Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
107599/21.0YIPRT.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
REDUÇÃO DO PREÇO
LIQUIDAÇÃO EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA
EQUIDADE
Data do Acordão: 02/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – Baseando-se esta asserção no princípio do cumprimento simultâneo das obrigações sinalagmáticas e na manutenção do equilíbrio patrimonial característico dos contratos bilaterais, a excepção de não cumprimento tem como efeito principal a dilação do tempo de cumprimento da obrigação de uma das partes até ao momento do cumprimento da obrigação da outra parte.
2 – O cumprimento defeituoso constitui uma das formas de violação do dever de prestar, que provém dos vícios, defeitos ou irregularidades da prestação efectuada que causa danos ao credor, ou, pelo menos, desvaloriza, a prestação, sendo certo que a questão de saber de o defeito da prestação prejudica ou não o fim da obrigação tem que ser apreciada e resolvida objectivamente, por analogia com o disposto para outras situações da mesma natureza, mas tendo em linha de conta os termos e as circunstâncias próprios de cada situação concreta.
3 – Da conjugação dos artigos 911.º, 913.º, 914.º e 915.º do Código Civil, resulta que o comprador do bem defeituoso tem o direito de exigir do vendedor em alternativa a reparação da coisa, a anulação do contrato, uma indemnização ou a redução do preço.
4 – Só é possível deixar para liquidação em execução de sentença a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora se prove a sua existência, não existam os elementos indispensáveis para fixar o seu quantitativo, nem sequer recorrendo à equidade.
5 – Comprovados os defeitos, tem a parte prejudicada o direito à redução do preço acordado, que se entende dever ser já fixada, por recurso à equidade ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 566.º do Código Civil.
6 – A equidade é assim a justiça do caso concreto, flexível, humana, independentemente de critérios normativos fixados na lei, devendo, o julgador ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 107599/21.0YIPRT.E1
Tribunal Judicial da Comarca de ... – Juízo Central de Competência ... – J...
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente acção intentada por “S..., SL” contra “V..., Lda.”, a Autora veio interpor recurso da sentença proferida.
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A sociedade Autora pedia a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 79.542,39, sendo € 63.921,30 a título de capital e € 15.468,09 a título de juros de mora e € 153,00 de taxa de justiça.
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Em benefício da respectiva pretensão a Autora alegou que, no exercício da sua actividade, foi celebrado entre as partes um contrato de fornecimento de bens e serviços e que, no âmbito do mesmo, foram entregues plantas de batata-doce à Ré, que não foram integralmente pagas.
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A Ré deduziu oposição, onde alegou que o serviço foi prestado de forma tardia e deficiente pela Autora e que as plantas adquiridas estavam infectadas com vírus e tiveram de ser arrancadas. E, por isso, a Ré não procedeu ao pagamento do preço.
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O processo de injunção foi remetido à distribuição, tendo passado a ser tramitado como acção comum.
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Procedeu-se a audiência prévia e proferiu-se despacho saneador.
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Realizado julgamento, o Tribunal a quo decidiu julgar procedente a excepção de não cumprimento invocada pela Ré, não sendo assim exigível o pagamento dos valores pedidos pela Autora, assim como dos montantes invocados a título de juros de mora.
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A sociedade recorrente não se conformou com a referida decisão e, após aperfeiçoamento, as alegações de recurso continham as seguintes conclusões:
«A) O presente recurso vem interposto pela A. aqui Recorrente da douta sentença proferida nos presentes autos, pela qual o tribunal a quo decidiu julgar a ação improcedente e não provada e, em consequência, absolver a R. do pedido.
B) Na decisão escrutinada no presente recurso a Meritíssima Juiz não se pronuncia sobre questões que deveriam ser objeto de pronuncia, o que configura uma manifesta omissão de dever de pronuncia que consubstancia causa de nulidade da sentença (artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, do CPC) que a saber: (i) a emissão de “pagaré” emitido pelo valor correspondente a 50% do valor de cada fornecimento, a entregar pela R. à A. No momento a descarga da mercadoria e com vendimento a 30 dias; (ii) independentemente das datas previsíveis para o inicio dos fornecimento referentes à campanha de 2018, estes apenas se iniciariam após o integral pagamento dos valores em dívida da campanha de 2017 e (iii) a inexistência de acreditação do laboratório (…) para a realização de análise fitopatológicas, que só pode ser arguida perante tribunal superior, na medida em que decisão admite recurso (n.º 4 do artigo 615.º do CPC), pelo que as mesmas servem de fundamento ao presente.
C) O Tribunal a quo incorreu ainda num erro de julgamento na apreciação dos factos e da prova que sobre os mesmos recaiu, não concordando a, depois de entrecruzar, corelacionar e complementar os depoimentos, documentos e articulados constantes das alegações supra, com os factos dados provados nos seguintes pontos constantes do segmento da sentença referente à Fundamentação de facto, subtítulo factos provados: 4, 6, 7, 10, 12, 13, 14, 15 e 17, para os quais, observando ónus que sobe ela impende nos termos do artigo 640.º, n.º 1, alínea c), requer a reapreciação deste Tribunal, sendo a redação a dar aos referidos pontos dos factos provados a seguinte:
4. As condições acordadas para a campanha de 2018 (fornecimento de plantas) eram: pagamento de 50% do valor da fatura da mercadoria fornecida na data da descarga e entrega à R. e os restantes 50% com vencimento a 30 dias dessa data, garantidos pela emissão e entrega de um pagaré (cheque) na data da entrega da mercadoria.
6. A R. tinha encomendado à A. um total de 3.300.000 plantas, que deveriam ser fornecidas ao longo de um período global de 10 semanas, iniciando-se o fornecimento após o pagamento do valor em divida, pela R. à A., referente à campanha de 2017.
7. A. começou a fornecer as plantas Georgia Jet encomendadas pela Ré a 20 de abril de 2018, cerca de 2 dias após o integral pagamento do valor em dívida pela R. à A. referente à campanha de 2017.
10. Além disso, na altura da receção na Comporta das plantas encomendadas, os técnicos da Ré verificaram que as mesmas aparentavam não se encontrar em condições visualmente perfeitas.
12. Os resultados dessas análises permitiram verificar que as plantas continham dois vírus: Sweet Potato feathery mole vírus (SPFMV) e Sweet potato leaf curl vírus (SPLCV).
13. Os vírus em causa, além de afetarem as plantas, inviabilizando o seu normal crescimento, podem contaminar plantações adjacentes e prejudicar o seu desenvolvimento.
14. O que levou a Ré a agir preventivamente, arrancando algumas plantas entregues pela A., em quantidade não determinada, procurando evitar riscos de contágio alargado.
15. Na sequência do que perdeu uma parte não determinada da cultura que pretendia obter com a plantação destas plantas de batata-doce.
17. Tendo a Ré respondido, designadamente por emails de 17/05/2018 e 18/05/2018, invocando os atrasos nas entregas das plantas e em quantidades inferiores ao acordado e referindo-se à existência de dois vírus, após a supressão do ponto 18 dos factos provados, que se fusionará no ponto 17, mas sem qualquer menção à denúncia, uma vez que não foi produzida prova que fundamente a sua inclusão (denúncia) nos factos provados.
D) Em face da prova produzida e da sua devida ponderação e valoração, deverá passar a integrar o elenco dos factos não provados, a existência de vírus nas amostras colhidas das plantas fornecidas pela A. à Ré e os atrasos nos fornecimentos de plantas por factos imputáveis à Autora.
