Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
657/21.9T8STR-E.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: PROCESSO DE INVENTÁRIO
COMPETÊNCIA
DIVÓRCIO
APENSAÇÃO DE PROCESSOS
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – Resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 1083.º do C.P.C. que o processo de inventário é da competência exclusiva dos tribunais judiciais, sempre que o inventário constitua dependência de outro processo judicial.
2 – Embora o vigente artigo 1133.º do Código de Processo Civil, não contenha disposição equivalente ao artigo 1404.º, n.º 3, do Código de 1961, segundo a qual o inventário em consequência de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação do casamento corria por apenso a estes processos, é esta a solução que a lei consagra ao atribuir competência exclusiva aos tribunais judiciais para a tramitação de tais inventários, fundada na sua dependência de outro processo judicial.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 657/21.9T8STR-E.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Família E Menores de Santarém – J3
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente acção de inventário proposta por (…) contra (…), a requerente veio interpor recurso do despacho datado de 09/01/2004.
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(…) requereu Inventário para Partilha dos Bens Comuns do seu dissolvido casal, em consequência de divórcio, contra (…).
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Em 10/02/2022, o Tribunal a quo proferiu despacho dizendo que «a indicação do tribunal competente constante do formulário enferma de lapso, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 2 e 3, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, determina-se a notificação do requerente para, querendo, requerer a sua correção».
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Em 11/02/2023, a requerente requereu «a correcção do lapso no formulário, de modo a que o processo fosse distribuído ao Juiz 3, do Juízo de Família e Menores de Santarém, e corra por apenso aos autos de processo n.º 657/21.9T8STR».
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Em 16/02/2023, foi proferido despacho determinando «ao abrigo do disposto no artigo 7.º, n.º 3, da Portaria 280/2013, de 26/08», que deferiu a correcção requerida «e, consequentemente, ordeno a imediata remessa dos autos ao Juízo de Família e Menores deste Tribunal».
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Em 17/02/2022, o processo desmaterializado foi remetido ao Juízo de Família e Menores de Santarém - Juiz 3.
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Em 03/01/2024 foi criado o apenso ao Processo n.º 657/21.9T8STR.
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A 09/01/2024, na parte com pertinência para o presente recurso, o despacho recorrido tem o seguinte conteúdo:
«Assim, considerando o novo regime do processo de inventário (aprovado pela Lei n.º 117/2019, 13SET), mais concretamente o disposto nos artigos 72.º-A, 1083.º, n.º 1, alínea b) e 2 e 1113.º do Código de Processo Civil, que com a alteração ao Código de Processo Civil desapareceu a previsão da apensação do processo de inventário ao processo de divórcio (no novo regime verifica-se que não foi acolhida a norma que antes constava no artigo 1404.º, n.º 3, que determinava que o inventário corria por apenso ao processo de divórcio), considerando que não tendo sido vontade do legislador determinar a apensação (pois que a retirou do regime quando a mesma já se encontrava prevista), não existe fundamento legal para a apensação destes autos de inventário ao processo de divórcio.
Em face do exposto, determino a desapensação do presente processo de inventário e a sua remessa à distribuição pela Secção Central como processo autónomo.
Notifique».
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A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações continham as seguintes conclusões:
«1. O Despacho recorrido procedeu a uma incorreta interpretação e aplicação do direito ao ter determinado a desapensação do presente processo de inventário aos autos de processo de divórcio e mandado proceder à sua remessa à distribuição como processo autónomo. Com efeito,
2. A circunstância de a letra da lei do artigo 1133.º do CPC não coincidir com o anterior artigo 1404.º, n.º 3, do anterior CPC, e não prever, de forma expressa, que o inventário requerido na sequência de divórcio deve ser tramitado por apenso ao processo judicial onde este foi decretado, não pode dar azo à conclusão interpretativa de autonomia e separabilidade processual ínsita no Despacho recorrido.
3. Ensina o artigo 9.º do Código Civil que a interpretação da lei não pode cingir-se à letra da lei, devendo reconstitui-se tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias da sua elaboração e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
4. Da comparação sistemática entre os artigos 1083.º, n.º 1, alínea b) e 206.º, n.º 2, do CPC e o artigo 122.º, n.º 2, da LOSJ resulta que o processo de inventário para partilha de meações do ex casal já divorciado constitui evidente dependência do processo de divórcio judicial, na medida em que é decorrência ou consequência da sentença que dissolveu o casamento, pois é do ali decidido que emerge o direito à partilha dos bens comuns do casal.
