Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
44/18.6PTSTB.E1
Relator: FÁTIMA BERNARDES
Descritores: OMISSÃO DE AUXÍLIO
Data do Acordão: 04/13/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1 - Tendo o veículo conduzido pelo arguido embatido na lateral do motociclo tripulado pelo ofendido, tendo provocado a queda deste e ficando o ofendido caído no solo, criou um concreto perigo de lesão grave da integridade física do mesmo, tendo o ofendido sofrido traumatismo do pé esquerdo, com amputação traumática da 2ª falange, exigindo socorro médico imediato, o que era apreensível, por qualquer pessoa, colocada perante a situação.

2 - A circunstância de não ter resultado provado que o ofendido correu perigo de vida e de as lesões que sofreu não se integrarem na previsão do artigo 144º do Código Penal – ofensa à integridade física grave –, não afasta a verificação da «grave necessidade», estando-se perante um crime de perigo concreto, que abrange também o perigo de grave lesão da integridade física, não se exigindo, para o preenchimento do tipo, que esse resultado venha efetivamente a ocorrer.
Em conformidade com o que supra se referiu, bastará que se configure um quadro factual, donde resulte a perceção, para qualquer pessoa, de que o ofendido necessita de ser de imediato socorrido, por serem previsíveis, face aos sinais exteriores evidenciados, que venham a existir consequências graves para o ofendido, designadamente, lesão substancial ou grave, da integridade física, o que, se verifica, no caso vertente.

3 - Tendo o arguido, apesar de estar consciente do tinha acontecido, ou seja, de que embateu com o seu veículo no motociclo conduzido pelo ofendido, prosseguido a marcha, abandonando o local, pondo-se em fuga, agindo voluntariamente, sem querer saber do estado em que ficou o ofendido, não lhe prestando qualquer socorro, nem promovendo a prestação de socorro por outrem, apesar de ter admitido que o sinistrado ficaria num estado em que careceria de socorro, para debelar os ferimentos de que pudesse padecer, com o que se conformou, sabendo o arguido que essa sua conduta era proibida e punida por lei, encontram-se também preenchidos os elementos subjetivos do crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo artº 200º, nºs 1 e 2, do C.P., tendo o arguido agido com dolo eventual.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

1. RELATÓRIO
1.1. Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, n.º 44/18.6PTSTB, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo Local Criminal de Setúbal – Juiz 1, foi submetido a julgamento o arguido (...), melhor identificado nos autos, estando acusado da prática, em autoria material e em concurso efetivo de um crime de ofensa à integridade física, por negligência, p. e p. pelos artigos 148º, n.º 1 e 15º, ambos do Código Penal e de um crime de omissão de auxílio p. e p. pelo artigo 200º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal e de uma contraordenação causal do acidente, p. e p. pelos artigos 35º, n.ºs 1 e 2, 44º, 145º, n.º 1, al. a) e 139º, todos do CE.
1.2. Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 04/12/2020, depositada nessa mesma data, absolvendo o arguido da prática da contraordenação e condenando-o pela prática dos crimes de ofensa à integridade física e de omissão de auxílio, por que vinha acusado, nas penas parcelares de 100 dias de multa e de 150 dias de multa e em cúmulo jurídico de tais penas, na pena única de 230 (duzentos e trinta) dias de multa, à taxa diária de €7,00 (sete euros) e, ainda, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, pelo período de 5 (cinco) meses.
1.3. Inconformado, o arguido interpôs recurso para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso apresentada, as conclusões que seguidamente se transcrevem:
«a) - O crime de omissão de auxilio assume-se por ser um crime que exige o dolo, ainda que na forma de dolo eventual. Sendo um crime de perigo concreto, exige-se o dolo do perigo concreto.
b) Atento o disposto no disposto no art.º 200 n.º 1 do CP, este crime exige a concretização do perigo, que há-de resultar demonstrado das circunstâncias concretas do caso, pois que não basta a existência de um perigo abstrato ou presumido.
c) A obrigação de auxílio que recai sobre o agente só existe em caso de grave necessidade;
d) O referido conceito exige que perante uma lesão da integridade física, esse perigo seja iminente e configure uma lesão substancial grave;
e) Essa necessidade de auxílio sendo grave, requer a impossibilidade do agente, por si só, afastar o perigo que ameaça bens jurídicos pessoais,
f) Exigindo a existência de consideráveis sinais exteriores, facilmente percecionados por qualquer pessoa, reveladores da premente necessidade de auxílio.
g) A grave necessidade a que se reporta o art.º 200 n.º 1 do CP, não se encontra demonstrada em face dos factos dados como provados pelo tribunal ad quo
h) Dos factos dados por provados pelo Tribunal ad quo não resulta que do embate tivesse resultado um grave perigo para a vida do ofendido.
i) O Relatório de Avaliação do Dano Corporal apurou que da ofensa não resultou, em concreto, uma situação de perigo para a vida do ofendido;
j) As sequelas não privaram o ofendido de importante órgão ou membro, nem o desfiguraram grave e permanentemente, nem tão pouco lograram interferir com a sua capacidade para o trabalho, ou de utilizar o seu corpo.
k) Não estamos perante um caso de grave necessidade da prestação de auxílio para afastar tais perigos, não demonstrados;
1) Ao ter decido de forma diversa, violou a sentença a quo o disposto no artigo 200.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal.
m) Deverá revogar-se a sentença recorrida no que respeita ao crime de omissão de auxílio - dele absolvendo-se o arguido e condenar-se somente pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, em pena de multa.
m) A pena acessória de proibição de condução de veículos motorizados pode ser proporcionalmente diferente da pena principal encontrada, uma vez que cada uma delas visa objectivos diversos, sendo certo que aquela tem em vista a recuperação do comportamento estradal do condutor imprudente e leviano, embora também, no que concerne à mesma, se deve ter em conta os critérios definidos no art.º 71º do C. Penal.
o) Considerando que o ora Recorrente apresenta um registo criminal imaculado de qualquer crime relacionado com a condução rodoviária, a ponderação dos critérios de prevenção geral e especial se mostram mitigados.
p) A medida da pena acessória aplicável ao caso concreto vai de três meses a três anos (cfr. Art.º 69º, n.º 1, alínea a) do C. Penal).
q) O Tribunal a quo aplicou ao recorrente uma pena acessória de 5 meses de proibição de conduzir.
r) O Recorrente vive com um filho recém nascido e quinzenalmente desloca-se para ir buscar a sua filha menor fruto de outro relacionamento para passar consigo os fins de semana.
s) A pena acessória em causa só deve ser aplicada na medida necessária à reintegração do recorrente na sociedade, visando a recuperação do seu comportamento enquanto condutor, mediante a simples intuição dos princípios dominantes do tecido social em que se insere e que, no caso em apreciação, têm a ver, sobretudo, com a segurança do trânsito rodoviário.
t) Tal pena deverá causar apenas o mal necessário e não afectar-lhe, em grau desmesurado, legítimas expectativas humanas que perpassam, obviamente, pela satisfação de necessidades próprias, sob pena de se estarem a infringir direitos fundamentais constitucionalmente garantidos.
t) A de condução carta assume especial relevância na particular situação profissional e familiar do recorrente;
u) Uma pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor de qualquer categoria pelo período de 3 (três) meses, cumpre com os exigidos critérios de prevenção geral e especial, o que se propugna.
Termos em que deverá determinar-se a revogação da sentença recorrida, absolvendo-se o arguido pela prática autoria material de um crime de omissão de auxílio, bem como aplicar-se-lhe a pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor de qualquer categoria pelo período de 3 (três) meses, nos termos supra expostos, concedendo-se provimento ao presente Recurso, por assim ser de inteira JUSTIÇA »
1.4. O recurso foi regularmente admitido.
1.5. O Ministério Público, junto da 1ª instância, respondeu ao recurso, pronunciando-se no sentido de dever se negado provimento ao mesmo, formulando, as seguintes conclusões:
«1- Nos presentes autos, foi o arguido, ora recorrente, condenado pela prática em autoria material, e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física negligente, previsto e punido pelo artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal, praticado a 03/06/2018, na pena de 100 (cem) dias de multa, à taxa diária de €7,00 (sete euros) e pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de um crime de omissão de auxílio, previsto e punido pelo artigo 200.º, n.º 1 e 2 do Código Penal, praticado a 03/06/2018, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €7,00 (sete euros). Em cúmulo jurídico, foi o arguido (...) condenado na pena única de 230 dias de multa, à taxa diária de €7,00 e ainda numa pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor de qualquer categoria pelo período de 5 (cinco) meses.
2 - Inconformado com esta condenação, dela veio o arguido interpor recurso, quanto à condenação pela prática de um crime de omissão de auxílio e quanto à medida da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor.
3 - Quanto à condenação pela prática de um crime de omissão de auxílio, alega o recorrente que não ficou demonstrado que do embate tivesse resultado um grave perigo para a vida do ofendido. E que não se está perante um caso de grave necessidade da prestação de auxílio para afastar tais perigos, não demonstrados.
4 - Com o devido respeito, consideramos que do elenco dos factos dados como provados na sentença, que não foram impugnados, resultam preenchidos os elementos típicos do crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo artigo 200 n.ºs 1 e 2 do Código Penal.