E) A respeito da Motivação, a posição do Tribunal a quo e da Meritíssima Juiz na ponderação da prova merece reparos e reservas por parte da A., já que o Tribunal a quo na decisão recorrida efetua uma apreciação, ponderação e valoração de prova, sectária e parcial, que deixa de fora dos fatos provados pormenores determinantes, adotando uma postura maniqueísta, desconsiderando as declarações do legal represente e da testemunha da A. Recorrente, e estabelecendo um binómio entre testemunhas da A. e da R., sendo que as da R. Recorrida são merecedoras de crédito, enquanto as da A. não são, em sua opinião, errada, diga-se, tão congruentes nos seus depoimentos.
F) O Tribunal a quo louvou-se nos depoimentos das testemunhas arroladas pela R., sem que os mesmos sejam suficientemente firmes e desinteressados de modo a alicerçar a prova e a convicção do Tribunal, que também não fundamentou como devia as suas decisões e “valorações” em sede de apreciação de prova, incorrendo num vício de falta de fundamentação, em especial quando discrimina positivamente determinados depoimentos ou discrimina outros de forma negativa.
G) Pejados pelos vocábulos “acho” e “penso que”, são muitas as contradições existentes nos depoimentos das testemunhas da R. Recorrida (nos próprios depoimentos em si e entre depoimentos, máxime no que se refere aos contentores de frio, à plantação e arranque da planta fornecida pela A., à equipe e estrutura de apoio de AA, às deslocações permanência dos técnicos da R. às instalações da A., ao aspeto e imagem das plantas à chegada às instalações da R., às consequências dos vírus, à plantação e arranque da planta ou ao processo negocial tendente ao fornecimento de planta), assim como os seus inexplicáveis lapsos de memoria em relação a assuntos que eram parte integrante das respetivas funções e atividades, em contraponto a uma frescura de memória e à prontidão e fluidez de respostas (mesmo a questões ainda não colocadas) em relação a minuciosas certezas em pontos concretos dos depoimentos.
H) Pelo vasto número de contradições e pelo carácter impactante das mesmas em relação às questões subjacentes e objeto de prova, não podem servir de esteio à prova dos factos dados como provados.
I) Ao depoimento do legal Representante da A. Recorrente não foi atribuída a merecida valoração, assim como ao depoimento da testemunha da A. BB, sem que isso fosse objeto de fundamentação em factos verificados.
J) A decisão judicial sob o presente escrutínio não procede a uma correta subsunção dos factos ao direito, patenteando erro na aplicação da norma e na determinação da norma aplicável.
K) Considerando a inexistência de prova em relação à existência de vírus nas plantas fornecidas pela A., considerando o facto de a A. não considerar a existência dos mesmos suscetível do incumprimento de qualquer obrigação, considerando o facto de existirem alegados atrasos no cumprimento de supostos prazos de fornecimentos, cuja calendarização apenas existia na formulação da R. (sendo que tais atrasos, errada e abusivamente atribuídos pela R. à A., são resultado do pagamento tardio das quantias que a R. devia à A. pelos fornecimentos da campanha de 2017) e considerando ainda o facto de os fornecimentos efetuados pela A. à R. não estarem a ser pagos nas condições definidas – para cuja análise não poderá ser ignorada e desconsiderada o Doc. 7 junto com a resposta às exceções deduzidas pela Ré –, a legitimidade para a invocação da exceção do não cumprimento não pertence à R., como expende a sentença recorrida, mas antes à A., como vem de ver, daqui resultando uma errada aplicação do disposto no artigo 428.º do CC.
L) O atraso no fornecimento da suposta encomenda de plantas que a R. fez à A. Ocorreu por força de um outro atraso a que a R. deu causa, i.e., o atraso no pagamento do valor devido à A. pelo fornecimento da campanha de 2017.
M) Em relação às análises realizadas a pedido da R., não resulta provado que as amostras enviadas para analise sejam de plantas da fornecidas pela A. à R. ou que as amostrar objeto de análise sejam efetivamente de plantas fornecidas pela A..
N) Os dois vírus alegadamente detetados nas plantas fornecidas pela A. a R., não levaram, ao contrário do vertido nos factos provados da sentença sob o presente recurso, nem ao arranque de todas as plantas entregues pela A. (eventualmente a uma parte, em quantidade e percentagem não determinada), nem à perda toda a cultura que se pretendia obter com a plantação das plantas de batata doce fornecidas pela A..
O) Mesmo após a deteção dos vírus, os representantes da R, pediram o fornecimento de mais planta, o que também não levou, como supra se demonstrou.
P) Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, não estamos perante um quadro de defeito das coisas vendidas, no sentido de vício, defeito ou falta de características ou desvalorize a coisa ou impeça a realização do fim (artigo 913.º do Código Civil), já que os bens entregues pela A. à R. não obstam à realização do fim a que se destinam como provam os pedidos de mais fornecimento de plantas em momento posterior à suposta descoberta e alheios ao aspeto da planta, já que se destinava à indústria.
Q) Estamos, isso sim, perante uma regular compra e venda, cabendo à R. proceder ao pagamento do preço acordado (artigos 874.º e 885.º do CC), não havendo campo de aplicação para o disposto no artigo 913.º do CC, por falta de pressupostos, sendo esta a análise, conclusão e decisão que o Tribunal a quo deveria ter tomado.
R) Expende a douta sentença recorrida, numa errada subsunção dos factos ao direito, que a lei concede proteção ao comprador de coisa defeituosa (artigo 913.º CC), embora para isso o comprador não possa ter conhecimento do vício ou falta de qualidade da coisa que adquiriu, o que não se verifica in casu, onde é manifesto e inequívoco que a R., pelo acompanhamento que sempre fez da planta produzida e fornecida pela A., nomeadamente nos viveiros desta, desde o semear, atá ao corte e transporta, teve perfeito e pleno conhecimento de eventual vício e falta de qualidade da coisa.
S) Sendo irrefutável o conhecimento pela R. do suposto e alegado vício ou falta de qualidade da coisa que adquiriu, não estamos perante uma venda com defeito, pelo menos na acessão do artigo 913.º do CC.
T) Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, que ignora o teor integral das comunicações enviadas pela R. à A. e que as entende como denúncia, estas são é pedidos de novos fornecimentos, feitos após o conhecimento da existência de supostos vírus, os quais eram o fundamento da denúncia.
U) Tais comunicações não revestem natureza e carácter de denuncia nos termos e para os efeitos do artigo 916.º do CC., já que a R., por força do acompanhamento que fez da prodição de planta, conhecia os alegados e supostos defeitos e conformou-se com os mesmos e após o conhecimento da existência de supostos e alegados vícios, a R. o que fez foi mais encomendas de planta.
V) Além do mais, aquelas comunicações enviadas pela R. à A., assentam em observações genéricas, vagas, imprecisas e incertas sobre o estado da coisa e em relação aos vírus, estes estão ainda a ser objeto de análise e avaliação, cujos resultado foram remetidos para posteriores contactos, que nunca foram enviados pela R. e recebidos pela A..
W) Nunca a A. foi admonitoriamente interpelada pela R. (artigo 808.º CC).
