Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
326/22.2T8ENT.E1
Relator: ROSA BARROSO
Descritores: PERSI
EXTINÇÃO
COMUNICAÇÃO
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Seria adulterar todo o espírito subjacente ao diploma (DL n.º 227/2012) aceitar que o simples decurso do prazo de menos de 20 dias desde a data da integração do cliente bancário em PERSI extingue o mesmo, em especial, quando está em causa a solicitação de variada documentação.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Recurso de Apelação n.º 326/22.2T8ENT.E1

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

1 – Relatório
Nos autos de oposição à execução mediante embargos, o executado … (ausente), através da Digna Magistrada do Ministério Público, opôs-se à execução mediante embargos de executado.
Para tanto, refere, para além do mais, que o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) não foi cumprido.
Por despacho datado de 13 de Março de 2023, foram admitidos liminarmente os embargos de executado.
O exequente/embargado Banco (…), S.A. contestou, defendendo, em síntese, a improcedência dos embargos e juntando cópia das cartas que terão sido remetidas para o cumprimento do PERSI.
Foi proferida a seguinte decisão:
Face ao exposto, decide-se julgar o incidente de oposição à execução mediante embargos de executado procedente, por provado, uma vez evidenciada a excepção dilatória inominada por falta de cumprimento do PERSI, e, subsequentemente, absolve-se o executado da instância, determinando a extinção da execução com o consequente levantamento, após trânsito, de quaisquer penhoras realizadas no processo de execução (artigo 732.º, n.º 4, do Código de Processo Civil).
…”
Foi interposto recurso desta decisão.
Nas suas alegações o Recorrente apresentou as seguintes conclusões:
A. No âmbito da instância executiva da qual emana a presente peça, o Ministério Público foi citado em representação do Executado, ausente.
B. E, nessa conformidade, deduziu oposição mediante embargos de executado, alegando que o Exequente não havia cumprido o PERSI e, portanto, pugnando pela extinção da instância.
C. O Exequente/Recorrente contestou, procedendo à junção das cartas de integração e extinção do PERSI, mais pugnando pelo prosseguimento da instância, por cumprimento do PERSI.
D. O Tribunal proferiu sentença nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 595.º do CPC, determinando a procedência dos embargos, por considerar que a carta de extinção do PERSI não contém as razoes pelas quais não considera viável a manutenção do procedimento, entendendo violador do n.º 3 do artigo 17.º do DL 227/2012, de 25/10.
E. O Recorrente entende que há erro da interpretação da lei diante do motivo de extinção, aqui concreto.
F. O n.º 3 do artigo 17.º do DL 227/2012 de 25/10 dispõe: “A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razoes pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento.” (negrito e sublinhado nossos).
G. Entende o Recorrente que esta imposição legal faz todo o sentido – a de descrever o fundamento legal e as razões da inviabilidade da manutenção do procedimento – precisamente quando o PERSI é extinto nos termos de alguma das alíneas do n.º 1 ou n.º 2 do artigo 17.º do DL 227/2012, de 25 de outubro.
H. Ora, na comunicação da extinção do procedimento, evidentemente, faz todo o sentido constar expressa e inequivocamente que o PERSI foi extinto pelo pagamento ou por decorridos os 91 dias sem acordo ou possibilidade de…, ou por insolvência do cliente bancário, ou porque o ciente bancário não enviou a documentação solicitada, ou porque o cliente bancário recusou a única proposta viável para a manutenção, etc.…
I. Na realidade, a obrigatoriedade de explicitar o motivo legal da extinção faz sentido para informar o cliente bancário do motivo concreto e fundamentos decisórios e a indicação dos fundamentos é particularmente importante – mesmo fundamental – no caso de a extinção ocorrer nos termos da alínea c), d) ou e do n.º 2 do artigo 17.º do DL 227/2012, de 25/10.
J. Nestes casos, o Recorrente admite mesmo que, sem fundamentação devida, não estariam acautelados os direitos do cliente bancário.
K. E, em particular nestas três alíneas, supra referidas, a fundamentação e explicitação dos motivos da extinção é imperiosa, ademais, porque a extinção resultará de uma análise e avaliação por parte da instituição credora, avaliação essa que terá se redundar numa conclusão de inviabilidade da via amigável.
