H. da factualidade assente na mui douta Sentença.

DDDDD. Efetivamente, o ora Recorrido não reconhece, como sendo suas, as assinaturas apostas nos referidos cheques bancários constantes dos autos, não podendo ter assinado os mesmos em razão dos seus internamentos e tratamentos devido ao cancro conforme resulta provado nos autos (cfr. cit. Docs. 9, 10, 11 e 12 juntos à Oposição Judicial).

EEEEE. Finalmente, quanto à alegada reexpedição de correspondência, o ora Recorrido impugna igualmente os factos vertidos nas Alíneas F. e L. porquanto foi o sócio-gerente A... que solicitou que a correspondência seguisse para a Rua D..., Estoril dado que estava na iminência de se deslocalizar para o Centro Empresarial da Beloura onde efetivamente veio a fixar o seu escritório - a qual corresponde à sede social da M... Lda. da qual o ora Recorrido é sócio a par com L..., co-executado e Oponente no processo de execução fiscal nº32472....

FFFFF. Sendo ainda certo que o escritório do sócio-gerente A... localizava-se, bem próximo, na Rua H... 2675 S. Pedro do Estoril para onde foi, tanto quanto se sabe, enviada a aprovação do financiamento do B... - cfr. cit. Docs. 4 e 7 juntos à Oposição Judicial.

GGGGG. Em conclusão, está positivamente provado que o ora Recorrido não exerceu a gerência de facto tendo, na verdade, permanecido em observação no ano de 2008 e 2009 pois o tratamento médico e hospitalar implicou diversos riscos, avultando o desenvolvimento de outros cancros tendo a sua convalescença sido lenta e difícil, mercê do tipo de cancro e da sua idade avançada.

HHHHH. O ora Recorrido não teve pois condições físicas e psíquicas para exercer de facto a gerência, nem o fez, nos moldes imputados atentas as suas funções na I....

IIII. O ora Recorrido é reconhecido Arquitecto há mais de 40 anos, com Obra feita distinguida nacional e internacionalmente (cfr. cit. Doc. 2 junto à Oposição Judicial) sendo responsável na I... pela parte técnica (arquitectónica), designadamente pelos projectos arquitectónicos e licenciamentos urbanísticos, tendo colaborado na preparação, prossecução e acompanhamento do já designado Empreendimento da Areia, nessa mesmíssima qualidade de Arquitecto, ao passo que a gestão administrativa e financeira da I... estava a cargo do atual sócio-gerente A..., enquanto promotor imobiliário, tratando diretamente dos assuntos relacionados com a tesouraria, contabilidade, fornecedores, clientes, bancos e entidades públicas.

JJJJJ. O que se vem de alegar é factualidade assente no Processo nº07028/13 deste Venerando Tribunal (cfr. cit. Doc. 3 junto à Oposição Judicial, ponto 21 de fls. 21): "21) A sociedade I... Lda., era, ao tempo, gerida per A... no que respeita à parte administrativa e pelos Oponentes (Arquitetos) no que se refere ò parte técnica (arquitectónica) - cfr. prova testemunhal." - à luz do princípio da eficácia extraprocessual das provas (cfr. artigo 421º do CPC).

KKKKK. O que se vem de invocar resulta também da prova documental (cfr. mormente cit. Docs. 6. 7 e 8 juntos á Oposição Judicial), mormente quanto à solicitação da prorrogação do empréstimo do Empreendimento da Areia em carta enviada ao B... na sequência do pedido de reforço do empréstimo em mais €498.000,00 para a B... pela primitiva sócia-gerente P... e pelo atual sócio-gerente A....

