Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
5172/18.5T8BRG.G1
Relator: JOSÉ CARLOS PEREIRA DUARTE
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DÉFICE FUNCIONAL
REPERCUSSÃO NA ACTIVIDADE PROFISSIONAL
DANOS MORAIS
INDEMNIZAÇÃO
EQUIDADE
JUROS DE MORA NO DOBRO DA TAXA
DANOS REFLEXOS
UNIDO DE FACTO
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 03/16/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÕES PARCIALMENTE PROCEDENTES
RECURSO SUBORDINADO: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I. Um evento estradal, como seja o embate de um veículo ligeiro de passageiros, num motociclista, é susceptível de causar dano (entendido como dano real, primário, in natura) na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa.
II. Esse dano (dano real, primário, in natura) na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa pode gerar consequências de diversa natureza, o que dependerá sempre da situação concreta em apreciação.
III. A atribuição de uma indemnização, por danos patrimoniais futuros, faz-se única e exclusivamente através da equidade, levando em conta as circunstâncias do caso concreto (art.º 566º n.º 3 do CC).
IV. Sendo a equidade chamada para quantificar montantes indemnizatórios, tal operação não fica ao livre-arbítrio do juiz, antes deve orientar-se por critérios emergentes do caso concreto, critérios esse verificáveis e controláveis.
V. Além disso, como manda o n.º 3 do art.º 8º do CC, deverão ter-se em consideração os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, por forma a dar cumprimento ao principio da igualdade plasmado no art.º 13º n.º 1 da CRP.
VI. Mas nem sempre se mostra tarefa fácil estabelecer comparações entre os diversos casos já tratados na jurisprudência, ante a multiplicidade e variabilidade de fatores e as singularidades de cada caso.
VII. Tendo o A. ficado com um Défice Funcional Permanente de Integridade Fisico-Psiquica fixável em 31 pontos, sendo as sequelas impeditivas e incompatíveis com o exercício da sua actividade profissional habitual, de “Técnico Manutenção de 2ª”, auferindo o mesmo uma remuneração mensal de cerca de € 870,00 e tendo o mesmo, à data do acidente, 50 anos, tem-se como equitativa a indemnização pela Repercussão do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica na actividade profissional/perda da capacidade geral de ganho do A. de €200.000,00, actualizada à presente data.
VIII. Afirmar-se que as sequelas de que o A. padece são compatíveis com outras profissões da área da preparação técnico-profissional do mesmo é uma abstracção insusceptível de ser juridicamente relevada, quando é generalizada a dificuldade de mobilidade entre funções e actividades, dos trabalhadores portugueses e o A. já tinha, à data do embate, 50 anos, o que torna ainda mais difícil essa mobilidade.
IX. Cabia à Ré seguradora alegar e provar que as sequelas de que o A. padece são compatíveis com o exercício de determinada profissão ou actividade económica alternativa, à luz suas qualificações, porque se trata de matéria com interferência na fixação do montante da indemnização, o que não ocorreu.
X. Tendo em consideração que:
a) do ponto de vista temporário:
- o quantum doloris, ou seja, o sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo A. entre a data do evento e a data da consolidação das lesões é fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- o condicionamento da autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social de forma total fixável num período de 137 dias (cerca de 4,5 meses) e de forma parcial num período 635 dias (mais de ano e meio)
b) do ponto de vista permanente:
- o A. ficou com um Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 31 pontos;
- o dano estético permanente na pessoa do A. é fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- a Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer é fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- o Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos actualmente padece de Repercussão Permanente na Actividade Sexual fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- embora não tão intensas, o Autor, em virtude das sequelas de que ficou a padecer atualmente, tem continuado e continuará a sofrer no futuro, de fortes dores físicas, incómodos e malestar durante o resto da sua vida, designadamente a nível da anca, bacia e região lombar, as quais se exacerbam e agravam com as mudanças de temperatura e com os esforços, gerando dificuldades em dormir e que o Autor até à data do acidente de viação descrito nos presentes autos não sentia.
- o Autor, atualmente e desde a data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas atuais e permanentes de que a mesma padece tornouse uma pessoa triste, infeliz, introvertida, abalada psiquicamente, introvertida, fechada, deprimida, angustiada, sofredora, triste, insegura, muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore, desgostosa da vida e está constantemente a pensar nos seus problemas e limitações.
- em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afetivas.
- o Autor está assim consciente das suas limitações, sentindose inibido e diminuído fisicamente e esteticamente.
- a Repercussão Permanente na Actividade Sexual causa um grande desgosto, sofrimento e revolta ao Autor.
- o Autor antes do acidente tinha uma vida sexual normal e feliz com a sua companheira.
- o Autor, antes e à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, sendo uma pessoa saudável, dinâmica, expedita, diligente e trabalhadora.
- era também uma pessoa alegre, confiante, cheia de projetos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade e alegria de viver, sendo uma pessoa calma, amante da vida, confiante, detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas.
- o Autor, à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 50 (cinquenta) anos de idade,
tem-se como equitativa a indemnização a titulo de danos morais, atribuída pelo tribunal recorrido, no montante de € 100.000,00, actualizada á data da sentença.
XI. Tendo o A. a 05/07/2018 apresentado à Ré um pedido de indemnização, acompanhado de um Relatório de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil, e tendo a Ré, na sua posse, já nessa data, um Relatório de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil, formulado pelo seu médico, a mesma tinha todos os elementos para, no prazo de 45 dias, apresentar uma proposta razoável de indemnização, sendo o dano quantificável.
XII. O facto de haver uma divergência entre ambos os Relatórios - quanto à questão de saber se as sequelas de que o A. tinha ficado a padecer eram, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, incompatíveis com o exercício da actividade habitual ou não -, tornava aceitável, apenas e tão só uma quantificação inferior à do A., mas não impossibilitava essa quantificação.
XIII. Não tendo a Ré seguradora apresentado qualquer proposta no referido prazo, sobre as quantias que a mesma seja condenada a pagar há lugar a juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável (n.º 2 do art.º 38º, aplicável ex vi o n.º 2 do art.º 39º do DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto).
XIV. Desde que alguém demonstre que: i) vivia com a vitima de um facto ilícito em condições análogas às dos cônjuges, há mais de dois anos, tendo em consideração a data do facto ilícito; ii) que mantinha com a mesma uma relação afetiva de grande proximidade; iii) que a vida de relação, nomeadamente, mas não só, a vida sexual ficou gravemente prejudicada em virtude das sequelas emergentes do facto ilícito; iv) e que tal prejuízo lhe causa um sofrimento particularmente grave, estão verificadas as condições para o unido de facto ter direito a indemnização por danos morais (a graduar, naturalmente, em função do caso concreto) á luz da doutrina do AUJ 6/2014.
XV. O facto de a A. e o A. viverem, um com o outro, em união de facto, à data do acidente e entretanto terem casado entre si, traduz uma mera formalização do que já existia materialmente: vivência em condições análogas às dos cônjuges.
XVI. Tendo o A., em consequência das lesões causadas pelo acidente de viação descrito nos autos, ficado a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite ao mesmo ter relações sexuais naturais e espontâneas, só sendo possível ao mesmo ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, tudo com repercussão na actividade sexual do A. de 5 numa escala de 7, tem-se como equitativa a indemnização de € 40.000,00 a titulo de danos morais devida à A. mulher, actualizada á presente data.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

1. Relatório

AA intentou acção declarativa de condenação com processo comum contra F... - Companhia de Seguros, SA, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe:

A - “uma Indemnização correspondente a todos os danos patrimoniais e não  patrimoniais pelo mesmo sofridos em virtude do acidente de viação melhor descrito nos autos aqui devidamente descriminados e já quantificados, de montante nunca inferior a € 478.000,00”;
B - “uma Indemnização (…) cuja total e integral quantificação se relega para posterior liquidação em sede de incidente de liquidação (…) ou execução de sentença, a titulo de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais futuros:
a) decorrentes do pagamento de uma quantia mensal na ordem dos € 870,04 a titulo de perdas de vencimento mensal ilíquido, acrescida de uma quantia anual €570,00 a titulo de Subsidio de Natal, acrescida de uma quantia anual € 570,00 a titulo de Férias, acrescida de uma quantia anual €570,00 a titulo de Férias, quantias essas cujo pagamento deverá contabilizado desde a data de 06/02/2017 (data da consolidação médico legal atribuída pelos serviços clinicos da Ré na medida em tais  quantias foram já liquidadas pela Ré desde a data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos (08/05/2016) e até a essa data de 06/02/2017 (data da consolidação médico legal atribuída pelos serviços clinicos da Ré) e até à data que vier a ser oportunamente fixada em sede de Perícia Medico Legal a realizar ao Autor pelo Gabinete Medico Legal a titulo de data de consolidação MédicoLegal das lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente de viação descrito nos autos;
b) decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de efetuar vários exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões, queixas e sequelas supra melhor descritas;
c) decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Ortopedia, Consulta da Dor Crónica, Urologia, Psiquiatria, Psicologia, Medicina Física e Reabilitação, Neurologia, Neurocirurgia, Neurocirurgia Funcional e Cirurgia Plástica para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas;
d) decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de realizar tratamento fisiátrico (pelo menos duas vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões) para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas;
e) decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, ansiolíticos, antiinflamatórios e analgésicos para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas;
f) decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de se submeter a várias intervenções cirúrgicas e plásticas, a vários internamentos hospitalares, de efetuar várias despesas hospitalares, de efetuar a vários tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, de efetuar várias deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas melhor descritas;
g) montantes esses, atualmente impossíveis de concretizar, mas cuja total e integral concretização e quantificação se relega para posterior incidente de liquidação (…) ou execução de sentença a titulo de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais futuros.”
C – “ a) pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor nos prazos devidos, (…) os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do DecretoLei n.º 291/2007, ou seja, desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016), ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018), ou desde a data da citação da Ré, ou desde a data que vier a ser estabelecida na decisão judicial e até efetivo e integral pagamento, os quais o Autor desde já peticiona da Ré”;
b) “ou caso (…)  assim (…) não [se] entenda, os juros de mora vincendos a incidir sobres as referidas indemnizações calculados à taxa legal anual, a contar da data da citação da Ré e até efetivo e integral pagamento”.

