Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1787/22.5T8BJA.E2
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: DESPACHO SANEADOR
DECISÃO NO SANEADOR
Data do Acordão: 02/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O conhecimento imediato do mérito em sede de despacho saneador só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não apenas tendo em atenção a visão partilhada pelo juiz da causa.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1787/22.5T8BJA.E2
Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo Local ... – J...
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
Na presente acção de despejo proposta pela “Santa Casa da Misericórdia de (…)” contra AA, a Ré veio interpor recurso da sentença proferida.
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A Autora pedia que
a) fosse declarada a resolução do contrato, com base no não uso do locado por mais de um ano – artigo 1083.º, n.º 2, alínea d), do Código Civil;
b) fosse decretado o despejo, condenando-se a Ré a entregar de imediato à Autora, livre e desocupado, o prédio urbano objecto do contrato aqui em causa.
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Em beneficio da sua pretensão, a Autora invocou que a Ré não reside no locado há mais de 20 anos.
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Devidamente citada, a Ré impugnou a versão da parte activa, dizendo que mantém residência na casa arrendada e que, estando reformada, apenas passa algum tempo em ..., onde reside e trabalha a sua filha, regressando depois sempre a sua casa, onde vive e convive com os amigos.
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Inicialmente, o Tribunal a quo declarou-se materialmente incompetente para conhecer do objecto do presente processo e absolveu a Ré da instância, nos termos do disposto nos artigos 4.º, n.º 1, alínea k), do Estatutos dos Tribunais Administrativos e Fiscais e 96.º, 97.º, n.º 1 e 99.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
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Interposto recurso, o Tribunal da Relação de Évora decidiu revogar a decisão recorrida, declarando a competência em razão da matéria do Juízo Local Cível ... (J...) para a presente acção, ordenando o prosseguimento dos autos.
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Descidos os autos, de imediato, o Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão:
«(…)
O facto vertido no artigo 9.º da petição não foi, cabalmente, impugnado uma vez que o aviso de recepção entrado nos serviços judiciais a 11-01-2023, com a Ref. ...19, não foi assinado pela própria ré, mas por terceiro. Por outro lado, é a própria ré que admite que se desloca várias vezes a ..., em visita. Pelo que se terá o mesmo por demonstrado.
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(…)
Conforme já se disse, é manifesto que a R. não usa o locado há mais de ano. Sendo certo que, no arrendamento para a habitação, como é o caso, o uso devido corresponde à residência permanente, devendo o arrendatário manter no locado o centro da sua vida familiar, social e da sua economia doméstica, no mesmo pernoitando, tomando as suas refeições, convivendo e recolhendo a sua correspondência, com carácter estável.
Estão por isso preenchidos os requisitos do artigo 1083.º, n.º 2, alínea d), do Código Civil que permitem ao senhorio, a aqui A., proceder à resolução do contrato de arrendamento em causa nos presentes autos».
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A recorrente não se conformou com a referida decisão e nas suas alegações apresentou as seguintes alegações:
«1 – De uma forma surpreendente, logo que finda a fase dos articulados, o Tribunal a quo proferiu uma decisão, decretando o despejo, considerando que se encontra provado o facto alegado em 9.º da PI.
2 – Fundamenta essa decisão dizendo o seguinte:
“O facto vertido no artigo 9.º da petição não foi, cabalmente, impugnado uma vez que o aviso de recepção entrado nos serviços judiciais a 11-01-2023, com a Ref. ...19, não foi assinado pela própria ré, mas por terceiro. Por outro lado, é a própria ré que admite que se desloca várias vezes a ..., em visita. Pelo que se terá o mesmo por demonstrado”.
Ora,
3 – Do confronto entre a PI e a Contestação resulta inequívoco que o facto 9.º da PI, contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo, foi expressamente impugnado pela Ré.
4 – Pelo que deveria ter sido considerado um facto controvertido.
E mais,
5 – Para o Tribunal a quo o facto do aviso de receção não se encontrar assinado pela Ré, mas por terceiro, é só por si determinante para decretar o despejo,
6 – Outro fundamento, na perspetiva do Tribunal a quo, é o facto da Ré ir visitar a filha a ... e passar lá 1 mês de férias.
7 – Ou seja, o Tribunal a quo desconsiderou tudo o que foi alegado pela Ré, inclusive que vive no arrendado há mais de 40 anos; que é e continua a ser a sua casa, é o centro da sua vida; é lá que tem os seus pertences; dorme e toma as refeições, recebe e convive com familiares e amigos; que não tem mais nenhuma casa; que tem feito obras de melhoramento na casa, etc..