LLLLL. Atento todo o exposto, por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, deve aditar-se ao probatório (cfr. artigo 662º, nº1 do CPC, subsidiariamente aplicável ex vi do artigo 2º, alínea e) do CPPT), a seguinte factualidade:
“R. A I... celebrou, em 09/11/2001, um contrato de Empreitada de Construção Civil para a execução e conclusão, até 15/05/2003, do "Condomínio R..." na Areia em Cascais, com a construtora B... - provado por documento (cfr. Contrato de Empreitada - em particular, ponto 3.1 da Cláusula Terceira do Doc. 6 junto à Oposição Judicial);
S. A B... tinha como administradores M..., A... e P... - provado por documento (cfr. Doc. 15 junto à Oposição Judicial);
T. O preço globalmente acordado pela Empreitada de construção do Empreendimento da Areia cifrou-se em €1.860.000, aí se incluindo a dação em pagamento da fração autónoma a construir (letra H) - provado por documento (cfr. Doc. 6 junto à Oposição Judicial);
U. O valor total do empréstimo originariamente obtido no Banco B... cifrou-se em €1.246.994.74 sendo que a obtenção dos distrates da hipoteca era condição contratual obrigatória do financiamento em cada venda de imóveis - provado por documento (cfr. Doc. 4 junto à Oposição Judicial);
V. Em 04/11/2003, a I... reforçou o financiamento em mais €498.000,00 para a B... concluir a obra - provado por documento (cfr. Doc. 7 junto à Oposição Judicial);
W. Em 20/08/2007, P... e A... enviaram ao B... pedido de prorrogação do prazo do financiamento- provado por documento (cfr. Doe. 8 - Oposição Judicial).
X. As vendas das frações autónomas ocorreram mais tarde do que o contratualizado no financiamento, durante a pública e notória crise do imobiliário, por um montante inferior ao próprio Valor Patrimonial Tributário e com uma diferença total para menos de €478.185,16 - provado por documento (cfr. pág. 5 do Relatório de Inspeção Tributária);
Y. A sociedade I... Lda., era, ao tempo, gerida per A... no que respeita à parte administrativa e pelos Oponentes (Arquitetos) no que se refere à parte técnica (arquitectónica)- cfr. prova testemunhal. - provado por documento (cfr. Doc. 3 junto à Oposição Judicial, ponto 21 de fls. 21)."

MMMMM. Tudo visto, o ora Recorrido é efetivamente parte ilegítima no processo de execução fiscal não podendo contra ele reverter a alegada dívida subjacente aos autos.

NNNNN. Destarte, atento o acima exposto, a mui douta Sentença do Tribunal a quo é nula por contradição dos fundamentos de facto da Decisão consubstanciada na incompatibilidade entre os factos vertidos nas Alíneas B., D., E., F., G., H. e I. por confronto com a Alínea J. do respetivo probatório, concretamente, por, provado que "Durante o ano de 2008, o Oponente esteve sujeito a diversos internamentos, dentro e fora do País, por lhe ter sido diagnosticado um Linfoma de Burkitt - provado por documento, a fls. 125 verso do PEF apenso;" (cfr. Alínea J. da Fundamentação de Facto da mui douta Sentença), o Tribunal a quo julgar a final que, ao longo do exercício a que se reporta a dívida em causa nos autos (2008), o Oponente, apesar da renúncia às funções de gerente, continuou a exercer - de facto - o cargo para o qual foi nomeado, como resulta da matéria de facto alegada nos arts.31º a 36º- da contestação da Fazenda Pública ou no despacho que ordenou a reversão.", correspondente aos factos vertidos nas Alíneas B., D., E., F., G., H. e I. da factualidade assente na mui douta Sentença, o que se argui sem prejuízo do conhecimento oficioso deste Colendo Tribunal, nos termos do artigo 636º, nº2 e 662º, nºs l e/ou 2, alínea c) do CPC, subsidiariamente aplicáveis por via do artigo 2º, alínea e) do CPPT.

OOOOO. Ad minus, caso assim não se entenda, deve ser revogada a mui douta Sentença por incorrer em erro de julgamento da matéria de facto por dar por provados os quesitos das Alíneas B., D., E., G., H., F. I. da Fundamentação de Facto (ponto 3.1.) por errada valoração na ilação que deles extraiu para sustentar a gerência de facto incorrendo também em errada valoração da prova documental (cfr. cit. Docs. 9,10,11 e 12 juntos à Oposição Judicial) devendo, reapreciada a prova por este Colendo Tribunal, alterar-se o probatório de facto e a fundamentação de direito assente na Sentença do Tribunal a quo reconhecendo-se a não gerência de facto do ora Recorrido mantendo-se, contudo, o sentido decisório de procedência da Oposição Judicial, o que se invoca nos termos do artigo 636º, nº2 do CPC e 662º, nºs l e/ou 2, alínea c) do CPC, subsidiariamente aplicáveis por via do artigo 2º, alínea e) do CPPT.

PPPPP. Subsidiariamente, alega-se ainda, quanto ao erro de julgamento da matéria de facto por défice instrutório, em obediência ao princípio do inquisitório, que enferma o processo tributário, com consagração legal no artigos 13º, nº l e 114º do CPPT bem como no artigo 411º do CPC, subsidiariamente aplicável, incumbe ao Meritíssimo Juiz realizar ou ordenar todas as diligências necessárias e consideradas úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos que lhes seja lícito conhecer.

QQQQQ. Dos preceitos em referência decorre que o Juiz tem a iniciativa da prova, podendo e devendo assim determinar a realização de todas as diligências de prova em direito permitidas - cfr. Aresto do Supremo Tribunal Administrativo, Processo nº0388/13, de 23/10/2013.

