Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1345/18.9T8CHV-A.G1
Relator: MARIA DA CONCEIÇÃO SAMPAIO
Descritores: PRINCÍPIOS DO DIREITO PROCESSUAL CIVIL
ADMISSÃO DE MEIOS DE PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 05/23/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1.ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
Sumário (da relatora)

I - O princípio do inquisitório deve ser interpretado como um poder-dever limitado, restringindo-se, em matéria probatória, na busca pelas provas dentro dos factos alegados pelas partes (factos essenciais), com vista à justa composição do litígio e ao apuramento da verdade.

II - O princípio da cooperação deve ser conjugado com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que não comporta o suprimento por iniciativa do juiz da omissão de articulação de factos estruturantes da causa no momento processualmente adequado.

III - O art.º 423º, nº1, do C.P.C., consagra o princípio geral de proposição dos meios de prova, constituendos e pré-constituídos, com os articulados, ao dispor que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.

IV – Na indagação da impossibilidade da prévia apresentação, a terminologia usada nos art.º 423º, n.º 3 e 425º é “não ter sido possível”, implicando que o fundamento haja de ser apreciado segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência, isto é, a diligência de um bom de família em face das circunstâncias do caso (art.º 487, nº2, do Código Civil).

V - A inquirição por iniciativa do tribunal constitui um poder-dever complementar de investigação oficiosa dos factos, e não uma forma de suprimento oficioso de comportamentos negligentes das partes.
Decisão Texto Integral:
I – RELATÓRIO

(..) e (..), Autores nos presentes autos, inconformados com o despacho proferido em 08.02.2019 que indeferiu a junção de documentos e a audição de testemunha, dele vêm interpor recurso, finalizando com as seguintes conclusões:

I - Objeto da presente ação é a declaração de que o A. é o único e exclusivo dono e possuidor do prédio rústico sito no lugar de … também conhecido por …, da freguesia de…, inscrito na respectiva matriz sob o art. (…) e registado na C. R. Predial de … sob o n.º (..) a favor do A. e a condenação dos RR. a reconhecerem essa declaração.
II - É também objeto dos autos que se declare que faz parte integrante deste prédio o trato com 1687 metros quadrados de área, sito no lado poente desse prédio, de que os RR. pretendem apossar-se, o qual tem a configuração de um triângulo irregular, cujo lado norte mede 58,39 metros, o nascente 61,54 e o poente 69,08, constituindo este a estrema entre o identificado prédio do A. e aquele de que os RR. se dizem donos e a condenação dos RR. a reconhecerem essa declaração bem como na consequente restituição desse trato ao A. livre da vedação de postes e arame farpado que ali instalaram.
III - Os RR. instalaram essa vedação de postes e arame farpado no prédio do A. para estabelecerem, do lado poente, a estrema entre o prédio do A. e o prédio na posse dos RR., situando-se o topo norte dessa vedação 58,39 metros para nascente sobre o prédio do A.
IV - O prédio na posse dos RR. é uma parcela que fazia parte integrante do prédio rústico inscrito sob o art. …, sito no dito lugar de …, prédio este que foi de (…) e mulher, que o venderam, em 1966, a (…) , este a(…) , em 1978, e este a (..) em 1986.
V - Falecido (..) (em 1997) e arrogando-se (…) dono de todo o prédio, reagiu a viúva daquele, dizendo-se dona da parcela do art. …situada a sul da referida estrada municipal que liga (…) e procedeu, entre 1998 e 2000, à vedação dessa parcela, com postes aramados, do lado norte (ao longo dessa estrada municipal) e do lado nascente conforme confronta com o prédio do A. com o art. 1519.
VI –(..), ao deparar com a vedação construída por (…) , derruba-a.
VII – (..) e filhos instauraram, de seguida, a ação n.º 196/00 pelo 2.º Juízo do extinto Tribunal de Chaves contra (…) para reivindicar a dita parcela.
VIII - Embora os AA. tivessem indagado exaustivamente no Serviço de Finanças de … o que aí constava na matriz rústica de ... sobre o prédio inscrito sob o art. ... e também em sede de imposto sucessório por óbito de (…) , só em princípios de dezembro de 2018, já depois da audiência prévia deste processo, tomaram conhecimento desta ação 196/00 e do teor de sua p. i. e documentos, além do mais.
IX - De entre os documentos juntos com a p. i. está o n.º 6 que é um esboço topográfico do prédio com o art. 1521 atravessado, sensivelmente ao meio, pela dita estrada municipal.
X - Embora elaborado sem a preocupação de rigor, estão as suas estremas delineadas com bastante precisão, designadamente a sua estrema nascente que o separa do prédio do A. com o art. ….
XI - Para evitar confusão entre ambas as parcelas, designa a parcela a norte da mencionada estrada por “Prédio de … art. …” e a que está a sul por “Prédio do … art. …”, que é a reivindicada.
XII - Observando esse esboço topográfico e tendo em atenção os pontos cardeais aí assinalados, que coincidem com os constantes da matriz, vemos que a citada estrema nascente parte da aludida estrada e segue na direção sul poente, ou seja, sensivelmente no sentido nordeste sudoeste, isto é, em sentido bem diferente da estrema assinalada pelos AA. na sua planta topográfica junta com a p. i. como doc. n.º 8 e que está a fls. 28.
XIII - Vê-se também que essa estrema parte, a norte, do termo da confinância, a nascente, do prédio com o art. 1521 com o prédio com o art. 1522, que foi de … (ou …) e é hoje a casa de …, como se constata do doc. n.º 7 junto com a p. i. e se encontra a fls. 68 destes autos.
XIV - Vê-se também que essa estrema está no sentido da que o pai do A. lhe ensinou como sendo a estrema poente do seu prédio com o art. 1519.
XV - Considerando que a delineação dessa estrema é da autoria bem consciente dos vendedores aos RR. da parcela cuja posse detêm, não podem restar dúvidas a ninguém de que a vedação que os RR. construíram está muito distante daquela estrema, pelo menos 58,39 metros junto à estrada municipal.
XVI - É também incontestável que esse esboço e a p. i. dessa ação, de credibilidade robustecida pelo decurso do tempo, constituem prova clarividente que muito pode contribuir para o esclarecimento da verdade material e para a justa decisão da causa.
XVII - O facto de tal documentação ter chegado ao conhecimento do Tribunal, seja por que via for, afigura-se-nos motivo mais que suficiente para fazer nascer no Douto Julgador o poder-dever de ordenar a sua junção ao processo sob pena da contingência de prolação de sentença iníqua.
XVIII - Os fundamentos invocados pelo Meritíssimo Juiz a quo para rejeitar a junção aos autos dos documentos em causa, ou seja, a p. i. da ação n.º 196/00 com documentos anexos em especial o n.º 6, não justificam o indeferimento e a não aplicação do disposto no art. 7.º n.º 1 e 411.º do C.P.C., o que gera a nulidade da sentença nessa parte conforme o disposto no art. 615.º n.º 1 al. b) do C.P.C.
XIX - Foi sim aplicado indevidamente o disposto no art. 423.º do C.P.C.
XX - Também o fundamento invocado para recusar a audição da testemunha A. R., não justifica o indeferimento e a não aplicação do disposto no art. 526.º do C.P.C., o que gera nulidade da sentença nesta parte conforme o disposto no art. 615.º n.º 1 al. b) do C.P.C.
XXI - Foi sim aplicado indevidamente o constante do art. 598.º do C.P.C.
XXII - Deve a douta sentença ser anulada e, no uso do disposto nos art. 7.º n.º 1 e 411.º e 526.º, deve ser ordenada a junção aos autos da p. i. com documentos anexos, designadamente o n.º 6, da ação n.º 196/00 do 2.º Juízo do extinto Tribunal de Chaves; e ordenar-se a audição da testemunha A. R..
Pugnam os Recorrentes pela revogação do despacho recorrido o qual deve ser substituído por outro que defira a junção dos documentos e a audição da testemunha.
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Foram apresentadas contra-alegações, defendendo os Recorridos a manutenção do decidido.
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Foram colhidos os vistos legais.