L. No caso aqui em discussão, diferentemente, entende o Recorrente que tal dever imperioso de fundamentação não existe – contrariamente ao julgado na sentença proferida – pois não aqui há qualquer fundamentação passível de ser explanada, face à ausência de resposta do cliente bancário… trata-se de uma impossibilidade prática.
M. Assim, nos autos, a extinção do PERSI, resulta tão-somente da ausência de resposta do cliente bancário, resulta diretamente da sua não ação…
N. Ora, desta não ação do cliente bancário se extrai inequivocamente a impossibilidade de acordo das partes, a impossibilidade análise documental, por falta de interesse do mesmo na resolução extrajudicial…
O. Dispõe o n.º 2 do artigo 4.º do DL 227/2012, de 25/10 que “os clientes bancários devem gerir as suas obrigações de crédito de forma responsável e, com observância do princípio de boa fé, alertar atempadamente as instituições de crédito para o eventual risco de incumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito e colaborar com estas na procura de soluções extrajudiciais para o cumprimento dessas obrigações”.
P. Ora, não tendo o cliente bancário sequer oferecido resposta, violando ele próprio uma norma imperativa e um princípio geral previsto no DL 227/2012, de 25/10, questiona-se em que medida poderia o tribunal a quo penalizar ainda o Recorrente, entendendo que a falta de resposta importaria um dever de fundamentação da impossibilidade de acordo…
Q. Uma falta de resposta é efetivamente isso, uma falta de resposta, uma falta de interesse em resolver amigavelmente, uma falta de prestação de informação obrigatória à instituição credora, não podendo o Recorrente escrever mais do que escreveu, por ele próprio não saber os motivos pelos quais o cliente bancário não pretende a via amigável…
R. Uma falta de resposta é isso mesmo, uma falta de resposta!
S. Portanto, entende o Recorrente que não há qualquer obrigação de explicitação taxativa das razões pelas quais não considera viável a manutenção do procedimento, não estando, pois, respeitado o artigo 17.º indicado…” conforme decorre da sentença proferida, pois da ausência de resposta do cliente bancário já se extrai inequivocamente a ausência de possibilidade de manutenção do procedimento, pois a entidade credora não poderá negociar com quem não tem vontade de…
T. Entende o Recorrente que – e face ao supra exposto – há erro claro na interpretação do n.º 3 do artigo 17.º do DL 227/2012, de 25/10.
U. Mais entende, ainda, o Recorrente, que há um excesso de paternalismo do tribunal, que, em duas instâncias, procedeu à defesa de um consumidor que até ao momento não se mostrou minimamente interessado em ser auxiliado na resolução de um problema financeiro, mais continuando a utilizar um bem de elevado valor que adquiriu com recurso a crédito que não paga.
V. Mediante tal ausência de resposta, o que poderia o credor fazer? Dirigir novas missivas? Não resolver o contrato e aguardar eternamente resposta do cliente bancário? Manter suspensa a execução da dívida?
W. Indubitavelmente que não…
X. Indubitavelmente se verifica uma impossibilidade de resolução extrajudicial, motivada pela ausência de comunicação por parte do cliente bancário…
Y. “Interpretar uma lei não é mais do que fixar o seu sentido e o alcance com que ela deve valer, ou seja, determinar o seu sentido e alcance decisivo; O escopo final a que converge todo o processo interpretativo é o deporá claro o verdadeiro sentido e alcance da lei; o que exterioriza o sentido mais razoável e harmoniza duas grandes preocupações da teoria da interpretação da lei: a certeza do direito e a segurança jurídica” Manuel de Andrade, ensaio sobre a teoria da interpretação das leis, Coimbra 1978, 3.ª ed., págs. 26, 32 e 95.
Z. O que manifestamente não se verificou, pois, o tribunal a quo invocou analogicamente acórdãos que não são análogos com este motivo de extinção em concreto.
AA. O Recorrente entende que a sentença proferida viola o artigo 9.º do Código Civil, por interpretar erradamente o preceituado no artigo 17.º, n.º 3, do DL 227/2012, de 25 de Outubro.
