Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães | |||
Processo: |
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Relator: | VERA SOTTOMAYOR | ||
Descritores: | FILIAÇÃO SINDICAL CONDENAÇÃO ULTRA PETITUM LIMITE DA CONDENAÇÃO | ||
Nº do Documento: | RG | ||
Data do Acordão: | 01/23/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | APELAÇÃO IMPROCEDENTE | ||
Indicações Eventuais: | SECÇÃO SOCIAL | ||
Sumário: | I – O facto de a autora nunca ter partilhado com a Ré a sua filiação sindical não pode ser entendido como uma causa de exclusão da obrigatoriedade de retribuir a autora de acordo com o CCT aplicável, como pretende a Recorrente e muito menos se poderá concluir-se, que o facto de só agora ter sido revelada a filiação sindical da autora configura litigância de má-fé e procura incessante por enriquecimento ilícito, aliás porque a trabalhadora dispõe do prazo de um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessou o contrato para reclamar os seus créditos. Com efeito, sendo a autora filiada no SP... (Sindicato dos Professores do ...) desde 23.02.1999 e estando a Ré inscrita na Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, em conformidade com o prescrito no art.º 496.º, n.º 1 do Código do Trabalho do qual resulta que “a convenção coletiva obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante”, à relação laboral estabelecida entre Autora e Ré são aplicáveis as convenções, e respetivas alterações, publicadas nos BTE n.º 26 de 2006, n.º 47, de 2007, n.º 45 de 2009 e n.º 39 de 2017, pois foram celebradas pela CNIS e pela FENPROF ou pelo Sindicato dos Professores do .... II - Na observância do princípio do dispositivo, o tribunal está, em regra (já que em determinadas circunstâncias, o tribunal pode condenar ultra ou extra petitum- art.º 74.º do CPT, que aqui não se colhe) impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido. Ou seja, o juiz não pode conhecer, por regra, senão das questões que lhe tenham sido apresentadas pelas partes, como não pode proferir decisão que ultrapasse os limites do pedido formulado, quer no tocante à quantidade quer no que respeita ao seu próprio objecto. III - Para efeito de se estabelecer o limite da condenação, a que se refere o art.º 609.º, n.º 1 do CPC, o valor do pedido global a considerar é aquele que, decorrendo da mesma causa de pedir, se apresenta como a soma do valor de várias parcelas, em que o mesmo se desdobra ou decompõe. Assim sendo, os limites da condenação reportam-se ao pedido global e não às parcelas em que aquele se desdobra. IV. Tendo a Autora pedido a condenação do Réu no pagamento de 13.032,50€ a título de diferenças salariais, a sentença que condena a Ré/Apelante na quantia de €9 229,50 a esse mesmo título, não viola o n.º 1 do art.º 609.º do CPC, pois o montante global do pedido é superior ao montante global da condenação, é assim manifesto que não verifica a condenação extra vel ultra petitum | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO AA, residente na Praceta ..., ..., ..., ... Guimarães, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra EMP01..., com sede na na Rua ..., ... Guimarães, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe: a) A importância de 13.032,50 €, a título de diferenças salariais, no período entre 2006 e 2019; b) A importância de 1.005,90 €, a título de formação profissional não assegurada pela ré; c) Juros de mora, desde a data da citação. Tal como se fez constar na decisão recorrida, alega, em síntese, que foi contratada pela ré em 20/09/2000 para prestar o seu trabalho de educadora de infância, mediante o pagamento de retribuição mensal. A ré nunca pagou a retribuição de acordo com as tabelas salariais da convenção coletiva de trabalho aplicável. Reclama o pagamento das quantias relativas a diferenças de retribuições entre o valor pago pela ré e o que seria devido por força da convenção coletiva de trabalho aplicável, pede a condenação da Ré no pagamento de horas de formação profissional não prestadas. A Ré contestou alegando desconhecer que a autora fosse sócia de qualquer sindicato, negando a aplicabilidade da convenção coletiva de trabalho invocada pela autora. Mais alega que com a suspensão da progressão na carreira e o exercício de funções na creche a autora não completou dez anos de exercício efetivo de funções pedagógicas, pelo que inexistem diferenças salariais. As horas de formação foram prestadas, sendo que a autora esteve de baixa médica de junho de 2018 a junho de 2019. A ré deduziu pedido reconvencional por falta de aviso prévio na denúncia do contrato e requereu a condenação da autora como litigante de má fé. Conclui pela improcedência da ação, com a sua consequente absolvição do pedido. Pede a condenação da autora no pagamento de uma indemnização de montante nunca inferior a €1.500,00 e pugna pela procedência da reconvenção, com a condenação da autora a pagar-lhe o montante de €2.960,00, acrescido de juros até efetivo pagamento. Os autos prosseguiram com a sua normal tramitação e em sede de audiência de julgamento veio a Autora