Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
632/17.8T8VIS-B.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: FONTE RAMOS
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
PROCESSOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
VONTADE MANIFESTADA PELA CRIANÇA
RESIDÊNCIA ALTERNADA
Data do Acordão: 03/05/2024
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO DE FAMÍLIA E MENORES DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 36.º, 5 E 69.º, 1, DA CRP
ARTIGO 988.º, 1, DO CPC
ARTIGOS 4.º, 1, C); 5.º, 1; 12.º; 40.º, 1 E 42.º DO RGPTC
ARTIGOS 1878.º; 1905.º E 1906.º, 5, 6 E 8, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: 1. Nos processos tutelares cíveis, com a natureza de jurisdição voluntária, o tribunal pode/deve proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa (mais conveniente e oportuna), a que melhor serve os interesses em causa.
2. A vontade manifestada pela criança (art.ºs 4°, n.º 1, alínea c), e 5°, n.º 1, do RGPTC) – genuinamente sua e conforme com o seu interesse, objetivamente apreciado – é um fator importante a atender, a ponderar com os demais, no contexto da regulação do exercício das responsabilidades parentais.

3. A alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais desde que sirva o interesse dos filhos e possa ser implementada, mesmo sem acordo dos pais, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes.

4. A residência alternada assenta no superior interesse da criança em manter com os progenitores uma relação em moldes igualitários e de grande proximidade com cada um deles.

5. Qualquer regime poderá/deverá ser ajustado se e quando as circunstâncias o ditarem.

Decisão Texto Integral:
Relator: Fonte Ramos
Adjuntos: Luís Cravo
Moreira do Carmo

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:        

           

            I. Em 07.5.2021, AA veio requerer a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais (RERP) contra BB, relativamente ao filho menor de ambos, CC, nascido a ../../2014, pedindo que seja alterada “para o regime de guarda conjunta com residência alternada semanal com cada um dos progenitores, fazendo troca à sexta-feira, no fim do horário das atividades escolares, devendo cada um dos progenitores suportar em igualdade todas as despesas escolares, extracurriculares, médicas, medicamentosas e de saúde do menor, mantendo-se todo o mais em vigor”.

            Foi ouvida a criança (cf. ata de 02.9.2021).

           Na conferência dos pais (02.11.2021, 07.01.2022 e 02.6.2022), não houve consenso.

           Produzidas as alegações, juntos os relatórios da Segurança Social e realizada a audiência de julgamento, o Tribunal a quo, por sentença de 14.7.2023, decidiu/determinou a RERP, nos seguintes termos:            

               1 - A criança CC passará uma semana em casa de cada progenitor, alternadamente (mudança à sexta-feira) sendo o exercício das responsabilidades parentais nas questões de particular importância para a vida da criança da competência de ambos os progenitores, designadamente as atinentes à sua segurança, saúde, educação, religião e moral e, eventuais deslocações das menores ao estrangeiro, salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer um dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações, por qualquer meio, ao outro logo que possível.

               2 - Compete a ambos os progenitores o exercício das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância da vida da criança (nomeadamente, as respeitantes a matérias consideradas fundamentais para o seu desenvolvimento, segurança, saúde, educação e formação, tais como, a título exemplificativo, escolha de escola pública/privada, de médico público/privado, de atividades extracurriculares, intervenções cirúrgicas não urgentes, opções religiosas até aos 16 anos, saídas para o estrangeiro, alteração da localidade de residência do menor, etc.), salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.

                a) - As funções de encarregado de educação serão exercidas pelo pai e pela mãe;

                b) - A criança está autorizada pelos pais a deslocar-se para o estrangeiro na companhia do outro progenitor durante os períodos de férias escolares em que pode estar na sua companhia, mediante prévia comunicação ao outro progenitor, com uma antecedência mínima de 15 dias, do local de destino e duração da estadia no estrangeiro.

               3 - O exercício das responsabilidades parentais quanto aos atos da vida corrente da criança compete ao progenitor com quem a criança estiver a residir naquela semana.

                4 - Cada um dos progenitores a quem couber o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da criança pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.

               5 - Ambos os progenitores ficam obrigados a dar conhecimento mútuo de todas as circunstâncias e acontecimentos de importância relevante para a vida, educação e saúde do filho[1] (na semana não residente).

               6 - Os progenitores poderão contactar diariamente com a criança, telefonicamente ou qualquer meio tecnológico, sem prejuízo dos seus períodos de descanso.

               7 - A criança passará metade das férias escolares do Verão, do Natal e da Páscoa com cada um dos progenitores, da seguinte forma:

                a) -  A criança passará, num ano, a primeira metade das férias escolares do Natal – que incluirá os dias 24 e 25 de dezembro – com um dos progenitores e a segunda metade dessas férias – que incluirá os dias 31 de dezembro e 1 de janeiro – com o outro progenitor.

               No ano seguinte, a criança passará a primeira metade dessas férias com o/a progenitor/a com o/a qual tiver passado a segunda metade das mesmas no ano anterior, alternando nos anos subsequentes.

               Nas próximas férias escolares de Natal, a criança passará a primeira metade dessas férias com a mãe e a segunda metade dessas férias com o pai, alternando nos anos subsequentes.

                b) - A criança passará a primeira metade das férias escolares da Páscoa com um dos progenitores e a segunda metade – que incluirá o Domingo e a Segunda-Feira de Páscoa – com o outro progenitor.

               No ano seguinte, a criança passará a primeira metade dessas férias com o/a progenitor/a com o/a qual tiver passado a segunda metade das mesmas no ano anterior, alternando nos anos subsequentes.

                Nas próximas férias escolares da Páscoa, a criança passará a primeira metade dessas férias com a mãe e a segunda metade dessas férias com o pai, alternando nos anos subsequentes.

                c) - A criança passará quinze dias do gozo de férias com cada um dos progenitores, devendo estes agendar entre si com pelo menos dois meses de antecedência o concreto período que cada um deles pretende passar com o menor em gozo de férias.

               No caso de sobreposição de interesse nos períodos escolhidos, nos anos pares prevalece a escolha do pai, e nos anos ímpares a escolha da mãe.

               d) - Cada um dos progenitores assegurará e financiará as deslocações da criança nos períodos em que pode estar na companhia da criança durante as férias escolares.

               8 - No dia de anos da criança, cada um dos progenitores poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

                Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com a mãe e jantará com o pai, invertendo-se nos anos ímpares.

               9 - No dia de anos dos pais, o/a progenitor/a aniversariante poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

                Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com o/a progenitor/a aniversariante e, nos anos ímpares, jantará com o/a mesmo/a.

               10 - Nos dias do pai e da mãe, o/a progenitor/a homenageado/a poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

               Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com o/a progenitor/a homenageado/a e, nos anos ímpares, jantará com o/a mesmo/a.

               11[2] - Cada um dos progenitores suportará metade das despesas escolares, extracurriculares, médicas, medicamentosas e outras de saúde, na parte não comparticipada, efetuando o pagamento da quota-parte que lhe compete ao/à progenitor/a que tiver efetuado a despesa mediante prévia entrega de cópia dos documentos comprovativos da realização de tais despesas, contendo o nome e NIF da criança, bem como a discriminação dos bens adquiridos/serviços prestados, no prazo de 15 dias após a apresentação e entrega de cópia de tais documentos, por depósito ou transferência para conta a indicar pelo/a progenitor/a credor/a ou, na falta desta, cheque ou vale postal.

               a) - Os documentos comprovativos da realização das mencionadas despesas deverão ser apresentados e entregues ao outro progenitor, para efeitos de pagamento, no prazo máximo de 60 dias após realização das mesmas.

               b) - A apresentação e entrega de tais documentos será efetuada por via eletrónica através dos seguintes endereços eletrónicos: (...)

               ou, na falta deles, através de correio registado ou em mão contra recibo assinado pelo/a progenitor/a devedor/a.

