Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1292/20.4T8VIS.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUÍS CRAVO
Descritores: CONTRATO PROMESSA DE DOAÇÃO
EXECUÇÃO ESPECÍFICA
CONSTITUIÇÃO DA PROPRIEDADE HORIZONTAL POR SENTENÇA JUDICIAL
IMPOSSIBILIDADE ORIGINÁRIA DA PRESTAÇÃO
NULIDADE DO CONTRATO PROMESSA DE DOAÇÃO
Data do Acordão: 11/07/2023
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE VISEU
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA EM PARTE
Legislação Nacional: ARTIGO 59.º, 1 E 2, DO CÓD. DO NOTARIADO
ARTIGOS 62.º A 66.º, DO RGEU
ARTIGOS 3.º, 3; 609.º, 2 E 665.º, 2, DO CPC
ARTIGOS 216.º; 289.º, 1; 342.º, 1; 397.º; 401.º; 405.º; 474.º; 482.º; 497.º, 2; 754.º; 756.º; 757.º; 795.º, 1; 830.º, 1; 1273.º; 1415.º E 1471.º, DO CÓDIGO CIVIL
Sumário: I – O contrato-promessa de doação não é passível de execução específica atenta a natureza da obrigação assumida pelo doado, isto porque a sua natureza pessoal justifica que as partes conservem a possibilidade de desistir do contrato definitivo até à celebração deste.
II – A constituição de propriedade horizontal por decisão do Tribunal só é admissível em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, a requerimento de qualquer consorte ou interessado, desde que sejam unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública, comprovados na forma legalmente prevista (cf. os arts. 1415º e 1417º do C.Civil) – são estes os requisitos civis ou substantivos para a constituição da propriedade horizontal.
III – A eles acrescem os designados por requisitos administrativos, impostos pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas, decorrentes de exigências de segurança, salubridade, arquitetónica, estética, urbanística – traduzidos na exigência de certificação pela câmara municipal de que o edifício satisfaz os requisitos legais para a sua constituição em propriedade horizontal (cf. arts. 62º a 66º do Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação aprovado pelo DL nº 555/99, de 16 de Dezembro).
IV – Se nem isto tudo foi alegado ocorrer, nem seguramente se mostra verificado, estava-se in casu, perante uma impossibilidade originária da prestação, a qual sempre produziria a nulidade do negócio (art. 401º, nº 1 do C.Civil).
V – A nulidade do contrato-promessa de doação torna impossível o cumprimento da promessa de compra e venda, se neste último contrato está em causa o mesmo imóvel objeto do primeiro contrato.
VII – Neste quadro, o incumprimento da promessa de compra e venda não corresponde a uma opção ou vontade da parte dos que nele figuram como promitentes vendedores, antes é uma situação a que os mesmos se encontravam sujeitos por circunstâncias exteriores a si e independentes da respetiva vontade, donde esse incumprimento não lhes é juridicamente imputável.
VII – Quando não estão determinadas as “balizas” dentro das quais vai funcionar o juízo de equidade – os “limites mínimo e máximo” – deve optar-se pela condenação «no que vier a ser liquidado», no quadro previsto no art. 609º, nº2 do n.C.P.Civil.
Decisão Texto Integral: Apelações em processo comum e especial (2013)

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Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]

                                                           *

1 – RELATÓRIO

AA propôs ação declarativa de condenação contra BB, CC, DD e EE, peticionando que deve a presente ação ser julgada provada e procedente e, em consequência:

a) Ser proferida sentença que produza as declarações negociais prometidas pelos réus no contrato promessa junto com documento n.º 3;

b) Serem os réus condenados a reconhecer que a autora é dona dos prédios identificado no artigo 5.º, 6.º e 7.º;

c) Serem os réus condenados a abster-se de praticar quaisquer atos que por qualquer forma possam prejudicar o direito de propriedade da autora.

Mas para a eventualidade de improcederem os pedidos principais, seja por impossibilidade jurídica, seja por impossibilidade respeitante ao objeto, a autora deduz pedidos alternativos, a saber:

a) seja declarado o incumprimento e a resolução do contrato promessa de doação por incumprimento dos promitentes doadores, os ora primeiro e segunda réus; e os ora réus;

b) serem os primeiro e segunda réus condenados a reconhecer que as benfeitorias incorporadas no seu prédio, foram úteis e necessárias e lhe aumentaram o valor em proporção igual ao custo das mesmas por via disso condenados a restituir à autora a quantia de € 73.291,00, a título de indemnização por realização de benfeitorias necessárias e úteis incorporadas no imóvel prometido doar;

c) serem os primeiro e segunda réus condenados a reembolsar a autora no montante de € 1.917,00, que está pagou a título de IMI;

d) Serem os primeiro e segunda réus condenados a pagar juros sobre a quantia mencionada em b) e c), desde a citação até efetivo pagamento;

e) seja declarada a resolução do contrato promessa de compra e venda por incumprimento dos promitentes vendedores, os ora terceira e quarto réus;

f) serem os terceira e quarto réus condenados a pagar à autora por conta da restituição do preço pago na execução do contrato promessa a quantia de € 25.000;

g) Serem os terceira e quarto réus condenados a pagar juros sobre a quantia mencionada em b), desde a citação até efetivo pagamento;

h) Deve ser reconhecido à autora o direito de retenção sobre o imóvel em causa até que o valor peticionado nas alíneas b) e e) seja liquidado pelos réus à autora.

Para tanto alega, em síntese que, os primeiro e segunda réus são casados entre si e progenitores da autora e os terceira e quarto réus são casado entre si e, respetivamente, irmã e cunhado da autora AA.

Em 2 de Maio de 2008, por documento escrito denominado contrato promessa de doação e compra e venda, os primeiro e segunda réus prometeram doar às suas filhas DD e AA, a fração ou andar com utilização independente, identificada com o acrónimo AND, do prédio urbano inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...02, bem como o sótão do mencionado prédio urbano; a promessa de doação foi na proporção de metade indivisa para cada uma das donatárias e, no mesmo documento a donatária DD, terceira ré, prometeu vender, pelo preço de 25.000 € (vinte e cinco mil euros) a sua parte (a metade indivisa) no andar doado (tipo T3 com sótão) à sua irmã, aqui autora AA; o preço a pagar pela prometida venda de metade do andar com sótão foi integralmente pago pela promitente compradora AA, à promitente vendedora DD; logo na data da prometida doação e venda, a autora AA e família fixaram residência no andar em causa, ali passando a autora a habitar com os filhos e companheiro, fazendo a sua casa de morada de família, ali dormindo, fazendo as refeições, descansando, criando e cuidando dos filhos, recebendo visitas de familiares e amigos e tudo o demais que é comum e usual fazer-se na casa em que se habita, tendo ainda procedido à conservação, restauro e beneficiação da mencionada casa (o andar com sótão), tal como passou a pagar a quota parte do IMI sobre a “sua” fração, tendo pago, à data, a este título, o montante total de 1.917,00 €.

Mais alega que, no decurso da utilização do andar com sótão, a autora AA efetuou diversas de obras de beneficiação no imóvel que lhe foi prometido doar e vender, e, entre 2008 e 2013, a autora efetuou no edifício obras de beneficiação, nas quais despendeu o montante de € 73.291,00.

Que, por conveniência e aceitação de todos os outorgantes no contrato promessa a celebração dos negócios prometidos foi sendo postergada no tempo e, agora, as segunda e terceira rés, a sua mãe e irmã, recusaram cumprir as promessas estabelecidas e firmadas no contrato promessa efetuado.

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Citados para contestar, os Réus CC, EE e mulher DD, ofereceram contestação, por exceção e por impugnação, excecionando a ilegitimidade do Réu EE; a nulidade do contrato denominado “contrato de promessa de doação, compra e venda”, datado de 2 de Maio de 2008, a prescrição do direito à indemnização das benfeitorias úteis, que não sejam passiveis de levantamento sem detrimento da coisa realizadas pela autora, uma vez que as obras foram feitas pela Autora no seu próprio interesse e em seu proveito exclusivo, por forma a adaptar aquele andar ao gosto dela e às comodidades por ela perfilhadas e queridas; que os Réus DD e marido nunca se recusaram a cumprir a promessa de venda constante do contrato promessa de compra e venda, estando impedidos fazer aquela prometida venda enquanto os pais da Ré DD não lhe fizerem a doação desse bem, tornando-a comproprietária do mesmo, pugnando pela procedência da exceção de ilegitimidade passiva do réu EE, pela procedência das exceções perentórias alegadas, com a absolvição dos réus dos pedidos deduzidos pela autora; ser julgada improcedente, por não provada, a ação, absolvendo-se os réus de todos os pedidos deduzidos pela autora, sendo julgada procedente, por provada a reconvenção e ser a autora condenada a pagar aos réus BB e FF, a quantia de € 53.550,00 (cinquenta e três mil quinhentos e cinquenta euros), a titulo de indemnização/restituição pela ocupação indevida do prédio daqueles, acrescida de juros; declarar-se que a autora não cumpriu o contrato promessa de compra e venda e, consequentemente, que a ré DD tem o direito de fazer suas todas as quantias que lhe foram entregues pela autora a titulo de sinal, antecipação ou principio de pagamento do preço, no montante de € 18.600,00 (dezoito mil e seiscentos euros), acrescida de juros de mora.

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Citado, o réu BB não contestou.

A autora AA apresentou Réplica, pugnando pela improcedência das exceções deduzidas e do pedido reconvencional.

A autora AA, veio requerer a ampliação do pedido, peticionando que sejam os terceiros e quarto réus condenados a pagar à autora a quantia de € 50.000,00 a título de restituição em dobro do preço pago na execução do contrato promessa.

Foi admitida a ampliação do pedido.

Procedeu-se à realização de audiência prévia, tendo sido apreciada a arguida exceção de ilegitimidade, com fixação do objeto do litígio e enunciação dos temas de prova, relegando-se para momento ulterior a apreciação das demais exceções invocadas.

                                                           *

Procedeu-se à realização de audiência de julgamento, com observância de todas as formalidades legais, como consta das Atas.

Na sentença, considerou-se, em suma, que pese embora existir discordância dogmática, in casu devia ser atendido o propósito da A. de obter sentença que produza os efeitos das declarações negociais em falta, por as partes terem expressamente acordado em cumprir com os contratos, sendo certo que não afastaram expressamente a faculdade de execução específica, sendo «(…) assim de proceder o pedido principal deduzidos pela autora, ficando prejudicada a apreciação dos pedidos subsidiários deduzidos», porém, e ao invés, no que ao pedido reconvencional dizia respeito, «Em face da prova produzida em sede de audiência de julgamento, não lograram os réus reconvintes provar os fundamentos constitutivos do seu direito quanto aos factos que fundamentam os pedidos reconvencionais deduzido nos autos, razão pela qual se conclui pela total improcedência da ação, decidindo-se assim pela absolvição da Autora do pedido», o que tudo se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”:

«IV - Decisão

Face ao exposto, julgando procedente por provada a presente ação e improcedente, por não provado, o pedido reconvencional, decide-se:

1 – Julgar válido o contrato-promessa de doação e compra e venda celebrado entre a autora AA e os réus BB, CC, DD e EE.

2 - Declarar que esta sentença produz os efeitos da declaração negocial dos réus BB e CC, suprindo a sua manifestação de doar à Autora AA e à ré DD o prédio urbano inscrito, composto por 1º andar, sótão e logradouro, inscrito na matriz sob o artigo ...02 e o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...55 da freguesia ..., concelho e distrito ....

3 – Declarar que esta sentença produz os efeitos da declaração negocial dos réus DD e EE, suprindo a sua manifestação de vender à Autora AA o prédio urbano inscrito, composto por 1º andar, sótão e logradouro, inscrito na matriz sob o artigo ...02 e o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...55 da freguesia ..., concelho e distrito ....

4 - Condenar os Réus BB, CC, DD e EE, a reconhecerem que a autora é dona do prédio urbano inscrito, composto por 1º andar, sótão e logradouro, inscrito na matriz sob o artigo ...02 e o prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...55 da freguesia ..., concelho e distrito ....

5 – Condenar os réus BB; CC; DD; EE, a abster-se de praticar quaisquer atos que por qualquer forma possam prejudicar o direito de propriedade da autora.

6 - Absolver os Réus BB; CC, DD, EE da instância quanto ao demais peticionado.

7 - Absolver autora AA dos pedidos reconvencionais deduzidos.

8 – Custas da ação a cargo dos réus CC; DD; EE.

9 - Custas do pedido reconvencional a cargo das rés CC e DD, na proporção do respetivo decaimento.

V - Registe e notifique.»  

                                                           *

            Inconformados com essa sentença, apresentaram as 2ª, 3ª e 4º RR. recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:

«1 – A M. Juíza “a quo” deu como provado factos que deveriam ter merecido uma resposta diferente, uma vez que estão em manifesta contradição com a prova produzida nos autos;

2 – O Tribunal “a quo” não expõe na fundamentação da Matéria de Facto os motivos que o levaram a considerar os depoimentos do Réu BB, da Autora AA e do seu companheiro GG como idóneos e prevalecentes em detrimento dos prestados pelos demais Réus, não cumprindo cabalmente o disposto no nº 2 do artº 653º do Cód. Proc. Civil;

3 - A prevalência que é dada ao depoimento do Réu BB, pai da Autora AA e da Ré DD, e ex-marido da Ré CC, não levou em conta o depoimento confuso, por vezes titubeante e perfeitamente alinhado com a versão trazida aos autos pela Autora, claramente transparece a gravação do seu depoimento de parte, gravado na audiência de julgamento na faixa 20220520193-3186455-2871929;

4 – Da matéria dada como provada nos pontos 1.5, 1.38, 1.6, 1.7, 1.8, 1.9, 1.15, 1.16, 1.24, 1.25, 1.26, 1.27, 1.30, 1.31, 1.33, 1.45, 1.46, 1.47, 1.48, 1.49, 1.50, 1.52, 1.54 e 1.56 deve ter-se por não provada nos autos, ser conclusiva ou de direito;

5 – No que respeita à matéria constante dos pontos 1.8, 1.9, 1.16, 1.26, 1.27, 1.28 e 1.32, as gravações dos depoimentos prestados pelos Réus BB e DD, transcritas no texto expositivo das presentes alegações de recurso, impõem que a mesma seja considerada não provada;

6 – O contrato-promessa de doação e compra e venda, outorgado em 02.05.2008 é nulo por duas ordens de razão: a primeira porque a promessa de doação não é legalmente possível, uma vez que não é passível de regulamentação legal estabelecida para os contratos-promessa, designadamente nos artºs. 442º e 830º do Cód. Civil, com especial relevância para a inadmissibilidade de se impor aos promitentes doadores a celebração do contrato prometido; a segunda porque o objecto desse contrato-promessa é física e legalmente impossível, uma vez que o bem que é objecto dessa promessa não tem existência legal, na medida em que o prédio onde o mesmo se insere e da qual faz parte integrante não foi objecto de propriedade horizontal;

7 – Aliás, para a constituição da propriedade horizontal é necessário que além de requisitos civis do prédio, sejam cumpridos os requisitos de natureza administrativa impostos pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas;

8 – No caso destes autos o prédio dos Réus BB e CC não foi objecto de propriedade horizontal, pelo que não é legalmente possível nem a doação, nem a compra e venda do mesmo, pois que o andar que constitui o objecto do prédio prometido doar e o objecto da promessa de compra e venda não existe enquanto fracção autónoma;

9 - A promessa de doação constante do dito contrato-promessa não é susceptível de execução específica, justificando-se que os promitentes doadores e as promitentes donatárias possam desistir do mesmo até à sua celebração definitiva;

10 – No caso dos presentes autos, a impossibilidade de cumprimento da doação, por nulidade do respectivo contrato-promessa de doação, torna impossível o cumprimento da promessa de compra e venda, na medida em que esta pressupõe o prévio cumprimento daquela promessa de doação;

11 – A dita nulidade tem como única consequência o cumprimento do disposto no artº. 289º, nº 1 do Cód. Civil, implicando para os promitentes vendedores, os aqui Réus DD e marido EE a devolução à Autora AA a parte do preço efectivamente por eles recebida, ou seja a quantia de € 18.600,00;

12 – A douta sentença recorrida violou, entre outros, o disposto nos artºs. 280º, nº 1, 289º, nº 1, 830º, 1.415º, 1.417º, 1.419º, 1.422º do Cód. Civil; 2º, nº 1 do Cód. Registo Predial; e 59º, 60º e 62º do Cód. do Notariado.