5 - No caso concreto, verificou-se um concreto perigo para a integridade física do ofendido, que ficou caído no solo, com grave lesão do pé esquerdo, tendo sido socorrido por outros condutores que circulavam no local - factos descritos em 12) e 13) da matéria de facto dada como provada na sentença em crise.
6 - O ofendido sofreu traumatismo do D5 do pé esquerdo com amputação traumática da 2.ª falange, úlcera traumática do dorso do pé esquerdo, conforme resulta em 9) da matéria de facto dada como provada.
7 - Conforme Paulo Pinto de Albuquerque, em "Comentário do Código Penal", Edição Universidade Católica Editora, Lisboa 2008, página 540, a situação de grave necessidade ocorre quando o portador do bem jurídico se encontra em perigo iminente de lesão dos bens jurídicos protegidos - a vida, a integridade física e a liberdade.
8 - Mostrando-se verificado o perigo concreto para a integridade física do ofendido, que sofreu grave lesão do pé esquerdo, ficando caído no solo, numa situação de grave necessidade de prestação de auxílio, decorrente do embate que sofreu pelo veículo conduzido pelo arguido, tendo este abandonado o local sem que tenha promovido o socorro que se impunha, resta concluir que, face aos factos provados que constam da sentença recorrida, cometeu também o arguido um crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo artigo 200.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal.
9 - Quanto à medida da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor, tendo em conta que, nos termos do artigo 69º, n.º 1 do Código Penal, a pena acessória tem um limite mínimo de 3 meses e um limite máximo de 3 anos e que esta obedece aos princípios orientadores explanados no artigo 71º do CP, e valoradas as circunstâncias apontadas na sentença recorrida para determinação da medida da pena acessória aqui em causa, consideramos que a mesma está longe de ultrapassar a medida da culpa do arguido.
10 - Deste modo, deverá o recurso interposto pelo arguido/recorrente ser julgado improcedente e, em consequência, manter-se a decisão recorrida nos seus precisos termos.
Termos em que, Vossas Excelências farão a habitual JUSTIÇA.»
1.6. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de o recurso dever ser julgado improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.
1.7. Cumprido o disposto no n.º 2 do artigo 417º do Código de Processo Penal, não foi exercido o direito de resposta.
1.8. Feito o exame preliminar e, colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
Cumpre agora apreciar e decidir:

2 – FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Delimitação do objeto do recurso
Em matéria de recursos, que ora nos ocupa, importa ter presente as seguintes linhas gerais:
O Tribunal da Relação tem poderes de cognição de facto e de direito – cfr. artigo 428º do C.P.P.
As conclusões da motivação do recurso balizam ou delimitam o respetivo objeto – cfr. artºs. 402º, 403º e 412º, todos do C.P.P.
Tal não preclude o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas als. a), b) e c), do nº. 2 do artigo 410º do C.P.P., mas tão somente quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum, bem como das nulidades principais, como tal tipificadas por lei.
No caso vertente, considerando os fundamentos do recurso interposto pelo assistente, são as seguintes as questões suscitadas:
- Erro de subsunção da matéria factual provada ao crime de omissão de auxílio;
- Medida da pena acessória.

*
Para que possamos apreciar as questões elencadas, importa ter presente a sentença recorrida, que se transcreve:

2.2. Sentença recorrida
«(…)
II. Fundamentação
2. Fundamentação de facto
2.1. Factos provados
Da audiência de discussão e julgamento resultaram provados os seguintes factos, com relevo para a decisão da causa:
1) No dia 03 de junho de 2018, pelas 12h25m, o arguido conduzia o seu veículo ligeiro de passageiros de marca (…), circulando na Estradas (…), no sentido norte/sul.
2) No mesmo circunstancialismo de tempo e lugar (...) conduzia o motociclo de marca (…), no sentido sul/norte.
3) No local a estrada, que configura uma reta, duas vias de trânsito, uma em cada sentido.
4) Na ocasião fazia bom tempo, existia boa visibilidade e luminosidade uma vez que era de dia.
5) O arguido imobilizou o seu veículo, junto do eixo da via, onde existe marcada no solo uma linha longitudinal descontínua, pretendendo efetuar uma mudança de direção à esquerda, para a Rua do (…), que se lhe apresentava à esquerda, atento o sentido de marcha que seguia.
6) Porém, na execução dessa manobra, o arguido não a realizou de forma rápida e segura, de modo a se certificar primeiro que não se aproximavam veículos a circular em sentido contrário ao seguido pelo arguido.
7) Nessas circunstâncias, o arguido avançou com o seu veículo, ocupando a faixa de trânsito de sentido contrário, onde na ocasião circulava o motociclo de matricula (…), conduzido por (...).
8) Veio o veículo do arguido a embater na lateral esquerda do motociclo de matrícula (...), em plena via de trânsito deste, que não foi possível de imobilizar pelo seu tripulante, a tempo de evitar o embate, tendo, da colisão resultado a queda do motociclo e do seu condutor.
9) Como consequência direta do embate, (...) sofreu traumatismo do D5 do pé esquerdo com amputação traumática da 2ª falange, úlcera traumática do dorso do pé esquerdo, lesões essas que determinaram 180 (cento e oitenta) dias de doença, sendo 120 (cento e vinte) dias de afetação para o trabalho em geral e 180 (cento e oitenta) dias de afetação para o trabalho profissional.
10) O arguido podia e devia ter tido outro comportamento que evitasse a colisão e as consequências que se lhe seguiram. Nomeadamente, podia e devia ter tido o cuidado, a precaução e a atenção necessárias para que, ao efetuar a manobra de mudança de direção para a sua esquerda, o fizesse com a garantia de que de tal manobra não resultava perigo para os restantes utentes da via, que nela circulavam, nomeadamente o motociclo conduzido por (...).
11) Não obstante o embate no ofendido, o arguido abandonou o local, não prestando qualquer auxílio a (...).
12) (...) ficou caído no solo, com grave lesão do pé esquerdo.
13) O ofendido foi socorrido por outros condutores que circulavam no local.
14) Ao fugir, o arguido ignorou o estado de saúde em que ficara o condutor do motociclo, não lhe prestando qualquer socorro, nem promovendo a prestação de socorro por terceiro.
15) O arguido agiu consciente e voluntariamente ao fugir após a colisão com o motociclo onde seguia o (...), sem querer saber do estado em que este ficou, sem lhe prestar o devido e necessário auxílio ao afastamento do perigo para a vida e integridade física que o embate causou àquele e sem sequer promover o socorro desse condutor por terceiros.
16) Agiu desse modo, e apesar de ter admitido que o sinistrado ficaria num estado em que careceria do seu socorro, abandonou o local sem lhe prestar a assistência necessária para debelar os ferimentos de que o mesmo pudesse padecer, conformando-se com essa decisão.
17) Sabia que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
Mais se provou que:
18) O arguido reside com a cônjuge e uma filha de 5 meses.
19) O arguido trabalha como operário fabril, auferindo €1.054,00, e a cônjuge trabalha como médica dentista, auferindo, em média, €1.500,00, apresentando como despesas mensais mais significativas a mensalidade com a creche da filha, no valor de €300,00, pensão de alimentos de uma filha de 5 anos, que reside com a mãe, no valor de €100,00, e prestação para aquisição de viatura própria, no valor de €300,00. 20) O arguido tem o 12.º ano de escolaridade.
21) Do certificado de registo criminal do arguido consta que o arguido foi condenado pela prática, a 30/11/2016, de um crime de furto de material de guerra, por sentença proferida a 15/09/2017, no âmbito do processo n.º 238/16.9T9EVR, do Tribunal Judicial de Comarca de Lisboa, Juízo Central Criminal 6, transitada em julgado a 17/10/2017, na pena de um ano e três meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período.

*
2.2 Factos não provados
Não se provaram, de entre os factos descritos na acusação, e com relevo para a boa decisão da causa:
a) Que o motociclo conduzido por (...), de marca Honda, modelo PC56, tivesse a matrícula (…).
b) Que com a mudança de direção, o arguido pretendesse estacionar na Rua do (…).
c) Que o arguido se tivesse apercebido do estado em que ficara o sinistrado, abandonando o local sem lhe prestar a assistência necessária para debelar os ferimentos de que ele padecia, com o intuito de se eximir às suas responsabilidades.
*
2.3. Motivação da matéria de facto
Serviram de base para formar a convicção do tribunal a análise critica e conjugada dos elementos probatórios carreados para os autos e produzidos em audiência de julgamento, apreciados segundo as regras da experiência comum e a livre convicção do julgador, nos termos do art.º 127º do Código de Processo Penal, com exceção da prova pericial, cujo juízo técnico e científico se presume subtraído à livre apreciação do julgador, conforme dispõe o artigo 163º, nº 1 do Código de Processo Penal.
Assim, a convicção do Tribunal formou-se com base nas declarações do arguido, nos depoimentos da testemunha e ofendido (...), e das testemunhas (…), devidamente concatenados com a participação do acidente (fls 5 a 8), episódio de urgência (fls 47 a 50 verso) e relatório da perícia do dano corporal (fls 181 a 184) e restante documentação junta aos autos.