               12[3] - Cada um dos progenitores suportará ainda metade das despesas de vestuário e calçado da criança, não podendo cada um dos progenitores exigir do outro o pagamento da quantia mensal superior a € 50 (cinquenta euros), efetuando o pagamento da quota-parte que lhe compete ao/à progenitor/a que tiver efetuado a despesa mediante prévia entrega de cópia dos documentos comprovativos da realização de tais despesas, contendo o nome e NIF da criança, bem como a discriminação dos bens adquiridos/serviços prestados, no prazo de 15 dias após a apresentação e entrega de cópia de tais documentos, por depósito ou transferência para conta a indicar pelo/a progenitor/a credor/a ou, na falta desta, cheque ou vale postal.»

            Inconformada, a progenitora/requerida apelou[4], formulando as seguintes conclusões:

           1ª - A decisão impugnada julgou incorretamente a matéria de facto dada como

provada nos pontos 3., 4. e 11.

           2ª - O ponto 3. dos factos provados deverá, de acordo com a prova produzida, ser alterado e, em substituição, dar-se como provado que: “3. O regime de regulação das responsabilidades parentais referido em 2) tem sido cumprido por ambos os progenitores”, devendo acrescentar-se à matéria de facto dada como provada que: “3.1 Verificam-se divergências, entre Requerente e Requerida, acerca de questões relacionadas com a criança, e é a Requerida que acaba por aceder à vontade do Requerente nas questões de discordância.

           3ª - O ponto 4. dos factos provados deverá, de acordo com a prova produzida, ser alterado e, em substituição, dar-se como provado que “4. O referido em 6) tem permitido um convívio de cerca de dois a três dias por semana, com pernoita, da criança com o pai”.

            4ª - O ponto 11. dos factos provados deverá ser eliminado.

           5ª - Entendeu o Tribunal a quo que o “sistema da criança passar uma semana em casa de cada progenitor é um regime adequado não comprometendo a segurança, estabilidade e bem-estar da criança”, com o que a Requerida não se conforma, considerando que não se verificam pressupostos, quer de facto, quer de direito, que permitam concluir pela fixação de um regime de residência alternada, não sendo esse regime adequado nem garantindo a estabilidade e bem-estar da criança.

            6ª - Desde logo, não se alcança de que forma o Tribunal a quo concluiu que a criança demonstra já maturidade para tomar a decisão, em consciência e com razoabilidade, de que quer residir uma semana com cada um dos progenitores.

            7ª - Uma criança com 6 anos, idade que o CC tinha quando foi ouvido pelo Tribunal, não tem maturidade para, sozinha e sem influência exterior, tomar tal decisão, nem tem consciência do que é residir com ambos os progenitores de forma alternada, nem saberá que pode viver com o pai e com a mãe de forma alternada.

           8ª - Acresce que o Tribunal não ponderou os prejuízos que poderão advir para a criança decorrentes da quebra das suas rotinas e horários, ponderação que entendemos terá sempre de ser feita.

            9ª - Além disso, nenhuma prova foi produzida, nem nada permite concluir que a fixação de uma residência alternada se revele estável e benéfica para a criança, tendo em conta os seus superiores interesses.

           10ª - Nada permite concluir, ou tão pouco resulta da factualidade provada e da prova produzida, que a fixação de uma residência semanal alternada não determinasse alterações significativas nos hábitos e rotinas da criança, e que esta tivesse de se adaptar a diferentes rotinas, diferentes horas para deitar, diferentes horas para brincar e estudar, diferentes regimes alimentares, que alternariam de acordo com o progenitor com o qual estivessem.

           11ª - Acresce que entre Requerente e Requerida verificam-se divergências acerca de questões relacionadas com a criança, sendo que o Requerente revela não ter capacidade de abertura e de diálogo, não se mostrando disponível para os ajustamentos pontuais e necessários que possam surgir inesperadamente, sendo sempre a Requerida que acaba por aceder à vontade do Requerente nas questões de discordância.

           12ª - Destarte, o que resulta da prova produzida é que o Requerente, ao contrário do que sucede com a Requerida/Recorrente, não permite que esta[5] tenha a criança na sua companhia para além dos dias e horas que se encontram definidos na Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais.

           13ª - Acresce que o facto de o Requerente poder passar a ter horário flexível, trabalhando apenas durante o dia, não pode ser valorizado sem se ter em conta as condições em que tal flexibilidade de horário ocorrerá.

           14ª - Com efeito, não ponderou o Tribunal a quo a circunstância, manifestamente relevante, de tal flexibilidade de horário ter uma duração limitada, porquanto o Requerente apenas poderá vir a beneficiar de horário flexível até a criança perfazer 12 anos de idade, o que ocorrerá em dezembro de 2026.

           15ª - Assim, e caso fosse fixado um regime de residência alternada, teria o mesmo de ser novamente alterado daqui a 3 anos, uma vez que o Requerente deixaria de beneficiar de horário flexível - voltando a trabalhar por turnos, o que incluirá turnos durante a noite - o que colocaria em causa os cuidados necessários da criança.

           16ª - Uma constante alteração do regime das responsabilidades parentais será prejudicial e trará certamente instabilidade ao CC, porquanto o obrigaria adaptar-se constantemente a diferentes hábitos e rotinas.

            17ª - Assim, não resulta que a alteração do regime do exercício das responsabilidades parentais pretendida pelo Requerente – que, no regime em vigor, tem a criança na sua companhia 2 ou 3 dias por semana – se revele benéfica para a criança, nem resulta que a alteração do regime em vigor permita à criança ter mais estabilidade na sua vida.

           18ª - Pelo contrário, a fixação de um regime de residência alternada apenas causaria instabilidade na vida da criança, o que, de modo algum, lhe seria benéfico.

           19ª - Acresce que não alegou nem provou o Requerente quaisquer factos suscetíveis de fundamentar ser do superior interesse da criança a fixação da residência em semanas alternadas com ambos os progenitores.

            20ª - Da factualidade apurada nada resulta que permita um juízo valorativo positivo quanto às vantagens, para a criança, de uma residência alternada com cada um

dos progenitores, tanto mais que não se verificam elementos de facto que inequivocamente apontem nesse sentido, de forma a salvaguardar o crescimento saudável e harmonioso da criança, não resultando igualmente que uma tal alteração seja minimamente vantajosa para a criança, tendo como pressuposto o seu superior interesse.

           21ª - O regime de residência alternada não é o mais adequado no caso de conflito entre os progenitores e em que estejam em causa crianças pequenas, como é o caso dos autos.

           22ª - O Requerente e Requerida já demonstram conflitos e incompatibilidades na vigência do atual regime de regulação, e tais conflitos e desacordos só serão exponenciados e agravados caso seja concedida a alteração à regulação das responsabilidades parentais e estabelecida a residência alternada.

            23ª - Inexiste assim fundamento para a fixação de um regime de residência alternada, devendo manter-se inalterado o regime das responsabilidades parentais em

vigor, continuando a criança a residir com a Requerida.

           24ª - A sentença violou o n.º 6 do art.º 1906º do Código Civil (CC).

           O M.º Público respondeu concluindo pela improcedência do recurso.

           Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objeto do recurso, importa reapreciar/decidir, sobretudo: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova); b) regulação das responsabilidades parentais (máxime, se é de alterar o decidido quanto à “residência partilhada” da criança).


*

            II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos:

            1) CC nasceu a ../../2014 e é filho de AA, à data solteiro e com 27 anos de idade, e de BB, à data solteira e com 31 anos de idade.

           2) Por decisão proferida a 30.10.2018, por sentença já transitada em julgado, foi regulado o exercício das responsabilidades parentais nos seguintes termos:


1)

                A criança CC fica a residir com a mãe.