NESTES TERMOS, NOS MAIS DE DIREITO E SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VªS. EXªS., DEVE SER DADO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, SER REVOGADA A DOUTA SENTENÇA RECORRIDA, SUBSTITUINDO-SE A MESMA POR OUTRA QUE ABSOLVA OS RÉUS DOS PEDIDOS CONTRA ELES DEDUZIDOS PELA AUTORA, COM O QUE VªS. EXªS. FARÃO , COMO SEMPRE, INTEIRA E SÃ

JUSTIÇA! »                                                     

                                                                       *

            A A. apresentou contra-alegações a este recurso, as quais rematou com as seguintes conclusões:

«1. O recurso ora interposto pelos Recorrentes não deverá merecer provimento.

2. A sentença recorrida não apresenta os vícios que lhe são apontados pelos recorrentes, designadamente falta de exposição dos motivos, manifesta contradição com a prova produzida ou ausência de tal prova.

3. O Tribunal a quo expôs, na fundamentação da matéria de facto, de forma completa, e bem expressa, as razões que o levaram a considerar a credibilidade ou não dos diversos depoimentos prestados.

4. No caso da douta sentença recorrida verifica-se que a decisão sobre a matéria de facto, compreendida na sentença recorrida, não se limitou a enumerar os factos provados e não provados, o Tribunal a quo fez referência a que concreta prova lançou mão para considerar cada facto como provado ou não, não tendo sido feita nenhuma omissão nem referência genérica, o que corresponde à satisfação da exigência estabelecida na lei.

5. Não resulta da sentença recorrida manifesta contradição com a prova produzida ou erro notório na apreciação da prova porque não se dá por provado, ou não provado, um facto que contraria com toda a evidência, segundo o ponto de vista de um homem de formação média, a lógica mais elementar e as regras da experiência comum.

6. A fundamentação da decisão da matéria de facto foi clara e especificou os meios de prova que foram decisivos para a formação da convicção do Tribunal, sendo eles a prova documental e prova testemunhal apresentada.

7. A factualidade dada como provada nos pontos 1.5., 1.6., 1.7, resulta da conjugação da prova produzida na audiência de julgamento designadamente, de conjugação dos depoimentos prestados com o contrato de promessa e as certidões matriciais juntos aos autos.

8. O recurso dos recorrentes quanto à factualidade provada nos 1.8 e 1.9. Deve ser rejeitado por não cumprimento do ónus de impugnação previsto no artigo 640º do CPC designadamente, por não especificação dos concretos meios probatórios que impunham decisão diversa e, não indicação do sentido concreto e correto da resposta, que na sua óptica, se impunha.

9. Ao contrário do alegado pelos recorrentes os depoimentos prestados pelos réus BB e DD explicam e justificam a matéria constante dos pontos 1.8, 1.9, 1.16, 1.26, 1.27, 1.32.

10. Também o documento denominado pagamentos efetuados sobre o andar, bem como os depoimentos sobre ele prestados pelas partes, impõe a matéria constante dos pontos 1.8 e 1.9.

11. É falsa a alegação dos recorrentes no sentido de que nenhuma prova foi feita sobre o ponto 1.15. Sobre esta matéria e, nos termos da motivação transcrita nas alegações, depuseram o réu BB, a autora AA, as testemunhas GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN e OO.

12. Partes e testemunhas que esclareceram o tribunal sobre as obras realizadas na habitação em causa, seja as obras da exterior, seja as do primeiro andar, sótão e telhado realizadas pela autora.

13. Os recorrentes procedem a uma interpretação errada da matéria constante do ponto 1.16 porquanto, entendem que o tribunal dá como provado que a autora despendeu a quantia de €73.291,00. Sendo que, da simples leitura atenta de tal matéria de facto resulta que o Tribunal a quo dá como provado que é a autora despendeu quantia não superior a € 73 291,00.

14. Sobre a matéria constante do ponto 1.16, o tribunal não só formou a sua convicção pelo depoimento do réu BB que, diga-se, ao contrário do que afirmam os recorrentes, Foi prestado de forma isenta, credível, imparcial, esclarecedora, não tendo o tribunal ficado com qualquer dúvida quanto à veracidade das declarações por este prestadas (cf. motivação da sentença decorrida).

15. A convicção formada pelo Tribunal a quo quanto a matéria constante dos pontos 1.24, 1.25. 1.26 e 1.27, encontra-se devidamente justificada, designadamente pela conjugação dos depoimentos prestados com os documentos n.º 9 e 10 juntos com a PI, bem como decorrem dos factos provados 1.22, 1.23, 1.28., 1.29 que, aliás, diga-se não mereceram qualquer alegação ou impugnação pelos recorrentes.

16. Os factos 1.30, 1.31, 1.32, 1.33, 1.45, 1.46, 1.47, 1.48, 1.49, 1.50, 1.51, 1.52, 1.56 não são conclusivos, pois deles não decorre a solução jurídica do litígio, isto é, não contêm em si mesmos a decisão da causa.

17. Não é a versão dos Recorrentes que pode prevalecer nos presentes autos, mas a verdade material, que in casu, foi trazida pelos Recorridos, percecionada pelo Tribunal em face de todos os elementos probatórios constantes dos autos, seja a prova documental, os depoimentos de parte e a prova testemunhal, que devidamente concatenada, permitiu à Meritíssima Juiz formar a sua convicção e decidir nos exatos termos em que foi decidido.

18. Lida e relida a sentença recorrida, não nos parece que lhe possam ser apontados os vícios alegados, pois que, a sentença encontra-se devidamente fundamentada, a prova devidamente conjugada e a decisão proferida em conformidade tanto com a factualidade dada como provada como com o raciocínio lógico aposto na Motivação.

19. Ademais, a respeito da reapreciação da prova, em particular quando se trata de reapreciar a força probatória dos depoimentos das testemunhas, vigora o princípio da livre apreciação, conforme decorre do disposto no artigo 396º do Código Civil e no artigo 607º/5, 1ª parte CPC.

20. Nem pode o Tribunal ad quem ignorar que, na formação da convicção do julgador de 1ª instância, poderão ter entrado elementos que, em princípio, no sistema da gravação sonora dos meios probatórios oralmente prestados, não podem ser importados para a gravação, como sejam aqueles elementos intraduzíveis e subtis, como a mímica e todo o processo exterior do depoente que influem, quase tanto como as suas palavras, no crédito a prestar-lhe, existindo, assim, atos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas podem ser percecionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que não podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal, que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção do julgador.

21. Não é admissível a alteração da decisão, proferida pelo Tribunal a quo, sobre a matéria de facto, por não ser possível em face das particulares circunstâncias do caso, concluir pela existência de erro de apreciação relativamente aos concretos pontos de facto impugnados, nomeadamente por os depoimentos prestados em audiência, conjugados com a restante prova produzida, imporem uma conclusão diferente (prevalecendo, em caso contrário, os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova), sendo de manter, na íntegra, a decisão da sentença recorrida.

22. A maioria da doutrina e da jurisprudência vem-se pronunciando no sentido da validade do contrato-promessa de doação, surgindo apenas questionável – consoante a lição do Prof. L. M. TELES MENEZES DE LEITÃO (Direito das Obrigações, Vol. I, Almedina) – “ a forma como se articula a promessa de doação com o respetivo contrato definitivo”.

23. Ademais, tendo em consideração as declarações de vontade que Autora e Réus levaram a cabo durante a formação e consequente celebração do contrato-promessa de doação, há que concluir pela existência do animus donandi naquele momento jurídico.

24. E, à luz do princípio da autonomia da vontade, não havendo nenhum pressuposto que implique a violação de normas jurídica imperativas, mormente em relação ao contrato-promessa, e sendo este um instituto de aplicação geral, não se vislumbra qualquer impedimento à validade do contrato-promessa de doação.

25. In casu, verifica-se tradição da coisa, aceitação da donatária, inequívoca vontade dos doadores e dos donatários na execução do contrato, posse consentida, pública e pacífica da Autora, durante cerca de 10 anos, criando em todos a convicção da aquisição da propriedade e, pagamento do preço,

26. Tais factos, acrescidos do facto de “os Réus não perderam o interesse no cumprimento do contrato, desde logo o 1º réu, cuja vontade de cumprir se mantém, antes, e de forma abusiva, pretendeu a 3ª ré, DD, obter um benefício indevido, tanto mais que a mesma recebeu o pagamento do preço, nunca se tendo oposto à transmissão da propriedade através da doação e do contrato promessa de compra e venda”, apenas permitem concluir pela aplicabilidade do instituto da execução específica ao regime do contrato-promessa de doação.

27. Como bem se defende na sentença recorrida: “A lei não exclui a aplicação do instituto da execução específica ao regime do contrato-promessa de doação, sendo que, considerando os concretos interesses em causa, a doutrina e a jurisprudência têm vindo a “evoluir”, no sentido da aplicação da decisão materialmente justa, admitindo a celebração de contrato-promessa de doação.”

28. “A sua não admissão levaria a uma decisão materialmente injusta e injustificável, prejudicando a autora quanto aos seus direitos adquiridos e que exerceu, por força de um “desentendimento/capricho” das 2ª a 3ªs rés, mãe e irmã da autora”.

29. “considerando a concreta “natureza das obrigações assumidas” pelas partes, aceite e cumpridas, não temos como concluir, no caso concreto, quanto à inaplicabilidade do artigo 830º do Código de Processo Civil (execução específica) ao contrato promessa de doação. A vontade da doação manteve-se por anos e foi executada com a tradição da coisa objeto do contrato-promessa, não sendo admissível no caso, pelas suas circunstâncias concretas, ao contrário da grande maioria dos casos de promessa de doação de bens imóveis, permitir aos 1ºs réus que “conservem a possibilidade de desistir do contrato definitivo até à celebração deste”.

30. In casu, ao abrigo do instituto do abuso de direito, com base num censurável venire contra factum proprium, quando a conduta dos Réus, sedimentada temporalmente, se traduziu num cumprimento do contrato, sem quaisquer focos de litigiosidade relevante, assumindo aqueles inteiramente os direitos e obrigações dele emergentes e criando, com tal estabilidade da relação contratual, a fundada e legítima convicção na Autora de ser a legítima proprietária do bem objeto do contrato, só pode concluir-se pela admissibilidade da execução específica.

31. Só assim, como muito bem é defendido na sentença recorrida, é que estaremos perante uma decisão materialmente justa, que garanta o direito à segurança dos cidadãos e a espectativa comunitária da realização do direito e da justiça em cada caso.

Nestes termos, e nos mais de direito, sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser negado provimento ao recurso apresentado pela Recorrente, confirmando-se a decisão recorrida, uma vez que a mesma, não merece qualquer censura, pois foi feita uma ponderada e fundamentada avaliação dos autos, bem como uma reta e justa aplicação da lei aos factos apurados, assim se fazendo

JUSTIÇA!»

                                                                       *

            Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objeto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

                                                                       *

            2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos RR./recorrentes nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte:

            - impugnação da matéria de facto, invocando o incorreto julgamento da matéria de facto quanto aos factos dados como “provados” sob os pontos “1.5”, “1.38”, “1.6”, “1.7”, “1.8”, “1.9”, “1.15”, “1.16”, “1.24”, “1.25”, “1.26”, “1.27”, “1.28”, “1.30”, “1.31”, “1.32”, “1.33”, “1.45”, “1.46”, “1.47”, “1.48”, “1.49”, “1.50”, “1.52”, “1.54” e “1.56” [cuja matéria entende que «(…) deve ter-se por não provada nos autos, ser conclusiva ou de direito»];

- incorreto julgamento de direito [porquanto a promessa de doação constante do ajuizado contrato-promessa não é suscetível de execução específica, acrescendo a impossibilidade de cumprimento da doação na medida em que o prédio em causa não foi objeto de propriedade horizontal, donde, a «(…) nulidade do respectivo contrato-promessa de doação, torna impossível o cumprimento da promessa de compra e venda, na medida em que esta pressupõe o prévio cumprimento daquela promessa de doação», sendo que essa nulidade teria como única consequência, à luz do disposto no art. 289º, nº 1 do Cód. Civil, a devolução à Autora AA da parte do preço efetivamente dela recebida pelos Réus DD e marido EE (ou seja, a quantia de € 18.600,00)].

                                                                       *

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”, sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade.   

            Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância em termos de Factos Provados:

«1- Factos Provados

(Da Petição Inicial)

1.1. BB e CC, contrariam casamento entre si no dia no dia .../.../1968, casamento esse dissolvido por divórcio decretado por sentença em .../.../2019 nos autos de divórcio sem consentimento do outro cônjuge com o nº 3892/19...., que correram termos pelo Juízo de Família e Menores ... – Juiz ..., confirmada por Acórdão do Tribunal da Relação ... de 31.03.2020.

1.2. A Ré DD e o réu EE contraíram casamento entre si em 6 de outubro de 1990.

1.3. A autora AA e a ré DD são filhas dos réus BB e CC.

1.4. Os primeiro e segunda réus são proprietários do prédio urbano, destinado à habitação, composto de 2 pisos, com dois andares com utilização independente, com a área total de 1.045,50 m2, a área de implantação do edifício de 183 m2, sito Rua ..., ..., ..., ..., inscrito na respetiva matriz sob o artigo ...02, encontrando-se o prédio urbano em causa descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...55 da freguesia ..., concelho e distrito ....