5. É precisamente esta dependência e conexão entre ambos os processos que justifica a competência exclusiva do Tribunal que decretou o divórcio, para tramitar o inventário que lhe sobrevém e que deve seguir apensado àquele, por força da aplicação da regra estabelecida no n.º 2 do artigo 206.º do C.P.C. (“As causas que por lei ou por despacho devam considerar-se dependentes de outras são apensadas àquelas de que dependam”).
6. Neste sentido, aliás, se têm pronunciado, quase em uníssono, a Doutrina e da Jurisprudência (melhor citadas supra nestas Alegações, cujos trechos por economia processual aqui se dão por integralmente reproduzidos).
Em suma:
7. O Tribunal materialmente competente para tramitar os autos de inventário para partilha do património conjugal, na sequência de divórcio, é o Tribunal onde tramitaram os autos principais do divórcio, atentas as disposições conjugadas dos artigos 1082.º, alínea d), 1083.º, n.º 1, alínea b), 1085.º, n.º 1, alínea a), 1133.º, n.º 1 e artigo 206.º, n.º 2, todos do CPC, e do artigo 122.º, n.º 2, da LOSJ (Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, com as alterações dadas pela Lei n.º 40-A/2016, de 22/12).
8. Devendo, por conseguinte, e por aplicação do artigo 206.º, n.º 2, do CPC, os presentes autos de inventário correr por apenso aos autos principais de divórcio.
9. Ao assim não ter decidido, o Tribunal a quo violou, nomeadamente, o disposto no artigo 9.º do Código Civil e nos artigos 1082.º, alínea d), 1083.º, n.º 1, alínea b), 1085.º, n.º 1, alínea a), 1133.º, n.º 1 e artigo 206.º, n.º 2, todos do CPC e do artigo 122.º, n.º 2, da LOSJ.
Termos em que e nos mais de direito, deve o presente recurso ser julgado totalmente provado e procedente, com todas as legais consequências, nomeadamente revogando-se o Despacho recorrido, substituindo-o por outro que determine a tramitação dos presentes autos de inventário por apenso aos autos principais de divórcio, assim se fazendo Justiça!».
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Não foi apresentada resposta ao recurso. *
Os autos foram remetidos à distribuição, na sequência da prolação do despacho recorrido. Porém, por não ter sido acautelado o prazo de trânsito em julgado antes da remessa à distribuição, em 01/02/2024, os autos foram devolvidos, a fim de dar prosseguimento ao recurso.
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Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento universal que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de erro de direito, na dimensão da conexão processual.
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III – Dos factos apurados:
Os factos com interesse para a justa resolução do recurso constam do relatório inicial.
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IV – Fundamentação:
Ao Juízo de Família e Menores de Santarém está deferida a competência para preparar e julgar, tanto as acções de separação de pessoas e bens e de divórcio como os processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens e divórcio [artigo 122.º, n.ºs 1, alínea c) e 2[1] da Lei da n.º 62/2013, de 26/8], com referência aos artigos 1133.º[2] do Código de Processo Civil e 1689.º[3] do Código Civil.
A questão da competência coloca-se aqui por razões de conexão dos processos e não em razão da matéria. E, assim, aquilo que se pergunta é se o inventário para partilha de bens comuns subsequente à acção de divórcio corre por apenso a esta acção ou se deve ser instaurado como processo autónomo?
No domínio do Código de Processo Civil de 1961 a resposta era claramente afirmativa, dado que a lei dispunha que o “inventário corre por apenso ao processo de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação” (artigo 1404.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).
A Lei n.º 23/2013, de 5/3, veio atribuir competência aos cartórios notariais para o processamento dos actos e termos do processo de inventário (artigo 3.º), sem prejuízo dos interessados serem remetidos para os meios judiciais comuns para a resolução de questões cuja natureza ou a complexidade da matéria de facto e de direito, o justificassem (artigo 16.º, n.º 1) e revogou (artigo 6.º), entre outros, o referido artigo 1404.º do Código de Processo Civil.