2)

               Compete a ambos os progenitores o exercício das responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância da vida da criança (nomeadamente, as respeitantes a matérias consideradas fundamentais para o seu desenvolvimento, segurança, saúde, educação e formação, tais como, a título exemplificativo, escolha de escola pública/privada, de médico público/privado, de atividades extracurriculares, intervenções cirúrgicas não urgentes, opções religiosas até aos 16 anos, saídas para o estrangeiro, alteração da localidade de residência do menor, etc.), salvo nos casos de urgência manifesta, em que qualquer dos progenitores pode agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.

               a) - As funções de encarregado de educação serão exercidas pela mãe;

               b) - A criança está autorizada pelos pais a deslocar-se para o estrangeiro na companhia do outro progenitor durante os períodos de férias escolares em que pode estar na sua companhia, mediante prévia comunicação ao outro progenitor, com uma antecedência mínima de 15 dias, do local de destino e duração da estadia no estrangeiro.


3)

               O exercício das responsabilidades parentais quanto aos atos da vida corrente da criança compete à progenitora com quem a criança reside habitualmente ou ao outro progenitor quando com ele se encontrar temporariamente, o qual, ao exercer essas responsabilidades, não deve contrariar as orientações educativas mais relevantes, tal como elas são definidas pela progenitora com quem a criança reside habitualmente.

4)

                Cada um dos progenitores a quem couber o exercício das responsabilidades parentais relativas aos atos da vida corrente da criança pode exercê-las por si ou delegar o seu exercício.

5)

               O progenitor da criança poderá visitar e estar na companhia da criança mesmo fora da casa da progenitora com a qual reside habitualmente a criança, sempre que o entender, sem prejuízo do descanso, cuidados médicos e deveres escolares da criança e avisando a progenitora com a qual reside habitualmente a criança com pelo menos 24 horas de antecedência.

6)

                O progenitor poderá ter a criança na sua companhia, nos seus dias de folga, com pernoita sempre que tiver dias de folga consecutivos, indo buscar a criança ao infantário no dia anterior à folga ou, no caso de não ser dia de infantário, indo busca-lo a casa da mãe pelas 18 horas e indo entregá-lo no dia subsequente à folga ao infantário, à hora do início das atividades do infantário, ou, no caso de não ser dia de infantário, pelas 10 horas a casa da mãe.

7)

               A criança passará metade das férias escolares do Verão, do Natal e da Páscoa com cada um dos progenitores, da seguinte forma:

                a) - A criança passará, num ano, a primeira metade das férias escolares do Natal – que incluirá os dias 24 e 25 de dezembro – com um dos progenitores e a segunda metade dessas férias – que incluirá os dias 31 de dezembro e 1 de janeiro – com o outro progenitor.

               No ano seguinte, a criança passará a primeira metade dessas férias com o/a progenitor/a com o/a qual tiver passado a segunda metade das mesmas no ano anterior, alternando nos anos subsequentes.

               Nas próximas férias escolares de Natal, a criança passará a primeira metade dessas férias com a mãe e a segunda metade dessas férias com o pai, alternando nos anos subsequentes.

               b) - A criança passará a primeira metade das férias escolares da Páscoa com um dos progenitores e a segunda metade – que incluirá o Domingo e a Segunda-Feira de Páscoa – com o outro progenitor.

               No ano seguinte, a criança passará a primeira metade dessas férias com o/a progenitor/a com o/a qual tiver passado a segunda metade das mesmas no ano anterior, alternando nos anos subsequentes.

               Nas próximas férias escolares da Páscoa, a criança passará a primeira metade dessas férias com a mãe e a segunda metade dessas férias com o pai, alternando nos anos subsequentes.

               c) - A criança passará quinze dias do gozo de férias com cada um dos progenitores, devendo estes agendar entre si com pelo menos dois meses de antecedência o concreto período que cada um deles pretende passar com o menor em gozo de férias.

               No caso de sobreposição de interesse nos períodos escolhidos, nos anos pares prevalece a escolha do pai, e nos anos ímpares a escolha da mãe.

                d) - Cada um dos progenitores assegurará e financiará as deslocações da criança nos períodos em que pode estar na companhia da criança durante as férias escolares.


8)

               No dia de anos da criança, cada um dos progenitores poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

                Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com a mãe e jantará com o pai, invertendo-se nos anos ímpares.


9)

                No dia de anos dos pais, o/a progenitor/a aniversariante poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

                Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com o/a progenitor/a aniversariante e, nos anos ímpares, jantará com o/a mesmo/a.


10)

               Nos dias do pai e da mãe, o/a progenitor/a homenageado/a poderá tomar uma refeição com a criança em termos a acordar entre ambos com pelo menos 24 horas de antecedência.

                Na falta de acordo, nos anos pares, a criança almoçará com o/a progenitor/a homenageado/a e, nos anos ímpares, jantará com o/a mesmo/a.


11)

               O progenitor pagará a título de alimentos devidos à criança, doze vezes ao ano, a quantia mensal de € 100 (cem euros), a entregar à progenitora, até ao último dia de cada mês, com início em março de 2017 até fevereiro de 2018 (nos termos provisoriamente acordados que ora se convertem em definitivos), e de € 103 (cento e três euros) a partir de março de 2018 (face à atualização provisoriamente acordada que ora se converte em definitiva) por depósito ou transferência bancária para a conta bancária a indicar pela progenitora ao outro progenitor ou, na falta desta, por vale postal ou cheque.

12)

                A prestação de alimentos referida em 11) será atualizada anual e automaticamente, com início em março de 2019, de acordo com uma taxa de 3 % (três por cento), sem prejuízo de poder ser alterada posteriormente.

13)

               Cada um dos progenitores suportará metade das despesas escolares, extracurriculares, médicas, medicamentosas e outras de saúde, na parte não comparticipada, efetuando o pagamento da quota-parte que lhe compete ao/à progenitor/a que tiver efetuado a despesa mediante prévia entrega de cópia dos documentos comprovativos da realização de tais despesas, contendo o nome e NIF da criança, bem como a discriminação dos bens adquiridos/serviços prestados, no prazo de 15 dias após a apresentação e entrega de cópia de tais documentos, por depósito ou transferência para conta a indicar pelo/a progenitor/a credor/a ou, na falta desta, cheque ou vale postal.

               a) - Os documentos comprovativos da realização das mencionadas despesas deverão ser apresentados e entregues ao outro progenitor, para efeitos de pagamento, no prazo máximo de 60 dias após realização das mesmas.

              b) - A apresentação e entrega de tais documentos será efetuada por via eletrónica através dos seguintes endereços eletrónicos: (...)

               ou, na falta deles, através de correio registado ou em mão contra recibo assinado pelo/a progenitor/a devedor/a.


14)

               Cada um dos progenitores suportará ainda metade das despesas de vestuário e calçado da criança, não podendo cada um dos progenitores exigir do outro o pagamento da quantia mensal superior a € 50 (cinquenta euros), efetuando o pagamento da quota-parte que lhe compete ao/à progenitor/a que tiver efetuado a despesa mediante prévia entrega de cópia dos documentos comprovativos da realização de tais despesas, contendo o nome e NIF da criança, bem como a discriminação dos bens adquiridos/serviços prestados, no prazo de 15 dias após a apresentação e entrega de cópia de tais documentos, por depósito ou transferência para conta a indicar pelo/a progenitor/a credor/a ou, na falta desta, cheque ou vale postal.

15)

               A mãe da criança (com ele residente) receberá o abono de família e todas as prestações a que a criança tiver direito.”

           3) O regime de regulação das responsabilidades parentais referido em 2) tem sido cumprido por ambos os progenitores, os quais têm vindo a atuar, em regra, com efetiva colaboração e cooperação parental, articulando-se em função das necessidades do filho e das rotinas de cada um.

            4) O referido em 2) - 6) tem permitido um convívio de cerca de duas a três vezes por semana da criança com o pai.

           5) O pai da criança é soldado da GNR, exercendo funções no posto da GNR ... e auferindo um rendimento mensal que ronda os mil euros.

           6) O pai da criança exerce a sua atividade profissional por turnos.