Da prova testemunhal resultaram duas versões: por um lado, aquela trazida aos autos pelo arguido e pela testemunha (…), cônjuge deste, a qual, advertida da faculdade concedida pelo artigo 134.º do Código de Processo Penal, da mesma prescindiu, optando por prestar o seu depoimento. Assim, e no essencial, o arguido e a cônjuge (a qual, segundo ambos, se encontrava no lugar do passageiro), após o embate prosseguiram o seu caminho, não tendo o arguido imobilizado a viatura por terem ambos considerado que o motociclo prosseguira a sua viagem, não se tendo, nem um nem outro, apercebido que o mesmo tombara.
Por outro lado, ressalta da versão trazida aos autos pelas testemunhas (…), ciclistas que se encontravam no local do acidente, que após o embate o veículo de passageiros se imobilizou na via durante alguns segundos, enquanto o motociclo prosseguia a marcha aos ziguezagues, também durante alguns segundos, acabando por tombar junto à berma da via. Só após a queda do motociclo, atestaram ambas as testemunhas, o veículo ligeiro de passageiros retomou a sua viagem em marcha lenta na direção que empreendera aquando do embate.
A versão do arguido e cônjuge apresenta algumas incongruências, como adiante se especificará, resultando comprometida a isenção desta testemunha, cujos laços familiares com o arguido poderão ter influenciado o depoimento prestado.
Por outro lado, a versão das restantes testemunhas revelou-se credível, segura, sustentada e descomprometida, logrando convencer o tribunal quanto à efetiva dinâmica do acidente.
Concretizando:
Factos provados:
As versões trazidas aos autos pelo arguido e testemunhas revestem-se consensuais quanto aos factos provados 1) a 5).
Assim, o arguido (...), que quis falar ao Tribunal, relatou que no dia, local e hora indicados conduzia o seu veículo ligeiro de passageiros de marca Volkswagen, (…), na Estradas (…), imobilizando o seu veículo junto do eixo da via, para efeito de mudança de direção à esquerda, por forma mudar de direção para a Rua do (…), o que foi corroborado pela testemunha (…).
As testemunhas (…), igualmente confirmam tal factualidade, relatando ao Tribunal que seguiam de bicicleta na mesma via do veículo ligeiro de passageiros Volkswagen (…), que este ia em velocidade moderada e se imobilizou junto ao eixo da via a fim de virar à esquerda, na direção da Rua do (…).
A testemunha (...), num depoimento descomprometido e muito credível - não obstante ser ofendido na causa -, e consentâneo com a dinâmica até ao momento descrita, relatou que conduzia o motociclo de marca Honda, matricula (...), no sentido oposto ao do veículo conduzido pelo arguido, o qual avistou, imobilizado junto ao eixo da via a fim de mudar de direção.
As condições atmosféricas (que fazia bom tempo, existia boa visibilidade e luminosidade) foram portados confirmadas.
A factualidade descrita encontra ainda respaldo no auto de notícia de fls 2 a 4 e na participação do acidente (fls 5 a 8).
A factualidade vertida em 6), 7) e 8) resultou provada com base no depoimento das testemunhas (...), (…).
Relatou (...) que, estando o veículo ligeiro de passageiros imobilizado à sua esquerda e preparado para mudar de direção, encontrando-se ele próprio a circular em velocidade moderada no seu ciclomotor, o qual salientou ser recente e, como tal, ter sempre luzes de presença acesas, foi surpreendido pela circunstância do veículo de passageiros ter empreendido a marcha no exato momento em que passava à sua frente, assim resultando o embate.
Afirmou ainda a testemunha que o veículo ligeiro de passageiros, invadindo a sua faixa de rodagem, embateu no lado esquerdo do motociclo, apanhando o seu pé esquerdo, não tendo tido tempo de travar a fim de evitar a colisão.
Segundo (...), num relato que em tudo se reputou de sério e credível, porque coerente e sem expressar qualquer sentimento de animosidade ou retaliação, não obstante o embate, não caiu de imediato, conseguindo dirigir-se até à berma da estrada, um pouco mais à frente, mas acabando por tombar, em virtude de não ter conseguido apoiar o pé esquerdo, lesionado, no chão.
Corroborando esta dinâmica do embate, (…) descreve que "no instante em que a mota vem a passar, o carro dá um solavanco, avança e dá-se a colisão" sic. Corroborou ainda que o motociclista não caiu de imediato, mas sim que reduziu a velocidade, não conseguiu suster a mota e veio a cair uns "cinco ou dez segundos depois (. . .) antes de uma paragem de autocarro que se encontrava a uns 20 ou 25 metros do cruzamento" sic.
Também a testemunha (…) confirma que o veículo ligeiro de passageiros, quando iniciou a marcha, embateu na mota. Esta, relata a testemunha, "ainda andou um bocadinho, uns metros, uns 2 ou 3 segundos, e depois caiu" sic.
Quanto à distância que efetivamente o ciclomotor ainda percorreu, tal não se conseguiu apurar com exatidão, em virtude de se tratar de perceções individuais, pouco objetiváveis, tendo (…) estimado que a paragem de autocarros perto da qual o motociclista tombou, distaria cerca de 100 metros do cruzamento, enquanto a anterior testemunha estimou cerca de 20 a 25 metros. Todavia, as duas testemunhas relataram que o campo de visão entre o motociclo tombado e o veículo ligeiro, no local onde se deu a colisão, era mútuo.
Embora não negando os factos provados 6) e 7), o arguido procurou justificar a colisão afirmando que quando iniciou a marcha em mudança de direção, não obstante ter visualizado o ciclomotor, calculou conseguir atravessar a faixa de rodagem deste "sem prejudicar ninguém" sic.
Todavia, dos relatos das testemunhas (…), e do próprio ofendido, não resultou que o motociclo circulasse em velocidade excessiva, o que, aliás, o próprio arguido não refere explicitamente, nem qualquer outra circunstância adversa, nomeadamente climatérica.
Já quanto ao facto provado 8), a versão do arguido não logrou convencer o Tribunal. Na sua versão, quis o arguido fazer crer ao Tribunal que ele é que foi embatido pelo motociclo, tendo sido sua perceção, afirmou, que após o embate, o ciclomotor se colocou em fuga. Ora, se o arguido é que efetua manobra de mudança de direção, e para tal se atravessa no eixo da via em que o ofendido circula sempre no mesmo sentido, em linha reta, apresentando-se pela sua direita, não pode esta versão colher, pois quem embateu no outro veículo foi ele próprio.
Quanto ao depoimento da testemunha (…), no atinente a esta factualidade menciona a mesma que vinha distraída com o telemóvel e apenas quando sentiu o embate, logo após o marido ter retomado a marcha para mudança de direção, olhou.
O depoimento desta testemunha refletiu algumas ambiguidades e incoerências. Na senda da versão do arguido, seu marido, a testemunha quis convencer o tribunal, o que não logrou alcançar, que "nunca pensou que a mota tivesse caído" sic, pois a mesma, após o embate, prosseguiu a marcha.
Todavia, começou a testemunha por descrever que depois do embate "a mota não estava a ziguezaguear muito" sic, para, logo de seguida, afirmar que o ofendido "estava equilibrado na mota" sic. Ora se estava a ziguezaguear - muito ou pouco -, equilibrado é que não estava, e mal se compreende que nem a testemunha, nem o marido, ora arguido, que igualmente mencionou que o motociclo ziguezagueou após o embate, tenham procurado ver o desfecho de tal ziguezaguear.
Aliás, a testemunha (…) relatou ao tribunal que a pezeira esquerda do motociclo embateu no lado esquerdo do para choques do veículo que o marido, ora arguido, conduzia (com efeito, conforme resulta provado à evidência, o veículo que o cônjuge conduzia é que embateu na pezeira do motociclo!) e que, após, olhou e viu o condutor do motociclo a sacudir o pé esquerdo.
Ora, novamente, mal se compreende que, após uma colisão entre um veículo ligeiro de passageiros e um motociclo, ficando o condutor do motociclo com o pé fora do respetivo apoio, a sacudir o mesmo pé - o que só podia resultar do embate sofrido -, e a ziguezaguear na mota, não fosse a testemunha colocar como hipótese plausível e provável que o mesmo viesse a tombar ou a imobilizar o veículo.
Com esta versão da dinâmica do acidente, pretendeu o arguido, no que foi seguido pela testemunha cônjuge, convencer o tribunal que não abandonou o local, nem fugiu, mas não foi esta a versão que o tribunal acolheu, resultando provados os factos 11) e 14) com base na versão, em tudo coerente, segura e credível, apresentada pelas testemunhas (…).
Ambos, sem qualquer hesitação - e contrariando a versão do arguido de que não imobilizou a viatura após o embate -, relataram que após o embate a viatura ligeira de passageiros se imobilizou, atravessada na faixa, durante alguns segundos, e que só após o motociclo ter tombado, uns metros mais à frente, é que o veículo ligeiro de passageiros retomou, lentamente, a marcha no sentido que encetara com a mudança de direção, não tendo ninguém saído da viatura ou aparecido posteriormente.