BB. Não se aplica a imposição de justificação da norma legal e dos motivos da extinção do PERSI neste caso concreto, porque a extinção não resulta de qualquer análise que careca ser justificada.
CC. A ausência de resposta de alguém é exatamente uma ausência de resposta, dela não se podendo extrair qualquer outra consequência senão a extinção do procedimento, uma vez que o mesmo não poderia ser imposto unilateralmente pelo credor…
DD. A fundamentação faz sentido havendo algo a decidir, neste caso, que fundamentação e quais as razões justificáveis para a extinção com a ausência de resposta do cliente bancário? Não havendo nada passível de ser acrescentado, desde logo porque a extinção resulta do comportamento e não de uma qualquer análise bancária…
EE. Mais entende, por fim, o recorrente, que o tribunal a quo não considerou – conforme devia – a violação, por parte do cliente bancário, de um princípio de boa fé, imposto no n.º 2 do artigo 4.º do DL 227/2012, de 25 de outubro, tratando o caso concreto como se apenas ao credor assistissem obrigações e deveres, o que manifestamente não é o espírito do DL n.º 227/2012, de 25 de outubro.
FF. Foi, assim, que pelo tribunal a quo, violado o artigo 9.º do C.C. e desconsiderado e não valorado o n.º 2 do artigo 4.º do DL 227/2012, de 25/10.
GG. Mais foi mal interpretado o n.º 3 do artigo 17.º do DL n.º 227/2012, de 25/10.
HH. Requerendo-se a anulação da sentença proferida e a substituição por acórdão que determina a validade do PERSI e o prosseguimento da instância executiva, até efectivo e integral pagamento.

NESTES TERMOS e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença, proferida em 1.ª instância, ser revogada e substituída por acórdão que julgue por cumprido o procedimento legal do PERSI, culminando com a improcedência dos embargos deduzidos e o prosseguimento da instância executiva até efetivo e integral pagamento,
Assim se fazendo a tão acostumada JUSTIÇA!”
Foram apresentadas contra-alegações pugnando-se pela manutenção do decidido.
Colhidos os vistos legais cumpre apreciar e decidir.
II – Os Factos
1. Foi apresentada como título executivo a livrança junta aos autos principais com o requerimento executivo, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido.
2. O embargante é subscritor da referida livrança.
3. Nos presentes autos, foi junta com a contestação, pelo exequente, carta de extinção do PERSI relativamente ao embargante, da qual consta que:
«Exmo.(a) Senhor(a),
Nos termos e para os efeitos do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, informamos V. Exa. que procedemos à extinção do PERSI, no dia 17/9/2020, por ausência de resposta de V. Exa.»
Vai aditado o seguinte facto, provado por documento junto aos autos e não impugnado (artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
4. A 02 de setembro de 2020, foi remetida a carta de Integração no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) – Cfr. Doc. 3 junto com a contestação – acompanhada de resenha do instituto jurídico, contactos da Embargante e a informação legalmente exigida, a ser prestada no prazo de 10 dias.

II – O Direito
É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, salvo questões de conhecimento oficioso – artigos 635.º, n.º 4, 639.º e 608.º, n.º 2, in fine, todos do Código de Processo Civil.
A pretendida alteração da matéria de facto (constante das alegações e que se adequa ao pretendido nas conclusões), com a inclusão da primeira carta enviada ao devedor, sempre seria de proceder, mas já foi aditada por nós nos factos assentes.
A questão suscitada no recurso consiste em apreciar se foi correctamente cumprido o dever de informação da exequente perante o executado e se foi dado conta de forma suficiente, das razões pelas quais se considerou extinto o PERSI.
Vejamos.
Nos termos do artigo 12.º do DL 227/2012, de 25/10, as instituições de crédito promovem as diligências necessárias à implementação do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) relativamente a clientes bancários que se encontrem em mora no cumprimento de obrigações decorrentes de contratos de crédito.