           7) O pai da criança reside em habitação arrendada, de tipologia T4, pagando cerca de € 250 mensais de renda, onde reside com a companheira e o filho desta – DD, de 6 anos.

           8) A progenitora vive com o filho e a avó materna deste numa casa pertencente a esta última bem conservada, organizada, asseada e bem equipada, de tipologia T4.

            9) Não são conhecidos antecedentes criminais aos progenitores.

           10) Não foram instaurados processos de promoção e proteção relativos a esta criança.

           11) A criança manifestou vontade em passar o mesmo tempo com o pai e com a mãe, bem como em residir uma semana com a mãe e outra semana com o pai.[6]

            2. Cumpre apreciar e decidir.

           a) A requerida/recorrente insurge-se, desde logo, contra a decisão sobre a matéria de facto, pugnando para que seja dada como não provada a factualidade dita em II. 1. 11), supra, dando-se ainda uma diferente resposta à matéria aludida em II. 1. 3) e 4), supra, como se indica nas “conclusões 2ª a 4ª”, ponto I., supra.

            Invoca, sobretudo, a prova pessoal produzida em audiência de julgamento (máxime, declarações dos pais da criança), conjugada com alguns dos documentos juntos aos autos (sobretudo, a fls. 76 e seguintes).

            Por conseguinte, dada a relevância da referida matéria, importa saber se outra poderia/deveria ser a decisão do Tribunal a quo quanto à factualidade em causa.

            b) Esta Relação procedeu à audição da prova pessoal produzida em audiência de julgamento e analisou a prova documental e os relatórios sociais juntos aos autos.

           c) Pese embora a maior dificuldade na apreciação da prova (pessoal) em 2ª instância, designadamente, em razão da não efetivação do princípio da imediação[7], afigura-se, no entanto, que, no caso em análise, tal não obstará a que se verifique se a prova pessoal foi apreciada de forma razoável e adequada.

            Na reapreciação do material probatório disponível por referência à factualidade em causa, releva igualmente o entendimento de que a afirmação da prova de um certo facto representa sempre o resultado da formulação de um juízo humano e, uma vez que este jamais pode basear-se numa absoluta certeza, o sistema jurídico basta-se com a verificação de uma situação que, de acordo com a natureza dos factos e/ou dos meios de prova, permita ao tribunal a formação da convicção assente em padrões de probabilidade[8], capaz de afastar a situação de dúvida razoável.

           d) Consignou-se na motivação da decisão sobre a matéria de facto, designadamente: «(...) Do teor das declarações prestadas pelos progenitores ao longo do processo resulta patente a falta de entendimento acerca da questão essencial que os divide nestes autos, relativa à fixação da residência da criança apenas com a mãe ou com ambos os progenitores, o que não os tem impedido de articularem atuações para assegurarem de forma empenhada as rotinas e bem-estar do filho. / (...) não são colocados entraves por nenhum dos progenitores ao convívio com o outro. (...)»

            e) Relativamente à prova pessoal, visto o objeto da impugnação e o aduzido pela requerida/recorrente, atente-se no que de essencial foi dito:

            - Declarações do Requerente:

           A seguir às férias de agosto/2021 (2ª quinzena), o declarante teve dois dias de folga (os dois primeiros dias de setembro), razão pela qual o CC permaneceu consigo - “(...) conforme diz a ata, os dias de folga passa com o pai, e foi isso que aconteceu, não fui eu que quis, (...) mas eu expliquei e mandei um ´e-mail` à mãe a dizer que estava de folga; (...)  foi no dia em que o CC foi ouvido aqui no Tribunal ..., eu trouxe o CC, aqui, à mãe, à entrada do tribunal e ele, depois, ficou com a mãe”.

            Em relação a férias, “nunca causou qualquer problema”.

           Quanto ao episódio sobre o aniversário da criança, manteve o que consta da ata de fls. 48/49, sublinhando, contudo, que “se ela (requerida) tivesse avisado um pouco mais cedo, não era por aí...”, i. é, podiam ter chegado a um acordo [cf., ainda, a propósito, o teor dos documentos/ “comunicações” juntos a fls. 76 e seguintes], como viria a suceder, por exemplo, no ano seguinte, por ocasião do aniversário do CC.

            “A mãe tem de fazer a gestão do tempo (...) para cumprir” - tal como o declarante -, “mas ela atrasa-se sempre...”.

            Tem estado com o CC de “quatro em quatro dias, mais ou menos...” e acontece estar duas ou três noites seguidas com ele “quando tem duas folgas”.

            É possível que a requerida lhe tenha solicitado ver a criança no período compreendido entre 16.8.2021 e 01.9.2021, mas “se não deixei, se calhar não foi oportuno, no dia em que ela pediu...”; foi o período das suas férias, na companhia do CC; exerceu o (seu) direito previsto na regulação (“é um direito meu, está nos meus dias, um dia de folga...”).

            - Declarações da Requerida:

           Afirmou que em diversas situações (aniversários, férias, etc.) “(...) ele (requerente) decide - é assim, e pronto!”; “(...) na maior parte das vezes, inflexibilidade da parte dele (requerente), e, depois, é a falta de comunicação, por parte dele, claro, que acaba por agravar as situações (...)”, dando como exemplo, “entre outras situações” - esta, com “várias falhas...” -, o período de férias da criança na “colónia de férias da GNR” sem que o requerido tenha indicado o n.º de telefone/telemóvel da declarante para esta poder contactar com a criança, pelo que ficou impedida de o fazer durante “24 horas”.

            f) Relativamente aos relatórios da Segurança Social de abril de 2022 e janeiro de 2023 verifica-se que a Mm.ª Juíza do Tribunal a quo atendeu ao resultado da indagação levada a cabo.

            Destacamos os seguintes excertos:

            - Considerou-se/concluiu-se que “a opção por uma situação de residência alternada, poderia trazer ao caso, mais benefícios que defeitos, na medida em que simplificaria consideravelmente, aspetos práticos do quotidiano de ambos os progenitores. / Esperamos de facto, que a comunicação, cooperação e colaboração parental possam melhorar e talvez através de tal alcance, no futuro possa vir a existir a consensualidade, que hoje, ainda não foi possível alcançar.” (abril/2022)

           -“(...) persistindo as discordâncias existentes entre requerente e requerida, relativamente à formulação defendida por cada um, acaba por existir, de facto, uma efetiva colaboração e cooperação parental entre os dois, hoje aparentemente consolidada.[9] Ambos articulam de um modo civilizado e com respeito mútuo, nunca perdendo de vista o bem-estar do menor, sempre muito presente na vida de cada um. / (...) ligeira melhoria na comunicação e relacionamento parental, denotando mais moderação e complacência de um para com o outro, com maior enfoque no bem-estar e interesse do filho. / (...) a prestação e atenção de cada um para com a criança, parece-nos inquestionável, genuína e efetiva. / Capacidade de comunicação e diálogo entre os progenitores da criança, revelando alguma capacidade de flexibilização de posições, mais constatável, por parte da progenitora. / (...) poderá ainda demorar algum tempo a conseguir-se a consensualidade numa solução de residência alternada, (...) talvez no futuro, tendo em conta a qualidade da comunicação, cooperação e colaboração parental que hoje existe, relativamente aos interesses e assuntos relativos a CC, e a boa articulação funcional que apesar de tudo, continua a existir entre ambos os progenitores.” (janeiro/2023)

           g) O CC disse, nomeadamente (audição de 02.9.2021; tinha, então, cerca de 6 anos e 9 meses):

            - “Está mais dias com a mãe do que com o pai, mas o que queria era ficar uma semana com a mãe e outra semana com o pai. / Foi o pai que lhe disse isso, para ficar uma semana com um e outra semana com outro, mas ele também acha que é melhor estar uma semana com um e outra semana com outro. / Ainda não experimentou passar uma semana com a mãe e outra com o pai. Nas férias passou duas semanas com cada um. / Sente-se bem na casa do pai e na casa da mãe, sente-se bem nas duas casas. / Não se importa que seja dado conhecimento das suas declarações aos pais.”

           h) Ainda a nível das incidências fáticas e adjetivas, e consideradas, apenas, as conferências dos pais:

            - Considerou a requerida que “trabalhando o progenitor por turnos, tal inviabiliza a instituição de um regime de residência alternada ou partilhada”, ao que este atalhou existir “a possibilidade de deixar de trabalhar por turnos” se e quando instituído tal regime.