Relatam ainda os dois ciclistas que a testemunha (…) permaneceu junto do acidentado, enquanto que a testemunha (…) seguiu a viatura ligeira de passageiros a fim de anotar a sua matrícula. E afirmou este, de forma bastante clara e segura, que uma vez que a viatura ligeira de passageiros encetava uma marcha bastante lenta, teve oportunidade de a seguir durante algum tempo e retificar a matrícula, que inicialmente anotara mal. Disse ainda, contrariando a versão do arguido e cônjuge, de forma muito genuína e segura, que o carro não se imobilizou na Rua do (…), mas antes, sempre em marcha lenta, virou novamente na primeira via que se lhe apresentou pela sua direita, tendo sido nesse momento que perdeu o contacto visual com a mesma.
E assim, acolhida esta versão pelos motivos supra aduzidos, sempre se dirá que se o arguido seguia em marcha lenta em virtude do seu para choques estar a arrastar pelo chão, como ele e a testemunha sua esposa afiançaram, a parar para consertar o para choques durante uns 6 ou 7 minutos, como igualmente o afirmam, tê-lo-á feito após virar à direita na Rua do (…), em local em que de maneira alguma poderia avistar o acidentado, ou ser ele próprio avistado. Certo, é que o arguido não voltou ao local do acidente para se inteirar do destino do motociclista.
Quanto aos factos provados 12) e 13), (…) testemunhou terem-se, de imediato, o seu amigo (…), bem como outros elementos do grupo de ciclistas, dirigido para junto do motociclista, que ficou caído no solo, sendo percetível estar mal do pé esquerdo, tendo alguém ligado para o 112.
No seu depoimento, a testemunha (…) confirmou que era notório que o pé do motociclista estava muito maltratado, pois via-se sangue a escorrer para fora do calçado e este não conseguia apoiar o pé no chão, relatando ainda ter sido ele próprio a chamar o 112 e que só saiu do local do acidente após a família do acidentado vir recolher o motociclo.
Com o embate ocorrido, sofreu o ofendido (...) as lesões descritas no facto provado 9), com amputação traumática da 2ª falange do dedo 5 do pé esquerdo, úlcera traumática do dorso do pé esquerdo, lesões essas que determinaram 180 (cento e oitenta) dias de doença, sendo 120 (cento e vinte) dias de afetação para o trabalho em geral e 180 (cento e oitenta) dias de afetação para o trabalho profissional, tudo conforme relatório de perícia do dano corporal (fls 181 a 184) e que o lesado confirmou em sede de inquirição na audiência de discussão e julgamento.
O facto provado 10) resulta das regras da experiência comum e do normal acontecer, pois a um indivíduo médio, colocado na posição do arguido, antes de efetuar manobra de mudança de direção, cumpre-lhe garantir que de tal manobra não resulta perigo para os restantes utentes da via; bem como das regras do Código da Estrada, que o arguido, como condutor, conhece e está obrigado a respeitar, sendo capaz de o fazer.
Os factos provados 15), 16) e 17) resultaram dos depoimentos das testemunhas (…), que relataram que o arguido imobilizou a viatura após o embate e que só após ter o motociclista tombado, retomou o arguido a marcha do seu veículo; o que foi devidamente conjugado com as regras da experiência comum e do normal acontecer, pois uma pessoa média, colocada na posição do arguido, não pode ter deixado de representar a eventualidade de, após uma colisão com um ciclomotor, em que este fica a ziguezaguear (acabando por, uns metros à frente, tombar no solo), necessitar o acidentado de assistência e socorro, bem sabendo que tal conduta é proibida e punida por lei, mas ainda assim aceitando e conformando-se com a decisão que tomou.
Por outras palavras, com os dados que tinha, não podia, ainda assim, o arguido ter deixado de representar um quadro lesivo, mas conformou-se, abandonando o local sem se certificar se o acidentado necessitava do seu socorro.
Não pode, pois, deixar de se concluir que o arguido agiu internamente da forma como o revelou externamente e foi o mesmo quem, conformado, decidiu efetuar tais condutas.
Os factos provados 18) a 20), relativos às condições de vida do arguido, resultaram de declarações do próprio arguido que, neste segmento factual, mereceram acolhimento do Tribunal.
O facto provado 21, relativo aos antecedentes criminais do arguido, deu-se como provado com recurso ao Certificado de Registo Criminal daquele, junto a fls 232 e 233 dos autos.
Factos não provados:
O facto não provado a) decorreu do depoimento da testemunha (...), proprietário do ciclomotor, que indicou que a matricula do mesmo é (...), e não (…), concatenado com o auto de notícia de fls 2 a 4, e com a participação de acidente, de fls 5 a 8, onde efetivamente consta a matrícula indicada pelo ofendido em sede de audiência de discussão e julgamento.
Quanto ao facto não provado b) resulta o mesmo de nenhuma prova se ter produzido quanto a uma eventual intenção do arguido pretender, com a mudança de direção, estacionar na Rua do (…).
A factualidade descrita em c) foi considerada pelo Tribunal como não provada, em virtude de não se ter produzido prova de que o arguido se tivesse efetivamente apercebido do estado em que ficara o sinistrado, sendo apenas certo que se apercebeu do embate e da circunstância do ofendido ter ficado a ziguezaguear na mota, perdendo o equilíbrio.
Ao abandonar o local do sinistro sem se inteirar se o acidentado necessitava de socorro, fê-lo, representando essa eventualidade, mas já não pode este Tribunal, para além de uma dúvida razoável, afirmar que o fez com a intenção consciente e deliberada de se eximir às suas responsabilidades
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2.4. Motivação de Direito
2.4.1. Enquadramento jurídico-penal
Vem o arguido acusado da prática, em autoria material, e na forma consumada, de:
2.4.1.1. uma contraordenação causal do acidente, p.p. pelo artº 35º nº 1 e 2, 44º, 145º n.º 1 alínea f) e 139º do Código da Estrada e, em concurso efetivo, da prática de um crime de omissão de auxilio p.p. pelos artv 200º, nº2 e art. 69º, nº l, alínea b) do Código Penal e de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p.p. pelos artº 148º, nº 1 e 15º, ambos do Código Penal.
Importa efetuar o enquadramento jurídico e aferir se o arguido efetivamente praticou a contraordenação e crimes imputados e se deverá pelos mesmos ser condenado.
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(…)
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Do crime de omissão de auxílio:
Vem o arguido acusado da prática de um crime de omissão de auxílio p.p. pelos artº 200º, nº 2 do Código Penal.
Prescreve o artigo 200.º que:
1 - Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por ação pessoal, seja promovendo o socorro, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.
2 - Se a situação referida no número anterior tiver sido criada por aquele que omite o auxílio devido, o omitente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
3 - A omissão de auxílio não é punível quando se verificar grave risco para a vida ou integridade física do omitente ou quando, por outro motivo relevante, o auxílio lhe não for exigível.
O crime de omissão de auxílio previsto no artº 200º é um crime omissivo, cujo núcleo do tipo é a inatividade do agente, em contrariedade com o dever jurídico de fazer.
Trata-se de um crime omissivo próprio, porquanto de mera atividade, contrariamente ao que sucede com os crimes omissivos impróprios, também designados comissivos por omissão, que são crimes de resultado e aos quais se refere diretamente o artº 10º do Código Penal, preceito que impõe o dever de evitar um resultado, enquanto que o artº 200º impõe, tão só, o dever de auxiliar.
Conforme Paulo Pinto de Albuquerque, em "Comentário do Código Penal", 3.ª edição, UC, pág. 782, os bens jurídicos protegidos pelo tipo incriminador são a vida, a integridade física e a liberdade de outra pessoa.
A solidariedade humana justifica a imposição de um dever geral de auxílio a todos aqueles que não estejam já vinculados por um particular dever de garante (artigo 10.º, n.º 2 do Código Penal) e não ocorrendo o dever de garante, deve funcionar o dever geral de auxílio.
O fundamento legitimador do dever geral de auxílio, consagrado no artv 200º do Código Penal
é, assim, a solidariedade humana que deve vincular todo e qualquer membro da sociedade.
O crime de omissão de auxílio do artº 200º do Código Penal é então cometido sempre que alguém omite o dever de solidariedade social de prestação de auxílio, quando este se revele necessário ao afastamento de um perigo de ofensa da vida, da saúde, da integridade física, ou da liberdade de outrem, numa situação de grave necessidade dessa prestação resultante, nomeadamente de desastre, acidente, calamidade pública, ou situação de perigo comum.
Como se escreve no Acórdão do STJ de 5/12/96, in BMJ 462, págs. 178 e ss., cujo entendimento por inteiro sufragamos, "a expressão «grave necessidade» não respeita à gravidade das consequências do acidente, calamidade, etc., mas às condições anormais em que surge a violação dos bens eminentemente pessoais do ofendido, e o conceito de «afastamento do perigo» que se encontra na base do mencionado dever de solidariedade social engloba também, e necessariamente, as situações em que a violação de qualquer daqueles bens eminentemente pessoais de outrem já foi ejetivada, mesmo que de forma irremediável, mas cuja extensão ou possíveis futuras consequências se não tornem percetíveis a quem se depare com a situação em causa".