X) Atenta a produção da prova, não podia o Tribunal a quo concluir que os alegados vírus, enquanto defeito dos bem, teriam inviabilizado em absoluto o cumprimento da prestação pelo facto de todas as plantas de batata-doce plantadas terem sido arrancadas; tal conclusão é manifestamente errada, já que a produção que resultou das plantas fornecidas pela A. foi entregue aos clientes da R., plantação que nunca foi arrancada, além de que a notícia de vírus não inibiu a R. de continuar a fazer pedidos, pelo que não se vislumbra qualquer incumprimento por parte da A..
Y) Resultou da inquirição de testemunhas e em sede de alegações finais, o facto de o laboratório que realizou, a pedido da R., as analises fitopatológicas às amostras alegadamente retiradas das plantas fornecidas pela A., denominado … (www.agrama.es) e sito em Espanha, não estar acreditado, pelo menos entre 2018 e novembro de 2022, para a realização de análises desta natureza, i.e., para a realização de análises fitopatológicas, precisamente aquelas que foram realizadas às referidas amostras, facto esse que o Tribunal a quo na apreciação dos factos e da prova, desconsiderou, não se pronunciando sobre este assunto, o que já motivou a invocação de omissão de dever de pronúncia.
Z) O alegado facto é passível de confirmação no referido site do laboratório www.agrama.es e do qual resulta a confirmação de que esses ensaios fitopatológicos não estão acreditados por ENAC (Entidad Nacional de Acreditación – www.enac.es), estando o laboratório apenas acreditado pela Junta de Andalucía e no que respeita a análises fitopatológicas para exportação de material vegetal e pela ENAC no item 17025, mas, concretamente, em fitopatologia, ainda não, daqui resultando que o boletim com os resultados das análises fitopatológicas junto pela R., não tem qualquer valor probatório em sede de deteção de vírus, não podendo integrar o acervo da prova documental que serviu de fundamentação à prova dos factos.
Nestes termos e nos mais de direito que V. Exas doutamente suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, julgada procedente a apelação e, em consequência, ser declarada nula a decisão por violação do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ou revogada a sentença proferida atenta a reapreciação e alteração da matéria de facto, que não permite a subsunção dos factos alterados e provados ao direito aplicado, o qual, mesmo sem a alteração da matéria de facto, também já não permitira a subsunção feita pelo Tribunal a quo de acordo com o supra alegado e concluído,
Ao decidir desta forma, farão V. Exas a habitual, merecida e sã Justiça!».
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Houve lugar a resposta da contraparte, que pugnou pela improcedência do recurso.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da questão da existência:
a) nulidade por omissão de pronúncia.
b) falta de fundamentação da decisão.
c) erro na apreciação da matéria de facto.
d) erro na apreciação da matéria de direito.
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III – Factos com interesse para a justa resolução do caso:
3.1 – Factos provados:
Com relevo para a presente decisão, mostram-se provados os seguintes factos:
1. A Autora, “S..., SL”, dedica-se à multiplicação, cultivo e venda de diversas variedades de batata doce e plantas diversificadas.
2. Por seu lado, a Ré, “V..., Lda.”, dedica-se à produção e comercialização de espécies de floricultura, horticultura e árvores ornamentais, comercialização de equipamentos e utensílios para floricultura e prestação de serviços nestas áreas.
3. No desenvolvimento da sua actividade comercial a Autora forneceu e vendeu à Ré plantas de batata doce das variedades de Georgia Jet e Beauregard, a que se referem as seguintes facturas, que totalizam o valor de € 75.863,50.
N.º Factura Data Emissão Data Vencimento Valor Total €
... 18.907,30
... 977,10
... 18.062,40
... 7.085,80
... 26.830,90
4. As condições acordadas para a campanha de 2018 (fornecimento de plantas) eram: pagamento de 50% do valor da fatura da mercadoria fornecida na data da descarga e entrega à Ré e os restantes 50% com vencimento a 30 dias dessa data.
5. Dos serviços acima referidos, a Ré apenas pagou 50% das primeiras duas facturas, ou seja, a quantia de € 11.942,20.
6. A Ré tinha encomendado à Autora um total de 3.300.000 plantas, que deveriam ser fornecidas ao longo de um período global de 10 semanas.
7. Mas a Autora começou a fornecer as plantas Georgia Jet encomendadas pela Ré cerca de 3 semanas após a data que havia inicialmente indicado, na sequência do que toda a produção da Ré ficou atrasada.
8. E apenas entregou 883.100 plantas Georgia Jet nas instalações da Ré, num espaço de 4 semanas.
9. Para suprimento das referidas falhas de fornecimento e para tentar cumprir com as datas de entrega e quantidades de batata doce aos seus clientes, a Ré solicitou à Autora a entrega de plantas Beauregard, tendo apenas recebido 185.400 plantas desta variedade, entregues pela Autora.
10. Além disso, na altura da recepção na Comporta das plantas encomendadas, os técnicos da Ré verificaram que as mesmas aparentavam não se encontrar em bom estado de conservação.
11. A Ré solicitou a realização de análises às plantas fornecidas, as quais foram realizadas pelo Laboratório (…), entre 09/05/2018 e 11/05/2018.
12. Os resultados dessas análises permitiram verificar que as plantas fornecidas pela Autora continham dois vírus: Sweet Potato feathery mottle vírus (SPFMV) e Sweet Potato leaf curl vírus (SPLCV).
13. Os vírus em causa, além de afectarem as plantas entregues, inviabilizando o seu normal crescimento, podem contaminar plantações adjacentes e prejudicar o seu desenvolvimento.
14. O que levou a Ré a agir preventivamente, arrancando uma quantidade indeterminada das plantas entregues pela Autora, procurando evitar riscos de contágio alargado[1].
15. Na sequência do que perdeu uma parte significativa da cultura que pretendia obter com a plantação destas plantas de batata doce, sendo que, para não deixar de cumprir os compromissos assumidos com os comercializadores do produto e também em função da diminuição do número de pés efectivamente entregues pela Autora, a Ré recorreu a outros fornecedores de plantas de batata doce para garantir a produção das quantidades que havia previsto introduzir no mercado[2].
16. A Ré foi instada a pagar as faturas acima referidas, por telefone, pessoalmente e por carta de interpelação datada de 17 de Maio de 2018.
17. Tendo a Ré respondido, designadamente por email de 17/05/2018, invocando os atrasos nas entregas das plantas e em quantidades inferiores ao acordado e referindo-se à existência de dois vírus.
18. E de novo, por email de 18/05/2018, a Ré volta a denunciar a existência de vírus nas plantas entregues pela A..
19. Em Abril de 2021, depois da Autora ainda vir interpelar a Ré para pagamento das faturas em questão, esta respondeu invocando as razões acima expostas e informou que não se considerava devedora de quaisquer montantes à Autora.
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3.2 – Factos não Provados[3]:
Com relevo para a presente decisão, não se provaram os seguintes factos:
1. Instada a pagar, a Ré efectuou continuas promessas de pagamento à Autora, nunca cumpridas.
2. Na sequência do atraso no cumprimento pela Autora, nas datas de entrega das plantas acordadas, a Ré teve um prejuízo de vários milhares de euros com os encargos acrescidos da plantação.
3. Na altura da recepção na (…) das plantas encomendadas, estas não se encontravam em bom estado de conservação devido à circunstância de não terem sido transportadas em frio.
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IV – Fundamentação:
4.1 – Nulidade por omissão de pronúncia:
De acordo com a primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, a sentença é nula, quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento».
A nulidade da decisão por omissão de pronúncia só acontece quando o acto decisório deixa de decidir alguma das questões suscitadas pelas partes, salvo se a decisão tiver ficado prejudicada pela solução dada a outra questão submetida à apreciação do Tribunal.