            - Juntos os documentos de fls. 26 e seguintes e 39, a requerida reiterou a sua posição contrária à pretensão do pai, por considerar que “continuam a acontecer incidentes entre o progenitor relacionados com o filho dos quais conclui que (...) não põe os interesses do filho à frente”; o CC “deve ficar a residir apenas consigo por entender que o pai não coloca os interesses do filho em primeiro lugar”.

            3. Visto o objeto do litígio e da impugnação relativa à matéria de facto, perante a dita prova pessoal e os documentos e relatórios juntos aos autos, afigura-se correto o decidido pela Mm.ª Juíza do Tribunal a quo, ainda que com uma fundamentação menos suficiente.

            Conjugados todos os elementos de prova, não se vê razão para dar como não provado o incluído no ponto 11) - destacando-se, aqui, necessariamente, o mencionado em II. 2. g), supra, que, pelo menos, evidencia o “querer” da criança, a sua “perceção” junto dos progenitores e o que “sente” quando em casa de cada um; e  não se antolha correto admitir a eventual existência de um qualquer fator externo a influenciar e/ou a determinar o assim declarado e que temos por ajustado/adequado à idade e às conhecidas circunstâncias da vida do CC.[10]

           À criança é, indiscutivelmente, reconhecido um direito de audiência e, portanto, o direito de participar na conformação das decisões que lhe digam respeito (art.ºs 4º, n.º 1, alínea c) e 5º, n.º 1, do RGPTC). Mas sabemos que uma coisa é o direito da criança a ser ouvida - outra bem diversa é a vinculação, acrítica ou imotivada, do juiz à preferência manifestada pela criança acerca de um qualquer ponto ou vertente da regulação das responsabilidades parentais, maxime, sobre a sua residência. Aceitando-se que a criança dispõe do grau de maturidade necessário para compreender o alcance do seu ponto de vista e o exprimiu de modo espontâneo - i. é, que a opinião que expressou é genuinamente sua, não tendo sido predeterminada ou condicionada por uma influência nociva ou indesejável de qualquer dos pais - há sempre que verificar se aquele ponto de vista corresponde objetivamente ao seu interesse, se é adequado ou conforme com um exercício ótimo dos direitos que titula, se a solução que preconiza é harmónica, além do mais, ao seu direito de conviver com ambos os pais e à participação destes, em condições de igualdade, na sua vida[11](cf. art.º 1906º, n.º 8, do CC).

            Na situação em análise, nada nos diz que não possamos atender à vontade expressa pelo menor (como melhor se explicitará adiante).

            Outrossim, nada justifica qualquer modificação ou acrescento ao ponto de facto 3), atendendo, sobretudo, ao teor dos mencionados relatórios sociais.

            Quanto ao ponto de facto 4), vistas as declarações do progenitor [cf. II. 2. e), supra], cremos que também não se justifica a sua alteração; para além do mais, o que se deu como provado - como bem refere a Exma. Magistrada do M.º Público - “em nada contende/releva ser com pernoita ou não”.

            Improcede, assim, a pretensão da apelante quanto à modificação da decisão da matéria de facto.

           4. Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária, pelo que há que atender à realidade pretérita e a todo o devir da vida do menor e seus progenitores, proferindo-se, sempre, a decisão mais conveniente e oportuna e dando o devido relevo às circunstâncias supervenientes[12] - cf. art.ºs 12º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível/RGPTC (aprovado pela Lei n.º 141/2015, de 08.9) e 987º e 988º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC).[13]

5. Na sentença, o exercício das responsabilidades parentais é regulado de harmonia com os interesses da criança, devendo determinar-se que seja confiada a ambos ou a um dos progenitores, a outro familiar, a terceira pessoa ou a instituição de acolhimento, aí se fixando a residência daquela (art.º 40º, n.º 1, do RGPTC).

           Quando o acordo ou a decisão final não sejam cumpridos por ambos os pais, ou por terceira pessoa a quem a criança haja sido confiada, ou quando circunstâncias supervenientes tornem necessário alterar o que estiver estabelecido, qualquer um daqueles ou o Ministério Público podem requerer ao tribunal, que no momento for territorialmente competente, nova regulação do exercício das responsabilidades parentais (art.º 42º, n.º 1, do RGPTC).

           6. Segundo o art.º 1906°, n.º 5, do CC[14], o tribunal determinará a residência do filho e os direitos de visita de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro.

            Preceitua o n.º 6 do mesmo art.º[15] que quando corresponder ao superior interesse da criança e ponderadas todas as circunstâncias relevantes, o tribunal pode determinar a residência alternada do filho com cada um dos progenitores, independentemente de mútuo acordo nesse sentido e sem prejuízo da fixação da prestação de alimentos.

           E nos termos do n.º 8, do mesmo art.º[16], o tribunal decidirá sempre de harmonia com o interesse do menor, incluindo o de manter uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades entre eles.[17] [18]

           7. A lei não define o que deva entender-se por interesse do menor, cabendo ao juiz em toda a amplitude que resulta daqueles preceitos legais identificar e definir, em cada caso, esse interesse superior da criança, por alguns já definido como “o direito do menor ao desenvolvimento são e normal no plano físico, intelectual, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade”[19] ou como tratando-se de uma “noção cultural intimamente ligada a um sistema de referências vigente em cada momento, em cada sociedade, sobre a pessoa do menor, sobre as suas necessidades, as condições adequadas ao seu bom desenvolvimento e ao seu bem estar material e moral”.[20]

           8. As “responsabilidades parentais” não são “um conjunto de faculdades de conteúdo egoísta e de exercício livre, ao arbítrio dos respetivos titulares, mas um conjunto de faculdades de conteúdo altruísta que tem de ser exercido de forma vinculada, de harmonia com a função do direito, consubstanciada no objetivo primacial de proteção e promoção dos interesses do filho, com vista ao seu desenvolvimento integral”.[21]

           Em causa o exercício de poderes-deveres visando a promoção do interesse da criança, a que se reportam diversos normativos da lei ordinária (cf. ainda, v. g., os art.ºs 1885º, n.º 1 e 1918º, n.º 1, do CC, que estabelecem o dever dos pais de promoverem o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos e de não colocarem em perigo a segurança, a saúde, a formação moral ou a educação do menor), da Lei Fundamental (cf., v. g., os art.ºs 36º, n.º 5 e 69º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa/CRP, consagrando, o primeiro, o direito fundamental da criança à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral e, o segundo, o poder-dever dos pais de educação e manutenção dos filhos) e do Direito Internacional.

           9. Com a alteração introduzida pela Lei n.º 65/2020, de 04.11, ao art.º 1906º do CC, deixou de ter sentido a questão de saber se a residência alternada[22] podia ser decretada pelo tribunal fora das hipóteses em que os pais estão de acordo.

            A residência alternada tem vindo a ser projetada como realidade do futuro [tendência que se verificará no futuro[23] - pesem embora os benefícios e contraindicações apontados na doutrina e jurisprudência], pois será a preferida dos menores e dos progenitores se as circunstância factuais o permitirem/potenciarem, designadamente, quando os progenitores moram na mesma cidade ou a distâncias que possam ser percorridas sem alterar as rotinas e mostram capacidade para superarem divergências entre si.

           Contra esta medida argumenta-se, essencialmente, que ela destrói as rotinas das crianças, pode ser causa de cansaço e desgaste e gera focos de tensão entre os pais devido à diversidade de diretrizes que podem dar aos filhos em questões de educação e outras quando estão com cada um dos progenitores.