Também no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 18/10/2000, in CJ, Ano XXV, Tomo IV, pág. 58 e ss., se refere, a propósito de tal ilícito criminal: "(…) Trata-se, pois, de um crime de omissão pura e de perigo, porquanto o seu elemento material se basta com a omissão ou falta de cumprimento do dever de prestação de auxílio, independentemente da verificação de qualquer resultado, isto é, quer os bens jurídicos ameaçados (vida, integridade física e liberdade) venham ou não a ser efetivamente atingidos ou venha ou não a ser agravada a situação de perigo que sobre eles impende por efeito da conduta omissivo".
O nº 2 do artº 200º do CP prevê um crime de omissão de auxílio qualificado pela circunstância da situação de perigo descrita no nº 1 ter sido criada pelo omitente do auxílio.
Nas palavras de Taipa de Carvalho "(…) está-se diante de um crime especifico impróprio. É a
circunstância da ingerência, ou seja, o facto de ter sido o próprio omitente a ter causado (anteriormente) a situação de perigo o que fundamenta um dever especial (potenciado) de auxílio e, consequentemente, a cominação de uma pena mais grave para a sua violação"- vide "Comentário Conimbricense do Código Penal", Parte Especial, Tomo I, pág. 851.
Assim também, conforme entendimento de Figueiredo Dias, nestas circunstâncias em que o agente cria ilicitamente, com dolo ou negligência, uma situação de perigo, tem este o dever de garante resultante da ingerência, previsto no artigo 10.º, n.º 2 do Código Penal.
Descendo ao caso concreto:
Resultou provado que na execução da manobra de mudança de direção, o arguido não a realizou de forma rápida e segura, de modo a se certificar primeiro que não se aproximavam veículos a circular em sentido contrário ao seguido pelo arguido, vindo o veículo do arguido a embater na lateral esquerda do motociclo de matrícula (...), em plena via de trânsito deste.
Resultou ainda provado que, não obstante o embate no ofendido, o arguido abandonou o local,
não prestando qualquer auxílio a (...), o qual ficou caído no solo, com grave lesão do pé esquerdo, tendo sido socorrido por outros condutores que circulavam no local.
Resulta igualmente do acervo factual que, ao fugir, o arguido ignorou em que estado de saúde ficara o condutor do motociclo, não lhe prestando qualquer socorro, nem promovendo a prestação de socorro por terceiro, o que fez consciente e voluntariamente.
O arguido omitiu o dever de solidariedade social de prestação de auxílio que se revelava, in casu, necessário ao afastamento de um perigo de ofensa à integridade física de outrem - o lesado (...) -, numa situação de grave necessidade dessa prestação, resultante de acidente por si provocado.
Agiu a título de dolo eventual (artigo 13.º e 14.º, n.º 3 do Código Penal), pois conhecendo a situação de perigo provocada pelo acidente, criada por ele próprio, conscientemente assumiu o comportamento omissivo, aceitando, conformando-se ou mostrando-se indiferente perante a perigosidade ou situação perigosa, mostrando-se irrelevante a finalidade que quis prosseguir com a abstenção de socorro.
Face a esta factualidade, dúvidas não restam de que o arguido se constituiu na autoria material do crime de omissão de auxílio na sua forma agravada, configurados que se mostram os seus elementos essenciais.
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(…)
Pelo exposto e porque inexiste causa que exclua a ilicitude ou dirima a sua responsabilidade, praticou o arguido, com negligência consciente ou grosseira, pois tendo provocado o acidente representou a possibilidade das suas consequências, um crime de ofensas à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148º, n.º 1 do Código Penal, em concurso efetivo com o crime de omissão de auxílio, p. p. pelo artv 200º, nº 1 e do CP (artº 30º, nº 1 do CP) - cfr., neste sentido, Paula Ribeiro de Faria, in ob. cit., anotação 26.ª ao artigo 148.º, pág. 273 e, na jurisprudência, Acórdão do STJ, de 07/03/90, in BMJ 395; 237 e ss.
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(…)
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2.4.2. Das consequências jurídico-penais do crime
2.4.2.1. Da escolha da pena
Na escolha da pena, determina o legislador que se tome em consideração as finalidades da punição, ou seja, a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, conforme plasmado no artigo 40º, nº 1 do Código Penal, sendo que a pena não pode ultrapassar a medida concreta da culpa, dr. dispõe o nº 2 do referido preceito legal.
A pena deve garantir a dissuasão do cometimento de crimes e a tutela das expectativas da comunidade na reposição da norma violada (prevenção geral) e, bem assim, a socialização e a reintegração do delinquente na sociedade (prevenção especial), configurando o ordenamento jurídico uma missão ressocializadora da pena, a qual afasta quaisquer finalidades de compensação de culpa ou expiação.
No que concerne ao critério de escolha da pena, estabelece o artigo 70º do Código Penal que "se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dará preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição".
A disposição legal referida expressa uma das ideias fundamentais subjacentes ao sistema punitivo do nosso Código Penal, isto é, uma reação contra as penas institucionalizadas ou detentivas, por sua própria natureza lesivas do sentido ressocializador que deve presidir à execução das reações penais (Robalo Cordeiro, "Escolha e Medida da Pena", Jornadas de Direito Criminal, Revisão do Código Penal, vol. II, CEJ, 1998, pág. 238).
O crime de ofensa à integridade física por negligência é punido, nos termos do artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal, com pena de prisão até 1 anos ou com pena de multa até 120 dias.
Quanto ao crime de omissão de auxílio, é o mesmo punido, nos termos do artigo 200.º, n.º 2 do Código Penal, com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
Nos presentes autos, as exigências de prevenção geral são elevadas, atentos os bens jurídicos protegidos: a integridade física e a solidariedade humanas, bem como atendendo ao número de crimes da mesma natureza praticados e ao flagelo nacional resultante da elevada taxa de sinistralidade rodoviária.
As necessidades de prevenção especial do arguido são baixas, pois este regista apenas uma condenação, por crime de natureza diversa, e encontra-se familiar, profissional e socialmente inserido.
Perante a apreciação global da factualidade dada como provada nos presentes autos, conclui-se que a aplicação ao arguido de, em ambos os casos, penas de multa, realizará de forma adequada os fins das penas, porquanto tal decisão oferece um nível satisfatório de estabilização das expectativas da comunidade na validade e vigência da norma infringida, bem como interiorização pelo arguido da ideia de que não deve, nem pode, voltar a delinquir.
A opção por penas de multa consubstancia, pois, a solução mais correta à luz das exigências de prevenção que o caso requer.
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2.4.2.2. Pena Acessória de Proibição de Conduzir Veículos Motorizados:
Dispõe o artigo 69.º, n.º 1, al. b) do Código Penal, sob a epígrafe "Proibição de conduzir veículos com motor", que "é condenado na proibição de conduzir veículos com motor por um período fixado entre três meses e três anos quem for punido por crime cometido com utilização de veículo e cuja execução tiver sido por este facilitada de forma relevante".
Tal proibição, preceitua o n.º 2 deste normativo, "produz efeito a partir do trânsito em julgado da decisão e pode abranger a condução de veículos com motor de qualquer categoria".
Determina o n.º 3 que, "no prazo de 10 dias a contar do trânsito em julgado da sentença, o condenado entrega na secretaria do tribunal, ou em qualquer posto policial, que remete àquela, o título de condução, se o mesmo não se encontrar já apreendido no processo. (…)".
Sendo consequência jurídica do crime, aplicável em cumulação com a pena principal, a pena acessória é dotada de autonomia, dependendo a sua aplicação:
i) da alegação e prova de pressupostos autónomos, relacionados com a prática do crime;
ii) da valoração dos critérios gerais de determinação da pena, incluindo a culpa;
iii) da graduação no âmbito da moldura autónoma fixada na lei.
A ratio de tal norma, será a de, ao interditar a condução de veículos a motor por banda do agente, lhe proporcionar, enquanto condutor, um "impulso para a consciencialização" de uma condução responsável- "Código Penal- Parte Geral e Especial", Miguel Garcia e Castela Rio, 2018, 3.ª Ed. Anotada, pág. 414.
A não desconformidade da pena acessória de proibição de conduzir com a Lei Fundamental, nomeadamente com o seu artigo 30º, nº 4, que estatui que "nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos", tem sido repetidamente afirmada pelo Tribunal constitucional com base no entendimento de que a lei não prevê a proibição como um mero efeito necessário e automático da aplicação de uma pena mas sim como uma verdadeira pena, ainda que de natureza acessória, que o tribunal gradua dentro de determinados limites mínimo e máximo, em função da culpa do agente - dr, entre outros, Ac TC 53/97 de 23.01.1997 (BMJ 463/172), relativamente ao artigo 12º do DL 124/90 de 14 de abril e Ac TC 440/02 (DR II de 29.11.2002).
Nada obsta, pois, à aplicação da pena acessória ao crime de ofensa à integridade física negligente cometido através de violação das regras do trânsito rodoviário, sendo certo que a moldura legal fixada entre três meses e três anos no art. 69º do Código Penal permite adequar devidamente a pena à culpa do agente pelo facto concreto, de acordo com a maior ou menor gravidade do resultado danoso da conduta estradal ilícita.
Sendo a proibição de conduzir necessariamente imposta sempre que o agente venha a ser condenado por algum dos crimes previstos no art. 69º do Código Penal, independentemente da verificação de qualquer pressuposto material, o tribunal não pode deixar de aplicar a pena acessória de proibição de conduzir.