RRRRR. Ora, estando impugnadas todas as referências nos autos relativas à gerência de facto do ora Recorrido, onde se incluem os documentos por ele alegadamente assinados, em particular, nos termos dos artigos 117º a 128º da Oposição Judicial bem como dos artigos 21º a 38º das Alegações Finais incumbiria ao Tribunal a quo a realização de todas as diligências de prova necessárias ao integral esclarecimento dos factos para alcançar a verdade material.

SSSSS. Porém, conforme resulta dos autos a fls..., em 09/07/2018, o Tribunal a quo indeferiu, por um lado, a realização da audiência de inquirição de testemunhas, solicitada pelo ora Recorrido, julgando-a dispensável considerando a causa de pedir da Oposição Judicial e os elementos documentais aportados e, por outro lado, a realização da prova pericial, igualmente pedida pelo ora Recorrido, por manifesta desnecessidade (cfr. artigo 13º, nº1 do CPPT).

TTTTT. Ora, sem prejuízo do mérito da convicção do Tribunal a quo formada pela livre apreciação da prova aportada aos autos e segundo as regras da experiência (cfr. artigo 607º, nº5 do CPC) entendendo-se que a realização da prova testemunhal e pericial seriam susceptíveis de conduzir à fixação do probatório do qual resultasse, em concreto, o não exercício da gerência de facto do ora Recorrido e que seria assim capaz de alterar a fundamentação de direito, mantendo-se não obstante a doutamente julgada procedência da Oposição Judicial.

UUUUU. Na falta desses elementos de facto que se julgam indispensáveis à apreciação da não gerência de facto do ora Recorrido constantes dos autos devem os autos baixar a fim de se proceder ao julgamento no Tribunal a quo, o que se invoca também à luz do princípio da impugnação unitária, atento o artigo 636º, nº3 do CPC, o que se deixa à doutíssima consideração deste Venerando Tribunal.

Nestes termos e nos mais de Direito que V/ Exas. doutamente suprirão, deve o Recurso Jurisdicional ser julgado doutamente improcedente mormente confirmando-se a Decisão recorrida que assim se manterá na Ordem Jurídica, ou, caso assim não se entenda, julgar-se procedente o Pedido de Ampliação do Objeto do Recurso, com as necessárias consequências legais, com o que se fará a devida e costumeira

JUSTIÇA!»


*

O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) pronunciou-se no sentido do não provimento do recurso.

*

Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



*

II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A. Em 25.05.2000, foi constituída a sociedade "I..., Sociedade Imobiliária, Lda." (adiante, sociedade devedora originária ou SDO), tendo como sócios e gerentes, o Oponente, C..., A... e P... - provado por documento, a fls. 4 e 5 do PEF apenso;

B. Em 27.02.2008, o Oponente outorgou, na qualidade de gerente da SDO, conjuntamente com A..., escritura de compra e venda, referente à fracção D, do prédio inscrito sob o artigo 1... da freguesia de Cascais - provado por documento, a fls. 275 a 281 dos autos;

C. Em 10.04.2008, o Oponente renunciou à gerência da SDO, tendo essa renúncia sido registada pela ap. 1…, de 06.09.2011 — provado por documento, a fls. 4 e 5 do PEF apenso;

D. Em 23.05.2008, o Oponente assinou, conjuntamente com os dois outros gerentes da SDO, uma confissão de dívida, em seu nome próprio e em representação da sociedade - provado por documento, a fls. 270 dos autos;

E. Em 30.09.2008 e 26.11.2008, o Oponente assinou cheques bancários da SDO, nos montantes de € 8.239,54 e de €11,72, respectivamente, a favor do Instituto de Gestão da Tesouraria do Crédito Público - provado por documentos, a fls. 273 e 272 dos autos;

F. Em Setembro de 2008, o Oponente solicitou a reexpedição de correspondência da Direccão - Geral dos Impostos - Nota de Cobrança do Imposto Municipal de Imóveis, dirigida à SDO, para o seu domicílio pessoal - provado por documento, a fls. 282 dos autos;

G. Em 01.10.2008, o Oponente assinou um cheque bancário da SDO para pagamento de reparações eléctricas efectuadas na sede da devedora originária, no montante de €240,00 -provado por documento, a fls. 274 dos autos;

H. Em 07.11.2008, o Oponente assinou um cheque bancário da SDO, juntamente com o gerente A..., no montante de € 34.000,00, a favor do sócio-gerente A... - provado por documento, a fls. 271 dos autos;

I. Em 08.12.2008, a correspondência do B... dirigida à SDO foi enviada para o domicílio pessoal do Oponente - provado por documento, a fls. 283 dos autos;

J. Durante o ano de 2008, o Oponente esteve sujeito a diversos internamentos, dentro e fora do País, por lhe ter sido diagnosticado um Linfoma de Burkitt - provado por documento, a fls. 125 verso do PEF apenso;

