Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1299/10.0PBVIS-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ALEXANDRA GUINÉ
Descritores: PERDÃO
ÂMBITO DE APLICAÇÃO
IDADE
Data do Acordão: 04/10/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: VISEU (JUÍZO LOCAL CRIMINAL DE VISEU – J2)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: REVOGADA
Legislação Nacional: ART. 2º, N.º 1, DA LEI N.º 38-A/2023, DE 2.8
Sumário: O perdão previsto Lei n.º 38-A/2023 aplica-se a quem tenha entre 16 e 30 anos de idade à data dos factos, considerando-se como último dia abrangido pelo perdão aquele em que o agente completa 30 anos (as 23h59m e 59ss desse dia).
Decisão Texto Integral: ***

 Acordam, em conferência, na 5.º Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra


I. RELATÓRIO

Nos autos de abreviado n.º 1299/10.... do Juízo Local Criminal de Viseu – Juiz ..., em que é arguido AA, foi proferido despacho, em 16.10.2024, atento o disposto nos artigos 2.º, 3.º, 7.º, a contrario, e 8.º da Lei n.º38-A/2023, de 2 Agosto – publicada a 2 de Agosto de 2023 – e com entrada em vigor a 1 de Setembro de 2023, estando verificados os pressupostos previstos no aludido diploma, foi declarada perdoada 1 ano da pena de prisão aplicada, sendo o perdão causa de extinção da pena, nos termos previstos no artigo 127.º, n.º3 do Código Penal.

Inconformado, recorreu o Ministério Público, apresentando as seguintes CONCLUSÕES:

«1. o arguido AA, nascido a ../../1979, foi condenado pela prática, a 28 de Setembro de 2010, de um crime de furto qualificado previsto e punido pelos artigos 203º, n.º1, e 204º, n.º2, alínea e), ambos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova, suspensão essa que veio a ser revogada por decisão transitada em julgado.

2. O Tribunal a quo decidiu quanto a esta pena, que haverá lugar ao perdão de 1 ano de prisão na pena única aplicada, o que se determina, sendo o perdão causa de extinção da pena, nos termos previstos no artigo 127.º, n.º3 do Código Penal.

3. Sendo certo que não o poderia fazer, dado que, tendo o arguido nascido em ../../1979, tinha, 30 anos, 10 meses e 12 dias de idade no momento da prática dos factos.

4. A idade do arguido excede a legalmente prevista neste diploma e era impeditiva que, in casu, lhe fosse concedido o perdão.

5. “Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto”

6. O teor literal deste normativo não permite a interpretação feita pela Mm.ª Juíza, nem é idêntica a redacção do à do regime especial de jovens adultos, como se refere no despacho recorrido.

7. O despacho recorrido fez uma interpretação extensiva da previsão legal, a qual não é admissível

8. Vigora nesta sede o principio geral de direito de que as medidas de graça, como providências de excepção que são, constam de normas que devem ser interpretadas e aplicadas nos seus precisos termos, sem ampliações nem restrições que nelas não venham expressas, devendo, pois, ser objecto de uma interpretação declarativa

9. Sendo certo que se presume que o legislador se soube exprimir da melhor forma possível e que a letra da lei corresponde ao seu pensar.

10. O perdão previsto na lei apenas se aplica “a pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto”…sendo isso mesmo que inculca a expressão “entre 16 e 30 anos de idade”,

11. O legislador não diz: “à data da prática dos factos tenham entre 16 anos e 30anosdeidade, inclusive, isto é , até perfazerem os 31 anos deidade”; ou que “à data da prática dos factos tenham entre 16 anos e 31 anos de idade, exclusive”, ou que “à data da prática dos factos tenham (de 16 anos) até 30 anos de idade”

12. A expressão usada pelo legislador “Entre” significa isso mesmo, entre duas datas, entre dois momentos delimitados temporalmente não sendo licito ao julgador entender que o legislador não se expressou como devia e que pretendia abarcar até aos 30 anos 11 meses e 29 dias de idade

13. Há inúmeros exemplos desta expressão legislativa “entre” (na LTE, no Código Penal, entre outros) nos quais, indubitavelmente não se coloca a questão do período/da idade que ultrapassa o limite máximo

14. A expressão usada na lei 38º-A/2023, é idêntica à utilizada, por exemplo, na Lei Tutelar Educativa, onde se estatui, no seu artigo 1º que “A prática, por menor com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos, de facto qualificado pela lei como crime dá lugar à aplicação de medida tutelar educativa”, não sendo defendido que a LTE se aplique a quem tenha 16 anos 10 meses e 12 dias de idade na data da prática dos factos.

