Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
820/17.7T8GMR-L.G1
Relator: JOSÉ ALBERTO MOREIRA DIAS
Descritores: INSOLVÊNCIA
CUSTAS
DÍVIDAS DA MASSA INSOLVENTE
DÍVIDAS DE INSOLVÊNCIA
BENS ONERADOS COM GARANTIA REAL
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- Para efeitos de pagamento a serem efetuados no âmbito do processo de insolvência impõe-se distinguir entre: a) dívidas da massa insolvente e b) dívidas sobre a insolvência.
2- As dívidas da massa insolvente são as que se constituem, grosso modo, após a declaração da insolvência e cuja constituição resulta do próprio processo de insolvência e encontram-se elencadas, de modo não taxativo, no art. 51º do CIRE, delas fazendo parte, além do mais, as custas do processo de insolvência, a remuneração do administrador da insolvência e as despesas deste, bem como as dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente.
3- As dívidas da insolvência são as que se constituíram antes da declaração da insolvência e que tenham sido julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, devendo o pagamento dessas dívidas observar a graduação efetuada nessa sentença, de acordo com o regime previstos nos arts. 173º a 184º do CIRE, ou seja, tendo em consideração as garantias e privilégios que lhes assistem sobre os bens apreendidos para a massa insolvente, em função do que ficou decidido na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, e em função do princípio da igualdade entre as diversas categorias de créditos.
4- A massa insolvente destina-se a liquidar, a título principal, as dívidas da massa insolvente e apenas, a título subsidiário (com o remanescente que resultar da liquidação da massa insolvente, uma vez garantido o pagamento das dívidas da massa insolvente), as dívidas da insolvência que tenham sido julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado.
5- As dívidas da massa insolvente são pagas com os rendimentos gerados pela própria massa insolvente, mas no caso de não existirem rendimentos gerados pela massa ou desse rendimento ser insuficiente para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente, o pagamento destas processa-se à custa do produto da liquidação dos bens que integram a massa insolvente, proporcionalmente, tendo em consideração o produto de liquidação de cada um desses bens.
6- Contudo, tendo sido apreendidos para a massa insolvente bens que se encontrem onerados com garantias reais que garantam créditos sobre a insolvência de credor desta (crédito esse e respetiva garantia real julgados verificados e graduados na sentença de verificação e graduação de créditos, transitado em julgado) e bens apreendidos para a massa que não se encontrem onerados com garantia real, os bens apreendidos para a massa que se encontram onerados com garantia real apenas respondem pela satisfação das dívidas da massa insolvente com 10% do valor da sua liquidação, tendo a restantes parte das dívidas da massa insolvente de serem pagas à custa do valor da liquidação dos bens que integram a massa insolvente que não se encontram onerados com garantias reais (na proporção do valor de liquidação de cada um desses bens). Apenas no caso do valor de liquidação dos bens apreendidos para a massa que não se encontrem onerados com garantia real (acrescido de 10% do valor de liquidação dos bens apreendidos para a massa que se encontrem onerados com garantia real) não ser suficiente para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente é que o pagamento dessas dívidas é feito à custa do produto de liquidação dos bens apreendidos para a massa que se encontrem onerados com garantias reais, sem qualquer limite.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I- RELATÓRIO

Por sentença proferida em 06/03/2017, transitada em julgado, EMP01..., S.A., com sede no Lugar ..., freguesia ..., ... e ..., ... Guimarães, foi declarada insolvente.
Em 08/05/2017, o administrador da insolvência juntou ao apenso B (apenso de apreensão de bens) auto de apreensão, em que se vê que, em 07/04/2017, foram apreendidos para a massa insolvente os seguintes bens:
Verba n.º 1
Uma serra para pedra “...” de 10000mm.
Verba n.º 2
Um martelo hidráulico sem marca visível.
Verba n.º 3
Um trator agrícola “... F40”.
Verba n.º 4
Uma máquina para cortar cubos “... 200-50-200”.
Verba n.º 5
Uma máquina para cortar cubos “... 200-50-200” sem centra hidráulica.
Verba n.º 6
Um depósito para gasóleo de cerca de 700 litros, com bomba.
Verba n.º 7
Uma pá carregadora “... W 60”.
Verba n.º 8
Uma secretária em L, 3 cadeiras, material informático fora de uso, um computador com monitor, teclado e rato, uma mesa redonda, uma marquesa e uma balança.
Verba n.º 9
Uma viatura ligeira de passageiros “...”, com a matrícula ..-..-PN.
Verba n.º 10
Uma viatura ligeira de passageiros “...”, com a matrícula ..-DU-...
Verba n.º 11
Uma viatura ligeira “...”, com a matrícula ..-..-QO.
Verba n.º 12
Uma viatura ligeira de matrícula “...”, com a matrícula ..-CE-...
Verba n.º 13
Uma viatura pesada “... ...”, com a matrícula ..-..-UP
Verba n.º 14
Uma viatura pesada “... 1317”, com a matrícula ..-..-QI do ano de 1989 e grua “...”.
Verba n.º 15
Um porta-inertes “... S/LF-...58”, com a matrícula L-.......
Verba n.º 16
Uma viatura ligeira de passageiros “... 960”, com a matrícula ..-..-CM
Verba n.º 17
Uma viatura ligeira de passageiros “... ...”, com a matrícula RM-..-...
Verba n.º 18
Uma viatura ligeira de mercadorias da marca ...”, com a matrícula ..-..-CA (estado de sucata).
Verba n.º 19
Uma viatura ligeira de passageiros da marca ...”, com a matrícula ..-..-TU.
Verba n.º 20
Uma cisterna “...”, com a matrícula P-....5.
Verba n.º 21
Uma viatura pesada “MAN ....3”, com a matrícula ..-..-JC.
Verba n.º 22
Prédio rústico, com a área de 7.800 m2, sito em ... e ..., confronta a norte com ..., a sul com caminho servidão e AA, a poente com o próprio e a nascente com ... e AA, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...74 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...8 (proveniente do artigo ...4 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 228,45€.
Verba n.º 23
Prédio rústico, com a área de 4.000 m2, sito em ..., confronta a norte com caminho público, a sul com o próprio, a poente com BB e a nascente com Quinta ..., da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...04 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...02 (proveniente do artigo ...54 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 1.200,00€.
Verba n.º 24
Prédio rústico, com a área de 6.000 m2, sito em Lugar ... ou ..., confronta a norte com ..., a sul com caminho, a poente com limite de freguesia com ... e a nascente com CC, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...60 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...8 (proveniente do artigo ...2 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 212,09€.
Verba n.º 25
Prédio rústico, com a área de 22.593m2, sito em Lugar ..., confronta a norte com DD, a sul com estrada municipal, EE e outro, a poente com FF e a nascente com GG e Filhos e EE e outro, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...69 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo...7 (proveniente do artigo ...5 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 776,13€.
Verba n.º 26
Prédio rústico, com a área de 2.925 m2, sito em Lugar ..., confronta a norte com caminho, HH e II, a sul e nascente com JJ e Irmãos e a poente com II, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...73 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...3 (proveniente do artigo ...7 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 55,27€.
Verba n.º 27
Prédio urbano, destinado a pedreiras, sito na Lugar ..., confronta a norte com o próprio, a sul com baldio, a nascente com Monte da Provisão e a poente divisão do ... e BB, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...85 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...11, com valor patrimonial de 1.003.374,13€.
Verba n.º 28
Fração autónoma designada pela letra ..., destinada a comércio, similares de hotelaria ou serviços no ... do prédio sito na Rua ..., freguesia ... do concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...99, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...86 (anterior 1099 – ... – extinta), com valor patrimonial de 149.101,59€.
Verba n.º 29
Fração autónoma designada pela letra ..., destinada a comércio, no ... do prédio sito na Praceta ... – Praceta ..., Lugar ..., da União de freguesias ... (... e ...) do concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...32, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...45 (anterior 2028 – ... – extinta), com valor patrimonial de 164.366,88€.
Verba n.º 30
Prédio rústico, com a área de 2.700 m2, sito em Lugar ..., confronta a norte com Estrada Municipal, a sul com terreno e caminho, a nascente com caminho e a poente com KK, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...70 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...87 (proveniente do artigo ...49 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 500,00€.
Verba n.º 31
Prédio rústico, com a área de 4.000 m2, sito em Lugar ..., confronta a norte com estrada municipal, a sul com EMP02..., Lda., a nascente com EMP02..., Lda. e a poente com terreno maninho, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...71 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...2 (proveniente do artigo ...6 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 23,94€.
Verba n.º 32
Prédio rústico, com a área de 6.262 m2, sito em Lugar ... ou ..., confronta a norte com caminho, a sul com ..., a nascente com CC e a poente com limite de freguesia ..., da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...61 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...1 (proveniente do artigo ...5 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 23,14€.
Verba n.º 33
Prédio urbano, com a área de 47.172 m2, destinado a Pedreiras, sito no Lugar ..., denominado por ..., da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...02 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...01 (proveniente do artigo ...99 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 1.446.694,35€.
Verba n.º 34
Prédio rústico, com a área de 4.716 m2, sito em Lugar ..., confronta a sul com ..., a norte, nascente e poente com “EMP02..., Lda.”, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...48 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...50 (proveniente do artigo ...84 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 700,00€.
Verba n.º 35
Prédio rústico, com a área de 8.200 m2, sito em Lugar ... ou ..., confronta a norte com ... e outro, a sul com limite de freguesia com ..., a nascente com EMP02..., Lda. e a poente com LL, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...10 e ...09 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...5 (proveniente do artigo ...9 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 567,83€.
Verba n.º 36
Prédio rústico, com a área de 16.000m2,sitoem... e ..., confronta a norte com ..., a sul com junta de freguesia, a poente com limite de freguesia com ... e a nascente com junta de freguesia e HH, da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., descrito na C.R.P. ... sob o n.º ...35 e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...6 (proveniente do artigo ...0 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 1.669,48€.
Verba n.º 37
Prédio rústico, com a área de 1000 m2, sito em ..., confronta a norte com ..., a sul com ..., a poente com CC e a nascente com ..., da união de freguesias ..., ... e ..., do concelho ..., não descrito na Conservatória do Registo Predial e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...41 (proveniente do artigo ...79 da extinta freguesia ...), com valor patrimonial de 140,00€.
Verba n.º 38
Prédio rústico, com a área de 4800 m2, sito em ..., confronta a norte com limite concelho ..., a sul com MM, a poente com NN e a nascente com limite concelho ..., da freguesia de ... do concelho de ..., não descrito na Conservatória do Registo Predial e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...18, com valor patrimonial de 37,41€.
Verba n.º 39
Direito ao valor da venda realizada nos processos executivos n.º ...72, ...29, ...70, ...67 e ...76 do 1.º Serviço de Finanças ... correspondente à fração autónoma designada pela letra ..., correspondente ao ..., destinado a comércio do prédio urbano sito na Rua ..., freguesia ... do concelho ..., descrita na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...99, inscrito na respetiva matriz predial urbana sob o artigo ...86 (anterior 1099 – ... – extinta). Adjudicada ao Banco 1..., SA, conforme auto de adjudicação lavrado a 08 de setembro de 2016, com a referência de venda n.º ...74....

O administrador da insolvência apresentou a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, a que alude o art. 129º do CIRE, que se encontra junta ao apenso de verificação de créditos (apenso A) em 08/05/2017.
Em 21/03/2017, foi proferida (no apenso A) sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, em que: se julgou procedente a impugnação apresentada pelo credor OO e se julgou verificado o crédito respetivo; se julgou verificado o crédito da EMP03..., no valor indicado pela mesma face ao acordo das partes manifestado nos respetivos articulados/requerimentos; se julgou procedente a impugnação do crédito da D... e verificado o respetivo crédito no montante de 4.579,50 euros; se homologou a desistência da impugnação deduzida relativamente ao crédito da Car... e julgou-se verificado o crédito desta nos exatos termos pela mesma reclamados; se homologou a desistência do pedido formulado pela Car... de condenação da devedora como litigante de má-fé; se julgou improcedente a impugnação deduzida pela devedora relativamente ao crédito de Banco 2..., julgando este verificado nos exatos termos reclamados e reconhecidos pelo administrador da insolvência na lista de créditos reconhecidos que aduziu nos autos, constando essa sentença da seguinte parte dispositiva (procede-se à sua transcrição ipsis verbis):