Consta do preâmbulo do citado Decreto-Lei n.º 227/2012, «[a] concessão responsável de crédito constitui um dos importantes princípios de conduta para a atuação das instituições de crédito. A crise económica e financeira que afeta a maioria dos países europeus veio reforçar a importância de uma atuação prudente, correta e transparente das referidas entidades em todas as fases das relações de crédito estabelecidas com os seus clientes enquanto consumidores na aceção dada pela Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril. (…)
Neste contexto, com o presente diploma pretende-se estabelecer um conjunto de medidas que, refletindo as melhores práticas a nível internacional, promovam a prevenção do incumprimento e, bem assim, a regularização das situações de incumprimento de contratos celebrados com consumidores que se revelem incapazes de cumprir os compromissos financeiros assumidos perante instituições de crédito por factos de natureza diversa, em especial o desemprego e a quebra anómala dos rendimentos auferidos em conexão com as atuais dificuldades económicas».
Deste modo, «define-se um Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), no âmbito do qual as instituições de crédito devem aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objetivos e necessidades do consumidor».
Como se escreveu no Acórdão deste Tribunal de 20.04.2023, em que a ora relatora teve intervenção “Num tal quadro, em que ali também são ponderadas as «assimetrias de informação entre consumidores e instituições de crédito», o cumprimento do PERSI não pode, como repetidamente temos assinalado, ser olhado de soslaio ou como mero pró-forma, o que seria o caso dos autos se porventura o tribunal aceitasse como validamente cumprida a obrigatória comunicação de integração dos executados naquele procedimento sem que, como lhe competia, a exequente tenha comprovado – ainda que de forma meramente perfunctória – o envio do documento informativo elaborado em conformidade com o modelo constante do Anexo II ao Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012.”
Resulta do artigo 18.º do mesmo diploma que o recurso ao tribunal é uma etapa que não pode ser antecipada, ou seja, não pode ocorrer sem que antes o credor tenha cumprido a obrigação de integrar o devedor no PERSI, como determina o artigo 14.º, e de seguir os trâmites previstos nos artigos 15.º e 16.º, tendo em vista a possibilidade de encontrar uma solução extrajudicial. Só após a extinção do PERSI, quando não é possível encontrar uma solução negociada, se torna lícito ao credor recorrer à via judicial, devendo ainda informar o consumidor, nos termos do artigo 17.º, n.º 3, sobre as razões que inviabilizam a solução extrajudicial.
O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da ação executiva movida por uma entidade financeira contra um devedor consumidor, cuja ausência se traduz numa exceção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância.
Salvo melhor entendimento, e sabemos da divergência jurisprudencial existente, o PERSI não pode ser visto e usado, entendendo que se cumpre a lei, como uma formalidade apenas.
Como no caso dos autos, em que se envia uma carta datada do dia 02 de Setembro a iniciar o procedimento e se julga extinto o mesmo no dia 19, do mesmo mês.
A instituição de crédito que move ação executiva contra o subscritor da livrança, o consumidor, que se encontra em mora, tem o ónus de demonstrar que cumpriu as obrigações impostas pelos artigos 12.º e seguintes do DL 227/2012, que prevê o regime jurídico do PERSI.
Estatui o artigo 17.º, n.ºs 2 e 3 a 5, do Decreto-Lei n.º 227/2012:
«2- A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que:
(…)

c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI;
d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior;
(…)
3 - A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento.
4 - A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1.
5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3». Em cumprimento deste n.º 5, do artigo 8.º do sobredito Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012, sob a epígrafe «[c]omunicação de extinção do PERSI», decorre o que segue: «A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações:
a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal;
b) Consequências da extinção do PERSI, nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, designadamente a possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos;
c) Quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação, informação acerca do regime constante do Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de novembro, na redação da Lei n.º 59/2012, de 9 de novembro, relativamente à resolução e ao direito à retoma do contrato de crédito;
d) No caso de o cliente bancário estar abrangido pelo regime extraordinário de regularização do incumprimento de contratos de crédito à habitação, referência, quando tal decorra do referido diploma legal, ao direito do cliente bancário à aplicação de medidas substitutivas, bem como aos termos em que poderá solicitar a sua aplicação;
e) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI;
f) Indicação dos elementos de contacto da instituição de crédito através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento.
