Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
5182/21.5T8STB-B-E1
Relator: ANA MARGARIDA LEITE
Descritores: DIVISÃO DE COISA COMUM
RECONVENÇÃO
REQUISITOS
CONEXÃO
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: MAIORIA COM * DEC VOT E * VOT VENC
Texto Integral: S
Sumário: I – A admissibilidade da reconvenção depende da verificação de algum dos requisitos de natureza substancial elencados no n.º 2 do artigo 266.º e da não verificação do requisito negativo previsto no n.º 3 do preceito, salvo se o juiz a autorizar, nos termos previstos no artigo 37.º, n.ºs 2 e 3, todos do CPC;
II – A enumeração dos requisitos de conexão do pedido reconvencional com o pedido formulado na ação é taxativa, do que decorre que a verificação de um dos elementos elencados no n.º 2 do artigo 266.º constitui condição necessária à admissibilidade da reconvenção;
III – A falta de algum dos elementos de conexão objetiva elencados no n.º 2 do artigo 266.º impede a admissibilidade da reconvenção, o que torna inútil a apreciação da questão da eventual compatibilidade processual entre o pedido reconvencional e o pedido do autor.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 5182/21.5T8STB-B-E1
Juízo Local Cível ...
Tribunal Judicial da Comarca ...


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

1. Relatório

AA intentou ação de divisão de coisa comum, com processo especial, contra BB, alegando que autor e ré são comproprietários da fração autónoma que identifica, na proporção de metade cada um, que o imóvel é indivisível em substância e que não pretende permanecer na indivisão; acrescenta que, para aquisição do imóvel, autor e ré contraíram um empréstimo junto da instituição bancária que identifica, encontrando-se o imóvel hipotecado a favor desse banco para garantia do cumprimento do contrato celebrado; pede se declare a indivisibilidade do bem imóvel comum e se determine a sua adjudicação ou a venda, com repartição do respetivo valor.
Citada, a ré contestou, defendendo-se por exceção – invocando a ineptidão da petição inicial e a ilegitimidade passiva – e por impugnação, quanto ao valor atribuído pelo autor ao imóvel; aceitando a compropriedade e a indivisibilidade do bem imóvel, deduziu reconvenção, visando obter o reconhecimento de um crédito correspondente a metade das quantias que alega ter suportado com encargos respeitantes à coisa comum – relativos a prestações do contrato de mútuo hipotecário e seguros associados a tal contrato, IMI e despesas com condomínio –, montante que pretende seja «levado em linha de conta, a título de compensação, na constituição dos quinhões das partes», como tudo melhor consta do articulado apresentado, no qual formula o pedido seguinte:
d) Ser julgada procedente por provada o Pedido Reconvencional deduzido pela R. e, por sua via:
e) Ser reconhecido à R. um crédito no montante de € 42.752,55 (quarenta e dois mil e setecentos e cinquenta e dois euros, cinquenta e cinco cêntimos), respeitante a 50% o por si exclusivamente assumidas com a fracção dos autos (e, como tal, valor que deveria ter sido assumido também pelo A.), montante esse que deverá ser levado em linha de conta, a título de compensação, na constituição dos quinhões das partes, caso os presentes autos mereçam provimento.
f) Ser reconhecido à Ré um crédito correspondente a 50% respeitante às prestações, seguros e outros suportados em exclusivo pela Ré desde 2012 e que venha a suportar com a administração / manutenção do imóvel dos autos (designada, mas não exclusivamente, prestações e encargos bancários), que se vencerem entre a apresentação da presente Reconvenção e a divisão do imóvel dos autos, caso os presentes autos mereçam provimento.
O autor apresentou articulado no qual, além do mais, se defendeu da reconvenção por impugnação.
Por despacho de 24-03-2023, foram consideradas não verificadas as exceções invocadas na contestação e foi rejeitada a reconvenção, após o que se declarou a indivisibilidade em substância do prédio e se fixou as quotas dos comproprietários em ½ para cada um, tendo-se determinado o prosseguimento dos autos para a fase de venda do imóvel.
Extrai-se do aludido despacho que a rejeição da reconvenção se baseou na fundamentação seguinte:
Admissibilidade da Reconvenção
Vem a Ré alegar que procedeu ao pagamento das prestações e demais encargos com o financiamento da fracção autónoma.
Ainda que o Autor, desde Outubro de 2012 que abandonou o lar, e não mais contribuiu com qualquer despesa, inclusive IMI, prémios de seguro e ou condomínio.
Alega que pagou em exclusivo desde Outubro de 2012 até á presente data as prestações mensais e sucessivas, ou seja cerca de 114 prestações mensais, perfazendo o valor global de € 39.900,00.
Bem como que o Autor tão só liquidou duas prestações mensais, desde a aquisição e constituição do credito, sendo que foi igualmente a mãe da Ré que emprestou as quantias necessárias referente ás despesas de escritura, registo, etc., não conseguindo ora precisar o montante.
Assim, conclui que deverá ser reconhecido à Ré um crédito no montante de € 42.752,55, respeitante a 50% das despesas por si exclusivamente assumidas com a fracção dos autos, montante esse que deverá ser levado em linha de conta, a título de compensação, na constituição dos quinhões das partes, caso os presentes autos mereçam provimento.
Considerando a forma de processo especial em causa, a admissibilidade da reconvenção tem de ser apreciada em dois níveis.
Em primeiro lugar, há que ponderar se o pedido reconvencional concreto é admissível nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 266.º do Código de Processo Civil. Na afirmativa, haverá que ponderar se, em função da admissibilidade abstrata do pedido reconvencional, a circunstância de seguir forma processual distinta não obsta à sua admissibilidade.
Concluindo-se que i) é admissível e que ii) há vantagens para a justa composição da causa que os pedidos sejam conhecidos num só processo, cabe ao juiz, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 266.º e no n.º 3 do artigo 926.º do Código de Processo Civil, remeter os autos para a forma comum (neste sentido, cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, “Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas”, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 94-98).
No caso vertente, verifica-se que as partes não divergem quanto ao essencial da divisão de coisa comum: concordam na compropriedade, concordam nas respetivas quotas-partes, concordam na indivisibilidade do prédio e concordam em pôr termo à referida compropriedade.
Relativamente ao pedido reconvencional concretamente formulado nos autos, está em causa um eventual direito de crédito da Ré sobre o Autor, respeitante ao pagamento das prestações bancárias e seguros associados ao mútuo contraído para aquisição do imóvel em causa nos autos, bem como despesas com condomínio e IMI.
Ora, se é certo que “os atuais princípios de gestão processual e da adequação formal impõem uma aplicação mais ágil e flexível do regime do artigo 266.º, n.º 3, do CPC, sempre no intuito de maximizar a celeridade e a economia processuais” (cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, cit., pág. 97), já “não será de admitir a reconvenção (…) assente em direito de crédito, para efeitos de eventual compensação, porquanto não é certo que, das operações de divisão de coisa comum, resulte um crédito do Autor sobre os Réus, para preenchimento da quota daquele, em resultado de adjudicação dos bem aos Réus” (cfr. Luís Filipe Pires de Sousa, cit., pág. 98).
Assim, não pode a Ré pretender transmutar estes autos em processo comum para discutir um eventual direito de crédito que alega deter.
Não se discute, pois, qualquer crédito do Autor sobre a ré que possa ser objeto de compensação, não sendo, então, de admitir a reconvenção apresentada.
Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 266.º do Código de Processo Civil, não admito a reconvenção apresentada pela Ré.
Notifique.