1.5. A casa possui dois andares com utilização independente são o 1.º andar e rés-do-chão, cada um com uma permilagem de 500, constituindo cada um uma fração independente em termos de propriedade vertical, ambos beneficiando em igual proporção da área total do terreno.

1.6. Em 2 de Maio de 2008, por documento escrito denominado contrato promessa de doação e compra e venda, os primeiro e segunda réus prometeram doar às suas filhas DD e AA, a fração ou andar com utilização independente, identificada com o acrónimo AND, do prédio urbano inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...02, bem como o sótão do mencionado prédio urbano.

1.7. A promessa de doação foi na proporção de metade indivisa para cada uma das donatárias. No mesmo documento a donatária DD, ora terceira ré, prometeu vender, pelo preço de 25.000 € (vinte e cinco mil euros) a sua parte (a metade indivisa) no andar doado (tipo T3 com sótão) à sua irmã, aqui autora AA.

1.8. O preço a pagar pela prometida venda de metade do andar com sótão foi integralmente pago pela promitente compradora AA, à promitente vendedora DD.

1.9. O pagamento ocorreu de forma parcelar, no período compreendido entre 2 de maio de 2008 e 4 de novembro de 2011, conforme registo de entregas e quitação.

1.10. Logo na data da prometida doação e venda, a autora AA e família fixaram residência no andar em causa, ali passando a autora a habitar com os filhos e companheiro.

1.11. Todos os outorgantes no contrato promessa de doação e compra e venda declararam especifica e expressamente que se obrigavam a cumprir com o estabelecido naquele documento

1.12. A autora desde aquela data de 2008, que habita a dita casa, dela fazendo a sua casa de morada de família, ali dormindo, fazendo as refeições, descansando, criando e cuidando dos filhos, recebendo visitas de familiares e amigos e tudo o demais que é comum e usual fazer-se na casa em que se habita.

1.13. A Autora procedeu à conservação, restauro e beneficiação da mencionada casa (o andar com sótão), tal como passou a pagar a quota parte do IMI sobre a “sua” fração, tendo pago, à data, a este título, o montante total de € 1.917,00 (mil, cento e dezanove euros).

1.14. No decurso da utilização do andar com sótão, a autora AA efetuou diversas de obras de beneficiação no imóvel que lhe foi prometido doar e vender.

1.15. Entre 2008 e 2013, a autora efetuou obras de beneficiação no edifício de 2 pisos e sótão, com a área bruta de construção de, aproximadamente. 437,0 m2, correspondente a R/Chão - 140,0 m2, Andar - 140,0 m2, varandas e escadas de acesso - 17,0 m2, sótão (Desvão da Cobertura) - 140,0 m2, designadamente

a.1) Paredes de fachada: Isolamento térmico em paredes exteriores - sistema capoto; Caixilharias de PVC com vidro duplo no andar; Peitoris e soleiras em granito no andar; em edifício de 2 pisos com uma altura de aprox 6,0 m e um perímetro de aprox. 52 m.

a.2) Substituição de cobertura: em estrutura de aço leve e revestimento a painéis de sandwich isolante de aço; numa área de aproximadamente. 140,0 m2 em projeção horizontal.

b) em habitação de tipologia T3, composta por 3 quartos, sala, cozinha, 2 instalações sanitárias, hall, despensa e sótão com a área de habitação de aproximada de 140,0 m2 e área de sótão (arrumos/arrecadação) de 140, 0m2.

b.1) Substituição de todas as infraestruturas existentes (águas, esgotos, eletricidade e aquecimento central e ar condicionado);

b.2) Substituição de todos os equipamentos de cozinha e quartos de banho (acessórios, aparelhos sanitários e torneiras);

b.3) Substituição de todos os revestimentos em paredes e pavimentos;

b.4) Mobiliário completo de Cozinha, móveis de Wc, roupeiro e escadas e portas interiores.

1.16. Nas quais despendeu o montante não superior a € 73.291,00

1.17. Por conveniência e aceitação de todos os outorgantes no contrato promessa a celebração dos negócios prometidos foi sendo postergada no tempo.

1.18. Desde logo, porque os primeiro e segunda réus pretendiam destacar do prédio rústico em que estava implantado o prédio urbano uma parcela de terreno para a destinar à construção urbana.

1.19. Tal operação urbanística era efetuada com a concordância de todos – autora e réus - e seria na parcela restante, na qual já estava edificado o prédio urbano, que se iria formalizar a prometida doação e venda.

1.20. Em outubro de 2018 o destaque efetivou-se, passando o prédio mãe a ficar composto de duas parcelas: - a destacada, a que foi atribuído o artigo matricial urbano da freguesia ... 5512; a sobrante a que foi atribuído o artigo matricial urbano da freguesia e ... ..02.

1.21. Sendo que seria a parte sobrante, o artigo matricial urbano ...02, o objeto das prometidas doações e venda.

1.22. Convertido o destaque supramencionado, a autora aprestou-se a solicitar que fossem formalizadas as promessas efetuadas: fossem formalizadas as doações e a venda.

1.23. Pelo que instou, em novembro de 2018, os pais, a irmã e o cunhado, ora primeiro, segunda, terceira e quarto réus, para que se efetuassem as prometidas escrituras de formalização das doações e venda.

1.24. Por essa ocasião e datas, as segunda e terceira rés, a sua mãe e irmã, recusaram cumprir as promessas estabelecidas e firmadas no contrato promessa efetuado, alegando que o cumprimento do contrato promessa e a “adjudicação” do 1.º andar do artigo ..02 à autora se constituiria num benefício injustificado para esta.

1.25. Alegando que a autora estava a receber uma casa e a irmã, a terceira ré, nada recebia, pelo que ficava a autora avantajada injustificadamente em relação à irmã.

1.26. as segunda e terceira rés mantiveram-se irredutíveis recusando a praticar quaisquer atos ou assinar quaisquer documentos necessários à realização dos negócios jurídicos prometidos realizar.

1.27. Muito embora a autora as tenha voltado a interpelar para cumprir, o que fez pessoalmente, no início de janeiro de 2019 e no início de fevereiro de 2019, em dias que não sabe já precisar.

1.28. Em junho de 2019 através de advogado

1.29. A recusa manteve-se, as rés não efetuavam ou efetuariam as escrituras prometidas.

1.30. A autora está na posse da fração prometida doar e vender desde a data da celebração do contrato promessa.

1.31. Desde maio de 2008 que a autora habita a sua fração ou unidade independente do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ...02, identificada como andar, aí pernoitando, fazendo as suas refeições, comprando móveis, eletrodomésticos e realizando obras de melhoramento e de reconstrução. Foi nessa habitação que nasceram e cresceram os filhos da autora e que desde .../.../2008, passou a possuir, de forma exclusiva, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém essa casa de habitação, bem como o sótão.

1.32. Tudo de forma pacífica, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, cultivando e aproveitando o logradouro comum, nele mantendo e criando aves de capoeira, horta e jardim.

1.33. Durante todos esses anos, nunca os réus alguma vez se opuseram a esse domínio e posse.

1.34. A casa de habitação que compõe o artigo urbano ...02 foi objeto de várias intervenções e obras, tendo durante os vários anos, a autora efetuado várias obras que visaram o melhoramento da casa de habitação, quer no 1.º andar que possuíam, quer até em áreas comuns do prédio.

1.35. Não é possível tecnicamente sem deteriorar gravemente o imóvel dele retirar, a cobertura substituída, a impermeabilização exterior efetuada, a colocação de janelas e arranjo dos peitoris, a colocação de portas a arranjo de soleiras, todo a infraestrutura e instalações destinadas ao aquecimento central e águas, os revestimentos de paredes e soalhos, os equipamentos sanitários e móveis de cozinha.

1.36. Todas as obras, equipamentos e instalações efetuadas e pagas pela autora, aumentaram o valor do imóvel/fração.

(Da contestação e do pedido reconvencional)

1.37. A Ré CC não está disposta a celebrar o contrato de doação às filhas DD e AA a que se respeita aquela promessa de doação.

1.38. O prédio onde se insere primeiro andar da casa de habitação não foi objeto de propriedade horizontal.

1.39. Até àquela data esse primeiro andar era habitado pelos pais da Autora e por esta.

1.40. Obras essas que foram feitas pela Autora no seu próprio interesse e em seu proveito exclusivo, por forma a adaptar aquele andar ao gosto dela e às comodidades por ela perfilhadas e queridas.

1.41. A Autora comparticipou financeiramente em algumas obras exteriores feitas no imóvel pelos pais, nomeadamente ao nível do isolamento térmico das paredes exteriores, caixilharias de PVC e substituição da cobertura do edifício,

1.42. Tal como nelas participou financeiramente a Ré DD, pagando € 6.400,00 (seis mil e quatrocentos euros) correspondente a metade do valor despendido com obras no R/C.

1.43. E pagou também todo o granito dos parapeitos e das janelas do R/C, no montante de € 3.860,00 (três mil, oitocentos e sessenta euros).

1.44. Naquela zona, a renda mensal de um andar/apartamento com as características daquele que a Autora habita, é superior a € 350,00 mensais.

(Da réplica)

1.45. O prédio encontra-se em condições de ser juridicamente autonomizado, composto por duas unidades independentes e isoladas entre si, com saída própria para parte comum do prédio ou para a via pública.

1.46. A existência de andares ou divisões com utilização independente é frações é legalmente possível.

1.47. Não existe coincidência entre o primeiro andar, tipo T3 com sótão do prédio inscrito sob o artigo ...46 e o artigo matricial ...02.

1.48. A Autora tem a posse do imóvel desde maio de 2008 sendo que, nunca houve oposição por parte dos réus, nem alguma quantia lhe foi peticionada, seja a que título for.

1.49. O uso do imóvel pela Autora, titulado pelos contratos de promessa e pela entrega do imóvel, jamais causou qualquer prejuízo aos Réus.

1.50. O 1.º e 2.º réus prometem efetivamente doar o imóvel às filhas de ambos (a Autora e a 3.ª Ré), não pretendiam / pretendem rentabilizar o imóvel, nomeadamente através de arrendamento.

1.51. O 1.º e 2.º réus não tinham intenção de usar o imóvel, nem de proporcionar uso a outrem.

1.52. O 1.º e 2.º réus não pretendiam colocar o imóvel no mercado de arrendamento.

1.53. O preço a pagar pela prometida venda de metade do andar com sótão foi integralmente pago pela promitente compradora AA, à promitente vendedora DD, a 4 novembro de 2011,

1.54. Parte do preço foi pago depois da data limite aposta no contrato promessa, contudo a 3.ª ré aceitou que assim fosse.

1.55. A alteração do prazo de pagamento ocorreu com a concordância da Autora e da 3.ª Ré.

1.56. A 3.ª ré recebeu a totalidade do preço há mais de 9 anos e apenas em sede de contestação à presente ação vem alegar o incumprimento do contrato.

1.57. As janelas em PVC e os trabalhos de colocação nos vãos do rés-do-chão foram integralmente pagas pelos réus.»

¨¨

E o seguinte em termos de factos Não Provados:

«2.1. Que a autora tenha despendido, as quantias seguintes nas obras:

- € 1.260,00 nos vãos do 1.º ANDAR, em Janelas de PVC, uma folha de batente com abertura para o interior, composta de aro, folha e bites, acabamento folheado nas duas faces, cor a escolher, perfis de 70 mm de largura, soldados a meia-esquadria, que incorporam cinco câmaras interiores, tanto na secção da folha como na do aro, para melhoria do isolamento térmico; rebaixo com pendente de 5% para facilitar a drenagem; com reforços interiores, juntas de estanquidade de EPDM, puxador e ferragens; coeficiente de transmissão térmica do aro: Uh,m = 1,3 W/(m²°C); espessura máxima do vidro: 40 mm; composta por aro, folhas, ferragens de pendurar e abertura, com fechadura de segurança, elementos de estanquidade e acessórios homologados, com classificação à permeabilidade ao ar classe 4, segundo EN 12207, classificação à estanquidade à água classe E750, segundo EN 12208, e classificação à resistência à carga do vento classe C5, segundo EN 12210, com pré-aro caixa de estore básica incorporada (monobloco), persiana enrolável de réguas de PVC, com acionamento manual com fita e recolhedor. Inclusive silicone para vedação perimetral da junta entre a caixilharia exterior e o paramento.

- € 960,00, em vãos do 1.º ANDAR, em porta de varandas de PVC, duas folhas de batente com abertura para o interior, dimensões 1200x1200 mm, composta de aro, folha e bites, acabamento folheado nas duas faces, cor a escolher, perfis de 70 mm de largura, soldados a meia-esquadria, que incorporam cinco câmaras interiores, tanto na secção da folha como na do aro, para melhoria do isolamento térmico; rebaixo com pendente de 5% para facilitar a drenagem; com reforços interiores, juntas de estanquidade de EPDM puxador e ferragens; coeficiente de transmissão térmica do aro: Uh,m = 1,3 W/(m²°C); espessura máxima do vidro: 40 mm; composta por aro, folhas, ferragens de pendurar e abertura, com fechadura de segurança, elementos de estanquidade e acessórios homologados, com classificação à permeabilidade ao ar classe 4, segundo EN 12207, classificação à estanquidade à água classe 9A, segundo EN 12208, e classificação à resistência à carga do vento classe C5, segundo EN 12210, com pré-aro caixa de estore básica incorporada (monobloco), persiana enrolável de réguas de PVC, com acionamento manual com fita e recolhedor. Inclusive silicone para vedação perimetral da junta entre a caixilharia exterior e o paramento.

- € 1.660,00 em vãos do 1.º andar, em Bloco-porta exterior de entrada na habitação, blindado normalizado, de PVC, de uma folha, reforçada por perfis omega verticais, de aço, com fechadura de segurança com três pontos frontais de fecho (10 linguetas).

- € 1.410,00 em vãos do 1.º andar, em porta interior de batente, cega, de uma folha de 203x82,5x3,5 cm, com almofadas, com painel de madeira maciça de pinho melis, envernizada em oficina; aro de madeira maciça. Incluindo guarnição do mesmo material e acabamento que a folha, dobradiças, ferragens de pendurar, de fechadura e puxador par sobre espelho comprido de ferro forjado, série básica.

- € 1.850,00 em vãos do 1.º andar, em porta de armário de seis folhas de 180 cm de altura com armário superior de 40 cm de 50x1,9 cm, de painel de PP Rua ..., ... e 5, ... .../Fax – ...41 aglomerado, acabamento em melamina; aro de madeira maciça; guarnição de MDF, com acabamento em melamina na face exterior. Inclusive ferragens de pendurar, fecho e puxador, acabamento brilhante, série média. • € 504,00 em vãos do 1.º andar, vidro duplo standard, 4/10/4, conjunto constituído por vidro exterior Float incolor de 4 mm, câmara de ar desidratada com perfil separador de alumínio e dupla vedação perimetral, de 10 mm, e vidro interior Float incolor de 4 mm de espessura; 18 mm de espessura total, fixado sobre caixilharia com cunhagem através de calços de apoio perimetrais e laterais, vedação a frio com silicone sintético incolor, compatível com o material suporte.