Cumpre apreciar e decidir.
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II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

As questões decidendas a apreciar, delimitadas pelas conclusões do recurso, consiste em saber:

- se ocorre a nulidade da decisão por falta de fundamentação;
- se deve ser admitida a junção dos documentos e a audição da testemunha requerida pelos Autores, no decurso da audiência de discussão e julgamento.
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III – FUNDAMENTAÇÃO

Os factos a considerar são os que resultam do relatório supra e do despacho recorrido que aqui se reproduz:

Refª 1859617:
A fls. 126 e ss. vieram os AA. apresentar um requerimento e com o mesmo juntar documentos. Indicam igualmente uma testemunha que pretendem que seja inquirida na próxima sessão da audiência de julgamento designada para o dia 13/02/2019.
A fls. 147 e ss. vieram os RR. opor-se à referida junção e bem assim à admissão do requerimento, o qual entendem configurar um novo articulado.
Cumpre apreciar.
Os presentes autos encontram-se na fase do julgamento, tendo já sido realizada uma sessão e estando agendada uma outra para a produção da restante prova.
Resulta evidente que o requerimento apresentado pelos AA. é manifestamente extemporâneo. No seu requerimento os AA. não vêm apenas juntar os documentos mas aproveitam para tecer um conjunto de considerações acerca da forma como tem decorrido a produção de prova e aquilo que, no seu entender, já se pode extrair da mesma, o que apenas deverá ocorrer em sede de alegações. Aproveitam também para explicar, de forma mais detalhada, as confrontações do prédio dos AA e fazer uma leitura/interpretação das certidões prediais relativas aos prédios confinantes que já se mostram juntas aos autos. Tudo factos que já poderiam e deveriam ter alegado na fase dos articulados, não se tratando por isso de articulado superveniente, sendo certo que nem os AA. alegam qualquer superveniência objectiva ou subjectiva para o efeito (cfr. artigo 588º do CPC).
Temos pois que o princípio da cooperação deve ser conjugado com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que não comporta o suprimento por iniciativa do juiz da omissão de articulação de factos estruturantes da causa no momento processualmente adequado.
O referido articulado é pois processualmente inadmissível e deve ser desentranhado.
Quanto aos documentos juntos com o requerimento, cumpre referir que em relação à certidão do processo 196/2000 já o Ilustre Mandatário dos AA, requereu a sua junção aos autos por duas vezes, no início da audiência de julgamento e por duas vezes a junção lhe foi indeferida. Desta vez, o Mandatário vem invocar o princípio da cooperação e o princípio do inquisitório para justificar a junção (cfr. artigos 7º nº 1 e 411º do CPC).
Não têm qualquer aplicação à situação dos autos os normativos invocados.
Não pode o Juiz ao abrigo do inquisitório e da cooperação suprir o incumprimento de formalidades essenciais pelas partes, permitir o atropelo de normas legais e nem pode obviamente, determinar oficiosamente a junção de documentos cuja junção já foi indeferida.
O disposto no artigo 411º do CPC não descaracteriza, nem invalida, o princípio base do processo civil e que é o de que o impulso processual, competindo às partes em toda a sua extensão, nomeadamente no tocante à indicação e realização oportuna das diligências probatórias (como já o enunciava o Ac. STJ, de 28.3.2000: Sumários, 39.°-23). Por isso, só em contexto diferenciado, e não naquele que os AA. agora pretendem, se pode conceber que o art. 411º do CPC estabelece um poder-dever do juiz, com vista à plena realização do fim do processo (Cf. Ac. RL, de 24.6.2010: Proc. 12473/04.8YYLSB-A.L1-6 disponível em www.dgsi.pt).
Dúvidas não restam de que a admissibilidade da junção deverá ser apreciada nos termos do n.º 3 do art.º 423º do CPC. Para a junção dos documentos ao abrigo do referido normativo, incumbia aos AA. alegar e provar que a sua apresentação não foi possível até ao momento temporal a que alude o n.º 2 do mesmo artigo ou que a sua apresentação só se tornou possível ao abrigo de ocorrência posterior. Porém, não o fizeram. Na verdade, e independentemente da pertinência ou necessidade desses elementos probatórios (art.º 443º), os AA. referem apenas que só tiveram conhecimento da existência dessa acção nº 196/2000 e por mero acaso em princípios de Dezembro findo. Ora é verdade que a certidão foi requisitada pelos AA. em Dezembro de 2018 mas a acção é de 2000, tendo os AA. obrigação de antes da instauração da presente acção encetar todas as diligências no sentido de obterem os documentos necessários à instrução dos autos. Tal documento poderia muito bem ter sido junto com a PI. O simples facto de os AA. só terem conhecimento da acção nesta fase processual “por mero acaso” não é argumento suficiente. Sem quebra do respeito sempre devido por opinião em contrário, tal razão, não se prefiguram como atendível, no sentido de ser apta/adequada a demonstrar a impossibilidade dos AA. (os art.º 423º, n.º 3 e 425º falam em “não (ter) sido possível”), num quadro de normal diligência, terem tido conhecimento anterior da situação e/ou da existência do documento. Por outro lado, não vemos qual tenha sido a “ocorrência posterior”, suficientemente consistente e atendível, que tornou necessária a apresentação do mesmo documento, já rejeitado por duas vezes nos autos.