K. Na sequência de acção inspectiva realizada à SDO, respeitante ao exercício de 2008, em 2012, foi emitida uma liquidação adicional de IRC e juros compensatórios, referente a 2008, no valor de €480.919,01, com data limite de pagamento voluntário a 18.09.2012 - provado por documentos, a fls. 21 a 27 e 2 do PEF apenso;

L. Não tendo a dívida referida na alínea antecedente sido objecto de pagamento voluntário, em 17.10.2012, foi autuado no Serviço de Finanças de Lisboa - 2, em nome da SDO, o PEF n°32472..., para sua cobrança coerciva - provado por documento, a fls. 1 e 2 do PEF apenso;

M. Em 14.05.2013, foi elaborada "Informação" no Serviço de Finanças de Lisboa - 2 na qual se afirma, na parte relevante, o seguinte:
"”(…) Por A..., C... e L..., foram praticados actos em nome e representação da sociedade devedora originária no período em que as dívidas se constituíram.
Pelo que se pode concluir que exerceram a gerência efectiva da sociedade no período a que respeita a dívida em causa, o IRC, do ano de 2008, o que se demonstra: (...)''. -provado por documento, fls. 115 e 116 do PEF apenso;

N. Com base na informação referida na alínea antecedente, na mesma data, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 2 proferiu, no âmbito do PEF referido na alínea L. supra, projecto de decisão de reversão contra o Oponente, ao abrigo da alínea a) do n°1 do art.24° da LGT, tendo ordenado a sua notificação para efeitos de audição prévia - provado por documento, a fls. 117 do PEF apenso;

O. Notificado do despacho referido na alínea antecedente, o Oponente exerceu o seu direito de audição prévia, invocando, além do mais, que o único representante legal da SDO era o sócio-gerente A..., e que, em 2008, por razões de doença, renunciou formalmente à gerência da SDO - provado por documento, a fls. 123 a 125 do PEF apenso;

P. Analisando a resposta referida na alínea antecedente, em 25.07.2013, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 2 proferiu despacho de reversão, ao abrigo dos arts.23º e 24º, nº1, alínea a) da LGT, com os seguintes fundamentos:
"(...) terá de se considerar quanto às informações prestadas por C... que:
- o sócio gerente A... não era o único representante legal da I..., Lda. (...);
- após a data da renúncia indicada verificou-se a gerência de facto em distintos momentos;
- para efeitos de apuramento da gerência de facto não se procede à distinção da diferente natureza dos actos de gestão; (...)
- o cumprimento das obrigações fiscais não termina com a submissão/envio da Declaração Mod. 22, tendo a Inspecção Tributária apurado lapsos no preenchimento da referida Declaração, que conduziram ao apuramento de imposto para o ano de 2008. (...).
Pelo que, não trazendo os interessados elementos novos que permitam alterar o sentido do projecto de decisão, deverá o mesmo manter-se. (...)." - provado por documento, a fls. 127 a 129 do PEF apenso;

Q. Através do ofício n°8197, de 26.07.2013, foi remetida ao Oponente citação, por reversão, no âmbito do PEF referido na alínea L. supra, com os fundamentos referidos na alínea antecedente - provado por documento, a fls. 134 e 135 do PEF apenso.


Factos Não Provados

Não há factos que importe registar como não provados.


Motivação da Decisão de Facto

A convicção do Tribunal quanto aos factos considerados provados resultou do exame dos documentos juntos aos autos e PEF apenso, não impugnados, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.»


*

- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

São diversas as questões que nos vêm dirigidas, como ficará claro ao longo na análise que se segue.

Comecemos pela crítica à sentença contida na conclusão I), no sentido de que, ao julgar procedente a oposição à execução deduzida por C..., o TAF dever-se-ia limitar a determinar a extinção da execução fiscal relativamente ao oponente, ora Recorrido, e não, como fez, a “julgar extinta a presente execução fiscal”, pois está “a decorrer outro processo, na 2.ª U.O., do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, outra reversão, sobre o mesmo processo de execução fiscal, em nome de outro Oponente, o Sr. L...”.

Embora, na economia da sentença, se perceba que o TAF decidiu unicamente a oposição deduzida pela C..., com base na sua ilegitimidade, o que inegavelmente conduz à procedência da oposição e à extinção do processo de execução relativamente ao oponente, a verdade é que a expressão usada pela Mma. Juíza – “julgar extinta a presente execução fiscal” – pode prestar--se a equívocos que importa evitar, quanto à abrangência subjectiva da extinção da execução.

De todo o modo, tal precisão linguística será relegada para final, uma vez que, como bem se compreende, poderá até nem se justificar se, porventura, for dada razão à Recorrente, mantendo-se a execução fiscal.