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2.4.2.2. Da medida das penas principais e da pena acessória
O artigo 71º, nº 1 do Código Penal prescreve que na determinação da pena deve atender-se à culpa concreta do agente, fundamento da pena, não se podendo perder de vista as funções de prevenção geral e especial.
Na prevenção geral utiliza-se a pena para dissuadir a prática de crimes pelos cidadãos - prevenção geral negativa - e para incentivar a convicção na sociedade, de que as normas penais são válidas, eficazes e devem ser cumpridas, servindo assim a pena para aprofundar a consciência dos valores jurídicos por parte dos cidadãos - prevenção geral positiva.
Na prevenção especial, a pena é utilizada no intuito de dissuadir o próprio delinquente de praticar novos crimes e com o fim de auxiliar a sua reintegração na sociedade.
Dispõe o nº 2 do artigo 71º do Código Penal que na determinação da medida concreta da pena deve ainda o Tribunal atender "a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele, nomeadamente:
a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente.
b) A intensidade do dolo ou da negligência
c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram.
d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica.
e) A conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime
f) A falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, quando essa falta deva ser censurada através da aplicação da pena."
Ao crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal corresponde uma pena de multa de máximo equivalente a 120 dias, sendo o limite mínimo de 10 dias - artigo 47º, nº 1 do Código Penal.
Ao crime de omissão de auxílio, previsto e punido pelo artigo 200.º, nº 1 e 2, do Código Penal, corresponde uma pena de multa de máximo equivalente a 240 dias de multa, sendo o limite mínimo de 10 dias - artigo 47º, nº 1 do Código Penal.
Cumpre, pois, determinar as penas de multa concretas a aplicar, dentro da moldura abstrata situada, para o crime de ofensa à integridade física por negligência entre os 10 e os 120 dias, e para o crime de omissão de auxílio entre os 10 dias e os 240 dias de multa.
A favor do arguido, atendendo ao disposto no nº 2 do artigo 71º do Código Penal, abonam as seguintes circunstâncias:
- a sua inserção familiar, profissional e social.
- o dolo, eventual quanto ao crime de omissão de auxílio, e por negligência grosseira quanto ao crime de ofensa à integridade física negligente.
Contra o arguido, igualmente atendendo ao disposto no nº 2 do artigo 71º do Código Penal, desabonam as seguintes circunstâncias:
- O grau de ilicitude da conduta que se considera significativo: o desvalor da ação afigura-se relevante, ante a gravidade das lesões produzidas, que demandaram amputação traumática da 2ª falange de um dedo do pé do ofendido, bem como 180 (cento e oitenta) dias de doença, sendo 120 (cento e vinte) dias de afetação para o trabalho em geral e 180 (cento e oitenta) dias de afetação para o trabalho profissional, sendo certo que, ao ter o omitente criado a situação de perigo, se revestiu de um dever de garante que não respeitou.
- A circunstância de registar anterior condenação, embora por crime de natureza diversa, sendo certo que se encontrava, à data da prática dos factos, em período de suspensão, na sua execução, da pena de prisão aí aplicada.
Tudo conjugado, entende-se ser justo, adequado e proporcional aplicar ao arguido:
- pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal, uma pena de multa de 100 dias.
- pela prática de um crime de omissão de auxílio, previsto e punido pelo disposto no artigo 200.º, n.º 1 e 2, do Código Penal, uma pena de multa de 150 dias.
Importa, ainda, fixar o quantitativo diário da multa, atendendo às condições económicas e financeiras do arguido e seus respetivos encargos. Tal quantitativo terá, necessariamente, de se fixar entre €5 e €500, conforme dispõe o artigo 47.º, n.º 2 CP.
É também pela fixação do quantitativo diário da multa que esta pena cumpre a sua função no quadro sancionatório. De tal modo que o montante da multa não poderá significar um sacrifício excessivo para o arguido (sob pena de se colocar em causa a própria legitimidade da multa enquanto pena), mas também não poderá fixar-se um montante irrisório ou que não represente qualquer sacrifício.
Com efeito, é também pela fixação do montante diário da multa que se conforma a multa como uma própria e verdadeira reação penal - ou por outras palavras, como uma verdadeira pena -, já que se o quantitativo diário fixado for irrisório ou irrelevante enquanto sacrifício para o condenado, a comunidade não poderá manter a crença de que, afinal, o crime não compensa.
Em face da factualidade provada, importa considerar que o arguido (...) trabalha como operário fabril, auferindo €l.054,00, e a cônjuge trabalha como médica dentista, auferindo, em média, €l.500,00.
Apresenta como despesas mensais mais significativas a mensalidade com a creche da filha mais
nova, que consigo reside, no valor de €300,00, pensão de alimentos de uma filha de 5 anos, que reside com a mãe, no valor de €100,00, e prestação para aquisição de viatura própria, no valor de €300,00.
Tendo ainda em atenção que o montante diário mínimo fixado na lei (€5,00) está reservado pelo legislador àquelas situações mais limite em termos de carência económica, situação que não ressalta dos factos provados muito embora de momento a situação económica descrita pelo arguido não lhe seja favorável, entende-se adequado fixar em €7,00 (sete euros) o montante diário da multa.
Consequentemente, será o arguido (...) condenado numa pena de multa de 100 dias, à taxa diária de €7,00, pela prática de um crime de ofensa à integridade física negligente e numa pena de multa de 150 dias pela prática de um crime de omissão de auxílio, igualmente à taxa de à taxa diária de €7,00.
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Para aplicação da pena acessória, haverá que analisar as especificidades do caso concreto, e ter em atenção que a culpa determina o limite inultrapassável da pena que poderá ser concretamente aplicada ao agente (artigo 40.º, n.º 2, do Código Penal).
Nas palavras do Prof. Eduardo Correia, in "Direito Criminal", I, pág. 313, "A culpa é a censura ético-jurídica dirigida a um sujeito por não ter agido de modo diverso e, assim, se traduz num juízo de valor", e "os elementos da culpa são a imputabilidade do agente, a sua atuação dolosa ou negligente e a inexistência de circunstâncias que tornem não exigível outro comportamento", ibidem, pág. 322.
Tudo ponderado, com base nas circunstâncias supra elencadas, relevando em especial que o crime de ofensa à integridade física foi praticado com negligência, na sua forma consciente ou grosseira, julga-se proporcional e adequada a aplicação ao arguido de uma sanção acessória de proibição de conduzir veículos a motor de qualquer categoria pelo período de cinco meses.
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2.4.2.3. Do cúmulo jurídico
O arguido vai ser condenado pela prática de dois crimes, em concurso efetivo, real e heterogéneo, o que impõe a condenação numa única pena, sendo que a punição do concurso de crimes no direito penal português se baseia no sistema de pena conjunta, obtida através de um cúmulo jurídico.
Nos termos do art. 77º, nº 1 do CP; o arguido será condenado numa pena única, sendo considerados em conjunto os factos e a personalidade do agente. Por sua vez, no nº 2 estipula-se que "a pena aplicável tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar os 25 anos, tratando-se de pena de prisão e 900 dias, tratando-se de pena de multa, e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes".
Com base nas penas concretamente aplicadas e supramencionadas, temos uma moldura abstrata do concurso de crimes em que o limite mínimo se encontra fixado em 150 dias de multa e o limite máximo em 250 dias de multa.
Realizada esta operação, importa ter em conta a globalidade do ilícito. Como refere Figueiredo Dias o que importa é "(…) a gravidade do ilícito em interligação com a personalidade do agente, de forma
a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto dos factos traduz uma personalidade propensa ao crime, ou é, a expressão de uma pluriocasionalidade, que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido (…) in "As Consequências Jurídicas do Crime".
No caso dos autos, importa anotar que estão em causa bens jurídicos que encontram similitude na proteção da integridade física, existindo contemporaneidade dos factos, os quais foram praticados nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, pois que o arguido com a sua conduta negligente provocou um acidente e concomitantemente ofensa na integridade física do lesado e, ao invés de o socorrer, responsabilidade que a lei lhe cometia, omitiu o auxílio que lhe era exigido, colocando-se em fuga.
Ao nível da personalidade do arguido, cabe referir que agiu com dolo eventual, no atinente ao crime de omissão de auxílio, e com negligência grosseira, relativamente ao crime de ofensa à integridade física por negligência.
O arguido apresenta antecedentes criminais, mas somente uma condenação e por crime de natureza diversa, pelo que não se evidenciam circunstâncias que revelam uma personalidade com uma especial propensão à adoção de condutas desviantes e não conformes ao Direito.
Ora, tudo considerado, atentos os critérios fixados nos artigos. 71º e 77º, nº 1 do Código Penal, face à moldura abstrata da pena única encontrada, entre os 150 dias e os 250 dias de multa, fixa-se a pena unitária em cúmulo jurídico em 230 dias de multa, à taxa diária de €7,00.
(…).»

2.3. Conhecimento do recurso
2.3.1. Do erro de subsunção da matéria factual provada ao crime de omissão de auxílio
Sustenta o recorrente que a matéria de facto dada como provada na sentença recorrida não integra o crime de omissão de auxílio, p. e p. pelo artigo 200º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, por não ser possível concluir, desde logo, pelo preenchimento de um dos elementos objetivos do tipo, qual seja a «grave necessidade» e, consequentemente, pugna pela sua absolvição da prática desse crime.