“1. Pelo exposto, julgo verificados os créditos identificados de 1 a 100, com as alterações supramencionadas e resultantes das impugnações à lista de créditos e da decisão que sobre as mesmas recaiu.
2. Graduo os supramencionados créditos verificados pela ordem seguinte:
A. Para serem pagos pelas quantias em dinheiro resultantes da venda dos bens móveis, identificados nas verbas nºs 1 a 8 do auto de apreensão de bens de fls. 3 verso - 7 do apenso B:
1. Os créditos privilegiados laborais mencionados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 90, 91 e 97 e reconhecidos nos montantes constantes da lista/parecer do Sr. Administrador
2. Em segundo lugar pagar-se-á o crédito da Fazenda por impostos (IVA e IRS).
3. Em terceiro lugar pagar-se-á o crédito da Segurança Social.
4. Em quarto lugar pagar-se-á o crédito privilegiado do Requerente da Insolvência, PP (art. 98º do CIRE).
5. Em quinto lugar pagar-se-ão os restantes créditos reconhecidos e verificados, na qualidade de créditos comuns, rateadamente e sempre até onde chegar o produto da massa insolvente.
6. Em último lugar os créditos subordinados.
B. Para serem pagos pela quantia em dinheiro resultante da venda dos veículos automóveis apreendidos e identificados sob as verbas nºs 9 a 21 do referido auto de apreensão:
1. O crédito de IUC por referência a cada um dos montantes e dos respetivos veículos tributáveis.
2. Em segundo lugar os créditos privilegiados laborais mencionados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 90, 91 e 97 e reconhecidos nos montantes constantes da lista/parecer do Sr. Administrador.
3. Em terceiro lugar pagar-se-á o crédito da Fazenda por impostos (IVA e IRS).
4. Em quarto lugar pagar-se-á o crédito da Segurança Social.
5. Em quinto lugar pagar-se-á o crédito privilegiado do Requerente da Insolvência, PP (art. 98º do CIRE).
6. Em sexto lugar pagar-se-ão os restantes créditos reconhecidos e verificados, na qualidade de créditos comuns, rateadamente e sempre até onde chegar o produto da massa insolvente.
7. Em último lugar os créditos subordinados.
C. Para serem pagos pela quantia em dinheiro resultante da venda dos imóveis apreendidos e identificados sob as verbas nºs 22 a 27 e 30 a 38 do auto de apreensão de bens de fls. 3 verso - 7, constante do apenso B:
1. Os créditos privilegiados laborais mencionados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 90, 91 e 97 e reconhecidos nos montantes constantes da lista/parecer do Sr. Administrador.
2. Em segundo lugar pagar-se-á o crédito de IMI.
3. Em terceiro lugar o crédito hipotecário da Segurança Social apenas quanto às verbas 22 a 27.
4. Em quarto lugar pagar-se-á o crédito da Segurança Social na parte privilegiada e não garantida (cfr. Ac. Relação de Coimbra de 15/02/2011).
5. Em quinto lugar pagar-se-á o crédito da Fazenda por impostos (IRS).
6. Em sexto lugar pagar-se-ão os restantes créditos reconhecidos e verificados, na qualidade de créditos comuns, rateadamente e sempre até onde chegar o produto da massa insolvente.
7. Em último lugar os créditos subordinados.
D. Para serem pagos pela quantia em dinheiro resultante da venda dos imóveis descritos sob as verbas nºs 28 e 29 do auto de apreensão de bens do apenso B:
1. O crédito de IMI.
2. Em segundo lugar o crédito hipotecário do Banco 1... (hipoteca de 1º grau), observando-se a preferência resultante do registo.
3. Em terceiro lugar pagar-se-á o crédito hipotecário da Segurança Social (hipoteca de 2º grau), observando-se a preferência resultante do registo.
4. Em quarto lugar pagar-se-á o crédito da Segurança Social na parte privilegiada e não garantida (cfr. Ac. Relação de Coimbra de 15/02/2011).
5. Em quinto lugar pagar-se-á o crédito da Fazenda por impostos (IRS).
6. Em sexto lugar pagar-se-ão os restantes créditos reconhecidos e verificados, na qualidade de créditos comuns, rateadamente e sempre até onde chegar o produto da massa insolvente.
7. Em último lugar os créditos subordinados.
E. Para serem pagos pelo direito ao valor da venda realizada no âmbito dos processos executivos melhor identificados sob a verba nº 39 do suprarreferido auto de apreensão:
1. O crédito de IMI.
2. O crédito do Banco 1..., S.A. enquanto credor garantido/hipotecário e a quem foi adjudicada a fração objeto da venda.
3. Os créditos privilegiados laborais mencionados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 90, 91 e 97 e reconhecidos nos montantes constantes da lista/parecer do Sr.  Administrador (enquanto privilégio mobiliário uma vez que a apreensão respeita a uma quantia em dinheiro, não obstante a preferência do credor hipotecário nos termos já suprarreferidos).
4. Em quarto lugar pagar-se-á o crédito da Fazenda por impostos (IVA e IRS enquanto privilégio mobiliário).
5. Em quinto lugar pagar-se-á o crédito da Segurança Social.
6. Em sexto lugar pagar-se-á o crédito privilegiado do Requerente da Insolvência, PP (art. 98º do CIRE).
7. Em sétimo lugar pagar-se-ão os restantes créditos reconhecidos e verificados, na qualidade de créditos comuns, rateadamente e sempre até onde chegar o produto da massa insolvente.
8. Em último lugar os créditos subordinados.
As custas da insolvência, assim como as despesas de liquidação, incluindo a remuneração do administrador, constituem dívidas da massa insolvente, as quais são liquidadas previamente aos créditos sobre a insolvência - art.º 51.º e 172.º do CIRE.
Custas pela massa insolvente.
Notifique e registe”.

Em 14/10/2022, o administrador da insolvência apresentou nos autos principais requerimento de cálculo da remuneração variável e de proposta de distribuição e de rateio final, nos termos do art. 182º, n.º 3 do CIRE, alegando:
“Conforme se poderá verificar pelo mapa de distribuição relativo às verbas n.ºs 28, 29 e 39 (último quadro da proposta de rateio), o credor Banco 1..., S.A., já recebeu a quantia de 183.220,00€, que corresponde aos pagamentos efetuados nos termos do artigo 174º do CIRE e ainda à dispensa do depósito de preço na aquisição do imóvel apreendido sob a verba n.º 29.
Acontece que as despesas da massa insolvente, já aprovadas em sede de prestação de contas, foram de montante superior ao expectável aquando da realização dos referidos pagamentos efetuados ao Banco 1..., pelo que o banco recebeu mais do que deveria ter recebido, conforme demostrado na proposta de distribuição.
Assim, atendendo ao disposto no artigo 172º, n.º 2 do CIRE, visto que a precipuidade se encontra garantida, isto é, que as despesas foram alocadas na proporção do produto da venda dos bens, conforme se demonstra no quadro relativo à imputação das despesas, o conjunto das verbas n.ºs 28, 29 e 39 apenas tem para distribuir pelos credores a quantia global de 163.237,84€.
Deste modo, atendendo que o credor Estado - Fazenda Nacional recebe 7.244,33€ na distribuição destas três verbas, cabe ao credor Banco 1... devolver a quantia de 27.226,49€”.
Juntou em anexo a esse requerimento os seguintes quadros:

Cálculo da Remuneração Variável do Administrador Judicial

Lei n.º 22/2013 de 26 de Fevereiro com as alterações da Lei n.º 9/2022 de 11 de Janeiro (EAJ)
Processo n.º 820/17.... Tribunal Judicial da Comarca ... - Juízo de Comércio ... - Juiz ...

Insolvência de EMP01..., S.A.

Receitas totais do processo

Despesas totais do processo [A]
                   474 430,08 €

77 886,79 €
Resultado da liquidação do ativo                   396 543,29




Resultado da liquidação da Massa Insolvente -nos termos do artigo 23º, n.º 6 do EAJ [B]                   399 003,29
(1) Cálculo da 1ª parcela da remuneração variável -artigo 23º, n.º 4, alíneab) e n.º 10 do EAJ

(2) IVA a 23%
                     19 950,16 €

4 588,54 €




Montante dos créditos satisfeitos-nostermosdo artigo 23º, n.º 7 do EAJ                     372 004,59
(3) Cálculo da 2ª parcela da remuneração variável - artigo 23º, n.º 7 do EAJ

(4) IVA a 23%
                      18 600,23 €

4 278,05 €

REMUNERAÇÃO VARIÁVEL (1)+(3)

IVA a 23% (2)+(4)
                     38 550,39 €

8 866,59 €
TOTAL DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL                     47 416,98


[A] com exceção da remuneração variável aqui calculada.
[B] exceciona a remuneração fixa e respetivo IVA, bem como as custas de processos judiciais pendentes na data da declaração da insolvência, quando aplicável.

MAPA DE RATEIO – artigo 182º, n.º 3 do CIRE
Produto da liquidação dos bens móveis (V. 1 a8)                                   9 700,00 euros
Produto da liquidação dos bens móveis-veículos (V. 9 a21)             35.960,00 euros
Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 22 a27 e30 a38)         206.500,00 euros
Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 28 e29)                          165.800,00 euros
Produto da liquidação do bem imóvel (V. 39)                                            56.025,08 euros
Recebimento proveniente de processos judiciais                             445.08 euros
Total receitas                                                                                                     474.430,08 euros


Despesas do Processo:
Despesas aprovadas na prestação de contas                                             77.686,79 euros
Provisão para transferências bancárias do rateio                                          200,00 euros
Cálculo Remuneração Variável do AI (c/IVA)                                     47.416,98 euros                                                                                                                                                             
Total Despesas                                                                                124.303,77 euros
Saldo da Insolvência                                                                         349.126,31 euros





Pagamento credores privilegiados-créditoslaborais
Resultado da liquidação: verbas 1 a 8; remanescente das verbas 9 a 21; verbas 22 a 27 e 30 a 38; recebimentos de processos judiciais
184 479,25

Reconhecido    %



OO QQ RR SS TT
UU VV
WW XX
PP YY
ZZ AAA BBB CCC DDD EEE FFF
Recebeu do                 Remanescente F.G.S.                reconhecido
5 478,39 €                       -      €               5 478,39 €                        0,76% 4 556,21 €                       -      €               4 556,21 €                        0,63% 24 161,57 €          10 026,00 €             14 135,57 €                        1,97% 15 833,00 €            8 730,00 €               7 103,00 €                        0,99% 26 750,49 €          10 026,00 €             16 724,49 €                        2,33% 33 185,55 €          10 026,03 €             23 159,52 €                        3,22% 18 245,86 €          10 026,01 €               8 219,85 €                        1,14% 19 823,00 €          10 026,00 €               9 797,00 €                        1,36% 34 441,81 €          10 026,00 €             24 415,81 €                        3,40% 5 610,18 €                       -      €               5 610,18 €                        0,78% 23 728,06 €          10 026,00 €             13 702,06 €                        1,91% 19 029,45 €                       -      €             19 029,45 €                        2,65% 36 437,27 €          10 026,00 €             26 411,27 €                        3,67% 32 460,35 €          10 026,00 €             22 434,35 €                        3,12% 38 325,22 €          10 026,00 €             28 299,22 €                        3,94% 34 515,60 €          10 026,00 €             24 489,60 €                        3,41% 22 998,77 €          10 026,00 €             12 972,77 €                        1,80% 31 220,71 €          10 026,00 €             21 194,71 €                        2,95%
PAGAMENTO A EFETUAR
1 405,62 1 169,01 3 626,84 1 822,45 4 291,09 5 942,16 2 109,01 2 513,67 6 264,49 1 439,43 3 515,61 4 882,48 6 776,48 5 756,10 7 260,88 6 283,42 3 328,49 5 438,04

Fica em Dívida

4 072,77 € 3 387,20 € 10 508,73 € 5 280,55 € 12 433,40 € 17 217,36 € 6 110,84 € 7 283,33 € 18 151,32 € 4 170,75 € 10 186,45 € 14 146,97 € 19 634,79 € 16 678,25 € 21 038,34 € 18 206,18 € 9 644,28 € 15 756,67 €





GGG HHH
III JJJ KKK
LLL MMM NNN OOO
PPP QQQ RRR SSS
TTT UUU VVV
Fundo deGarantiaSalarial
Recebeu do                 Remanescente F.G.S.                reconhecido
21 125,49 €          10 026,00 €             11 099,49 €                        1,54% 19 858,47 €          10 026,00 €               9 832,47 €                        1,37% 23 401,53 €          10 026,00 €             13 375,53 €                        1,86% 11 813,43 €                       -      €             11 813,43 €                        1,64% 9 023,21 €                       -      €               9 023,21 €                        1,25% 17 505,65 €            8 730,00 €               8 775,65 €                        1,22% 8 927,75 €                       -      €               8 927,75 €                        1,24% 16 800,96 €          10 026,00 €               6 774,96 €                        0,94% 29 714,10 €          10 026,00 €             19 688,10 €                        2,74% 27 097,06 €          10 026,00 €             17 071,06 €                        2,37% 26 619,36 €          10 026,00 €             16 593,36 €                        2,31% 5 923,66 €                       -      €               5 923,66 €                        0,82% 15 575,49 €          10 026,00 €               5 549,49 €                        0,77% 37 816,54 €                       -      €             37 816,54 €                        5,26% 5 051,82 €            3 593,72 €               1 458,10 €                        0,20% 15 950,67 €                       -      €             15 950,67 €                        2,22%
231 599,76 €      -      € 231 599,76 €                            32,21%
PAGAMENTO A EFETUAR
2 847,85 2 522,77 3 431,83 3 031,03 2 315,13 2 251,61 2 290,64 1 738,29 5 051,48 4 380,01 4 257,44 1 519,86 1 423,86 9 702,78 374,11 4 092,55
59 422,74

Fica em Dívida

8 251,64 € 7 309,70 € 9 943,70 € 8 782,40 € 6 708,08 € 6 524,04 € 6 637,11 € 5 036,67 € 14 636,62 € 12 691,05 € 12 335,92 € 4 403,80 € 4 125,63 € 28 113,76 € 1 083,99 € 11 858,12 €
172 177,02 €



Pagamento credoresprivilegiados-crédito IUC

Resultado daliquidação:verbas9 a21

26 462,45
)


Estado - FazendaNacional (IUC)

Reconhecido                     Já recebido
1 409,22 €     0,00 €

        %
100%
PAGAMENTO A EFETUAR
1 409,22

Fica em Dívida
0,00 €

Remanescea quantia de25.053,23€ (alocada ao valor a distribuir peloscredoreslaborais




Pagamento ao credor privilegiado e garantido

Resultado daliquidação:verbas28, 29 e 39

163 237,84
Estado - FazendaNacional (IMI)

Banco 1..., SA

Reconhecido                     Járecebid
7 244,33 €     0,00 €

197 883,97 €      183 220,00 €

%

100%

-
PAGAMENTOA EFETUAR7 244,33

-27 226,49 €

Fica em Dívida

0,00 €


Em 21/10/2022, o credor Banco 1..., S.A. reclamou das propostas de remuneração variável e de rateio apresentadas pelo administrador da insolvência, alegando, no que respeita à proposta de rateio, que:
“Nos presentes autos, as dívidas da massa – custas, despesas e honorários do AI – ascendem ao montante de 125.303,77 €.
Na proposta de rateio que apresenta o Senhor Administrador imputa o valor das dívidas da massa proporcionalmente ao produto da venda de todos os bens, com e sem garantia real.
Ora, sobre os bens imóveis identificados pelas verbas números 28, 29 e 39 do auto de apreensão incidiam hipotecas registadas a favor do Credor Banco 1... SA, ora Requerente, pelo que a imputação nunca poderia exceder o correspondente a 10% do produto da sua venda, nos termos do disposto no artigo 172.º, n.º 2 do CIRE.
De facto, estatui assim a citada norma: “As dívidas da massa insolvente são imputadas aos rendimentos da massa, e, quanto ao excedente, na devida proporção, ao produto de cada bem, móvel ou imóvel; porém, a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos (destacado nosso).
Por outras palavras, a regra geral é de imputar proporcionalmente as dívidas da massa ao produto da venda de cada bem; porém, excecionalmente, quando estamos na presença de bens objeto de garantias reais, essa imputação não deve exceder 10% do produto da sua venda, salvo nos casos em que não existem outros montantes para custear as dívidas da massa (o que não acontece) ou do que não prejudique o pagamento integral dos créditos garantidos (o que também não se verifica).
Nestes termos, em respeito do estatuído no artigo 172º/2 do CIRE, ao produto da venda dos bens hipotecados ao Banco 1..., SA – verbas 28, 29 e 39 - deverá ser deduzido o máximo de 10% para pagamento das dívidas da massa insolvente, ou seja, 10.820,00 €, 5.760,00 € e 5.602,25 €, respetivamente.
No entanto, a proposta do Senhor Administrador prevê que seja deduzido ao produto da venda das verbas 28 e 29 e 39 os montantes de 28.569,25 €, de 15.211,87 € e de 14.797,00 € o que não respeita o estabelecido no artigo supra transcrito”.
Concluiu pedindo que se ordenasse a retificação do cálculo da remuneração variável do administrador da insolvência e do mapa de rateio final que apresentou.