Inconformada, a ré/reconvinte interpôs recurso da decisão de rejeição da reconvenção, pugnando pela admissão do pedido reconvencional deduzido e terminando as alegações com a formulação das conclusões que se transcrevem:
«I. Venerandos Desembargadores, esteve mal, salvo melhor entendimento, o Douto Tribunal ao não admitir a reconvenção apresentada pela Ré
II. Está em causa um eventual direito de crédito da Ré sobre o Autor, no processo especial divisão de coisa comum respeitante ao pagamento das prestações bancárias e seguros associados ao mútuo contraído para aquisição do imóvel em causa nos autos, bem como despesas com condomínio e IMI.
III. Apesar da primeira parte do disposto no n.º 3 do artigo 266.º do CPC estatuir que não é admissível a reconvenção quando ao pedido da Ré corresponda uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido de Autor.
IV. A segunda parte do aludido disposto legal admite excepções a esta regra, nomeadamente as previstas nos nºs 2 e 3 do artigo 37.º do CPC, ou seja sempre que haja interesse relevante ou a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para uma justa composição do litígio.
V. Nos termos do n.º 2 do artigo 37.º do CPC quando aos pedidos correspondam formas de processo que, embora diversas, não sigam uma tramitação manifestamente incompatível, pode o juiz autorizar a cumulação.
VI. Havendo interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões, seja indispensável para a justa composição do litígio, a decisão do Tribunal a quo, não admitindo a reconvenção, impede a justa composição do presente litígio.
VII. Foi coartada a possibilidade da ora Recorrente ver reconhecido o seu crédito e poder compensá-lo com o crédito de tornas que possa ser adjudicado a um dos comproprietários uma vez que a fracção autónoma, aqui objecto dos autos é indivisível.
VIII. É expressamente admissível a transmutação do processo especial de divisão de coisa comum em processo comum, de acordo com o preceituado nos nºs e 3 do indicado artigo 37.º.
IX. Nos poderes – dever do Juiz, pode o juiz autorizar a reconvenção, sempre que nela haja interesse relevante, o que é in casu.
X. É entendimento, dos Tribunais da Relação de Lisboa, de Évora, de Guimarães, como do Supremo Tribunal de Justiça, que na acção de divisão de coisa comum, se for deduzida reconvenção pela Requerida a suscitar créditos que tem sobre o Requerente por ter efectuado despesas, nomeadamente, no pagamento do empréstimo bancário para aquisição da fracção autónoma, que em seu entender incumbe em partes iguais a ambos, deve a mesma ser admitida à luz do disposto no n.º 3 do artigo 26.º, n.º 2 e 3 do artigo 37.º, ambos do CPC.»
Não foram apresentadas contra-alegações.
Face às conclusões das alegações da recorrente, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar se é de admitir o pedido reconvencional.
Corridos os vistos, cumpre decidir.