- € 1.443,20 em remates e e trabalhos auxiliares no 1.º andar, em remates inferiores de granito, em peças até 1200 mm de comprimento, até 200 mm de largura e 40 mm de espessura, com pingadeira, face e bordo reto polido e brita aderida à superfície na sua face inferior, encastrado nas ombreiras; assente com argamassa de cimento, confecionada em obra, com aditivo hidrófugo, dosificação 1:4; e enchimento de juntas entre peças e das uniões com os muros com argamassa de juntas especial para pedra natural.

- € 131,20 em remates e trabalhos auxiliares no 1.º andar, em soleira para remate de porta de entrada ou varanda de granito, em peças até 1100 mm de comprimento, até 200 mm de largura e 40 mm de espessura, com pingadeira, face e bordo recto polido, com banda anti deslizante e brita aderida à superfície na sua face inferior, encastrada nas ombreiras, cobrindo o degrau de acesso à porta de entrada ou varanda do edifício; assente com argamassa de cimento, confecionada em obra, com aditivo hidrófugo, dosificação 1:4; e enchimento de juntas entre peças e das uniões com os muros com argamassa de juntas especial para pedra natural.

- € 4.168,00 em instalações no 1.º andar, em Salamandra a pellets, potência térmica nominal total de 4,7 a 12,2 kW (potência térmica ao ar 2,6 kW e potência térmica à agua 9,5 kW), rendimento 92%, volume de aquecimento, calculado com um requisito de 40 W/m³, 300 m³, revestimento de maiólica cor antracite, sistema de ventilação forçada controlada electronicamente, com possibilidade de alimentação de um sistema de aquecimento por radiadores ou por piso radiante ou de produção de A.Q.S., com comando à distância.

- € 3.100,00 em instalações no 1.º andar, em coletor solar térmico completo, dividido, para instalação individual, para colocação sobre cobertura inclinada, composto por: dois painéis de 2320x1930x90 mm em conjunto, superfície útil total 4,04 m², rendimento ótico 0,819 e coeficiente de perdas primário 4,227 W/m²K, segundo NP EN 12975-2, depósito de 300 l, grupo de bombagem individual, central solar térmica programável.

- € 1.600,00 em instalações no 1.º andar, em equipamento de ar condicionado, sistema ar-ar multi-split 2x1, com unidades interiores de parede, para gás R410A, bomba de calor, alimentação monofásica (230V/50Hz), potência frigorífica nominal 5 kW, SEER 5,6 (classe A+), potência calorífica nominal 5,6 kW, SCOP 3,8 (classe A), formado por duas unidades interiores com as seguintes características cada uma delas: dimensões 275x845x180 mm, peso 9 kg, filtro purificador do ar e painel liso de cor branca com ecrã LCD retroiluminado, e uma unidade exterior com compressor tipo Inverter DC, dimensões 700x892x396 mm, peso 50 kg, diâmetro de ligação da tubagem de gás 3/8", diâmetro de ligação da tubagem do líquido 1/4", com amortecedores de molas, suportes e fixações das unidades interior e exterior, tubagem de drenagem com sifão, ligação frigorífica entre unidades, ligação elétrica entre unidades, fixação e proteção mecânica da instalação com ocultação em calha acessível em zonas vistas. Inclusive elementos anti vibratórios e suportes de parede para apoio da unidade exterior. O preço não inclui a canalização nem a cablagem elétrica de alimentação.

- € 1.401,32, em instalações no 1.º andar, em tubagem de distribuição de água quente de aquecimento formada por tubo de polietileno reticulado (PE-Xa), com barreira de oxigénio (EVOH), de 20 mm de diâmetro exterior e 2 mm de espessura, PN=6 atm, colocado superficialmente no interior do edifício, com isolamento através de manga isolante flexível de espuma elastomérica.

- € 288,45, em instalações no 1.º andar, em radiador de alumínio injetado, com 298,8 kcal/h de emissão calorífica, de 4 elementos, de 425 mm de altura, com frontal plano, para instalação com sistema bitubo, com válvula de seccionamento termostática.

- € 611,45, em instalações no 1.º andar, em radiador de alumínio injetado, com 448,2 kcal/h de emissão calorífica, de 6 elementos, de 425 mm de altura, com frontal plano, para instalação com sistema bitubo, com válvula de seccionamento termostática.

- € 237,42, em instalações no 1.º andar, em instalação interior de abastecimento de água para WC de serviço com capacidade para: sanita, lavatório simples, realizada com polietileno reticulado (PE-X), para a rede de água fria e quente.

- € 366,65, em instalações no 1.º andar, em instalação interior de abastecimento de água para casa de banho com capacidade para: sanita, lavatório simples, banheira, bidé, realizada com polietileno reticulado (PE-X), para a rede de água fria e quente.

- € 218,72, em instalações no 1.º andar, em instalação interior de abastecimento de água para cozinha com capacidade para: lava-loiças, tomada e válvula de seccionamento para máquina de lavar loiça, realizada com polietileno reticulado (PE-X), para a rede de água fria e quente.

- € 148,79, em instalações no 1.º andar, em rede interior de drenagem para WC de serviço com capacidade para: sanita, lavatório simples, realizada com tubo de PVC, série B.

- € 257,70, em instalações no 1.º andar, em rede interior de drenagem para casa de banho com capacidade para: sanita, lavatório simples, banheira, bidé, realizada com tubo de PVC, série B.

- € 128,24, em instalações no 1.º andar, em rede interior de drenagem para cozinha com capacidade para: lava-loiças, tomada de descarga para máquina de lavar loiça, realizada com tubo de PVC, série B..

- € 92,70, em instalações no 1.º andar, em fornecimento e colocação de arejador de passagem, de alumínio, caudal máximo 15 l/s, de 725x20x82 mm, com silenciador acústico de espuma de resina de melamina e isolamento acústico de 34 dBA. Inclusive elementos de fixação.

- € 81,52, em instalações no 1.º andar, em fornecimento e instalação no interior da campana de ventilador de extração de cozinha, de dimensões 218x127x304 mm, velocidade 2250 r.p.m., caudal de descarga livre 250 m³/h, com ramo de ligação de tubo flexível de alumínio a conduta de extração para evacuação de fumos. Inclusive elementos de fixação

- € 3.500,00, em instalações no 1.º andar, em rede elétrica de distribuição interior de uma habitação unifamiliar com eletrificação elevada, com os seguintes compartimentos: acesso, hall, corredor, sala de jantar/estar, 2 quartos duplos, casa de banho, WC de serviço, cozinha, varanda, composta de: quadro de entrada; circuitos interiores com cabos protegidos por tubo protetor: C1, C2, C3, C4, C5, C7, do tipo C2, 4 C8, C10; mecanismos gama média (tecla ou ampa: branco; aro: branco; embelezador: branco).

- € 8.160,00, em isolamento e impermeabilizações em todo o edifício (deste gastos foram considerados para efeitos de pagamento à terceira ré, do preço da prometida venda a quantia de € 6.400, conforme consta do recibo de quitação do preço junto como documento n.º4), em isolamento térmico pelo exterior de fachadas, com sistema ETICS, composto por: painel rígido de poliestireno expandido, segundo NP EN 13163, de superfície lisa e bordo lateral recto, de cor branca, de 80 mm de espessura, fixado ao suporte com argamassa, aplicada manualmente e fixações mecânicas com bucha de expansão de polipropileno camada de regularização de argamassa, aplicada manualmente, armada com malha de fibra de vidro, anti-álcalis, de 5x4 mm de vão de malha, de 0,6 mm de espessura e de 160 g/m² de massa superficial; camada de acabamento de argamassa acrílica cor branco, sobre primário acrílico. Inclusive perfis de arranque de alumínio, perfis de fecho superior de alumínio, perfis de canto de PVC com malha, perfis de fecho lateral de alumínio, pasta vedante monocomponente e cordão de espuma de polietileno expandido de células fechadas para vedação de juntas.

- € 5.700,00, em coberturas, em estrutura metálica leve autoportante, sobre compartimento não habitável formada por aço NP EN 10162 S235JRC, em perfis enformados a frio das séries L, U, C ou Z, acabamento galvanizado, com uma quantidade de aço de 5 kg/m². O preço inclui os parafusos, os cortes, os desperdícios, as peças especiais, os casquilhos e os elementos auxiliares de montagem.

- € 7.650,00, em coberturas, em revestimento de cobertura de painéis sandwich isolantes de aço, com a superfície exterior grecada e a superfície interior lisa, de 50 mm de espessura e 1000 mm de largura, formados por dupla face metálica de chapa standard de aço, acabamento pré-lacado, de espessura exterior 0,5 mm e espessura interior 0,5 mm e alma isolante de poliuretano de densidade média 40 kg/m³, e acessórios, colocados com uma sobreposição do painel superior de 200 mm e fixados mecanicamente sobre estrutura leve metálica, em cobertura inclinada, com uma pendente maior que 10%. Inclusive acessórios de fixação dos painéis sandwich, fita flexível de butilo, adesiva em ambas as faces, para a selagem de estanquidade das sobreposições entre painéis sandwich e tinta antioxidante de secagem rápida, para a proteção das sobreposições entre painéis sandwich. O preço não inclui a superfície suporte nem os pontos singulares e as peças especiais da cobertura.

- € 554,49, em coberturas, em encontro de vertente de telhado com chaminés ou condutas de ventilação através de banda ajustável composta por liga de alumínio e zinco e lâmina flexível de chumbo natural de 1 mm de espessura, formando duplo rufo, fixada com perfil de aço inoxidável.

- € 491,82, em coberturas, em rufo composto por liga de alumínio e zinco e lâmina flexível de chumbo natural de 1 mm de espessura, no encontro de vertente do telhado com paramento vertical.

- € 940,00, em coberturas, em estrutura metálica leve autoportante, sobre área exterior a afetar a coberto para estacionamento, formada por aço NP EN 10162 S235JRC, em perfis enformados a frio das séries L, U, C ou Z, acabamento galvanizado com revestimento de cobertura de painéis sandwich isolantes de aço, com a superfície exterior grecada e a superfície interior lisa, de 50 mm de espessura e 1000 mm de largura, formados por dupla face metálica de chapa standard de aço, acabamento pré-lacado, de espessura exterior 0,5 mm e espessura interior 0,5 mm e alma isolante de poliuretano de densidade média PP Rua ..., ..., ... .../Fax – ...40 kg/m³, e acessórios, em cobertura inclinada de uma água, Inclui acessórios de fixação dos painéis sandwich, fita flexível de butilo, adesiva em ambas as faces, para a selagem de estanquidade das sobreposições entre painéis sandwich e tinta antioxidante de secagem rápida, para a proteção das sobreposições entre painéis sandwich. O preço inclui a superfície suporte.

- € 1.418,20, em revestimentos no 1.º andar, em ladrilhamento com azulejo acabamento liso, 20x20 cm, 8 €/m², capacidade de absorção de água E>10%, grupo BIII, resistência ao deslizamento até 15, colocado sobre uma superfície suporte de argamassa de cimento ou betão, em paramentos interiores, assente com cimento cola de utilização exclusiva para interiores, Ci cinzento, sem junta (separaçãoentre 1,5 e 3 mm); cantoneiras de PVC.

- € 850,00, em revestimentos no 1.º andar, em revestimento de escada recta de dois tramos com descanso, com 17 degraus de 60 cm de largura, formado por cobertor de madeira, acabamento polido, espelho de estuque.

- € 1.183,70, em revestimentos em 1.º andar, em guarda de inox e madeira envernizada, de 90 cm de altura para escada recta de dois tramos, fixada através de ancoragem mecânica com buchas de nylon e parafusos de aço.

- € 1.581,14, em revestimentos no 1.º andar, em aplicação manual de duas demãos de tinta plástica cor branca, acabamento mate, textura lisa, a primeira demão diluída com 20% de água e a seguinte não diluída, (rendimento: 0,1 l/m² cada demão); aplicação prévia de uma demão de primário à base de copolímeros acrílicos em suspensão aquosa, sobre paramento

- € 1.107,40, em revestimentos no 1.º andar, em emboço de cimento, com aplicação de mestras, aplicado sobre um paramento vertical interior, acabamento superficial riscado, para servir de base a um posterior ladrilhamento, com argamassa de cimento, tipo GP CSII W0.interior de gesso projetado ou placas de gesso laminado, vertical, até 3 m de altura.

- € 3.082,52, em revestimentos no 1.º andar, em revestimento de gesso de construção B1, projetado, com aplicação de mestras, sobre paramento vertical, até 3 m de altura, prévia colocação de malha anti-álcalis nas mudanças PP Rua ..., ..., ... .../Fax – ...41 de material, acabamento estucado com gesso de aplicação em camada fina C6, de 15 mm de espessura, com perfil para proteção de arestas.

- € 276,86, em revestimentos no 1.º andar, em revestimento de paramentos exteriores com argamassa monomassa acabamento com pedra projetada, cor a escolher, tipo OC CSIII W1 segundo EN 998-1, espessura 15 mm, aplicado manualmente, armada e reforçada com malha anti-álcalis nas mudanças de material e nas testas de laje

- € 504,00, em revestimentos no 1.º andar, em base para pavimento interior, de 40 mm de espessura, de argamassa autonivelante de cimento CT - C10 - F3 segundo EN 13813, descarga com misturadora-bombeadora, sobre lâmina de isolamento para formação de pavimento flutuante; e aplicação posterior de líquido de cura incolor, (0,15 l/m²). Inclusive banda de painel rígido de poliestireno expandido para a preparação das juntas perimetrais de dilatação.

- € 893,20, em revestimentos no 1.º andar, em pavimento de ladrilhos cerâmicos de grés esmaltado, de 30x30 cm, 8 €/m², capacidade de absorção de água E<3% grupo BIb, resistência ao deslizamento até 15, assentes com argamassa de cimento M-5 de 3 cm de espessura e enchimento das juntas com argamassa de juntas cimentosa tipo L, cor branca, para juntas de até 3 mm.

- € 1988,80, em revestimentos no 1.º andar, em pavimento laminado FINfloor Original "FINSA", de lâminas de 1200x189 mm e 8 mm de espessura, Classe 33: Comercial intenso, resistência à abrasão AC5, Euroclasse Bfl-s1 de reacção ao fogo, formado por painel base de HDF hidrófugo, de 1 régua, com face interior de papel kraft, face superior de laminado decorativo de Pino Lofoten revestido de uma camada superficial de proteção plástica e cantos vedados com parafina anti-humidade, ensamblado sem cola, tipo 'Clic', colocadas sobre manta de espuma de polietileno reticulado, de células fechadas, para isolamento a ruído de impacto, revestido numa das suas faces com um filme de polietileno que atua como barreira de vapor FINfloor Silent Elite Underfloor, "FINSA", de 2 mm de espessura.