            Sem dúvida que isso pode acontecer e quando se revelar nocivo para os interesses dos filhos não deve implementar-se a alternância de residências, mas só nestes casos é que existirão razões para não enveredar pela alternância de residências.

           Concluindo, dir-se-á que a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais desde que tal situação sirva os interesses dos filhos e possa ser implementada, mesmo que não exista acordo dos pais, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes.[24]

           10. Na decisão sob censura, o Tribunal a quo indicou alguma doutrina e jurisprudência nacional do direito da família e menores e os preceitos legais atinentes (v. g., art.ºs  1878º, 1905º e 1906º, do CC; 42º do RGPTC).

           Depois, tendo presente a factualidade apurada, expendeu, designadamente, o seguinte:

            - A criança manifestou vontade de passar a residir com a mãe e com o pai de forma alternada; demonstra já maturidade para tomar tal decisão em consciência e com razoabilidade;

            - Fixada a residência alternada o pai poderá passar a ter horário flexível, trabalhando apenas durante o dia, ficando ultrapassados os obstáculos que estavam no caminho para a residência alternada;

            - Os progenitores têm retaguarda familiar com a qual a criança se dá bem e que cria um bom ambiente para esta;

           - O sistema da criança passar uma semana em casa de cada progenitor é adequado e não compromete a segurança, estabilidade e bem-estar da criança;

            - No regime atual a criança passa cerca de duas a três vezes por semana com o pai;

           - Requerente e requerida demonstraram que conseguem ultrapassar divergências que possam ter, em prol do seu filho.         

            11. A descrita ponderação assenta nos elementos disponíveis.

            Atendendo, nomeadamente, à idade do CC e à vontade por ele claramente manifestada (em passar o mesmo tempo com o pai e com a mãe, residindo uma semana com a mãe e outra semana com o pai) e bem assim às possibilidades laborais dos progenitores [cf. II. 1. 1), 6) e 11), supra, e documento de fls. 39/42] e à proximidade das suas residências, afigura-se, salvo o devido respeito por entendimento contrário, que nada obsta ao deferimento da pretensão do requerente.

            Ademais:

           - O desenvolvimento afetivo da criança com ambos os progenitores consubstancia um interesse marcadamente superior à (eventual, mas sempre diminuta) instabilidade criada pela existência de duas residências;

           - A circunstância de poder haver nova alteração nas condições de exercício da atividade laboral do pai (por volta de 2026/2027), não belisca o entendimento de que será sempre preferível, para o interesse superior do menor, viver com ambos os pais o máximo de tempo possível, do que viver com apenas um, independentemente das eventuais adaptações no futuro;

            - O regime da guarda partilhada/alternada servirá igualmente para uma pacificação das relações entre os progenitores, igualizando-os entre si e perante o menor, trazendo-os a um campo de entendimento, favorecendo-os como pais e cidadãos que partilham entre si algo de perene e imutável: a educação e criação de um filho comum;

           - Os progenitores apresentam qualidade e consistência nas relações afetivas estabelecidas com o CC; apresentam disponibilidade, saúde física e mental para cuidar do mesmo, bem como um estilo de vida e comportamento compatível com o exercício efetivo das responsabilidades parentais; 

            - Como tal, também aqui o regime de guarda partilhada/alternada (semanal) surge como o mais razoável para esse processo de desenvolvimento das capacidades parentais e de coparentalidade, sempre a benefício do CC;

           - Os progenitores dispõem de condições familiares, sociais, económicas e habitacionais conformes para os bons cuidados e desenvolvimento do menor;

           - O regime de guarda partilhada/alternada (semanal) é aquele que melhor se adequa ao superior interesse do CC tanto pela sua viabilidade/exequibilidade como pelos ganhos no exercício da coparentalidade;

            - Importa regular o exercício das responsabilidades parentais de acordo com as necessidades atuais da criança, pois circunstâncias supervenientes permitirão a alteração e atualização do regime;

            - E, cremos, passou a existir alguma colaboração, sensatez e prudência na prossecução da estabilidade afetiva e emocional da criança; não obstante, estamos com aqueles que não exigem uma quase plena concordância dos pais para a implementação de um regime de residência alternada, vendo-se antes como normal e compreensível que possa haver algum dissídio que aos tribunais caberá minorar ou dissipar/resolver, mas que não poderá ser fator primordial na tomada da decisão quanto à guarda e residência do menor, sendo que o decurso do tempo tende a diluir os ressentimentos e a promover a tolerância e a compreensão das atitudes alheias, mormente quando anteriormente não se dispunha de informação suficiente que só o tempo trouxe.[25]

           12. Assim, afigura-se acertada a decisão de estabelecer um regime de “residência alternada”, sendo que não se questiona o decidido quanto ao regime de visitas/contactos e aos alimentos.

           13. Na determinação da residência das crianças, os princípios basilares a ter em consideração são o superior interesse da criança, a igualdade entre os progenitores, assim como a disponibilidade manifestada por cada um para promover relações habituais do filho com o outro progenitor, prevalecendo, no entanto, sempre o superior interesse da criança.[26]

            Também no presente caso a residência alternada é a que melhor serve os interesses da criança porquanto passa a ter muito maior contacto com os progenitores; é o regime que melhor acautela os interesses do menor, levando em conta o bem-estar da criança, ainda que, nesta matéria, não se possa ter uma posição definitiva por ou contra a residência alternada, porque tudo é uma questão de circunstâncias.[27]

           Por outro lado, não se deve exagerar o facto de a mudança de residência criar instabilidade e, por isso, representar inconveniente para a criança, pois que a instabilidade é uma realidade na vida de uma criança com pais separados, que, sempre, terão de se integrar em duas residências, sendo essa mais uma adaptação a fazer nas suas vidas; as crianças são dotadas de grande aptidão para se integrarem em situações novas e, quando são mais novas, têm tendência a adaptar-se melhor às circunstâncias - será mais fácil a uma criança de tenra idade que não tem grande memória de ver os pais juntos adaptar-se à realidade das duas residências do que propriamente uma criança com mais idade.[28]

           E podemos acrescentar que esta medida só não produzirá bons resultados se os pais não forem compreensivos e colaborantes um com o outro e se não colocarem o interesse do menor à frente dos seus interesses particulares (dando prioridade aos interesses do filho em detrimento dos seus problemas e conflitos entre ambos).[29]

           Importa, pois, dar a necessária relevância e concretização ao interesse superior do menor poder privar e manter contactos com ambos os progenitores - quando estes tenham capacidade para assegurar o desenvolvimento psicoafectivo da criança -, de modo a assegurar o seu bem-estar e desenvolvimento integral (art.º 1906º, n.º 8, do CC)[30], sabendo-se que o presente (e qualquer) regime poderá/deverá ser ajustado se e quando as circunstâncias o ditarem.

           14. Convictos de que a decisão recorrida respeitará o indeclinável objetivo de alcançar “o melhor para a criança” e que, como tal, não merece censura, caberá aos pais, requerente e requerida, no interesse daquela e do seu próprio interesse, manter a colaboração e a entreajuda necessárias visando aquele objetivo fundamental.[31]

           15. Soçobram, desta forma, as “conclusões” da alegação de recurso, não se mostrando violadas quaisquer disposições legais.


*

            III. Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando-se a decisão recorrida.

            Custas pela requerida/recorrente. 


*

05.3.2024



[1] Retifica-se.
[2] Retificou-se.
[3] Idem.

[4] Recurso admitido a subir «de imediato, nos próprios autos e com efeito devolutivo» (despacho de 11.12.2023).
[5] Retifica-se.
[6] Retificou-se (cf. fls. 19).