Questões submetidas à apreciação do Tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
É a violação daquele dever que torna nula a decisão e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que a omissão de pronúncia se traduz, ao fim e ao cabo, em denegação de justiça e o excesso de pronúncia na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes.
Coisa diferente são as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, as quais correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa estipulada no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil.
Na esteira do preconizado por Alberto dos Reis há que não confundir questões suscitadas pelas partes com motivos ou argumentos por elas invocados para fazerem valer as suas pretensões. Na realidade, «são, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão»[4].
Amâncio Ferreira evidencia que se trata da nulidade mais invocada nos tribunais, «originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda»[5].
Deste modo, o julgador não tem que analisar e a apreciar todos os argumentos, todos os raciocínios, todas as razões jurídicas invocadas pelas partes em abono das suas posições. Apenas tem que resolver as questões que por aquelas lhe tenham sido postas[6] [7].
Na hipótese vertente não existe uma identidade absoluta entre as pretensões deduzidas pelas partes e a matéria solucionada pelo Tribunal e, por conseguinte, aquilo que se acabou de expressar é suficiente para concluir que existe omissão de pronúncia.
As questões da emissão de “pagaré”, das datas previsíveis para o inicio dos fornecimento referentes à campanha de 2018 e da inexistência de acreditação do laboratório (…) para a realização de análise fitopatológicas correspondem a matérias relacionadas com a factualidade provada que não se confundem com uma nulidade por omissão de pronúncia, antes correspondem a problemas associados ao mérito e não a qualquer preterição de formalismo decisório.
Assim, sem prejuízo do posterior conhecimento destas temáticas na avaliação do mérito da questão suscitada, não existe qualquer situação relacionada com a omissão de pronúncia.
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4.2 – Nulidade por falta de fundamentação:
As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas (n.º 1 do artigo 154.º do Código de Processo Civil, como corolário da injunção constitucional precipitada no artigo 205.º da Constituição da República Portuguesa).
É nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil).
Seguindo em absoluto a lição de Alberto dos Reis, «há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.
Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto»[8]. Esta posição é partilhada por Antunes Varela[9] e Lebre de Freitas.
A falta de fundamentação só é causa de nulidade quando for absoluta e «o dever de fundamentação da sentença final não se confunde com o dever de motivação previsto no artigo 607.º do Código de Processo Civil».
No entanto, no caso em apreço, estão devidamente especificados os fundamentos de facto e de direito que motivaram a decisão recorrida, inexistindo assim, sem cuidar da bondade e da validade dos mesmos, uma situação de falta absoluta de fundamentação.
Questão diversa é se aquilo que consta do corpo decisório representa a solução factual e jurídica adequada ao caso concreto. Porém, essa operação de avaliação da prova e de posterior subsunção e de integração jurídica fica reservada para o local próprio. Em face do exposto, julga-se improcedente a invocada nulidade.
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4.2.1 – Da falta ou da errada de fundamentação da decisão de facto:
Em adição, mesmo que se entendesse que a referida omissão assenta na deficiente formulação da fundamentação fáctica, José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre sublinham que «face ao actual código, que integra na sentença tanto a decisão sobre a matéria de facto como a fundamentação desta decisão (artigo 607.º, nºs 3 e 4), deve considerar-se que a nulidade consagrada na alínea b) do n.º 1 (falta de especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão) apenas se reporta à primeira, sendo à segunda, diversamente aplicável o regime do artigo 662.º, nºs 2-d e 3, alíneas b) e d)»[10].
Alberto dos Reis alerta que por vícios da sentença entende a lei os erros materiais e os erros formais, que se corrigem pelos meios facultados pelos artigos 667.º e 669.º[11]. Contrapõem-se aos erros substanciais, contra os quais se há-de reagir por via de recursos»[12]. Esta posição é partilhada por Antunes Varela[13] e encontra eco ainda na jurisprudência recente dos Tribunais Superiores[14] [15].
Na óptica da sociedade recorrente, a fundamentação da matéria de facto dada como provada não permite descortinar em qual das provas em concreto se alicerçou o Tribunal para dar como provados uns factos em detrimento de outros e a opção por algumas fontes probatórias no confronto com outras que a Autora entende serem mais credíveis.
A fundamentação cumpre assim uma dupla função: de carácter objectivo – pacificação social, legitimidade e controlo das decisões; e de carácter subjectivo – garantia do direito ao recurso e controlo da correcção material e formal das decisões pelos seus destinatários[16].
Para cumprir a exigência constitucional, a fundamentação há-de ser expressa, clara e coerente e suficiente. Ou seja, não deve ser deixada ao destinatário a descoberta das razões da decisão, os motivos não podem ser obscuros ou de difícil compreensão, nem padecer de vícios lógicos e a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão.
A fundamentação da decisão deve, pois, permitir o exercício esclarecido do direito ao recurso e assegurar a transparência e a reflexão decisória, convencendo e não impondo.
Embora referindo-se à jurisdição penal, tem aqui aplicabilidade a afirmação que «o sistema de livre apreciação da prova deve definir-se pelo seu significado positivo que se traduz na valoração racional e crítica que permita ao julgador objectivar a apreciação dos factos e assegurar pelo seu conteúdo as garantias procedimentais concedidas pela lei fundamental. É de salientar que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais mas a própria sociedade»[17].
O núcleo essencial mínimo de motivação demanda que esta seja objectiva e clara e, bem assim, se estruture num raciocínio suficientemente abrangente em relação à apreciação dos problemas fundamentais e necessários à justa decisão da lide[18]. Efectivamente, o exame crítico consiste na enumeração das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou por outro dos meios de prova, os motivos da credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pela ordem jurídica exterior ao processo com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo Tribunal e das razões da sua convicção[19].
A exigência legal impõe que se estabeleça o fio condutor entre a decisão sobre os factos provados e não provados e os meios de prova usados na aquisição da convicção, fazendo a respectiva apreciação crítica nos seus aspectos mais relevantes[20] [21].
Analisada a decisão sobre a matéria de facto, verifica-se que a motivação individualiza os contributos advenientes das declarações tomadas às partes, às testemunhas e a documentos que entendeu serem fundamentais na formação da convicção relativamente à prova dos factos em conflito.
Além de não existir um método operativo único a prosseguir em matéria de fundamentação, o processo intelectivo impresso na decisão é suficiente para cumprir o dever de fundamentação e através das regras da ciência jurídica, da lógica e da experiência são facultados ao destinatário as razões psicológicas da convicção do juízo e os julgadores do Tribunal Superior foram convencidos da correcção formal da decisão.
A descrição efectuada na decisão recorrida é claramente suficiente para perfectibilizar os comandos legais destinados a salvaguardar a reconstituição do pensamento do julgador. E, por isso, à luz dos contributos doutrinais editados a este respeito [22] [23] [24] [25] [26] [27] [28] [29] [30], interligando a resposta do Tribunal e as exigências expressas na lei, não se comungando do entendimento expresso que existem factos infundamentados e que a decisão em causa não se adequa às exigências impostas pelo n.º 4 do artigo 607.º do Código de Processo Civil.
Questão diversa é a de saber se existe fundamento para julgar que essa factualidade deveria ter julgada em sentido diverso, mas essa apreciação será feita de seguida.