Alegou para tanto e em síntese que no dia, hora e local que indica enquanto conduzia o seu motociclo de matrícula ..-..-RV, o veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-HL-.. seguro na Ré, que circulava em sentido contrário ao A., a uma velocidade de 70/80 km/h, dentro de uma localidade, ao descrever uma curva à esquerda, perdeu o controlo do veículo, que entrou em despiste, invadiu a faixa de rodagem em que circulava o A., embatendo-o.

Em consequência do embate sofreu as lesões corporais e ficou com as sequelas que indica, necessitando no futuro de exames de diagnóstico, acompanhamento médico nas especialidades que indica, tratamento de fisiatria, medicamentos, intervenções cirúrgicas e plásticas, internamentos.

Refere os danos patrimoniais, os lucros cessantes, em que integra a perda de capacidade de ganho (entendendo que a mesma deve ser indemnizada em quantia não inferior a € 200.000,00) e o dano biológico (entendendo que deve ser indemnizado em € 125.000,00), as perdas salariais, as despesas médicas, medicamentosas, transportes e outras  e os danos não patrimoniais, em que integra o quantum doloris, o dano estético permanente, a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer e o prejuízo sexual.

Mais alega que o embate se ficou a dever a culpa exclusiva do condutor do veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-HL-.. seguro na Ré, tendo esta assumido a responsabilidade.

Finalmente alega que a Ré não cumpriu a obrigação legal de apresentar uma proposta razoável de indemnização ao A. pelo que deve ser condenada a pagar os juros de mora calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso.

A Ré, citada, contestou dizendo que não enjeita nem nunca enjeitou a sua responsabilidade pelo pagamento ao A. de uma indemnização devida pelos danos realmente sofridos pelo mesmo em consequência do acidente.

Alegou ainda que a indemnização reclamada é exagerada e injustificada, a incapacidade ou défice funcional permanente do A. não será superior a 20 pontos, o A. não ficou com qualquer sequela que impeça o desempenho de qualquer actividade profissional, o dano estético não será superior a 2 numa escala de 7, o prejuízo de afirmação pessoal não será superior a 2 numa escala de 5, em 1985 o A. já tinha sofrido um acidente em virtude do qual teve necessidade de realizar um enxerto ósseo no fémur esquerdo.

Referiu ainda que a ofensa à integridade física de uma pessoa constitui o dano biológico, o qual pode assumir uma vertente patrimonial, como não patrimonial, sendo, á partida, pela sua natureza imaterial, um dano não patrimonial.
Mas se em consequência desse dano biológico o lesado vir a sua capacidade de ganho efectivamente afectada, existindo uma real perda de rendimentos, pode haver um dano patrimonial futuro.
O que não pode é atribuir ao lesado uma indemnização pelo dano biológico sofrido, em ambas as vertentes, sem que exista uma dicotomia nos interesses atingidos, uma vez que se estava a indemnizar duas vezes o mesmo dano.
O A. na parte relativa á “perda de capacidade de ganho” e ao “dano biológico” acaba por formular pedidos para indemnizar os mesmos danos alegadamente sofridos, existindo uma repetição de pretensões.

Finalmente alegou que em virtude da divergência entre os Relatórios enviados pelo A. e o Relatório que tem na sua posse suspendeu o envio da proposta de indemnização por considerar que ainda não tinha sido possível quantificar o dano sofrido pelo A., pelo que não teria aplicação o disposto no art.º 38º n.º 3 do DL 291/07.

Foi também citado o Centro Distrital de Segurança Social de ..., que não deduziu qualquer pretensão.

Foi proferido despacho saneador que, no que releva, fixou:

- o objecto do litigio:
“O montante indemnizatório a atribuir ao Autor decorrente dos danos de natureza patrimonial e não patrimonial por si sofridos com o acidente de viação descrito nos autos.”
- e os temas da prova:
1º Lesões e sequelas sofridas pelo Autor em consequência do acidente.
2º Tratamentos, consultas e exames médicos a que foi submetido e a que necessitará no futuro de ser submetido.
3º Períodos de internamento e de défice funcional temporário da integridade física e psíquica.
4º Défice funcional permanente sofrido e repercussão na sua capacidade actual e futura de ganho.
5º Data da consolidação médico-legal das lesões sofridas pelo Autor.
6º Quantum doloris e dano estético.
7º Repercussão das sequelas nas actividades de desporto e lazer e prejuízo sexual.
8º Profissão do Autor e retribuição que auferia à data do acidente.
9º Perdas salariais do Autor.
10º Despesas médicas, medicamentosas e com deslocações a hospitais e clínicas.
11º Repercussões de natureza psíquica das sequelas sofridas.
12º Data em que a Ré teve acesso ao relatório final de avaliação de dano corporal do Autor e diligências encetadas pela mesma posteriormente a essa data com vista a quantificar o dano.

Posteriormente foi proferido despacho sobre as provas requeridas, tendo, nomeadamente, sido admitido o exame médico requerido pelo A., a ser realizado pelo Gabinete de Medicina Legal de ....

A 06/06/2019 a Ré requereu a apensação do processo 2402/19...., pendente no J ... do Juízo Central Cível ..., alegando para tanto que, com base no acidente que integra a causa petendi desta acção, foi intentada contra a Ré, pela mulher do A., o referido processo, e a fim de evitar uma eventual contradição de julgados.

A 25/09/2019 e no âmbito do processo 2402/19...., o J ... do Juízo Central Cível ... solicitou aos autos fosse informado se interessava a remessa dos últimos para apensação.

A 30/09/2019 (sem que o requerimento da Ré de 06/06/2019 tivesse sido objecto de apreciação) foi proferido o despacho a determinar se informasse que não interessava a apensação.

Junto aos autos o Relatório da Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil, foi o mesmo objecto de pedido de esclarecimentos por ambas as partes, ambos deferidos.

A 10/03/2021 o A. veio deduzir articulado superveniente e requerer ampliação do pedido alegando que do referido relatório resulta que a data da consolidação médico-legal foi fixado a 18/06/2018 e foi fixado o Período de repercussão Temporária na Actividade Profissional Total em 772 dias, pelo que as perdas salariais são de € 23.858,90, a Ré por conta do referido valor pagou € 12.541,80, pelo que a título perdas salariais reclama a quantia de € 11.317,10.

A Ré pronunciou-se

O tribunal deferiu o pedido de ampliação

Foi designada data para julgamento.

A 17/06/2021 foi determinada a apensação do processo 2402/19.....

Neste processo, que constitui acção declarativa de condenação com processo comum, BB demanda F... - Companhia de Seguros, SA, pedindo seja condenada a pagar-lhe “uma Indemnização correspondente a todos os danos não patrimoniais pela mesma sofridos em virtude do acidente de viação melhor descrito nos autos aqui devidamente discriminados e já quantificados, de montante nunca inferior a € 100.000,00 (Cem Mil Euros)” acrescida de “juros de mora vencidos e vincendos (…) calculados à taxa legal anual, a contar da data da citação da Ré e até efetivo e integral pagamento”.

A petição inicial da A. constitui uma repetição da petição inicial do A. AA, tendo alegado de novo que á data do acidente vivia com o A. em união de facto há 6 anos, casaram entre si a ..., no dia do acidente e nos dias que se seguiram sofreu um enorme susto e receou pela vida do marido, prestou-lhe toda a assistência material e emocional, acompanhou o marido em todos os internamentos, consultas, tratamentos e cirurgias, vivencia o sofrimento do marido, a A. também adoeceu do ponto de vista psicológico e psiquiátrico, encontrando-se hoje deprimida e angustiada com a situação do marido, o marido da A., não obstante a ajuda medicamentosa, mantêm manifestações de ansiedade, flutuações de humor e instabilidade , torna-se insuportável, transformando a vida da A. num “inferno”, antes do acidente mantinha com o marido uma vida sexual normal e feliz, em consequência do acidente o marido da A. sofre de disfunção eréctil, não controlada com medicação, o que causa á A. desgosto, sofrimento, revolta frustração.

A Ré, citada, contestou dizendo desconhecer os factos alegados, não se verifica a situação prevista nos n.º 2 e 3 do art.º 496º do CC, para que à luz do AUJ nº 6/2014 exista uma obrigação de indemnização por danos morais causados a terceiro decorrentes de danos causados a vítima sobrevivente, devem estar em causa: a) danos particularmente graves da vítima sobrevivente; b) a existência de uma relação especial com essa vítima por parte do demandante, no caso específico daquele acórdão, fruto do casamento; c) o demandante da indemnização tenha sofrido também ele danos particularmente graves em consequência daqueles danos particularmente graves causados à vítima sobrevivente; à data do acidente a A. não era casada, só tendo casado um mês antes de intentar a acção e quase três anos após o acidente que causou as lesões ao seu actual marido, a relação da Autora com o seu actual marido não se viu especialmente afectada, em consequência do acidente, já que passaram de uma situação de mera união de facto para uma situação de união formal, através do casamento, se as sequelas de que o actual marido da Autora padece a nível sexual são motivo para tanto sofrimento, ao ponto de poderem levar ao divórcio entre ambos, não se percebe por que razão decidiram casar após a manifestação dessas sequelas, a actuação da Autora revelaria um manifesto e intolerável abuso do direito invocado, nos termos do art. 334.º do C. Civil, na modalidade de venire contra factum proprium, concluindo que não deve ser arbitrada qualquer indemnização á A.

No referido processo 2402/19.... foi proferido despacho saneador, tendo sido consignado como Objecto do litigio:
“O objecto do litígio consiste em saber se, em consequência do acidente ocorrido a 8 de Maio de 2016, em ..., ..., e em que foi vítima AA, no qual foi interveniente o veículo com a matrícula ..-..-RV, conduzido por CC, cuja culpa na respectiva produção foi assumida, e com a responsabilidade por danos causados a terceiros com a sua circulação transferida para a ré “F... - Companhia de Seguros, S.A”, através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...61, a aqui autora também sofreu danos não patrimoniais ressarcíveis.”
           