- € 449,12, em revestimentos no 1.º andar, em rodapé de MDF, de 58x12 mm, recoberto com uma lâmina plástica de imitação de madeira, cor a escolher, fixado ao paramento através de pregos.

- € 191,85, em revestimentos no 1.º andar, em teto falso contínuo suspenso, situado a uma altura menor de 4 m, formado por placas de escaiola com nervuras, de 60x60 cm, com canto biselado e acabamento liso, suspensas da laje através de estopadas suspensas.

- € 385,00, em equipamentos fixos no 1.º andar, em conjunto de aparelhos sanitários em WC de serviço formado por: lavatório de porcelana sanitária, gama básica, cor branco, de 520x410 mm; sanita de porcelana sanitária, com tanque baixo, gama básica, cor branco, com assento e tampa lacados, mecanismo de descarga de 3/6 litros, com jogo de fixação e curva de evacuação. Incluindo; bidé de porcelana sanitária, gama básica, cor branco, sem tampa; elementos de drenagem, válvulas de seccionamento, ligações de alimentação flexíveis e vedação com silicone.

- € 754,20, em equipamentos fixos no 1.º andar, em conjunto de aparelhos sanitários em casa de banho formado por: lavatório de porcelana sanitária, gama básica, cor branco, de 520x410 mm; sanita de porcelana sanitária, com tanque baixo, gama básica, cor branco, com assento e tampa lacados, mecanismo de descarga de 3/6 litros, com jogo de fixação e curva de evacuação; bidé de porcelana sanitária, gama básica, cor branco, sem tampa; banheira acrílica, gama média, cor, de 160x75 cm, sem asas, com torneira monocomando, gama média, acabamento cromado. Incluindo elementos de drenagem, válvulas de seccionamento, ligações de alimentação flexíveis e vedação com silicone.

- € 210,00, em equipamentos fixos no 1.º andar, em lava-loiças de aço inoxidável para instalação em bancada, de uma cuba, de 450x490 mm, equipado com torneira monocomando com cartucho cerâmico para lava-loiças, gama média, acabamento cromado.

- € 8.000,00, em equipamentos fixos no 1.º andar, em mobiliário completo de cozinha composto por móveis inferiores com rodapé e móveis superiores, acabados verniz de poliuretano e núcleo painel de partículas tipo P2 de interior (painel de aglomerado para ambiente seco), e corpos constituídos por núcleo de painel de partículas tipo P2 de interior (painel de aglomerado para ambiente seco), com revestimento melamínico acabamento, impregnado com resina melamínica e orlas termoplásticas de ABS; gavetas e prateleiras do mesmo material que o corpo, dobradiças, pés reguláveis para móveis inferiores, guias de gavetas, ferragens de suspensão e outras ferragens de qualidade básica, instalados nos corpos dos móveis e puxadores, maçanetas, sistemas de abertura automática, e outras ferragens de fecho da série básica, fixados nas frentes desses móveis.

- € 1.500,00, em equipamentos fixos no 1.º andar, em bancada de aglomerado de quartzo (Silestone), acabamento polido, 60 cm de largura e 2 cm de espessura, bordo simples recto, com os bordos ligeiramente biselados, formação de 1 abertura com os seus bordos polidos, e remate superior perimetral de 5 cm de altura e 2 cm de espessura, com o bordo recto.

2.2. Todas as obras, equipamentos e instalações efetuadas e pagas pela autora, aumentaram o valor do imóvel/fração em valor equivalente ao custo das benfeitorias efetuadas.

(Da contestação e do pedido reconvencional)

2.3. O primeiro andar da casa de habitação é um bem sem existência legal.

2.4. A AA não cumpriu o estabelecido na cláusula quinta daquele contrato, pois que até à presente data, e por conta do pagamento do preço, apenas pagou à Ré DD a quantia de € 18.600,00.

2.5. A Ré CC nunca recebeu qualquer quantia da Autora para o pagamento do IMI, nem tem conhecimento de que alguma vez esta tenha procedido a qualquer pagamento dessa contribuição predial.

2.6. Os Réus contestantes desconhecem que obras a Autora efetuou no interior do primeiro andar do prédio dos Réus BB e CC, onde habita desde 2 de maio de 2008.

2.7. Quando a autora foi habitar aquele primeiro andar, o mesmo reunia todas as condições para esse efeito, designadamente estava equipado com móveis de cozinha, eletrodomésticos, tais como frigorifico, fogão, exaustor, forno, máquina de lavar loiça e a roupa, mesa de cozinha e cadeiras.

2.8. Essas obras foram custeadas pela Autora e pela Ré DD, porque os pais não tinham à data condições económicas para o efeito, tendo ambas as filhas assumido o pagamento das mesmas, em partes iguais.

2.9. Porém, até à presente data a Autora não restituiu à Ré DD o valor correspondente à metade dessa quantia

2.10. Todas as demais obras não tiveram o acordo ou autorização prévios dos Réus.

2.11. O isolamento e impermeabilização em todo o edifício, inclusive as coberturas, foram pagos em partes iguais pela Autora e pela Ré DD, sendo que esta última pagou na totalidade os granitos dos parapeitos as janelas e uma porta existentes no imóvel.

2.12. Os Réus DD e marido nunca se recusaram a cumprir a promessa de venda constante do contrato promessa de compra e venda.

2.13. Estão impedidos de fazer aquela prometida venda enquanto os pais da Ré DD não lhe fizerem a doação desse bem, tornando-a comproprietária do mesmo.

2.14. Os Réus BB e CC, proprietários do prédio onde se localiza o andar que prometeram doar às filhas, não podem cumprir essa promessa porque não se encontra feita a propriedade horizontal daquele prédio, de modo a autonomizarem o dito andar numa fração autónoma própria e independente.

2.15. Propriedade horizontal essa que se mostra difícil de licenciar pela Câmara Municipal ..., por o prédio não reunir as condições construtivas e técnicas necessárias para esse efeito.

2.16. As relações entre a Autora e os pais, especialmente com a aqui Ré CC, foram-se degradando com o decurso do tempo, sendo atualmente praticamente inexistentes.

2.17. Situação que contribui para a formação da vontade da Ré CC em não querer doar à Autora o dito andar que esta habita, pelo menos até que sejam ultrapassadas as divergências existentes e que estiveram na origem do divórcio dos Réus BB e CC.

2.18. Além de habitar nesse andar/apartamento, a Autora desde a referida data de maio de 2008, vem cultivando e aproveitando o logradouro do dito prédio dos pais (artº. 5502º), nele mantendo e criando aves de capoeira, horta e jardim

2.19. A Autora não paga, nem nunca pagou, aos proprietários do imóvel, seus pais, qualquer contrapartida financeira, ou outra, pela ocupação, uso e fruição daquele andar/apartamento e do logradouro do prédio.

2.20. A Autora não tem qualquer título legítimo e juridicamente válido, que lhe permita usar e fruir daqueles espaços físicos nos termos referidos.

2.21. O facto de ali habitar com a família (filhos e companheiro), de cultivar o logradouro do prédio e nele manter e criar aves de capoeira, a Autora obteve, e continua a obter, um benefício económico mensal superior a € 350,00 (trezentos e cinquenta euros).

2.22. Aquele imóvel localiza-se na zona urbana da cidade ..., próximo de duas escolas secundárias, centro comercial “...”, num bairro habitacional com procura no mercado de arrendamento para habitação.

2.23. Desde maio de 2008 que a Autora tem tido, e continua a ter, um benefício económico-financeiro de pelo menos € 350,00 mensais, resultante da ocupação que faz daqueles espaços para habitação e fins agrícolas e avícolas.

2.24. A Autora não cumpriu o contrato promessa referido, não tendo pago a totalidade do preço até junho de 2010.

2.25. A Autora e a Ré DD acordaram verbalmente em que a parte do preço da prometida venda ainda em débito, seria paga na data em que fosse feito o contrato definitivo de compra e venda.

2.26. A Autora e a Ré DD acordaram que seria feito entre ambas um acerto de contas que tivesse presente as quantias que cada uma delas tinha pago pelas obras exteriores feitas no prédio, designadamente as de isolamento térmico das paredes, caixilharias, peitoris e soleiras em granito e janelas e portas exteriores.»

                                                                       *

           

3.2 – Os RR./recorrentes deduzem impugnação da matéria de facto, invocando o incorreto julgamento da matéria de facto quanto aos factos dados como “provados” sob os pontos “1.5”, “1.38”[2], “1.6”, “1.7”, “1.8”, “1.9”, “1.15”, “1.16”, “1.24”, “1.25”, “1.26”, “1.27”, “1.28”, “1.30”, “1.31”, “1.32”, “1.33”, “1.45”, “1.46”, “1.47”, “1.48”, “1.49”, “1.50”, “1.52”, “1.54” e “1.56” [cuja matéria entende que «(…) deve ter-se por não provada nos autos, ser conclusiva ou de direito»].

            Que dizer?

            Apreciemos com o necessário pormenor e detalhe cada um dos pontos de facto questionados.

Sem prejuízo de esta apreciação ser feita conjuntamente, quando justificada in casu.

Começando pela apreciação do ponto de facto dado como “provado” sob “1.5” [relativamente ao qual os RR./recorrentes discordam da redação dada quanto à descrição dos dois andares em causa], rememoremos, antes de mais, o seu teor literal, a saber:

«1.5. A casa possui dois andares com utilização independente são o 1.º andar e rés-do-chão, cada um com uma permilagem de 500, constituindo cada um uma fração independente em termos de propriedade vertical, ambos beneficiando em igual proporção da área total do terreno.»

Que dizer?

Evidencia-se desde logo que foram usadas na redação da descrição dos ditos dois andares, conceitos e categorias que juridicamente se justificam e têm lugar quando há constituição de propriedade horizontal, o que consabidamente não é o caso [cf. ponto “provado” sob “1.38”], porém, sem embargo do vindo de dizer, pode ser dado acolhimento ao teor literal do que figurou escrito no “contrato promessa” em causa, e bem assim o que consta na certidão matricial junta [cf. docs. 1 e 3 da p.i.], mas já não se vislumbra qual a justificação para dar como “provado” o que figurou na parte final desse ponto de facto,.

Assim sendo, entende-se deferir a impugnação quanto a este particular traduzida na reformulação desde ponto de facto pela seguinte forma:

«1.5. A casa possui dois andares com possível utilização independente, são o 1.º andar e rés-do-chão, estando tal casa inscrita na matriz urbana respetiva atualmente sob o art. ...02º (antigo art. 2046º), na qual figuram cada um dos andares com uma permilagem de 500.»

                                                           ¨¨

Ponto de facto “1.6”, relativamente ao qual os RR./recorrentes invocam a falta de correspondência com o que consta do contrato promessa.

É o seguinte o teor literal do mesmo:

«1.6. Em 2 de Maio de 2008, por documento escrito denominado contrato promessa de doação e compra e venda, os primeiro e segunda réus prometeram doar às suas filhas DD e AA, a fração ou andar com utilização independente, identificada com o acrónimo AND, do prédio urbano inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...02, bem como o sótão do mencionado prédio urbano.»

Que dizer?

Que também nesta parte assiste parcial razão aos RR./recorrentes, na medida em que importa ser-se fiel na transcrição do que ficou grafado no contrato-promessa em causa, pelo que, defere-se esta impugnação com a reformulação da redação do dito ponto de facto pelo seguinte modo:

«1.6. Em 2 de Maio de 2008, por documento escrito denominado “contrato promessa de doação e compra e venda”, os primeiro e segunda réus prometeram doar às suas filhas DD e AA, o primeiro andar do prédio aludido no ponto antecedente, descrito como sendo do “tipo T3, com sótão”.»

                                                           ¨¨

Ponto de facto “1.7”, relativamente ao qual os RR./recorrentes reclamam uma alteração da redação, a saber, que passe a figurar que o andar foi “prometido doar” em vez de que o mesmo foi “doado” [como ora consta].

Que dizer?

Que assiste inteira razão aos RR./recorrentes, donde se determinar que este ponto de facto passe doravante a figurar pela seguinte forma:

«1.7. A promessa de doação foi na proporção de metade indivisa para cada uma das donatárias. No mesmo documento a donatária DD, ora terceira ré, prometeu vender, pelo preço de 25.000 € (vinte e cinco mil euros) a sua parte (a metade indivisa) no andar prometido doar (tipo T3 com sótão) à sua irmã, aqui autora AA.»

                                                           ¨¨

Pontos de facto “1.8” e “1.9”, cujo teor literal é o seguinte, respetivamente:

«1.8. O preço a pagar pela prometida venda de metade do andar com sótão foi integralmente pago pela promitente compradora AA, à promitente vendedora DD.»;

«1.9. O pagamento ocorreu de forma parcelar, no período compreendido entre 2 de maio de 2008 e 4 de novembro de 2011, conforme registo de entregas e quitação.»

Sustentam os RR./recorrentes que a matéria destes pontos de facto deve ser alterada, na medida em que «(…) não existem nos autos quaisquer documentos que comprovem o pagamento integral do preço, no montante de 25.000,00, não sendo bastante a afirmação da Autora e do réu BB, sendo que este último não presenciou esse pagamento. Ademais, quando ouvida na audiência de julgamento em depoimento de parte, a Ré DD negou que o preço total da prometida venda lhe tenha sido pago. Transcrição do depoimento na faixa 20220502112620 – 3486455 – 2871920.(…)»

Apreciando.

Temos desde logo que terá sido determinante para este efeito o documento intitulado de “Pagamentos feitos sobre o andar” [logo junto com a p.i. como doc nº 4], mas o que é certo é que a Exma. Juíza a quo, na “motivação” que fez constar da sentença, apenas alude a que o mesmo foi “valorado”, não especificando se total ou parcialmente, quando ocorria que nesse documento estavam discriminados pagamentos em numerário totalizando € 18.600, e uma anotação manuscrita reportando um qualquer “acerto de contas” quanto ao parcial de € 6.400, com redação pouco clara e precisa.

Sucede que os RR. efetivamente impugnaram esse documento na contestação [cf. art. 31º da mesma], e, paralelamente, apenas aceitaram ter sido pago pela A. o montante de € 18.600, posição que reiteraram nos depoimentos prestados na audiência.

É certo que a A. e o R. BB terão confirmado o pagamento dos € 25.000 nos depoimentos que prestaram, mas na medida em que não resulta que os ditos € 6.400 o tenham sido em valor líquido/monetário, nem tão pouco se vislumbra que tenha sido feito prova consistente e concludente de que os 3ª e 4ª RR. tenham anuído a um eventual “acerto de contas” por essa forma[3], sendo certo que não resulta ter sido feito qualquer prova pericial ao documento em causa no sentido da sua validade [apesar de ter sido pedido tal na contestação dos RR.!], designadamente quanto a esse particular.