Pelo exposto indefere-se uma vez mais a referida junção por manifestamente extemporânea.
Quanto ao documento de fls. 142, intitulado “Protocolo Propriedade do Alto de …” celebrado entre os AA. e o Presidente da Junta de Freguesia de ... invocam os AA. que a sua junção apenas agora se tornou relevante em face do alegado em audiência de julgamento pelas testemunhas, nomeadamente pela testemunha A. F. que se referiu à sua existência. Considerando o argumento expendido e tendo em conta que a junção do documento assumiu particular relevância apenas com o depoimento da referida testemunha em audiência, admite-se a sua junção aos autos nos termos do disposto no artigo 423º nº 3, in fine, do CPC.
Por último, pretendem ainda os AA. que o Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 526º do CPC, proceda agora à inquirição de uma testemunha, o Sr. Engenheiro A. R., o qual procedeu à celebração com os AA. do referido protocolo e como tal deverá depor sobre a celebração do mesmo, implantação dos pilares, correntes e cadeado, natureza do espaço entre esses pilares e a capelinha ali existente e também sobre localização da extrema do prédio dos AA. do lado do poente, com o prédio que foi de E. R. e que foi vendido aos RR.
Cumpre referir que os factos relativos à celebração do protocolo, implantação dos pilares, correntes e cadeado, natureza do espaço entre esses pilares e a capelinha ali existente são factos meramente instrumentais que resultam agora da instrução da causa e nem sequer foram alegados pelos AA. Quanto ao facto de a referida testemunha ter conhecimento da localização da estrema poente do prédio dos AA. o mesmo não se retirou do depoimento das testemunhas até agora inquiridas. Mas mesmo que assim seja, o A. marido que outorgou o mencionado protocolo em 2005 poderia muito bem ter indicado a referida testemunha na sua PI para a prova dos factos ali alegados e podia fazê-lo incluindo até 20 dias antes da realização da audiência de julgamento nos termos do disposto no artigo 598º nº 2 e 3 do CPC.
Não o fez.
Vejamos o entendimento da Jurisprudência acerca do disposto no artigo 526º do CPC.
Na sua individualidade, o que o disposto no art. 526º CPC, permite não ultrapassa a dimensão equivalente a, actualmente, impor ao juiz um poder-dever de ordenar a notificação oficiosa de pessoas, não oferecidas como testemunhas, mas quando haja razões para presumir que têm conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa. Este poder, complementar, de investigação oficiosa do tribunal pressupõe que as partes cumpriram o ónus que sobre elas prioritariamente recai de indicarem tempestivamente as provas de que pretendem socorrer-se para demonstrarem os factos cujo ónus probatório lhes assiste, não podendo configurar-se como uma forma de suprimento oficioso de comportamentos negligentes das partes (Ac. RG, de 4.3.2013: Proc. 293/12.0TBVCT-J.G l.dgsi.Net).
Acervo que determina eleger como hipótese operacional não se encontrar o juiz obrigado a proceder à inquirição de uma testemunha só porque a parte, que a não apresentou oportunamente, invoca a importância daquela inquirição para a descoberta da verdade (Cf. Ac. RP, de 22.2.2011: Proc. 476/09.0TBVFR-B.Pl.dgsi.Net).
A tudo acresce que a concessão ao tribunal da faculdade de tomar declarações a pessoa não indicada como testemunha, não pode servir para subverter a regras processuais relativas à indicação e produção das provas e ao princípio do dispositivo.
Pois que, se acaso o Tribunal fizer um tal uso dessa prerrogativa poderá estar a violar princípios constitucionais fundamentais, inerentes à aplicação da justiça e aos Tribunais, como sejam o da independência, da imparcialidade e da igualdade (Ac. RE, de 4.3.2004: Proc. 2045/03-2.dgsi.Net citado no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 15/11/2016, Proc nº 3250/13.6TJCBR.C1 também disponível em www.dgsi.pt).
Pelo exposto, indefere-se a inquirição da mencionada testemunha.
Custas do incidente anómalo pelos AA. com taxa de justiça que se fixa em 2 UC
(artigos 7º nºs 4 e 8 do RCP).
Notifique, devolvendo ao apresentante o teor de fls. 126 a 141v e 143 a 145 dos autos.”.