Sobre o requerimento que antecede pronunciou-se o administrador da insolvência, por requerimento de 10/11/2022, pugnando pelo indeferimento do requerido pelo credor e reclamante Banco 1..., S.A., nos termos que se seguem:
Quanto à reclamação da proposta de rateio final, entende o Banco que, a imputação das despesas suportadas pela Massa Insolvente não deverá exceder 10% do produto da venda dos imóveis apreendidos pelas verbas n.ºs 28, 29 e 39 do auto de apreensão e que, a haver excedente de despesas que ultrapasse estes 10%, este deverá ser imputado ao produto dos outros bens.
Ora, não se pode concordar com tal entendimento, em primeiro lugar porque a norma é clara (aqui sim), quando estatui o artigo 172º, nº 2 do CIRE que: “As dívidasda massa insolvente são imputadas (...) na devida proporção, ao produto de cada bem, móvel ou imóvel; porém, a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos” (negrito nosso).
Em segundo lugar, porque se assim não fosse, e no caso concreto destes autos, seriam os créditos dos trabalhadores a suportar a diferença, o que implicaria uma redução do pagamento a efetuar a estes credores privilegiados, quando a norma é clara, ao garantira imputação precípua das despesas da massa ao produto da liquidação de todos os bens.
A precipuidade garante que todos os bens liquidados são responsáveis por suportar as despesas da massa, na medida da proporção do seu peso relativo na liquidação conseguida, pelo que, por referência ao quadro da imputação que consta da proposta de rateio final, as verbas n.ºs 28 e 29 suportam uma percentagem conjunta de 34,95% das despesas e a verba n.º 39 suporta 11,81%. Significa isto que, estes três bens imóveis, atendendo ao seu valor de venda e ao valor global da liquidação, terão de suportar 46,76% das despesas da massa.
Assim, nos termos do n.º 2 do artigo 172º do CIRE, a percentagem de 10%, cede perante a percentagem de 46,76%, sob pena de termos outros credores (pela redução do pagamento) a suportar uma quota-parte superior das despesas da massa.
Neste sentido decidiu o Tribunal da Relação de Guimarães, no Acórdão de 20/03/2014, proferido no processo n.º 269/07.0TBGMR-G.G1: “ I- O art.º 172.º n.ºs 1 e 2 do CIRE, traduz e concretiza a regra da precipuidade das custas do processo e despesas de liquidação.
II- Resulta também desta norma que se devem imputar prioritariamente às dívidas da massa, em que se incluem as custas do processo, os rendimentos que ela própria gera. Se os rendimentos da massa não chegarem para satisfazer as dívidas da massa, serão os próprios bens, móveis ou imóveis que têm de as suportar, mesmo que esses tenham sido objeto de garantias, consequentemente, ao produto da liquidação, sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável á satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida” (negrito nosso).
Bem como, no Acórdão de 15/06/2021, proferido no processo n.º 309/13....: (...) determinando-se que o apelante e credor garantido proceda, no prazo de 15 dias, ao pagamento de 10%do valor licitado para aquisição da fração ...,  a que acresce o valor das despesas da leiloeira, contados da notificação que para tal lhe seja efetuada, na sequência da baixa destes autos ao tribunal de primeira instância (sem prejuízo da responsabilidade pelas dívidas da massa, nos termos do segmento final do artigo 172º n.2 do CIRE, se se vier a apurar a final, ser superior aos referidos 10%) (negrito nosso).
Face ao exposto, requer-se a V. Exa. que indefira, totalmente, o requerido pelo credor Banco 1..., S.A.”.

Por despacho proferido em 19/12/2022, decidiu-se:
“O Sr.(a) Administrador(a) de Insolvência aduziu aos autos o cálculo da sua remuneração variável e proposta de rateio.
O Credor Banco 1... apresentou reclamação quanto à mesma nos termos que constam do seu requerimento datado de 21/10/2022.
Notificado do mesmo, o Sr.(a) Administrador(a) de Insolvência já se pronunciou nos termos que constam do requerimento que aduziu aos autos a 11/10/2022.
A Secção já procedeu à sua apreciação tal como consta do termo e cálculo que antecedem.
Ora, previamente à apreciação da proposta de rateio, importa fixar a remuneração variável do Sr.(a) Administrador(a) da Insolvência, referindo-se, desde já, assistir inteira razão quer ao Credor Banco 1..., quer à Secção quanto ao cálculo constante do termo que antecede, desde logo porque o Sr.(a) Administrador(a) da Insolvência não atentou que a norma referente a tal cálculo deve ser interpretada no sentido de que a remuneração corresponderá a 5% do montante dos créditos satisfeitos, quando estes créditos (satisfeitos) correspondam à totalidade dos créditos admitidos, configurando-se, portanto, um grau de satisfação destes créditos de 100%; quando os créditos satisfeitos não correspondam à totalidade dos créditos admitidos, os 5% terão que ser calculados com referência ao grau de satisfação dos créditos, ou seja, à percentagem dos créditos admitidos que foram satisfeitos. Se o valor da remuneração correspondesse sempre a 5% dos créditos satisfeitos, tal significaria que a remuneração seria idêntica quer esses créditos correspondessem à globalidade dos créditos admitidos, quer correspondessem a uma parte ínfima deles; o grau de satisfação dos créditos seria, portanto, totalmente desconsiderado ao contrário do que expressamente se dispõe na norma em causa (art. 23º do EAJ) e contrariando aquele que – pelas razões apontadas – pensamos ter sido o pensamento do legislador (cfr. neste sentido Ac. da Relação do Porto de 11/10/2022, proferido no âmbito do processo nº 2631/20.3T8OAZ, Ac. da Relação de Évora de 29/09/2022 e Acs. da Relação de Coimbra datados de 11/10/22 e 28/09/22).
Assim, por tal ser o sentido expresso na lei, fixa-se a remuneração variável do Sr.(a) Administrador(a) da Insolvência no valor constante do termo que antecede.
Notifique, convidando-se o Sr.(a) Administrador(a) da Insolvência a juntar aos autos nova proposta de rateio em conformidade, observando a decisão agora proferida quanto ao montante da remuneração variável.
Oportunamente o Tribunal pronunciar-se-á quanto à segunda questão suscitada pelo Credor Banco 1....

Inconformado com o decidido quanto à remuneração variável que lhe foi fixada (em que se lhe arbitrou a quantia de 25.629,24 euros a esse título), o administrador da insolvência interpôs recurso do despacho que antecede, tendo esta Relação, por acórdão proferido em 25/05/2023, transitado em julgado, julgado o recurso improcedente e confirmou o despacho recorrido (cfr. apenso K).
Por despacho de 22/06/2023, a 1ª Instância determinou que o administrador da insolvência apresentasse nova proposta de rateio, observando a decisão transitada em julgado quanto ao montante da remuneração variável.

Nessa sequência, por requerimento de 03/07/2023, o administrador da insolvência apresentou nova proposta de distribuição e de rateio final, alegando:
“Conforme se poderá verificar pelo mapa de distribuição relativo às verbas n.ºs 28, 29 e 39 (último quadro da proposta de rateio), o credor Banco 1..., S.A., já recebeu a quantia de 183.220,00€, que corresponde aos pagamentos efetuados nos termos do artigo 174º do CIRE e ainda à dispensa do depósito de preço na aquisição do imóvel apreendido sob a verba n.º 29.
Acontece que as despesas da Massa Insolvente, já aprovadas em sede de prestação de contas, foram de montante superior ao expectável aquando da realização dos referidos pagamentos efetuados ao credor Banco 1..., pelo que o banco recebeu valor superior ao que deveria ter recebido, conforme demonstrado na proposta de distribuição.
Assim, atendendo ao disposto no artigo 172º, n.º 2 do CIRE, visto que a precipuidade se encontra garantida, isto é, que as despesas foram alocadas na proporção do produto da venda dos bens, conforme se demonstra no quadro relativo à imputação das despesas, o produto da venda das verbas n.ºs 28, 29 e 39 apenas permite distribuir a quantia global de 173.424,94€.
Deste modo, quanto à distribuição destas verbas, atendendo que o credor Estado – Fazenda Nacional recebe o montante de 7.244,33€, cabe ao credor Banco 1..., S.A. proceder à restituição da quantia de 17.039,39€ à Massa Insolvente”.

Apresentou o seguinte mapa de rateio:

Produto da liquidação:

Produto da liquidação dos bens móveis (V. 1 a 8)                                         9 700,00 euros
Produto da liquidação dos bens móveis - veículos (V. 9 a 21)                     35 960,00 euros
Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 22 a 27 e 30 a 38)                 206 500,00 euros
Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 28 e 29)                                 165.800,00 euros
Produto da liquidação do bem imóvel (V. 39)                                                  56.025,00 euros
Recebimento proveniente de processos judiciais                                                 445,08 euros
Total Receitas                                                                                                     474.430,08 euros

Despesas do processo
Despesas aprovadas na prestação de contas                       77. 686,79 €
Provisão para transferências bancárias do rateio                      200,00 €
      Cálculo da remuneração variável do AI (c/IVA)                  25.629,24 €
Total Despesas                                                                             103 516,03



Imputação das despesas do processo às verbas                                                              Valor                                                                                                                                    Remanescente (Artigo 172º, n.º 2 do CIRE)                                                                             imputado           das despesas

A Distribuir

Total das Despesas                                                                                                                                                          103 516,03

Produto da liquidação dos bens móveis (V. 1 a 8)                        2,04%               2 116,45 €                                                                                                         101 399,58

Produto da liquidação dos bens móveis - veículos (V. 9 a 21)     7,58%               7 846,12 €                                                                                                         93 553,46

Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 22 a 27 e 30 a 38)  43,53%             45 056,29 €                                                                                                        48 497,17

Produto da liquidação dos bens imóveis (V. 28 e 29)                   34,95%             36 175,95 €                                                                                                        12 321,22

Produto da liquidação do bem imóvel (V. 39)                               11,81%             12 224,11 €                                                                                                        97,11

Recebimento proveniente de processos judiciais                          0,09%                    97,11 € -                                                                                                         0,00



7 583,55

28 113,88

161 443,71

129 624,05

43 800,89

347,97

100,00%

370 914,05




Pagamento credores privilegiados - créditos laborais
Resultado da liquidação: verbas 1 a 8; remanescente das verbas 9 a 21; verbas 22 a 27 e 30 a 38; recebimentos de processos judiciais
196 079,89



OO

QQ

RR

SS

TT

UU

VV

WW

XX

PP

YY

ZZ

AAA

BBB

CCC

DDD

EEE

WWW
Recebeu do                                                       Remanescente F.G.S.                reconhecido

5 478,39 €                       0,00 €           5 478,39 €                                         0,76%

4 556,21 €                       0,00 €           4 556,21 €                                         0,63%

24 161,57 €             10 026,00 €        14 135,57 €                                 1,97%

15 833,00 €               8 730,00 €          7 103,00 €                                  0,99%

26 750,49 €             10 026,00 €        16 724,49 €                                 2,33%

33 185,55 €             10 026,03 €        23 159,52 €                                 3,22%

18 245,86 €             10 026,01 €          8 219,85 €                                 1,14%

19 823,00 €             10 026,00 €          9 797,00 €                                 1,36%

34 441,81 €             10 026,00 €        24 415,81 €                                 3,40%

5 610,18 €                       0,00 €           5 610,18 €                                         0,78%

23 728,06 €             10 026,00 €        13 702,06 €                                 1,91%

19 029,45 €                     0,00 €         19 029,45 €                                         2,65%

36 437,27 €             10 026,00 €        26 411,27 €                                 3,67%

32 460,35 €             10 026,00 €        22 434,35 €                                 3,12%

38 325,22 €             10 026,00 €        28 299,22 €                                 3,94%

34 515,60 €             10 026,00 €        24 489,60 €                                 3,41%

22 998,77 €             10 026,00 €        12 972,77 €                                 1,80%

31 220,71 €             10 026,00 €        21 194,71 €                                 2,95%
PAGAMENTO A EFETUAR

1 494,01

1 242,52

3 854,90

1 937,05

4 560,93

6 315,82

2 241,63

2 671,73

6 658,42

1 529,95

3 736,68

5 189,51

7 202,60

6 118,06

7 717,46

6 678,54

3 537,80

5 780,00

Fica em Dívida

3 984,38 €

3 313,69 €

10 280,67 €

5 165,95 €

12 163,56 €

16 843,70 €

5 978,22 €

7 125,27 €

17 757,39 €

4 080,23 €

9 965,38 €

13 839,94 €

19 208,67 €

16 316,29 €

20 581,76 €

17 811,06 €

9 434,97 €

15 414,71 €



GGG

HHH

III

JJJ

KKK

LLL

MMM

NNN

OOO

PPP

QQQ

RRR

SSS

TTT

UUU

VVV

Fundo de Garantia Salarial
Recebeu do                                       Remanescente F.G.S.                reconhecido

21 125,49 €             10 026,00 €        11 099,49 €                                 1,54%

19 858,47 €             10 026,00 €          9 832,47 €                                 1,37%

23 401,53 €             10 026,00 €        13 375,53 €                                 1,86%

11 813,43 €                     0,00 €         11 813,43 €                                         1,64%

9 023,21 €                       0,00 €           9 023,21 €                                         1,25%

17 505,65 €               8 730,00 €          8 775,65 €                                  1,22%

8 927,75 €                       0,00 €           8 927,75 €                                         1,24%

16 800,96 €             10 026,00 €          6 774,96 €                                 0,94%

29 714,10 €             10 026,00 €        19 688,10 €                                 2,74%

27 097,06 €             10 026,00 €        17 071,06 €                                 2,37%

