Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1095/11.7TAVNF-A.G1
Relator: FERNANDO MONTERROSO
Descritores: CÚMULOS JURÍDICOS
TRIBUNAL COMPETENTE
ARTº 471º
Nº 2
DO CPP
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 12/13/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO
Decisão: CONFLITO NEGATIVO
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
Para os efeitos do art. 471 nº 2 do CPP, havendo conhecimento superveniente de concurso, o tribunal da condenação da última ou das últimas penas parcelares é o competente para a realização de todos os cúmulos jurídicos a que houver lugar, independentemente de ao caso caber a realização de um só cúmulo ou de vários “blocos” ou “ciclos” de cúmulo.
Decisão Texto Integral:
I – Resulta dos autos que o arguido M. N. sofreu as seguintes condenações:

1 – Em 19-4-2016, por sentença proferida no Proc. 1095/11.7TAVNF do atual Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2, por um crime de falso testemunho p. e p. pelo art. 360 nºs 1 e 3 do Cod. Penal, cometido em 5-7-2011, na pena de
- 7 (sete) meses de prisão.
A sentença transitou em julgado em 3-5-2018.
2 – Em 28-4-2011, no Proc. 95/19.9PBRG, por um crime de furto qualificado, cometido em 13-1-2010, na pena de:
- 10 (dez) meses de prisão.
A sentença transitou em julgado em 20-6-2011.
3 – Em 24-4-2013, no Proc. 211/12.6GCVNF, por um crime de furto qualificado, cometido em 30-4-2012, na pena de:
- 9 (nove) meses de prisão.
A sentença transitou em julgado em 14-5-2018.
4 – Em 9-5-2013, no Proc. 269/09.5GBVNF, por um crime de resistência e coação sobre funcionário, cometido em 8-10-2010, na pena de:
- 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 1 ano e 3 meses, tendo a suspensão sido posteriormente revogada.
A condenação transitou em julgado em 6-9-2018.
5 – Em 12-12-2013, no Proc. 2942/12.1TAMTS, por um crime de detenção de arma proibida, cometido em 23-8-2012, na pena de
- 3 (três) meses de prisão.
A condenação transitou em julgado em 2-10-2018.
6 – Em 1-7-2015, no Proc. 150/10.5GBCMN, por um crime de furto qualificado, cometido em 21-7-2010, na pena de
- 3 (três) meses de prisão.
A condenação transitou em julgado em 2-6-2018.
7 – Em 6-10-2011, no Proc. 1279/10.5PCBRG, por um crime de furto, cometido em 3-10-2010, na pena de
- 150 dias de multa, posteriormente convertidos em prisão subsidiária, declarada extinta em 28-11-2011..
A condenação transitou em julgado em 28-11-2011.
8 – Em 20-10-2011, no Proc. 408/09.6GCVNF, por um crime de furto e outro de burla informática, cometido em 16-7-2009, na pena de
- 3 meses de prisão, por cada crime, sendo fixada a pena única de 4 meses e 15 dias de prisão, sendo suspensa a execução da pena, suspensão que veio a ser revogada.
A condenação transitou em julgado em 14-5-2012.
9 – Em 29-3-2012, no Proc. 223/11.7GDSTS, por um crime de roubo, cometido em 28-5-2011, na pena de
- 1 ano e 3 meses de prisão, sendo a execução da pena suspensa pelo mesmo período e posteriormente sido declarada extinta.
A condenação transitou em julgado em 2-5-2013.
10 – Em 19-7-2012, no Proc. 1304/10.0GBGMR, por um crime de furto qualificado, cometido em 12-10-2010, na pena de
- 14 meses de prisão, já extinta
A condenação transitou em julgado em 27-9-2012.
11 – Em 24-1-2012, no Proc. 34/10.7GDSTS, por um crime de furto qualificado, um crime de furto simples, um crime de condução perigosa e um crime de omissão ao auxílio, cometidos em 23-8-2010, e de um crime de resistência e coação a funcionário, cometido em 21-1-2010, na pena de:
- 2 anos de prisão, suspensa na sua execução, sendo a suspensão posteriormente revogada.
A condenação transitou em julgado em 13-2-2012.
12 – Em 19-3-2012, no Proc. 306/11.3PAVNF, por um crime de furto, cometido em 5-4-2011, na pena de:
- 5 meses de prisão, suspensa na sua execução, sendo a suspensão posteriormente revogada.
A condenação transitou em julgado em 17-4-2012.
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13 – No Proc. 1095/11.7TAVNF do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2 foi, por sentença proferida em 26-3-2019, transitada em julgado em 26-4-2019, realizado o cúmulo jurídico que englobou as penas aplicadas ao arguido M. N. nesse processo e nos Procs. 211/12.6GCVNF e 2942/12.1TAMTS.
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II – Sendo suscitada questão da realização de cúmulo jurídico das diversas penas parcelares acima discriminadas, a sra. juíza do Juízo de Competência Genérica de Caminha, por despacho de 15-10-2019, proferido no Proc. 150/10.5TAVFN decidiu “que o conhecimento do concurso deverá tramitado” no Proc. 1095/11.7TAVNF do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2, por ser onde ocorreu a última condenação do arguido.