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4.3 – Do erro na avaliação da matéria de facto:
Só à Relação compete, em princípio, modificar a decisão sobre a matéria de facto, podendo alterar as respostas, a partir da prova testemunhal extractada nos autos e dos demais elementos que sirvam de base à respectiva decisão, desde que dos mesmos constem todos os dados probatórios, necessários e suficientes, para o efeito, dentro do quadro normativo e através do exercício dos poderes conferidos pelo artigo 662.º do Código de Processo Civil.
Em face disso, a questão crucial é a de apurar se a decisão do Tribunal de Primeira Instância que deu como provados (e não provados) certos factos pode ser alterada nesta sede – ou, noutra formulação, é tarefa do Tribunal da Relação apurar se essa decisão fáctica está viciada em erro de avaliação ou foi produzida com algum meio de prova ilícito e, se assim for, actuar em conformidade com os poderes que lhe estão confiados.
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A sociedade recorrente discorda da posição do Tribunal a quo quanto às respostas aos pontos 4[31], 6[32], 7[33], 10[34], 12[35], 13[36], 14[37], 15[38] e 17[39] dos factos provados, propondo uma redacção distinta.
Ao mesmo passo, propõe a supressão do ponto 18[40] dos factos provados e entende que não se deve considerar como provada a existência de vírus nas amostras colhidas das plantas fornecidas pela Autora à Ré e, bem assim, de atrasos nos fornecimentos de plantas por factos imputáveis à primeira.
No essencial, a sociedade recorrente manifesta sua discordância com a desconsideração das declarações do legal representante da Autora e da testemunha BB. E, ao mesmo passo, sublinha que a prova testemunhal arrolada pela parte passiva não foi suficientemente firme e desinteressada de modo a alicerçar a prova e a convicção do Tribunal. Na sua concepção, o vasto número de contradições e o carácter impactante das mesmas em relação às questões objecto de prova não podem servir de esteio à prova dos factos dados como provados.
A sociedade recorrida entende que não deve ser conhecido o pedido de alteração da matéria de facto, mas, ainda assim, embora não tendo pedido a ampliação do objecto do recurso, sugere que os pontos 14 e 15 dos factos provados sejam objecto de reformulação.
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Entende-se que a impugnação da matéria de facto segue os requisitos mínimos impostos pelo artigo 640.º do Código de Processo Civil e, por isso, em homenagem a um critério de proporcionalidade e de normal impressão do destinatário, a reapreciação da decisão fáctica será prosseguida.
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Foi ouvida toda a prova e analisada toda a documentação presente nos autos.
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Inexiste qualquer hierarquia apriorística entre as declarações de parte, a prova testemunhal e a restante prova produzida, devendo cada uma delas ser individualmente analisada e valorada. Em caso de colisão, o julgador deve recorrer a tais critérios sopesando a valia relativa de cada meio de prova, determinando no seu prudente critério qual o que deverá prevalecer e por que razões deve ocorrer tal primazia[41].
A questão matricial do julgamento está associada à existência de um vírus que terá afectado as plantas fornecidas pela sociedade Autora e das consequências que essa patologia teve na produtividade associada e na quebra da relação contratual.
Existem duas versões. Uma encabeçada pela sócio-gerente da Autora e pelo filho e outra transmitida pelas testemunhas CC, AA e DD. E da comparação entre estas duas linhas probatórias ressalta, com evidência, que as declarações destas últimas testemunhas são mais verossímeis e sólidas do que aquelas que foram tomadas ao EE e a FF, até porque as primeiras têm o suporte de uma análise fitopatológica realizada por amostra a diversas plantas de batata doce.
As testemunhas AA, agrónoma, técnica responsável dos V... no período compreendido entre 2017 e Novembro de 2018, e de DD, coordenador agrícola da Ré, explicaram o processo de descarregamento, de armazenamento, de plantação, de cálculo de densidade, dos parâmetros de qualidade exigidos, das quebras de produção associadas à existência de vírus e de fungos e da necessidade ocorrida de arranque de parte da produção e da contratação substitutiva de pés de batata doce a outros viveiristas.
O relato dos problemas ocorridos e a caracterização da qualidade das plantas (eram visíveis infestantes e a existência de sintomas de praga) e a relação de imediação com o envio das amostra para teste laboratorial credibilizam a versão da parte passiva, em detrimento da tese que foram problemas ocorridos com a falta de vontade ou de capacidade da Ré para proceder ao pagamento que motivaram o termo da relação contratual.
Ainda que possam ter havido problemas com a tempestividade da entrega das plantas e independentemente das razões que reciprocamente foram avançadas por qualquer das partes contratantes, aquilo que é decisivo na presente avaliação é a circunstância da impropriedade daquelas plantas para serem comercializadas no mercado de produtos frescos.
E, neste domínio, o contributo tecnicamente diferenciado da testemunha CC é absolutamente esclarecedor e o mesmo não foi cabalmente rebatido por qualquer outra fonte probatória, não se verificando qualquer motivo para duvidar da credibilidade e da isenção da sua avaliação.
Ademais, tal como se avança no acto recorrido, as plantas que foram recolhidas para análise laboratorial foram retiradas das câmaras frigoríficas, tendo sido o próprio CC (técnico do laboratório …) que as foi buscar e levou para o laboratório, em Sevilha para análise, onde foi confirmada a existência de vírus. O documento ... junto aos autos com o requerimento de 15/09/2022 é atestador dessa realidade.
Em acréscimo, nos emails datados de 17/05/2018 e 18/05/2018 (juntos a fls. 27 verso e 41), para além das queixas relativamente aos atrasos de entrega das plantas encomendadas e à quantidade fornecida, foi denunciada a existência de vírus.
Concorda-se ainda com a avaliação feita pelo Tribunal a quo quanto ao testemunho colhido a BB, o qual pela falta de contemporaneidade com a situação descrita nos autos não estava habilitado de qualquer informação relevante e credível sobre esta concreta situação, sendo que é absolutamente transparente a existência de um conflito – não ultrapassado – com a sociedade Ré, o qual lhe condicionou a objectividade e a capacidade crítica.
Não se concebe assim que tenha ocorrido uma pré-determinação da Ré no sentido de, artificialmente, ter criado as condições para se furtar a qualquer pagamento devido. Na realidade, tal como foi sublinhado pela testemunha DD, estamos num domínio em que a qualidade da planta determina em 80% o sucesso de uma plantação, inexistindo qualquer vestígio ou traço de que as quebras de produção e a necessidade de arranque dos pés adquiridos à Autora tenha tido origem na deficiente tecnologia produtiva da Ré, na qualidade dos solos ou noutro factor relacionado com a capacidade de actuação da parte passiva no domínio do cultivo.
Foi a circunstância das folhas se apresentarem moles, a tombar, com cor acastanhada e a presença de infestantes que determinou a Ré a realizar exames laboratoriais, os quais confirmaram aquilo que as testemunhas já projectavam, em função da sua experiência profissional e das suas capacidades práticas e técnico-científicas.
A questão levantada pela parte activa quanto à falta da credenciação necessária do laboratório não invalida o exame feito nem os resultados do mesmo, não se vislumbrando qualquer sinal que a referida análise não haja seguido as regras protocolares relativas à qualidade dos exames ou da metodologia empregue.
No entanto, ainda que o referido exame não tivesse sido realizado ou fosse desconsiderado por qualquer motivo de natureza burocrática, a prova anteriormente mencionada era suficiente para considerar que existia um vício no produto transacionado pela Autora nos exactos termos consignados na decisão de facto.