[7] Vide, entre outros, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, págs. 284 e 386 e Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, Vol. II, 4ª edição, 2004, págs. 266 e seguinte.
[8]Refere-se no acórdão da RP de 20.3.2001-processo 0120037 (publicado no “site” da dgsi): A prova, por força das exigências da vida jurisdicional e da natureza da maior parte dos factos que interessam à administração da justiça, visa apenas a certeza subjetiva, a convicção positiva do julgador. Se a prova em juízo de um facto reclamasse a certeza absoluta da verificação do facto, a actividade jurisdicional saldar-se-ia por uma constante e intolerável denegação da justiça.   
[9] Sublinhado nosso, como o demais a incluir no texto.
[10] Vide, nomeadamente, T. Berry Brazelton e Syanley I. Greenspan, A Criança e o Seu Mundo – Requisitos Essenciais para o Crescimento e Aprendizagem, Editorial Presença, 5ª edição, 2006, pág. 246.

[11] Cf. acórdão da RC 12.4.2023-processo 604/17.2T8LMG.C1 [referindo-se no sumário: «(...) IV - O juiz não está inexoravelmente vinculado à preferência manifestada pela criança acerca de um qualquer ponto ou vertente da regulação das responsabilidades parentais, máxime, sobre a sua residência, impondo-se sempre a verificação da adequação ou conformidade dessa preferência com um exercício ótimo dos direitos que titula, designadamente com seu direito de conviver com ambos os pais e à participação destes, em condições de igualdade, na sua vida. V - A vontade manifestada pela criança – desde que seja racional e genuinamente sua e se mostre conforme com o seu interesse, objetivamente apreciado – é, decerto, um fator importante, mas não o único fator a considerar.»], publicado no “site” da dgsi.

[12] Isto é, no dizer da lei, tanto as circunstâncias ocorridas posteriormente à decisão como as anteriores, que não tenham sido alegadas por ignorância ou outro motivo ponderoso (art.º 988º, n.º 1, 2ª parte, do CPC).

[13] Nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, tendo a liberdade de se subtrair a esse enquadramento rígido e de proferir a decisão que lhe pareça mais equitativa (mais conveniente e oportuna), a que melhor serve os interesses em causa; salvaguardados os efeitos já produzidos, será sempre possível a alteração de tais resoluções com fundamento em circunstâncias supervenientes.
[14] Na redação conferida pela Lei n.º 61/2008, de 31.10.
[15] Redação conferida pela Lei n.º 65/2020, de 4 de novembro, que veio definir as condições em que o tribunal pode determinar a residência alternada do filho em caso de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento dos progenitores, alterando o Código Civil.
[16] Na renumeração da Lei n.º 65/2020, de 04.11.

[17] Estatuição que faz lembrar os Princípios 2 e 8 da Recomendação n.º R (84) sobre as responsabilidades parentais, adotada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa em 28.02.1984, na 367ª reunião dos Delegados Ministeriais, e que havia sido preparada pelo Comité de Peritos sobre o Direito da Família instituído sob os auspícios do Comité Europeu de Cooperação Jurídica - Qualquer decisão da autoridade competente relativa à atribuição das responsabilidades parentais ou ao modo como essas são exercidas, deve basear-se, antes de mais, nos interesses dos filhos. O progenitor com quem a criança não reside deve, pelo menos, ter a possibilidade de manter relações pessoais com o filho, exceto quando essas relações prejudiquem seriamente os interesses deste.
[18] Regime aplicável a progenitores que, tendo vivido em condições análogas às dos cônjuges, cessem a sua convivência, assim como a progenitores que não vivam (nem viveram) em condições análogas às dos cônjuges - art.ºs 1911º e 1912º do CC (redação introduzida pela Lei n.º 5/2017, de 02.3).

[19] Vide Almiro Rodrigues, Interesse do Menor – Contributo para uma Definição, Revista de Infância e Juventude, n.º 1, 1985, págs. 18 e seguinte.
[20] Vide Rui Epifânio e António Farinha, Organização Tutelar de Menores – Contributo para uma visão interdisciplinar do direito de menores e de família, Almedina, 1987, pág. 326.
[21] Vide Armando Leandro, Poder Paternal: natureza, conteúdo, exercício e limitações. Algumas reflexões de prática judiciária, Temas do Direito da Família – Ciclo de Conferências no Conselho Distrital do Porto da Ordem dos Advogados, Almedina, pág. 119.

[22] Abandonando o conceito de “guarda” da criança, adota-se o conceito de “residência” do filho [segundo Guilherme de Oliveira, a evolução foi no sentido de um abandono progressivo do uso das palavras “guarda”, direitos de “visita”, ao mesmo tempo que as leis passaram a recomendar ou a exigir “planos de parentalidade” que cumpram o objetivo de regular a convivência dos dois progenitores com o filho, sendo que a ideia de um dos progenitores com um papel principal foi desaparecendo nos Estados Unidos e na Europa – «Ascensão e queda da doutrina do “cuidador principal”, Lex Familiae, Revista Portuguesa de Direito da Família, Coimbra Editora 2011, Ano 8, nº16, p.16], que deverá ser determinada “de acordo com o interesse deste, tendo em atenção todas as circunstâncias relevantes, designadamente o eventual acordo dos pais e a disponibilidade manifestada por cada um deles para promover relações habituais do filho com o outro” (art.º 1906º, n.º 5 do CC) - cf., por exemplo, acórdão da RC de 27.4.2017-processo 4147/16.3T8PBL, publicado no “site” da dgsi.
   De qualquer modo cumpre igualmente distinguir os conceitos, que continuam a ser usados na doutrina e na jurisprudência, de “guarda exclusiva” – exercício exclusivo das responsabilidades parentais com residência exclusiva –, “guarda conjunta” – exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência exclusiva a um dos progenitores e um regime de visitas a outro –, “guarda alternada” – residência alternada com exercício exclusivo nos respetivos períodos de residência de cada um dos pais –, e “guarda compartilhada” como exercício conjunto das responsabilidades parentais com residência alternada [assim sintetizado por Joaquim Manuel da Silva, A Família das Crianças na Separação dos Pais, a Guarda Compartilhada, Petrony Editora, 2016, pág. 45] - cf., nomeadamente, acórdão da RL de 07.8.2017-processo 835/17.5T8SXL-A-2, publicado no “site” da dgsi.
[23] A este propósito Katharina Boele-Woelki refere que «Normalmente, a residência habitual da criança é com um dos progenitores, mas os progenitores, num número cada vez maior de casos, acordam em fixar um modelo de residência alternada para o filho numa base de, por exemplo, 50:50 ou 60:40» - ´A harmonização do direito da família na Europa: uma comparação entre a nova lei portuguesa do divórcio com os princípios da CEFL sobre direito da família europeu`. In: Nova lei do divórcio (Grupo parlamentar do Partido Socialista), 2008, pág. 41.