III – Por sua vez, em 15-11-2019, pelo sr. juiz do Proc. 1095/11.7TAVNF do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2, foi proferido despacho do qual resulta o entendimento de que:

Há que “fazer dois cúmulos jurídicos, onde se apurem duas penas únicas (de cumprimento sucessivo), uma que cumule as penas parcelares aplicadas nos processos descritos em 2, 4, 6 a 12 e outro que cumule as aplicadas nos processos descritos em 1, 3 e 5, sendo que, e apenas, para realizar este (último) cúmulo, nestes autos, é competente este Tribunal (…) cúmulo este, aliás, já realizado”.

O Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2 é o competente para o cúmulo jurídico das penas dos Procs. 1095/11.7TAVNF (1), 211/12.6GCVNF (3) e 2942/12.1TAMTS (5), aliás já realizado.

Porém, para a realização do cúmulo jurídico das penas dos demais processos, é competente o Juízo de Competência Genérica de Caminha, do Proc. 150/10.5GBCMN, por ser o tribunal da última condenação das penas parcelares deste ciclo de penas parcelares.

Em consequência, para o efeito, foi declarada a incompetência do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2 e a competência do tribunal do Proc, 150/10.5GBCMN do Juízo de Competência Genérica de Caminha.
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Suscitado o conflito, observou-se o disposto no art. 36 nºs 1 do CPP.

O sr. procurador-geral adjunto junto deste tribunal pronunciou-se, no sentido de “assistir razão à juíza de Vila Nova de Famalicão, nada tendo de relevante a acrescentar ao pela mesma expendido…”.

Cumpre decidir.

FUNDAMENTAÇÃO

[no essencial, com as devidas adaptações, reproduzirei a fundamentação que consta das decisões por mim proferidas nos Autos de Conflito de Competência 73/15.1GDBGC-A.G1 e 99/15.5GDBGC-A.G1 deste Tribunal da Relação de Guimarães]
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O art. 471 nº 2 do CPP dispõe que, em caso de conhecimento superveniente do concurso, “é territorialmente competente o tribunal da última condenação”.

A questão do conflito está em determinar o alcance desta norma, quando o conhecimento superveniente do concurso implicar a realização de vários «blocos» ou «ciclos» de cúmulo.

Ou seja, o «tribunal da última condenação» é o que proferiu a última condenação de todas as penas parcelares, que vão ser consideradas nos vários “blocos” de cúmulo? – como decidiu a sra. juíza de Caminha;

Ou, diferentemente, há um «tribunal da última condenação» para cada “bloco”? – como entende o sr. juiz do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2

Diga-se, desde já, que a razão está do lado da sra. juíza de Caminha.

Veja-se o ac. da Rel. Coimbra de 9-4-2014, proferido no Proc. 327/10.3PBVIS.C2, (disponível no ITIJ), para cuja fundamentação se remete.

Transcrevo o sumário:

Se forem vários os crimes conhecidos posteriormente, sendo uns praticados antes de condenação anterior e outros praticados depois dela, é o tribunal da última condenação o competente quer para a realização do cúmulo jurídico relativo a penas aplicadas antes da condenação anterior, quer para o cúmulo jurídico relativo a crimes praticados depois daquela condenação.

Acresce que a solução adotada é a única que permite definir de modo definitivo a situação processual do arguido.

Na realidade, quando há lugar à realização de vários “blocos” de cúmulos, há que decidir que penas devem integrar cada um dos blocos. Em abstrato, um tribunal pode entender que determinada pena deve integrar um “bloco” e outro que deve integrar “bloco” diferente. Igualmente, os tribunais podem ter entendimentos distintos quanto à inclusão, ou exclusão nos cúmulos das penas parcelares em que foi decidida a suspensão da execução. O mesmo pode ocorrer relativamente às penas de prisão substituídas por multa.

Estas questões têm de ser resolvidas numa só decisão, sob pena de risco de contradição de julgados. Se os cúmulos forem efetuados por dois tribunais, poderá chegar-se à situação de ambos incluírem, ou excluírem uma mesma pena do respetivo “bloco”, por terem entendimentos distintos, transitando em julgado todas as decisões.

São questões desta índole que impõem que, para salvaguarda da harmonia do sistema, a norma do art. 471 nº 2 do CPP tenha o alcance que lhe foi dado pela juíza de Caminha, havendo só uma decisão a definir toda a situação do arguido.

É também a solução que melhor serve a celeridade e eficácia processuais, pois o tribunal da última de todas as condenações é o que possui conhecimento mais atualizado sobre as condicionantes do arguido relevantes para a fixação das penas.
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Finalmente, neste despacho apenas se decide o conflito entre os srs. juízes de Camina e de Vila Nova de Famalicão, com o enquadramento acima indicado.

Não se decide, porque tal não foi objeto de divergência, sobre se as operações de cúmulo jurídico devem ser realizadas pelo tribunal singular ou pelo tribunal coletivo.

DECISÃO

Decido o presente conflito negativo atribuindo a competência ao tribunal do Proc. 1095/11.7TAVNF do Juízo Local Criminal de Vila Nova de Famalicão – J2, para, nesse processo, serem desencadeados os procedimentos necessários à realização dos cúmulos jurídicos das penas em que foi condenado o arguido M. N..
Não é devida tributação.
Observe-se o disposto no art. 36 nº 3 do CPP.
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13-12-2019

Fernando Monterroso