Sustentam os Recorrentes que a decisão recorrida enferma da nulidade prevista no artigo 615º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, na medida em que os fundamentos invocados para rejeitar a junção dos documentos e a inquirição da testemunha, não justificam o indeferimento.
Dispõe este normativo que é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

Como ensinava o Professor Alberto dos Reis (1), a nulidade por falta de motivação ocorre quando há “ausência total de fundamentos de direito e de facto”, esclarecendo que “o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade”.
A mesma posição é perfilhada pelo Professor Antunes Varela (2), que refere que “para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.

Apreciada a decisão recorrida, é manifesto que não enferma da nulidade que lhe é apontada, visto que nela se mostram bem (diremos até muito bem) explicitados os fundamentos que levaram ao indeferimento das pretensões dos Autores.

Improcede, pois, a nulidade invocada.

Apreciemos, agora, a questão que na verdade conforma o objeto deste recurso e que se prende com o saber se deve ser admitida a junção dos documentos e a audição da testemunha requerida pelos Autores, no decurso da audiência de discussão e julgamento.

A questão a apreciar insere-se no âmbito do direito à prova e oportunidade da sua apresentação.

O direito à prova emana da necessidade de se garantir ao cidadão a adequada participação no processo e de assegurar a capacidade de influenciar o conteúdo da decisão.

A consagração constitucional do direito a um processo equitativo (artigo 20.º, nº4 da Constituição da Republica Portuguesa) envolve a opção por um processo justo em cada uma das suas fases, constituindo o direito fundamental à prova uma das dimensões em que aquele se concretiza. Como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional de 11/11/2008, “o direito à tutela jurisdicional efetiva para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, genericamente proclamado no artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (CRP), implica um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância de garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultados de umas e outras” (3).

O direito à prova significa que as partes conflituantes, por via de ação e da defesa, têm o direito a utilizarem a prova em seu benefício e como sustentação dos interesses e das pretensões que apresentarem em tribunal. As partes têm ainda o direito a contradizer as provas apresentadas pela parte contrária ou suscitadas oficiosamente pelo tribunal bem como o direito à contraprova.