[24] Neste sentido, cf., nomeadamente, os acórdãos da RG de 02.11.2017-processo 996/16.0T8BCL-C.G  [“(...) “só a residência alternada conclama os progenitores para a participação mútua na vida dos filhos, porque permite que os pais continuem a dividir atribuições, responsabilidades e tomadas de decisões em iguais condições, ou seja, tal regime permite concretizar o princípio da igualdade de ambos os progenitores, no exercício das responsabilidades parentais”. “(...) é o regime que melhor evita conflitos de lealdade e sentimentos de abandono ou de rutura afetiva (...).”], RP de 29.9.2022-processo 1777/21.5T8GDM.P1, RC de 27.4.2017-processo 4147/16.3T8PBL-A.C1, 24.10.2017-processo 273/13.9TBCTB-A.C1, 12.6.2018-processo 261/17.6T8VIS-A.C1, 11.12.2018-processo 1032/17.5T8CBR.C1, RC de 23.02.2021-processo 1671/18.7T8VIS-D.C1 [salientando que será, normalmente, a solução “mais adequada ao interesse da criança de manter uma relação o mais próxima possível com ambos os progenitores, de molde a que possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe pode proporcionar. (...) é a solução que melhor permite a manutenção de uma relação de grande proximidade com os dois progenitores, promovendo amplas oportunidades de contacto com ambos e de partilha de responsabilidades, sempre tendo em vista um ´tempo de qualidade` no convívio entre aquele com ambos os progenitores.”] e 12.7.2022-processo 264/22.9T8CNT-A.C1 [expendeu-se, nomeadamente, que «na residência alternada o menor continuará a estar com ambos os pais por períodos prolongados e equivalentes e poderá continuar a estabelecer com eles relações de salutar intimidade, pois quanto mais elevada for a frequência dos contactos, melhor conhecimento recíproco existirá» e que «a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais desde que tal situação sirva os interesses dos filhos e possa ser implementada, mesmo que não exista acordo dos pais, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes»; sumariou-se: «Tendo a criança 11 meses de idade; não tendo existido coabitação entre os progenitores, nem contatos frequentes entre a criança e o pai, a separação entre a criança e a mãe, para que possa conviver com o pai, deve fazer-se de modo gradual, dilatando-se progressivamente no tempo, sendo desaconselhável, nestas circunstâncias, a fixação do regime de residência alternada.»], RL de 28.6.2012-processo 33/12.4TBBRR.L1-8, 17.12.2015-processo 6001/11.6TBCSC, 24.01.2017-processo 954-15.2T8AMD-A.L1-7 [consta do sumário: «(...) o objetivo final do legislador é o de cimentar o contacto, tão próximo quanto possível, do filho com ambos os progenitores, de modo a que possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe proporcionará. V - Havendo disponibilidade e condições de ordem prática e psicológica de ambos os pais, e não havendo circunstâncias concretas que o desaconselhem, a guarda/residência conjunta é o instituto com melhor aptidão para preservar as relações de afeto, proximidade e confiança que ligam o filho a ambos os pais, sem dar preferência à sua relação com um deles, em detrimento do outro, o que necessariamente concorrerá para o desenvolvimento são e equilibrado do menor e melhor viabilizará o cumprimento, por estes últimos, das responsabilidades parentais.»], 07.8.2017-processo 835/17.5T8SXL-A-2, 06.02.2020-processo 6334/16.5T8LRS-A.L1-2, 18.6-2020-processo 2973/18.8T8BRR.L1-2 e 12.01.2023-processo 7918/20.2T8SNT-E.L1-6 [constando do sumário: «Mesmo não existindo acordo entre os pais, a alternância de residências é uma solução adequada ao exercício conjunto das responsabilidades parentais – artigo 1906º do Cód. Civil –, salvo se o desacordo se fundamentar em razões factuais relevantes ou se mostrar que a medida não promove os interesses do filho, porquanto, em abstrato, é a situação que se encontra mais próxima da vivência em comum entre pais e filhos e melhor promove as vantagens daí resultantes para a criação, desenvolvimento e solidificação dos vínculos afetivos próprios da filiação.»] e da RE de 14.7.2020-processo 546/19.7T8PTM.E1 [sumariando-se: «(...) 2. A lei não exige o acordo de ambos os pais na fixação da residência alternada do filho, devendo a solução ser encontrada de acordo com o seu interesse e ponderando todas as circunstâncias relevantes. 3. A tal não obsta a circunstância da criança ter dois anos de idade, não apenas porque a partir desta idade é importante iniciar o processo de desmame, como estímulo à sua independência e promoção da sua inteligência e estruturação emocional, como os estudos realizados sobre esta matéria indicam que crianças que, desde cedo, vivem em regime de residência alternada possuem melhores indicadores de bem-estar emocional do que as que crescem em modelo de residência única.»] e 25.02.2021-processo 1583/19.7T8FAR.E1 [concluindo-se: «O critério orientador para a escolha do regime da residência alternada assenta no superior interesse da criança em manter com ambos os progenitores uma relação em moldes igualitários de grande proximidade com cada um deles e revela-se no acervo de circunstâncias factuais concretas e relevantes provadas nos autos, não sendo de afastar tal aplicabilidade mesmo em crianças de tenra idade.»], publicados no “site” da dgsi.  

   Numa perspetiva crítica e salientando os seus possíveis “malefícios”, cf., de entre vários, o acórdão da RP de 10.01.2012-processo 336/09.5TBVPA-B.P1, publicado no “site” da dgsi.

[25] Em determinadas situações, a jurisprudência mais recente vê a residência alternada como “a que mais potencial tem para diminuir a conflitualidade parental” - cf., por exemplo, os citados acórdãos da RL de 12.01.2023-processo 7918/20.2T8SNT-E.L1-6, 18.6-2020-processo 2973/18.8T8BRR.L1-2 [depois de aludir às posições da doutrina e da jurisprudência, considera existir «uma perspetiva mais otimista, que tende a considerar que a residência alternada terá a virtualidade de pacificar a situação de conflitualidade existente entre os progenitores, que alegadamente decorreria da guarda exclusiva atribuída à mãe, atenuando esse antagonismo, ou pelo menos não o agravando»; indica diversos arestos que perfilham esse entendimento, alguns dos quais referidos na “nota 29”, supra] e 24.01.2017-processo 954-15.2T8AMD-A.L1-7Cremos ainda não poder dizer-se, sem mais, que a guarda/residência alternada fomenta o conflito entre os progenitores; ao invés, cremos que pode até concorrer para desvanecer os conflitos eventualmente existentes, pois que, com ela, nenhum deles se sentirá excluído ou preterido no seu direito de se relacionar com o filho e de participar ativamente, em termos práticos e psicológicos, no seu desenvolvimento como ser humano, sendo sabido que o progenitor “preterido”, movido pelo sentimento de exclusão que a maioria das vezes o assola, é levado a deixar de cumprir as suas obrigações parentais.»].

[26] Vide, designadamente, Helena Bolieiro e Paulo Guerra, em A Criança e a Família – uma questão de Direito(s), Coimbra Editora, 2009, pág. 185 e seguintes e, de entre vários, acórdãos da RC de 28.02.2023-processo 1810/21.0T8ACB.C1 e 12.4.2023-processo 604/17.2T8LMG.C1, publicados no “site” da dgsi.
[27] Cf. o citado acórdão da RL de 07.8.2017-processo 835/17.5T8SXL-A-2, designadamente, a respeito da discussão sobre a problemática a nível nacional e internacional, aresto que também nos dá conta das atuais tendências do direito da família e menores nalguns dos países europeus e do seu tratamento a nível das Organizações Internacionais.

[28] Cf. o cit. acórdão da RG de 02.11.2017-processo 996/16.0T8BCL-C.G.

   Versando sobre casos de crianças de tenra idade e/ou ponderando a aplicabilidade, nessas situações, do regime de residência alternada, cf., de entre vários, os citados acórdãos da RC de 12.7.2022-processo 264/22.9T8CNT-A.C1 e 28.02.2023-processo 1810/21.0T8ACB.C1 e da RE de 14.7.2020-processo 546/19.7T8PTM.E1 e 25.02.2021-processo 1583/19.7T8FAR.E1.
[29] Cf., por exemplo, os citados acórdãos da RC de 24.10.2017-processo 273/13.9TBCTB-A.C1 e 28.02.2023-processo 1810/21.0T8ACB.C1 e da RG de 02.11.2017-processo 996/16.0T8BCL-C.G.  
[30] A Segurança Social, em resultado do acompanhamento da situação da criança, pronunciou-se favoravelmente à fixação da residência alternada - cf. II. 2. f), supra.
[31] Os pais devem saber pôr os filhos em primeiro lugar, mostrar civismo em prol dos filhos, pela simples razão de que “os filhos precisam de ambos”, cabendo ao tribunal “ajudar os pais a trabalhar em conjunto tendo em vista o bem-estar dos seus filhos” - vide, a propósito, T. Berry Brazelton e Syanley I. Greenspan, ob. cit., págs. 52 e seguintes.