26 619,36 €             10 026,00 €        16 593,36 €                                 2,31%

5 923,66 €                       0,00 €           5 923,66 €                                         0,82%

15 575,49 €             10 026,00 €          5 549,49 €                                 0,77%

37 816,54 €                     0,00 €         37 816,54 €                                         5,26%

5 051,82 €                 3 593,72 €          1 458,10 €                                  0,20%

15 950,67 €                     0,00 €         15 950,67 €                                         2,22%

231 599,76 €                   0,00 €       231 599,76 €                                         32,21%
PAGAMENTO A EFETUAR

3 026,94

2 681,41

3 647,63

3 221,63

2 460,71

2 393,20

2 434,68

1 847,60

5 369,13

4 655,44

4 525,17

1 615,44

1 513,40

10 312,93

397,64

4 349,90

63 159,43

Fica em Dívida

8 072,55 €

7 151,06 €

9 727,90 €

8 591,80 €

6 562,50 €

6 382,45 €

6 493,07 €

4 927,36 €

14 318,97 €

12 415,62 €

12 068,19 €

4 308,22 €

4 036,09 €

27 503,61 €

1 060,46 €

11 600,77 €

168 440,33 €

Totais                                950 606,44 €                                        231 599,76 €   719 006,68 €                                                                                                                100,00%          196 079,89 €      522 926,79 €

Nada remanesce para os restantes credores

Pagamento credores privilegiados - crédito IUC

Resultado da liquidação: verbas 9 a 21

28 113,88



Estado - Fazenda Nacional (IUC)

Reconhecido         recebido

1 409,22 €                                    0,00 €



100%
PAGAMENTO A EFETUAR
 1 409,22

Fica em Dívida

     0,00 €

Pagamento ao credor privilegiado e garantido

Resultado da liquidação: verbas 28, 29 e 39

173 424,94


Estado - Fazenda Nacional (IMI)


Banco 1..., SA

Reconhecido         recebido
7 244,33 €                                    0,00 €


197 883,97 €           183 220,00 €

%
100%


-
PAGAMENTO A EFETUAR
7 244,33

-17 039,39 €

Fica em Dívida

0,00 €
Notificado da nova proposta de rateio, o reclamante Banco 1..., S.A. requereu:
“O Credor Reclamante tomou conhecimento que foi junta aos autos nova proposta de rateio na sequência do acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, o qual manteve a decisão proferida em primeira instância quanto à fixação do montante da sua remuneração variável.
Sucede que, na reclamação contra a anterior proposta de rateio apresentada pelo Sr. AI, junta aos autos por requerimento datado de 21 de outubro de 2022, o credor Reclamante, para além de discordar do cálculo da remuneração variável apresentada pelo Sr. AI, apresentou as razões pelas quais discorda da forma como o Sr. AI imputa o valor das dívidas da massa proporcionalmente ao produto da venda de todos os bens, com e sem garantia real – cfr. documento ... que se junta ao diante e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeitos.
No que diz respeito à questão levantada pelo Credor Reclamante relativamente à forma de imputação do valor das dívidas da massa insolvente ao produto da venda, o Tribunal, no despacho proferido em 19 de dezembro de 2022, decidiu que oportunamente se pronunciaria - cfr. documento ... que se junta ao diante e aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos e legais efeito.
Atento o exposto, entende o Credor Reclamante que não poderá ser apresentada nova proposta de rateio pelo Sr. AI sem antes o Tribunal se pronunciar quanto à questão levantada pelo Credor Reclamante quanto às dívidas da massa insolvente e a forma de imputação das mesmas ao produto da venda dos bens da massa insolvente, o que se requer”.

Por despacho de 02/11/2023, a 1ª Instância indeferiu a reclamação apresentada pelo credor Banco 1..., S.A. quanto à proposta de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência, constando esse despacho do teor que se segue:
“O artº. 172º nº2 do CIRE prevê que o pagamento das custas seja suportado prioritariamente pelos rendimentos da massa, porém no caso dos autos a massa não gerou rendimentos, pelo que o valor das custas será imputado na respetiva proporção a cada bem.
O limite dos 10% previsto no normativo vindo de indicar poderá ser excedido, na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente.
O pagamento das dívidas da massa insolvente sai precípuo do produto do bem.
Se é certo que, nos termos do artº 172º, nº2, do CIRE, a imputação das dívidas da massa não excederá 10% do produto do bem onerado com garantia real, logo a parte final do preceito ressalva “salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos.”.
A imputação das dívidas da massa a bens objeto de garantias – e, consequentemente, ao produto da respetiva liquidação – pode ocorrer sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável à satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida (Neste sentido e cujo sumário aqui se transcreveu em parte veja-se o douto Ac. proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Guimarães datado de 10/07/2023 e Ac. da Relação do Porto de 16/11/2015, ambos consultáveis em www.dgsi.pt).
Assim, assiste razão ao Sr.(a) Administrador(a) de Insolvência, indeferindo-se o requerido pelo credor Banco 1... quanto à redução ao limite máximo de 10% do produto dos bens objeto de garantia real para pagamento das dívidas da massa insolvente.
Notifique”.

Inconformado com o decidido, o credor e reclamante Banco 1..., S.A. interpôs recurso do despacho acabado de transcrever, em que formulou as conclusões que se seguem:
1- Nos presentes autos, foram apreendidos e vendidos 39 bens, móveis e imóveis, dos quais, os correspondentes às verbas 22ª a 29ª e 39ª do auto de apreensão estavam onerados com garantias reais e os correspondentes às verbas 1ª a 21ª e 30ª a 38ª estavam desonerados de garantias reais.
2- O Recorrente tem um crédito definitivamente reconhecido no montante global de 197.883,97 €, garantido por hipoteca em 1º grau sobre as verbas 28ª, 29ª e 39ª do auto de apreensão.
3- As dívidas da massa insolvente ascenderam ao montante global de 103.516,03 €.
4- No mapa de rateio que elaborou, o Senhor AI imputou as dívidas da massa proporcionalmente ao produto de cada bem, sem atender à limitação prevista na 2ª parte do nº 2 do artigo 172º do CIRE. 
5- O n.º 2 do artigo 172º do CIRE dispõe que “As dívidas da massa insolvente são imputadas aos rendimentos da massa, e, quanto ao excedente, na devida proporção, ao produto de cada bem móvel ou imóvel; porém, a imputação não excederá 10% do produto e bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos”.
6- Ou seja, nos termos da norma citada, se os rendimentos da massa não forem suficientes para pagar as suas dívidas há, antes do mais, que verificar que bens foram liquidados.
7- Existindo – como sucede nos presentes autos – bens desonerados de garantias reais e bens onerados com aquelas garantias, a satisfação das dívidas da massa é feita, em primeiro lugar, até 10% do valor de cada bem liquidado.
8- Se este montante não for suficiente então, o remanescente será pago com recurso ao produto da venda dos bens desonerados de garantia real e, apenas se este produto for esgotado e ainda assim as dividas não forem pagas, então o remanescente em dívida será pago pelos montantes correspondentes à liquidação dos bens onerados com garantia real (sendo vários, na proporção).
9- Dito de outro modo, havendo bens onerados com garantia real e bens desonerados, apenas é possível ultrapassar os 10% do valor da venda dos bens garantidos nos casos em que, uma vez imputado o produto da venda de todos os bens desonerados, ainda assim as dívidas da massa não estejam satisfeitas.
10- Neste sentido, assim se escreveu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 07.10.2021, proferido no processo 1/08.0TJVNF-ET.G1: As dívidas da massa insolvente são liquidadas, em primeira linha, com os rendimentos gerados pela própria massa insolvente, mas se esses rendimentos não forem suficientes para honrar as dívidas da massa, são os próprios bens, móveis e imóveis, que integram a massa insolvente que têm de suportar esse pagamento. Porém, quanto aos créditos garantidos sobre a insolvência, porque os respetivos credores são aqueles que são pagos em primeiro lugar no confronto com os demais credores da insolvência, compreende-se que o n.º 2 do art. 172º estatua que a imputação não deverá exceder 10% do produto de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos, o que significa que se o valor dos rendimentos da massa insolvente e o valor dos bens que integram a massa insolvente que se encontram desonerados de garantias reais não for suficiente para satisfazer as dívidas da massa insolvente e se for necessário recorrer ao produto da venda dos bens que integram a massa insolvente onerados com garantias reais, que exceda esses 10%, não exista qualquer impedimento a esse recurso, posto que as dívidas da massa insolvente é que têm de ser satisfeitas, mesmo que para tal se tenha de recorrer à totalidade do produto da venda de bens onerados com garantias reais (negrito e sublinhado nosso).
11- O legislador, ao limitar a imputação das dívidas da massa a 10% de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável para satisfação integral das dívidas da massa, tomou uma opção de dar uma tutela particular, uma vantagem, a estes credores, tutela essa que, não raras vezes, se repercutirá numa perda para outros credores.
12- Seguindo este entendimento, a afetação do produto da venda dos bens onerados com garantias reais ao pagamento das dívidas da massa, no que excede o correspondente a 10%, só poderia acontecer depois de esgotado o produto da venda dos demais bens não onerados com garantias reais, ou seja, depois de esgotado o produto da venda das verbas 1ª a 21ª e 30ª a 38ª.
13- Só no caso de o produto da venda destes bens não se mostrar suficiente para liquidar as dívidas da massa, é que se poderia ultrapassar o limite de 10% do valor da liquidação dos bens onerado com garantias reais, afetando-o ao pagamento do remanescente das dívidas em falta.
14- Sucede que, não foi este o sentido da decisão recorrida, que deu razão ao Senhor Administrador e decidiu que “a imputação das dívidas da massa a bens objeto de garantias – e, consequentemente, ao produto da respetiva liquidação – pode ocorrer sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável à satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida.”
16- Com o devido respeito, o Banco Recorrente entende que a aplicação da norma aqui em causa – 172.º nº 2 do CIRE – interpretada nos termos acabados de expor, não permitia a prolação desta decisão, sem que previamente ficasse demonstrada a insuficiência do pagamento das dívidas da massa por recurso ao produto da venda dos bens desonerados de garantias reais.
17- Dispõe o artigo 9.° n.º 3 do CC que “Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.”
18- No entender do Recorrente, a interpretação do disposto no artigo 172.º CIRE nos termos supra explanados é a que tem maior correspondência com a letra e com o espírito da lei.
19- A sentença recorrida violou, por deficiente interpretação e aplicação, o disposto nos artigos 9.º do C.C. e 172.º n.º 2 do CIRE 
20- Impondo-se, pelos motivos acabados de expor, a sua revogação e, consequentemente, a sua substituição por outra que ordene que a imputação das dívidas da massa ao produto da venda dos bens onerados com garantias reais, no que excede o correspondente a 10%, só aconteça se e depois de esgotado o produto da venda dos demais bens não onerados com garantias reais.
Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, ser revogada a decisão proferida em primeira instância.
Assim se fazendo inteira JUSTIÇA! 
*
Não foram apresentadas contra-alegações.
*
A 1ª Instância admitiu o recurso interposto como sendo de apelação, a subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo, o que não foi alvo de modificação no tribunal ad quem.
*
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II- DO OBJETO DO RECURSO