Finalmente no que releva, nos referidos autos foi proferido o seguinte despacho:
“Face à apensação operada, consigna-se que este processo deixa de ter autonomia, passando o mesmo a ser tramitado nos autos principais.”

Nos presentes autos, realizou-se o julgamento, em duas sessões, tendo ficado a constar da Acta da 1ª sessão o seguinte:
“ Despacho
Conforme resulta de fls. 62 e 100, a F... - Companhia de Seguros já entregou ao autor por  conta da futura indemnização a pagar a quantia de € 20.000,00 ( vinte mil euros)”
           
A 11/05/2022 foi proferida sentença.

Na mesma data foi proferido o seguinte despacho:
“A sentença proferida necessita de ser rectificada de forma a englobar a pretensão da autora.
Assim sendo, fica, por ora, sem efeito a mesma.
Notifique e conclua novamente.”

A 12/05/2022 foi proferida sentença com o seguinte decisório:
“ Nestes termos, julgo parcialmente provados os fundamentos de facto e parcialmente meritórios os de direito, e, em consequência, decido:
1 – Condenar a Ré a pagar ao autor a título indemnização por danos patrimoniais a quantia de € 100 455, 22 (cem mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e vinte e dois cêntimos);
2 – Condenar a Ré a pagar ao autor, quantia, cujo cômputo se relega para posterior liquidação em sede de incidente de liquidação (artigo 358.º do C.P.Civil) ou execução de sentença, a titulo de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais futuros decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de efetuar vários exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões, queixas e sequelas descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Ortopedia, Consulta da Dor Crónica, Urologia, Psiquiatria, Psicologia, Medicina Física e Reabilitação, Neurologia, Neurocirurgia, Neurocirurgia Funcional e Cirurgia Plástica para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de realizar tratamento fisiátrico (pelo menos duas vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões) para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, ansiolíticos, antiinflamatórios e analgésicos para superar as consequências físicas das lesões e sequelas descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de se submeter a várias intervenções cirúrgicas e plásticas, a vários internamentos hospitalares, de efetuar várias despesas hospitalares, de efetuar a vários tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, de efetuar várias deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas descritas;
3 - Pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor nos prazos devidos, os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do DecretoLei n.º 291/2007, ou seja, desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016), ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018), ou desde a data da citação da Ré, ou desde a data que vier a ser estabelecida na decisão judicial e até efetivo e integral pagamento, os quais o Autor desde já peticiona da Ré;
4 - Condenar a Ré a pagar ao autor a quantia de € 100.000 € (cem mil euros) a título de indemnização por danos morais, a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.
5 - Condenar a Ré a pagar à autora a quantia de € 50.000 € (cinquenta mil euros) a título de indemnização por danos morais, a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.
6 – Absolver a ré do restante peticionado.
7 - Condenar autores e ré no pagamento das custas na proporção do decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário concedido ao primeiro.”

O A. interpôs recurso, pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por Acordão que condene a Ré nos termos requeridos, tendo concluído as suas alegações com as seguintes conclusões (patentemente prolixas e sem qualquer preocupação de síntese, como determina o n.º 1 do art.º 639º do CPC, em virtude de não se ter em consideração o que deve constar da motivação e o que deve constar das conclusões. Assim, pretendendo o recorrente que esta Relação dê como provados determinados factos que não foram considerados na sentença recorrida, nas conclusões apenas deve indicar esses factos, sem necessidade de proceder á sua transcrição, sem necessidade de transcrever os meios de prova que determinam a prova dos mesmos, sejam eles depoimentos, sejam eles documentos. E pretendendo o recorrente a alteração dos valores indemnizatórios, não há necessidade de repetir nas conclusões grande parte do argumentário, o qual apenas tem lugar nas conclusões. Mas não se dá cumprimento ao disposto no n.º 3 do art.º 639º a fim de não dilatar mais a resolução do processo):
1) O Autor/Recorrente, não concorda e dessa forma impugna a decisão proferida relativamente à matéria de facto dada como provada e como não provada, na medida em que da mesma (matéria de facto dada como provada) não consta a matéria de facto alegada pelo Autor na sua Petição Inicial mais concretamente nos artigos: 1) 134º (quantum dolóris), 138º (dano estético permanente) e 140º (repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer), 2) 165º a 173º (reconhecimento da culpa e assunção da responsabilidade pela Ré), 3) 174º a 176º e 178º a 181º (condenação da ré em juros de mora no dobro da taxa legal).
2) O Autor/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos futuros pela “perda da capacidade de ganho”, na medida em que em termos de repercussão permanente da atividade profissional, o défice funcional de que ficou padecer em virtude das lesões e sequelas sofridas, é incompatível e impeditivo do exercício da actividade profissional de “Técnico Manutenção de 2ª” encontrando-se o Autor Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH).
3) O Autor/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de “dano biológico” em consequência da perda ou diminuição de capacidades funcionais decorrente do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 31 pontos que lhe foi fixado.
4) O Autor/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos não patrimoniais.
5) O Autor/Recorrente, não concorda que a condenação da Ré em pagar ao Autor os juros de mora no dobro da taxa legal prevista sobre as indemnizações que venham a ser a concedidas ao Autor, sejam só devidos em relação danos não patrimoniais, devendo os mesmos ser devidos em relação aos danos patrimoniais e aos danos não patrimoniais.
6) O Autor/Recorrente, não concorda com a não fixação de um prazo concreto a partir do qual deverá a Ré ser condenada a pagar ao Autor os juros de mora no dobro da taxa legal prevista sobre as indemnizações que verem a concedidas ao Autor a titulo de danos patrimoniais e danos não patrimoniais.
7) O Autor nos artigos 134º, 138 e 140 da sua Petição Inicial alegou o seguinte:
134.No que concerne ao Quantum Dolóris, que corresponde à valoração do sofrimento físico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões e, ainda, tendo em conta o sofrimento atual, deverá fixar-se o mesmo ao Autor no grau 6, numa escala crescente de 1 a 7.
138. As referidas cicatrizes e deformidade numa escala crescente de 1 a 7 conferem ao Autor um “Dano Estético Permanente” fixável no grau 4.
140. As referidas queixas, lesões e sequelas supra descritas numa escala crescente de 1 a 7 conferem ao Autor uma “Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer” fixável no grau 3.
8) O Autor para sustentar a factualidade alegada no artigo 134º, 138º e 140º da sua Petição Inicial juntou aos autos os documentos n.ºs ...1 e ...2.
9) O Autor com a sua P.I. requereu a realização de perícia médica de avaliação de dano corporal à sua pessoa acompanhada do respetivo objeto de perícia médica, o qual foi reformulado, tendo reformulados quesitos n.ºs 21 relativo ao quantum dolóris, 26 relativo ao dano estético permanente e 29 relativo à repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer.
10) Matéria de facto essa constante dos temas de prova, mais concretamente dos n.ºs 6 e 7 do Douto Despacho Saneador datado de 27/12/2018, com a refª citius ...92.
11) Por Douto Despacho datado de 08-01-2019 com a referencia citius ...62 foi admitido o exame médico requerido pelo Autor, o qual teve por objecto o indicado pelo mesmo a fls. 130 e 131 e será realizado pelo GML de ...,
12) A matéria de facto opor si alegada nos artigos 134º (quantum dolóris), 138º (dano estético permanente) e 140º (repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer) deveria ter sido dada como provada na Douta Sentença.
13) O Mº Juiz de Direito “a quo” quanto à matéria de facto alegada pelo Autor nos artigos 134º, 138º e 140º da sua Petição Inicial, deveria fundamentar a sua convicção e respetiva resposta positiva a dar à mesma, nos seguintes meios de prova: Nas conclusões do Relatório de Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil datado de 25/11/2020 realizado ao Autor, junto aos autos em 02/12/2020, com a refª citius ...27.
14) Com efeito, das conclusões do Relatório de Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil de datado de 25/11/2020, junto aos autos em 02/12/2020, com a refª citius ...27 (página 8), consta o seguinte:
a) Quantum Dolóris fixável no grau 5/7.
b) Dano Estético Permanente fixável no grau 4 /7.
c) Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 3 /7.
15) Pelas razões de facto e de direito supra aludidas, da matéria de facto dada como provada, deverá também passar a constar a matéria de facto alegada pelo Autor
nos artigos 134º, 138º e 140º da sua Petição Inicial e constante das conclusões do Relatório de Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil de datado de 25/11/2020, junto aos autos em 02/12/2020, com a refª citius ...27, devendo ser fixado ao Autor:
a) Um Quantum Dolóris de grau 5 numa escala crescente de 1 a 7.
b) Um Dano Estético Permanente de grau 4 numa escala crescente de 1 a 7.
c) Uma Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer de grau 3 numa escala crescente de 1 a 7.
16) O Autor nos artigos 165º a 173º da sua Petição Inicial alegou o seguinte:
177. A Ré através dos seus gestores de processo de nome DD e EE, expressamente assumiu e reconheceu por escrito perante o Autor, a responsabilidade e culpa exclusivas do condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC) na produção do acidente de viação descrito nos presentes autos e que vitimou o Autor.
178. A Ré sempre reconheceu de uma forma clara, inequívoca e concludente o direito à indemnização por parte do Autor, de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo mesmo e que tiveram como causas mediatas e imediatas o aqui descrito acidente de viação.
(…)
24) Pelas razões de facto e de direito supra aludidas, da matéria de facto dada como provada, deverá também passar a constar a matéria de facto alegada pelo Autor nos artigos 174º a 176º e 178º a 181º da PI em virtude de a Ré no artigo 35º da sua Douta Contestação ter confessado expressamente que “recebeu do Autor, em 05.07.2018, um pedido de indemnização tendo por base dois relatórios médico-legais aqueles também juntos com a petição – Docs. nº ...2”, no artigo 39º da sua Douta Contestação ter confessado expressamente que “a Ré suspendeu o envio da proposta de indemnização”) e com a sua douta Contestação não ter impugnado o teor nem as assinaturas do dos documentos n.ºs 83º e 84 juntos pelo Autor com a sua P.I.. (a data e o conteúdo do pedido de indemnização final apresentado pelo Autor junto da Ré).
25) O lesado afectado de sequelas impeditivas do exercício da actividade profissional habitual encontra-se em posição de desvantagem em relação a outro que, afectado da mesma incapacidade parcial, não ficou impedido de exercer a sua profissão habitual.
26) Esta posição de desvantagem é agravada pela circunstância da taxa de desemprego do cidadão deficiente ser especialmente elevada (pelo menos o dobro da restante população), porquanto os empregadores partem do pressuposto da sua inadaptação ao desempenho profissional.
27) Acresce que os elementos estatísticos demonstram que a taxa de pobreza das pessoas com deficiência é 70% superior à média, em parte devido a limitações no acesso ao emprego.
28) Daí que, na determinação da perda da capacidade de ganho dos lesados afectados de incapacidade definitiva para o exercício da sua profissão, e apelando ao princípio da igualdade, inscrito no art. 13.º n.º 1 da Constituição (implicando o dever de tratar de forma igual o que é igual e de forma diferente o que é diferente), se justifique a utilização da regra que o direito do  trabalho aplica ao cálculo da pensão para os sinistrados em acidente de trabalho afectados de incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual (IPATH), a qual é fixada entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível – art. 48.º n.º 3 al. b) da Lei 98/2009, de 4 de Setembro.
29) Tendo a vítima ficado impedida de exercer a sua actividade profissional habitual, face às graves sequelas físicas sofridas, prejudicando substancialmente as suas oportunidades de obter novo emprego, justifica-se a elevação do resultado obtido através das tabelas financeiras em cerca de 10%.
30) Tendo em linha de conta a matéria de facto constante dos itens n.ºs 3, 45, 46, 53, 54, 55, 56, 57 e 58 dos factos dados como provados na Douta Sentença, deverá a Ré ser condenada a pagar ao Autor a titulo de indemnização pela “perda da capacidade de ganho” na medida em que em termos de repercussão permanente da atividade profissional o défice funcional de que ficou padecer em virtude das lesões e sequelas sofridas, é incompatível e impeditivo do exercício da actividade profissional de “Técnico Manutenção de 2ª” encontrando-se o Autor Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH), uma quantia nunca inferior a €250.000,00 (Duzentos e cinquenta Mil Euros), quantia essa cujo pagamento o Autor desde já peticiona da Ré.
31) Tal montante indemnizatório, deverá ter em linha de conta, os seguintes fatores:
(…)
36) Tendo em linha de conta a matéria de facto constante do item n.ºs 44 e 45 dos factos dados como assentes na Douta Sentença e ainda à matéria de facto constante dos artigos 174º a 176º e 178º a 181º da PI e que pelas razões de facto e de direito supra alegadas deverão ser dados como assentes, pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos patrimoniais e danos não patrimoniais sofridos pelo Autor nos prazos devidos, deverá a Ré ser condenada a pagar ao Autor os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais.
(…).
38) Juros esses em dobro da taxa legal que deverão ser contabilizados e devidos pela Ré ao Autor a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do Decreto-Lei n.º 291/2007, ou seja, desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída ao Autor pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016) e até efetivo e integral pagamento, nos termos do artigo 39º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 291/2007,
39) Subsidiariamente e para a hipótese de V.Ex.as não atenderem a data de 22/02/2016, os juros de mora em dobro da taxa legal deverão ser contabilizados e devidos pela Ré ao Autor a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do Decreto-Lei n.º 291/2007, ou seja, 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação dopedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018) e até efetivo e integral pagamento, nos termos do artigo 37.º, n.º 1 alínea c) do Decreto-Lei n.º 291/2007.
40) Subsidiariamente e para a hipótese de V.Ex.as não atenderem às datas de 22/02/2016 ou 18/08/2018, os juros de mora em dobro da taxa legal deverão ser contabilizados contabilizados e devidos pela Ré ao Autor desde a data da citação da Ré e até efetivo e integral pagamento.
41) A Douta Sentença recorrida violou as seguintes disposições legais: os artigos 483º, 496º, 562º, 563º, 564º, nº1 n.º 2, 566.º, n.ºs1, 2, 3 todos Código Civil , os artigos 36.°, n.°s 1 e) e 5, 37, n.º 1 alínea c), n.º 2, alínea a), 38º, n.º 3 e 4 e 39º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-lei 291/2007 de 21 de Agosto, artigos 805º, nº 3 e 806º todos Código Civil e Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2002, de 09/05/2002.

