Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2088/22.4T8EVR.E1
Relator: MÁRIO BRANCO COELHO
Descritores: TRANSMISSÃO DA EMPRESA OU ESTABELECIMENTO
BAIXA POR DOENÇA
DIREITOS DO TRABALHADOR
SUSPENSÃO
Data do Acordão: 03/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
1. A realização dos serviços de vigilância e segurança em instalações de um cliente implica, necessariamente, um conjunto de meios organizados que constitui uma unidade produtiva autónoma, com identidade própria, e com o objectivo de prosseguir uma actividade económica.
2. Ocorre a transmissão dessa unidade, se a nova prestadora desses serviços mantém a actividade com 51 dos 56 vigilantes que a antecessora havia colocado, pois a tal estava obrigada pelo caderno de encargos do concurso público para prestação desses serviços a que se candidatou.
3. A baixa médica não suspende os direitos do trabalhador que não pressuponham a efectiva prestação de serviço.
4. E como se mantêm os deveres e garantias que não pressuponham a efectiva prestação de serviço, o vínculo contratual do trabalhador é transmitido quando ocorre a transmissão do estabelecimento onde estava colocado.
(Sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

No Juízo do Trabalho de Évora, AA demandou:
1.ª Ré RONSEGUR – Rondas e Segurança, S.A.; e,
2.ª Ré PSG – Segurança Privada, S.A..
Alegou o exercício de funções de vigilante no IEFP de …, sob as ordens e direcção da 1.ª Ré, e que o estabelecimento se transmitiu à 2.ª Ré, não tendo esta aceite a transmissão do vínculo, deixando de pagar qualquer remuneração, motivo pelo qual procedeu à resolução do contrato de trabalho com justa causa.
Os pedidos que o A. formula relacionam-se com o reconhecimento da justa causa na resolução do contrato, e no pagamento dos proporcionais das férias e subsídios de férias e de Natal do ano de cessação do contrato, dos salários vencidos e não pagos e em indemnização pela justa causa de resolução.
A 1.ª Ré contestou, alegando que o contrato de trabalho caducou por ocorrência do seu termo incerto, e ainda que a relação contratual foi transmitida para a 2.ª Ré.
Por seu turno, a 2.ª Ré alegou a inexistência de qualquer transmissão de estabelecimento, que o contrato cessou por ocorrência do seu termo resolutivo, e que o contrato de trabalho se encontrava suspenso por baixa médica do A..
Após julgamento, foi proferida sentença contendo o seguinte dispositivo:
“(…) decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência:
1. Declara-se válida a resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte do autor AA realizada à 2.ª Ré “PSG –Segurança Privada, S.A.”, por se ter verificado a transmissão do contrato de trabalho em apreço da 1.ª Ré para a 2ª Ré;
2. Condena-se a 2.ª Ré “PSG –Segurança Privada, S.A.” a pagar ao autor AA a quantia global de 1.161,11€ (mil, cento e sessenta e um euros e onze cêntimos), a título de indemnização por resolução do contrato de trabalho com justa causa, acrescida de juros de mora, à taxa supletiva legal anualmente prevista para obrigações civis, vencidos desde a data da citação da mencionada Ré e vincendos até efectivo e integral pagamento;
3. Condena-se a 2.ª Ré “PSG –Segurança Privada, S.A.” a pagar ao autor AA:
a. 1.489,69€ a título de retribuição de 9 de Agosto a 2 de Outubro de 2022;
b. 506,67€ referente a 14 dias de férias não gozadas no ano da admissão – 2021 – vencidas em 1 de Janeiro de 2022;
c. 506,67€ respeitante a 14 dias de subsídio de férias do ano da admissão – 2021 – vencidas em 1 de Janeiro de 2022;
d. 599,31€ a título de proporcionais de férias não gozadas referentes ao ano de 2022;
e. 599,31€ referente a proporcionais de subsídio de férias referentes ao ano de 2022;
f. 599,86€ a título de proporcionais de subsídio de Natal; e,
g. Juros de mora, à taxa supletiva legal prevista para obrigações civis, desde a data do vencimento de cada um dos créditos salariais em dívida até efectivo e integral pagamento;
4. Condena-se a 1.ª Ré “Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A.” como responsável solidária pelo pagamento das quantias referida em 3., al. b) e al. c);
5. Absolvem-se as Rés do demais peticionado pelo autor AA nos presentes autos.”

Inconformada, a 2.ª Ré recorre e conclui:
(…)

A 1.ª Ré respondeu, sustentando a manutenção do julgado.
A Digna Magistrada do Ministério Público nesta Relação emitiu parecer no sentido da manutenção da sentença recorrida.
Cumpre-nos decidir.

Impugnação da matéria de facto
Pretende a Recorrente que se considere provada matéria relacionada com a contratação de outro trabalhador em 01.06.2022, e a cessação desse contrato a 20 desse mês, com a extinção do posto no IEFP.
Trata-se de matéria não alegada pela Recorrente na sua contestação, nem pela outra Ré, ou sequer pelo trabalhador na sua petição inicial.
Ora, não cabe nos poderes de cognição da Relação aditar factos essenciais não alegados e integrantes da causa de pedir, ainda que possam resultar da prova produzida.[1]
O atendimento de factos essenciais não articulados é um poder inquisitório que incumbe ao juiz da causa e que ele apenas pode exercitar no decurso da audiência de julgamento, por sugestão da parte interessada ou por iniciativa própria, em função dos elementos que resultem da instrução e discussão da causa e da sua pertinência para a decisão jurídica e com vista ao apuramento da verdade material e da justa composição do litígio. Por isso, a Relação não pode utilizar tais poderes, ampliando o elenco dos factos provados, como não pode ordenar à 1.ª instância que utilize tal faculdade.[2]
Como tal, este tribunal de recurso não pode apurar os novos factos agora alegados pela Recorrente, motivo pelo qual se julga improcedente a impugnação da matéria de facto.