a desistir do pedido que havia formulado respeitante a diferenças de retribuição referente ao período temporal compreendido entre Abril de 2016 e Maio de 2019. Por despacho foi homologada a desistência parcial do pedido referente às diferenças de retribuição no período de Abril de 2016 a Maio de 2019 inclusive, com a inerente extinção dessa parte da instância e redução do pedido da autora nessa conformidade. Por fim, foi proferida sentença pela Mma. Juiz, que terminou com o seguinte dispositivo: “Nestes termos, e face ao exposto, 1. Julgo a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente, condeno a ré EMP01... a pagar à autora AA : a) a quantia de € 9 229,50 (nove mil, duzentos e vinte e nove euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa legal desde a data da citação, a título de diferenças salariais no período entre janeiro de 2005 e setembro de 2015; b) a quantia de € 404,41 (quatrocentos e quatro euros e quarenta e um cêntimos) acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa legal desde a data da citação, a título de formação profissional não assegurada pela ré. Julgo a reconvenção procedente e, consequentemente, condeno a autora AA a pagar à ré EMP01... a quantia de € 2 960,00 (dois mil, novecentos e sessenta euros), acrescida dos juros moratórios legais a contar desde a notificação do pedido reconvencional até integral pagamento, a título de indemnização por falta de aviso prévio na denúncia do contrato. * Custas integralmente por autora e ré, na proporção do respetivo decaimento – art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil – sem prejuízo da isenção subjetiva prevista no artigo 4.º n.º 1 h) do Regulamento das Custas Processuais.* Fixo o valor da ação e reconvenção em €16 998,40 (dezasseis mil, novecentos e noventa e oito euros e quarenta cêntimos) Registe e notifique.“ Inconformada com esta sentença, dela veio a Ré interpor recurso de apelação para este Tribunal da Relação, apresentando alegações, que termina mediante a formulação das seguintes conclusões, depois de aperfeiçoadas: “I. CONCLUSÕES 1ª. A Recorrente não se conforma como a matéria de facto dada como provada no ponto G da sentença em crise, motivo pelo qual impugna a mesma com base em erro manifesto na aplicação do direito, bem como da apreciação da prova produzida. 2ª. O Tribunal a quo deu como provado o facto G com base nos documentos juntos pelo SP... (Sindicato dos Professores do ...), o que não se concebe, atendendo ao facto de a Recorrida ter junto duas declarações com datas diferentes relativas à sua sindicalização. 3ª. Na petição inicial a Recorrida juntou uma declaração que atestava a sua sindicalização desde 22.01.2018, vindo, após a contestação, juntar nova declaração indicando que afinal já era sócia desde 26.02.1999, motivo pelo qual, não pode a Recorrente conformar-se com a valoração de um documento absolutamente ferido de credibilidade. 4ª. A Recorrida ao juntar a nova declaração com data de filiação de 1999, tinha como único e exclusivo intuito demonstrar que não estaria abrangida pelo congelamento das carreiras dos educadores de infância em vigor entre 2015/2016 e 2018 (que não incluiu a frente sindical que agora alega ser sindicalizada), conforme foi alegado pela Recorrente, na sua contestação. 5ª. A falta de credibilidade da referida declaração do Sindicato, demonstra-se ainda pela data indicada ser anterior à própria data em que a Recorrida consta no Sistema de Informação da SS, como inscrita enquanto trabalhadora por conta de outrem (que ocorreu em 01.09.2000), não sendo credível que a mesma fosse sindicalizada antes mesmo de ter exercido qualquer atividade profissional. 6ª. Nem sequer deveria ter sido dado como provado qualquer sindicalização da Recorrida, independentemente da data, uma vez que não foi apresentada nenhuma prova ou comprovativo dessa sindicalização, nomeadamente documentos fiscais relativos ao pagamento das quotas. 7ª. Requer-se assim que a matéria de facto dada como provada no ponto G seja alterada para matéria de facto não provada. 8ª. Por mera hipótese de raciocínio, ainda que assim não se entenda, sempre deveria ter sido a sindicalização considerada apenas desde a data de 22.01.2018, porquanto, ao abrigo do disposto nonº2 do artigo 358º do Código Civil, tal resulta da declaração junta com a petição inicial e assumido pela própria Recorrida, não sendo admissível a apresentação posterior de novas declarações com informação divergente. 9ª. Pelo que, a não se entender pela alteração da matéria do ponto G para facto dado como não provado, o que se coloca por cautela de patrocínio, sempre terá o referido ponto que ser alterado para passar a constar que a “A Autora é sócia do Sindicato dos Professores do ..., associação sindical que integra a FENPROF, desde 22.01.2018”. 10ª. O Tribunal a quo, ao considerar aplicável a Convenção Coletiva celebrada entre a CNIS e a FENPROF, ignorou e contradisse por completo o facto dado como provado no Ponto I) da sentença, do qual resulta o desconhecimento da Recorrente sobre a sindicalização da Recorrida. 