Assim, adiante, retomaremos tal questão, se tal se mostrar ainda necessário.


*

Avançando, entramos na questão de saber se a sentença fez errada apreciação crítica da prova, não valorando adequadamente o circunstancialismo subjacente aos presentes autos e, consequentemente, se errou ao considerar que, in casu, a AT não provou, como lhe competia, nos termos da alínea a), do nº 1 do artigo 24º da LGT, que a insuficiência do património da devedora principal para a satisfação da dívida de IRC de 2008 é imputável ao Oponente.

Vejamos.

Considera a Recorrente que do despacho de reversão, da contestação e do relatório de inspeção se retiram elementos que conduzem ao acerto da sua posição. Enfatiza a Recorrente que a AT “realizou todas as diligências com vista à penhora de bens pertencentes à devedora originária, a fim de salvaguardar os créditos, todavia, não foi conseguido esse intuito”, já que “a devedora originária não possuía prédios, viaturas, contas bancárias (…)”. Por outro lado, realça a celebração de “escritura de compra e venda e Mútuo com Hipoteca celebrada pelo ora Oponente e pelo sócio-gerente A... em representação da sociedade devedora originária”, tendo sido recebidos 470.000 euros, o que corresponde a alienação do património da sociedade que, assim, se tornou insuficiente para responder pelas dívidas fiscais da devedora originária. Para a Recorrente, “a culpa do ora Oponente também é demonstrada com o cuidado no pagamento da totalidade do empréstimo bancário, que não encontra paralelo no cumprimento das obrigações fiscais, mormente o pagamento do IRC resultante da atividade da sociedade”. Para mais, sublinha a Fazenda Pública, “não se encontra demonstrado que o Oponente tivesse erigido esforços no sentido de recuperar os alegados fundos apropriados pela construtora B... - Engenharia e Construção, SA, ou para que fossem ressarcidos do incumprimento generalizado por esta última sociedade das suas obrigações contratuais para com a devedora originária”. A Recorrente põe ainda em evidência que não foi acautelada “a documentação respeitante ao empreendimento, a qual seria de extrema importância, designadamente para apurar o IRC a pagar”. Em suma, daquilo que se trata é de uma “gestão danosa do património da sociedade que se verifica quer através de ações, quer por omissões”. Tudo isto, nas palavras da Recorrente, “deveria o Tribunal a quo ter devidamente considerado e valorado, efetuado uma apreciação crítica”, de modo a concluir pela “responsabilidade, e gestão danosa do Oponente/Recorrido por uso indevido de dinheiros do Estado, cujas verbas tinha a responsabilidade e a obrigação únicas, de entrega nos cofres do Estado enquanto representante, administrador e gerente da sociedade”.

Vejamos, então, o que se nos oferece dizer a este propósito.

Ora, no caso, nenhuma discordância suscita a aplicação do artigo 24º, nº1, alínea a), da LGT, nem quanto ao ónus da prova que, nesta situação, recai sobre a Fazenda Pública, a quem compete a demonstração da culpa do gerente na insuficiência do património da I... para a satisfação das dívidas tributárias.

Como se percebe, o TAF de Sintra considerou que a AT, no caso sub judice, não logrou provar o que lhe competia na reversão operada e, como tal, considerou a ilegitimidade do revertido/oponente, extinguindo a execução fiscal.

Com efeito, lê-se na decisão recorrida, além do mais, que:

“(…)

De acordo com esse regime de responsabilidade, cabia à AT, nos termos previstos no art. 74.º, n.º 1 da LGT e, em geral, do n.º 1 do art. 342.º do Código Civil, alegar – e demonstrar – que foi por culpa da Oponente que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação das dívidas em causa.

Ou seja, não basta à AT alegar (ou provar) que, ao longo do exercício a que se reporta a dívida em causa nos autos (2008), o Oponente, apesar da renúncia às funções de gerente, continuou a exercer – de facto – o cargo para o qual foi nomeado, como resulta da matéria de facto alegada nos arts. 31.º a 36.º da contestação da Fazenda Pública ou no despacho que ordenou a reversão.

A lei exige mais. Não operando, neste caso, a presunção de culpa, que resulta apenas do regime previsto na alínea b) do referido art. 24.º, n.º 1 da LGT, porquanto na data de pagamento o Oponente já não tinha a seu cargo a responsabilidade pela gestão corrente da sociedade, nem capacidade de dispor dos seus bens, competia ao órgão de execução fiscal alegar – mas também demonstrar – factos que revelassem que o Oponente teve uma actuação culposa e que foi a sua conduta que determinou (nexo de causalidade) a diminuição patrimonial da devedora originária – prova essa que não foi feita nos presentes autos.