A matéria de facto fica assim estabelecida, nos precisos termos que constam da sentença:
1. “Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A.” e “PSG – Segurança Privada, S.A.” são sociedades comerciais que se dedicam à prestação de serviços de segurança privada.
2. Por despacho da Senhora Secretária-Geral Adjunta do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, proferido em 8 de Agosto de 2019, foi determinada a abertura de concurso público para a prestação de serviços de vigilância e segurança, para os vários organismos do referido Ministério, compreendendo 5 lotes:
- Lote 1 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região Norte;
- Lote 2 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região Centro;
- Lote 3 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região de Lisboa e Vale do Tejo;
- Lote 4 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região do Alentejo, no âmbito dos quais se contavam as instalações do Instituto de Emprego e Formação Profissional de …, e
- Lote 5 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região do Algarve.
3. À Ré “Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A.” foi adjudicada a prestação dos mencionados serviços colocados a concurso, pelo que o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social celebrou com esta contrato de prestação de serviços para o período compreendido entre 3 de Dezembro de 2019 e 31 de Maio de 2020.
4. Prestação de serviços essa que se prolongou para além de Maio de 2020, nomeadamente até 31.05.2022.
5. Por documento escrito denominado “Contrato de Trabalho e Termo Incerto”, assinado, em 30.06.2021, pelo A., designado por segundo outorgante, e por “Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A.”, designada por primeiro outorgante, acordaram os mesmos:
“É celebrado de boa-fé um contrato de trabalho a termo incerto nos termos das cláusulas seguintes:
1- O Segundo Outorgante é: admitido ao serviço do Primeiro Outorgante para desempenhar as funções inerentes à profissão de Segurança Privado, a qual compreende as especialidades previstas no artigo 17° da Lei 34/2013 de 16 de Maio, sendo-lhe atribuída a categoria de Vigilante e respectivas funções de acordo como Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a AESIRF – Associação Nacional das Empresas de Segurança e a ASSP – Associação Sindical da Segurança Privada (publicado no BTE n.º 26/2019 de 15 de Julho) e a(s) autorização(ões) e habilitação(ões) que lhe é(são) reconhecida(s) pela entidade legalmente competente para o efeito e que fará(ão) parte integrante deste contrato, cabendo àquele, neste caso, as funções respectivas, de acordo com o seguinte:
a. O Segundo Outorgante é titular do cartão profissional n.º …, válido até …, cartão atribuído pela Secretária-Geral do Ministério da Administração Interna que o habilita a exercer a especialidade de Vigilante;
(…)
3- O presente contrato é celebrado a Termo Resolutivo Incerto e durará pelo período necessário em que se mantiverem as circunstâncias, que motivaram a contratação do Segundo Outorgante e que se consubstanciam no descrito nas cláusulas seguintes.
4- O contrato é celebrado pelo prazo estabelecido na cláusula 3.ª. ao abrigo da alínea a) do número 2 do art. 140.º do Código do Trabalho, e justifica-se devido à substituição do trabalhador BB, o qual denunciou o seu contrato de trabalho em 30.06.2021.
5- O referido trabalhador substituído havia sido contratado devido ao acréscimo excepcional de actividade da empresa, a fim de dar cumprimento ao contrato de prestação de serviços entre a Segurança Social – Alentejo Lote 4 e a Ronsegur.
6- O motivo justificativo para a celebração do contrato a termo incerto foi a celebração de um contrato de prestação de serviços de segurança e vigilância entre o Primeiro Outorgante e a Segurança Social – Alentejo Lote 4, com início em 01.12.2019.
7- Assim, o presente contrato caducará quando caducar o mencionado contrato de prestação de serviços.
8- Prevendo-se a ocorrência de termo, o Primeiro Outorgante comunicará ao Segundo a cessação do presente contrato com a antecedência mínima de 7, 30 ou 60 dias, conforme o contrato tenha durado, respectivamente, até seis meses, de seis meses a dois anos ou por período superior.
9- Ao Segundo Outorgante será paga uma remuneração mensal base de 796,19€ (setecentos e noventa e seis euros e dezanove cêntimos) sujeito aos impostos e descontos legais em vigor.
10- O período normal de trabalho semanal é de 40 horas, distribuído por todos os dias da semana de acordo como mapa de horário de trabalho a estabelecer.
11- O local de trabalho será o IEFP … de acordo com o previsto no artigo 1930 do Código do Trabalho e da Cláusula 17.a do Contrato Colectivo de Trabalho, ou a que resultar do acordo das partes, sem prejuízo do previsto na cláusula seguinte.
12- O Segundo Outorgante assume desde já o compromisso de, temporária ou definitivamente, ser transferido para outro local de trabalho, desde que tal mudança seja necessária ao exercício da actividade do Primeiro Outorgante e não se verifique prejuízo sério para o trabalhador.
(…)
14- A denúncia do contrato pelo Segundo Outorgante está sujeita às regras impostas pelos artigos 400.º e seguintes do Código do Trabalho.
15- O presente contrato de trabalho caduca nos termos gerais da lei, nomeadamente por impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva, de o trabalhador prestar o seu trabalho ou do empregador o receber.