Neste contexto, de discordância de posições das partes, e não tendo logrado a Exma. Juíza a quo explanar, nem minimamente convencer, da razão da sua opção, não se vislumbra que seja de dar acolhimento preferencial à versão da A. como consta da sentença, isto é, não existe efetivamente prova objetiva e sólida que permita validar a dita versão da A, pelo que, operando a reapreciação dos meios de prova postos à disposição deste Tribunal de recurso, traduzida afinal na validação apenas parcial do que consta do documento referenciado, entende-se reformular a redação destes dois pontos de facto, os quais passam doravante a figurar com a seguinte redação, respetivamente:

«1.8. Do preço a pagar pela prometida venda de metade do andar com sótão foi pago pela promitente compradora AA, à promitente vendedora DD, pelo menos o montante de € 18.600.»;

1.9. Tal pagamento ocorreu de forma parcelar, no período compreendido entre 2 de maio de 2008 e 31 de março de 2010.»

Sucede que em consequência do vindo de decidir, se impõe a eliminação do ponto de facto “provado” sob “1.54” [cf. «1.54. Parte do preço foi pago depois da data limite aposta no contrato promessa, contudo a 3.ª ré aceitou que assim fosse.»], na medida em que este ponto de facto estava diretamente dependente e relacionado com a parte que foi eliminada dos antecedentes pontos de facto (por via da operada reformulação na correspondente redação), termos em que expressamente se determina, e  sem mais, a eliminação desse ponto de facto “1.54” do elenco dos factos “provados”.

                                                           ¨¨

Ponto de facto “1.15”, relativamente ao qual os RR./recorrentes sustentam que «nenhuma prova foi feita nos autos», mais concretamente, quanto às áreas intervencionadas com obras realizadas pela Autora no prédio (ou outras), que nenhuma das pessoas inquiridas na audiência sobre tal se pronunciou.

Será assim?

Tendo em conta os elementos de prova a que este Tribunal de recurso pode aceder, importa concluir que assiste efetivamente razão aos RR./recorrentes, não se podendo argumentar em sentido contrário com o que consta do documento junto aos autos com a p.i., designado por “Relatório de Avaliação de Obras de Remodelação e Beneficiação” [cf. doc. 6 da mesma], por o mesmo ter sido impugnado pelos RR. na respetiva contestação e o alegado subscritor do mesmo nem sequer ter sido inquirido em audiência, sendo certo que mesmo na “motivação” expressa pela Exma. Juíza a quo, tal documento apenas foi valorado «no tocante a obras realizadas e às fotografias juntas, que foram identificada somo sendo do andar em causa», donde, em correspondência com uma tal mais limitada convicção, impõe-se reformular a redação correspondente, termos em que tal ponto de facto passa a figurar pela seguinte concreta forma:

«1.15. Entre 2008 e 2013, a autora efetuou obras de beneficiação no edifício de 2 pisos e sótão, designadamente

a.1) Paredes de fachada: Isolamento térmico em paredes exteriores em edifício de 2 pisos - sistema capoto; Caixilharias de PVC com vidro duplo no andar; Peitoris e soleiras em granito no andar;

a.2) Substituição de cobertura: em estrutura de aço leve e revestimento a painéis de sandwich isolante de aço;

b) em habitação de tipologia T3, composta por 3 quartos, sala, cozinha, 2 instalações sanitárias, hall, despensa e sótão.

b.1) Substituição de todas as infraestruturas existentes (águas, esgotos, eletricidade e aquecimento central e ar condicionado);

b.2) Substituição de todos os equipamentos de cozinha e quartos de banho (acessórios, aparelhos sanitários e torneiras);

b.3) Substituição de todos os revestimentos em paredes e pavimentos;

b.4) Mobiliário completo de Cozinha, móveis de Wc, roupeiro e escadas e portas interiores.»

                                                           ¨¨

Ponto de facto “1.16”, cujo teor literal é o seguinte:

«1.16. Nas quais despendeu o montante não superior a € 73.291,00.»

Relativamente a este ponto de facto, os RR./recorrentes aduzem que «Apenas o pai da Autora, o Réu BB, quando ouvido em depoimento de parte afirmou que aquela lhe terá dito que gastou em obras na casa entre € 60.000,00 e € 70.000,00», razão pela qual não descortinam como chegou o Tribunal a quo à quantia de €73.291,00, constante desse ponto de facto.

Que dizer?

Não se olvida que está grafado no ponto de facto ora em análise que a A. despendeu «montante não superior a € 73.291,00» [sublinhado nosso] – como, aliás, enfatizou a A. nas contra-alegações! –, isto é, não concluiu a Exma. Juíza a quo que era esse o montante preciso e concreto despendido.

Ainda assim, não podendo ser valorado o que consta do “Relatório de Avaliação de Obras de Remodelação e Beneficiação” junto com a p.i. [doc. 6 da mesma], pelas razões já explanadas na análise do ponto precedente, também entendemos que a referência a esse concreto montante não encontra justificação legítima, donde, procedendo à reapreciação dos meios de prova produzidos, mormente valorando o que positivamente pode ser, a saber, o depoimento do Réu BB, concluímos pela reformulação da redação deste ponto de facto, o qual passa doravante a figurar pela seguinte forma:

«1.16. Nas quais despendeu montante não concretamente apurado, mas não superior a € 70.000,00.»

                                                           ¨¨

Pontos de facto “1.24”, “1.25” e “1.26”, cujo teor literal é o seguinte, respetivamente:

«1.24. Por essa ocasião e datas, as segunda e terceira rés, a sua mãe e irmã, recusaram cumprir as promessas estabelecidas e firmadas no contrato promessa efetuado, alegando que o cumprimento do contrato promessa e a “adjudicação” do 1.º andar do artigo ..02 à autora se constituiria num benefício injustificado para esta.»;

«1.25. Alegando que a autora estava a receber uma casa e a irmã, a terceira ré, nada recebia, pelo que ficava a autora avantajada injustificadamente em relação à irmã.»;

«1.26. as segunda e terceira rés mantiveram-se irredutíveis recusando a praticar quaisquer atos ou assinar quaisquer documentos necessários à realização dos negócios jurídicos prometidos realizar.».

Relativamente a estes pontos de facto, sustentam os RR./recorrentes que «(…) não se alcança qual a justificação para o Tribunal “a quo” dar como provada a matéria constante» dos mesmos.

Compulsados os autos, também assim o entendemos, donde se determinar a eliminação destes três pontos de facto do elenco dos factos “provados”.

                                                           ¨¨

Pontos de facto “1.27” e “1.28”, relativamente aos quais os RR./recorrentes também sustentam que faltou a correspondente prova, rectius, que a Ré DD impugnou a factualidade deles constante.

Rememoremos, antes de mais o seu teor literal respetivo, a saber:

«1.27. Muito embora a autora as tenha voltado a interpelar para cumprir, o que fez pessoalmente, no início de janeiro de 2019 e no início de fevereiro de 2019, em dias que não sabe já precisar.»;

«1.28. Em junho de 2019 através de advogado.»

Que dizer?

Compulsados os autos, designadamente a contestação dos RR. ora recorrentes, não é possível constatar a invocada impugnação, nem sequer dos documentos nos 9 e 10 juntos com a p.i. (que são precisamente cartas subscritas pelo Exmo. Mandatária da A. a interpelar os RR. ao cumprimento).

Coisa diversa é a R. ter negado a factualidade no seu depoimento…

De referir que na sua “motivação”, a Exma. Juiz a quo referiu que «Para prova da factualidade dada por provada, o Tribunal valorou, desde logo, a prova documental junta aos autos … Mais se valoraram os documentos n.º 9 e 10 juntos com a PI, referentes às missivas remetidas em 21 de junho de 2019 aos réus”.

Ora se assim é, nada há que apontar, em termos de erro de julgamento, no tocante à opção de considerar estes pontos de facto como “provados”, designadamente pela valoração positiva dos documentos em causa, conjugada com a não impugnação da factualidade em causa, à luz do que era legítimo considerar-se uma tal factualidade como assente sem mais, donde se indeferir à impugnação quanto a este particular.

¨¨

            Pontos de facto “1.30”, “1.31”, “1.32” e “1.33”.

            Rememoremos antes de mais o seu teor literal, a saber:

            «1.30. A autora está na posse da fração prometida doar e vender desde a data da celebração do contrato promessa.»;

«1.31. Desde maio de 2008 que a autora habita a sua fração ou unidade independente do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo ...02, identificada como andar, aí pernoitando, fazendo as suas refeições, comprando móveis, eletrodomésticos e realizando obras de melhoramento e de reconstrução. Foi nessa habitação que nasceram e cresceram os filhos da autora e que desde .../.../2008, passou a possuir, de forma exclusiva, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém essa casa de habitação, bem como o sótão.»;

«1.32. Tudo de forma pacífica, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, cultivando e aproveitando o logradouro comum, nele mantendo e criando aves de capoeira, horta e jardim.»;

«1.33. Durante todos esses anos, nunca os réus alguma vez se opuseram a esse domínio e posse.».

Relativamente a estes pontos de facto, sustentam os RR./recorrentes que os mesmos contêm matéria conclusiva e/ou de direito [sendo o ponto “1.31” quanto ao segmento a Autora habita a sua fracção ou unidade independente”], acrescendo, quanto ao ponto “1.32”, que a matéria dele constante foi negada parcialmente pelo R. QQ.

Que dizer?

Quanto a nós, não se pode entender que da redação de qualquer destes pontos de facto decorre a solução jurídica do litígio.

Por outro lado, mesmo o vocábulo “posse”, ainda que de teor conclusivo, também tem um significado corrente e vulgar.

Finalmente, precisamente por o R. QQ ter afirmado no seu depoimento que o quintal do prédio era utilizado para a agricultura por ambas as filhas, é que se justifica manter a redação do ponto “1.32”, onde não se afirma nenhuma utilização exclusiva.

Não obstante tudo o vindo de dizer, justifica-se efetivamente uma reformulação de pormenor no ponto de facto “1.31”, por fidelidade à realidade, pelo que, se defere apenas nesse concreto particular à impugnação ora em apreciação, determinando-se que este ponto de facto passe a figurar doravante com a seguinte concreta redação:

  «1.31. Desde maio de 2008 que a autora habita essa fração identificada como andar, aí pernoitando, fazendo as suas refeições, comprando móveis, eletrodomésticos e realizando obras de melhoramento e de reconstrução. Foi nessa habitação que nasceram e cresceram os filhos da autora e que desde .../.../2008, passou a possuir, de forma exclusiva, à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém essa casa de habitação, bem como o sótão.».

                                                           ¨¨

Pontos de facto “1.45”, “1.46”, “1.47”, “1.48”, “1.49”, “1.50”, “1.52” e “1.56”.

Relativamente a estes pontos de facto, sustentam os RR./recorrentes que a matéria deles constante «(…) para além de ser conclusiva, não se vê, nem se percebe, qual é a justificação que o Tribunal “ a quo” encontrou para considerar tal matéria como provada.»

Vejamos.

Quanto aos pontos de facto “1.45”, “1.46” e “1.47”, o que quanto a nós sucede é que os mesmos reportam uma situação que só podia ser provada por certidão camarária ou por inspeção judicial, pelo que, na medida em que nenhum desses meios de prova se mostra produzido nos autos, determina-se a eliminação desses ditos pontos de facto sem mais.

Por outro lado, constata-se que o ponto de facto “1.56” meramente contém uma proposição argumentativa, pelo que, não se descortinando relevância na mesma, determina-se igualmente a eliminação desse ponto de facto.

Já quanto aos demais pontos de facto [“1.48”, “1.49”, “1.50” e “1.52”], não se reconhece qualquer razão à argumentação dos RR./recorrentes, termos em que improcede a impugnação no que aos mesmos respeita.

                                                           *

            4 - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Cumpre agora entrar na apreciação da questão neste particular supra enunciada, diretamente reportada ao mérito da sentença, na vertente da fundamentação de direito da mesma.

Mais concretamente, neste particular sustentam os RR./recorrentes o incorreto julgamento de direito [porquanto a promessa de doação constante do ajuizado contrato-promessa não é suscetível de execução específica, acrescendo a impossibilidade de cumprimento da doação na medida em que o prédio em causa não foi objeto de propriedade horizontal, donde, a «(…) nulidade do respectivo contrato-promessa de doação, torna impossível o cumprimento da promessa de compra e venda, na medida em que esta pressupõe o prévio cumprimento daquela promessa de doação», sendo que essa nulidade teria como única consequência, à luz do disposto no art. 289º, nº 1 do Cód. Civil, a devolução à Autora AA da parte do preço efetivamente dela recebida pelos Réus DD e marido EE (ou seja, a quantia de € 18.600,00)].

Que dizer?

Que em nosso entender assiste, no essencial, razão aos RR./recorrentes, sem prejuízo de que a procedência que é de decretar tem consequências mais amplas do que a afirmada pelos mesmos, isto é, não se resume à devolução à Autora da parte do preço efetivamente dela recebida pelos RR..

Senão vejamos.

Quanto ao contrato-promessa de doação celebrado entre Autora e Réus, cremos ser pacificamente aceite na atualidade a sua validade, quer em termos doutrinários, quer jurisprudenciais, pelo que, na medida em que tal não é questionado sequer pelo recurso, nos dispensamos de aprofundar tal questão.

Sem embargo do vindo de dizer, perfilhamos o entendimento de que o contrato-promessa de doação não é passível de execução específica, isto atenta a natureza da obrigação assumida pelo doador.

Com efeito, o nº 1 do art. 830º do C.Civil exclui a execução específica que se oponha à natureza da obrigação assumida, o que, além do mais, se verifica, como é o caso da promessa de doação, «(…) quando se trate de promessa de contrato que, pela índole da prestação prometida e o carácter dos interesses em jogo, não se concilie razoavelmente com a realização coactiva, (…) pois a sua natureza pessoal justifica que as partes conservem a possibilidade de desistir do contrato definitivo até à celebração deste, embora incorrendo em responsabilidade pelo incumprimento do contrato-promessa.»[4]

Esta posição é perfilhada por demais ilustres doutrinadores[5], designadamente sendo sublinhado que «(…) eliminando do regime da promessa de doação a tutela obrigacional da execução específica, está-se afinal a caracterizar tal contrato-promessa como integrando aquela categoria de promessas precárias, cujo incumprimento se resolve forçosamente na indemnização.»

De referir que esta posição é igualmente perfilhada na jurisprudência que se conhece, senão unanimemente, em termos seguramente maioritários.[6]

Ora se assim é, tendo-se verificado recusa dos RR. [rectius, da 2ª Ré – cf. pontos de facto “provados” sob “1.23.”, “1.27.” a “1.29.” e “1.37.”] em consumar o contrato de doação, também nunca seria possível aos 3ª e 4º RR. [mais concretamente a quem destes era prometido donatário], outorgar o contrato de compra-e-venda igualmente prometido realizar, na medida em que este pressupunha o prévio cumprimento daquela dita promessa de doação.