8 – Desconsideração total da Ré por parte do tribunal a quo, pois nem foi dada sequer a possibilidade à Ré de provar em sede de Audiência de discussão de julgamento estes factos por si alegados.
9 – Correlativamente cabe à Autora provar que o alegado em 9.º da PI, ou seja que a Ré não reside na casa há mais de 20 anos e que se ausenta por períodos superiores a 1 ano,(o que é completamente falso, como já se disse na contestação e repete-se agora), e encontrando-se impugnado é ónus da Autora prová-lo.
10 – O objeto do presente litigio, é de extrema importância pois em causa está a manutenção ou não do contrato de arrendamento de uma casa, a casa de morada de família da Ré, onde vive há mais de 40 anos, e o decretamento do despejo terá consequências devastadoras na sua vida, agravadas pelo facto de já ter uma idade avançada e não ter qualquer outra casa para viver.
11 – Havendo factos controvertidos, uma decisão justa só pode ser alcançada observando toda as regras da tramitação processual, com realização de uma audiência de discussão e julgamento, designadamente para efeitos de produção de prova, com observância das regras da valoração da mesma, tudo com vista a que seja apurada a verdade e consequentemente proferida uma decisão ponderada e justa.
12 – Os fundamentos apresentados pelo tribunal a quo são, pois, contrários à lei e como tal a decisão é injusta.
13 – O artigo 9.º da PI deverá considerar-se impugnado, e como tal ser tratado como um facto controvertido, em cujo sentido se espera que V. Exas. decidam.
14 – De igual modo se espera que V. Exas. considerem e decidam que o facto do aviso de receção não se encontrar assinado pela Ré, mas sim por terceiro, deve ser considerado completamente irrelevante na tomada de uma decisão de mérito.
15 – Consequentemente, deverá ser proferido acórdão que revogue a sentença recorrida e ordene o prosseguimento dos autos para a fase de instrução seguida da respetiva audiência de discussão e julgamento.
O Direito
16 – O Artigo 1083.º, n.º 2, alínea d), do Código Civil, sob a epigrafe “Fundamento da resolução” dispõe o seguinte: “2. É fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente, quanto à resolução pelo senhorio:
d) O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º”.
17 – O artigo 9.º da PI tratando -se de um facto controvertido, porque impugnado, teria de ser objeto de prova, cujo ónus caberia à Autora, e só vindo a ser considerado provado, com respeito pelo contraditório inclusive, poderia ser subsumido na previsão do n.º 2 do artigo 1083.º do Código Civil.
18 – Por seu turno o facto da Ré ter alegado que por vezes se deslocava a ... em visita à filha e aí passando 1 mês, ou não ter assinado o aviso de receção, não pode ser considerado suficiente para preencher a citada norma, até porque o locado nunca deixou de ser a sua habitação permanente, conforme resulta das sua alegações constantes da Contestação(e que provará em sede de audiência de discussão e julgamento), pelo que foi feita uma interpretação errada da referida norma por parte do Tribunal a quo.
Nestes termos e nos mais de direito, que V. Exas. Srs. Juízes Desembargadores doutamente suprirão, deve o presente recurso ser considerado procedente e provado e, por via dele ser revogada a sentença recorrida que decretou o despejo e condenou a Ré à entrega do Locado, proferindo-se acórdão que ordene o prosseguimento dos autos para a fase de instrução e respetiva audiência de discussão e Julgamento.
fazendo-se desse modo Justiça».
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A parte contrária não apresentou alegações.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. *
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Apesar da sua exagerada extensão, analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de:
i) erro na avaliação da matéria de facto.
ii) erro de julgamento na subsunção jurídica realizada.
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III – Dos factos apurados:
3.1 – Matéria de facto provada:
Com pertinência para a decisão da causa a Primeira Instância considerou provado o seguinte:
1) A Autora é dona e legitima proprietária do prédio urbano sito na Rua ..., da União de Freguesias ... (...), concelho ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...28 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...22 (docs. 1 e 2).
2) A propriedade do referido prédio urbano foi inicialmente do Fundo de Fomento de Habitação que por sua vez transferiu o património para o IGAPHE (Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado) – Cfr. doc. 2.
3) Por escritura datada de 16 de Junho de 1995, a propriedade deste e de outros prédios urbanos foi transferida para a Santa Casa da Misericórdia de (…) – Doc. 3.
4) Em data que a Autora desconhece mas anterior a 1992, o IGAPHE celebrou um contrato de arrendamento com a Ré, cfr. doc. n.º 4 em que o IGAPHE procede à cobrança de rendas em divida ao ano de 1992.