A esse respeito, a jurisprudência tem sido clara no sentido de exigir à AT a prova dos pressupostos legais em que assenta a decisão de reversão (cfr., entre outros, o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, processo n.º 282/11.2BEALM, de 08.03.2018, disponível em www.dgsi.pt).

Desta forma, nada sendo invocado, na decisão que ordenou a reversão, ou nos elementos preparatórios desta, sobre a imputação da responsabilidade ao Oponente pela situação de insuficiência patrimonial da devedora originária, o que implicaria, neste caso, repete-se, que fossem alegados – e demonstrados – factos precisos reveladores de uma actuação descuidada ou danosa por parte do Oponente e que foi essa sua conduta que determinou a situação insuficiência patrimonial da devedora originária, à luz do regime previsto na alínea a) do n.º 1 do art. 24.º da LGT, nem tendo essa prova sido feita nos presentes autos pelos elementos carreados pela Fazenda Pública, não é possível acolher a pretensão da AT no sentido de considerar verificados os pressupostos legais da responsabilidade subsidiária do Oponente”.

Tenhamos presente, então, o disposto no nº 1 do artigo 24º da LGT, respeitante à responsabilidade dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos:

1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.

Temos, assim, que o transcrito artigo 24º da LGT distingue duas diferentes situações:

- a primeira correspondente à alínea a), e refere-se à “responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções quer no momento de ocorrência do fato tributário, quer após este momento, mas antes do término do prazo de pagamento da dívida tributária, sendo esta responsabilidade pelo depauperamento do património social, de molde a torna-lo insuficiente para responder pelas dívidas em causa. A culpa exigida aos gerentes ou administradores, nesta situação, é uma culpa efectiva - culpa por o património da sociedade se ter tornado insuficiente. Não há qualquer presunção de culpa, o que nos remete para o disposto no artigo 74.º, n.º 1, da LGT, pelo que cabe à AT alegar e provar a culpa dos gerentes ou administradores” – cfr. acórdão do TCA Sul, de 24/11/16, processo nº 9780/16;

- a segunda, tal como consta da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º, da LGT, refere-se à responsabilidade dos gerentes ou administradores em funções no período no qual ocorre o fim do prazo de pagamento ou entrega do montante correspondente à divida tributária. No artigo 24.º, n.º1, al. b), da LGT já se presume que a falta de pagamento da obrigação é imputável ao gestor.

Ora, no caso, e como não sofre dúvidas, é aplicável a alínea a) do nº 1 do referido artigo 24º da LGT, sabido que o Oponente, Recorrido, já não era gerente da sociedade executada originária na data limite de pagamento voluntário da dívida aqui em cobrança coerciva. Foi com base nesta alínea do nº1 do artigo 24º da LGT que se efectivou a reversão contra o C....

Nesta conformidade, e como bem assinalou a sentença, para a efectivação da responsabilidade subsidiária do revertido não pode deixar de resultar provada a sua culpa na insuficiência do património da pessoa colectiva para a satisfação das dívidas tributárias, sendo que o ónus da prova cabe à Fazenda Pública.

Se atentarmos na matéria de facto, em concreto no despacho de reversão (e, bem assim, nos elementos que o precederem) resulta claro que a Administração Tributária não alegou factualidade donde pudesse resultar a evidenciação de actuações ou omissões ilícitas por parte do oponente, causadoras da insuficiência do património societário para satisfação dos créditos tributários em questão. Na verdade, a Administração nada disse a esse propósito, nenhum facto concreto alegou susceptível de demonstrar a culpa do Recorrido, o que passaria pela alegação de factos-índice de uma gestão danosa do património da sociedade originariamente devedora.

Vejamos.

Lido atentamente o longo despacho de reversão, e no que ao Recorrido respeita, o que temos é que a AT aí se esforça para demostrar, não apenas o exercício da gerência da devedora originária, mas também a insuficiência do património da mesma.

Quanto a estes dois pressupostos da responsabilidade subsidiária, contudo, não se suscita qualquer controvérsia neste recurso jurisdicional, correspondendo esses aspectos a questões que não são controvertidas. Aliás, a insistência da Recorrente quanto à gerência de facto e à insuficiência dos bens da I... é, para os presentes efeitos, absolutamente irrelevante, pois não é isso que aqui importa demonstrar.

Não se desconsidera que a Recorrente põe especial enfoque no RIT, elaborado em 2012, no qual foi apurado o IRC em falta, respeitante ao exercício de 2008. Trata-se de um circunstancialismo a que o despacho de reversão faz referência circunstanciada e ao qual a Fazenda Pública atribui peso significativo na defesa da sua tese. Sem razão, porém, como se verá.