Sendo este um resultado e conclusão que nos parece insofismável no quadro fáctico apurado nos autos.

Mas ainda que se entendesse que era dogmaticamente possível a execução específica da doação, tal não invalidaria que sempre estaríamos confrontados com uma impossibilidade relativamente ao objeto dessa doação, isto é, estaríamos perante uma “impossibilidade originária da prestação”, nos termos do art. 401º do C.Civil.

Na verdade, este art. 401º, sob a epígrafe “Impossibilidade originária da prestação”, preceitua o seguinte:

«1. A impossibilidade originária da prestação produz a nulidade do negócio jurídico.

2. O negócio é, porém, válido, se a obrigação for assumida para o caso de a prestação se tornar possível, ou se, estando o negócio dependente de condição suspensiva ou de termo inicial, a prestação se tornar possível até à verificação da condição ou até ao vencimento do termo.

3. Só se considera impossível a prestação que o seja relativamente ao objeto, e não apenas em relação à pessoa do devedor.»

No caso vertente foi prometido doar um primeiro andar de um prédio urbano, destinado à habitação, composto de 2 pisos, sendo que ainda que que esses andares pudessem ter utilização independente [cf. factos “provados” sob “1.4.” e “1.5.”], o que é certo é que estava expressamente apurado, e era incontornável, que «O prédio onde se insere primeiro andar da casa de habitação não foi objeto de propriedade horizontal.» [cf. facto “provado” sob “1.38.”].

Ora, consabidamente, a propriedade horizontal pode ser constituída por negócio jurídico, usucapião, decisão administrativa ou decisão judicial, proferida em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário (art. 1417º, nº 1 do C.Civil), sendo certo que a constituição da propriedade horizontal por decisão judicial pode ter lugar a requerimento de qualquer consorte, desde que no caso se verifiquem os requisitos exigidos pelo art. 1415º, nº 2 do mesmo normativo.

Daqui decorre que a propriedade horizontal pode ser constituída pelas diversas vias previstas no art. 1417º do C.Civil, mas em qualquer dos casos, é imprescindível o respeito pelos requisitos legais do art. 1415º, ou seja, supõe-se a existência de unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída para uma parte comum do prédio ou para a via pública.

Por outro lado, a constituição de propriedade horizontal por decisão do Tribunal só é admissível em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, a requerimento de qualquer consorte ou interessado, desde que sejam unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública, comprovados na forma legalmente prevista (cf. os arts. 1415º e 1417º do C.Civil).[7]

Estes são os requisitos civis ou substantivos para a constituição da propriedade horizontal.

Mas a eles acrescem os designados por requisitos administrativos, impostos pelo Regulamento Geral das Edificações Urbanas, decorrentes de exigências de segurança, salubridade, arquitetónica, estética, urbanística e que têm de ser igualmente asseguradas, por condicionarem a construção de edifícios e a sua utilização.

Com efeito, o Regime Jurídico da Urbanização e da Edificação aprovado pelo DL nº 555/99, de 16 de Dezembro, com as sucessivas alterações de que foi objeto, é expresso relativamente à exigência de certificação pela câmara municipal de que o edifício satisfaz os requisitos legais para a sua constituição em propriedade horizontal (cf. arts. 62º a 66º do mesmo).

Também o Código do Notariado é expresso, no caso de constituição negocial da propriedade horizontal, na exigência de documento emitido pela Câmara Municipal respetiva comprovativo da verificação dos requisitos legais (cf. respetivo art. 59º, nos 1 e 2).[8]

Acontece que no caso vertente nem isto tudo foi alegado ocorrer, nem seguramente se mostra verificado.

Ora se assim é, estava-se in casu, perante uma impossibilidade originária da prestação (citado art. 401º, nº 1 do C.Civil).

E não de uma mera dificuldade, antes sendo a dita impossibilidade objetiva, absoluta e essencial (não versando sobre aspetos incidentais da prestação)…

Sendo certo que tal impossibilidade sempre produziria a nulidade do negócio – referido art. 401º, nº 1.

Temos presente que as partes, dentro dos limites da lei, podem livremente fixar o conteúdo dos contratos (cf. art. 405º do C.Civil), implicando estes, desde logo, o seu acordo sobre determinado objeto, sendo também que as mesmas, dentro dos limites da lei, podem livremente fixar o conteúdo da prestação (art. 398º, nº 1 do C.Civil).

Sucede que a prestação, que é o objeto da obrigação (art. 397º), deve, além do mais, ser possível, isto é, realizável, pois ninguém pode considerar-se obrigado ao que não é suscetível de cumprimento.

Obstando, em princípio, a impossibilidade originária [que é aquela que é contemporânea da constituição do vínculo obrigacional], a que a obrigação se constitua validamente (art. 401º, nº 1, já citado).[9]

Dito de outra forma: verificando-se a impossibilidade objetiva, que afeta a prestação em si mesma, estava invalidada a obrigação.

Sendo certo que esta apontada nulidade do referido contrato-promessa de doação, sempre tornaria impossível o cumprimento da promessa de compra e venda.

Impossibilidade de cumprimento da promessa de compra e venda que não é, assim, imputável aos 3ª e 4º RR.!

Contrapõe a A./recorrida na suas contra-alegações que «Tutelar-se o direito invocado pelos Réus seria permitir um absoluto e inadmissível abuso de direito, completamente contrário aos ditames da boa fé e até da própria segurança jurídica das partes e de terceiros, pois que, no caso concreto, a autora era vista e reconhecida como proprietária do andar em causa, como resultou amplamente demostrado», termos em que, se por regra não é admissível a execução específica do contrato-promessa de doação, «(…) no concreto caso dos autos, a sua não admissão levaria a uma decisão materialmente injusta e injustificável, prejudicando a autora quanto aos seus direitos adquiridos e que exerceu, por força de um “desentendimento/capricho” das 2ª a 3ªs rés, mãe e irmã da autora.»

Que dizer?

Será que efetivamente ao abrigo do instituto do abuso de direito, com base num censurável venire contra factum proprium por parte dos RR., devia concluir-se pela admissibilidade da execução específica?

Entendemos que não.

Desde logo, no que à 2ª R. diz respeito, atento o entendimento supra exposto quanto à impossibilidade jurídica da execução específica da doação, salvo o devido respeito, dogmaticamente está afastado qualificar-se uma recusa em cumprir a doação como um abuso do direito, pela determinante razão de que, por definição, o promitente doador não pode ser censurado juridicamente por não cumprir a promessa de doação, nem esta lhe pode ser coercivamente exigida.

Temos presente que, consabidamente, «O alcance do princípio do abuso do direito excede o conjunto dos grupos ou tipos de casos considerados na doutrina e na jurisprudência – como a exceptio doli, o venire contra factum proprium, o tu quoque ou o desequilíbrio no exercício jurídico – e, por consequência, não é absolutamente necessário coordenar a situação sub judice a algum dos tipos enunciados.»[10]

Como quer que seja, o abuso de direito manifestado na variante do venire contra factum proprium baseia-se na tutela da confiança e exprime a reprovação social e moral que recai sobre aquele que assume comportamentos contraditórios, resumindo-se à ideia de que a ninguém é permitido agir contra o seu próprio ato.[11]

Atente-se que o abuso do direito assenta numa estrutura que pressupõe duas condutas da mesma pessoa, ambas lícitas, ainda que assumidas em momentos distintos e deferidos no tempo, em que a primeira (factum proprium) é contrariada pela segunda (venire contra).

Sendo que para esse efeito se costumam identificar os seguintes requisitos para aplicação desta figura: a) factum proprium – uma conduta inicial lícita da parte (acção ou omissão); b) boa-fé da outra parte, que justificadamente confiou nessa conduta; c) comportamento contraditório injustificado; d) existência de dano ou potencial dano a partir da contradição.

Ora, no caso vertente, nem nos parece legítimo sustentar que essa 2ª Ré atuou contra um seu ato anterior, isto é que teve um comportamento contraditório injustificado, quando nem sequer resultou apurado, em concreto, quais foram as razões para a doação não ter sido operada…

Quanto ao demais, porque, como resulta do precedentemente exposto, os 3ª e 4º RR. não podiam outorgar o contrato de compra-e-venda na medida em que este pressupunha o prévio cumprimento da doação, sendo que pelo incumprimento deste não podem eles ser responsabilizados.

Acresce que os 3ª e 4º RR. não tiveram nenhuma atuação, antes, admite-se, uma inação, a saber, não outorgar a prometida compra-e-venda.

Ora, s.m.j., essa inação não corresponde a uma opção ou vontade da parte dos mesmos, antes é uma situação a que os mesmos se encontravam sujeitos por circunstâncias exteriores a si e independentes da respetiva vontade – estamos a reportar-nos à anteriormente aludida impossibilidade jurídica da execução específica da doação, e, decisivamente, à impossibilidade relativamente ao objeto dessa doação, determinante da respetiva nulidade.

Sendo certo que, no quadro fáctico apurado, só pode legitimamente falar-se de recusa em consumar o contrato de doação por parte da 2ª Ré…

Ademais, os 3ª e 4º RR. [mais concretamente o destes que era prometido donatário] nunca poderiam outorgar o contrato de compra-e-venda, na medida em que este pressupunha o prévio cumprimento daquela dita promessa de doação!

Assim sendo, salvo o devido respeito, é completamente desajustado ao caso vertente invocar-se um censurável venire contra factum proprium por parte dos RR..

                                                           ¨¨

Assente isto, vejamos agora das suas consequências, com o que se entra já na apreciação dos pedidos subsidiários que haviam sido formulados na ação.

De referir que por despacho preliminar e singular do ora Relator nesta instância de recurso, se adiantou/perspetivou poder vir a revogar-se a decisão final que havia considerado procedente o pedido principal, do que decorreria ter então que se conhecer dos pedidos formulados na p.i. em via alternativa/subsidiária (cf. art. 665º, nº2 do n.C.P.Civil) – cuja apreciação fora considerada prejudicada pela procedência do pedido principal – a propósito do que se ordenou a notificação das partes para exercício do contraditório quanto ao possível enquadramento (cf. arts. 3º, nº3 e 665º, nº3 do n.C.P.Civil).

Sendo que ambas as partes corresponderam a tal nos termos que tiveram por mais convenientes.

Vejamos então.

Pugnam os RR./recorrentes no sentido de que a nulidade do contrato-promessa de doação pelos mesmos invocada teria como única consequência, à luz do disposto no art. 289º, nº 1 do Cód. Civil, a devolução à Autora AA da parte do preço efetivamente dela recebida pelos Réus DD e marido EE (ou seja, a quantia de € 18.600,00).

Atendendo ao que precedentemente se perfilhou e expôs, mormente face ao decisivo reconhecimento da nulidade do contrato-promessa de doação, não há que declarar qualquer resolução desse contrato por incumprimento dos promitentes doadores, antes tudo se resumindo nessa parte a declarar tal nulidade.

Por outro lado, a impossibilidade naturalística/objetiva de cumprimento do contrato-promessa de compra-e-venda por parte dos 3ª e 4º RR., nos termos também já supra aludidos, aliada à recusa definitiva da parte dos mesmos em cumprir tal contrato, tem como corolário/consequência, a declaração de resolução desse contrato, a qual não sendo imputável aos mesmos, determina, à luz do disposto no art. 795º, nº1 do C.Civil, a obrigação para esses 3ª e 4º RR., DD e marido EE, de devolver à Autora AA, a quantia dela efetivamente apurada como recebida, a saber, € 18.600,00 [cf. facto “provado” sob “1.8.”, na redação objeto da reformulação a que se procedeu supra].

Nestes concretos e mais restritos termos procedendo os pedidos subsidiários formulados sob as als. “a)”, “e)” e “f)”.

Bem assim procedendo o pedido de condenação desses 3ª e 4º RR. a pagar juros sobre esta quantia, desde a citação até efetivo pagamento.

Deste modo já se está a apontar no sentido de que a devolução da dita quantia não é a única consequência do acolhimento do recurso.

Acresce que também em nosso entender merecem procedência, ainda que em diversos moldes, os pedidos subsidiários de reembolso de quantias monetárias a título de indemnização por realização de benfeitorias e de montante pago a título de IMI.

Mas vejamos em que concretos termos tal tem lugar.

No particular da reclamada indemnização por realização de benfeitorias, não se olvida que os RR./recorrentes invocaram oportunamente a prescrição desse direito, para tanto sustentando[12] que «(…) é a própria Autora quem na p. i. invoca o instituto jurídico do enriquecimento sem causa para justificar o seu alegado direito», donde, face ao disposto no art. 482º do Código Civil onde se preceitua que «o direito à restituição por enriquecimento prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o credor teve conhecimento do direito que lhe compete e da pessoa do responsável, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respectivo prazo a contar do enriquecimento» [sublinhado nosso], na medida em que  «No caso dos autos, a Autora teve conhecimento do direito à restituição do montante por ela despendido nas obras, na mesma altura em que as concluiu, ou seja, em 2013», termos em que, «(…) à data da propositura da presente ação já se encontrava prescrito o alegado direito da Autora à restituição da quantia (qualquer que ela seja) despendida na realização das ditas obras».

Será assim?

Entendemos que não pelas seguintes razões.

Desde logo importa ter presente que a A. tinha a posse daquele imóvel, posse que lhe foi conferida aquando da celebração dos contratos-promessa, ao ser-lhe permitido e concedido o pleno e irrestrito uso e fruição do mesmo.

Foi nesse contexto que a mesma realizou as obras em causa, as quais insofismavelmente constituem benfeitorias, pelo menos com a natureza de “úteis”[13].

Senão vejamos.

O art. 216º do C.Civil define o conceito de “benfeitorias” e procede à sua classificação. No nº 1 estabelece que se consideram benfeitorias «todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa». No nº 2 refere que as mesmas podem ser «necessárias, úteis ou voluptuárias». E no nº 3 classifica-as do seguinte modo: são benfeitorias necessárias «as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa»; são úteis «as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor»; e são voluptuárias «as que não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante».

Em sentido jurídico, são, pois, “benfeitorias” os melhoramentos feitos em coisas por pessoas a elas ligados por alguma relação jurídica, resultante, por exemplo, de locação, comodato ou posse, só sendo de considerar necessárias as despesas imprescindíveis para a sua conservação à luz de critérios objectivos de normalidade e de razoabilidade, ao passo que benfeitorias úteis serão as despesas não imprescindíveis para a sua conservação mas idóneas ao aumento do respectivo valor; as demais são voluptuárias.[14]

Por outro lado, o art. 1273º do mesmo C.Civil estabelece que «tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento delas» (nº 1 do art. 1273º), sendo certo que «quando, para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa» (nº 2 do mesmo preceito).

A esta luz e face ao quadro fáctico “provado”, cremos não subsistirem quaisquer dúvidas que as da situação vertente se podem qualificar como “benfeitorias úteis”, por ter ficado provado (ónus que cabia à A., de acordo com o estabelecido no art. 342º, nº 1 do C.Civil[15]) que “aumentaram … o valor” do imóvel em que tiveram lugar.