15. No despacho recorrido perdoa-se um ano da pena de prisão aplicada sem considerar que o arguido se encontra em cumprimento sucessivo de penas e que se encontra em liberdade condicional, tendo já cumprido parte da pena

16. Contudo, o que o Tribunal poderia perdoar – se o perdão fosse admissível – era o remanescente da pena de prisão que o arguido tivesse ainda a cumprir à ordem destes autos, até um ano de prisão-

Deve, pois, alterar-se a decisão proferida em conformidade».

Notificado, o arguido não respondeu.

Nesta Relação, o Digno Procurador Geral Adjunto emitiu parecer pugnando pela procedência do recurso.

Cumprido o estabelecido no artigo 417º, nº 2, do CPP, o arguido não se pronunciou.

Colhidos os vistos, foram os autos à conferência.

ÂMBITO DO RECURSO

Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 402º; 403º e 412º nº 1 do CPP, o poder de cognição do tribunal de recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, já que é nelas que sintetiza as razões da sua discordância com a decisão recorrida, expostas na motivação.

Encontra-se, ainda, o tribunal obrigado a decidir todas as questões de conhecimento oficioso, como sejam, as nulidades insanáveis que afetem o recorrente, nos termos dos art.º s 379º nº 2 e 410º nº 3 do CPP e dos vícios previstos no art.º 410º nº 2 do CPP, que obstam à apreciação do mérito do recurso, mesmo que este se encontre limitado à matéria de direito (Acórdão do Plenário das Secções do STJ nº 7/95 de 19.10.1995, in Diário da República, I.ª Série-A, de 28.12.1995 e o AUJ nº 10/2005, de 20.10.2005, DR, Série I-A, de 07.12.2005).

No caso em apreço são QUESTÕES a resolver:

1. O perdão de penas previsto no art.º 2.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de agosto abrange pessoas que tenham até 30 anos de idade, ou pessoas que ainda não tenham perfeito 31 anos de idade?

2. Sendo admissível o perdão (aplicação do perdão ao arguido, que ainda não perfizera 31 anos à data dos factos), haveria de ter sido perdoado 1 ano da pena de prisão ou o remanescente da pena de prisão que o arguido tivesse ainda a cumprir à ordem destes autos, até um ano de prisão?


*

II. DESPACHO RECORRIDO (TRANSCRITO NA PARTE RELEVANTE)

«O arguido AA, nascido a ../../1979, foi condenado nos presentes autos por sentença proferida a 12 de Maio de 2011, transitada em julgado a 17 de Junho de 2011, pela prática, a 28 de Setembro de 2010, de um crime de furto qualificado previsto e punido pelos artigos 203º, n.º1, e 204º, n.º2, alínea e), ambos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova.

Por despacho proferido nos autos a 27 de Outubro de 2015, transitado em julgado, o Tribunal determinou a revogação da suspensão da execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado.

O arguido encontra-se em cumprimento sucessivo de penas, tendo estado ligado aos presentes autos desde o dia 26 de Maio de 2017 até ao dia 25 de Novembro de 2018, encontrando-se o arguido, actualmente, em liberdade condicional.

Considerando a entrada em vigor da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, foram os autos com vista ao Ministério Público que defendeu que, atenta a idade do arguido à data da prática dos factos (“30 anos 10 meses e 12 dias”), o perdão previsto em tal diploma não é aplicável (vide fls. 553).

Apreciando.

De harmonia com o disposto no artigo 2º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto – que estabelece um perdão de penas e uma amnistia de infracções por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude – estão abrangidas pela Lei em apreço as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º da mesmo Diploma (sublinhado e negrito nossos).

Ora, considerando a redacção do preceito normativo em apreço, aludindo o legislador à idade de 30 anos sem ressalva e sem menção expressa idêntica à do regime especial de jovens adultos, não podemos deixar de entender, no que à delimitação subjectiva concerne, que o perdão previsto Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto aplica-se aos agentes que, à data da prática dos factos tenham entre 16 anos e 30 anos de idade, inclusive, isto é, até perfazerem os 31 anos de idade.

Neste conspecto, considerando a idade do arguido à data da prática do crime em que foi condenado, pena aplicada e tipo de ilícito em causa nos autos e atento o disposto nos artigos 2.º, 3.º, 7.º, a contrario, e 8.º da Lei n.º38-A/2023, de 2 Agosto – publicada a 2 de Agosto de 2023 – e com entrada em vigor a 1 de Setembro de 2023, estando verificados os pressupostos previstos no aludido diploma, haverá lugar ao perdão de 1 ano de prisão na pena única aplicada, o que se determina, sendo o perdão causa de extinção da pena, nos termos previstos no artigo 127.º, n.º3 do Código Penal.