A este propósito afirma Eduardo Cambi que as partes devem, pois, ter a oportunidade de demonstrar os fatos que servem de fundamento para as respetivas pretensões e defesas, sob pena de não conseguirem influenciar o órgão julgador no julgamento da causa. A noção de direito à prova aumenta as possibilidades das partes influenciarem na formação do convencimento do juiz, ampliando as suas chaces de obter uma decisão favorável aos seus interesses (4).

Em suma, o direito fundamental à prova implica que as partes tenham liberdade para demonstrar quaisquer factos, mesmo que não possuam o respetivo ónus da prova, desde que entendam que a sua comprovação diminuirá os seus riscos processuais (5).

Todavia, o direito à prova não é ilimitado.

O direito à prova não pode ser tomado por um direito absoluto na sua essência, e por isso, por vezes, terá de sofrer restrições.
No campo das proibições de prova, importa considerar a natureza processual ou substancial que estas revistam: tem natureza substancial quando colocada essencialmente em função dos direitos que o ordenamento reconhece aos indivíduos, independentemente do processo; está em causa uma proibição de prova processual, quando for colocada em função de interesses atinentes à lógica e à finalidade do processo (6).

Sem entrar na classificação conceitual de “prova proibida”, ora como uma limitação legal à produção da prova, ora como uma limitação legal a valoração da prova, importa sublinhar aqui a sua importância em termos de prova inadmissível, por referência àquela prova que, por qualquer razão legal, não pode ser admitida no processo. Neste conspecto, a inadmissibilidade corresponde à verificação de um impedimento à prática de determinado acto no processo seja porque a lei não admite in tottum ou não admite com aquela forma ou altura do processo. Com efeito, na doutrina refere-se à prova inadmissível para descrever os meios de prova que, por qualquer motivo, não podem ser inseridas nos autos.
Um dos limites que a lei impõe respeita, precisamente, ao momento da sua apresentação.
Quanto à prova por documentos, a oportunidade da sua apresentação encontra-se legalmente fundada na previsão do art.º 423.º, do C.P.C.

O nº1 deste preceito consagra o princípio geral de proposição dos meios de prova, constituendos e pré-constituídos, com os articulados, ao dispor que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.

Da exegese do 423.º do C.P.C., extrai-se que os documentos podem ser apresentados nos seguintes momentos: a) com o articulado respetivo; b) até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final mas, neste caso, a parte é condenada em multa, exceto se provar que não os pode oferecer com o articulado respetivo; e c) posteriormente aos mencionados 20 dias, até ao encerramento da discussão em 1ª instância mas, neste caso, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento e os que provem factos posteriores a ele ou que, provando factos anteriores, se formem posteriormente ou se tornem necessários por virtude de ocorrência posterior.

O art.º 423º do C.P.C. regula tão só e apenas o direito que assiste às partes de fazerem juntar ao processo documentos, independentemente da sua pertinência, da sua relevância e da apreciação do seu valor probatório (7).

As circunstâncias que tornam admissível a apresentação de documentos depois dos 20 dias que antecedem a audiência final têm de ser alegadas e provadas pela parte que pretende a junção do documento.

Visou-se com a restrição contida neste preceito (que difere da anterior redação do art.º 523º, nº 2) disciplinar a produção de prova, assegurando-se o oportuno contraditório e obviando a intuitos exclusivamente dilatórios.

A falta de diligência da parte e a produção do chamado "efeito-surpresa" são incompatíveis com os parâmetros atuais do processo civil. Como o é a apresentação de um documento na audiência final com vista a provocar o seu adiamento. Um e outro estão correlacionados, pois que a diligência constitui um parâmetro de aferição da conduta da parte no desenvolvimento do processo.

Na indagação da admissibilidade do documento, quando invocada a impossibilidade da prévia apresentação, o seu fundamento haverá de ser apreciado segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência, isto é, a diligência de um bom de família em face das circunstâncias do caso (art.º 487, nº2, do Código Civil).

Quando invocada a necessidade da sua junção em virtude de ocorrência posterior o grau dessa necessidade não tem de ser significativo, bastando que a apresentação do documento se revele útil como meio de prova.

Na verdade, como se escreveu no já citado acórdão da Relação de Lisboa de 25/9/2018 (8), “da economia do preceito legal não se descortina uma especial intenção de reforçada excecionalidade; não é necessário que o documento cuja junção se pretende seja o único (ou principal) meio de prova, bastando que a apresentação do documento se revele útil como meio de prova”.

Seguindo ainda o entendimento considerado no referido aresto “A ocorrência posterior deve ser relacionada com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialéctica que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa (…). E nesse conspecto haverá de ter em conta o regime legal relativamente ao apuramento dos factos relevantes. As partes apenas estão adstritas à alegação dos factos essenciais (artigos 5º, nº 1, 552º, nº 1, al. d), e 572º, al. c), do NCPC); mas o tribunal, para além desses, pode considerar os factos instrumentais e complementares ou concretizadores que resultem da discussão da causa (art.º 5º, nº 2, do NCPC). Ora será aquando da revelação desses factos decorrentes da produção de prova na audiência que poderá surgir a necessidade, no apontado sentido de utilidade, de confirmação desses factos mediante prova documental. E a essa situação se reportará, na generalidade dos casos, o conceito de ocorrência posterior”.