(…)
32- Pelo estabelecimento do vínculo laboral veiculado pelo presente contrato, passará a ser aplicável ao Segundo Outorgante o seguinte instrumento de regulação colectiva: CCT – Contrato Colectivo entre a AESIRF – Associação Nacional das Empresas de Segurança e a ASSP – Associação Sindical da Segurança Privada (publicado no BTE n.º 26/2019 de 15 de Julho).”
6. A partir de 01.07.2021, e na sequência do contrato descrito em 5., o A. exerceu as funções de vigilante no “IEFP …”, por conta, sob as ordens e autoridade da Ré “Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A.”
7. Por despacho da Senhora Secretária-Geral do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, proferido em 21 de Dezembro de 2021, foi determinada a abertura de concurso público para a prestação de serviços de vigilância e segurança, para os vários organismos do referido Ministério, compreendendo 5 lotes:
- Lote 1 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região Norte;
- Lote 2 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região Centro;
- Lote 3 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região de Lisboa e Vale do Tejo;
- Lote 4 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região do Alentejo, no âmbito dos quais se contavam as instalações do Instituto de Emprego e Formação Profissional de …, e
- Lote 5 – Prestação de serviços de vigilância e segurança na Região do Algarve.
8. O caderno de encargos relativo ao referido procedimento para a prestação de serviços de vigilância e de segurança previa, no art. 6.º, como obrigações do adjudicatário:
“cumprir as normas relativas à transmissão de estabelecimento e manutenção de todos os direitos contratuais e adquiridos pelos trabalhadores, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional, conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos” (al. a))
mais prevendo que:
“o universo dos trabalhadores abrangido na alínea anterior corresponde aos trabalhadores afectos aos postos de trabalho agora postos a concurso, que se encontravam em exercício de funções no âmbito dos contratos vigentes, nos vários organismos do MTSSS, nos termos legais em vigor” (al. b)).
9. No âmbito do referido procedimento concursal foi decidido, em Abril de 2022, adjudicar, com efeitos a partir de 1 de Junho de 2022, à Ré “PSG – Segurança Privada, S.A.”, a prestação dos serviços de vigilância e segurança nas instalações do Alentejo do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, no âmbito das quais se inclui o edifício do Instituto de Emprego e Formação Profissional de ….
10. Em 13 de Maio de 2022, a Ré Ronsegur remeteu à Ré PSG – Segurança Privada, S.A. uma carta por esta recebida, com o seguinte teor:
“Assunto: Transmissão de Estabelecimento - Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana nas Instalações do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo
Exmo.(s) Senhores,
Os nossos respeitosos cumprimentos.
No âmbito do fim do contrato celebrado dom a entidade identificada em epígrafe, foi adjudicada a V. Exas a prestação de serviços de vigilância e segurança nas instalações do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo, com efeitos a partir do próximo dia 01 de Junho de 2022.
Assim, face à redacção do Artigo 6.º, alínea a) do Caderno de Encargos, no âmbito do Procedimento CP/06/2021/UMCMTSSS, e na sequência da perda e cessação da aludida prestação de serviços de vigilância e segurança pela Ronsegur, Rondas e Seguranças, SA, seguida de adjudicação da mesma à PSG – Segurança Privada, S.A., constata-se que se mantém e transmite aquela para o novo operador, o qual deve receber a transmissão e a manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos Vigilantes que prestam funções nas Instalações do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo, ao abrigo do descrito no Artigo 6.º do Caderno de Encargos e no Artigo 285.º do Código do Trabalho.
Com base nestes fundamentos, comunicamos formalmente, que o serviço a prestar por V. Exas. no âmbito do contrato com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo, deverá ser efectuado com os Vigilantes, cuja relação discriminada V/ enviamos em anexo. Mais se informa que os trabalhadores mencionados deverão passar a prestar funções por conta e à ordem da vossa empresa, mantendo as respectivas categorias profissionais, antiguidade, retribuição e demais condições resultante do correspectivo contrato de trabalho.
Por último, comunicamos que a Ronsegur, Rondas e Seguranças, SA deu cumprimento aos deveres de prévia informação e subsequente consulta dos trabalhadores em causa, tal como previsto no Artigo 286.º do Código do Trabalho, comunicando aos mesmos tal transmissão e sucessão contratual, com indicação da vossa empresa e endereço, para os devidos efeitos. A transmissão, por via da data de produção de efeitos do contrato/adjudicação contratual do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo terá lugar no dia 01 de Junho de 2022.
Para além disso, demos conhecimento das mesmas aos serviços com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral (Artigo 285.º, n.º 8, do Código do Trabalho).
Sem mais de momento,”
11. A carta era instruída com anexo contendo identificação de 56 trabalhadores, neles se incluindo o A., com indicação, entre outros dados, da respectiva categoria, local de trabalho, residência e contacto telefónico.
12. Nessa mesma data, a 1.ª Ré expediu idêntica comunicação à ACT – Centro Local do Alentejo Central.
13. Dos 56 trabalhadores referidos em 11., a Ré “PSG – Segurança Privada, S.A.” admitiu ao seu serviço 51 trabalhadores, os quais continuaram a exercer as mesmas funções até então exercidas, não tendo, contudo, admitido: CC e, por se encontrarem de baixa médica, DD, EE, FF e o A..