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
Acresce que, o tribunal ad quem também não pode conhecer de questão nova, isto é, que não tenha sido objeto do despacho sob sindicância, salvo se se tratar de questão que seja do conhecimento oficioso, dado que, sendo os recursos os meios específicos de impugnação de decisões judiciais, mediante o reexame de questões que tenham sido nelas apreciadas, visando obter a anulação da decisão recorrida (quando padeça de vício determinativo de nulidade), ou a sua revogação ou alteração (quando padeça de erro de julgamento, seja na vertente de erro de julgamento da matéria de facto e/ou na vertente de erro de julgamento da matéria de direito), nos recursos, salvo a já enunciada exceção, não podem ser versadas questões de natureza adjetivo-processual e/ou substantivo material sobre as quais não tenha recaído, ou devesse recair, o despacho recorrido[1].
No seguimento desta orientação, cumpre ao tribunal ad quem apreciar uma única questão que consiste em saber se o despacho recorrido, ao julgar improcedente a reclamação apresentada pelo apelante, Banco 1..., S.A., contra o mapa de rateio final apresentado pelo administrador da insolvência (determinando que as dívidas da massa insolvente sejam liquidadas pelo produto da liquidação de todos os bens apreendidos para a massa insolvente, na respetiva proporção, independentemente desses bens se encontrarem ou não onerados com garantia real), padece de erro de direito e se, em consequência, se impõe a sua revogação e ordenar que a imputação das dívidas da massa ao produto da venda dos bens onerados com garantias reais (apreendidos a favor da massa insolvente sob as verbas n.ºs 28, 29 e 30, onerados com hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A. para garantia dos créditos que reclamou e que foram julgados verificados e graduados por sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado), no que excede o correspondente a 10%, só aconteça se e depois de esgotado o produto da venda dos demais bens não onerados com garantias reais.
*
III- DA FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Os factos que relevam para a decisão a proferir no âmbito do presente recurso são os que constam do “Relatório” acima elaborado.
*
IV- DA FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Tendo sido apreendidos os bens supra identificados sob as verbas n.ºs 1 a 39 para a massa insolvente e tendo esses bens sido liquidados, encontrando-se os bens sobre que versam as verbas n.ºs 28, 29 e 39 onerados com hipoteca constituída a favor do apelante (Banco 1..., S.A.), garantindo o pagamento do crédito deste sobre a insolvência, no montante global de 103.516,03 euros (conforme sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, no apenso A, transitada em julgado, que lhe reconheceu esse crédito no montante global de 103.516,03 euros sobre os imóveis penhorados a favor da massa nas mencionadas verbas n.º s 28, 29 e 39), ascendendo o produto da liquidação dos móveis apreendidas para a massa sob as verbas n.ºs 1 a 8 à quantia de 9.700,00 euros, o da liquidação dos móveis apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 9 a 21 à quantia de 35.960,00 euros, o da liquidação dos imóveis apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 22 a 27 e 30 a 38 à quantia de 206.500,00 euros, o da liquidação dos imóveis apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 28 e 29 à quantia de 165.800,00 euros, o da liquidação do imóvel apreendido para a massa sob a verba n.º 39 à quantia de 56.025,00 euros, e tendo o administrador da insolvência recebido a quantia de 445,08 euros provenientes de processos judiciais, ascendendo o total de receitas proveniente da liquidação da massa insolvente à quantia total de 474.430,08 euros, enquanto o total das custas do processo de insolvência ascende a 103.516,03 euros, verificando-se que, por via da hipoteca que era beneficiária sob as verbas apreendidas para a massa insolvente sob as verbas n.ºs 28, 29 e 30, este recebeu a quantia de 183.220,00 euros, correspondente aos pagamentos que lhe foram feitos nos termos do art. 174º do CIRE e da dispensa do depósito do preço do imóvel apreendido sob a verba n.º 29, constatando-se que o produto da liquidação dos bens apreendidos sob as verbas n.ºs 1 a 8 se mostrou insuficiente para satisfazer os créditos privilegiados reconhecidos aos trabalhadores na sentença de verificação de graduação de créditos, transitada em julgado; que o produto da liquidação dos bens apreendidos sob as verbas n.ºs 9 a 21, uma vez liquidado o IUC em dívida (julgado verificado e graduado em primeiro lugar na sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos, transitada em julgado), se mostrou insuficiente para satisfazer os créditos privilegiados reconhecidos nessa sentença e nela graduados em segundo lugar, e que o produto da liquidação dos bens apreendidos sob as verbas n.ºs 22 a 27 e 30 a 38 se mostrou insuficiente para proceder ao pagamentos dos créditos privilegiados reconhecidos e graduados em primeiro lugar na sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos, transitada em julgado, o administrador da insolvência apresentou rateio final, nos termos do art. 182º do CIRE, conforme quadros que apresentou no processo principal em 03/07/2023.
Alegando que “as despesas da massa insolvente, já aprovadas em sede de prestação de contas, foram de montante superior ao expectável aquando da realização dos referidos pagamentos efetuados ao credor Banco 1..., pelo que o banco recebeu valor superior ao que deveria ter recebido, conforme demonstrado na proposta de distribuição”, pelo que, “atendendo ao disposto no art. 172º, n.º 2 do CIRE, visto que a precipuidade se encontra garantida, isto é, que as despesas foram alocadas na proporção do produto da venda dos bens, conforme se demonstra no quadro relativo à imputação das despesas, o produto da venda das verbas n.ºs 28, 29 e 39 apenas permite distribuir a quantia global de 13.424,94 euros”, concluiu o administrador da insolvência que, “atendendo que o credor Estado – Fazenda Nacional – recebe o montante de 7.244,33 euros (de IMI reconhecido e graduado na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, que reconheceu aquele montante de IMI em dívida sobre os imóveis apreendidos sob as verbas n.ºs 28, 29 e 39 graduando-o em 1º lugar), “cabe ao Banco 1..., S.A, proceder à restituição da quantia de 17.039,39 euros”.
O apelante, Banco 1..., S.A., reclamou contra o mapa de rateio final apresentado pelo administrador da insolvência, alegando que incidindo sob os prédios apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 28, 29 e 39 hipotecas registadas a favor daquele, nos termos do art. 172º, n.º 2 do CIRE, os mesmos nunca poderão ser objeto de uma imputação superior a 10%, isto é, não havendo rendimentos da massa insolvente que cubra as dívidas desta ou que seja suficiente para cobrir essas dívidas da massa insolvente, estas têm de ser imputadas ao produto da venda de cada bem; porém, tratando-se de bens que sejam objeto de garantias reais (como é o caso dos prédios das verbas n.ºs 28, 29 e 39, que se encontravam hipotecados a favor do apelante a fim de garantir o cumprimento dos créditos que lhe assistem sobre a insolvência), essa imputação não deve exceder 10% do produto da sua venda, salvo nos casos em que não existem outros montantes para custear as dívidas da massa (o que não acontece no caso dos autos), ou do que não prejudique o pagamento integral dos créditos garantidos (o que também não é o caso dos autos).
Conclui que, em respeita do disposto no art. 172º, n.º 2 do CIRE, ao produto da venda dos bens hipotecados a favor do apelante (verbas n.ºs 28, 29 e 39) deverá ser deduzido o máximo de 10% para pagamento das dívidas da massa insolvente, ou seja, 10.820,00 euros, 5.760,0 euros e 5.602,25 euros, respetivamente, devendo a restante quantia necessária ao pagamento das dívidas da massa insolvente ser suportadas pelos restantes bens apreendidos a favor da massa insolvente que não beneficiam de garantia real.
Contra este entendimento pronunciou-se o administrador da insolvência, alegando que, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 172º do CIRE, o limite de 10% do produto de bens objeto de garantias reais nele previsto terá de ser ultrapassado “na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos”, até porque, se assim não fosse, “seriam os créditos dos trabalhadores a suportar a diferença, o que implicaria uma redução do pagamento a efetuar a estes credores privilegiados, quando a norma é clara, ao garantir a imputação precípua das despesas da massa ao produto da liquidação de todos os bens. A precipuidade garante que todos os bens liquidados são responsáveis por suportar as despesas da massa, na medida da proporção do seu peso relativo na liquidação conseguida, pelo que, por referência ao quadro da imputação que consta da proposta de rateio, as verbas n.ºs 28 e 29 suportam uma percentagem conjunta de 34,95% das despesas e a verba n.º 39 suporta 11,81%”. Daí que “estes três bens imóveis, atendendo ao seu valor de venda e ao valor global da liquidação, terão de suportar 46,76% das despesas da massa”.
Este foi o entendimento que foi sufragado pela 1ª Instância na decisão sob sindicância de 02/11/2013, em que entendeu que não tendo, no caso dos autos, a massa insolvente gerado qualquer rendimento, o limite dos 10% previsto no n.º 2, do art. 172º de imputação do produto de bens objeto de garantias reais pode ser excedido, na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente, dado que estas saem precípuas do produto dos bens liquidados.
O apelante não se conforma com esse entendimento, imputando ao decidido erro de direito.
Com efeito, o apelante mantém o entendimento de que existindo nos autos bens desonerados de garantias reais e bens onerados com aquelas garantias, a satisfação das dívidas da massa é feita, em primeiro lugar, até 10% do valor de cada bem liquidado; se este montante não for suficiente então o remanescente será pago com recurso ao produto da venda dos bens desonerados de garantia real e, apenas se esse produto for esgotado e ainda assim as dívidas da massa insolvente não forem pagas (integralmente liquidadas), então o remanescente em dívida será pago pelos montantes correspondentes à liquidação dos bens onerados com garantia real (sendo vários, na proporção), ou seja, em suma, na sua perspetiva, havendo bens onerados com garantia real e bens desonerados, apenas é possível ultrapassar os 10% do valor da venda dos bens garantidos nos casos em que, uma vez imputado o produto da venda de todos os bens desonrados, ainda assim as dívidas da massa não estejam satisfeitas.
Em abono desta posição invoca o acórdão desta Relação de 07/10/2021, proferido no processo n.º 1/08.0TJVNF-ET.G1, que foi relator pelo aqui relator.
Vejamos se assiste razão ao apelante para os erros de direito que assaca ao despacho sob sindicância.
O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores (art. 1º, n.º 1 do CIRE[2]), em que, salvo os casos expressamente previstos na lei, a declaração de insolvência priva imediatamente o insolvente, por si ou pelos seus administradores, dos poderes de administração e de disposição dos bens integrantes da massa insolvente, os quais passam a competir ao administrador da insolvência (n.º 1 do art. 81º), em que a declaração de insolvência determina a suspensão de quaisquer diligências executivas ou providências requeridas pelos credores da insolvência que atinjam os bens integrantes da massa insolvente e obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer ação executiva intentada pelos credores da insolvência (n.º 1 do art. 88º), em que os credores do devedor/insolvente, durante a pendência do processo de insolvência apenas podem exercer os seus direitos contra o devedor nos termos previstos no CIRE (art. 90º), e em que dentro do prazo fixado na sentença declaratória da insolvência, todos os credores da insolvência, incluindo o Ministério Público na defesa dos interesses das entidades que represente, devem reclamar a verificação dos seus créditos, incluindo aqueles que tenham o seu crédito reconhecido por decisão definitiva (art. 128º, n.ºs 1 e 3), em que é a sentença de verificação e graduação de créditos que autoriza o administrador de insolvência a proceder ao pagamento dos créditos reconhecidos e graduados aos credores do devedor/insolvente, no âmbito do processo de insolvência (arts. 172º a 185º).
Decorre do regime legal que se acaba de enunciar que, uma vez proferida a sentença declaratória da insolvência da devedora, abre-se a denominada fase executiva do processo de insolvência, a qual é composta, por um lado, pela reclamação, verificação e graduação de créditos e, por outro, pela apreensão, separação, restituição e liquidação do ativo.
Com efeito, visando o processo de insolvência satisfazer os interesses dos credores da insolvente, uma vez decretada a insolvência deste, cumpre ao administrador de insolvência proceder imediatamente à apreensão dos bens do devedor/insolvente, os quais passam a formar a denominada massa insolvente, a qual fica sujeita aos poderes de administração e de disposição do administrador de insolvência (art. 81º, n.º 1).
Não aprovando a assembleia de credores uma medida de recuperação cumpre ao administrador de insolvência proceder à venda da massa insolvente a fim de com as forças do produto dessa venda proceder ao pagamento dos créditos detidos pelos credores da massa insolvente e, em segunda linha, pelos credores da insolvência.
Deste modo, declarada a insolvência, o devedor/insolvente perde imediatamente os poderes de administração e de disposição sobre os seus bens integrantes da massa insolvente, deixando de poder satisfazer, voluntária ou coativamente, os seus débitos perante os seus credores, uma vez que, com a sentença declaratória da insolvência, o mesmo perde o poder de administração e de disposição dos seus bens; os credores não lhe podem instaurar execuções com vista à cobrança coativa desses seus direitos de créditos e as já instauradas não podem prosseguir os seus termos legais.
O pagamento dos débitos da insolvência apenas pode ser realizado pelo administrador da insolvência no âmbito do processo de insolvência e contanto que esses débitos da insolvência (e eventuais garantias) tenham sido julgados verificados e graduados na sentença de verificação e graduação de créditos, a proferir no âmbito do processo de insolvência e que transite em julgado.
O apenso de verificação e de graduação de créditos destina-se precisamente a apurar o passivo da insolvência e a autorizar o pagamento desse passivo pelo administrador de insolvência, uma vez transitada em julgado a sentença de verificação e de graduação de créditos a proferir no âmbito do processo de insolvência, em sede de incidente de verificação e graduação de créditos, regulado nos arts. 128º e segs. do CIRE.
O pagamento do passivo da insolvência pelo administrador processa-se de acordo com o princípio da exclusividade nos termos do qual esse pagamento “apenas contempla os que estiverem verificados por sentença transitada em julgado”, proferida no âmbito do incidente de verificação e graduação de créditos,  ainda que o crédito já tenha sido reconhecido por sentença transitada em julgado proferida em ação que correu termos fora do âmbito do processo de insolvência (art. 128º, n.º 5)[3].
Deste modo, independentemente dos credores da insolvência terem ou não visto o seu crédito sobre o devedor/insolvente reconhecido, por sentença transitada em julgado, proferida em ação instaurada contra o último fora do processo de insolvência, uma vez declarada a insolvência do devedor, esses credores não se encontram dispensados do ónus de reclamação dos seus créditos e só poderão obter pagamento desses seus créditos caso estes venham a ser julgados verificados e graduados na sentença de verificação e graduação de créditos a proferir em sede de incidente de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado (art. 173º).
Destarte, o trânsito em julgado de sentença que reconheça direitos de crédito e as respetivas garantias a determinado credor ou credores sobre o devedor/insolvente em ações intentadas por estes fora do processo de insolvência, não opera caso julgado material quanto aos demais credores do devedor/insolvente, não ficando esses credores, beneficiários de tais sentenças, dispensados do ónus de reclamar os seus créditos (e as respetivas qualidades, nomeadamente, garantias) sobre o devedor/insolvente no âmbito do processo de insolvência, caso pretendam obter pagamento, o que se compreende, dado que não tendo os demais credores da devedora, entretanto declarada insolvente, sido partes na ação que culminou com a prolação da sentença transitada em julgado, que reconheceu ao credor demandante o direito de crédito e as respetivas garantias sobre o devedor/insolvente, sendo a insolvência uma execução universal, que tem por objetivo satisfazer os direitos de todos os credores da devedora/insolvente, de acordo com as regras enunciadas no CIRE, se esses restantes credores do insolvente que não foram partes na ação antes intentada por um outro credor contra esta eram, em princípio, terceiros juridicamente indiferentes em relação ao discutido e decidido nessas ações, uma vez declarada a insolvência do devedor (demandado e condenado nessas concretas ações), esses credores perdem a qualidade de terceiros juridicamente indiferentes em relação ao discutido e decidido nessas ações e passam a ser terceiros juridicamente interessados, pelo que o trânsito em julgado da decisão de mérito proferida no âmbito dessas concretas ações que correram à margem do processo de insolvência não pode, nem sequer lhes é oponível, compreendendo-se, assim, que todos os credores da insolvente, quer beneficiem de decisão definitiva que lhes reconheça o seu direito de crédito (e respetivas garantias) sobre o devedor/insolvente, quer não beneficiem desse título, têm de reclamar os seus créditos (e respetivas garantias) no âmbito da insolvência, caso pretendam obter pagamento.
No entanto, conforme decorre do que se vem dizendo, uma coisa são as dívidas da insolvência, em relação às quais valem as regras que se acabam de enunciar, isto é, os credores da insolvência carecem de reclamar os créditos que detém sobre a insolvência junto do administrador de insolvência, dentro do prazo fixado na sentença declaratória da insolvência (ou, caso não o façam, derradeiramente, dentro do prazo e limites fixados pelo art. 146º, em ação instaurada contra a massa insolvente, os credores e o devedor),  ainda que beneficiem de sentença transitada em julgado, que lhes reconheça os créditos (e respetivas garantias) que reclamam, cabendo ao administrador de insolvência reconhecer ou não esses créditos sobre a insolvência após cumprimento dos deveres de indagação que lhe são impostos pelo art. 129º, n.º 1, na sequência do que, poderá também reconhecer outros créditos (e respetivas garantias) que não lhe tenham sido reclamados pelos respetivos credores dentro desse prazo, mas de cuja existência venha a tomar conhecimento na sequência do cumprimento desse seu poder-dever de indagação, juntando após, aos autos de insolvência a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos sobre a insolvência a que alude o art. 129º, lista essa que poderá ser alvo de impugnação nos termos do disposto nos arts. 130º e ss., e outra, bem diversa, são as dívidas da própria massa insolvente, as quais se encontram enunciadas, a título exemplificativo – “além de outras como tal qualificadas neste Código” -, no art. 51º.
Na verdade, existe uma série de dívidas que não são dívidas da insolvência, mas antes dívidas da própria massa insolvente.
Enquanto as dívidas da insolvência são as que se constituíram antes da declaração da insolvência do devedor (art. 47º, n.º 1), as dívidas da massa insolvente são as que se constituíram, grosso modo, após a declaração da insolvência do devedor e cuja constituição resulta do próprio processo de insolvência.
As dívidas da insolvência, conforme antedito, respeitam grosso modo a créditos que se constituíram sobre o devedor declarado insolvente antes de ter sido declarado insolvente. Esses créditos têm de ser reclamadas pelos respetivos credores junto do administrador da insolvência dentro do prazo fixado na sentença declaratória da insolvência para a reclamação de créditos, ainda que o credor tenha esse seu crédito já reconhecido por sentença antes proferida fora do processo de insolvência, já transitada em julgado antes do devedor ter sido declarado insolvente, posto que as dívidas da massa insolvente apenas podem ser pagas desde que sejam reconhecidas por sentença de verificação e graduação de créditos que, na sequência da reclamação de créditos, venha a ser proferida no âmbito do processo de insolvência (no apenso de reclamação de créditos) e que transite em julgado (art. 173º).
As dívidas da insolvência podem respeitar a: créditos privilegiados, garantidos, comuns ou subordinados (art. 47º, n.º 4).
São créditos garantidos sobre a insolvência os que beneficiem de garantias reais, incluindo os que beneficiem de privilégios creditórios especiais (art. 47º, n.º 4, al. a)).
Os bens apreendidos para a massa insolvente que se encontram onerados com garantias reais (v.g., hipoteca, penhor, etc.) ou com privilégio creditório especial são liquidados pelo administrador da insolvência para pagar os credores garantidos.
No entanto, antes de proceder ao pagamento os créditos sobre a insolvência que beneficiem de garantia real ou de privilégio creditório especial o administrador da insolvência terá de abater (descontar ou deduzir) ao valor de liquidação dos bens onerados com garantia real ou com privilégio creditório especial as despesas com a própria liquidação desses bens e efetuar as imputações previstas no art. 172º, n.ºs 1 e 2. O pagamento aos credores garantidos é feito imediatamente, com respeito pela prioridade que lhes caiba na sentença de verificação e graduação de créditos transitada em julgado (arts.173º e 174º, n.º 1, 1ª parte). Se os credores garantidos não obtiverem daquela forma o pagamento integral dos seus créditos, o saldo respetivo será incluído entre os créditos comuns se o devedor responder perante eles com todo o seu património (art. 174º, n.º 1, parte final)[4].
Por sua vez, os bens apreendidos para a massa insolvente que são privilegiados são os que beneficiam de privilégios creditórios gerais (art. 47º, n.º 4, al. a)).
Sem prejuízo do disposto no art. 174º, n.ºs 1, segunda parte, e 2, com as necessárias adaptações (n.º 2, do art. 175º), o pagamento dos créditos privilegiados é feito à custa dos bens sobre os quais recai o privilégio e não afetos a garantias reais prevalecentes, com respeito da prioridade que lhe caiba, e na proporção dos seus montantes, quanto aos que sejam igualmente privilegiados (art. 175º, n.º 1). Se os credores privilegiados não obtiveram daquela forma pagamento integral dos seus créditos, o saldo respetivo será incluído entre os créditos comuns se o devedor responder perante eles com todo o seu património (art. 175º, n.º 2, ex vi, art. 174º, n.º 1, 2ª parte)[5].
Os créditos comuns que incidem sobre os bens apreendidos para a massa insolvente são os que não são nem garantidos, nem privilegiados, nem subordinados (art. 47º, n.º 4, al. c)).
Os credores comuns que viram os seus créditos reconhecidos na sentença de verificação e graduação de créditos proferida no processo de insolvência, transitada em julgado, são pagos antes dos credores titulares de créditos subordinados. Não havendo credores garantidos ou privilegiados, os credores comuns serão pagos através do produto da liquidação dos bens da massa insolvente e, se a massa insolvente for insuficiente para a sua satisfação integral, esse pagamento será efetuado na proporção dos créditos (art. 176º). Caso existam credores garantidos e/ou privilegiados, o produto da liquidação dos bens apreendidos para a massa insolvente que se encontram onerados com as ditas garantias e/ou privilégios servirá para pagar o crédito garantido e/ou privilegiado, pelo que tais credores serão pagos primeiro do que os credores comuns através do produto da liquidação daqueles bens. “Mas, se houver outros bens não onerados com garantias ou privilégios, o produto da liquidação dos mesmos também será utilizado para pagar aos credores comuns. Se os bens onerados com garantias ou privilégios forem liquidados e o produto permitir o pagamento integral dos créditos garantidos ou privilegiados, os credores comuns podem ainda ser pagos com o produto eventualmente restante”[6].
Os créditos subordinados que incidam sobre os bens apreendidos para a massa insolvente são os que se encontram enumerados no art. 48º, exceto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência (art. 47º, n.º 4, al. b))).
Os créditos subordinados são graduados depois dos restantes créditos sobre a insolvência (art. 48º) e são pagos apenas após terem sido integralmente pagos os créditos comuns. Se for possível pagar os créditos subordinados, a ordem de pagamento é a indicada no art. 48º. Porém, se a subordinação for convencional, as partes podem atribuir ao crédito uma prioridade no pagamento diferente da que resulta do art. 48º (n.º 2, do art. 177º). Em relação aos créditos subordinados de cada alínea do art. 48º o pagamento será feito na proporção dos montantes no caso de a massa não ser suficiente para o seu pagamento integral (art. 177º, n.º 1).
Diferentes das dívidas sobre a insolvência, conforme antedito, são as dívidas da massa insolvente.
 As dívidas da massa insolvente são aquelas que se constituíram após a declaração da insolvência do devedor e a sua constituição resulta, grosso modo, do próprio processo de insolvência.
As dívidas da massa insolvente encontram-se elencadas, de modo não taxativo no art. 51º, em que se lê: “1- Salvo preceito expresso em contrário, são dívidas da massa insolvente, além de outras como tal qualificadas neste Código: a) As custas do processo de insolvência; b) As remunerações do administrador da insolvência e as despesas destes e dos membros da comissão de credores; c) As dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente; d) As dívidas resultantes da atuação do administrador da insolvência no exercício das suas funções; e) Qualquer dívida resultante de contrato bilateral cujo cumprimento não possa ser recusado pelo administrador da insolvência, salvo na medida em que se reporte a período anterior à declaração de insolvência; f) Qualquer dívida resultante de contrato bilateral cujo cumprimento não seja recusado pelo administrador da insolvência, salvo na medida correspondente à contraprestação já realizada pela outra parte anteriormente à declaração de insolvência ou em que se reporte a período anterior a essa declaração; g) Qualquer dívida resultante de contrato de contrato que tenha por objeto uma prestação duradoura, na medida correspondente à contraprestação já realizada pela outra parte e cujo cumprimento tenha sido exigido pelo administrador judicial provisório; h) As dívidas constituídas por atos praticados pelo administrador judicial provisório no exercício dos seus poderes; i) As dívidas que tenham por fonte o enriquecimento sem causa da massa insolvente; j) A obrigação de prestar alimentos relativa a período posterior à data da declaração de insolvência, nas condições do artigo 93º; 2- Os créditos correspondentes a dívidas da massa insolvente e os titulares desses créditos são neste Código designados, respetivamente, por créditos sobre a massa e credores da massa”.
Deriva do excurso antecedente que, no âmbito do processo de insolvência, para efeitos de pagamento, impõe-se distinguir entre dívidas da insolvência (que são unicamente as que se constituíram antes da declaração da insolvência do devedor e, por força do princípio da exclusividade, são apenas as que foram reconhecidas no âmbito do processo de insolvência, isto é, que tenham sido nele julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado – art. 173º)[7], as quais serão pagas de acordo com as regras prevista nos arts. 173º a 184º CIRE, ou seja, tendo em consideração as garantias e privilégios de pagamento que lhes assistem sobre os bens apreendidos para a massa insolvente e em função do princípio da igualdade entre as diversas categorias de créditos, conforme já expendido, e, por outro, as dívidas da própria massa insolvente, as quais se constituem após a declaração da insolvência do devedor, cuja constituição, grosso modo, resulta do próprio processo de insolvência, as quais são pagas pelo administrador de insolvência de acordo com as regras do art. 172º do CIRE.
Note-se que a massa insolvente destina-se em primeiro lugar a satisfazer os créditos da massa insolvente, e em segundo lugar, ou seja, supletivamente (com o remanescente que resultar da liquidação da massa insolvente após o pagamento ou a garantia de pagamento das dívidas da massa insolvente), a satisfazer os créditos insolvência[8].
Neste sentido, lê-se no n.º 1 do art. 46º que: “A massa insolvente destina-se à satisfação dos credores da insolvência depois de pagas as suas próprias dívidas, e, salvo disposição em contrário, abrange todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que ele adquira na pendência do processo”.
Conforme se lê no n.º 21 do Preâmbulo do CIRE[9], o legislador distingue expressa e claramente para efeitos de pagamento no âmbito do processo de insolvência entre «dívidas da insolvência» e «dívidas da massa insolvente», delimitando aquelas no art. 47º e dedicando a estas o art. 51º.
Daí que na fase de pagamento o legislador parta de uma distinção fundamental, qual seja: dívidas da massa insolvente e dívidas da insolvência.
As dívidas da massa insolvente, as quais, reafirma-se, se constituem após a declaração da insolvência do devedor, resultando, grosso modo, a sua constituição do próprio processo de insolvência, nas quais se incluem as custas do próprio processo de insolvência, as remunerações do administrador da insolvência e as despesas deste e, além do mais, as dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente, o respetivo pagamento não está dependente de reclamação, mas uma vez realizadas, o pagamento das mesmas tem lugar nas datas dos respetivos vencimentos, qualquer que seja o estado do processo de insolvência (n.º 3 do art. 172º), pelo que o administrador da insolvência deverá proceder ao seu pagamento mal estas se vençam. Caso não o faça, decorridos três meses após a declaração da insolvência, os credores de dívidas sobre a massa insolvente podem instaurar ações declarativas ou executivas contra a massa com vista à cobrança daquelas, correndo essas ações por apenso ao processo de insolvência, com exceção das execuções por dívidas da massa insolvente de natureza tributária (art. 89º).
As dívidas da insolvência (que foram reconhecidas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado) só serão pagas depois de serem integralmente satisfeitas ou garantido o pagamento das dívidas da massa insolvente, ou seja, com o remanescente do produto da venda dos bens apreendidos para a massa insolvente uma vez liquidadas, ou garantido o pagamento das dívidas da massa insolvente.
Porque assim é, compreende-se que nos termos do art. 172º, n.º 1 se estabeleça que: “Antes de proceder ao pagamento dos créditos sobre a insolvência, o administrador da insolvência deduz da massa insolvente os bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas desta, incluindo as que previsivelmente se constituirão até ao encerramento do processo” e que o art. 304º estatua que: “As custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão com trânsito em julgado”.
Com efeito, nos casos em que no processo de insolvência tenham sido apreendidos bens para a massa insolvente, destinando-se o produto da liquidação/venda desses bens a pagar, em primeiro lugar, as dívidas da própria massa insolvente e, apenas, a título subsidiário, as dívidas da insolvência (reafirma-se, que tenham sido julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado), estando incluídas nas dívidas da massa insolvente as custas do processo de insolvência e as despesas da liquidação, em coerência com o princípio de que a massa insolvente se destina, em primeiro lugar, a  pagar as dívidas da massa consagra-se naquele art. 304º o comando de que as custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente e no art. 172º, n.º 1 dá-se concretização prática à tradicional regra da precipuidade das custas do processo e despesas da liquidação[10].
E também coerentemente com o que se vem dizendo compreende-se que o n.º 2, do art. 172º estatua que: “As dívidas da massa insolvente são imputadas aos rendimentos da massa e, quanto ao excedente, na devida proporção, ao produto de cada bem, móvel ou imóvel; porém, a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos”.
Na verdade, destinando-se a massa insolvente a liquidar, em primeiro lugar, as dívidas da massa insolvente e apenas, a título subsidiário, as dívidas da insolvência, estando incluídas nas dívidas da massa insolvente as custas do processo de insolvência, em relação às quais vigora o princípio da precipuidade, mas também, e além do mais, as dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente, impõe-se que o administrador da insolvência, nos rateios parciais que vá fazendo ao longo do processo de insolvência à medida que vai liquidando a massa insolvente, e a final, no rateio final que deverá realizar, antes de proceder ao pagamento dos créditos sobre a insolvência, retenha as quantias necessárias ao pagamento das dívidas da massa insolvente.
As dívidas da massa insolvente são pagas à custa dos rendimentos produzidos pela massa insolvente[11], mas não havendo rendimentos produzidos pela massa insolvente ou sendo o rendimento produzido por esta insuficiente para liquidar a totalidade das dívidas da massa insolvente, a liquidação dessas dívidas é feita proporcionalmente à custas do produto de cada bem, móvel ou imóvel, apreendido para a massa insolvente (art. 172º, n.º 2, primeira parte). Assim, decorre do exposto que, a retenção ou salvaguarda da quantia necessária ao pagamento das custas da massa insolvente (onde, reafirma-se, se incluem as custas do processo de insolvência e as  dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente) têm por referência o produto de liquidação de cada bem que integra a massa insolvente, designadamente, os bens objeto de garantias reais, e não o próprio crédito reconhecido e garantido[12], ou seja, as dívidas da massa insolvente têm de ser liquidadas à custa do produto da liquidação da massa insolvente, na devida proporção.
No entanto, no caso de créditos garantidos com garantias reais que onerem bens apreendidos para a massa insolvente, essa imputação não pode exceder 10% do produto dos bens onerados com garantias reais, salvo na medida em que for indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos (art. 172º, n.º 2, parte final).
Mediante esta disposição legal em relação aos créditos garantidos por garantias reais que tenham sido apreendidos para a massa insolvente (garantias reais essas que têm de ser reconhecidas, relembra-se, na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado), de acordo com Catarina Serra, foi propósito do legislador “compensar os respetivos titulares pelo atraso na venda dos bens onerados (que só pode ter lugar após a realização da assembleia de apreciação do relatório ou, caso não seja designado dia para a sua realização, nos termos da al. n) do n.º 1 do art. 36º, depois de decorridos quarenta e cinco dias sobre a prolação da sentença de declaração de insolvência (art. 36º, n.º 4)) e pela eventual desvalorização dos bens onerados decorrentes desse atraso ou da sua utilização em proveito da massa insolvente. Eles são pagos logo que é liquidado o bem onerado com a garantia real, pelo valor da liquidação, abatidas as respetivas despesas e as imputações devidas pelos créditos sobre a massa (art. 174º, n.º 1), que, como se disse, em regra, podem, no máximo, ascender a dez por cento do produto dos bens (art. 172º n.ºs 1 e 2)”[13].
Na mesma linha expendem Carvalho Fernandes e João Labareda que: “Sucederá muitas vezes – porventura, as mais delas, atendendo ao âmbito das dívidas da massa – que os rendimentos não são suficientes para honrar os compromissos prioritários da massa insolvente. Nesse caso, são os próprios bens, móveis e imóveis, que têm de suportar, o que justifica a regra seguinte, que se fixa na primeira parte do n.º 2. Compreende-se, no entanto, a tutela particular conferida, por princípio, aos credores garantidos exatamente por serem eles, de entre todos os titulares de créditos sobre a insolvência os que, até à concorrência do valor dos bens objeto da garantia, são pagos em primeiro lugar. Daí que a vinculação dos bens livres às dívidas da massa assuma, em regra, uma dimensão bem mais significativa do que sucede com a relação aos bens onerados. Mas não se pode esquecer a injunção final do n.º 2, que condescendo com a imputação das dívidas da massa a bens objeto de garantias – e, consequentemente, ao produto da respetiva liquidação – sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável à satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida.
O que se acaba de dizer, designadamente a propósito do legislador querer favorecer os credores cujos créditos sobre a insolvência estejam garantidos por bens apreendidos para a massa insolvente que se encontrem onerados com garantias reais, determinando, por um lado, que em caso dos rendimentos da massa insolvente serem inexistentes ou insuficientes para satisfazer o pagamento integral das dívidas da massa insolvente, esses bens onerados com garantias reais, assim como todos os restantes bens apreendidos para a massa insolvente sem semelhantes garantias, devem responder, na devida proporção, para a satisfação da massa insolvente, mas que a imputação não excederá 10% do produtos de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos (art. 172º, n.º 2) e, por outro, determinando que esses créditos sobre a insolvência que beneficiem de garantia real, são imediatamente pagos logo que seja liquidado o bem onerado com a garantia real, com respeito pela prioridade que lhes caiba, pelo valor da liquidação, uma vez abatidas as respetivas despesas e as imputações devidas pelo crédito sobre a massa, que, em regra, não excedem 10% do produto do bem (arts. 174º, n.º 1 e 172º, n.º 2, parte final), concatenado com o facto de o art. 175º não prever aquele limite de imputação de 10% em relação aos créditos privilegiados, comuns ou subordinados sobre a insolvência, apenas pode significar que não existindo rendimentos da massa insolvente ou rendimentos da massa insolvente que sejam suficientes para satisfazer as dívidas da massa insolvente, todos os bens que integram a massa insolvente respondem, na devida proporção, pela satisfação das dívidas da massa insolvente; porém, a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, sendo que o remanescente necessário ao pagamento das dívidas da massa insolvente terá de ser assegurado  pelo produto da liquidação dos restantes bens que integram a massa insolvente e que não gozam de garantia real; se o produto desses bens que integram a massa insolvente e que não gozam de garantia real (acrescido dos 10% do valor da liquidação dos bens onerados com garantia real) for insuficiente para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente, então o produto de liquidação dos bens que beneficiam de garantia real respondem, sem qualquer limite, pela satisfação integral das dívidas da massa insolvente, tal como o determina a parte final do n.º 2, do art. 172º.
Dito por outras palavras, tal como se ponderou no acórdão desta Relação de 07/10/2021, Proc. 1/08.0TJVNF-ET.G1 (relatado pelo aqui relator): “Em sede de pagamento das dívidas da insolvência, tendo em consideração que a massa insolvente se destina, em primeiro lugar a satisfazer as dívidas da massa insolvente, compreende-se que o n.º 1 do art. 172º determine que “antes de proceder ao pagamento dos créditos sobre a insolvência, terá o administrador da insolvência de deduzir da massa insolvente os bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas desta, incluindo as que previsivelmente se constituirão até ao encerramento do processo”, posto que apenas uma vez satisfeitas as dívidas da massa insolvente é que se houver remanescente é que se procederá ao pagamento das dívidas da insolvência, de acordo com as regras impostas nos arts. 173º e segs. do CIRE. As dívidas da massa insolvente são liquidadas, em primeiro lugar, com os rendimentos gerados pela própria massa insolvente, mas se esses rendimentos não forem suficientes para satisfazer/pagar as dívidas da massa, são os próprios bens, móveis e imóveis, que integram a massa insolvente que têm de suportar esse pagamento. Porém, quanto aos créditos garantidos sobre a insolvência, porque os respetivos credores são aqueles que são pagos em primeiro lugar no confronto com os demais credores da insolvência, compreende-se que o n.º 2 do art. 172º estatua que a imputação não deverá exceder 10% do produto de bens objeto de garantias reais, salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos, o que significa que se o valor dos rendimentos da massa insolvente e o valor dos bens que integram a massa insolvente que se encontram desonerados de garantias reais não for suficiente para satisfazer as dívidas da massa insolvente e se for necessário recorrer ao produto da venda dos bens que integram a massa insolvente onerados com garantias reais, que exceda esses 10%, não exista qualquer impedimento a esse recurso, posto que as dívidas da massa insolvente é que têm de ser satisfeitas, mesmo que para tal se tenha de recorrer à totalidade do produto da venda de bens onerados com garantias reais”.
Note-se que o que se acaba de dizer em nada é contrariado pelos acórdãos que foram invocados pelo administrador da insolvência e pela 1ª Instância em defesa do seu ponto de vista, posto que nos identificados arestos apenas se decidiu que, por força do princípio da precipuidade das custas do processo de insolvência, consagrado no art. 172º, n.º 1, no caso de inexistência de rendimentos gerados pela massa insolvente ou destes serem insuficientes para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente, o pagamento desta processa-se à custa da liquidação de todos os bens que integram a massa insolvente, na devida proporção, conforme determina a primeira parte do n.º 2, do art. 172º, e que se é certo que, nos termos do art. 172º, n.º 2, parte final, a imputação das dívidas da massa insolvente não excederá 10% dos bens apreendidos para a massa que se encontrem onerados com garantia real, logo a parte final deste n.º 2 ressalva “salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral de créditos garantidos”, concluindo-se que a imputação das dívidas da massa a bens objeto de garantias reais – e, consequentemente, ao produto da respetiva liquidação – pode ocorrer sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável à satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida, o que aqui subscrevemos.
No entanto, em nenhum desses arestos se trata da questão que se coloca nos presentes autos, que é a de saber como se processa o pagamento das dívidas da massa insolvente nos casos em que tenham sido apreendidos para a massa bens onerados com garantias reais e bens não onerados sem garantias reais (créditos garantidos), que é a questão decidenda no presente recurso.
Assentes nas premissas que se acabam de expor, revertendo ao caso dos autos, nele foram aprendidos os bens móveis e imóveis que se encontram discriminados sob as verbas n.ºs 1 a 39 do auto de apreensão junto pelo administrador da insolvência, em 08/05/2017, ao apenso B.
Os bens apreendidos sob as verbas n.ºs 1 a 8 a favor da massa insolvente são móveis e foram liquidados (vendidos) pelo montante global de 9.700,00 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
De acordo com a sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado, sobre o produto da venda dos identificados móveis apreendidos a favor da massa sob as verbas n.º 1 a 8, foram graduados, como créditos privilegiados (privilégio mobiliário geral), os créditos laborais identificados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 80, 91 e 97 na lista de créditos reconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência, cujo montante global excede o produto da liquidação desses bens móveis apreendidos sob as verbas n.ºs 1 a 8.
Já os bens apreendidos para a massa insolvente sob as verbas n.ºs 9 a 21 do auto de apreensão junto pelo administrador da insolvência, em 08/05/2017, ao apenso B, são veículos automóveis.
Os identificados veículos automóveis que foram apreendidos a favor da massa sob as verbas n.ºs 9 a 21 foram liquidados pelo montante global de 35.960,00 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
Em função do decidido na sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado, sobre o produto da venda dos identificados veículos automóveis apreendidos a favor da massa sob as verbas n.º 1 a 8 foram graduados, em primeiro lugar, os créditos de IUC que nela foram reconhecidos quanto a cada um desses veículos e, em segundo lugar, como créditos privilegiados (privilégio mobiliário geral), os créditos laborais identificados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 80, 91 e 97 na lista de créditos reconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência.
Acontece que os créditos de IUC e os créditos laborais que foram reconhecidos na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, quanto aos referidos veículos automóveis das verbas n.ºs 9 a 21 excedem o produto da respetiva liquidação.
Por sua vez, os bens apreendidos para a massa insolvente sob as verbas n.ºs 22 a 27 e 30 a 38 do auto de apreensão junto pelo administrador da insolvência, em 08/05/2017, ao apenso B, são imóveis.
Os mencionados imóveis apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 22 a 27 e 30 a 38 foram liquidados pelo montante global de 206.500,00 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
De acordo com o decidido na sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado, sobre o produto da venda desses imóveis apreendidos a favor da massa insolvente sob as verbas n.º 22 a 27 e 30 a 38 foram graduados, em primeiro lugar, como créditos privilegiados (privilégio imobiliário especial), os créditos laborais identificados em 4, 5, 7 a 10, 12, 15, 28 a 30, 34, 38, 41, 42, 45, 47, 54, 57 a 61, 64, 66, 70, 71, 73, 80, 91 e 97 na lista de créditos reconhecidos apresentada pelo administrador da insolvência, cujo montante global reconhecido naquela sentença excede o produto da liquidação desses imóveis.
Já os bens apreendidos para a massa insolvente sob as verbas n.ºs 28 e 29 do auto de apreensão junto pelo administrador da insolvência, em 08/05/2017, ao apenso B, são imóveis.
Os mencionados imóveis apreendidos para a massa sob as verbas n.ºs 28 e 29 foram liquidados pelo montante global de 165.800,00 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
De acordo com o decidido na sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado, sobre o produto da venda dos referidos imóveis apreendidos a favor da massa sob as verbas n.º 28 e 29 foram graduados, em primeiro lugar, os créditos de IMI que nela foram reconhecidos quanto a cada um desses prédios e, em segundo lugar, o crédito hipotecário constituído sobre esses prédios a favor do apelante Banco 1..., S.A., reconhecido na dita sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado.
O crédito de IMI e o crédito hipotecário que foram reconhecidos quanto aos identificados imóveis apreendidos sob as verbas n.ºs 28 e 29 a favor do apelante Banco 1..., S.A., excedem o produto da liquidação desses mesmos imóveis.
Finalmente, o bem apreendido para a massa insolvente sob a verba n.º 39 do auto de apreensão junto pelo administrador da insolvência, em 08/05/2017, ao apenso B, respeita ao valor da venda de um imóvel realizada no âmbito dos processos executivos identificados naquele auto de apreensão.
O produto de liquidação da verba n.º 39 ascendeu a 56.025,00 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
De acordo com o decidido na sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 21/03/2017, transitada em julgado, sobre o produto da venda da dita verba n.º 39, foi graduado, em primeiro lugar, o crédito de IMI que nela foi reconhecido quanto ao imóvel objeto da venda realizada no âmbito dos mencionados processos executivos e, em segundo lugar, o crédito hipotecário constituído sobre esse prédio a favor do apelante Banco 1..., S.A., reconhecido na dita sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado.
Sucede que o crédito de IMI e o crédito hipotecário que foram reconhecidos quanto ao identificado imóvel apreendido a favor da massa insolvente sob a verba n.º 39 a favor do apelante Banco 1..., S.A., excedem o produto da liquidação desse prédio.
Por sua vez, as custas do processo de insolvência, incluindo a remuneração devida ao administrador da insolvência e todas as dívidas da massa insolvente ascendem à quantia global de 103.516,03 euros (cfr. quadro anexo à proposta de distribuição e de rateio final apresentada pelo administrador da insolvência em 03/07/2023).
Conforme antedito, nos termos do disposto nos arts. 46º, n.º 1 e 172º, n.ºs 1 e 2, as dívidas da massa insolvente são pagas pelos rendimentos da massa insolvente, mas na ausência desses rendimentos (como é o caso dos autos), ou deste ser insuficiente para liquidar as dívidas da massa insolvente, essas dívidas são liquidadas/pagas pelo produto de cada bem que integra a massa insolvente, na devida proporção.
Daí que não existindo no caso dos autos rendimentos da massa insolvente, a massa insolvente composta pelos bens apreendidos sob as verbas n.ºs 1 a 39 destina-se a liquidar, em primeiro lugar, as dívidas da massa insolvente, ou seja, a mencionada quantia de 103.516,03 euros, na devida proporção, e só supletivamente, o respetivo remanescente será destinado a liquidar as dívidas da insolvência que foram reconhecidas na sentença de verificação e graduação de créditos proferida nos autos,  transitada em julgado, e de acordo com a graduação nela efetuada.
De acordo com o administrador da insolvência, secundado pela 1ª Instância na decisão sob sindicância, as dívidas da massa insolvente, no montante de 103.516,03 euros tinham de ser imputadas proporcionalmente ao produto da liquidação das verbas n.ºs 1 a 39 (toda a massa insolvente), mas salvo melhor opinião, sem arrimo jurídico, posto que, nos termos do art. 172º, n.º 2, parte final, a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, não beneficiando de igual limite de imputação os créditos privilegiados que incidem sob as verbas n.ºs 1 a 8 do auto de apreensão, nem os que incidem sob as verbas n.ºs 9 a 21 do mesmo autos, nem os que incidem sob as verbas n.ºs 22 a 27 e 30 a 38 desse auto, dado que estes bens não se encontram onerados com garantia real.
Neste contexto, beneficiando os bens apreendidos a favor da massa insolvente sob as verbas n.ºs 28 e 29 de garantia real, mais concretamente, de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto de liquidação desses imóveis, no montante global de 165.800,00 euros, apenas respondem pela satisfação da dívida da massa insolvente (103.516,03 euros) na proporção de 10%, ou seja, 16.580,00 euros (16.580,00 euros = 165.800,00 euros x 10%), e o apreendido sob a verba n.º 39, na medida em que também beneficia de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto da respetiva liquidação, no montante de 56.025,00 euros, apenas responde pela satisfação da dívida da massa insolvente na proporção de 10%, isto é, pela quantia de 5.602,50 euros (5.602,50 euros = 56.025,00 x 10%).
O remanescente necessário a satisfazer a dívida da massa insolvente, remanescente esse que ascende ao montante de 81.333,53 euros (103.516,03 euros – 16.580,00 euros – 5.602,50 euros) terá de ser satisfeito pelo produto da liquidação das verbas n.ºs 1 a 8, 9 a 21 e 22 a 27 e 30 a 38, na devida proporção, conforme o determina a primeira parte do n.º 2, do art. 172º, uma vez que os bens apreendidos sob essas verbas não beneficiam de garantia real.
Apenas na hipótese do produto da liquidação dos bens apreendidos sob as mencionadas verbas, acrescido daqueles 10% do produto da liquidação das verbas n.ºs 28, 29 e 39 oneradas com garantia real, ser insuficiente para satisfazer integralmente as dívidas da massa insolvente (hipótese essa que não se verifica no caso dos autos) é que o produto das verbas n.ºs 28, 29 e 39, que se encontram oneradas com a hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A. teria de responder por essa satisfação integral das  dívidas da massa insolvente, na devida proporção, sem qualquer limite.
Resulta do exposto, impor-se concluir pela procedência da presente apelação e, em consequência, revogar o despacho recorrido, procedendo à sua substituição por outro, em que se determina que, beneficiando os bens apreendidos a favor da massa insolvente sob as verbas n.ºs 28 e 29 de garantia real, mais concretamente, de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto de liquidação desses imóveis, no montante global de 165.800,00 euros, apenas responde pela satisfação da dívida da massa insolvente (no montante global de 103.516,03 euros) na proporção de 10%, ou seja, 16.580,00 euros (16.580,00 euros = 165.800,00 euros x 10%), e o apreendido sob a verba n.º 39, na medida em que também beneficia de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto da respetiva liquidação, no montante de 56.025,00 euros, apenas responde pela satisfação da dívida da massa insolvente na proporção de 10%, isto é, 5.602,50 euros (5.602,50 euros = 56.025,00 x 10%); o remanescente necessário a satisfazer a dívida da massa insolvente, o qual ascende a 81.333,53 euros (103.516,03 euros – 16.580,00 euros – 5.602,50 euros) será satisfeito por produto da liquidação das verbas n.ºs 1 a 8, 9 a 21 e 22 a 27 e 30 a 38, na devida proporção.
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Sumário (elaborado pelo relator – art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).