No caso vertente, estando a decorrer a audiência de discussão e julgamento, os Requerentes da junção dos documentos justificam a sua pretensão alegando tratar-se de elementos fundamentais para a descoberta da verdade material e altamente relevantes para a justa decisão da causa e não obstante terem já sido indeferidos, renovam esse pedido fazendo apelo ao princípio da cooperação e ao princípio do inquisitório para justificar a junção (cfr. artigos 7º nº 1 e 411º do CPC). Acrescentam que, tal como oportunamente alegaram, os Autores só tiveram conhecimento da ação n.º 196/00, aqui referida, em princípios de dezembro de 2018, já depois da audiência prévia.

Como vêm fazendo ao longo do processo, uma vez mais, os Recorrentes não vêm apenas requerer seja admitida a junção de documentos, mas aproveitam para explicar, de forma mais detalhada, as confrontações do prédio dos Autores e fazer uma leitura, ou melhor, interpretação das certidões prediais relativas aos prédios confinantes que já se mostram juntas aos autos. Tudo factos que já poderiam e deveriam ter alegado na fase dos articulados, não se tratando por isso de articulado superveniente, sendo certo que nem os Autores alegam qualquer superveniência objetiva ou subjetiva para o efeito (cfr. artigo 588º do CPC).

Como bem se referiu na decisão recorrida, o princípio da cooperação deve ser conjugado com o princípio da auto-responsabilidade das partes, que não comporta o suprimento por iniciativa do juiz da omissão de articulação de factos estruturantes da causa no momento processualmente adequado.

No que respeita à certidão do processo 196/2000 os Autores já requereram a sua junção aos autos por duas vezes, no início da audiência de julgamento, e por duas vezes o Tribunal a quo lhes indeferiu o pedido.

Os Autores formulam novo pedido, desta vez fazendo apelo ao princípio da cooperação e ao princípio do inquisitório para justificar a junção.

Vejamos se têm aplicação ao caso os princípios invocados.

O processo é constituído por uma série de atos dirigidos a um fim - a decisão judicial que resolve o conflito entre as partes -, devendo obedecer a formas e requisitos adequados a esse escopo. Sem regras o processo fica sujeito à indisciplina das partes e cria insegurança, e presta-se a manobras que prejudiquem a obtenção da decisão em tempo razoável e útil.

Tem portanto o processo exigências técnicas, designadamente sujeitando as partes a um tecido de ónus necessários à boa administração da justiça (9).

Um dos princípios do processo civil é precisamente o da auto-responsabilidade das partes, segundo o qual estas sofrem as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo, que fazem a seu próprio risco.
O princípio do inquisitório traduz uma ideia de divisão subordinada de trabalhos, dominante em matéria probatória, entre o juiz e as partes (estas num primeiro plano).
Recebeu consagração legal no art. 411.º ao dispor que incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
O princípio do inquisitório exerce atualmente, é certo, um importante papel no processo civil português mas, a nosso ver, funciona subordinado ao princípio do dispositivo, parecendo-nos excessiva a sua configuração como um sistema processual híbrido, que se coaduna em par em torno dos dois princípios (10).
O nosso sistema processual civil é norteado pelo princípio do dispositivo, competindo-lhe o “monopólio” dos factos e dos meios de prova.

Como escreve Mariana França Gouveia esteirada nos ensinamentos dos mais ilustres processualistas, “O princípio dispositivo é a tradução processual do princípio constitucional do direito à propriedade privada e da autonomia da vontade. Subjacente ao processo civil está um litígio de direito privado, em regra disponível, pelo que são as partes que têm o exclusivo interesse na sua propositura em tribunal. O interesse público, neste âmbito, limita-se à correta aplicação do seu Direito para que haja segurança e paz nas relações privadas. Assim, o exato limite da intervenção estadual é fixado pelas partes que não só têm a exclusiva iniciativa de propor a ação (e de se defender), como delimitam o seu objeto. O princípio dispositivo traduz-se, assim, na liberdade das partes de decisão sobre a propositura da ação, sobre os exatos limites do seu objeto (tanto quanto à causa de pedir e pedidos, como quanto às exceções perentórias) e sobre o termo do processo (na medida em que podem transacionar). No fundo, é um princípio que estabelece os limites de decisão do juiz — aquilo que, dentro do âmbito de disponibilidade das partes, estas lhe pediram que decidisse. Só dentro desta limitação se admite a decisão.”

Compreende-se, assim, por que o princípio do inquisitório deve ser interpretado como um poder-dever limitado, restringindo-se, em matéria probatória, na busca pelas provas dentro dos factos alegados pelas partes (factos essenciais), com vista à justa composição do litígio e ao apuramento da verdade.