Neste domínio, não existe qualquer erro na avaliação da prova. Aliás, o aqui relator vem pugnando que a alocução fundamento para impor decisão diversa, nos termos proclamados pelo n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória antes exige que o juízo efectuado pela Primeira Instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova[42]. E esse lapso não existe, face à dinâmica da prova e ao confronto valorativo entre as fontes probatórias.
No entanto, apesar disso, os factos 14) e 15) devem ser reformulados à luz da prova produzida. Neste segmento, não existem sinais de ter sido arrancada toda a plantação efectuada, existia a viabilidade dessa produção ter sido canalizada para indústria e não para o sector de comercialização de frescos e, como tal, ao contrário do juízo anteriormente realizado, na avaliação do Tribunal da Relação de Évora apenas ocorreu uma perda parcial da cultura de batata doce.
Quanto a este último ponto, a convicção do Tribunal da Relação de Évora funda-se essencialmente no reconhecimento parcial efectuado pelos funcionários da Ré quanto à questão da dimensão do arranque e da quebra de produção associada e do recurso a viveiristas alternativos para garantir a produtividade desejada.
Neste enquadramento, altera-se a resposta do ponto 14 dos factos provados nos seguintes termos: «o que levou a Ré a agir preventivamente, arrancando uma quantidade indeterminada das plantas entregues pela Autora, procurando evitar riscos de contágio alargado».
Do mesmo modo, o ponto 15 dos factos provados passa a ter a seguinte redacção: «na sequência do que perdeu uma parte significativa da cultura que pretendia obter com a plantação destas plantas de batata doce, sendo que, para não deixar de cumprir os compromissos assumidos com os comercializadores do produto e também em função da diminuição do número de pés efectivamente entregues pela Autora, a Ré recorreu a outros fornecedores de plantas de batata doce para garantir a produção das quantidades que havia previsto introduzir no mercado».
A referida alteração será realizada directamente no texto dos factos provados, a negrito, a fim de facilitar a compreensão da modificações determinadas.
No mais, não existe qualquer prova concludente relativamente ao fundamento da entrega tardia dos pés de planta que tenha a idoneidade de alterar o previamente decidido.
Quanto às outras questões acessórias suscitadas (nomeadamente os aspectos convocados sobre o pagaré e as condições de pagamento), ainda que existisse qualquer modificação de facto a esse propósito, a mesma não teria qualquer influência no destino final da acção.
Nesta valência, como defendemos recorrentemente, os Tribunais Superiores entendem que os recursos sobre a impugnação da matéria de facto têm sempre carácter ou natureza instrumental, devendo as questões submetidas à apreciação poder repercutir-se, de forma útil e efectiva, na decisão a proferir pelo Tribunal ad quem, de modo alterar ou modificar, no todo ou em parte, a solução jurídica que se obteve no caso concreto. De outro modo, no plano formal, não haverá interesse processual em promover a revisão dos factos controvertidos[43].
Deste modo, com as alterações introduzidas nos pontos 14 e 15 dos factos provados, a decisão de facto mostra-se assim consolidada e é com base nesses factos que será realizada a apuração de subsunção subsequente.
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4.4 – Do mérito da causa:
A Autora pretende o pagamento de um fornecimento comercial e, a isto, a recorrida contrapõe que se está perante um cenário de não cumprimento da prestação acordada e que isso viabiliza a operacionalização da exceptio non adimpleti contractus.
É incontroverso que o pagamento reclamado não foi realizado, mas tal como é dito na sentença recorrida «depois de se realizarem análises às plantas fornecidas, entre 09.05.2018 e 11.05.2018, verificou-se que as plantas fornecidas pela A. continham dois vírus: Sweet Potato feathery mottle vírus (SPFMV) e Sweet potato leaf curl vírus (SPLCV), vírus esses, que inviabilizavam o normal crescimento das plantas e também podiam contaminar plantações adjacentes e prejudicar o seu desenvolvimento.
(…) No caso em apreço pode dizer-se que está em causa um defeito das coisas vendidas, no sentido de “sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não ter as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim” (artigo 913.º do Código Civil)».
Almeida Costa salienta que se verifica «o não cum­primento, incumprimento ou inadimplemento de uma obrigação, sempre que a respectiva prestação debitória deixa de ser efectuada nos termos adequados»[44].
O cumprimento defeituoso integra um dos modos de não cumprimento das obrigações, que permite ao credor da prestação imperfeita o recurso à excepção do não cumprimento do contrato[45].
A excepção de não cumprimento do contrato encontra-se prevista no n.º 1 do artigo 428.º[46] do Código Civil, onde se estipula que «se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo».
São pressupostos da excepção de não cumprimento do contrato: existência de um contrato bilateral, não cumprimento ou não oferecimento do cumprimento simultâneo da contraprestação; não contrariedade à boa-fé[47].
Vaz Serra avança que «a fórmula legal não é inteiramente rigorosa, pois o que a excepção supõe é que um dos contraentes não esteja obrigado, pela lei ou pelo contrato, a cumprir a sua obrigação antes do outro; se não o estiver pode ele, sendo-lhe exigida a prestação, recusá-la, enquanto não for efectuada a contraprestação... Por conseguinte, a excepção pode ser oposta ainda que haja vencimentos diferentes… apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro...»[48]. Idêntica formulação é detectada na lição de Pires de Lima e Antunes Varela[49].
Daqui decorre que a excepção de não cumprimento do contrato só se aplica aos contratos bilaterais, uma vez que nestes derivam obrigações para ambas as partes havendo, entre tais vinculações, correspectividade ou nexo causal recíproco. Assim as duas obrigações justificam-se uma à outra, cada uma delas é causa da outra, sendo interdependentes.
Nos contratos sinalagmáticos verifica-se reciprocidade entre as prestações de ambas as partes, o que implica que, por força do sinalagma funcional, não deva permitir-se a execução de uma das prestações sem que a outra também o seja. Essa situação implica que o não cumprimento das obrigações de prestações recíprocas seja sujeito a um regime especial, admitindo-se ser lícita a recusa de cumprimento, enquanto a outra parte não realizar a sua prestação[50].
Nas palavras de Pires de Lima e Antunes Varela «a exceptio non adimpleti contractus a que se refere este artigo (artigo 428.º do Código Civil) pode ter lugar nos contratos com prestações correspectivas ou correlativas, isto é, interdependentes, sendo uma o motivo da outra. É o que se verifica nos contratos tradicionalmente chamados bilaterais ou sinalagmáticos»[51].
Vaz Serra alerta que, no caso dos contratos de execução continuada, «a exceptio pode ser exercida por qualquer dos contraentes, desde que a prestação e a contraprestação correspondentes devam, ser simultâneas ou a prestação do excipiens deva ser feita depois da do outro contraente»[52].
A exigência de apenas poder ser invocada quando não estejam fixados prazos diferentes para o cumprimento da prestação – ou, estando fixados prazos diferentes, pelo contraente que haja de efectuar a prestação em segundo lugar – tem fundamento no facto da aludida excepção visar salvaguardar até ao fim o sinalagma funcional.
Baseando-se esta asserção no princípio do cumprimento simultâneo das obrigações sinalagmáticas e na manutenção do equilíbrio patrimonial característico dos contratos bilaterais, este meio de defesa tem como efeito principal a dilação do tempo de cumprimento da obrigação de uma das partes até ao momento do cumprimento da obrigação da outra parte.