Também a Ré interpôs recurso, pedindo a revogação da sentença recorrida e a prolação de Acordão nos termos que remete para as suas alegações, que terminou com as seguintes conclusões:

1) A Ré não pode conformar-se com a douta sentença recorrida, quer no que respeita ao Autor quer no que respeita à Autora.
2) Salvo o devido respeito, entende a apelante que a douta sentença recorrida enferma de nulidades, não fez a correta apreciação da prova e a correta aplicação do Direito aos factos provados.

I. DA DECISÃO RESPEITANTE AO AUTOR

3) Entende a apelante que a douta sentença recorrida enferma de nulidades, por ser falha de fundamento e ser ininteligível, num dos segmentos.
4) Conforme decorre do dispositivo da douta sentença recorrida, a apelante foi condenada a pagar ao Autor:
“3 - Pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor nos prazos devidos, os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do Decreto-Lei n.º 291/2007, ou seja, desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016), ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018), ou desde a data da citação da Ré, ou desde a data que vier a ser estabelecida na decisão judicial e até efetivo e integral pagamento, os quais o Autor desde já peticiona da Ré;”
5) Analisada a douta sentença recorrida, no que respeita aos Factos Provados, nada é referido quanto à possibilidade de apresentação ao Autor por parte da apelante de uma proposta consolidada de indemnização.
6) De igual modo, examinada a parte da sentença intitulada de “qualificação jurídica”, constata-se que não é feita qualquer consideração jurídica ou de direito respeitante a uma eventual obrigação da apelante em pagar juros no dobro da taxa legal aplicável ao caso.
7) Analisados os termos do segmento da decisão atrás transcrita, constata-se ainda que, no que concerne ao dia a partir do qual os juros são devidos, o tribunal a quo não estipulou qualquer data, limitando-se a copiar ipsis verbis o que tinha sido peticionado pelo Autor, apresentando datas alternativas, sendo impossível de ser cumprida.
8) Acresce que o tribunal a quo, após ter calculado a indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pelo Autor, fez constar expressamente da decisão que “sobre esta quantia não são devidos juros, uma vez que o cálculo reporta-se à actualidade e tem como parâmetro um juízo de equidade, conforme resulta do Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2002”, o não é compatível com a condenação do pagamento de juros no dobro da taxa legal, sendo a douta sentença recorrida, nestes dois pontos, manifestamente contraditória.
9) Deste modo, o segmento nº 3 do dispositivo da douta sentença recorrida é nulo, nos termos do disposto no art. 615.º, nº 1, als. c) e d), do CPC, devendo ser suprimido.
10) O tribunal a quo considerou ainda provada factualidade que a apelante entende não ter resultado da produção de prova e que, em momento algum, se podem considerar confessados ou aceites por acordo.
(…)
22) Atendendo à factualidade constante do ponto 78-A dos Factos Provados, sempre teria de se descontar o valor de €20.000,00 à indemnização a pagar pela apelante ao Autor.
23) Deste modo, deve ser proferido acórdão que subtraia a quantia de €20.000,00 aos valores indemnizatórios atribuídos ao Autor.
24) Entende também a apelante que os valores indemnizatórios atribuídos ao Autor são excessivos.
25) A indemnização a arbitrar deve ter apenas em conta a idade do Autor à data da consolidação médico-legal, uma vez que durante o período em que duraram os tratamentos, o Autor foi indemnizado pela apelante pelas retribuições que deixou de auferir.
26) Além disso, não podemos esquecer que o Autor não está absolutamente incapaz de desempenhar qualquer profissão, encontrando-se se capaz de desempenhar outras profissões da sua área de preparação técnico-profissional.
27) Por último, a vida ativa do Autor acabaria certamente aos 70 anos, sendo certo que, atendendo ao quadro legal atual, o Autor estará reformado cerca de 3 ou 4 anos antes.
28) Deste modo, atendendo ao atual estado do Autor, à capacidade restante e à possibilidade de desempenhar outras profissões dentro da sua área técnico-profissional, à sua idade e ao período de vida ativa que ainda lhe falta, entende a apelante que a indemnização a atribuir nunca deverá ser arbitrada em quantia superior a €75.000,00.
29) Analisada a douta sentença recorrida e os efetivos danos sofridos pelo Autor, verifica-se que a indemnização arbitrada a título de danos não patrimoniais também é excessiva.
30) No caso dos autos, o Autor não carece de ajuda de terceira pessoa e pese emboras as sequelas de que padece que encerram indisfarçável gravidade, ainda consegue manter vários aspetos da sua vida dentro de relativa normalidade.
31) A disfunção erétil de que padece, e que deve ser necessariamente indemnizada é passível de terapêutica, não sendo absoluta, como infelizmente ocorre noutras situações mais graves.
32) Deste modo, tendo em conta a matéria de facto provada, nomeadamente, as lesões sofridas pelo Autor, as sequelas daí decorrentes, os efeitos provocados na sua vida e no seu dia-a-dia, a indemnização fixada a título de danos não patrimoniais nunca poderá ser superior ao montante de €70.000,00.
33) Ao decidir como decidiu o tribunal a quo não teve na devida conta a matéria de facto provada nem o direito aplicável, tendo violado o disposto nos arts. 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil.