Posteriormente, diagnosticado o falhanço parcial do processo de desjudicialização do inventário, a Lei n.º 117/2019, de 13/9 veio reintroduzir este processo especial no Código de Processo Civil, revogou o regime jurídico do processo de inventário, aprovado em anexo à Lei n.º 23/2013, de 5/3 (artigos 5.º e 10.º) e reintroduziu a tramitação da partilha de bens comuns nos casos de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento nos Tribunais Comuns.
A ausência de norma expressa com conteúdo equivalente à do pretérito artigo 1404.º do Código de Processo Civil apenas significa que, por via da aplicação das regras gerais, a estatuição anterior permanece válida e que a partilha de bens comuns subsequente às acções de separação, divórcio, ou declaração de nulidade ou anulação do casamento corre por apenso a estes procedimentos.
Efectivamente, Abrantes Geraldes sustenta a ideia que «não é legítimo inferir que tenha existido qualquer objectivo de modificar a natureza jurídica do processo de inventário. Este mantém-se como um processo de jurisdição contenciosa, ainda que submetido a uma tramitação especial ajustada à especificidade e à variedade de normas de direito material sucessório e á multiplicidade de interessados e de operações que precedem a sentença homologatória de partilha, como, aliás, já ocorria aquando da sua regulação no CPC de 1961»[4].
Na supra mencionada obra conjunta os autores pugnam que «agora, que foi restaurada a competência dos tribunais judiciais para a tramitação dos processos de inventário, faz todo o sentido que o processo de inventário subsequente a sentenças declarativas de divórcio ou de separação, ou de anulação do casamento, proferidas no âmbito de processos judiciais seja tramitado nos tribunais judiciais e que, ademais, corra por apenso a tais processos (competência por conexão), nos termos do artigo 206.º, n.º 2»[5].
Com idêntico desenlace, Pedro Pinheiro Torres avança que é «competente para o inventário subsequente o divórcio decretado judicialmente, o tribunal em que este foi decretado, devendo o processo de inventário correr por apenso àquele, de que é dependente, nos termos do n.º 2 do artigo 206.º do CPC»[6]. A defesa da apensação do inventário ao divórcio é assumida assim pela melhor doutrina[7].
Por via do cruzamento entre os artigos 80.º[8] e 122.º da Lei de Organização do Sistema Judiciário e n.º 2 do artigo 206.º[9] do Código de Processo Civil, está estabilizado o entendimento que o legislador quis estabelecer um regime equivalente àquele que tinha vigorado no domínio do Código de Processo Civil anterior para a tramitação do inventário em tais situações. Efectivamente, o processo de inventário é da competência exclusiva dos tribunais judiciais sempre que o inventário constitua dependência de outro processo judicial.
Esta posição já foi sufragada pelo agora relator (então como primeiro adjunto) no acórdão datado de 29/04/2021, onde se decidiu que na vigência da Lei n.º 117/2019, de 13/9, que reintroduziu o processo de inventário no Código de Processo Civil, o inventário para partilha de bens comuns subsequente à acção de divórcio, corria por apenso a esta acção, sendo competente para tramitar o inventário o Tribunal que decretou o divórcio[10]. E este é o sentido estabilizado da jurisprudência dos Tribunais Superiores [11] [12] [13] [14] [15][16] [17] [18] [19].
Em conclusão, embora o vigente artigo 1133.º do Código de Processo Civil, não contenha disposição equivalente ao artigo 1404.º, n.º 3, do Código de 1961, segundo a qual o inventário em consequência de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação do casamento corria por apenso a estes processos, é esta a solução que a lei consagra ao atribuir competência exclusiva aos tribunais judiciais para a tramitação de tais inventários, fundada na sua dependência de outro processo judicial.
Deste modo, julga-se procedente o recurso e decide-se revogar a decisão recorrida, determinando-se a tramitação dos presentes autos de inventário por apenso aos autos principais de divórcio.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o recurso apresentado, revogando-se a decisão recorrida.