O Ministério Público pronuncia-se no sentido de que o arguido preencheu, nos seus elementos típicos objetivos e subjetivos, o crime de omissão de auxílio, tal como se decidiu na sentença recorrida.
Vejamos:
O crime de omissão de auxílio encontra-se previsto no artigo 200º do Código Penal, que dispõe:
«1. Quem, em caso de grave necessidade, nomeadamente provocada por desastre, acidente, calamidade pública ou situação de perigo comum, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa, deixar de lhe prestar o auxílio necessário ao afastamento do perigo, seja por acção pessoal, seja promovendo o socorro é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.
2. Se a situação referida no número anterior tiver sido criada por aquele que omite o auxílio devido, o omitente é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
3. A omissão de auxílio não é punível quando se verificar grave risco para a vida ou integridade física do omitente ou quando, por outro motivo relevante, o auxílio lhe não for exigível
Os bens jurídicos protegidos pelo crime de omissão de auxílio [estando o citado artigo 200º inserido no Livro II – Parte Especial –, Título I – Dos Crimes Contra as Pessoas –, Capítulo VIII – Dos crimes contra outros bens Jurídicos Pessoais –], de acordo com o entendimento que se perfilha, são a vida, a integridade física e a liberdade - abrangendo esta última a liberdade pessoal nas suas diversas expressões, de deslocação, de autodeterminação, sexual -, constituindo a solidariedade humana o fundamento legitimador do dever de geral de auxílio subjacente a esta incriminação, tendo em vista impedir a lesão de tais bens jurídicos pessoais[1].
O auxílio a terceiros, perante risco de morte, lesões corporais ou de perda de liberdade, deveria constituir um impulso natural em cada um de nós, permitindo, em contrapartida, que tenhamos a legítima expectativa de que terceiros tenham o mesmo comportamento.
No entanto, o legislador entendeu reforçar, através da tutela penal, este dever de auxílio de terceiros, nos casos de serem colocados em perigo os bens jurídicos mais relevantes, censurando aqueles que, postos perante esses mesmos perigos, demonstram uma total insensibilidade ao sofrimento dos outros, omitindo ações salvadores perfeitamente ao seu alcance.
Este dever alcança maior intensidade no caso de ser o próprio a provocar a situação de perigo, como se retira da moldura penal agravada, constante do n.º 2, do artigo em análise, dada a especial ligação do agente ao factualismo causador do perigo. É a situação de ingerência, ou seja, o facto de ter sido o próprio omitente do auxílio a ter causado a situação de perigo.
O crime em omissão de auxílio, é um crime de perigo concreto – pressupõe a existência efetiva de perigo para um dos bens jurídicos mencionados no tipo legal –; de omissão pura – traduz-se na omissão de uma conduta exigida pela lei, esgotando-se na própria inobservância da norma – e de mera atividade – sendo irrelevante para o preenchimento do tipo a verificação de um resultado lesivo –. Na sua forma qualificada, prevista no n.º 2 do artigo 200º do Código Penal, é um crime específico próprio – que só pode ter por agente o causador do perigo –.
São elementos do tipo objetivo do crime de omissão de auxílio qualificado, previsto no artigo 200º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, os seguintes:
- A existência de uma situação de grave necessidade, que ponha em perigo a vida, a integridade física ou a liberdade de outra pessoa;
- Que o agente deixe de prestar o auxílio necessário ao afastamento desse mesmo perigo, seja por ação pessoal ou através de solicitação de auxílio a terceiros;
- Que a situação de perigo seja criada pelo agente.
Relativamente à “grave necessidade”, o respetivo conceito, para efeito do tipo legal em análise, «significa e exige que se trate de um risco ou perigo iminente de lesão substancial (grave) dos referidos bens jurídicos» protegidos - a vida, a integridade física e a liberdade -. «Assim caem fora do âmbito deste tipo de crime as situações de perigo de lesão não iminente e as situações de perigo de leves lesões corporais ou da liberdade, (mesmo que iminentes)[2].
Nas palavras dos Cons. Simas Santos e Leal-Henriques[3]: «Por necessidade entende-se a precisão que a pessoa tem de afastar perigos, ou seja, a possibilidade de acontecimentos danosos susceptíveis de ameaçar bens jurídicos pessoais (vida, saúde, integridade física e liberdade) e a que, em princípio, não é capaz, de, por si só, pôr cobro.
Diz-se que há grave necessidade quando coexistam dados quantitativa e qualitativamente indicadores de que se está perante uma situação de suficiente dimensão: «consideráveis sinais exteriores facilmente percepcionáveis por qualquer pessoa» e «seriedade e premência do estado de necessidade», implicando «urgência de actuação, atentas as graves consequências que desse estado poderão advir para o necessitado.»
A «grave necessidade» pressupõe a incapacidade da vítima para, por si só, afastar o perigo iminente de lesão importante dos bens jurídicos – a vida, a integridade física ou a liberdade –, «revelada pela existência de sinais apreensíveis por qualquer pessoa, da necessidade urgente de atuação na prestação de auxílio[4]
Outro dos elementos do tipo objetivo é o de que o auxílio omitido se mostre “necessário” a afastar o perigo concreto.
Tal elemento pressupõe, como se refere no Acórdão do STJ de 10/05/2000[5], «que num juízo objetivo ex ante, o auxílio seja simultaneamente “indispensável” e “adequado” a afastar o perigo concreto considerado no tipo legal de crime.»
Como refere Paulo Pinto de Albuquerque[6] «O auxílio devido é o auxilio adequado (“necessário”) a afastar o perigo, quer seja por ação pessoal do omitente quer seja por ação de terceiro, cujo socorro é solicitado pelo omitente. O nexo de adequação é o reverso do nexo de imputação do resultado de perigo. Ambos se aferem numa perspetiva objetiva ex ante, de prognose póstuma (…). Portanto, está incluída a situação em que já se verificou uma lesão consumada da integridade física da vítima do acidente, mesmo que não haja perigo de vida da vítima, mas o omitente desconheça a extensão e possíveis consequências do acidente (…)
A conduta do agente deve ser avaliada de um ponto de vista objetivo, na articulação com a sua idoneidade e necessidade para afastar esse perigo, que tem de ser grave, implicando perigo de vida ou de grave lesão para a saúde ou a liberdade.
A circunstância de o auxílio poder ser prestado por outra(s) pessoa(s) que se encontre(m) no local da ocorrência, não afasta o especial ou especifico dever que recai sobre o agente, na situação prevista no n.º 2 do artigo 200º do CP, de prestação do auxílio[7].
Quanto ao elemento subjetivo, o crime de omissão de auxílio é de estrutura dolosa, exigindo-se para o seu preenchimento, o dolo, em qualquer das suas modalidades, bastando, para o efeito, que o agente conhecendo a situação de facto da qual deriva a necessidade de prestar auxílio, represente que a vítima corre risco de vida ou de lesão grave da sua saúde ou liberdade, e voluntariamente se abstenha de lhe prestar auxílio, conformando-se ou mostrando-se indiferente perante essa situação de perigo[8].
Assim e citando o que escreve Vanessa Filipa Leitão de Azevedo[9] «Existe dolo (eventual) sempre e quando o omitente conheça a situação típica, seja capaz de realizar os actos que se revelam necessários ao afastamento do perigo para o bem jurídico e, mesmo assim, se abstenha de actuar, conformando-se com a manutenção da situação de necessidade e perigo, como consequência possível da sua conduta. O elemento volitivo do dolo traduz-se, aqui, na conformação do agente com a possível imutabilidade da situação de perigo para os bens jurídicos pessoais da vítima e há-de induzir-se do seu comportamento face à factualidade típica. (…).
Por fim, o dolo eventual poderá configurar a conduta do agente que, tendo assistido a um facto como os descritos no artigo 200.º, máxime, se foi por ele provocado e, representando-se como possível a existência de uma pessoa na situação de grave necessidade, não cura de se certificar da real existência da vítima, permanecendo inactivo, conformando-se com a manutenção da possível situação de perigo.»
Tendo presentes as considerações que se deixam expendidas, baixando ao caso dos autos e revertendo à questão suscitada no recurso:
Encontra-se provado que o arguido/recorrente, nas circunstâncias de tempo e lugar apuradas, conduzindo o seu veículo automóvel ligeiro de passageiros, ao efetuar a manobra de mudança de direção à esquerda, ocupou a faixa de trânsito de sentido contrário àquele em que seguia e onde, na ocasião, circulava o motociclo conduzido por (...), tendo o veículo do arguido embatido na lateral esquerda do motociclo e dessa colisão resultado a queda do motociclo e do seu condutor, o qual ficou caído no solo e tendo sofrido, como consequência direta e necessária do embate, traumatismo do D5 do pé esquerdo, com amputação traumática da 2ª falange e úlcera traumática do dorso desse mesmo pé, lesões essa que lhe determinaram 180 dias de doença, com afetação para o trabalho profissional e 120 dos quais com afetação para o trabalho em geral.