Assim como, em nosso entender, não se suscitam quaisquer dúvidas quanto a haver detrimento da coisa em caso de levantamento das benfeitorias[16], donde, por aplicação do nº2 do citado art. 1273º do C.Civil, ser caso de indemnização da A., pelo valor delas, «calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa».

Ora, como já foi doutamente sustentado a este propósito, «o direito a obter o valor das benfeitorias que o possuidor pretenda obter com base no disposto no n.2 do artigo 1273 do Código Civil está sujeito ao prazo ordinário de prescrição de vinte anos estabelecido no artigo 309º ( norma geral) e não ao prazo especial de três anos estabelecido no artigo 482 apenas e só para o exercício do direito à restituição fundado no enriquecimento sem causa normal».[17]

  Neste sentido aponta a natureza subsidiária do instituto do enriquecimento sem causa (cf. art. 474º do C.Civil), isto é, trata-se do corolário lógico da natureza subsidiária da obrigação de restituir fundada no enriquecimento, da qual resulta que «o prazo de prescrição do direito à restituição por enriquecimento sem causa não se inicia enquanto o empobrecido tiver à sua disposição outro meio ou fundamento que justifique a restituição».[18]

Assim, revertendo tal ao caso presente, temos que tendo a ação sido proposta pela A. contra os RR. fundada em via principal no incumprimento do contrato-promessa e no pedido de execução específica respetivo, o prazo de prescrição em causa [o do enriquecimento sem causa] não se havia sequer iniciado à data da propositura da ação.

De referir que a melhor doutrina igualmente sustenta que «A remissão que, relativamente às benfeitorias úteis, o n.º 2 do artigo 1273.º faz para o regime do enriquecimento sem causa vale apenas para o cálculo do montante indemnizatório, sendo inaplicável a regra prescricional do art. 482.º (neste sentido, acórdão do S.T.J., de 15 de janeiro de 1981, no B.M.J., n.º 303, pags. 236 e segs.)».[19]

Concluindo-se, desta forma, pelo direito da A. a ser indemnizada por realização de benfeitorias, importa agora determinar qual o montante respetivo.

Neste particular importa ter presente que, de acordo como o preceituado no art. 479º, nº2 do C.Civil, «a obrigação de restituir não pode exceder a medida do locupletamento (…)».

Com o objetivo de esclarecer o sentido deste critério, já foi doutamente sublinhado o seguinte:

«As benfeitorias podem valer menos do que aquilo que o possuidor despendeu para as realizar e pode verificar-se também a hipótese inversa.

Se, por exemplo, as benfeitorias custaram 200 e apenas valorizaram a coisa em 100, a obrigação de restituir não excederá o montante de 100, por ser este o valor com que o proprietário se enriquece à custa do possuidor.

Se, ao invés, as benfeitorias custaram 100 e valorizaram a coisa em 200, o montante da restituição será igualmente de 100, visto ser esse o valor com que o proprietário normalmente se enriquecerá à custa do possuidor.»[20]

Sucede que se confrontarmos os dados do caso presente, não pode deixar de se constatar que nada foi alegado – nem resulta apurado! – em termos de valorização decorrente das obras feitas.

 Por outro lado, o que singela e mais restritamente resultou “provado” em termos do montante despendido nas obras foi «Nas quais despendeu montante não concretamente apurado, mas não superior a € 70.000,00» [cf. ponto “1.16.” do correspondente elenco].

Neste conspecto, o que é que resulta?

Obviamente que não pode ter lugar a condenação dos 1º e 2ª RR. [os proprietários do imóvel] nem no montante total peticionado [de € 73.291,00], nem sequer em qualquer montante definido e preciso.

Concretizemos então o que será devido por esses RR..

O art. 609º nº2 do n.C.P.Civil estipula que «Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida».

A aplicação desta norma depende da verificação, em concreto, de uma indefinição de valores de prejuízos ou da prestação devida; mas como pressuposto primeiro de aplicação do dispositivo, deverá ocorrer a prova de existência de danos; este preceito tanto se aplica no caso de se ter inicialmente formulado um pedido genérico e de não se ter logrado converter em pedido específico, como ao caso de ser formulado pedido específico sem que se tenha conseguido fazer prova da especificação, ou seja, quando não se tenha logrado coligir dados suficientes para se fixar, com precisão e segurança, a quantidade de condenação.[21]

Concretizando.

Ao abrigo do disposto no art. 609º, nº2 do n.C.P.Civil, porque nos parece ser possível vir a apurar os elementos de que depende a liquidação, importa proferir condenação, neste particular, no que se vier a liquidar como devido pelo efetivo enriquecimento da A./ valorização decorrente das obras feitas, embora com o limite máximo global de € 70.000,00 [limite superior do já provado].

Nestes termos e limites procedendo o pedido subsidiário no particular do pedido de reembolso de quantias monetárias a título de indemnização por realização de benfeitorias.

Já quanto ao pedido subsidiário de reembolso de montante pago a título de IMI, sendo insofismável que se trata de obrigação que compete ao proprietário do imóvel, na medida em que resultou efetivamente “provado” o pagamento pela A. [cf. ponto “1.13.” do correspondente elenco], importa condenar os 1º e 2ª RR. no reembolso àquela do montante em causa, a saber, € 1.917,00, igualmente acrescido de juros desde a citação até efetivo pagamento.

Vejamos, para finalizar, o pedido subsidiário de ser reconhecido à A. o direito de retenção do imóvel em causa até que lhe seja liquidado pelos “RR.” (sic) os valores peticionados.

É que o direito de retenção, previsto nos artigos 754º e seguintes do Código Civil, consiste na faculdade de não restituir uma coisa, enquanto o credor dessa restituição não cumprir, por seu turno, a obrigação que tem para com o retentor.

Com base nessa garantia, é conferido ao retentor o direito de se fazer pagar preferencialmente pelo valor da coisa retida.

O direito de retenção tem duas funções, a de garantia e a de coerção, sendo que esta última consiste na faculdade de recusa da entrega da coisa retida, sem incorrer em responsabilidades, enquanto o credor da restituição não cumprir a sua obrigação, pressionando, desta forma, o cumprimento da obrigação em falta.

De referir que, atento o preceituado no art. 756º do C.Civil, são pressupostos do direito de retenção: i) a posse ou detenção legítima de coisa alheia ii) o detentor da coisa ser credor do titular da coisa objeto de retenção iii) existência de uma conexão entre a coisa e o direito de crédito iv) não existir afastamento do direito de retenção pela prestação de caução.

Por outro lado, preceitua-se no art. 757º, nº2 do mesmo normativo que «O direito de retenção não depende da liquidez do crédito do respetivo titular.»

Ora, como já foi doutamente sublinhado a este propósito, como exemplo de titular com uma detenção lícita da coisa, «(…) pode citar-se o do crédito por benfeitorias feitas pelo possuidor de boa fé (cf. arts. 1273.º e 1275.º; vide também o caso decidido pelo acórdão do S.T.J., de 18 de Dezembro de 1970, no B.M.J., n.º 202, págs. 202 e segs., e na Rev. de Leg. e de Jur., ano 104.º, págs. 293 e segs., com anotação de Vaz Serra)».[22] 

Assim sendo, à luz de tudo o exposto impõe-se concluir pela procedência deste pedido de reconhecimento do direito de retenção.

Sendo certo que na medida em que a entrega/restituição em causa só tem sentido e razão de ser em relação aos 1º e 2ª RR. – os proprietários do imóvel! – obviamente que apenas em relação a eles pode ser reconhecida e ser decretada.

                                                           ¨

Nestes termos e limites procedendo o recurso deduzido pela A..

(…)

                                                                       *

6 - DISPOSITIVO

Pelo exposto, na revogação da sentença da 1ª instância, acorda-se em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação deduzido pelos 2ª, 3ª e 4º RR., em consequência do que, revogando-se a condenação dos mesmos proferida por via da procedência da execução específica na sentença recorrida, se substitui o dispositivo da sentença pelo seguinte:

«I – declara-se a nulidade do contrato-promessa de doação ajuizado que teve por objeto a doação pelos RR. BB e CC a favor da autora AA e à ré DD do 1º andar, sótão e logradouro do prédio inscrito na matriz sob o artigo ...02º da freguesia ..., concelho e distrito ... e descrito na Conservatória do Registo Predial ..., sob o n.º ...55;

II – reconhece-se que tal tornou impossível o cumprimento da promessa de venda pela ré DD da sua parte nesse imóvel a favor da autora AA, o que, aliado à recusa definitiva da parte dessa ré DD e marido EE em cumprir tal contrato, tem como consequência declarar-se a resolução desse contrato;

III – condenam-se esses réus, DD e marido EE, a devolver à autora AA, a quantia dela recebida no contexto desse prometido contrato, isto é, € 18.600,00, acrescidos de juros, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento;

IV – condenam-se os réus BB e CC a indemnizar a autora AA pelas benfeitorias feitas no prédio em causa, sendo-o no montante que se vier a liquidar como devido pelo efetivo enriquecimento da autora/valorização decorrente das obras por esta feitas, embora com o limite máximo global de € 70.000,00;

V – reconhece-se o direito de retenção do imóvel em causa pela autora AA até que lhe seja liquidado pelos réus BB e CC o valor a apurar a este título;

VI – condenam-se os réus BB e CC a reembolsar a autora AA do montante por esta pago a título de IMI do dito imóvel, isto é, € 1.917,00, igualmente acrescido de juros, à taxa legal, desde a citação até efetivo pagamento;

VII – absolvem-se os réus BB, CC, DD e EE quanto ao demais peticionado;

VIII – absolve-se a autora AA dos pedidos reconvencionais contra ela deduzidos;

IX – custas da ação e do recurso a cargo da autora e réus CC, DD e EE, na proporção de ¼ para aquela e ¾ para estes.

X – custas do pedido reconvencional a cargo das rés CC e DD, na proporção do respetivo decaimento.»

                                  Coimbra, 7 de Novembro de 2023

                                                        Luís Filipe Cravo

                                                   João Moreira do Carmo

                                                       José Fonte Ramos


[1] Relator: Des. Luís Cravo
  1º Adjunto: Des. João Moreira do Carmo
  2º Adjunto: Des. Fonte Ramos

[2] De referir que este ponto de facto não será objeto de qualquer apreciação, por não aparecer qualquer referência ao mesmo no corpo das alegações recursivas, nem aliás se encontrar qualquer justificação, do ponto de vista dos RR./recorrentes, para a sua impugnação [antes ocorrendo o contrário!], donde ter sido seguramente por mero lapso de escrita que o mesmo foi integrado neste elenco dos factos impugnados.
[3] Sendo até que esse “acerto de contas” figura expressamente entre os factos “não provados” – cf. ponto “2.26” do correspondente elenco.
[4] Assim ALMEIDA E COSTA in “Direito das Obrigações”, 12ª Ed., Livª Almedina, a págs. 422-423.
[5] É o caso de MENEZES DE LEITÃO in “Direito das Obrigações”, Vol. I, 15ª Ed., Livª Almedina, a págs. 189, e por ANA PRATA, in “Código Civil –Anotado”, Vol I, 2017, Coordenação de ANA PRATA, Livª Almedina.
[6] Cf., inter alia, o acórdão do TRP de 26.09.2016 (proferido no proc. nº 1248/13.3T2AVR-A.P1) e os acórdãos do STJ de 21.11.2006 (proferido no proc. nº 06A3608) e de 09.05.2019 (proferido no proc. nº 1563/11.0TVLSB.L1.S3), todos eles acessíveis em www.dgsi.pt.
[7] Cf. neste sentido e mais aprofundadamente LUÍS A. CARVALHO FERNANDES, in “Lições de Direitos Reais”, 6ª edição (reimpressão), Quid Juris, 2010, a págs. 377 e 379, aliás, doutamente citado no acórdão do TRC de 12.02.2019, proferido no proc. nº 30/17.3T8FCR.C1, acessível em www.dgsi.pt, de que foi Relator o aqui Exmo. 2º Adjunto.
[8] Neste sentido vide o acórdão do STJ de 29.11.2006, proferido no proc. nº 06A3355, igualmente acessível em www.dgsi.pt.
[9] Podendo a impossibilidade temporária, nos precisos termos do nº 2 do mesmo art. 401º, que aqui não estão em causa, não acarretar a nulidade do negócio!


[10] Assim no acórdão do STJ de 14.03.2019, proferido no proc. nº 1189/15.0T8PVZ.P1.S1, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[11] Neste sentido vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, in “Tratado de Direito Civil Português”, I, Parte Geral, Tomo I, a págs. 200.
[12] Designadamente no exercício do contraditório que lhes foi facultado já nesta instância de recurso ao abrigo do disposto no art. 665º, nos 2 e 3 do n.C.P.Civil.
[13] Cf., em particular, o facto “provado” sob “1.36.”: «Todas as obras, equipamentos e instalações efetuadas e pagas pela autora, aumentaram o valor do imóvel/fração».

[14] cfr. VAZ SERRA, in RLJ 106º-109 e, inter alia, os acórdãos do STJ de 09/02/2006 (proferido no proc. nº 06B014) e de 06/05/2008 (proferido no proc. nº 08A1389), ambos eles acessíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[15] Neste sentido, inter alia, os acórdãos do STJ de 06/05/2008 (proferido no proc. nº 08A1389) e de 22/03/2018 (proferido no proc. nº 336/13.0TBTVD.L1.S1), ambos eles acessíveis em www.dgsi.pt/jstj.
[16] Cf. o que consta do facto “provado” sob “1.35.”, a saber: «Não é possível tecnicamente sem deteriorar gravemente o imóvel dele retirar, a cobertura substituída, a impermeabilização exterior efetuada, a colocação de janelas e arranjo dos peitoris, a colocação de portas a arranjo de soleiras, todo a infraestrutura e instalações destinadas ao aquecimento central e águas, os revestimentos de paredes e soalhos, os equipamentos sanitários e móveis de cozinha».
[17] Trata-se do acórdão do TRG de 10/09/2013, proferido no proc. nº 533/11.3TBAVV-A.G1, igualmente acessível em www.dgsi.pt/trg.
[18] Citámos agora o acórdão do STJ de 26/02/2004, proferido no proc. nº 03B3798, acessível em www.dgsi.pt/jstj.
[19] Assim por PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in “Código Civil Anotado”, Vol. III, Coimbra Editora, 1987, a págs. 43.
[20] Cf. PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, Coimbra Editora, 1987, a págs. 467.
[21] cfr. ALBERTO DOS REIS, in “Código de Processo Civil Anotado”, vols. I pág. 614 e segs. e V pág. 71; VAZ SERRA, in “RLJ”, ano 114.º, pág. 309 e RODRIGUES BASTOS, in “Notas ao C.P.C”, vol. III, pág. 233.
[22] Citámos novamente PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, Coimbra Editora, 1987, ora a págs. 773-774.