11ª. Não existindo conhecimento da sindicalização por parte da entidade patronal, esta limita-se a aplicar a legislação subsidiária, por força de portaria de extensão, que, nesta situação concreta, corresponde à Convenção Coletiva celebrada entre a CNIS e a FNSTFPS. 12ª. Legislação aplicada ao longo da relação laboral de dezanove anos entre a Recorrida e a Recorrente, não sofrendo ao longo do vínculo, qualquer oposição por parte da Recorrida. 13ª. Por conseguinte, não se pode igualmente aceitar o argumento do tribunal a quo, para a não aplicação da CCT celebrada entre a CNIS e a FNSTFPS, pelo simples facto de o SP... não ser outorgante, uma vez que, havendo desconhecimento da sindicalização, tal não é exigível ou aplicável. 14ª. Contribui para o referido e para a impugnação sobre a sindicalização da Recorrida, a desistência parcial do pedido quanto aos períodos de 04/2016 a 05/2018, coincidente com o congelamento das carreiras docentes, determinado, nomeadamente, pelo CCT da CNIS e FNSTFPS e bem assim, uma assunção, pela própria Recorrida, de ser esse, por força de Portaria de Extensão, o diploma aplicável. 15ª. Não se conforma também a Recorrente quanto ao decidido relativamente à contagem do tempo de serviço prestado em creche uma vez que, embora o CCT celebrado entre a CNIS e a FNSTFPS não faça distinção entre educadores de infância, deve ser aplicado, em paralelo o Estatuto da Carreira Docente dos Educadores de Infância do Ensino Básico e Secundário. 16ª. Do referido estatuto decorre a faixa etária das crianças incluídas em pré-escolar, sendo a creche uma resposta destinada à primeira infância, sem componente letiva, motivo pelo qual se encontra sob a alçada do Ministério do Trabalho e Segurança Social e não do Ministério da Educação, o qual, inclusive, já se pronunciou no sentido de que o tempo de serviço prestado em creche não é passível de relevar para efeitos de progressão na carreira docente. 17º. Assim, mal andou o tribunal a quo ao julgar a existência de diferenças salariais, visto que a Recorrida somente exerceu funções como educadora de infância no pré-escolar nos períodos compreendidos entre 20/09/2000 a 31/08/2003; 01/09/2004 a 31/08/2007 e 01/09/2009 a 31/08/2012, num total de 9 anos de serviço para efeitos de progressão de carreira. 18ª. Consequentemente, a Recorrida sempre auferiu em conformidade com a legislação e até acima do fixado conforme se retira da análise conjunta das portarias de extensão que foram sendo aplicáveis no tempo - CCT celebrados entre a CNIS e a FNSTFPS e entre a CNIS e a FEPCES. 19ª. Em Janeiro de 2005 a Recorrida auferia € 997,00 tendo apenas 3 anos de serviço docente, ou seja, bem acima dos € 898,00 de vencimento previsto pela CCT; em janeiro de 2010, a Recorrida auferia € 1.345,00 tendo já 6 anos para efeitos de progressão de carreira, nesta sequência pelas tabelas salariais aplicáveis à data o vencimento corresponderia apenas a € 1.146,00. 20ª. Importante para a boa decisão da causa é também o facto de as tabelas salariais publicadas no BTE nº 35, de 22/9/2009 (CNIS e a FNSTFPS), com as tabelas salariais para 2008 e, posteriormente, no BTE nº 15, de 22/04/2011, para 2010, não terem sido alvo de portaria de extensão. 21ª. Por sua via, também nunca foram alvo de portaria de extensão, o BTE nº 26, de 15/07/2006, acordado entre a CNIS e FEPCES, no qual se previa os valores salariais a aplicar em 2004 e 2005 e, posteriormente, o BTE nº 11, de 22/3/2009, com as quantias a aplicar em 2008, pelo que, na ausência de sindicalização da Autora, a Recorrente não estaria obrigada a aplicar os diplomas, tornando inválidas as pretensões da Recorrida nos anos referidos (2005, 2008 e 2010). 22º. Não são devidas quaisquer diferenças salariais à Recorrida, em virtude de tudo quanto se alegou e por simples análise à legislação aplicada no tempo. 23º. Ainda que improceda tudo quanto se alegou, não se conforma a aqui Recorrente com a decisão da sentença em crise quanto aos valores alegadamente devidos, uma vez que a mesma configura violação do disposto no artigo 609º do Código de Processo Civil. 24º Na medida em que, a Recorrida, veio peticionar no período de Setembro a Outubro de 2008 a diferença salarial de € 302,00, mas a sentença em crise condenou a Recorrente no valor de € 604,00 e, igualmente, no período de Novembro a Dezembro de 2009, foi peticionada a quantia de € 110,00 mas condenada a Recorrente em € 165,00, sem qualquer explicação idónea ou fundamento. 25ª. O tribunal a quo condenou a Recorrente em quantidade superior ao peticionado pela Recorrida, efetuando uma liquidação oficiosa e sem qualquer pedido para o efeito, o que é inadmissível e ilegal, implicando, em caso de improcedência de tudo quanto mais se alegou, a redução das quantias ao inicialmente requerido. Termos em que deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta Sentença recorrida na parte em que condena a Recorrente, absolvendo-a do pagamento de quaisquer diferenças salariais, com todas as devidas e legais consequências, assim fazendo V.(as) Ex.