2. Fundamentos

2.1. Tramitação processual
Os elementos com relevo para a apreciação da questão suscitada constam do relatório supra.

2.2. Apreciação do objeto do recurso
Pretende o autor, com a presente ação, pôr termo à indivisão da fração autónoma que identifica, bem imóvel que considera indivisível, requerendo se proceda à respetiva adjudicação ou venda.
A ré contestou, aceitando a compropriedade e a indivisibilidade da fração autónoma, mas impugnando o valor atribuído pelo autor ao bem imóvel, e deduziu pedido reconvencional, visando obter a compensação de um crédito correspondente a metade das quantias que alega ter suportado com o pagamento de encargos respeitantes à coisa comum, designadamente prestações do contrato de mútuo hipotecário outorgado para aquisição do imóvel, bem como seguros associados a tal contrato, IMI e despesas com condomínio.
Vem posta em causa na apelação a decisão de rejeição do pedido reconvencional, com fundamento na falta de verificação do requisito substancial de admissibilidade da reconvenção.
Discordando da decisão proferida, a apelante defende a admissibilidade da reconvenção que deduziu sustentando que, apesar de corresponder ao pedido do autor um processo especial e ao pedido reconvencional o processo comum, tal não impede se admita a reconvenção, alegando que se mostra preenchida, pelos motivos que expõe, a exceção prevista na 2.ª parte do n.º 3 do artigo 266.º do Código de Processo Civil e que tal permite ao juiz autorizar a reconvenção.
Vejamos se é de revogar a decisão recorrida e admitir o pedido reconvencional formulado pela ré.
Sob a epígrafe Admissibilidade da reconvenção, o artigo 266.º do CPC, dispõe, além do mais, o seguinte:
1 - O réu pode, em reconvenção, deduzir pedidos contra o autor.
2 - A reconvenção é admissível nos seguintes casos:
a) Quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à ação ou à defesa;
b) Quando o réu se propõe tornar efetivo o direito a benfeitorias ou despesas relativas à coisa cuja entrega lhe é pedida;
c) Quando o réu pretende o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor;
d) Quando o pedido do réu tende a conseguir, em seu benefício, o mesmo efeito jurídico que o autor se propõe obter.
3 - Não é admissível a reconvenção, quando ao pedido do réu corresponda uma forma de processo diferente da que corresponde ao pedido do autor, salvo se o juiz a autorizar, nos termos previstos nos n.ºs 2 e 3 do artigo 37.º, com as necessárias adaptações.
(…).
Regulando os Obstáculos à coligação, dispõe o artigo 37.º do CPC, além do mais, o seguinte:
1 - A coligação não é admissível quando aos pedidos correspondam formas de processo diferentes ou a cumulação possa ofender regras de competência internacional ou em razão da matéria ou da hierarquia.
2 - Quando aos pedidos correspondam formas de processo que, embora diversas, não sigam uma tramitação manifestamente incompatível, pode o juiz autorizar a cumulação, sempre que nela haja interesse relevante ou quando a apreciação conjunta das pretensões seja indispensável para a justa composição do litígio.
3 - Incumbe ao juiz, na situação prevista no número anterior, adaptar o processado à cumulação autorizada.
(…).
Da análise conjugada destes preceitos decorre que a admissibilidade da reconvenção depende da verificação de algum dos requisitos de natureza substancial elencados no n.º 2 do artigo 266.º e da não verificação do requisito negativo previsto no n.º 3 do preceito, salvo se o juiz a autorizar, nos termos previstos no artigo 37.º, n.ºs 2 e 3, do CPC.
Nas palavras de José Lebre de Freitas (A Ação Declarativa Comum: À Luz do Código de Processo Civil de 2013, 3.ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2013, págs. 122-124), «para que a reconvenção seja admissível, terá de se verificar algum dos elementos de conexão com o pedido do autor indicados no artigo 266.º-2 e não poderá verificar-se nenhum dos requisitos negativos de compatibilidade processual a que se refere o artigo 266.º-3, sem prejuízo do disposto no artigo 37.º, n.ºs 2 e 3».
Conforme se extrai da redação do n.º 2 do artigo 266.º – A reconvenção é admissível nos seguintes casos: (…) –, a enumeração dos requisitos de conexão do pedido reconvencional com o pedido formulado na ação é taxativa, do que decorre que a verificação de um desses elementos constitui condição necessária à admissibilidade da reconvenção.