14. Em 05.04.2022 o A. entrou em período de baixa médica, assim se mantendo até 08.08.2022.
15. Em 16 de Maio de 2022, a 1.ª Ré enviou ao A. uma carta, por este recebida, com o seguinte conteúdo:
“Assunto: Transmissão de Estabelecimento – Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana nas Instalações do IEFP – Serviço de Emprego de …
Exmo. (a) Senhor (a),
“Informamos que o serviço prestado pela Ronsegur, Rondas e Segurança, SA no IEFP – Serviço de Emprego de …, foi adjudicado à Empresa PSG – Segurança Privada, SA, com efeitos a partir de 01 de Junho de 2022.
Assim, face à actual redacção do Artigo 285.º do Código do Trabalho (Lei n.º 18/2011, de 08 de Abril), e na sequência da perda e cessação da aludida prestação de serviços de vigilância e segurança pela Ronsegur, Rondas e Segurança, SA, seguida de adjudicação da mesma à PSG – Segurança Privada, SA, constata-se que se mantém e transmite aquela para o novo operador, o qual deve receber a transmissão e manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos Vigilantes que presta, funções no IEFP – Serviço de Emprego de …, ao abrigo do regime da Transmissão do Estabelecimento, previsto no art. 285.º do Código do Trabalho.
A referida transmissão do estabelecimento ocorrerá no dia 01 de Junho de 2022, data em que a empresa PSG – Segurança Privada, S.A. assumirá a prestação de serviço. Mais informa que V. Exa. deverá passar a prestar funções por conta e à ordem da PSG – Segurança Privada, S.A. mantendo a respectiva categoria profissional, antiguidade, retribuição e demais condições resultantes do respectivo contrato de trabalho.
Considerando a transmissão de estabelecimento operada, a Ronsegur, Rondas e Segurança, SA procederá ao pagamento do vencimento correspondente aos dias trabalhados até à data da cessação do contrato com esta empresa, 31 de Maio de 2022.
(…)
Mais se informa que a empresa PSG – Segurança Privada, S.A. foi informada da lista dos trabalhadores a operar Instalações IEFP – Serviço de Emprego de …, e da informação necessária para os respectivos contratos de trabalho.
Por fim, Ronsegur, Rondas e Segurança, SA informa que deverá proceder à entrega, em condições aceitáveis de manutenção, do fardamento que lhe está adstrito, bem como outros materiais e equipamentos que lhe tenham sido fornecidos, a partir do dia 01 de Junho de 2022.”
16. Em 01 de Junho de 2022, os serviços de segurança nos postos de vigilância do IEFP – Serviço de Empreso de … deixaram de ser prestados pela Ré Ronsegur, Rondas e Segurança, S.A., e passaram a ser assegurados pela Ré PSG – Segurança Privada, S.A., por decorrência da adjudicação de serviços de segurança à mesma.
17. O posto de segurança do IEFP – Serviço de Emprego de … veio a ser extinto, por decisão da entidade adjudicante a 20 de Junho de 2022.
18. Em 21 de Junho de 2022, a 1.ª Ré enviou ao A. uma carta, por este recebida, com o seguinte conteúdo:
“Nos termos legais procedeu-se à transmissão do serviço prestado pela Ronsegur - Rondas e Segurança, SA, nas instalações do IEFP – Serviço de Emprego de …, onde V. Exa. prestava serviço, tendo o mesmo sido adjudicado à Empresa PSG – Segurança Privada, S.A., com efeitos partir do próximo dia 01 de Junho de 2022, cumprindo, desse modo, o disposto no Caderno de Encargos do Concurso e na legislação laboral.
Desta forma e uma vez que, não existiu oposição por parte de V. Exa., somo a considerar concluída a respectiva transmissão e a sua integração na Empresa PSG – Segurança Privada, S.A.
Assim sendo, informamos que, a partir desse dia, 01 de Junho de 2022, a sua Entidade Patronal é a Empresa PSG – Segurança Privada, S.A., pelo que toda e qualquer documentação deverá ser remetida para a mesma, inclusive os Certificados de Incapacidade Temporária para o Trabalho, que nos remeteu, pelo que devolvemos os mesmos a V. Exa.”
19. Em 17 de Agosto de 2022, o A. enviou à 2.ª Ré uma carta, por esta recebida, com o seguinte conteúdo:
“(…) venho uma vez mais informar que, tal como exposto na carta registada enviada no dia 9 de Agosto de 2022 (anexo I) e e-mail que seguiu no dia 8 de Agosto de 2022 (anexo II), me encontro apto para regressar ao trabalho, desde o dia 9 de Agosto de 2022, tendo a minha baixa médica terminado a 8 de Agosto de 2022. Foram solicitadas ainda informações quanto ao posto de trabalho a ocupar, data para iniciar funções e fornecimento de equipamento necessário.
De acordo com o Contrato Colectivo de Trabalho celebrado entre a AESIRF – Associação Nacional das Empresas de Segurança e Fetese – Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços, publicado no BTE n.º 22 de 15/06, com portaria ext. n.º 186/2020, na sua cláusula 14.ª, fui notificado pela Ronsegur, Rondas e Segurança, SA no dia 16 de Maio de 2022, da perda e cessação da prestação de serviços de vigilância e segurança humana nas instalações do IEFP – Serviço de Emprego de …, seguida da adjudicação da mesma à PSG – Segurança Privada, S.A., a qual teve o dever de receber a transmissão e a manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos Vigilantes que prestam funções no IEFP – Serviço de Emprego de ….”