(as), a mais inteira JUSTIÇA!” A Autora/Apelada apresentou contra-alegação concluindo pela improcedência do recurso. Admitido o recurso na espécie própria e com o adequado regime de subida e efeito devolutivo, foram os autos remetidos a esta 2ª instância. Realizado o exame preliminar e aperfeiçoadas as conclusões da alegação de recurso, foi dado cumprimento ao disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT., tendo a Exma. Procuradora Geral-Adjunta emitido douto parecer, no sentido da procedência parcial do recurso, apenas na parte em que condenou em valor superior ao peticionado. A Recorrente apresentou resposta ao parecer concluindo que, com exceção do que diz respeito à condenação em valor superior ao peticionado, não devem ser relevadas as demais conclusões constantes parecer do Ministério Público na tomada de decisão final nos presentes autos. Dado cumprimento ao disposto na primeira parte do nº 2 do artigo 657.º do Código de Processo Civil foi o processo submetido à conferência para julgamento. II – OBJECTO DO RECURSO Delimitado o objeto do recurso pelas conclusões da Recorrente (artigos 635.º, nº 4, 637.º n.º 2 e 639.º, nºs 1 e 3, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 87.º n.º 1 do CPT), as questões trazidas à apreciação deste Tribunal da Relação são as seguintes: - Impugnação da Matéria de Facto; - Da Aplicabilidade do Direito Coletivo - Da Violação da Limitação de Condenação III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO - FACTOS PROVADOS A) A autora foi admitida ao serviço da ré. B) Uma instituição particular de solidariedade social, que tem por objeto todas as atividades de caráter social, nomeadamente creche, jardim de infância, atividades tempos livres e outras de caráter social e de apoio à família. C) Por força de um contrato de trabalho, celebrado em 20 de setembro de 2000. D) A partir dessa data, a autora passou a exercer a sua atividade profissional remunerada por conta e sob a direção e fiscalização da ré. E) A autora estava classificada profissionalmente pela ré como Educadora de Infância. F) Ao serviço da ré a autora auferiu as seguintes retribuições mensais, por 35 horas semanais: Jan/2005 Dez/2005 997,00€ Jun/2007 Dez/2007 1.064,00€ Jan/2008 Set/2008 1.064,00€ Jan/2009 Ago/2009 1.084,00€ Set/2009 Out/2009 1.098,00€ Nov/2009 Dez/2009 1.345,00€ Jan/2010 Dez/2010 1.345,00€ Jan/2011 Dez/2011 1.345,00€ Jan/2012 Dez/2012 1.345,00€ Jan/2013 Ago/2013 1.345,00€ Set/2013 Dez/2013 1.345,00€ Jan/2014 Dez/2014 1.345,00€ Jan/2015 Set/2015 1.345,00€ Out/2015 Dez/2015 1.480,00€ Jan/2016 Ago/2016 1.480,00€ Set/2016 Dez/2016 1.480,00€ Jan/2017 Jun/2017 1.480,00€ Jul/2017 Dez/2017 1.480,00€ Jan/2018 Mai/2018 1.480,00€ Jun/2018 Set/2019 1.480,00€ G) A autora é sócia do Sindicato dos Professores do ..., associação sindical que integra a FENPROF, desde 26-02-1999. H) A ré encontra-se inscrita na CNIS – Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade. I) A ré desconhecia que a autora se encontrava inscrita no Sindicato dos Professores do .... J) A autora denunciou o contrato de trabalho, com efeitos imediatos, a 30-09-2020. K) A autora frequentou: - 1h50m de formação em planos de higienização, em 18-11-2015; - 8h de formação no encontro subordinado ao tema «Novos rumos para a educação de bebés e crianças em creche e jardim-de-infância», em maio de 2015; - 5 h de formação subordinada ao tema «Deixemos de brincar com a educação de infância – A implicação da criança no processo educativo», em outubro de 2015; - no ano letivo 2016/2017, formação ministrada pela nutricionista BB, num total de 15 horas; - formação “Ser verde de dentro para fora”, num total de 6 horas, nos dias 5 e 6 de junho de 2017; - o XIV Encontro Nacional da APEI – Currículo e Desenvolvimento em Educação de Infância, nos dias 7 e 8 de julho de 2017; - formação no âmbito do projeto Conversas, Educação, num total de 12 horas, em julho de 2017; - a ação de sensibilização pelos Serviços de Segurança de Apoio ao Trabalho, em 7 de fevereiro de 2018. L) A autora esteve em baixa médica desde junho de 2018 a junho de 2019. * - FACTOS NÃO PROVADOS.A autora sabe que a ré sempre cumpriu com todas as obrigações a que se encontrava adstrita e nada lhe deve. IV - APRECIAÇÃO DO RECURSO Da impugnação da matéria de facto Dispõe o artigo 662.º n.º 1 do C.P.C. aplicável por força do disposto no n.º 1 do artigo 87.º do C.P.T. e no que aqui nos interessa, que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Acresce dizer que resulta do prescrito no art.º 640.º do CPC. que tem como epígrafe o “ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto” que quando se impugne a decisão proferida quanto à matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que impunham decisão diversa, bem como, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Por fim, realçamos que no nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade do julgador ou da prova livre, consagrado no artigo no n.º 5 do artigo 607.