5) Em virtude da transferência de propriedade referida 3º do presente articulado, a Autora, no que respeita ao mencionado contrato de arrendamento, assumiu a posição contratual do IGAPHE, situação que foi comunicada à Ré – Docs. 5 e 6.
7) Desde Julho de 1995, até a presente data a Ré tem pago as rendas devidas à Autora.
8) Actualmente o valor mensal da renda é de € 32,66.
9) Eliminado[1].
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3.2 – Matéria de facto não provada:
Inexiste.
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IV – Fundamentação:
A locação vem prevista nos artigos 1022.º e seguintes do Código Civil e corresponde ao «contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa mediante retribuição».
O artigo 1079.º[2] do Código Civil versa sobre as formas de cessação do arrendamento, entre as quais avulta a extinção do contrato por resolução, cujos fundamentos estão inscritos na previsão do artigo 1083.º[3] do mesmo diploma. No elenco dos fundamentos resolutivos consta o não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º[4].
Relativamente ao não uso do locado durante mais de um ano, a Meritíssima Juíza de Direito entendeu que o mesmo ocorria, fundando-se na circunstância desse facto não ter sido «cabalmente, impugnado uma vez que o aviso de recepção entrado nos serviços judiciais a 11-01-2023, com a Ref. ...19, não foi assinado pela própria ré, mas por terceiro. Por outro lado, é a própria ré que admite que se desloca várias vezes a ..., em visita. Pelo que se terá o mesmo por demonstrado».
Em função desta premissa fáctica, foi decretado o despejo do prédio urbano aqui em causa e a Ré foi condenada a entregá-lo à Autora livre e devoluto de pessoas e bens.
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É inquestionável que a circunstância de o aviso postal de citação não ter sido assinado pelo destinatário não impõe qualquer efeito confessório nos casos em que a causa de pedir se funda na falta de habitação por mais de um ano de arrendado e a situação goza de um regime específico regulado pelos artigos 228.º, n.º 2[5] e 233.º[6] do Código de Processo Civil.
Depois, uma vez concretizada a citação, importa assim apurar se ocorreu a confissão do referido facto. Isto é, o objecto principal do recurso é saber se é válida a matéria da impugnação oferecida pela Ré e se o ónus de impugnação foi perfectibilizado nos termos regulados no artigo 574.º[7] do Código de Processo Civil.
Ou, por outras palavras, cuida-se de averiguar se os factos são controvertidos ou não. E dependendo da resposta fica traçado o destino da acção em termos factuais. Se vingar a afirmativa não poderia o Tribunal dar como assente a realidade subjacente. Se, pelo contrário, se considerar a factualidade em causa como assente prevalece o entendimento contrário e a declaração havida equivale a confissão.
Lida a contestação, é seguro que a Ré rejeitou a veracidade dos factos aduzidos pela Autora quanto à matéria da falta de residência na morada arrendada. Efectivamente, tal como reclama a recorrente, do confronto entre a petição inicial e a contestação resulta inequívoco que o facto 9.º foi expressamente impugnado pela Ré, sendo assim o mesmo matéria controvertida[8].
Na realidade, a Ré apenas assume que, por vezes, se ausenta por algumas temporadas para ir visitar a filha a ..., permanecendo na casa desta um mês de férias. Porém, no conjunto da sua defesa, a Ré assinala que mantém o seu centro da sua vida no local arrendado e é nessa residência que guarda os seus pertences e executa os actos da vida quotidiana, doméstica e social.
A este propósito, é manifesta a discordância expressa pela agora recorrente, mormente nos artigos 9.º[9], 10.º[10], 11.º[11], 12.º[12], 13.º[13], 14.º[14], 15.º[15], 16.º[16], 17.º[17] e 18.º[18], entre outros, para não ser mais exaustivo na transcrição de aspectos negatórios da inexistência de um vínculo mínimo com a referida residência.
A factualidade em questão, que se mostra impugnada, não pode ser transposta para os factos provados, especialmente sem ter sido realizado um juízo crítico sobre a prova e sem serem conhecidos os elementos em que se funda a convicção do julgador em ordem a ultrapassar a dúvida criada pela contestação.
Neste enquadramento, o facto 9 não se encontra admitido por acordo e, consequentemente, será eliminado do elenco da factualidade provada (o mesmo tinha a seguinte redacção: não obstante a Ré há mais de um ano que não reside no locado, sito em ...).
Tal como resulta do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 595.º do Código de Processo Civil, o despacho saneador destina-se a conhecer imediatamente do mérito da causa, sempre que o estado do processo permitir, sem necessidade de mais provas, a apreciação, total ou parcial, do ou dos pedidos deduzidos ou de alguma excepção peremptória.