20. Não foi paga ao A. a remuneração dos meses de Junho, Julho, Agosto e Setembro de 2022.
21. Em 03 de Outubro de 2022 o A. enviou à 2.ª Ré uma carta, pela mesma recebida, com o seguinte teor:
“Assunto: Resolução do contrato de trabalho com justa causa
No passado dia 12 de Setembro de 2022 enviei uma carta a V. Exas à qual, até à presente data, não se dignaram responder.
Na sequência da referida carta, e como continuo sem saber a qual das entidades, se a V/ Exas ou à Ronsegur, Rondas e Seguranças, SA, me encontro afecto contratualmente, venho, pela presente, comunicar a V/ Exas a imediata resolução, com justa causa, do contrato de trabalho celebrado no dia 30 de Junho de 2021, nos termos e conforme o disposto nas alíneas a) e e) do nº. 1 do art. 394.º do Código do Trabalho, por motivo de falta culposa do pagamento da retribuição referente aos meses de Agosto e Setembro do corrente ano de 2022.
Fico a aguardar o envio, no prazo de 5 (cinco) dias, da Declaração Modelo 5044 da Segurança Social e do Certificado do Trabalho, sem prejuízo do pagamento dos créditos emergentes da cessação do contrato, acrescida da indemnização de antiguidade, nos termos do n.º 1 do art. 396 do Código do Trabalho.”
22. Em 03 de Outubro de 2022 o A. enviou à 1.ª Ré uma carta, pela mesma recebida, com o seguinte teor:
“Assunto: Resolução do contrato de trabalho com justa causa
Em 16 de Maio de 2022 e 21 de Junho de 2022 V/ Exas. comunicaram-me, respectivamente, a “Transmissão de Estabelecimento – Aquisição de Serviços de Vigilância e Segurança Humana nas Instalações do IEFP – Serviço de Emprego de …” e “Esclarecimentos”, resultando das mesmas missivas a transmissão do meu contrato de trabalho e a consequente integração na PSG – Segurança Privada, S.A. a partir de 1 de Junho de 2022.
Sucede que, não obstante todas as minhas diligências, até à presente data a PSG – Segurança Privada, S.A. não aceitou a minha integração no dia 09 de Agosto de 2022 após o términus da minha baixa médica.
Sendo certo que, não sou eu que tenho de aferir se o meu contrato de trabalho continua afecto a V/ Exas ou à PSG – Segurança Privada, S.A..
Assim, venho, pela presente, comunicar a V/ Exas a imediata resolução, com justa causa, do contrato de trabalho celebrado no dia 30 de Junho de 2021, nos termos e conforme o disposto nas alíneas a) e e) do nº. 1 do art. 394.º do Código do Trabalho, por motivo de falta culposa do pagamento da retribuição referente aos meses de Agosto e Setembro do corrente ano de 2022.
Fico a aguardar o envio, no prazo de 5 (cinco) dias, da Declaração Modelo 5044 da Segurança Social e do Certificado do Trabalho, sem prejuízo do pagamento dos créditos emergentes da cessação do contrato, acrescida da indemnização de antiguidade, nos termos do n.º 1 do art. 396 do Código do Trabalho.”
23. Em 12 de Outubro de 2022, a 1.ª Ré enviou ao A. uma carta, por este recebida, com o seguinte conteúdo:
“Exmo. Senhor,
Acusamos a recepção da sua carta datada de 03/10/2022 e recepcionada no dia 04/10/2022, e, desde já, não podemos deixar de expressar a nossa perplexidade quanto ao conteúdo da mesma.
Primeiramente, cumpre referir que, face à redacção do Artigo 6.º, alínea a) do Caderno de Encargos, no âmbito do Procedimento CP/06/2021/UMCMTSSS, e na sequência da perda e cessação da aludida prestação de serviços de vigilância e segurança pela PSG – Segurança Privada, S.A., constatou-se que se mantinha e transmitia aquela para o novo operador, o qual deveria receber a transmissão e a manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos Vigilantes que prestavam funções nas Instalações do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social – Alentejo, ao abrigo do descrito no Artigo 6.º do Caderno de Encargos e no Artigo 285.º do Código do Trabalho.
De forma a dar cumprimento ao Artigo 6.º do Caderno de Encargos e ao Artigo 285.º do Código do Trabalho, a Ronsegur comunicou no dia 13 de Maio de 2022 ao novo prestador de serviço, PSG – Segurança Privada, S.A. e à Autoridade para as Condições de Trabalho, a listagem com a indicação dos vigilantes e respectiva informação quanto aos contratos, antiguidades e respectivos direitos.
No que diz respeito aos vigilantes, a Ronsegur comunicou a transmissão supra aos mesmos, numa primeira fase pessoalmente e, posteriormente, por carta registas com aviso de recepção, tendo enviado para V Exa., comunicação datada de 16 de Maio de 2022, a indicar a referida transmissão, tal como alegado na sua missiva.
Sendo que, no dia 21 de Junho de 2022, a Ronsegur e após missiva da sua parte, esclareceu, de novo que a sua entidade patronal, desde o dia 01 de Junho de 2022, era a PSG – Segurança Privada, S.A., atento a transmissão que tinha ocorrido.
Desta forma, não se alcança a resolução de justa causa invocada por V. Exa.., na medida em que, a transmissão foi aceite pela PSG – Segurança Privada, S.A. e a mesma, de acordo com o caderno de encargos tinha de manter os trabalhadores afectos ao posto.
Nesse sentido, V. Exa. deixou de ser colaborador da Ronsegur a partir do dia 30 de Maio de 2022, passando a ser colaborador da PSG – Segurança Privada, S.A. desde o dia 01 de Junho 2022, pelo que a Ronsegur não alcança a resolução em questão.