º do CPC., segundo o qual tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que tenha formado no espirito do julgador acerca da existência de cada um dos factos controvertidos, salvo se a lei exigir para a prova de determinado facto formalidade especial. O uso dos poderes de alteração da decisão de 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de manifesta desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos impugnados, sendo certo que, só em casos excecionais poderá o Tribunal da Relação concluir de forma diferente do tribunal da 1ª instância, impondo a alteração da matéria de facto. A Recorrente nos pontos 1 a 9 das suas conclusões sustenta que a decisão proferida pela 1ª instância quanto à matéria de facto se revela de incorreta, no que respeita à alínea G) dos pontos de Facto Provados, já que atenta a falta de credibilidade dos documentos juntos aos autos designadamente os emitidos pelo Sindicato dos Professores do ..., não podia ter sido dado como provado qualquer sindicalização da recorrida, independentemente da data, uma vez que não foi junto aos autos qualquer documento comprovativo de tal sindicalização, nomeadamente fiscais relativos ao pagamento de quotas. Requer assim que o ponto G) dos pontos de facto provados passe a constar dos pontos de facto não provados, ou caso assim não se entenda deverá tal ponto ser alterado e passar a constar que a autora é sócia de tal sindicato desde 22.01.2018. O Tribunal a quo motivou a sua convicção para dar tal facto como provado da seguinte forma: “A matéria da sindicalização da autora decorre da análise dos documentos juntos que atestam tal facto. Os documentos de folhas 41 e 171 atestam especificamente a data em que a trabalhadora se inscreveu no sindicato, enquanto que o documento junto com a petição inicial tem como escopo a verificação das condições de isenção do pagamento de custas judiciais, pelo que foi considerado o teor dos primeiros, designadamente quanto à relevância a atribuir à data de filiação.” Vejamos: Ora, depois de analisada toda prova documental junta aos autos, passamos à apreciação da impugnação da matéria de facto e uma vez que se mostram cumpridos os ónus de impugnação previstos no citado art.º 640.º do CPC., cumpre conhecer da pretensão da Recorrente. Começamos por dizer que efectivamente o tribunal a quo não valorou o primeiro documento emitido pelo SP... e junto aos autos pela Autora, pois o mesmo destinava a sustentar os factos que conduziriam à isenção de custas e não a comprovar a data da filiação da Autora em tal sindicato. É nosso entendimento que o Tribunal a quo procedeu à valoração de forma escorreita e certa. Na verdade, ao invés do afirmado pela Recorrente os documentos juntos aos autos são suficientes e comprovam que a filiação da autora não ocorreu em 2018, mas sim em 1999. Assim, para além de tal ter sido declarado pelo próprio sindicato, documento junto aos autos em 19.01.2021 e que consiste numa declaração emitida pela Direção do Sindicato na qual se fez constar que a recorrida é filiada no Sindicato ... desde 26.02.1999. Por outro lado, o SP..., em 17.11.2021 veio juntar aos autos, em conformidade com o requerido pelo Recorrente, a ficha de inscrição de AA em tal sindicato, da qual resulta inequívoco, que a recorrida iniciou funções como docente no Colégio ..., em Guimarães em 1.09.1998 e em 23.02.1999 filiou-se no SP..., não sendo assim o seu primeiro emprego o que resulta do vínculo que manteve com a Recorrente. Por fim, do oficio informativo junto aos autos pela autoridade tributária resulta que das declarações de rendimentos apresentadas pela recorrida respeitantes aos rendimentos de 2001 a 2007 constam valores referentes a quotizações sindicais, sendo certo que de 2008 a 2020 tais valores deixaram de ser mencionados nas declarações de rendimentos da recorrida. Da conjugação de todos estes documentos afigura-se-nos mais do que suficiente a prova de que a autora, ainda que não tenha dado conhecimento à sua entidade empregadora, é filiada no Sindicato dos Professores do ... desde 23.02.1999, tal como foi atestado pelo próprio sindicato, que nenhum interesse tem na procedência ou improcedência da presente ação, consta ficha de filiação preenchida pela autora em Fevereiro de 1999 e resulta de algumas declarações de rendimentos da autora onde fez constar os valores das quotizações por si liquidadas. Em suma é de manter a alínea G) dos pontos de facto provados e improcede a impugnação da matéria de facto. 2. Do Direito Coletivo Aplicável Defende a Recorrente a não aplicabilidade do direito coletivo invocado na sentença, ou seja, defende a inaplicabilidade das convenções coletivas celebradas entre a CNIS e a FENPROF, por não ter tido conhecimento que a autora fosse sindicalizada, razão pela qual diz ter aplicado a CCT celebrada entre a CNIS e a FNSTFPS. No caso em apreço está em causa apurar do pagamento da retribuição mensal da autora, de acordo com a Convenção Coletiva de Trabalho celebrada entre a CNIS e a FENPROF publicada nos BTE n.º 26 de 15-07-2006, n.