Sem tributação, atento o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 07/03/2024
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Maria Rosa Barroso
Isabel Matos Peixoto Imaginário


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[1] Artigo 122.º (Competência relativa ao estado civil das pessoas e família):
1 - Compete aos juízos de família e menores preparar e julgar:
a) Processos de jurisdição voluntária relativos a cônjuges;
b) Processos de jurisdição voluntária relativos a situações de união de facto ou de economia comum;
c) Ações de separação de pessoas e bens e de divórcio;
d) Ações de declaração de inexistência ou de anulação do casamento civil;
e) Ações intentadas com base no artigo 1647.º e no n.º 2 do artigo 1648.º do Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47344, de 25 de novembro de 1966;
f) Ações e execuções por alimentos entre cônjuges e entre ex-cônjuges;
g) Outras ações relativas ao estado civil das pessoas e família.
2 - Os juízos de família e menores exercem ainda as competências que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos.
[2] Artigo 1133.º (Separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação de casamento):
1 - Decretada a separação judicial de pessoas e bens ou o divórcio, ou declarado nulo ou anulado o casamento, qualquer dos cônjuges pode requerer inventário para partilha dos bens comuns.
2 - As funções de cabeça de casal incumbem ao cônjuge mais velho.
3 - Sempre que o entenda conveniente, o juiz pode determinar a remessa do processo para mediação, aplicando-se, quanto ao mais, o disposto no artigo 273.º.
[3] Artigo 1689.º (Partilha do casal. Pagamento de dívidas):
1. Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros recebem os seus bens próprios e a sua meação no património comum, conferindo cada um deles o que dever a este património.
2. Havendo passivo a liquidar, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis até ao valor do património comum, e só depois as restantes.
3. Os créditos de cada um dos cônjuges sobre o outro são pagos pela meação do cônjuge devedor no património comum; mas, não existindo bens comuns, ou sendo estes insuficientes, respondem os bens próprios do cônjuge devedor.
[4] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2.º edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 553.
[5] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, 2.º edição, Almedina, Coimbra, 2022, pág. 560.
[6] Pedro Pinheiro Torres, Cadernos do CEJ, “Inventário: o novo regime”, Maio de 2020, pág. 31.
[7] Pode ainda ser consultada a obra conjunta de Teixeira de Sousa, Lopes do rego, Abrantes Geraldes e Pinheiro Torres, O Novo Regime do Processo de Inventário e Outras Alterações na Legislação Processual Civil, Almedina, Coimbra, 2020, pág. 158.
[8] Artigo 80.º (Competência):
1 - Compete aos tribunais de comarca preparar e julgar os processos relativos a causas não abrangidas pela competência de outros tribunais.
2 - Os tribunais de comarca são de competência genérica e de competência especializada.
[9] Artigo 206.º (Atos processuais sujeitos a distribuição na 1.ª instância):
1 - Estão sujeitos a distribuição na 1.ª instância:
a) Os atos processuais que importem começo de causa, salvo se esta depender de outra já distribuída;
b) Os atos processuais que venham de outro tribunal, com exceção das cartas precatórias, mandados, ofícios ou telegramas, para simples citação, notificação ou afixação de editais.
2 - As causas que por lei ou por despacho devam considerar-se dependentes de outras são apensadas àquelas de que dependam.
[10] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 29/04/2021, disponível em www.dgsi.pt.
[11] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23/02/2021, avança que «I - A Lei n.º 117/2019, de 13.9, que entrou em vigor em 1.1.2020, veio, além do mais, revogar o regime jurídico do processo de inventário instituído pela Lei n.º 23/2013, de 5.3, aprovando um novo regime do inventário notarial e reintroduzindo no Código de Processo Civil (artigos 1082.º a 1135.º) o inventário judicial. II - Sem prejuízo do regime transitório previsto nos artigos 12.º e 13.º da referida Lei n.º 117/2019, estabelece a mesma a repartição de competências para a tramitação do inventário entre os tribunais judiciais e os cartórios notariais, delimitando o artigo 1083.º do C.P.C. os casos em que o processo de inventário é da competência exclusiva dos primeiros. III - Resulta da alínea b) do n.º 1 do artigo 1083.º do C.P.C. que o processo de inventário é da competência exclusiva dos tribunais judiciais, sempre que o inventário constitua dependência de outro processo judicial. IV - Por outro lado, resulta do n.º 1 do artigo 1133.º do mesmo diploma que: “Decretada a separação judicial de pessoas e bens ou o divórcio, ou declarado nulo ou anulado o casamento, qualquer dos cônjuges pode requerer inventário para partilha dos bens comuns. V - O inventário para separação de meações é dependente do processo de divórcio judicial, na medida em que é consequência do que nele foi decidido, pois é da sentença de divórcio que emerge o direito à partilha dos bens comuns do casal. VI - Da leitura destes preceitos e da sua conjugação com o disposto no n.º 2 do artigo 122.º da Lei Organização do Sistema Judiciário (LOSJ), onde se refere que: “Os juízos de família e menores exercem ainda as competências que a lei confere aos tribunais nos processos de inventário instaurados em consequência de separação de pessoas e bens, divórcio, declaração de inexistência ou anulação de casamento civil, bem como nos casos especiais de separação de bens a que se aplica o regime desses processos”, temos para nós que o inventário tem de correr nos tribunais judiciais (juízos de família e menores) quando seja subsequente a ação de divórcio judicial».