Não pode o juiz ao abrigo do inquisitório e da cooperação suprir o incumprimento de formalidades essenciais pelas partes, permitir o atropelo de normas legais e nem pode, obviamente, determinar oficiosamente a junção de documentos cuja junção já foi indeferida.
Não pode o interessado afastar, fazendo apelo a princípios gerais de condução processual, regras básicas que contendem com a certeza e segurança jurídicas, como é o do caso julgado.

Por outro lado, como bem se expressou na sentença recorrida, o disposto no artigo 411º do CPC não descaracteriza, nem invalida, o princípio base do processo civil que é o do impulso processual, competindo às partes em toda a sua extensão, nomeadamente no tocante à indicação e realização oportuna das diligências probatórias.

Em suma, o exercício do dever de diligenciar pelo apuramento da verdade e justa composição do litígio, não comporta uma amplitude tal que o autorizem a colidir quer com o princípio da legalidade e da tipicidade que comanda toda a tramitação processual, quer com outros princípios fundamentais como o do dispositivo, da auto-responsabilidade das partes e o da preclusão, importando este que, ao longo do processo, as partes estão sujeitas, entre outros ónus, ao de praticar os atos dentro de determinados prazos perentórios.

Demonstrada a inaplicabilidade dos princípios do inquisitório e da cooperação, ao caso concreto, temos que a admissibilidade da junção dos documentos deverá ser apreciada nos termos do n.º 3 do art.º 423º do CPC.

Para a junção dos documentos ao abrigo do referido normativo, incumbia aos Autores alegar e provar que a sua apresentação não foi possível até ao momento temporal a que alude o n.º 2 do mesmo artigo ou que a sua apresentação só se tornou possível ao abrigo de ocorrência posterior.

Referem os Autores que só tiveram conhecimento da existência da ação nº 196/2000, e por mero acaso, em princípios de Dezembro 2018.

Analisada a respetiva certidão constata-se que efetivamente a mesma só foi requisitada pelos Autores em Dezembro de 2018. Mas a ação é de 2000 e respeita nos próprios dizeres dos Autores ao prédio aqui em discussão, suas estremas e confrontações, pelo que era de sua obrigação, antes da instauração da presente ação, encetar todas as diligências no sentido de obterem os documentos necessários à instrução dos autos. Tal documento poderia muito bem ter sido junto com a PI. O simples facto de os Autores só terem conhecimento da ação nesta fase processual “por mero acaso”, como se entendeu na decisão recorrida, não é argumento suficiente.
A razão invocada, assente no desconhecimento, não se prefigura como atendível, no sentido de ser apta ou adequada a demonstrar a impossibilidade dos Autores, num quadro de normal diligência, terem tido conhecimento anterior da situação e/ou da existência do documento.

Não é por acaso que a propósito da impossibilidade da prévia apresentação, a terminologia usada nos art.sº 423º, n.º 3 e 425º é “não ter sido possível”, implicando que o fundamento haja de ser apreciado segundo critérios objetivos e de acordo com padrões de normal diligência, isto é, a diligência de um bom de família em face das circunstâncias do caso (art.º 487, nº2, do Código Civil).

Por outro lado, não se alcança nem os Recorrentes invocam qual tenha sido a “ocorrência posterior”, suficientemente consistente e atendível, que torne necessária a apresentação do mesmo documento, já rejeitado por duas vezes nos autos.

Nestes termos, quanto ao requerimento de junção de documentos consubstanciados na petição inicial e documentos anexos da ação n.º 196/00 do 2.º Juízo do extinto Tribunal de Chaves, o mesmo é manifestamente extemporâneo, tendo sido bem decidido o seu indeferimento.
Insurgem-se, ainda, os Recorrentes quanto ao indeferimento da inquirição de uma testemunha que, ao abrigo do disposto no artigo 526º do CPC, requereram fosse oficiosamente ouvida pelo Tribunal.

Veja-se o que a propósito se fundamentou na decisão sindicanda: “Cumpre referir que os factos relativos à celebração do protocolo, implantação dos pilares, correntes e cadeado, natureza do espaço entre esses pilares e a capelinha ali existente são factos meramente instrumentais que resultam agora da instrução da causa e nem sequer foram alegados pelos AA. Quanto ao facto de a referida testemunha ter conhecimento da localização da estrema poente do prédio dos AA. o mesmo não se retirou do depoimento das testemunhas até agora inquiridas. Mas mesmo que assim seja, o A. marido que outorgou o mencionado protocolo em 2005 poderia muito bem ter indicado a referida testemunha na sua PI para a prova dos factos ali alegados e podia fazê-lo incluindo até 20 dias antes da realização da audiência de julgamento nos termos do disposto no artigo 598º nº 2 e 3 do CPC. Não o fez.”.