Neste quadro factual, entendemos que, contrariamente ao que defende o recorrente, a descrita situação, configura uma situação de “grave necessidade”, que integra o elemento do tipo objetivo do crime de omissão de auxílio, tal como se concluiu na sentença recorrida.
Com efeito, o embate do veículo conduzido pelo arguido, na lateral do motociclo tripulado pelo ofendido, tendo provocado a queda deste e ficando o ofendido caído no solo, criou um concreto perigo de lesão grave da integridade física do mesmo, tendo o ofendido sofrido traumatismo do pé esquerdo, com amputação traumática da 2ª falange, exigindo socorro médico imediato, o que era apreensível, por qualquer pessoa, colocada perante a situação.
A circunstância de não ter resultado provado que o ofendido correu perigo de vida e de as lesões que sofreu não se integrarem na previsão do artigo 144º do Código Penal – ofensa à integridade física grave –, não afasta, contrariamente ao que preconiza o recorrente, a verificação da «grave necessidade», estando-se perante um crime de perigo concreto, que abrange também o perigo de grave lesão da integridade física, não se exigindo, para o preenchimento do tipo, que esse resultado venha efetivamente a ocorrer. Em conformidade com o que supra se referiu, bastará que se configure um quadro factual, donde resulte a perceção, para qualquer pessoa, de que o ofendido necessita de ser de imediato socorrido, por serem previsíveis, face aos sinais exteriores evidenciados, que venham a existir consequências graves para o ofendido, designadamente, lesão substancial ou grave, da integridade física, o que, se verifica, no caso vertente.
Mostra-se, assim, verificada a situação de grave necessidade e a existência de perigo concreto para a integridade física do ofendido, decorrente do embate/acidente causado pelo arguido, ora recorrente.
E tendo o arguido, apesar de estar consciente do tinha acontecido, ou seja, de que embateu com o seu veículo no motociclo conduzido pelo ofendido, prosseguido a marcha, abandonando o local, pondo-se em fuga, agindo voluntariamente, sem querer saber do estado em que ficou o ofendido, não lhe prestando qualquer socorro, nem promovendo a prestação de socorro por outrem, apesar de ter admitido que o sinistrado ficaria num estado em que careceria de socorro, para debelar os ferimentos de que pudesse padecer, com o que se conformou, sabendo o arguido que essa sua conduta era proibida e punida por lei, encontram-se também preenchidos os elementos subjetivos do crime de omissão de auxílio, tendo o arguido agido com dolo eventual.
Conclui-se, pois, que o arguido preencheu, com a sua conduta omissiva, todos os requisitos objetivos e subjetivos do crime de omissão de auxílio pelo artigo 200º, nºs. 1 e 2, do Código Penal, por que foi condenado em 1ª instância, pelo que, se mantém essa condenação.

2.3.2. Da medida da pena acessória
Pugna a recorrente para que a medida da pena acessória de proibição de conduzir veículos que lhe foi aplicada em 1ª instância, pela prática do crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo artigo 148º, n.º 1, do Código Penal, fixada em 5 (cinco) meses, seja reduzida para o limite mínimo de 3 (três) meses.
Para fundamentar a sua pretensão aduz o recorrente que é premente a sua necessidade da carta de condução, na sua situação profissional e familiar, tendo um filho recém-nascido e tendo de se deslocar para ir buscar e a sua filha, menor, fruto de outro relacionamento, para passar consigo os fins de semana.
O Ministério Público defende a manutenção da medida concreta da pena acessória aplicada.
Vejamos:
A pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, abstratamente aplicável, tem como limite mínimo três meses e como limite máximo 3 anos (cf. artigo 69º, n.º 1, al. a), do C. Penal).
Á aplicação de uma pena acessória, tal como como acontece em relação à pena principal, subjaz um juízo de censura global pelo crime praticado, daí que para a determinação da medida concreta de uma e outra se imponha o recurso aos critérios estabelecidos no art.º 71º do Código Penal. Consequentemente, na graduação da pena acessória o Tribunal deve atender à culpa do agente e às exigências de prevenção, bem como a todas as circunstâncias que depuserem a favor ou contra este.
A prevenção geral, a acautelar, com a aplicação da pena acessória de que se trata, terá de ser uma prevenção negativa ou de intimidação.
Como refere o Prof. Figueiredo Dias a pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor visa prevenir a perigosidade do agente. Trata-se de uma censura adicional pelo facto que ele praticou (cf. Ata n.º 8 da Comissão de Revisão do Código Penal).
Corresponde a uma necessidade de política criminal, que se prendem com a elevada taxa de sinistralidade rodoviária que se regista em Portugal.
Revertendo ao caso dos autos, na graduação da medida concreta da pena acessória, importa considerar os fatores que foram ponderados na determinação da pena principal de multa, designadamente:
- O grau de ilicitude dos factos, que se revela medianamente acentuado, tendo, em conta, designadamente, a grave violação das regras da circulação rodoviária e a manifesta falta de cuidado do arguido na realização da manobra de mudança de direção que efetuou e que foi causal do embate no motociclo conduzido pelo ofendido e a gravidade das lesões que, em consequência, do embate o ofendido sofreu, no pé esquerdo, com amputação traumática da 2ª falange, que lhe determinaram 180 dias de doença com afetação para o trabalho profissional, dos quais 120 dias também com afetação para o trabalho em geral;
- A negligência com que atuou, que reveste a modalidade de negligência inconsciente, na medida em que o arguido não se certificou que não se aproximavam veículos em sentido contrário e, nessa situação, é de afastar que tivesse representado, como podia e devia, a possibilidade da ocorrência do embate no motociclo conduzido pelo ofendido, sendo o grau de culpa do arguido/recorrente mediano;
- As exigências de prevenção geral e especial que no caso se evidenciam, sendo as primeiras elevadas, face aos elevados índices de sinistralidade que se registam nas estradas portuguesas, com as consequências terríveis daí decorrentes, em termos de perda de vidas humanas e de sequelas com que ficam muitos dos sinistrados sobreviventes, com os elevados custos sociais e económicos que acarretam; e mostrando-se as de prevenção especial, à partida, moderadas, registando o arguido, que tem 33 anos de idade, uma condenação pela prática de crime de furto, de natureza totalmente distinta, portanto, daquele que está em causa nos autos e mostrando-se inserido familiar, profissional e, ao que tudo indica, também socialmente.
A circunstância do arguido necessitar de conduzir veículo automóvel para se deslocar, nos seus afazeres profissionais e familiares e inerente sacrifício que resulta para a sua vida, nesses domínios, da proibição de conduzir veículos que lhe é imposta, não constitui circunstância que deva ser atendida na determinação da medida concreta dessa pena acessória.
Sopesando todos os fatores que se deixam enunciados, entendemos que a medida concreta da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, fixada em 5 (cinco) meses, não se mostra desproporcional, nem excede a culpa do arguido/recorrente e, se peca é por defeito, pelo que, se decide mantê-la.
Improcede, pois, também este segmento do recurso.

3. DECISÃO
Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e, em consequência, confirmar, na íntegra, a sentença recorrida.


Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça, em 3 (três) UC´s (cfr. artigo 513º, n.º 1, do CPP e artigo 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

Notifique.

Évora, 13 de abril de 2021
Fátima Bernardes Fernando Pina
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[1] Neste sentido, cfr., entre outros, na doutrina, Américo Taipa de Carvalho, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, páginas 846 e 848 e Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, à luz da Constituição da República …, 3ª edição atualizada, 2015, Universidade Católica Editora, pág. 782 e, na jurisprudência, vide, entre outros, Ac. da RP de 18/05/2005, in CJ, Ano XXX, 2005, tomo III, pág. 203 e Ac. da RC de 05/04/2017, in CJ, Ano XLII, 2017, tomo II, pág. 47.
[2] Américo Taipa de Carvalho, in ob. cit., pág. 849.
[3] In Código Penal Anotado, Vol. III, 4ª edição, 2016, Rei dos Livros, pág. 722, citando Leonor Assunção, in Contributo para a interpretação do art. 219º do Cód. Penal – “O Crime de Omissão de Auxílio”, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Studia Jurídica, 6, pág. 67.
[4] Cfr. citado Ac. da RC de 05/04/2017.
[5] Cujo sumário se encontra acessível, in Boletim de Sumários do STJ, 2000, pág. 41.
[6] In ob. cit., pág. 782, citando o já referido Ac. do STJ de 10/05/2000, Miguez Garcia e Castela Rio, in Código Penal Anotado, 2014, Almedina, pág. 816 e ainda o Ac. do STJ de 05/12/1996, in BMJ, 462, pág. 170.
[7] Neste sentido, cfr., na doutrina, Paulo Pinto de Albuquerque, in ob. cit., págs. 782 e 783 e na jurisprudência, vide, entre outros, Ac. da RC de 02/11/2011, in CJ, Ano XXXVI, 2011, tomo V, pág. 314.
[8] Neste sentido, cfr. Américo Taipa de Carvalho in ob. cit., pág. 853 e [9] In “O Crime de Omissão de Auxílio no Direito Penal Português – O artigo 200.º do Código Penal”, Dissertação de Mestrado, FDUL, Lisboa 2015, pág. 64, acessível in https://repositorio.ul.pt › ulfd133599_tese