Considerando que o perdão é concedido sob a condição resolutiva prevista no artigo 8.º, n.º1 da Lei n.º38-A/2023, de 2 Agosto, mais determino que, neste particular, os autos aguardem por 1 ano, após juntando CRC actualizado e solicitando informação ao TEP quanto à situação do condenado».


*

III. APRECIANDO E DECIDINDO

*


Nos presentes autos, por sentença proferida a 12 de Maio de 2011, já transitada em julgado, o arguido AA, nascido a ../../1979, foi condenado pela prática, a 28 de Setembro de 2010, de um crime de furto qualificado previsto e punido pelos artigos 203º, n.º1, e 204º, n.º2, alínea e), ambos do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período de tempo, acompanhada de regime de prova.

A suspensão da execução da pena foi revogada, por despacho transitado em julgado, proferido em 27.10.2015.

O arguido cumpre sucessivamente várias penas de prisão, tendo estado ligado aos presentes autos desde o dia 26 de maio de 2017 até ao dia 25 de novembro de 2018, e encontrando-se, atualmente, em liberdade condicional.

Em face da entrada em vigor da Lei n.º 38-A/2023, de 2.08, em 1 de setembro de 2023, a Mm.ª Juíza a quo veio, por despacho proferido em 05.09.2023 (Referência:93633913), a decidir, e além do mais, que haverá lugar ao perdão de 1 ano de prisão na pena única aplicada, o que se determina, sendo o perdão causa de extinção da pena, nos termos previstos no artigo 127.º, n.º3 do Código Penal.

É deste despacho que vem interposto o presente recurso por o Ministério Público não concordar com a aplicação do perdão no caso vertente e com a aplicação do perdão de um ano de prisão à pena que o arguido cumpre sucessivamente e relativamente à qual se encontra em liberdade condicional.

São, portanto, questões a decidir saber se:

1. O perdão de penas previsto no art.º 2.ºn.º 1 da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de agosto abrange pessoas que tenham até 30 anos de idade, ou pessoas que ainda não tenham perfeito 31 anos de idade?

2. Sendo admissível a aplicação do perdão (ao arguido, que ainda não perfizera 31 anos à data dos factos), haveria de ter sido perdoado 1 ano da pena de prisão ou o remanescente da pena de prisão que o arguido tivesse ainda a cumprir à ordem destes autos, até um ano de prisão?

Vejamos.

1. O PERDÃO DE PENAS PREVISTO NO ART.º 2.º N.º 1 DA LEI N.º 38-A/2023 DE 2 DE AGOSTO ABRANGE PESSOAS QUE TENHAM ATÉ 30 ANOS DE IDADE, OU PESSOAS QUE AINDA NÃO TENHAM PERFEITO 31 ANOS DE IDADE?

Como é sabido, toda a fonte necessita de interpretação que desvele a regra que encerra.

E, em sede de interpretação de normas há que ter em conta o que se dispõe no artigo 9.º do Código Civil:

«1 - A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.

2 - Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.

3 - Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados».

Assim, em conformidade com tal normativo, a letra é não só o ponto de partida da interpretação, mas, também, o seu limite (n.º 2).

Não desconhecemos, ainda, que a amnistia é um direito de graça «que subverte princípios estabelecidos num moderno Estado de direito sobre a divisão e interdependência dos poderes estaduais, porquanto permite a intromissão de outros poderes na administração da justiça, tarefa para a qual só o poder judicial se encontra vocacionado, sendo por muitos consideradas tais medidas como instituições espúrias que neutralizam e até contradizem as finalidades que o direito criminal se propõe.

Razão pela qual aquele direito é necessariamente considerado um direito de «excepção», revestindo-se de «excepcionais» todas as normas que o enformam» - v. Fundamentação do Acórdão de Fixação da Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça de 25.10.2001.

E é pela natureza excecional de tais normas que é pacífico o entendimento jurisprudencial e doutrinal de que se encontra afastada a analogia, e mesmo a interpretação extensiva (não pode concluir-se que o legislador disse menos do que o que queria) ou restritiva (entendendo-se que o legislador disse mais do que o que queria).