É que do apontado relatório, e até ao momento em que foi proferido o despacho de reversão, a AT nenhuma ilação retirou de tal fiscalização, a não ser que da mesma tinham resultado as correcções que derem origem à liquidação subjacente à dívida exequenda (IRC de 2008). Ora, como bem se percebe, e contrariamente ao que pretende a Fazenda Pública, uma coisa são os pressupostos de facto e de direito (vertidos no relatório de inspecção) que legitimam a liquidação adicional do IRC, apurado com respeito à I...; outra coisa é a demonstração da culpa de cada um dos revertidos (em concreto do Oponente/ Recorrido) na insuficiência do património da devedora originária no que toca à satisfação das dívidas da devedora originária. Dito de outro modo: ainda que sejam legais as correcções efectuadas ao imposto e a consequente liquidação adicional de IRC, daí não decorre a legitimidade do gerente/ revertidos, pois os pressupostos de ambas as pretensões da AT são diferentes.

Com efeito – repete-se – com vista à aplicação do disposto no artigo 24º, nº1, alínea a), da LGT, impunha-se que a AT tivesse alegado e demonstrado, relativamente ao revertido, factos ilícitos e culposos que traduzam a violação de regras destinadas a proteger os credores da sociedade, sendo disso exemplo, a utilização de crédito contrária aos interesses da empresa, a disposição de bens da devedora originária em proveito próprio dos gerentes, a danificação/ ocultação de património societário. Claramente, nada disto vem feito.

Não se desconsidera que a Recorrente chama à colação a venda, por parte da devedora originária, representada, além do mais, pelo Recorrido, de uma fracção autónoma por 470.000,00, valor este que consta ter sido pago à vendedora, como correspondendo a circunstancialismo demostrativo da actuação ilícita (do C...) na diminuição do património da originária devedora. Será que assim é? Que tal pode ser valorado nesses termos? Entendemos que não, sabido que se tratou de uma venda de um imóvel em 2008 (ou seja, quatro anos antes do apuramento da dívida de IRC), inserida plenamente no objecto social da devedora originária (uma sociedade imobiliária), sem que haja o menor indício de que o valor da venda tenha sido desviado para proveito de outros que não a sociedade (designadamente dos sócios). De resto, o facto de o valor em causa ter sido canalizado para solver um crédito bancário da devedora originária anteriormente contraído, em nada belisca esta constatação.

No caso - repete-se- a Administração Tributária não alegou e comprovou qualquer facto concreto susceptível de demonstrar a culpa do oponente, através da revelação de factos-índice de uma gestão danosa do património da sociedade originariamente devedora.

Diga-se, ainda, que as asserções contidas nas conclusões XI) e XII), jamais foram invocadas em sede de reversão (e, como tal, demonstradas), sendo para nós claro – insista-se –que tal alegação e prova competia à AT e não, como que numa pretensa inversão do ónus da prova, ao revertido, aqui Recorrido.

E, assim sendo, como bem decidiu o Mma. Juiza a quo, a reversão operada, desacompanhada da prova da culpa do oponente pela insuficiência do património da sociedade para satisfazer as dívidas fiscais da devedora originária, basta, por si só, para considerar verificado o fundamento de oposição à execução fiscal invocado – a alínea b) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, isto é, a ilegitimidade da pessoa citada – e, consequentemente para julgar procedente a oposição deduzida.

Assim se concluindo, na linha da sentença do TAF de Sintra, isso reconduz-nos à última questão suscitada pela Fazenda Pública, sabido que a mesma entende que foi violado o princípio do inquisitório, previsto nos artigos 99º da LGT e 13º do CPPT.

Com efeito, para a Recorrente, perante incertezas, o tribunal deveria ter promovido a “junção aos autos de novos, adicionais e esclarecedores, seja pela Fazenda Pública, seja pelos serviços da AT, fosse, ainda, pelo Oponente”, assim cumprindo o poder-dever do Juiz a quo no sentido da realização e promoção de diligências ou actos úteis ao apuramento da verdade. De resto, evidencia a Fazenda Pública, o TAF “julgou dispensável a prova testemunhal por despacho judicial de 09/07/2018”.

Para mais fácil compreensão daquilo que está em causa, tenhamos presente o teor do apontado despacho, no qual se lê, além do mais, o seguinte:

“Requerimento de prova do Oponente:

Nos presentes autos, vem o Oponente arrolar dez testemunhas.

Decorre, no entanto, do disposto no art. 13.º, n.º 1 do CPPT, que apenas devem ser realizadas as diligências úteis ao apuramento da verdade relativamente aos factos de que cumpra conhecer.

Considerando a causa de pedir da presente oposição e os elementos documentais juntos aos autos, julgo dispensável a produção de prova testemunhal.

Notifique.