Como tal, a aferição da admissibilidade da reconvenção impõe a prévia apreciação da verificação de algum dos elementos de conexão com o pedido deduzido na ação elencados do n.º 2 do citado artigo 266.º; caso se mostre preenchido este pressuposto material, há que apreciar a verificação do pressuposto relativo à compatibilidade processual, nos termos previstos no n.º 3 do preceito.
Analisando a fundamentação da decisão recorrida, verifica-se que a 1.ª instância considerou não verificado o requisito substancial de admissibilidade da reconvenção – por se ter entendido, em síntese, que, pretendendo o autor pôr termo à indivisão da fração autónoma comum, não está em causa qualquer crédito do autor sobre a ré que possa ser objeto de compensação –, na sequência do que rejeitou a reconvenção.
No recurso que interpôs, a apelante, não obstante manifestar discordância relativamente à rejeição do pedido reconvencional, não se pronuncia quanto ao preenchimento do requisito substancial de admissibilidade da reconvenção, não invocando a verificação de qualquer fator de conexão com o pedido do autor; nas alegações que apresentou, a recorrente limita-se a defender a compatibilidade processual entre o pedido reconvencional e o pedido do autor, invocando a verificação da exceção prevista na 2.ª parte do n.º 3 do citado artigo 266.º e defendendo que tal permite ao juiz autorizar a reconvenção.
Assim sendo, verifica-se que a apelante não tem em conta o conteúdo da decisão recorrida, designadamente os fundamentos pelos quais foi determinada a rejeição do pedido reconvencional, os quais permanecem intocados, não deduzindo uma verdadeira oposição à motivação da decisão que impugna.
As questões a decidir serão, além das de conhecimento oficioso, apenas as que constarem das conclusões, cabendo ao recorrente o ónus de as formular e de nelas incluir as questões que pretenda ver reapreciadas.
Explicam João de Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa (Manual de Processo Civil, volume II, Lisboa, AAFDL Editora, 2022, pág. 136) o seguinte: «A delimitação do âmbito do recurso é feita pelas conclusões da alegação do recorrente (artigo 635.º, n.º 4), não podendo, aliás, o tribunal de recurso conhecer de matéria não incluída nas conclusões. Portanto, é pelas conclusões das alegações que se determina o quantum do efeito devolutivo do recurso, naturalmente dentro da competência decisória do tribunal ad quem: a este tribunal é devolvido para apreciação o que constar daquelas conclusões».
Não tendo a apelante especificado, nas conclusões ou no corpo da alegação, que considera incorretamente julgada a questão da verificação dos requisitos substanciais de conexão do pedido reconvencional com o pedido do autor, não invocando a verificação de qualquer dos fatores de conexão enumerados no n.º 2 do artigo 266.º ou os motivos pelos quais considera incorretamente julgada a questão em causa, não se tratando de questão de conhecimento oficioso, não será reapreciado este fundamento da decisão recorrida.
Assente a falta de verificação de requisito(s) de conexão do pedido reconvencional com o pedido do autor, pressuposto substantivo que constitui condição necessária à admissibilidade da reconvenção, cumpre concluir pela inadmissibilidade da reconvenção, o que impõe se considere prejudicada a apreciação da questão da verificação do pressuposto relativo à compatibilidade processual.
Ainda que viesse a considerar-se verificada, nos termos invocados pela apelante, a compatibilidade processual entre o pedido reconvencional e o pedido do autor, a falta de algum dos elementos de conexão objetiva elencados no n.º 2 do artigo 266.º sempre impediria a admissibilidade da reconvenção, o que torna inútil a apreciação daquela questão.
Neste sentido, cfr. o acórdão desta Relação de 15-09-2022 (relator: Vítor Sequinho dos Santos), proferido no processo n.º 249/21.2T8VVC.E1 (publicado em www.dgsi.pt), de cujo sumário consta, além do mais, o seguinte: 1 – A admissibilidade de reconvenção depende da verificação de um dos pressupostos de natureza substancial ou factores de conexão estabelecidos nas diversas alíneas do n.º 2 do artigo 266.º do CPC. 2 – Apenas há lugar para a ponderação da verificação do pressuposto da compatibilidade processual entre o pedido do autor e o pedido reconvencional, nos termos do n.º 3 do artigo 266.º do CPC, se se verificar algum dos factores de conexão estabelecidos no n.º 2. 3 – O n.º 3 do artigo 266.º do CPC não constitui uma via alternativa ao n.º 2 para a admissão de reconvenção.
Nesta conformidade, tendo-se concluído que a reconvenção se mostra inadmissível, improcede a apelação, cumprindo confirmar a decisão recorrida.