Ao executado foi transmitido que aqueles procedimentos se extinguiram por ausência de resposta.
Ora, no caso em apreço caímos no estatuído no mesmo artigo 17.º, normativos insertos nos n.ºs 2, alíneas c) e d), 3, 4 e 5, antes referidos.
A este respeito aderimos aquilo que se escreveu no Acórdão deste Tribunal de 24.11.2022, visitável in www.dgsi.pt
Tendo a instituição bancária indicado genericamente como fundamento legal da extinção do PERSI, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10, e tendo também indicado genericamente a causa da inviabilidade da manutenção do procedimento, referenciando tão só a falta de colaboração com a instituição de crédito e a falta de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, nada de concreto referiu quanto aos fundamentos da extinção do referido procedimento, seja por via da descrição dos factos que a tal determinaram, seja pela concretização dos fundamentos que, no seu entender, a tal levaram.
Essa forma de comunicação viola a ratio legis do citado diploma, bem como o disposto no artigo 17.º, n.º 3, do mesmo, e artigo 8.º, alínea a), do Aviso n.º 17/2012, do Banco de Portugal, aplicável ao caso dos autos, impedindo os clientes bancários de se defenderem, quer no plano factual, quer no plano legal, caso a entidade bancária venha instaurar procedimento judicial contra os mesmos para cobrança do crédito incumprido.
A violação do no n.º 3 do artigo 17.º do PERSI nos termos sobreditos, determina a ineficácia da comunicação da extinção do PERSI (n.º 4 do artigo mesmo artigo 17.º), mantendo-se o impedimento de instauração da ação executiva.
De grande relevo temos que, no nosso caso a carta a integrar no PERSI, está datada de 02.09.2020 e outra a extinguir o PERSI está datada de 17.09.2020.
O que seria possível fazer nestes dias?
Não conseguimos ver mais do cumprir uma formalidade por parte da entidade bancária.
Esse não é o espírito subjacente ao instituto em causa.
Nada é referido em termos claros, quanto às concretas razões em que se terá baseado a inviabilidade da manutenção do procedimento, descrevendo os factos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo, sendo certo que o tempo que mediou uma e outra carta é quase nada e, por isso, quase abusivo o que do decurso deste prazo se extraiu.
Não basta, pois, repetir os dizeres que constam da lei, pois isso, nada concretiza em relação aos devedores destinatários da extinção do PERSI (como se escreveu no citado acórdão).
A entidade bancária não se pode eximir de comunicar as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento, sob pena de ineficácia da comunicação da extinção do PERSI, quanto mais com o decurso de um prazo de tão poucos dias.
A entidade bancária não se pode eximir de comunicar.
Seria adulterar todo o espirito subjacente ao diploma que vimos a analisar (DL n.º 227/2012), aceitar que o simples decurso de um prazo tão curto desde a data da integração do cliente bancário em PERSI extingue o mesmo, em especial, quando também não foram de forma clara explicitadas as razões da integração no programa.
Ou entender que esta extinção poderia ocorrer sem que a entidade bancária tivesse que indicar as razões que inviabilizaram a manutenção do procedimento, bastando-lhe comunicar ao cliente bancário a extinção pelo decurso do referido prazo, poucos dias, como já vimos dizendo.
O cumprimento prévio dos deveres impostos pelo regime do PERSI constitui um pressuposto específico da ação executiva movida por uma entidade financeira contra um devedor consumidor, cuja ausência se traduz numa exceção dilatória inominada de conhecimento oficioso que conduz à absolvição da instância.
Ou então nada se cumpre, nada se faz e a resolução extrajudicial pretendida não ocorrerá.
Que avaliação foi feita por parte da entidade credora? Cremos que nenhuma.
Concluímos, pois, no sentido de não ter sido validamente cumprida a obrigatória comunicação de extinção do PERSI.
Não assiste, por isso, razão à Recorrente.

Sumário: (…)

IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se improcedente a apelação e vai confirmada a decisão recorrida.
Custas pela Apelante.
Évora, 08 de Fevereiro de 2024
Rosa Barroso
Canelas Brás
Isabel Imaginário