Por isso é que tem sido qualificada como excepção de direito material ou substancial, posto que se funda em razões de direito substantivo e é de natureza impeditiva porque não exclui definitivamente o direito do autor, apenas o paralisa temporariamente, assumindo uma feição de conservação do equilíbrio contratual nos contratos bilaterais. Eventualmente, em casos de maior gravidade e excepcionalmente só nesses, esse incumprimento pode conduzir à extinção da contraprestação da parte contrária.
Neste caso, a gravidade das consequências da venda de coisa defeituosa impõe que se considere que a existência de vírus nas plantas de batata doce impedia parcialmente a realização do fim a que as mesmas se destinavam ou que, pelo menos, ocorria uma desvalorização na afetação do destino normal.
Porém, a solução final encontrada pela Primeira Instância partia de um pressuposto errado, porquanto as sementeiras de batata doce não foram totalmente arrancadas nem a produção final ficou integralmente inviabilizada.
Mais, ainda que a batata doce pudesse vir a apresentar defeitos que impedissem a respectiva comercialização no mercado de produtos frescos, mesmo que defeituosos (ao nível da configuração do tubérculo e da existência de manchas de pele), tal como resultou da audição da prova, essa matéria prima tinha a viabilidade para ser absorvida pelos mercados de indústria transformadora e de rações. E é indiscutível que, ao tempo, a Ré também canalizava para esses sub-sectores industriais e de transformação os seus produtos sempre que a calibragem, o aspecto ou a qualidade final não permitissem a negociação prioritária no comércio de comércio de frescos.
Em função disto, deixa de ser possível chancelar a conclusão da verificação da exceptio non adimpleti contractus, na acepção máxima de extinção da exigência de qualquer contrapartida contratual acordada. Estamos assim num caso em que a magnitude do cumprimento defeituoso tem não efeitos equivalentes ao do incumprimento absoluto.
Com efeito, o cumprimento defeituoso constitui uma das formas de violação do dever de prestar, que provém dos vícios, defeitos ou irregularidades da prestação efectuada que causa danos ao credor, ou, pelo menos, desvaloriza, a prestação, sendo certo que a questão de saber de o defeito da prestação prejudica ou não o fim da obrigação tem que ser apreciada e resolvida objectivamente, por analogia com o disposto para outras situações da mesma natureza, mas tendo em linha de conta os termos e as circunstâncias próprios de cada situação concreta.
Da conjugação dos artigos 911.º[53], 913.º[54], 914.º[55] e 915.º[56] do Código Civil, resulta que o comprador do bem defeituoso tem o direito de exigir do vendedor em alternativa a reparação da coisa, a anulação do contrato, uma indemnização ou a redução do preço.
Esta obrigação, no entanto, é excluída se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou falta de qualidade de que a coisa padece. Todavia, este pressuposto excludente não tem respaldo nos factos apurados.
Face à natureza sazonal do cultivo e aos problemas de relacionamento comercial sobrevindos, a redução do preço é a solução justa e adequada a resolver o conflito existente e essa possibilidade situa-se ainda na esfera de protecção do pedido formulado e da defesa por excepção apresentada.
Neste domínio, recorde-se que só é possível deixar para liquidação em execução de sentença a indemnização respeitante a danos relativamente aos quais, embora se prove a sua existência, não existam os elementos indispensáveis para fixar o seu quantitativo, nem sequer recorrendo à equidade.
In casu, apenas foi apurada uma quebra de entrega na ordem de 2/3 das plantas que foram contratualizadas, a que acresce uma quantidade indeterminada de pés inutilizados, o arranque de uma parcela também não apurada de plantas entregues pela Autora e a perda de parte significativa da cultura em termos de qualidade e de tonelagem final.
Tudo isto, face a essa indeterminação de quantidades, preços e quebras de produção determina que a redução do preço seja realizada através de critérios de equidade. Por força do grau de incerteza inerente a toda a situação esta forma de arbitramento deve ser tida como ultima ratio do cálculo indemnizatório, que será realizada de acordo com o disposto n.º 3 do artigo 566.º[57] do Código Civil.
A equidade é assim a justiça do caso concreto, flexível, humana, independentemente de critérios normativos fixados na lei, devendo, o julgador ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida[58] [59].
Como afiançam Pires de Lima e Antunes Varela são «razões de conveniência, de oportunidade, principalmente de justiça concreta, em que a equidade se funda»[60].
Repete-se que não houve um incumprimento total e definitivo e ocorreu um aproveitamento parcial da produção, o qual, de acordo com as regras da experiência, da lógica e do mercado, terá gerado rendimentos ao produtor de batata doce e que determinam que o prejuízo global da situação não seja integralmente suportado pela Autora.
Neste quadro, em função dos dados disponibilizados pelo processo, tendo presente que só foi entregue parte da encomenda, que essas remessas chegaram com algum atraso, que parte da produção teve de ser arrancada e que existia um mercado secundário onde poderiam ser colocados os produtos com defeito reduz-se a 20% o valor da dívida contabilizada (€ 63.921,30 x 0,20 = € 12.784,26), acrescida de juros, contados desde a última entrega de plantas.
Não existe qualquer outro argumento recursivo com a virtualidade de modificar a decisão recorrida e, assim, nestes termos, julga-se parcialmente procedente o recurso, revogando-se a sentença recorrida nos termos acima assinalados.
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IV – Sumário: (…)
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V – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso apresentado, revogando-se a decisão recorrida, condenando-se a Ré “V..., Lda.” a pagar “S..., SL” a quantia de € 12.784,26 (doze mil, setecentos e oitenta e quatro euros e vinte e seis cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados desde a última entrega de plantas, até efectivo e integral pagamento.
Custas do recurso a cargo do apelante e da apelada nos termos do respectivo decaimento, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 08/02/2024
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Mário João Canelas Brás

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[1] Alteração decorrente da reapreciação da matéria de facto provado realizada pelo Tribunal da Relação de Évora no ponto 4.3 do presente acórdão.
[2] Alteração decorrente da reapreciação da matéria de facto provado realizada pelo Tribunal da Relação de Évora no ponto 4.3 do presente acórdão.
[3] Ficou ainda consignado na decisão recorrida que: «quanto ao demais alegado, não se teceu qualquer juízo probatório uma vez que o mesmo ou é manifestamente despiciendo para a decisão, ou encerra juízos conclusivos ou de direito que são insuscetíveis de juízo probatório de facto».
[4] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 143.
[5] Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª Edição, pág. 57.
[6] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Volume V, Coimbra Editora, 1981 (reimpressão), pág. 141.
[7] A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, pág. 688.
[8] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, págs. 124-125.
[9] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, págs. 687-689.
[10] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 736.
[11] A que actualmente correspondem os artigos 614.º e 617.º do novo Código de Processo Civil.
[12] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, págs. 124-125.
[13] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, págs. 687-689.
[14] No acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 05/03/2015, in www.dgsi.pt, é afirmado que «não são confundíveis nem têm o mesmo regime o vício da nulidade da sentença por falta de fundamentação e o vício da deficiência da motivação da decisão da matéria de facto».
[15] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29/06/2015, in www.dgsi.pt.
[16] No mesmo sentido, Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, pág. 281, que afirma que «a fundamentação exerce, pois, a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo Tribunal Superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça inerente ao acto jurisdicional».
[17] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-Dezembro 2013, pág. 84.
[18] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-Dezembro 2013, pág. 83.