II. DA DECISÃO RESPEITANTE À AUTORA

34) Entende a apelante que a decisão de condenação do pagamento à Autora de uma compensação a título de danos não patrimoniais é nula, por não ter qualquer fundamento de direito.
35) Conforme decorre do dispositivo da douta sentença recorrida, foi decidido:
“5 - Condenar a Ré a pagar à autora a quantia de € 50.000 € (cinquenta mil euros) a título de indemnização por danos morais, a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.”
36) Na verdade, no que respeita a esta concreta parte da decisão, nada consta da douta sentença recorrida que consubstancie qualquer subsunção jurídica dos factos apurados, nem qualquer silogismo jurídico, ou a invocação de qualquer norma jurídica.
37) Deste modo, o segmento nº 5 do dispositivo da douta sentença recorrida é nulo, nos termos do disposto no art. 615.º, nº 1, al. c), do CPC.
38) Ainda que assim não se considerasse, entende a apelante que nunca a Autora teria direito a ser indemnizada nos presentes autos.
(…)
54) Deste modo, entende a apelante que, ainda que seja arbitrada uma indemnização à Autora, o valor nunca deverá ser superior ao montante de €10.000,00.
55) Ao decidir como decidiu, a douta sentença recorrida não teve na devida conta a matéria de facto provada nem o direito aplicável, tendo violado o disposto nos arts.\562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil.

Na sequência da interposição de recurso pela Ré F... - Companhia de Seguros, a Autora BB veio interpor recurso subordinado, pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por Acordão que condene a Ré “na medida do assinalado”, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões:

1) A 2ª Autora/Recorrente não concorda com o valor indemnizatório que lhe foi atribuído a título de danos não patrimoniais.
2) Tendo em linha de conta a matéria de facto constante dos itens n.ºs 46, 47, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 81, 82, 83, 84, 85, 86, 87 e 88 dos factos dados como provados na Douta Sentença, com interesse para a determinação do montante indemnizatório a atribuir à 2ª Autora/Recorrente a titulo de danos não patrimoniais, deverá o mesmo ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a €100.000,00 (Cem Mil Euros).
(…)
22) A Douta Sentença recorrida violou as seguintes disposições legais: artigos 70, 1577, 1677, 483º, 496º, 562º, 563º, 564º, nº1 n.º 2, 566.º, n.ºs1, 2, 3 todos Código Civil e Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6430/07.0TBBRG.S1, de 16-01-2014.

O A. AA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto pela Ré, tendo terminado as suas contra-alegações com as seguintes conclusões:
(…).

2. Questões a apreciar

O objecto do recurso, é balizado pelo teor do requerimento de interposição (artº 635º nº 2 do CPC), pelas conclusões (art.ºs 608º n.º 2, 609º, 635º n.º 4, 637º n.º 2 e 639º n.ºs 1 e 2 do CPC), pelas questões suscitadas pelo recorrido nas contra-alegações em oposição àquelas, ou por ampliação (art.º 636º CPC) e sem embargo de eventual recurso subordinado (art.º 633º CPC) e ainda pelas questões de conhecimento oficioso cuja apreciação ainda não se mostre precludida.
           
No caso dos autos foram interpostos dois recursos independentes - um pelo A.  AA e outro pela Ré F... - Companhia de Seguros, SA – e um recurso subordinado – pela A. BB.

Ordenando logicamente as questões colocadas nos diversos recursos, que cumpre apreciar, temos:

- nulidade da sentença quanto ao ponto 3 do decisório (recurso da Ré);
- nulidade da sentença quanto ao ponto 5 do decisório ( recurso da Ré);
- impugnação da matéria de factos quanto aos pontos 45, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 59, 60, 74, 80 dos factos provados (recurso da Ré);
- deve ser aditada aos factos provados que o A. (recurso do A.)
a) sofreu um quantum doloris de grau 5 numa escala crescente de 1 a 7;
b) ficou com um dano estético permanente de grau 4 numa escala crescente de 1 a 7;
c) ficou com uma repercussão permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer de grau 3 numa escala crescente de 1 a 7;
- deve ser aditada aos factos provados a matéria dos artigos 165º a 173º da PI (recurso do A.)
- deve ser aditada aos factos provados a matéria constante dos artigos 174º a 176º e 178º a 181º da petição inicial (recurso do A.)
- deve ser aditado á factualidade provada que a Ré já entregou ao A., por conta da futura indemnização, a quantia de € 20.000,00 (recurso da Ré);
- o valor da indemnização atribuída ao A. a título de “perda de capacidade de ganho” deve ser fixado em € 250.000,00 (recurso do A.);
- o valor da indemnização atribuída ao A. a título de “dano biológico” deve ser fixada em € 50.000,00 (recurso do A.);
- a indemnização relativa ao dano biológico/dano patrimonial futuro atribuída ao A. não deverá ser fixada em valor superior € 75.000,00 (recurso da Ré);
- deve ser descontada à indemnização devida ao A., a quantia de € 20.000,00 já paga pela Ré ao A., por conta da indemnização;
- deve ser alterada a redacção do ponto 2 do decisório, em conformidade com a alteração da matéria de facto (recurso da Ré);
- o valor da indemnização atribuída ao A.  a titulo de danos morais deve ser fixada em € 175.000,00 (recurso do A.);
- a indemnização por danos não patrimoniais atribuída ao A. não deve ser fixada em valor superior a € 70.000,00 (recurso da Ré);
- sobre as indemnizações que a Ré for condenada a pagar ao A. deve incidir juros de mora no dobro da taxa legal (recurso do A.);
- deve ser fixada uma data a partir da qual são devidos juros de mora no dobro da taxa legal (recurso do A.);
- não deverá ser atribuída qualquer indemnização á A. BB (recurso da Ré);
- caso assim não se entenda, a mesma não deve ser superior a € 10.000,00 (recurso da Ré);
- a indemnização devida à A. BB a titulo de danos não patrimoniais deve ser fixada em € 100.000,00 (recurso da A. BB).

3. Nulidades da sentença

3.1. Enquadramento jurídico

A sentença pode ser vista como trâmite ou como acto: no primeiro caso, atende-se à sentença no quadro da tramitação da causa; no segundo, considera-se o conteúdo admissível ou necessário da sentença.
As nulidades da sentença e dos acórdãos referem-se ao conteúdo destes actos, ou seja, estas decisões não têm o conteúdo que deviam ter ou têm um conteúdo que não podiam ter (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, in O que é uma nulidade processual? in Blog do IPPC, 18-04-2018, disponível em https://blogippc.blogspot.com/search?q=nulidade+processual).

A recorrente indica as alíneas c) e d) do n.º 1 do art.º 615º do CPC.

Mas nas suas alegações, cita o texto das alíneas b) e c) do do referido normativo.           
Neste contexto, considera-se que a indicação da alínea d) constitui manifestamente um lapso.

O n.º 1 do art.º 615º do CPC dispõe que:
1 - É nula a sentença quando:
(…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
(…)

A alínea b) é uma decorrência do disposto no art.º 205º n.º 1 da CRP - que dispõe que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei.
E está relacionada com o art.º 154º do CPC - cujo n.º 1 dispõe que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas e no n.º 2 que a justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, salvo, quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade.
E especificamente, no que respeita à sentença, com o disposto no art.º 607º do CPC, cujo n.º 3 dispõe que nos fundamentos, deve o juiz discriminar os factos que considera provados e indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes e cujo n.º 4 dispõe que na fundamentação da sentença, o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

A este respeito referida Alberto dos Reis In Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra Editora, 1945, p. 172/173, que:

A exigência de motivação é perfeitamente compreensível. Importa que a parte vencida conheça as razões por que o foi, para que possa atacá-las no recurso que interpuser. Mesmo no caso de não ser admissível recurso da decisão o tribunal tem de justificá-la, pela razão simples de que a decisão vale, sob o ponto de vista doutrinal, o que valerem os seus fundamentos. Claro que a força obrigatória da sentença ou despacho está na decisão; mas mal vai a força quando se não apoia na justiça e os fundamentos destinam-se precisamente a convencer de que decisão é conforme à justiça. A função própria do juiz é interpretar a lei e aplicá-la aos factos em causa; por isso, deixa de cumprir o dever funcional o juiz que se limita a decidir, sem dizer como interpretou e aplicou a lei ao caso concreto. A decisão é um resultado, é a conclusão dum raciocínio; não se compreende que se enuncie unicamente o resultado ou a conclusão, omitindo-se as premissas de que ela emerge”.

Esta causa de nulidade da sentença apenas se verifica quando a falta de fundamentação é absoluta, como é entendimento unânime da doutrina e da jurisprudência.
           
Assim e na doutrina:
- Alberto os Reis in Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1981, Vol. V, p. 140:“Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade.”;
- A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, in Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª edição, 1985, p. 687: “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente e incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.”;
- Rodrigues Bastos in Notas ao Código de Processo Civil, III, p. 194: “a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afecta o valor legal da sentença.”
- Teixeira de Sousa in Estudos sobre o Processo Civil, p. 221: “esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciaiso dever de fundamentação restringe-se às decisões proferidas sobre um pedido controvertido ou sobre uma dúvida suscitada no processo…  e apenas a ausência de qualquer fundamentação conduz à nulidade da decisão… a fundamentação insuficiente ou deficiente não constitui causa de nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso, se este for admissível.”;
- e finalmente Manuel Tomé Soares Gomes, in Da Sentença Cível, CEJ, 2014, in https://elearning.cej.mj.pt/mod/folder/view.php?id=6202, pág. 39: a falta de fundamentação de facto ocorre quando, na sentença, se omite ou se mostre de todo ininteligível o quadro factual em que era suposto assentar. Situação diferente é aquela em que os factos especificados são insuficientes para suportar a solução jurídica adoptada, ou seja, quando a fundamentação de facto se mostra medíocre e, portanto, passível de um juízo de mérito negativo. A falta de fundamentação de direito existe quando, não obstante a indicação do universo factual, na sentença, não se revela qualquer enquadramento jurídico ainda que implícito, de forma a deixar, no mínimo, ininteligível os fundamentos da decisão.”