º 47 de 22-12-2007, 45 de 08-12-2009 e 39 de 22-10-2007. Esta é a CCT, que a recorrente se recusa a aplicar, alegando o desconhecimento da filiação sindical da recorrida. Quanto ao facto de a Recorrente não ter tido conhecimento da filiação sindical da autora, tal apenas releva no sentido de servir de justificação para a Ré não ter aplicado à autora a mencionada a CCT celebrada entre a CNIS e a FRENPROF, impondo-se, contudo, a sua aplicação assim que teve conhecimento do facto, o que admitimos ter sucedido com a interposição da presente ação. Na verdade, o facto de a autora nunca ter partilhado com a Ré a sua filiação sindical não pode ser entendido como uma causa de exclusão da obrigatoriedade de retribuir a autora de acordo com o CCT aplicável, como pretende a Recorrente e muito menos se poderá concluir-se, que o facto de só agora ter sido revelada a filiação sindical da autora configura litigância de má-fé e procura incessante por enriquecimento ilícito, aliás porque a trabalhadora dispõe do prazo de um ano a contar do dia seguinte àquele em que cessou o contrato para reclamar os seus créditos. Com efeito, sendo a autora filiada no SP... (Sindicato dos Professores do ...) desde 23.02.1999 e estando a Ré inscrita na Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, em conformidade com o prescrito no art.º 496.º, n.º 1 do Código do Trabalho do qual resulta que “a convenção coletiva obriga o empregador que a subscreve ou filiado em associação de empregadores celebrante, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros de associação sindical celebrante”, à relação laboral estabelecida entre Autora e Ré são aplicáveis as convenções, e respetivas alterações, publicadas nos BTE n.º 26 de 2006, n.º 47, de 2007, n.º 45 de 2009 e n.º 39 de 2017, pois foram celebradas pela CNIS e pela FENPROF ou pelo Sindicato dos Professores do .... Acresce ainda dizer que caso não fosse este o nosso entendimento, existem diversas Portarias de Extensão que estenderiam a aplicação daquelas convenções à autora. Assim quanto à CCT celebrada entre a CNIS e a FENPROF, publicada no BTE n.º 8, de 28/02/2002, existe a PE, publicada no BTE 6, de 15/02/2202; quanto à CCT celebrada entre a CNIS e a FENPROF publicada no BTE 47, de 22/12/2007, existe a PE 957, publicada no DR de 25/08/2008; quanto à CCT celebrada entre a CNIS e a FENPROF, publicada no BTE n.º 45, de 08/12/2009, existe a PE 280, publicada no DR de 24/05/2010. Em suma, bem andou o Tribunal a quo ao aplicar para efeitos às retribuições devidas à autora as tabelas que resultam das referidas CCTs. Insurge-se ainda a Recorrente quanto à progressão da carreira da Autora defendendo que tendo esta exercido funções no pré-escolar durante 9 anos, estes anos, não contam para a progressão na carreira, por se tratar de prestação de serviço não docente, já que não tem qualquer componente letiva ou pedagógica, o que permite concluir que ao efectuar-se a contagem do tempo de serviço descontado aqueles 9 anos, não são devidas à recorrida quaisquer diferenças salariais. Vejamos se lhe assiste razão. A Recorrente confunde a carreira docente no ensino particular cooperativo e social com a carreira docente no ensino público, sendo certo que o DL n.º 41/2012, de 21.02 – Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e Professores dos Ensinos Básico e Secundário, não é aplicável aos professores e educadores de infância do sector social, ou seja, a todos aqueles que trabalham por conta de Instituições de Solidariedade Social, como sucede no caso. Relativamente a estes professores e educadores de infância a suas carreiras são reguladas pelos IRCT, designadamente os celebrados entre a CNIS e as diferentes Federações Sindicais. Assim a progressão na carreira obedece ao estipulado na contratação coletiva sendo feita de acordo com o ali previsto, não existindo qualquer distinção para efeitos de progressão na carreira no que respeita ao facto de se estar afeto à creche ou pré-escolar, não sendo tal impeditivo de se progredir para os níveis superiores em conformidade com os anos de serviço que se vão adquirindo há medida que o tempo passa. Não vislumbramos assim qualquer razão para considerar que os 9 anos em que a autora esteve alocada ao pré-escolar prestado em creche pela autora não relevem ou devam ser descontados para efeitos de progressão na carreira docente, não ocorrendo quanto a este aspeto qualquer necessidade de nos socorrermos da Lei Base do Sistema Educativo, por não estarmos perante qualquer lacuna existente na legislação aplicável. Situação distinta e que com esta não se confunde respeita à contagem do tempo de serviço para efeitos de concurso ao ensino publico, com progressão na carreira ao serviço do ensino particular, cooperativo e social, pois em sede de concurso externo para o ensino publico, os oponentes vindos do sector particular, o tempo de serviço prestado em creche não conta como tempo de serviço docente para efeitos de graduação. Improcede nesta parte o recurso. 3. Da Violação da Limitação de Condenação Por último, considera o Recorrente que a sentença recorrida viola o disposto no art.º 609.º n.