1- Para efeitos de pagamento a serem efetuados no âmbito do processo de insolvência impõe-se distinguir entre: a) dívidas da massa insolvente e b) dívidas sobre a insolvência.
2- As dívidas da massa insolvente são as que se constituem, grosso modo, após a declaração da insolvência e cuja constituição resulta do próprio processo de insolvência e encontram-se elencadas, de modo não taxativo, no art. 51º do CIRE, delas fazendo parte, além do mais, as custas do processo de insolvência, a remuneração do administrador da insolvência e as despesas deste, bem como as dívidas emergentes dos atos de administração, liquidação e partilha da massa insolvente.
3- As dívidas da insolvência são as que se constituíram antes da declaração da insolvência e que tenham sido julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, devendo o pagamento dessas dívidas observar a graduação efetuada nessa sentença, de acordo com o regime previstos nos arts. 173º a 184º do CIRE, ou seja, tendo em consideração as garantias e privilégios que lhes assistem sobre os bens apreendidos para a massa insolvente, em função do que ficou decidido na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado, e em função do princípio da igualdade entre as diversas categorias de créditos.
4- A massa insolvente destina-se a liquidar, a título principal, as dívidas da massa insolvente e apenas, a título subsidiário (com o remanescente que resultar da liquidação da massa insolvente, uma vez garantido o pagamento das dívidas da massa insolvente), as dívidas da insolvência que tenham sido julgadas verificadas e graduadas na sentença de verificação e graduação de créditos, transitada em julgado.
5- As dívidas da massa insolvente são pagas com os rendimentos gerados pela própria massa insolvente, mas no caso de não existirem rendimentos gerados pela massa ou desse rendimento ser insuficiente para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente, o pagamento destas processa-se à custa do produto da liquidação dos bens que integram a massa insolvente, proporcionalmente, tendo em consideração o produto de liquidação de cada um desses bens.
6- Contudo, tendo sido apreendidos para a massa insolvente bens que se encontrem onerados com garantias reais que garantam créditos sobre a insolvência de credor desta (crédito esse e respetiva garantia real julgados verificados e graduados na sentença de verificação e graduação de créditos, transitado em julgado) e bens apreendidos para a massa que não se encontrem onerados com garantia real, os bens apreendidos para a massa que se encontram onerados com garantia real apenas respondem pela satisfação das dívidas da massa insolvente com 10% do valor da sua liquidação, tendo a restantes parte das dívidas da massa insolvente de serem pagas à custa  do valor da liquidação dos bens que integram a massa insolvente que não se encontram onerados com garantias reais (na proporção do valor de liquidação de cada um desses bens). Apenas no caso do valor de liquidação dos bens apreendidos para a massa que não se encontrem onerados com garantia real (acrescido de 10% do valor de liquidação dos bens apreendidos para a massa que se encontrem onerados com garantia real) não ser suficiente para liquidar integralmente as dívidas da massa insolvente é que o pagamento dessas dívidas é feito à custa do produto de liquidação dos bens apreendidos para a massa que se encontrem onerados com garantias reais, sem qualquer limite.  
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V- Decisão