Na jurisprudência e a titulo meramente exemplificativo (os Ac’s citados são  do STJ e são consultáveis in www.dgsi.pt/jstj):
- Ac. do STJ de 15/05/2019, proc. nº 835/15.0T8LRA.C3.S1: “Para que se verifique a nulidade de falta de fundamentação prescrita no art. 615, nº 1, al, b), do CPC, não basta que a justificação seja deficiente, incompleta ou não convincente. É preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”);
- Ac. do STJ de 02/03/2021, processo nº 3157/17.8T8VFX.L1.S1:“Só a absoluta falta de fundamentação - e não a errada, incompleta ou insuficiente fundamentação - integra a previsão da nulidade do artigo 615.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil”.

A alínea c) tem dois fundamentos - a contradição e a ininteligibilidade.

Quanto á contradição, os fundamentos devem possuir uma relação lógica com a decisão, ou seja, deve haver uma relação de concordância entre os fundamentos e a decisão.

A contradição verifica-se quando ocorre incompatibilidade entre os fundamentos e a decisão, ou seja, em que a fundamentação aponta num sentido que contradiz o resultado final (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, CPC Anotado, I, 2ª edição, pág. 763).

Se na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, mas, no decisório, concluir noutro sentido, oposto ou divergente, esta oposição será causa da nulidade da sentença.

A contradição entre fundamentos e a decisão é estritamente no plano lógico da construção da decisão.

Coisa diversa é o próprio silogismo estar errado no seu mérito, por conter uma contradição com os factos ou com o direito: trata-se, então, de erro de julgamento, por o juiz decidir contra os factos ou contra “lei” que lhe impunha uma decisão diversa (Rui Pinto, Manual do Recurso Civil, AAFDL Editora, pág. 83).

Quanto á ininteligibilidade verifica-se quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade, ou seja, respectivamente, quando da decisão – e é apenas á decisão/dispositivo que a norma se refere - se puder extrair mais de um sentido ou quando não se puder retirar um sentido lógico, racional e coerente

3.2. Em concreto
3.2.1. Consta do ponto 3 do decisório da sentença recorrida:

3 - Pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor nos prazos devidos, os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, contados a partir do dia seguinte ao final dos prazos previstos nos artigos 37.º, n.º 1 alínea c) e 39º, n.º 22, do DecretoLei n.º 291/2007, ou seja, desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016), ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018), ou desde a data da citação da Ré, ou desde a data que vier a ser estabelecida na decisão judicial e até efetivo e integral pagamento, os quais o Autor desde já peticiona da Ré;

Este ponto do decisório é uma pura e simples cópia e colagem do pedido deduzido pelo A., sem que tenha havido o cuidado de eliminar as normas e concretizar a data a partir da qual são devidos os juros à taxa referida.

Um pedido que suscita dúvidas, pois num primeiro momento parece apenas ter em vista os danos morais - ”…pela não apresentação de uma proposta consolidada de indemnização final por todos os danos não patrimoniais sofridos pelo Autor …” -, mas num segundo momento já parece ter em vista quer os danos morais, quer os danos não patrimoniais – “ os juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que virem a ser fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais,…”

No entanto e tendo em consideração o segundo momento do petitório, entende-se que o mesmo abrange os danos patrimoniais e não patrimoniais.

A sentença condenou a Ré:
1 – (…) a pagar ao autor a título indemnização por danos patrimoniais a quantia de € 100 455, 22 (cem mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e vinte e dois cêntimos);
(…)

Não constam da sentença recorrida quaisquer factos ou razões de direito que permitam compreender porque é que o ponto 3 do decisório faz incidir, sobre a indemnização por danos patrimoniais, juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável.

Destarte, o ponto 3 do decisório da sentença recorrida, na parte em que abrange a indemnização por danos patrimoniais, referida no ponto 1 do decisório, é nula por falta de fundamentação, à luz da alínea b) do n.º 1 do art.º 615º.

E sendo nulo por falta de fundamentação, logicamente não pode haver contradição entre os fundamentos e a decisão (alínea c) do n.º 1 do art.º 615º do CPC).

Consta do ponto 4 do decisório da sentença recorrida:
4 – (…) a pagar ao autor a quantia de € 100.000 € (cem mil euros) a título de indemnização por danos morais, a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.
(…)

Na fundamentação da sentença consta:
“Atendendo, ao sofrimento e dores suportados pelo autor, ao tempo em que permaneceu com diversos incómodos inerentes aos tratamentos médicos a que foi sujeito, o facto de ter ficado lesionado de forma permanente, ter a sua vida sexual afectada de modo permanente, e ao facto de a culpa no acidente ser da inteira responsabilidade do segurado da ré, parece-nos justo a indemnização devida nesta sede, em € 100 000.
Sobre esta quantia não são devidos juros, uma vez que o cálculo reporta-se à actualidade e tem como parâmetro um juízo de equidade, conforme resulta do Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2002.”

Já deixámos dito que o ponto 3 do decisório abrange os danos não patrimoniais.

Assim sendo há uma contradição entre o ponto 3 do decisório – sobre a indemnização por danos morais incidem juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável – e o ponto 4 – sobre a indemnização por danos morais incidem juros de mora calculados à taxa de 4% (que é, actualmente, a taxa dos juros civis) – que torna a sentença ininteligível, pois fica sem se saber a que taxa de juro são calculados os juros de mora sobre a indemnização por danos morais: ao dobro da taxa ou à taxa de 4%.

Destarte, a sentença, no ponto 3 do decisório, na parte em que o mesmo abrange a indemnização por danos não patrimoniais, referida no ponto 4 do decisório, é nula por ininteligibilidade, à luz da 2ª parte da alínea c) do n.º 1 do art.º 615º.

Uma vez que o ponto 3 do decisório abrange danos patrimoniais e danos não patrimoniais e é nulo em ambas as dimensões, há-de concluir-se que o mesmo é nulo, ainda que por fundamentos diversos, in totum.

3.2.2. Consta do ponto 5 do decisório:
5 - Condenar a Ré a pagar à autora a quantia de € 50.000 € (cinquenta mil euros) a título de indemnização por danos morais, a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.

A Ré invoca que nesta parte é nula por não ter qualquer fundamento de direito.

Consta da sentença recorrida quanto a esta matéria:
“Quanto aos danos não patrimoniais sofridos pela autora:
O débito conjugal constitui um dos deveres do casamento e, a sua recusa pode ser motivo de divórcio.
Constituindo um direito do cônjuge/companheira e aqui Autora em ter um relacionamento sexual normal, pelo que a sexualidade, pelo menos dentro do casamento/união de facto, pode ser encarada como um direito de personalidade.
Atendendo, ao sofrimento suportado pela autora, ao ver a vida sexual com o seu marido afectada de modo permanente, e ao facto de a culpa no acidente ser da inteira responsabilidade do segurado da ré, parece-nos justo a indemnização devida nesta sede, em € 50 000.
Sobre esta quantia não são devidos juros, uma vez que o cálculo reporta-se à actualidade e tem como parâmetro um juízo de equidade, conforme resulta do Acórdão do STJ de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2002. “

Como ficou referido, o que constitui fundamento da nulidade prevista na alínea b) é a absoluta falta de fundamentação e não a insuficiência ou mediocridade da fundamentação.

No caso, é patente que não se verifica uma absoluta falta de fundamentação quanto ao segmento de decisório em apreço.

Em face do exposto, improcede a nulidade da sentença relativamente ao ponto 5 do decisório.

4. Fundamentação de facto

4.1. A sentença recorrida considerou (mantêm-se a numeração de origem):
Provaram-se os seguintes factos:
(…)
4.2. Impugnação da decisão de facto
4.2.1. Os requisitos – art.º 640º do CPC
(…)
4.2.2. Em concreto
A recorrente deu cumprimento aos ónus a que se refere o art.º 640º n.º 1 do CPC, pelo que estão reunidas as condições para a apreciação da impugnação.

4.3. Da modificabilidade da decisão de facto
O art.º 662º do CPC, com a epigrafe “Modificabilidade da decisão de facto” dispõe:
“1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”
(…)”

Está em causa saber como a Relação deve mover-se no domínio da modificabilidade da decisão de facto.
(…)
4.4. Da livre apreciação da prova e motivação da decisão de facto
(…)
4.5. Em concreto
A Ré impugna a decisão de facto quanto aos pontos 45, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 59, 60, 74, 80 dos factos provados.
(…)
Em face do exposto, altera-se o ponto 45 dos factos provados, o qual passa ter a seguinte redacção:
45. As lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, atingiram a consolidação médicolegal em 18/06/2018, com Incapacidade Permanente Absoluta para a sua Profissão Habitual (IPAPH) de “Técnico Manutenção de 2ª”.

Consta do ponto 48:
(…)
Em face do exposto, elimina-se o ponto 48 dos factos provados, ingressando a respectiva matéria na alínea c) dos factos não provados.

Consta dos pontos 49 e 50:
(…)
Em face de tido o exposto:
a) altera-se a redacção do ponto 49 dos factos provados, que passa a ser:
49. O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
b) elimina-se a restante matéria do ponto 49 dos factos provados, ingressando na alínea d) dos factos não provados com o seguinte teor:
d) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Ortopedia, Consulta da Dor Crónica, Psiquiatria, Medicina Física e Reabilitação, Neurologia, Neurocirurgia, Neurocirurgia Funcional e Cirurgia Plástica para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
c) elimina-se o ponto o ponto 50 dos factos provados, ingressando a respectiva matéria na alínea e) dos factos não provados com o seguinte teor:
e) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de realizar tratamento fisiátrico (pelo menos duas vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões) para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.

Consta do ponto 51:
(…)
Destarte impõe-se:
a) alterar a redacção do ponto 51 dos factos provados, que passa a ser:
51. O autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, regularizador do sono, injeção intracavernosa com prostaglandina e analgésicos - para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
b) remeter para a alínea f) dos factos não provados o seguinte:
f) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ansiolíticos e antiinflamatórios, para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.

Consta do ponto 52:
(…)
Em face do exposto, elimina-se o ponto 52 dos factos provados, cuja matéria deve ingressar na alínea g) dos factos não provados.