º 1 do CPC., uma vez que, no que aos valores peticionados pela autora com referência aos períodos compreendidos entre setembro de 2009 e novembro e dezembro de 2009, a condenação foi em valor superior ao peticionado, o que se revela de inadmissível e ilegal, devendo proceder-se à redução das quantias ao peticionado pela Autora. Cabe-nos agora analisar se o tribunal a quo podia ou não ter condenado, com referência aos períodos compreendidos entre setembro e outubro de 2009 e novembro e dezembro de 2009 em valor superior ao peticionado, uma vez que como refere o Recorrente, a Recorrida, veio peticionar no período de Setembro a Outubro de 2009 a diferença salarial de €302,00, tendo a condenação resultante da decisão recorrida condenado a Recorrente no que respeita a esse período de tempo no valor de €604,00 e igualmente, no período de Novembro a Dezembro de 2009, foi peticionada pela recorrida a quantia de €110,00, tendo a Recorrente sido condenada em €165,00. Contudo importa ter presente o pedido formulado a este propósito pela Autora, ou seja, a condenação da Ré a pagar-lhe a importância de 13.032,50 €, a título de diferenças salariais, no período entre 2005 (por lapso no pedido escreveu-se 2006 ao invés de 2005) e 2019, bem como o teor da decisão recorrida no que respeita à procedência deste pedido da qual consta o seguinte: Julgo a presente ação parcialmente procedente e, consequentemente, condeno a ré EMP01... a pagar à autora AA a quantia de € 9 229,50 a título de diferenças salariais no período entre janeiro de 2005 e setembro de 2015. Prescreve o n.º 1 do art.º 609 do CPC. que “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir”. E resulta da al. e) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC que a sentença é nula quando o juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. Um dos princípios basilares do direito processual civil é o princípio do dispositivo, a que alude o artigo 5.º n.º 1 do CPC, segundo o qual “às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a caus de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas” e o artigo 608.º n.º 2 do mesmo diploma, o qual estabelece que “o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. Daqui resulta que às partes incumbe o dever de alegar os factos que integram o direito que pretende ver reconhecido e ao juiz impõe-se o dever de fundamentar a sua decisão nesses factos e de resolver todas as questões suscitadas pelas partes Na observância deste princípio, o tribunal está, em regra (já que em determinadas circunstâncias, o tribunal pode condenar ultra ou extra petitum- art.º 74.º do CPT, que aqui não se colhe) impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido. Ou seja, o juiz não pode conhecer, por regra, senão das questões que lhe tenham sido apresentadas pelas partes, como não pode proferir decisão que ultrapasse os limites do pedido formulado, quer no tocante à quantidade quer no que respeita ao seu próprio objecto. Ora, a proibição de condenação em quantidade superior à do pedido, consignada no art.º 609.º, n.º 1 do CPC, é justificada pela ideia de que compete às partes a definição do objecto do litígio, não cabendo ao juiz o poder de se sobrepor à vontade das partes, e de que não seria razoável que o demandado fosse surpreendido com uma condenação mais gravosa do que a pretendida pelo autor. É na observância do princípio do dispositivo que o tribunal está impedido de condenar em quantia superior ou em objecto diverso do que for pedido. Como se refere no Acórdão do STJ, e 25.03.2010, acessível em www.dgsi.pt “Encontra-se, há muito, firmado na jurisprudência o entendimento segundo o qual os limites da condenação contidos no art.º 661.º, n.º 1 do CPC têm de ser entendidos como referidos ao valor do pedido global e não às parcelas em que aquele valor se desdobra. Esta orientação tem sido assumida como válida na solução de casos em que o efeito jurídico pretendido se apresenta como indemnização decorrente de um único facto ilícito, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, a certa espécie ou classe de danos (v.g. danos patrimoniais e danos não patrimoniais, danos emergentes e lucros cessantes, danos presentes e danos futuros), componentes ou integrantes do direito cuja tutela é jurisdicionalmente solicitada. Compreende-se que assim seja nos casos em que, com base na descrição de uma situação de facto, se afirma a titularidade de um direito que se pretende ver tutelado mediante a declaração da sua existência e a concretização em valor único da sua dimensão global, porque, então, se trata de pedido unitário, decomposto ou desdobrado em parcelas que integram um só efeito jurídico, com a mesma e única causa de pedir. Com efeito, na definição legal (artigo 498.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), pedido é o efeito jurídico que se pretende obter com a acção, traduzindo uma pretensão decorrente de uma causa, a causa de pedir, consubstanciada em factos concretos [artigos 467.º, alínea d), e 498.º, n.º 4, 1.