Na concepção de Lebre de Freitas o conhecimento imediato do mérito pode derivar de inconcludência do pedido, procedência ou improcedência de excepção peremptória e procedência ou improcedência do pedido[19].
Este conhecimento só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não apenas tendo em atenção a visão partilhada pelo juiz da causa[20].
O mérito da causa será julgado no despacho saneador se a questão poder ser decidida neste momento com perfeita segurança. E é ainda actual a lição de José Alberto dos Reis quando refere que «julga com segurança o Tribunal que só emite a sua decisão quando está de posse de todos os elementos necessários para proferir um veredictum consciencioso, ponderado e justo»[21] [22].
Em suma, por corresponder a matéria impugnada e por não ser passível de ser formulado um juízo de certeza e de convicção antecipado, usado em conformidade com as regras da experiência, que autorize a concluir de forma incontroversa sobre a veracidade da matéria constitutiva da acção, os autos devem assim prosseguir para a fase de julgamento.
E, como tal, o recurso apresentado é julgado procedente, revogando-se em conformidade com o atrás relatado a sentença recorrida.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir para a fase do julgamento.
Sem tributação, atento o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 20/02/2024
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Rui Manuel Duarte Amorim Machado e Moura

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[1] O facto 9 (Não obstante a Ré há mais de um ano que não reside no locado, sito em ...) foi eliminado, na sequência da reavaliação da matéria de facto realizada no ponto IV do presente acórdão.
[2] Artigo 1079.º (Formas de cessação)
O arrendamento urbano cessa por acordo das partes, resolução, caducidade, denúncia ou outras causas previstas na lei.
[3] Artigo 1083.º (Fundamento da resolução):
1 - Qualquer das partes pode resolver o contrato, nos termos gerais de direito, com base em incumprimento pela outra parte.
2 - É fundamento de resolução o incumprimento que, pela sua gravidade ou consequências, torne inexigível à outra parte a manutenção do arrendamento, designadamente quanto à resolução pelo senhorio:
a) A violação de regras de higiene, de sossego, de boa vizinhança ou de normas constantes do regulamento do condomínio;
b) A utilização do prédio contrária à lei, aos bons costumes ou à ordem pública;
c) O uso do prédio para fim diverso daquele a que se destina, ainda que a alteração do uso não implique maior desgaste ou desvalorização para o prédio;
d) O não uso do locado por mais de um ano, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 1072.º;
e) A cessão, total ou parcial, temporária ou permanente e onerosa ou gratuita, do gozo do prédio, quando ilícita, inválida ou ineficaz perante o senhorio.
3 - É inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento em caso de mora igual ou superior a três meses no pagamento da renda, encargos ou despesas que corram por conta do arrendatário ou de oposição por este à realização de obra ordenada por autoridade pública, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 3 a 5 do artigo seguinte.
4 - É ainda inexigível ao senhorio a manutenção do arrendamento no caso de o arrendatário se constituir em mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses, com referência a cada contrato, não sendo aplicável o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo seguinte.
5 - É fundamento de resolução pelo arrendatário, designadamente, a não realização pelo senhorio de obras que a este caibam, quando tal omissão comprometa a habitabilidade do locado e, em geral, a aptidão deste para o uso previsto no contrato.
6 - No caso previsto no n.º 4, o senhorio apenas pode resolver o contrato se tiver informado o arrendatário, por carta registada com aviso de receção, após o terceiro atraso no pagamento da renda, de que é sua intenção pôr fim ao arrendamento naqueles termos.
[4] Artigo 1072.º (Uso efetivo do locado):
1 - O arrendatário deve usar efectivamente a coisa para o fim contratado, não deixando de a utilizar por mais de um ano.
2 - O não uso pelo arrendatário é lícito:
a) Em caso de força maior ou de doença;
b) Se a ausência, não perdurando há mais de dois anos, for devida ao cumprimento de deveres militares ou profissionais do próprio, do cônjuge ou de quem viva com o arrendatário em união de facto;
c) Se a utilização for mantida por quem, tendo direito a usar o locado, o fizesse há mais de um ano.
d) Se a ausência se dever à prestação de apoios continuados a pessoas com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%, incluindo a familiares.
[5] Artigo 228.º (Citação de pessoa singular por via postal):
1 - A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má fé.
2 - A carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando.
3 - Antes da assinatura do aviso de receção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do cartão do cidadão, bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação.
4 - Quando a carta seja entregue a terceiro, cabe ao distribuidor do serviço postal adverti-lo expressamente do dever de pronta entrega ao citando.