Assim sendo e, atento ao exposto, cumpre referir e firmar que a Ronsegur prontamente liquidou as retribuições a V/ Exa. até ao dia 30 de Maio de 2022, não se encontrando em falta não culposa de pagamento pontual de retribuição, conforme alegado por V. Exa.
(…)”
24. Em 25 de Outubro de 2022, a 2.ª Ré enviou ao A. uma carta, por este recebida, com o seguinte conteúdo:
“Assunto: Resposta à s/carta de 03 de Outubro de 2022 – Impossibilidade de emissão de MOD, RP 5044-DGSS
Exmo. Senhor,
Venho ao seu contacto na qualidade de mandatária da PSG – Segurança Privada, S.A., no seguimento da missiva recebida pela minha constituinte, com data de 03 de Outubro de 2022, mediante a qual comunica a resolução do seu contrato de trabalho, bem como, solicita a emissão de declaração para efeitos de concessão do subsídio de desemprego.
Após cuidada atenção à supra aludida missiva, venho pela presente comunicar-lhe que, pese embora a minha cliente compreenda e lamente profundamente a sua situação, malogradamente, não pode assumir V. Exa. como seu trabalhador pelo motivo que se explanará infra.
É verdade que a sua entidade empregadora “Ronsegur, Rondas e Seguranças, SA” comunicou a intenção de transmissão do seu contrato de trabalho, anteriormente alocado ao posto em que a aquela empresa cessou a sua exploração, para a minha constituinte, nas instalações do IEFP – Serviço de Emprego de …, assim como de todos os contratos de trabalho dos trabalhadores que se encontravam nessa altura a prestar serviços nas aludidas instalações.
Sucede que, no seu caso concreto, salvo o devido respeito e melhor opinião, a relação laboral que mantinha com a sociedade Ronsegur, SA, esteve suspensa, pelo que não se verificou a sua transmissão para a minha cliente.
Com efeito, como resulta do disposto no n.º 1 do artigo 296.º do Código do Trabalho que “determina a suspensão do contrato de trabalho o impedimento temporário por facto respeitante ao trabalhador que não lhe seja imputável e se prolongue por mais de um mês, nomeadamente doença”.
Ora, à data da adjudicação dos serviços à minha cliente, Junho de 2022, V. Exa. encontrava-se de baixa médica desde o dia 04 de Abril de 2022, pelo que o seu contrato de trabalho, nos termos do preceito normativo acima transcrito, encontrava-se suspenso e consequentemente o mesmo não foi objecto de transmissão.
Aliás, o posto, de trabalho que V Exa. ocupava e que foi transmitido, foi assegurado por outro trabalhador, vindo posteriormente a extinguir-se a pedido do próprio cliente.
Em suma, constitui nosso entendimento que não ocorreu qualquer transmissão do seu contrato de trabalho para a minha cliente, contrariamente ao aludido na missiva que pela presente se dá resposta, pelo que, salvo melhor opinião, V. Exa. não tem qualquer vínculo com a minha constituinte, subsistindo, a contrário, o seu vínculo contratual com a empresa “Ronsegur, Rondas e Seguranças, SA”.
Nesta perspectiva, não se revela possível à minha constituinte proceder à emissão de declaração para fins de desemprego, uma vez que a relação laboral vigora e mantem-se nas mesmas condições, com a sociedade acima referida.”

APLICANDO O DIREITO
Da transmissão do vínculo contratual e da eventual caducidade do contrato de trabalho
Argumenta a 2.ª Ré, aqui Recorrente, que não se verificou a transmissão do vínculo contratual, e que o contrato de trabalho do A., a termo incerto, caducou automaticamente com a cessação do contrato de prestação de serviços de vigilância da 1.ª Ré.
Cabe, pois, identificar no caso a figura jurídica de transmissão de empresa ou estabelecimento, para os fins do art. 285.º do Código do Trabalho, na versão em vigor à data dos factos – a que já lhe foi conferida pela Lei n.º 18/2021, de 8 de Abril – importando realçar a nova redacção do seu n.º 10, dispondo que aquele artigo “é aplicável a todas as situações de transmissão de empresa ou estabelecimento por adjudicação de contratação de serviços que se concretize por concurso público ou por outro meio de selecção, no sector público e privado, nomeadamente à adjudicação de fornecimento de serviços de vigilância, alimentação, limpeza ou transportes, produzindo efeitos no momento da adjudicação.”
Os factos apurados demonstram que estamos efectivamente perante uma transmissão de empresa ou estabelecimento que constitui uma unidade económica, para os fins do art. 285.º n.ºs 1, 5 e 10 do Código do Trabalho, na versão daquela Lei n.º 18/2021, pois verificou-se a adjudicação dos serviços de vigilância do Lote 4 – Região do Alentejo, onde se contavam as instalações onde o A. exercia as suas funções – impondo o caderno de encargos, ao qual a 2.ª Ré se vinculou, a cumprir as normas relativas à transmissão de estabelecimento e manutenção de todos os direitos contratuais e adquiridos pelos trabalhadores, incluindo-se nesse universo os afectos aos postos de trabalho postos a concurso, que se encontravam em exercício de funções no âmbito dos contratos vigentes nos vários organismos do MTSSS.