Consta do ponto 53:
(…)
Em face de tudo o exposto:
a) altera-se a redacção do ponto 53 que passa a ser:
53. Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas atuais e permanentes causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor, padece atualmente de: Um Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 31 pontos; As sequelas supra descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, impeditivas e incompatíveis com o exercício da sua actividade profissional habitual; O Autor está Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH).
b) ingressando na alínea h) dos factos não provados que:
h) Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas atuais e permanentes causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor, padece atualmente de uma Incapacidade Permanente Parcial (IPP) fixável em 72.465 %.

Consta do ponto 59:
(…)
Em face do exposto:
a) altera-se a redacção do ponto 59 dos factos provados, que passará a ser a seguinte:
59. O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, teve necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, a varias intervenções cirúrgicas, de recorrer a consultas médicas de várias especialidades, de se submeter a várias sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos, nas quais despendeu, até à presente data, a quantia de €1.955,22, tendo a Ré até à presente data procedido a um adiantamento no valor de €1.500,00.
b) ingressando nos factos não provados sob a alínea i) o seguinte:
i) O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, tem e terá necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, a varias intervenções cirúrgicas, de recorrer a consultas médicas de várias especialidades, de se submeter a várias sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos.

Consta do ponto 60:
(…)
Em face do exposto, elimina-se o ponto 60 dos factos provados, cuja matéria deve ingressar nos factos não provados sob a alínea j).

Consta dos pontos 74 e 80:
(…)
Neste conspecto impõe-se:
i) alterar a redação dos ponto 74 e 80, que passa a ser:
74. Em consequência das lesões causadas pelo acidente de viação descrito nos autos, o A. ficou a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite relações sexuais naturais e espontâneas, só lhe sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, tudo com repercussão na actividade sexual do A. de 5 numa escala de 7.
80. Agora o marido da Autora, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias relações sexuais naturais e espontâneas com a Autora, só podendo ter relações sexuais mediante injeção intracavernosa com prostaglandina.

4.6. Alteração oficiosa
Como já ficou referido, na sequência da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, caso a Relação proceda à alteração da mesma e se verifique ser necessário, em função da reapreciação conjunta e global dos factos, alterar algum facto não impugnado, pode a Relação fazê-lo a bem da coerência daquela decisão (cfr. Ac. do STJ de 29/04/2021, proc. 684/17.0T8ABT.E1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj).

Alterada a redacção dos pontos 74 e 80 dos factos provados, verifica-se que os pontos 78, 82 e 88, não são coerentes com tal alteração.

- O ponto 78 tem o seguinte teor:
78. Agora o Autor, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias uma vida sexual com a sua companheira.

Onde se afirma que o Autor, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias uma vida sexual com a sua companheira, o que se pode afirmar, à luz da alteração ao ponto 74, é que agora o A. não pode nem poderá ter relações sexuais naturais e espontâneas, já que a prova permite afirmar que pode e poderá ter relações sexuais (que não serão naturais nem espontâneas) fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina.

Assim impõe-se adequar a redacção do ponto 78, que passa a ser:
78. Agora, o Autor, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias relações sexuais naturais e espontâneas com a sua companheira, só podendo ter relações sexuais fazendo aquele injeção intracavernosa com prostaglandina.

- O ponto 82 tem o seguinte teor:
82. Devido à impotência sexual de que ficou portador, o marido da Autora, passou a ser acometido de um sentimento de ciúme em relação à sua mulher/companheira e aqui Autora, o que se traduz em discussões.

A expressão “impotência sexual” não retrata de forma coerente a realidade material apurada no ponto 74.

Assim impõe-se adequar a redacção do ponto 82, que passa a ser:
82. Devido ao facto de o A. ter ficado a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite ao mesmo ter relações sexuais naturais e espontâneas, só sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, o mesmo passou a ser acometido de um sentimento de ciúme em relação à sua mulher/companheira e aqui Autora, o que se traduz em discussões.

O ponto 88 tem o seguinte teor:
88. O facto de não poder ter relações sexuais com o marido, causa-lhe um grande desgosto, sofrimento.

O que está em causa é a clarificação de que a A. não pode ter relações sexuais naturais e espontâneas com o marido, só as podendo ter mediante a injecção intracavernosa com prostaglandina.

Destarte impõe-se adequar a redacção do ponto 88 à factualidade provada no ponto 74, passando a ser:
88. O facto de não poder ter relações sexuais naturais e espontâneas com o marido, causa-lhe um grande desgosto, sofrimento.

4.7. Deficiência da decisão de facto
4.7.1. Enquadramento jurídico
Realidade diversa da impugnação da decisão de facto, que pressupõe um erro de julgamento, é a deficiência da decisão de facto, que está plasmada no art.º 662º n.º 2 alínea c) onde se dispõe que a Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: (…) c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta.

Actualmente poderá afirmar-se que haverá deficiência quando o tribunal não se pronuncie sobre algum facto integrante dos temas da prova ou como refere Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil, 6ª edição, pág. 352, a decisão de facto será deficiente se houver “falta de pronúncia sobre factos essenciais ou complementares”, “de modo que conjugadamente se mostre impedido o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso”; será caso de ampliação da matéria de facto, quando tiver sido omitida dos temas da prova matéria de facto alegada pelas partes que se revele essencial para a resolução do litigio ( cfr. Abrantes Geraldes, ob. cit., pág. 353).

4.7.2. Deficiência invocada pelo A.
4.7.2.1. Matéria de facto relativa ao Quantum doloris, dano estético permanente e repercussão permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer.

O A. alegou:
134. No que concerne ao Quantum Dolóris, que corresponde à valoração do sofrimento físico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões e, ainda, tendo em conta o sofrimento atual, deverá fixarse o mesmo ao Autor no grau 6, numa escala crescente de 1 a 7.
138. As referidas cicatrizes e deformidade numa escala crescente de 1 a 7 conferem ao
Autor um “Dano Estético Permanente” fixável no grau 4.
140. As referidas queixas, lesões e sequelas supra descritas numa escala crescente de 1 a 7 conferem ao Autor uma “Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer” fixável no grau 3.

E foi objecto dos Temas da prova:
6º Quantum doloris e dano estético.
7º Repercussão das sequelas nas actividades de desporto e lazer e prejuízo sexual.

Porém, nada consta quanto a estas realidades na matéria de facto provada ou não provada.

É certo que consta do ponto 46 dos factos provados que:
46. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 04072018, foi observado e submetido a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil e a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito do Trabalho realizada pelo Dr. FF, Médico Especialista em Medicina do Trabalho e Perito em Avaliação do Dano Corporal pós traumático pelo INML – ..., com domicílio profissional na clinica “C...-CENTRO MÉDICO DE ..., LDA”, sita na Rua ..., ..., ... ..., o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou: (…) Quantum Dolóris fixável no grau 6/7; Dano Estético Permanente fixável em grau 4/7; Repercussão nas actividades de Desporto e de Lazer/Prejuízo de Afirmação Pessoal fixável em grau 3/7; (…)

Porém e como já se deixou referido, o que está dado como provado é que o Dr. FF, Médico Especialista em Medicina do Trabalho e Perito em Avaliação do Dano Corporal pós traumático pelo INML – ..., procedeu a uma “Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil” e a uma “Avaliação do Dano Corporal em Direito do Trabalho”, tendo concluído nos termos ali referidos.

Em segundo lugar e ao contrário do que é afirmado na decisão de facto, não estamos perante uma “perícia” ou um relatório pericial, mas apenas e tão só perante um parecer técnico.

Um relatório pericial só tem essa natureza e valor quando na sua produção se observaram os procedimentos legais de admissão e produção estabelecidos para a prova pericial (cfr. Ac. da RP de 08/11/2012, pro. 6439/07.3TBMTS.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp).

A única prova pericial produzida nos autos é o Relatório pericial elaborado pelo INML... – Gabinete Médico-Legal do ..., junto aos autos a 02/12/2020, onde, relativamente aos aspectos em referência, na pág. 5, no âmbito do “Estado actual”, consta:
“ 2. Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento
O examinando apresenta as seguintes sequelas:
(…)
Abdómen: três cicatrizes não recentes, de aspecto cirúrgico, de 3 por 1 cm, 3 por 1 cm e de 2 cm (respecticamente) no flanco e fossa ilíaca direita; três cicatrizes não recentes de aspecto cirúrgico, com 2 po1, 2 por 1 e 2 cm no flanco esquerdo e fossa ilíaca esquerda; “

E na pág. 6, no âmbito da “Discussão” consta:
“3. No âmbito do período dos danos temporários são valorizáveis, entre os diversos parâmetros do dano, os seguintes:
“ (…)
Quanto doloris (corresponde à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vitima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões); fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.”
4. No âmbito do período de danos permanentes são valorizáveis, entre os diversos parâmetros de dano, os seguintes:
(…)
- Dano Estético Permanente (corresponde à repercussão das sequelas, numa perspectiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afectação da imagem da vitima quer em relação asi próprio, quer perante os outros).  É fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspectos: a claudicação da marcha, a utilização de ajudas técnicas e as(s) cicatrize(s).
- Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer ( corresponde à impossibilidade estrita e específica para a vítima de se dedicar a certas actividades lúdicas, de lazer e de convívio social, que exercia de forma regular). É fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta os seguintes aspectos: abandono da prática de ciclismo de lazer e futsal com amigos.”

Finalmente nas “Conclusões” consta:
“ (…)
- Quanto doloris fixável no grau 5/7
(…)
- Dano Estético permanente fixável no grau 4/7
- Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer fixável no grau 3/7.
(…)”

Em face do exposto, impõe-se aditar aos factos provados os pontos 53.A. 53. B e 53. C, com o seguinte teor:
53.A -  Entre a data do evento – 08/05/2016 - e a data da consolidação das lesões – 18/06/2018 – o quantum doloris, ou seja, o sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo A. é fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.
53.B – O dano estético permanente na pessoa do A.  é fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a claudicação da marcha, a utilização de ajudas técnicas e as cicatrizes.
53.C – A Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer é fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta o abandono da prática de ciclismo de lazer e futsal com amigos.