5 - Não sendo possível a entrega da carta, será deixado aviso ao destinatário, identificando-se o tribunal de onde provém e o processo a que respeita, averbando-se os motivos da impossibilidade de entrega e permanecendo a carta durante oito dias à sua disposição em estabelecimento postal devidamente identificado.
6 - Se o citando ou qualquer das pessoas a que alude o n.º 2 recusar a assinatura do aviso de receção ou o recebimento da carta, o distribuidor do serviço postal lavra nota do incidente, antes de a devolver.
7 - Não sendo possível deixar aviso ao destinatário, o distribuidor do serviço postal lavra nota da ocorrência e devolve o expediente ao tribunal.
8 - No caso previsto no número anterior, se a impossibilidade se dever a ausência do citando e se, na ocasião, for indicado ao distribuidor do serviço postal novo endereço do citando, devolvido o expediente, a secretaria repete a citação, enviando nova carta registada com aviso de receção para tal endereço.
9 - No caso previsto no n.º 7, se a impossibilidade se dever a ausência do citando em parte incerta, devolvido o expediente, a secretaria dá cumprimento ao disposto no n.º 1 do artigo 236.º e, se for apurado novo endereço, repete a citação, enviando nova carta registada com aviso de receção para tal endereço.
10 - A assinatura do funcionário judicial responsável pela elaboração da citação pode ser substituída por indicação do código identificador da citação, bem como do endereço do sítio eletrónico do Ministério da Justiça no qual, através da inserção do código, é possível confirmar a autenticidade da citação.
[6] Artigo 233.º (Advertência ao citando, quando a citação não haja sido na própria pessoa deste)
Sempre que a citação se mostre efetuada em pessoa diversa do citando, em consequência do disposto no n.º 2 do artigo 228.º e na alínea b) do n.º 2 do artigo anterior, ou haja consistido na afixação da nota de citação nos termos do n.º 4 do artigo anterior, é ainda enviada, pelo agente de execução ou pela secretaria, no prazo de dois dias úteis, carta registada ao citando, comunicando-lhe:
a) A data e o modo por que o ato se considera realizado;
b) O prazo para o oferecimento da defesa e as cominações aplicáveis à falta desta;
c) O destino dado ao duplicado; e
d) A identidade da pessoa em quem a citação foi realizada.
[7] Artigo 574.º (Ónus de impugnação):
1 - Ao contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
2 - Consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, se não for admissível confissão sobre eles ou se só puderem ser provados por documento escrito; a admissão de factos instrumentais pode ser afastada por prova posterior.
3 - Se o réu declarar que não sabe se determinado facto é real, a declaração equivale a confissão quando se trate de facto pessoal ou de que o réu deva ter conhecimento e equivale a impugnação no caso contrário.
4 - Não é aplicável aos incapazes, ausentes e incertos, quando representados pelo Ministério Público ou por advogado oficioso, o ónus de impugnação, nem o preceituado no número anterior.
[8] No artigo 2.º da contestação ficou escrito o seguinte: «Já quanto ao alegado em 9.º, 10.º, 11.º, 12.º e 13.º é completamente falso, pelo que se impugnam todos eles».
[9] (9) A Ré não reside em ..., nunca residiu e nem tem intenção de residir.
[10] (10) A única ligação que a Ré tem com ..., é a sua filha.
[11] (11) A filha da Ré sim, reside e trabalha em ..., próximo de ....
[12] (12) E em consequência disso, a Ré, porque está reformada, por vezes vai visitar a filha e fica lá umas semanas ou até mesmo 1 mês ou dois em casa da filha. Outras vezes é a filha que a vem visitar a Portugal ficando com a mãe no imóvel arrendado.
[13] (13) Certo é que a Ré não também tem qualquer habitação/residência em ... e muito menos esteve ausente da sua casa, o imóvel arrendado, por longos períodos.
[14] (14) Terminada a visita regressa para a sua casa, ou seja, para o imóvel arrendado, onde vive e convive com os vizinhos.
[15] (15) Pois é aí o seu centro de vida.
[16] (16) E é também aí que tem todos os seus pertences.
[17] (17) Desde os móveis que compõem a habitação, roupas, acessórios de cozinha, frigorifico, TV, etc..
[18] (18) É também no imóvel arrendado que recebe visitas, e confraterniza com pessoas amigas, dorme, confeciona e toma refeições, vê televisão, lava e estende roupa, etc..
[19] José Lebre de Freitas, A Acção Declarativa Comum, Gestlegal, Coimbra, 2017, n.º 13.1.4.A.
[20] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/12/01, in www.dgsi.pt.
[21] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. III (reimpressão, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 190.
[22] No mesmo sentido, pode ser consultado Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Almedina, Coimbra, 1982, págs. 254-255.