Tal como pode ler-se na Fundamentação do Acórdão Unificador da Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 2/2023, sob o título D - Excecionalidade da norma e suas questões hermenêuticas):

«Atendendo à excecionalidade que caracteriza as leis de amnistia e de perdão, a interpretação das mesmas deverá, pura e simplesmente, conter -se no texto da respetiva lei, adotando -se uma interpretação declarativa em que “não se faz mais do que declarar o sentido linguístico coincidente com o pensar legislativo».

Dispõe o art.º 2.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de agosto que:

«Estão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º».

Ora, tal como refere no Ministério Público na resposta ao recurso, que nos diz o preceito é que «o perdão se aplica “a pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto”…sendo isso mesmo que inculca a expressão “entre 16 e 30 anos de idade”,

O legislador não diz: “à data da prática dos factos tenham entre 16 anos e 30anosdeidade, inclusive, isto é , até perfazerem os 31 anos de idade”; ou que “à data da prática dos factos tenham entre 16 anos e 31 anos de idade, exclusive”, ou que “à data da prática dos factos tenham (de 16 anos) até 30 anos de idade”

A expressão usada pelo legislador “Entre” significa isso mesmo, entre duas datas, entre dois momentos delimitados temporalmente não sendo licito ao julgador entender que o legislador não se expressou como devia e que pretendia abarcar até aos 30 anos 11 meses e 29 dias de idade

Há inúmeros exemplos desta expressão legislativa “entre” (na LTE, no Código Penal, entre outros) nos quais, indubitavelmente não se coloca a questão do período/da idade que ultrapassa o limite máximo.

A Mm.ª Juíza apela ao regime penal especial de jovens adultos referindo que a expressão é idêntica. Mas, com todo o respeito, não é.

Diz-se no artigo 1º , nº e 2 do Regime penal dos jovens adultos:

1. O presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime.

2. É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos.

A expressão “tiver completado 16 anos sem ter ainda atingido os 21 anos” não é idêntica à expressão “por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto” usada na lei 38º-A/2023.

Ao invés, a expressão usada na lei 38º-A/2023, é idêntica à utilizada, por exemplo, na Lei Tutelar Educativa, onde se estatui, no seu artigo 1º que «A prática, por menor com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos, de facto qualificado pela lei como crime dá lugar à aplicação de medida tutelar educativa».

E, certamente, pelo menos que saibamos, ninguém defende que a lei tutelar educativa é aplicável a quem tenha 16 anos 10 meses e 12 dias de idade na data da prática dos factos.

No artigo 47º, nº 2 do Código Penal, diz-se que «Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre (euro) 5 e (euro) 500» e certamente ninguém defende que o quantitativo diário da pena de multa pode ser até 501,00€. O mesmo se poderia dizer das normas que, por exemplo estabelecem que «O período de suspensão é fixado entre um e cinco anos», sendo impensável, cremos, que alguém defendesse que o período de suspensão da execução da pena poderia ser de 5 anos, 11 meses e 29 dias».

Acresce que, este sentido de que o perdão previsto no diploma se aplica a quem tenha entre 16 e 30 anos de idade à data dos factos, considerando-se como último dia abrangido pelo perdão, aquele em que o agente completa 30 anos (as 23h59m e 59ss desse dia) é o que também o que se encontra em perfeita coerência com como o que se pode ler na exposição de motivos da Proposta de Lei n.º 97/XV/1.ª, in DAR II série A n.º 245, 2023.06.19, que esteve na origem da Lei n.º 38-A/2023, de 2.8:

«Uma vez que a JMJ abarca jovens até aos 30 anos, propõe-se um regime de perdão de penas e de amnistia que tenha como principais protagonistas os jovens. Especificamente, jovens a partir da maioridade penal, e até perfazerem 30 anos, idade limite das JMJ» (sublinhado nosso).

Assim, e tudo considerado, o recorrente, atenta a sua idade à data dos factos, não reúne, em face da letra da lei, as condições objetivas para poder beneficiar de 1 (um) ano de perdão da respetiva pena.

Como assim é, resulta prejudicado o conhecimento da segunda das questões a decidir.


IV. DISPOSITIVO

*


Em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra, em julgar procedente o recurso, revogando o despacho recorrido, por a sanção penal relativa ao ilícito não se encontrar abrangida pelo perdão previsto na Lei n.º 38-A/2023, de 2.8 atenta a idade do arguido à data dos factos.

Sem custas.


*

(Certifica-se que o acórdão foi elaborado pela relatora e revisto pelos seus signatários, nos termos do art.94.º, n.º 2 do C.P.P.).

*

Coimbra, 10.04.2024

Alexandra Guiné (relatora)

João Novais (1.º adjunto)

Ana Carolina Cardoso (2.º adjunta)