*

Da prova pericial:

O Oponente vem requerer igualmente, nos termos do art. 475.º do CPC, que seja ordenada a realização de perícia para exame da assinatura aposta nos documentos constantes de fls. 20 a 23 e 25 dos autos.

Constata-se, porém, que os referidos documentos não se encontram identificados, nem se encontra devidamente concretizado o objecto da perícia, sendo que a impugnação de genuinidade de documento se encontra regulamentada no art. 444.º do CPC.

Não obstante, considerando o disposto no art. 13.º, n.º 1 do CPPT, anteriormente citado, indefere-se, por manifesta desnecessidade, a prova pericial requerida.

(…)”

Refira-se, ainda, que tal despacho, notificado às partes, não foi contestado, tendo a Fazenda Pública, em sede de alegações pré-sentenciais, considerado o seguinte: “Para efeitos de apreciação do pedido da oposição, considera-se conterem os autos os elementos de prova e as informações oficiais que, por fundamentarem a presente oposição, se entendem como suficientes para a boa decisão da causa. (…) Não houve lugar ao procedimento de inquirição de testemunhas, pelo que, encerrada a fase de instrução dos autos e não se vislumbrando nenhum facto ou circunstância susceptível de alterar o posicionamento assumido pela Autoridade Tributária, pugna-se pela improcedência da presente oposição, reiterando-se o entendimento já defendido em sede de contestação.”

Tendo isto presente, avancemos, para dizer que efectivamente no processo judicial tributário vigora o princípio do inquisitório (cfr. artigos 99° da LGT e 13° do CPPT), o que significa que o juiz não só pode, como também deve, ordenar ou realizar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade.

Este princípio e dever que o Juiz deve observar não serve, porém, para colmatar a inércia ou falta de diligência das partes, como aqui patentemente aconteceu, sob pena de o juiz se substituir às partes no cumprimento daquilo que a lei lhes impõe, imprimindo ao processo um cariz absolutamente paternalista que entendemos que o mesmo não deve assumir.

No caso, a Mma. Juíza considerou, face à causa de pedir e aos elementos de prova existentes, pressupondo evidentemente o ónus de prova que impende sobre cada parte envolvida, que não se afigurava útil a produção da prova testemunhal arrolada única e exclusivamente pelo Opoente, C... W....

Temos, pois, que a Fazenda Pública não requereu qualquer diligência de prova, razão pela qual nenhuma possibilidade de demonstração da sua posição lhe foi negada pelo Tribunal, nem tão-pouco, como decorre da sentença e da análise que aqui fizemos seguidamente, o Tribunal ficou numa situação de “eventuais incertezas” que importasse dissipar.

Na verdade, o que para nós resulta claro ao longo da apreciação que fizemos da questão antecedente, é que, aquilo a que a Recorrente denomina de “eventuais incertezas” mais não traduz que o resultado do funcionamento das regras legais do ónus da prova, concretamente quanto à alínea a) do nº 1 do artigo 24º da LGT, ónus esse que, impendendo sobre a Fazenda Pública (quanto à culpa na diminuição do património da devedora originária), não foi, pura e simplesmente, cumprido.

Mas – repete-se a ideia – tal falta corresponde a uma inércia de oportuna alegação e prova que, em nossa opinião, não competia ao TAF colmatar, sendo de afastar, conforme pretendido, uma interpretação do princípio do inquisitório com a amplitude e abrangência que a Recorrente pretende, com a qual não concordamos.

Em suma, e em nosso entendimento, como a sentença concluiu e já o dissemos, todo o circunstancialismo trazido aos autos é notoriamente insuficiente para permitir a conclusão de que é imputável ao Oponente a insuficiência do património da I... para satisfazer a dívida exequenda, nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 24º da LGT, demonstração esta que, sem hesitações, competia à Fazenda Pública ter feito e não fez.

Improcede, pois, esta última questão.

Nesta conformidade, improcedem a totalidade das conclusões, o que equivale a negar provimento ao presente recurso jurisdicional.

Uma palavra final para, retomando a questão por nós abordada inicialmente quanto ao segmento decisório, deixar esclarecido que a extinção da execução fiscal respeita apenas ao Oponente, ora Recorrido, o que, de resto, já resultava da economia da sentença.

Assim, rectifica-se o segmento decisório e onde se lê “julgar extinta a execução fiscal”, deve passar a ler-se “julgar extinta a execução fiscal quanto ao oponente”.


*




III – Decisão

Termos em que, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida, sem prejuízo da rectificação do teor do segmento decisório da sentença, tal como ficou esclarecido no parágrafo antecedente.


Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 29/04/21

[A Relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão as restantes Desembargadoras integrantes da formação de julgamento, as Senhoras Desembargadoras Hélia Gameiro e Ana Cristina Carvalho]



Catarina Almeida e Sousa