A Secção Social desta Relação de Évora vem decidindo, de forma uniforme, que “I – Verifica-se uma transmissão de unidade económica, para efeitos do art. 285.º do Código do Trabalho, quando uma empresa de prestação de serviços de vigilância e segurança sucede, sem interrupções, a outra empresa de prestação de serviços de vigilância e segurança, por ter ganhado o concurso público e lhe ter sido adjudicado tal serviço, realizando-se a prestação com o mesmo cliente, no mesmo local, com os mesmos trabalhadores, a utilização dos mesmos indispensáveis meios de vigilância e segurança, pertencentes ao cliente, e tendo por objectivo a execução do serviço nas mesmas condições essenciais. II- A utilização de folhas de registo, relatórios e uniformes com modelos e imagens identificativos da empresa de segurança permitam a identificação da empresa responsável pela vigilância e segurança, mas não integram a unidade económica, no seu núcleo essencial identificativo.”[3]
Os autos demonstram que o A. exercia as funções inerentes à categoria de vigilante, sob as ordens e direcção da 1.ª Ré, nas instalações do IEFP de ….
Com efeitos a partir de 01.06.2021, foram adjudicados os serviços de vigilância da Região do Alentejo à 2.ª Ré e, nessa sequência, a 1.ª Ré remeteu-lhe, em 13.05.2021, a relação discriminada dos vigilantes que tinha ao seu serviço no âmbito do contrato que estava em vigor, contendo a identificação de 56 trabalhadores, entre eles o A., tendo a 2.ª Ré admitido ao seu serviço 51 deles.
Entendemos – na linha do que é a jurisprudência da Secção Social desta Relação de Évora – que a realização dos serviços de vigilância e segurança em instalações do cliente implica, necessariamente, um conjunto de meios organizados que constitui uma unidade produtiva autónoma, com identidade própria, e com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, e como tal enquadrável nos n.ºs 1, 5 e 10 do art. 285.º do Código do Trabalho, na versão da Lei n.º 18/2021.
A noção ampla de transmissão, acolhida nesta norma, não exige a existência de relações contratuais directas entre as duas empresas de segurança.
O que releva é a existência de uma unidade económica com autonomia técnico-organizativa e com identidade própria, e em sectores de actividade como o dos serviços de segurança e vigilância, a prossecução da actividade com um conjunto de trabalhadores que vinha executando de forma durável uma actividade comum, correspondendo a um número substancial dos vigilantes da empresa antecessora adequadamente estruturados, permite reconhecer a identidade da unidade económica, mesmo que não haja uma total coincidência na organização hierárquica.
E – ponto essencial – a 2.ª Ré assumiu 51 dos trabalhadores que já desempenhavam funções de vigilância para a 1.ª Ré.
Nestas condições, podemos afirmar a transmissão da mesma entidade económica, e como tal a ocorrência da figura jurídica de transmissão de estabelecimento.
Estas conclusões são reforçadas pela argumentação utilizada no recente Acórdão do TJUE de 16.02.2023 (Proc. n.º C-675/2021), o qual reconheceu que “a Directiva 2001/23 deve ser interpretada no sentido de que a inexistência de vínculo contratual entre o cedente e o cessionário de uma empresa ou de um estabelecimento ou de uma parte de empresa ou de estabelecimento é irrelevante para a determinação da existência de uma transferência na acepção desta directiva” – parágrafo 45, aceitando, assim, que o conceito legal de transmissão não carece de relações contratuais directas entre cedente e cessionário.
E declarou, também, o seguinte:
- “(…) nalguns sectores em que a actividade assenta essencialmente na mão de obra, o que sucede nomeadamente no caso de uma actividade que não necessita de utilizar elementos materiais específicos, um conjunto de trabalhadores que executa de forma duradoura uma actividade comum pode corresponder a uma entidade económica, essa entidade é susceptível de manter a sua identidade além da sua transferência quando o novo empresário não se limitar a prosseguir a actividade em causa, retomando também uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efectivos que o seu antecessor afectava especialmente a essa tarefa. Nesta hipótese, o novo empresário adquire, com efeito, um conjunto organizado de elementos que lhe permitirá prosseguir de forma estável as actividades ou parte das actividades da empresa cedente (…)” – parágrafo 52.
- “A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou, no contexto de um processo comparável ao do processo principal, que uma actividade de vigilância de um museu que não exige a utilização de elementos materiais específicos pode ser considerada uma actividade que assenta essencialmente na mão de obra e, por consequência, um conjunto de trabalhadores que executa de forma duradoura uma actividade comum de vigilância pode, na falta de outros factores de produção, corresponder a uma entidade económica. É ainda necessário, porém, como resulta do número anterior, que a identidade desta última seja mantida além da operação em causa, o que pode ser o caso quando a entidade económica em questão pertence a um sector que assenta essencialmente na mão de obra e o essencial dos efectivos dessa entidade, em termos de número e de competência, for integrado pelo alegado cessionário (…). Por conseguinte, nesse sector, a identidade de uma entidade económica não pode ser mantida além da operação em causa se o essencial dos seus efectivos, em termos de número e de competência, não for integrado pelo presumido cessionário (…)” – parágrafo 53.
- “(…) a qualificação de transferência pressupõe que seja apurado um determinado número de factos, devendo esta questão ser apreciada in concreto pelo órgão jurisdicional nacional à luz dos critérios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça, bem como dos objectivos prosseguidos pela Directiva 2001/23, conforme enunciados, nomeadamente, no seu considerando 3 (…)” – parágrafo 55, estipulando este considerando 3 ser “necessário adoptar disposições para proteger os trabalhadores em caso de mudança de empresário especialmente para assegurar a manutenção dos seus direitos.”