[19] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-Dezembro 2013, pág. 84.
[20] Lebre de Freitas e João Redinha, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, pág. 628.
[21] No acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11/07/2006, in www.dgsi.pt, é dito que «a prova há-de ser sempre apreciada segundo critérios de valoração racional e lógica do julgador, pressupondo o recurso a conhecimentos de ordem geral das pessoas normalmente inseridas na sociedade do seu tempo, a observância das regras da experiência e dos critérios da lógica, tudo se resolvendo, afinal, na formação de juízos e raciocínios que, tendo subjacentes as ditas regras, conduzam a determinadas convicções reflectidas na decisão de pontos de facto sob avaliação. Deve, ela, ainda ser considerada globalmente, conjugando todos os elementos disponíveis e atendíveis».
[22] Alexandre Pessoa Vaz, Direito Processual Civil, Almedina, Coimbra, 1998, págs. 211-241.
[23] Gonçalves Salvador, Motivação, Boletim do Ministério da Justiça n.º 121, págs. 85-117.
[24] Oliveira Martins, Justiça Portuguesa, n.º 29, pág. 49.
[25] Gonçalves Pereira, Poderes do juiz em matéria de facto, Justiça Portuguesa, n.º 32, pág. 81.
[26] Miguel Corte-Real, O dever da fundamentação da decisão judicial dada sobre a matéria de facto, Vida Judiciária, n.º 24, págs. 22-24.
[27] Michele Taruffo, Note sulla garanzia constituzionale della motivazione, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, n.º 55, págs. 29-38.
[28] Cláudia Sofia Alves Trindade, A prova de estados subjectivos no processo civil: presunções judiciais e regras de experiência, Almedina, Coimbra, 206, págs. 317-225.
[29] Marta João Dias, A fundamentação do juízo probatório — Breves considerações, Julgar n.º 13, Janeiro de 2011.
[30] José Manuel Tomé de Carvalho, Breves palavras sobre a fundamentação da matéria de facto no âmbito da decisão final penal no ordenamento jurídico português, Julgar 21, Setembro-Dezembro 2013, remetendo aqui para as demais referências bibliográficas ali contidas sobre este assunto.
[31] (4) As condições acordadas para a campanha de 2018 (fornecimento de plantas) eram: pagamento de 50% do valor da fatura da mercadoria fornecida na data da descarga e entrega à Ré e os restantes 50% com vencimento a 30 dias dessa data.
[32] (6) A Ré tinha encomendado à Autora um total de 3.300.000 plantas, que deveriam ser fornecidas ao longo de um período global de 10 semanas.
[33] (7) Mas a Autora começou a fornecer as plantas Georgia Jet encomendadas pela Ré cerca de 3 semanas após a data que havia inicialmente indicado, na sequência do que toda a produção da Ré ficou atrasada.
[34] (10) Além disso, na altura da recepção na (…) das plantas encomendadas, os técnicos da Ré verificaram que as mesmas aparentavam não se encontrar em bom estado de conservação.
[35] (12) Os resultados dessas análises permitiram verificar que as plantas fornecidas pela Autora continham dois vírus: Sweet Potato feathery mottle vírus (SPFMV) e Sweet potato leaf curl vírus (SPLCV).
[36] (13) Os vírus em causa, além de afectarem as plantas entregues, inviabilizando o seu normal crescimento, podem contaminar plantações adjacentes e prejudicar o seu desenvolvimento.
[37] (14) O que levou a Ré a agir preventivamente, arrancando todas as plantas entregues pela Autora, procurando evitar riscos de contágio alargado.
[38] (15) Na sequência do que perdeu toda a cultura que pretendia obter com a plantação destas plantas de batata doce.
[39] (17) Tendo a Ré respondido, designadamente por email de 17/05/2018, invocando os atrasos nas entregas das plantas e em quantidades inferiores ao acordado e referindo-se à existência de dois vírus.
[40] (18) E de novo, por email de 18/05/2018, a Ré volta a denunciar a existência de vírus nas plantas entregues pela Autora.
[41] Luís Filipe Pires de Sousa, Prova Testemunhal. Noções de Psicologia do Testemunho, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2020, pág. 413.
[42] Por todos podem ser consultados os acórdãos de 30/01/2020, 13/02/2020, 04/06/2020, 08/10/2020, 03/12/2020, 13/05/2021, 30/06/2021, 28/10/2021 e 11/01/2024, entre muitos outros disponíveis na plataforma www.dgsi.pt.
[43] Acórdãos aqui relator do Tribunal da Relação de Évora datados de 30/01/2020, 08/10/2020, 30/06/2021, 15/12/2022, 06/02/2023 e 15/06/2023, entre outros disponibilizados em www.dgsi.pt.
[44] Almeida Costa, Direito das Obrigações, 5ª edição, Coimbra, pág. 881.
[45] Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso em especial na compra e venda e na empreitada, Almedina, Coimbra 1994, págs. 324-330.
[46] Artigo 428.º (Noção):
1. Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efectuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo.
2. A excepção não pode ser afastada mediante a prestação de garantias.
[47] José João Abrantes, A Excepção de Não Cumprimento do Contrato, 1986, págs. 39 e seguintes.
[48] Vaz Serra, Revista de Legislação e Jurisprudência, ano 105º, pág. 238, nota 2.
[49] Pires de Lima e Antunes Varela – Código Civil Anotado, vol. I, pág. 405, sustentam que «mesmo estando o cumprimento das prestações sujeito a prazos diferentes a excepção poderá ser invocada pelo contraente cuja prestação deva ser efectuada depois da do outro, apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir primeiro».
[50] Luís Menezes Leitão, Direito das Obrigações, Almedina, Coimbra, 2006, vol. II, 4ª ed., pág. 262.
[51] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, pág. 405.
[52] Vaz Serra, Boletim do Ministério da Justiça, ano 67, pág. 23.
[53] Artigo 911.º (Redução do preço) :
1. Se as circunstâncias mostrarem que, sem erro ou dolo, o comprador teria igualmente adquirido os bens, mas por preço inferior, apenas lhe caberá o direito à redução do preço, em harmonia com a desvalorização resultante dos ónus ou limitações, além da indemnização que no caso competir.
2. São aplicáveis à redução do preço os preceitos anteriores, com as necessárias adaptações.
[54] Artigo 913.º (Remissão):
1. Se a coisa vendida sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor ou necessárias para a realização daquele fim, observar-se-á, com as devidas adaptações, o prescrito na secção precedente, em tudo quanto não seja modificado pelas disposições dos artigos seguintes.
2. Quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria.
[55] Artigo 914.º (Reparação ou substituição da coisa):
O comprador tem o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa ou, se for necessário e esta tiver natureza fungível, a substituição dela; mas esta obrigação não existe, se o vendedor desconhecia sem culpa o vício ou a falta de qualidade de que a coisa padece.
[56] Artigo 915.º (Indemnização em caso de simples erro):
A indemnização prevista no artigo 909.º também não é devida, se o vendedor se encontrava nas condições a que se refere a parte final do artigo anterior.
[57] Artigo 566.º (Indemnização em dinheiro):
1. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
2. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
3. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.
[58] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/12/98, in CJ STJ, Ano VI, I, 6.
[59] Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição revista e actualizada (com a colaboração de Henrique Mesquita), Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pág. 501.
[60] Pres de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª edição revista e actualizada (com a colaboração de Henrique Mesquita), Coimbra Editora, Coimbra, 2010, pág. 56.