ª parte, do Código de Processo Civil], sendo, pois, os dois elementos (pedido e causa de pedir) indissociáveis, como elementos identificadores da acção e delimitadores do seu objecto, do que resulta que o pedido se individualiza como a providência concretamente solicitada ao tribunal em função de uma causa de pedir”. Concordamos com estes ensinamentos que entendemos serem de transpor para o caso em apreço, dando como assente que para efeito de se estabelecer o limite da condenação, a que se refere o art.º 609.º, n.º 1 do CPC, o valor do pedido global a considerar é aquele que, decorrendo da mesma causa de pedir, se apresenta como a soma do valor de várias parcelas, em que o mesmo se desdobra ou decompõe. Assim sendo, os limites da condenação reportam-se ao pedido global e não às parcelas em que aquele se desdobra. Considera o Apelante que o limite referido no art.º 609 nº1 do CPC não se deve aferir por referência ao pedido global, porquanto a autora em sede de petição inicial decompôs em parcelas as diferenças salariais reclamadas, mês a mês, ou seja, de forma autónoma peticiona tais diferenças salariais, encontrando uma diferença para mais, entre o montante reclamado a título de diferença salarial dos meses de Setembro a Dezembro de 2009 e o montante da condenação. Contudo desde já dizemos que não assiste razão ao apelante, pois se por um lado as diferenças salariais foram peticionadas mês a mês, por outro lado o pedido formulado a este propósito apresenta-se como de diferenças salariais no valor total e tal decorre de um único facto de uma única causa de pedir, que consiste no apuramento da retribuição devida à autora no decurso da relação laboral, traduzindo-se o total do pedido na soma dos valores de várias parcelas, que correspondem, cada uma delas, à diferença reclamada a título de retribuição com referência a cada um dos meses. Não será pelo facto de o pedido de diferenças salariais correspondente aos anos de 2005 a 2019 no corpo da petição ter sido deduzido parcelarmente, que não se atenderá ao entendimento por nós acima assumido. Na verdade, podemos afirmar ao invés do defendido pelo Apelante, não se mostra violado o princípio do pedido que impede a condenação em valor superior ao peticionado, já que estamos perante um valor parcelar das diferenças salariais globalmente peticionadas, sendo certo que a limitação quantitativa da condenação implícita no art.º 609.º n.º 1 do CPC se reporta ao valor global e não ao das concretas parcelas que integram o valor total do pedido. A Autora/apelada pediu a título de diferenças salariais no período entre 2005 e 2019, a importância de 13.032,50€. Ora, tendo a Autora pedido a condenação do Réu no pagamento de 13.032,50€ a título de diferenças salariais, a sentença que condena a Ré/Apelante na quantia de €9 229,50 a esse mesmo título, não viola o n.º 1 do art.º 609.º do CPC, pois o montante global do pedido é superior ao montante global da condenação, é assim manifesto que não verifica a condenação extra vel ultra petitum. A obrigação a que a Ré/Recorrente se encontra vinculada é una e proveniente do mesmo facto – retribuição inferior à devida. A Autora/Recorrida não fica investida em vários direitos de crédito – tantos quantas as parcelas em que, para a determinação do quantum global, mas sim num único direito de crédito. É isto que explica, que os limites da condenação, ditados pelo princípio da disponibilidade objectiva, se entendem referidos ao pedido global e não às parcelas em que, para a determinação do quantum global, há que desdobrar o seu cálculo. Sem que se possa falar em violação do n.º 1 do art.º 609 do CPC, o Tribunal pode condenar na procedência do quantitativo total ou parcial do pedido formulado pela autora, ainda que com diferentes montantes de cada uma das suas parcelas, tal como sucedeu no caso. A autora pediu determinada importância a título de diferenças salariais referentes a vários meses e anos, decorrente do facto da sua retribuição ter sido fixada em valor inferior ao devido, o tribunal pode considerar a ação parcialmente ou totalmente procedente, ainda que faça uma diferente avaliação de cada uma das parcelas identificadas pela autora. Neste sentido cfr. Ac. da RC de 21.03.2013, Proc. n.º 793/07.4TBAND.C1, acessível em www.dgsi.pt. Pelo exposto e sem necessidade de nos debruçarmos sobre a Condenação extra vel ultra petitum resultante do prescrito no art.º 74.º do CPT, que no caso sempre seria de considerar não aplicável, pois o crédito em causa não seria de considerar direito irrenunciável, teremos de concluir que a condenação levada a cabo pelo tribunal a quo no que respeita às diferenças salariais se conteve dentro dos limites traçados pelo n.º 1 do art.º 609.º do CPC, já que não se verifica ter ocorrido uma condenação superior do que foi pedido. Improcede assim totalmente o recurso V - DECISÃO Pelo exposto, e ao abrigo do disposto nos artigos 87.º do C.P.T. e 663º do C.P.C., acorda-se, neste Tribunal da Relação de Guimarães em negar provimento ao recurso de apelação interposto por EMP01..., e consequentemente é de manter a decisão recorrida. Custas a cargo da Recorrente. Guimarães, 23 de Janeiro de 2024 Vera Maria Sottomayor (relatora)Antero Dinis Ramos Veiga Maria Leonor Barroso |