Ora, os critérios definidos no Acórdão do TJUE para a ocorrência de transmissão de estabelecimento verificam-se no caso dos autos.
Na verdade, 2.ª Ré integrou nos seus quadros uma parte essencial dos vigilantes que já desempenhavam as mesmas funções para a 1.ª Ré, isto é, admitiu 51 dos 56 vigilantes que já trabalhavam para a 1.ª Ré – não obstando a essa conclusão o facto de ter ocorrido uma ligeira redução do número total de vigilantes empenhado na prestação de serviços, pois o que importa é a continuação da actividade com parte essencial dos trabalhadores que já desempenhavam as mesmas funções.

Argumenta a 2.ª Ré, de todo o modo, que a transmissão do vínculo contratual do A. não ocorreu, por dois motivos: estava de baixa médica desde 05.04.2022 e o seu contrato de trabalho caducou.
A resposta às duas objecções colocadas pela 2.ª Ré é negativa.
Quanto à primeira, a baixa médica não suspende os direitos do trabalhador que não pressuponham a efectiva prestação de serviço. Como correctamente observa a sentença recorrida, do art. 295.º n.º 1 do Código do Trabalho decorre “que durante o período de suspensão, mantém-se o vínculo contratual existente entre o empregador e o trabalhador, mantendo-se os deveres e garantias que não pressuponham a efectiva prestação de serviço. Resta, pois, saber se a transmissão do contrato de trabalho ao abrigo do preceituado no art. 285.º do CT está incluída entre essas garantias, não dependentes da efectiva prestação de trabalho. Considerando, por um lado, que o próprio art. 285.º, podendo tê-lo feito, uma vez que exclui do seu âmbito de aplicação outras situações, designadamente as previstas no seu n.º 4, não exclui a sua aplicação às situações em que os contratos dos trabalhadores se encontrem suspensos e, tendo presente, por outro lado, que o instituto em causa visa a protecção da situação de emprego e estabilidade da relação laboral, não se vislumbrando que tais propósitos não sejam igualmente aplicáveis em situações de suspensão dos contratos de trabalho por motivo de doença, sob pena de violação do princípio constitucionalmente consagrado da igualdade, não pode deixar de se concluir que a circunstância de o contrato se encontrar suspenso não obsta à sua transmissão nos termos preceituados no art. 285.º do CT.”[4]
Quanto à caducidade, o contrato de trabalho menciona que era celebrado a termo resolutivo incerto e justificava-se devido à substituição de outro trabalhador, que “denunciou o seu contrato de trabalho em 30.06.2021” – ou seja, foi invocada uma justificação da necessidade temporária que não se enquadra na norma legal indicada, do art. 140.º n.º 2 al. a) do Código do Trabalho, pois não estava em causa uma ausência do anterior trabalhador ou com impedimento temporário para trabalhar, mas uma cessação definitiva do respectivo contrato de trabalho, pelo que o contrato se considera sem termo (art. 147.º n.º 1 al. b) do Código do Trabalho).
De todo o modo, a prestação de serviços de vigilância não findou com a adjudicação da Região do Alentejo à 2.ª Ré – como vimos, não só ocorreu uma transmissão de estabelecimento, como o próprio caderno de encargos do concurso ganho pela 2.ª Ré lhe impunha a obrigação de cumprir as normas relativas à transmissão de estabelecimento e manutenção de todos os direitos contratuais adquiridos pelos trabalhadores, incluindo-se nesse universo de trabalhadores os afectos aos postos de trabalho postos a concurso (entre eles, o ocupado pelo A.).
Enfim, porque outras questões não são colocadas no recurso, deve a bem elaborada sentença recorrida ser confirmada.

DECISÃO
Destarte, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a sentença recorrida.
Custas do recurso pela 2.ª Ré.

Évora, 7 de Março de 2024

Mário Branco Coelho (Relator)
Paula do Paço
Emília Ramos Costa

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[1] Assim se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18.04.2023 (Proc. 1205/19.6T8VCD.P1.S1), publicado em www.dgsi.pt.
[2] Hermínia Oliveira e Susana Silveira no VI Colóquio sobre Direito do Trabalho, realizado no Supremo Tribunal de Justiça em 24.10.2014, in “Colóquios”, disponível em www.stj.pt.
Na jurisprudência, vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 15.09.2016 (Proc. 2/13.7TTBRG.G1.S1), da Relação de Évora de 28.09.2017 (Proc. 1415/16.8T8TMR.E1, subscrito pelo ora relator) e da Relação de Guimarães de 10.07.2019 (Proc. 3235/18.6T8VNF.G1), todos em www.dgsi.pt.
[3] Sumário do Acórdão desta Relação de 11.02.2021 (Proc. 100/20.0T8SNS.E1), relatado pela 1.ª Adjunta e publicado em www.dgsi.pt.
No mesmo sentido, no domínio das empresas de vigilância e segurança, pronunciaram-se os Acórdãos desta Relação de Évora de 28.01.2021 (Proc. 959/18.1T8BJA.E1), de 10.03.2022 (Proc. 1746/20.2T8PTM.E1), de 24.03.2022 (Proc. 620/20.7T8STR.E1) e de 30.06.2022 (Proc. 2082/20.0T8FAR.E1), todos publicados no mesmo local.
[4] Analisando um caso semelhante, e adoptando solução semelhante, vide o Acórdão desta Relação de Évora de 16.03.2017 (Proc. 6939/15.1T8STB.E1), publicado em www.dgsi.pt.