Nesta conformidade, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães acordam em julgar a presente apelação procedente e, em consequência, revogam o despacho recorrido e, em sua substituição, determinam que, beneficiando os bens apreendidos a favor da massa insolvente sob as verbas n.ºs 28 e 29 de garantia real, mais concretamente, de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto de liquidação desses imóveis, no montante global de 165.800,00 euros, apenas respondem pela satisfação das dívidas da massa insolvente (no montante global de 103.516,03 euros) na proporção de 10%, ou seja, 16.580,00 euros, e o apreendido sob a verba n.º 39, na medida em que também beneficia de hipoteca constituída a favor do apelante Banco 1..., S.A., o produto da respetiva liquidação, no montante de 56.025,00 euros, apenas responde pela satisfação das dívidas da massa insolvente na proporção de 10%, isto é, 5.602,50; o remanescente necessário a satisfazer as dívidas da massa insolvente (remanescente esse que ascende ao montante de 81.333,53 euros) será suportado pelo produto da liquidação das verbas n.ºs 1 a 8, 9 a 21 e 22 a 27 e 30 a 38, na devida proporção, uma vez que os bens que integram estas verbas não beneficiam de garantia real.
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Custas da apelação pela massa insolvente (arts. 527º, n.ºs 1 e 2 do CPC e 304º do CIRE).
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Notifique.
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Guimarães, 29 de fevereiro de 2024