Em conclusão: (…)


3. Decisão
Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
Évora, 07-03-2024
(Acórdão assinado digitalmente)~
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite (Relatora)
Cristina Dá Mesquita (1.ª Adjunta)
Anabela Luna de Carvalho (2.ª Adjunta) – (vencida)


VENCIDA:

Temos vindo a decidir que:
Na ação de divisão de coisa comum é admissível o pedido reconvencional para serem apurados os pagamentos efetuados pela ré de determinadas prestações efetuadas por esta, nomeadamente prestações de condomínio e de empréstimo bancário para aquisição do prédio objeto de divisão, com vista à sua adjudicação ou venda (assim, por exemplo, no Proc. n.º 469/21.0T8ABF.E1 in www.dgsi.pt.)
Apesar de os pedidos da ação e da reconvenção seguirem formas de processo diferentes, há interesse relevante para a apreciação conjunta de tais pretensões, o que se afigura indispensável para a composição justa do litígio.
Quando a Recorrente refere nas conclusões das alegações que pretende ver reconhecido o seu crédito (pagamento de encargos respeitantes à coisa comum, designadamente prestações do contrato de mútuo hipotecário outorgado para aquisição do imóvel, seguros, IMI e despesas de condomínio) com o crédito de tornas que possa ser adjudicado a um dos comproprietários (onde se inclui o autor) uma vez que a fração autónoma é indivisível (logo obriga a adjudicação ou venda), está, s.m.o, a invocar um requisito substancial de conexão entre o pedido reconvencional e o pedido do Autor.
Isto porque ao intentar uma ação de divisão de coisa comum o autor está a formular um pedido abrangente e complexo, formado por tantos pedidos quantos caibam na fase declarativa e executiva desta ação especial, nomeadamente a adjudicação a si do imóvel ou a entrega a si de 1/2 do preço que terceiro pagar, e é sobre esse crédito que assenta o contra crédito da recorrente.
Se a Recorrente quer obter o pagamento do seu "sacrifício patrimonial" com a "vantagem patrimonial" do Autor no momento da divisão do produto da venda, sendo ambos credores de metade, embora essa pretensão a um encontro de contas não constitua uma compensação em sentido estrito, cabe ainda assim na previsão da alínea c) do artigo 266.º, n.º 2, na parte em que prevê a possibilidade de reconvenção para o reconhecimento de um crédito para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor.
Por isso admitiria a reconvenção.

Anabela Luna de Carvalho