Aceitam os Recorrentes que é verdade que podia ter sido oferecido o depoimento da testemunha na altura própria, mas defendem que isso não impede que, oficiosamente, se determine a sua audição.
O normativo que emana do art. 526.º do C.P.C., é uma decorrência do princípio do inquisitório, já atrás aflorado. Como, então, deixámos dito, este princípio não funciona desgarrado do princípio do dispositivo, a cujos limites está subordinado, nem pode postergar o princípio da auto- responsabilidade das partes.

Por isso mesmo, como salienta Lopes do Rego “O exercício dos poderes de investigação oficiosa do tribunal pressupõe que as partes cumpriram minimamente o ónus que sobre elas prioritariamente recai de indicarem tempestivamente as provas de que pretendem socorrer-se para demonstrarem os factos cujo ónus probatório lhes assiste - não podendo naturalmente configurar-se como uma forma de suprimento oficioso de comportamentos grosseira ou indesculpavelmente negligentes das partes. A inquirição por iniciativa do tribunal constitui um poder-dever complementar de investigação oficiosa dos factos, que pressupõe, no mínimo, que foram indicadas provas cuja produção implica a realização de uma audiência (…)”. (11)

No mesmo sentido, Nuno Lemos Jorge defende que se a necessidade de promoção de diligências probatórias pelo juiz “não for patentemente justificada pelos elementos constantes dos autos, a promoção de qualquer outra diligência resultará, apenas, da vontade da parte nesse sentido, a qual, não se tendo traduzido pela forma e no momento processualmente adequados, não deverá agora ser substituída pela vontade do juiz, como se de um seu sucedâneo se tratasse”. (12)

Afigura-se-nos claro que o juiz não se encontra obrigado a proceder à inquirição de uma testemunha só porque a parte, que não a indicou oportunamente, invoca a importância daquela inquirição para a descoberta da verdade. A não se entender assim, como se adverte no aresto desta Relação de 4.3.2013 (Proc. 293/12.0TBVCT-J.G.l) (13), perdia sentido a obrigação de apresentação da prova em momentos processuais determinados, pois restaria sempre à parte a possibilidade de invocar esta norma do art. 526º, do C.P.C. Na defesa desta posição, refere-se, ainda, no Acórdão da Relação do Porto de 22.2.2011 que “Esse uso decorrerá da ponderação feita pelo juiz, em face das circunstâncias concretas que em cada caso se deparem; o que afasta a sua aplicação automática na sequência de simples requerimento, em sede de julgamento, de uma das partes (ou de ambas)” (14).

Daí que, o poder-dever de ordenar a notificação oficiosa de pessoas, não oferecidas como testemunhas, se circunscreva às situações em que haja razões para presumir que têm conhecimento de factos importantes para a boa decisão da causa, não podendo configurar-se como uma forma de suprimento oficioso de comportamentos negligentes das partes, que conduziria à subversão das regras processuais relativas à indicação e produção das provas e violação da igualdade das partes.

Pelo exposto, também nesta parte não merce censura o despacho recorrido.

Termos em que improcede a apelação.
*
IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas pelos Recorrentes.
Guimarães, 23 de Maio de 2019

Assinado digitalmente por:
Rel. – Des. Conceição Sampaio
1º Adj. - Des. Fernanda Proença Fernandes
2º - Adj. - Des. Heitor Gonçalves

1. In “Código de Processo Civil Anotado”, Volume V, pág. 139.
2. In “Manual de Processo Civil”, 2ª edição, pág. 687.
3. Acórdão do Tribunal Constitucional de 11/11/2008, relatado por Carlos Fernando Cadilha, disponível in www.dgsi.pt
4. O direito à Prova no Processo Civil, in Revista da Faculdade de Direito UFRP, disponível em http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/direito/article/viewFile/1836/1532.
5. Neste sentido, Acórdão da Relação de Coimbra de 21/04/2015, in www.dgsi.pt
6. Sobre a proibição da prova, Isabel Alexandre, Provas ilícitas em Processo Civil, Almedina, Coimbra, 1998, pag. 48.
7. Neste sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 25/9/2018, disponível em www.dgsi.pt
8. Acórdão da Relação de Lisboa de 25/9/2018, disponível em www.dgsi.pt
9. Neste sentido, o Acórdão do STJ de 12.11.2002, disponível em www.dgsi.pt.
10. Como defende Téssia Matias Correia, A Prova no Processo Civil, Reflexões sobre o problema da (in)admissibilidade da prova ilícita, Dissertação de Mestrado em Direito, na Área de Especialização de Ciências Jurídico - Civilísticas, Coimbra, 2015, pag. 62 e Francisco Almeida, Direito Processual Civil, vol. I, Almedina, Coimbra, 2010, pag. 243.
11. Comentários ao Código de Processo Civil, Almedina, pág. 425.
12. “Os poderes Instrutórios do Juiz: Alguns Problemas”, Revista Julgar, nº 3, pág. 70.
13. Disponível em www.dgsi.pt.
14. Disponível em www.dgsi.pt