José Alberto Moreira Dias – Relator
Lígia Paula Ferreira de Sousa Santos Venade – 1ª Adjunta
José Carlos Pereira Duarte – 2º Adjunto  



[1] Ferreira de Almeida, “Direito Processual Civil”, vol. II, 2015, Almedina, págs. 395 e 396.
[2] A que se reportam todas as disposições legais infra indicadas, sem menção em contrário.
[3] Maria do Rosário Epifânio, “Manual de Direito da Insolvência”, 7ª ed., Almedina, pág. 267; Catarina Serra, “Lições de Direito da Insolvência”, abril de 2018, pág. 291.
[4] Alexandre de Soveral Martins, “Um Curso de Direito da Insolvência”, vol. I, 4ª ed., Almedina, págs. 506 e 507.
[5] Alexandre de Soveral Martins, ob. cit., págs. 509 e 510.
[6] Alexandre de Soveral Martins, ob. cit., págs. 510 e 511.
[7] Catarina Serra, ob. cit., pág. 291 e 292, em que expende: “Se bem que o pressuposto do exercício do poder executivo pelos credores seja a declaração judicial de insolvência, é a sentença de verificação de créditos que os autoriza a participar no rateio sobre os bens do devedor. O processo de insolvência rege-se, nesta matéria, pelo princípio da exclusividade: só os credores que obtenham o reconhecimento judicial dos seus créditos no processo de insolvência podem legitimamente aspirar a que o seu crédito seja realizado no processo. Não parece, portanto, haver dúvidas quanto à natureza – declarativa – e ao conteúdo da sentença de verificação de créditos – declaração ou certificação de direitos. Desempenha, correspondentemente, a função de título executivo certificativo. Habilitando os credores a aceder à fase do pagamento. (…). Além da verificação dos créditos, deve haver sempre lugar à sua graduação. A graduação é essencial para determinar não só a ordem como a forma de pagamento das várias classes de créditos. A lei determina que a graduação seja geral para os bens da massa insolvente e especial para os bens a que respeitam   
[8] Catarina Serra, ob. cit., pág. 256; Carvalho Fernandes e João Labareda, “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado”, 3ª ed. Quid Juris, pág. 291, onde escrevem que: “no n.º 1 (do art. 46º), definem-se, sem quaisquer inovações relevantes, o âmbito e a função da massa insolvente. Esclarece-se a adstrição da massa à satisfação primeira das suas próprias dividas, que o Código identifica no art. 51º”. 
[9] Em que se lê: “Distinguem-se com precisão as «dívidas da insolvência», correspondentes aos créditos sobre o insolvente cujo fundamento existisse à data da declaração de insolvência e aos que lhe sejam equiparados (que passam a ser designados como «créditos sobre a insolvência», e os respetivos titulares como «credores da insolvência»), das « dívidas ou encargos da massa insolvente» (correlativas aos «créditos sobre a massa», detidos pelos «credores da massa»), que são, grosso modo, as constituídas no decurso do processo”. Uma vez que o processo de insolvência tem por finalidade o pagamento, na medida em que ele seja ainda possível, dos créditos da insolvência, a constatação de que a massa insolvente não é sequer suficiente para fazer face às dividas – aí compreendidas, desde logo, as custas do processo e a remuneração do administrador da insolvência – determina que o processo não prossiga após a sentença de declaração de insolvência ou seja mais tarde encerrado, consoante a insuficiência da massa seja reconhecida antes ou depois da declaração. Em ambos os casos, porém, prossegue sempre o incidente de qualificação da insolvência, com tramitação e alcance mais mitigados”.
[10] Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit., pág. 644.
[11] Carvalho Fernandes e João Labareda, ob. cit., pág. 644, onde expendem que, para efeitos do art. 172º, n.º 2, deve entender-se por “rendimentos da massa insolvente”, “qualquer proveito patrimonial que acresça ao universo de bens apreendidos e que resulte diretamente desses ou da sua administração, excluídos, no entanto, os bens que venham a integrar a massa por virtude dos arts. 120º e seguintes, ou em razão da recusa do cumprimento de negócios em curso em conformidade com os arts. 120º e seguintes”, especificando que: “A determinação do âmbito dos rendimentos é importante porque, estando eles afetos à satisfação prioritária das dívidas da massa, não podem, em regra, ser utilizados para pagamento aos credores da insolvência, antes da respetiva liquidação integral, devendo ser usados para esse fim, normalmente, apenas no ratio final, a não ser que manifesta e comprovadamente excedam o necessário para honrar as dívidas da massa”.
[12] Ac. R.G., de 11/01/2018 Proc. 2465/13.1TBVCT, em que e lê: “O que está em causa é a tradicional regra da precipuidade das custas do processo e despesas de liquidação, estipulando o n.º 1 do art. 172º que antes de proceder ao pagamento dos créditos sobre a insolvência o administrador da insolvência deduz da massa insolvente os bens ou direitos necessários à satisfação das dívidas desta; e conferindo o n.º 2 deste preceito, por princípio, uma particular tutela aos credores garantidos ao consagrar que a imputação não excederá 10% do produto de bens objeto de garantias reais, não obstante a salvaguarda constante da parte final do preceito (“salvo na medida do indispensável à satisfação integral das dívidas das massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral dos créditos garantidos”). O art. 172º impõe que “antes de ser dado pagamento aos credores deve ser garantido o pagamento das custas do processo e dívidas da massa, imputando-se estas primeiro aos rendimentos da massa e depois, na devida proporção, ao produto de cada bem, não excedendo essa imputação, em princípio, 10% do produto de bens objeto de garantias reais. Daqui decorre que a retenção ou salvaguarda da quantia necessária ao pagamento das custas do processo e dívidas da massa tem por referência o produto de cada bem, designadamente, os bens objeto de garantias reais, e não o próprio crédito reconhecido e garantido. Assim, e para que seja respeitado o preceituado no art. 172º, designadamente o seu n.º 2, é necessário garantir que do produto da venda e bens objeto de garantias reais é depositado quantia equivalente a pelo menos 10% desse valor (que poderá ser superior considerando a parte final do preceito)”.
No mesmo sentido Acs. RG., de 10/07/2023, Proc. 170/09.2TBEPST-AN.G1, em que adicionalmente se pondera que: “A dispensa do depósito do preço não abrange as quantias que sejam necessárias à salvaguarda do pagamento das dívidas da massa insolvente, que saem precípuas do produto do bem. Se é certo que, nos termos do art. 172º, n.º 2 do CIRE, a imputação das dívidas da massa não excederá 10% do produto do bem onerado com garantia real, logo a parte final do preceito ressalva “salvo na medida do indispensável à satisfação integra das dívidas da massa insolvente ou do que não prejudique a satisfação integral de créditos garantidos”. A imputação das dívidas da massa a bens objeto de garantias – e, consequentemente, ao produto da respetiva liquidação – pode ocorrer sem qualquer limite, desde que isso seja indispensável à satisfação integral das mesmas, e na respetiva medida”; RG., de 15/06/2021, Proc. 309/13.3TBVLN-J.G1; RG., de 20/03/2014, Proc. 269/07.0TBGMT-G1; R.P. de 16711/2015, Proc. 372/14.0TBOAZ-G-P1
[13] Catarina Serra, ob. cit., pág. 293.