[12] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08/07/2021, que deliberou que «Na vigência da Lei n.º 117/2019, de 13/9, que reintroduziu o processo de inventário no Código de Processo Civil, o inventário para partilha de bens comuns subsequente à ação de divórcio, corre por apenso a esta ação, sendo competente para tramitar o inventário o tribunal que decretou o divórcio».
[13] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24/01/2022, cujo sumário refere que «(…) Optando o requerente por instaurar o processo no tribunal, determina-se o tribunal competente por aplicação do regime previsto no artigo 80.º do CPC (…)».
[14] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/04/2022, pronuncia-se que: «(…) II - É da competência exclusiva dos tribunais, mais concretamente dos juízos de Família e Menores, tramitarem inventário subsequente a processo de divórcio que neles hajam corrido termos, no qual haja sido proferida a decisão de que emerge o propósito de proceder à partilha dos bens comuns do ex-casal. III - Nesta hipótese, o inventário deve correr termos por apenso ao processo de divórcio. IV - Não tendo o inventário sido instaurado por dependência a outro processo judicial, aquele pode ser requerido, à escolha do interessado que o instaura ou mediante acordo entre todos os interessados, nos tribunais judiciais ou nos cartórios notariais; optando pelo recurso aos tribunais judiciais, são os tribunais de Família e de Menores os materialmente competentes para tramitarem o processo de inventário».
[15] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 09/06/2022, que sublinha que «o processo de inventário para partilha de bens comuns do casal, subsequente ao decretamento do divórcio, deve ser tramitado por apenso ao processo de divórcio, nos termos dos artigos 122.º, n.º 2, da LOSJ e 206.º, n.º 2, do CPC».
[16] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 27/04/2023, que aponta no sentido que «não há que distribuir o inventário para partilha dos bens comuns subsequente ao divórcio decretado nos Juízos de Família e Menores, previsto no artigo 1133.º do Código de Processo Civil, porquanto este corre por apenso a esse processo».
[17] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10/07/2023, advoga também que: «o inventário para partilha de bens, decorrente de divórcio judicial, não está sujeito à distribuição, por dever ser apensado ao processo que decretou o divórcio que fundamenta o inventário, nos termos da ressalva da alínea a) do n.º 1 do artigo 206.º, do n.º 2 do artigo 206.º, em referência ao artigo 1083.º/1-b) e ao artigo 1133.º do Código de Processo Civil».
[18] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23/07/2023, que consagrou o entendimento que «I – Através do n.º 2 do artigo 122.º da LOSJ atribui-se competência material ao Juízo de Família e Menores também para os processos de inventário subsequentes a divórcio decretado pela Conservatória do Registo Civil, incluindo o inicialmente instaurado no cartório notarial e que depois vem a ser remetido a tribunal ao abrigo do disposto no artigo 12.º, n.º 2, da Lei n.º 117/2019;
II – O tribunal territorialmente competente para tal processo de inventário determina-se por aplicação da regra geral prevista no artigo 80.º do CPC, sendo a competência de Juízo de Família e Menores quando este abrange na sua área de competência territorial a residência do ex-cônjuge requerido».
[19] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 30/11/2023, que considera que «o processo de inventário para partilha de bens comuns do casal, subsequente ao decretamento do divórcio, deve ser tramitado por apenso ao processo de divórcio, nos termos dos artigos 122.º/2, da LOSJ e 206.º/2, do CPC».