4.7.2.2. Aditamento aos factos provados da matéria dos artigos 165º a 173º da PI
Os artigos em referência são relativos à matéria da assunção de responsabilidade pelo sinistro, pela Ré.

Expurgados da matéria que não se mostra essencial e da matéria de direito, com relevância o A. alegou:
167. (…) [A] 09062016 (…) a Ré comunicou e informou expressamente o Autor na pessoa do seu mandatário do seguinte:
“(…)
Informamos V. Exa que estamos a assumir a responsabilidade pelo sinistro, pelo que nesta fase é importante desde já acompanharmos a evolução da situação clínica do sinistrado, sendo imprescindível que nos faça chegar os relatórios médicos e a informação clínica acerca das lesões sofridas pelo sinistrado para análise da nossa Assessoria Clínica.
Por outro lado, solicitamos que V. Exa nos informe do local para onde o sinistrado irá ser reencaminhado pelo Hospital ... e em que data para que possamos marcar uma consulta domiciliária de avaliação do dano corporal.
Caso a alta não esteja para breve, solicitamos igualmente que nos informe em que cama do Serviço de Ortopedia se encontra o sinistrado para podermos marcar a consulta domiciliária.”

Esta factualidade, em si mesma considerada, não foi impugnada pela Ré.

Assim e tendo em consideração as várias soluções plausíveis de direito,  determina-se o aditamento aos factos provados, sob o n.º 89, da seguinte factualidade:
89. A 09/06/2016 a Ré enviou ao mandatário do A. o email junto com a PI sob o doc. ...0, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, nomeadamente com o seguinte teor:
“Informamos V. Exa que estamos a assumir a responsabilidade pelo sinistro, pelo que nesta fase é importante desde já acompanharmos a evolução da situação clínica do sinistrado, sendo imprescindível que nos faça chegar os relatórios médicos e a informação clínica acerca das lesões sofridas pelo sinistrado para análise da nossa Assessoria Clínica.
Por outro lado, solicitamos que V. Exa nos informe do local para onde o sinistrado irá ser reencaminhado pelo Hospital ... e em que data para que possamos marcar uma consulta domiciliária de avaliação do dano corporal.
Caso a alta não esteja para breve, solicitamos igualmente que nos informe em que cama do Serviço de Ortopedia se encontra o sinistrado para podermos marcar a consulta domiciliária.”

4.7.2.3. Aditamento aos factos provados da matéria constante dos artigos 174º a 176º e 178º a 181º da petição inicial.
Os artigos em referência são relativos à matéria da não apresentação pela seguradora de uma proposta razoável de indemnização 

Expurgados da matéria que não se mostra essencial e da matéria de direito, com relevância o A. alegou:
179. O Autor através do seu mandatário, por mail enviado para a Ré Seguradora (…) em 05/07/2018 (…), com cópia das perícias de avaliação do dano corporal em direito civil e direito do trabalho e ainda recibo de vencimento do autor juntos aos presentes autos sob os doc.s n.sº 21, 22 e 26, apresentou por escrito à Ré Seguradora (…) um pedido de indemnização final por conta de todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Autor/Lesado em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, (…)  peticionando extrajudicialmente os seguintes valores: (…) tudo conforme cópia do mesmo e respetivo comprovativo de entrega com MDDE e cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os devidos efeitos legais sob os doc.s nºs 83 e 84.

181. A Ré, até à presente data, decorridos que foram os 15 dias após a data da alta clinica atribuída pela Ré ao Autor em 06/02/2018, bem como decorridos que foram os 45 dias a contar da data da formulação e receção do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018, ainda não apresentou ao Autor qualquer proposta razoável de indemnização por conta dos danos patrimoniais e não patrimoniais que advieram para o Autor em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos.

Esta factualidade, em si mesma considerada, não foi impugnada pela Ré.

Esta alegou que havia uma divergência quanto à questão de saber se o A. tinha ficado ou não totalmente incapaz para o exercício da profissão habitual, entre os Relatórios apresentados pelo A. com o pedido de indemnização formulado a 05/07/2018 e o Relatório mandado elaborar pela Ré e recebido a 02/07/2018, pelo que não se pode considerar que o dano do A. já fosse quantificável.

Voltaremos a esta alegação da Ré adiante.

Assim e tendo em consideração as várias soluções plausíveis de direito,  determina-se o aditamento aos factos provados, sob os n.ºs 90 e 91, da seguinte factualidade:
90. A 05/07/2018 o A., através do seu mandatário, enviou á Ré, que o recebeu, o e-mail junto com a petição inicial sob o doc. ...3, cujo teor, dada a sua extensão, se dá aqui por reproduzido, e-mail em que apresenta um pedido de indemnização civil pelos danos sofridos em consequência do embate dos autos, elencando os diversos danos sofridos, e-mail acompanhado de cópia dos Relatórios de Avaliação do dano Corporal em Direito Civil e em Direito do Trabalho que constituem os doc .s 21 e 22 juntos com a PI e do recibo de vencimento de Abril de 2016
91. Até á data da propositura da acção, a Ré nunca apresentou ao A. qualquer proposta de indemnização.

4.8. Deficiência invocada pela Ré
Pretende a Ré seja aditado á factualidade provada que a Ré já entregou ao A., por conta da futura indemnização, a quantia de € 20.000,00.

Na contestação a Ré alegou que no procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória havia pago ao A. a quantia de € 10.000,00 por conta da indemnização final.

Tendo o A. apresentado pronúncia quanto á contestação (que foi mantida nos autos), não colocou em crise a referida alegação.

A 21/02/2020 a Ré, em requerimento também subscrito pelo Ilustre mandatário do A. veio juntar aos autos transacção da qual resulta que se compromete a pagar ao A. € 5.000,00, por conta da indemnização que vier a ser fixada a final.

E por requerimento de 24/02/2020 comprovou nos autos o referido pagamento.

A 12/10/2020 a Ré, em requerimento também subscrito pelo Ilustre mandatário do A. veio juntar aos autos transacção da qual resulta que se compromete a pagar ao A. € 5.000,00, por conta da indemnização que vier a ser fixada a final.

E por requerimento de 29/19/2020 comprovou nos autos o referido pagamento.

Finalmente, na Acta da 1ª Sessão de julgamento ficou a constar o seguinte:
“ Despacho
Conforme resulta de fls. 62 e 100, a F... - Companhia de Seguros já entregou ao autor por conta da futura indemnização a pagar a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros)”

O próprio A., no seu recurso, alude ao facto de já ter recebido da Ré a referida quantia e á necessidade de se proceder ao seu desconto na indemnização final.

Estamos em parte perante um facto alegado na contestação (pagamento da quantia de € 10.000,00 por conta da indemnização) e em parte perante um facto superveniente, ambos essenciais para a boa decisão da causa.

Em face de tudo o exposto e tendo em consideração as várias soluções plausíveis de direito, determina-se o aditamento aos factos provados, sob o n.º 92, da seguinte factualidade:
92. A F... - Companhia de Seguros já entregou ao autor, por conta da futura indemnização a pagar, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros).

4.9. Deficiência verificada oficiosamente
4.9.1. Matéria relativa ao défice funcional temporário e repercussão temporária do acidente na actividade profissional do A.
Compulsados os autos verifica-se que muito embora tivesse sido objecto do ponto 3º dos temas da prova o défice funcional temporário da integridade física e psíquica e sob o ponto 4º a repercussão do acidente na actividade profissional do A., isso não consta da factualidade provada.

É certo que consta do ponto 46 dos factos provados que:
46. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 04072018, foi observado e submetido a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil e a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito do Trabalho realizada pelo Dr. FF, Médico Especialista em Medicina do Trabalho e Perito em Avaliação do Dano Corporal pós traumático pelo INML – ..., com domicílio profissional na clinica “C...-CENTRO MÉDICO DE ..., LDA”, sita na Rua ..., ..., ... ..., o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou: (…) Quantum Dolóris fixável no grau 6/7; Dano Estético Permanente fixável em grau 4/7; Repercussão nas actividades de Desporto e de Lazer/Prejuízo de Afirmação Pessoal fixável em grau 3/7; (…)

Mas – repete-se – o que aqui está como provado é que o Dr. FF, Médico Especialista em Medicina do Trabalho e Perito em Avaliação do Dano Corporal pós traumático pelo INML – ..., procedeu a uma “Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil” e a uma “Avaliação do Dano Corporal em Direito do Trabalho”, tendo concluído nos termos ali referidos.

Por outro lado, e ao contrário do que é afirmado na decisão de facto, não estamos perante um relatório pericial, mas apenas e tão só perante um parecer técnico.

A única prova pericial produzida nos autos é o Relatório pericial elaborado pelo INML... – Gabinete Médico-Legal do ..., junto aos autos a 02/12/2020, onde, relativamente aos aspectos em referência, consta:
- na pág. 6, no âmbito da “Discussão”:
“3. No âmbito do período dos danos temporários são valorizáveis, entre os diversos parâmetros do dano, os seguintes:
“ Défice Funcional temporário (corresponde ao período durante o qual a vitima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social). Considerou-se o:
- Défice Funcional Temporário Total (correspondendo com os períodos de internamento e/ou de repouso absoluto), que se terá situado entre 08/05/2016 e 21/09/2016, sendo assim fixável num período de 137 dias;
- Défice Funcional temporário Parcial ( correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização desses actos, ainda que com limitações), que se terá situado entre 22/09/2016 e 18/0672018, sendo assim fixável num período 635 dias;
- Repercussão Temporária na Actividade profissional (correspondendo ao período durante o qual a vitima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade profissional habitual). Considerou-se a:  
- Repercussão temporária na Actividade Profissional Total correspondendo aos períodos de internamento e/ou repouso absoluto, entre outros), que se terá situado entre 08/05/2016 e 18/06/2018, sendo assim fixável num período total de 772 dias. “

Assim e tendo em consideração as várias soluções plausíveis de direito,  determina-se o aditamento aos factos provados, sob os n.ºs 53.D e 53.E, da seguinte factualidade:
53.D - Em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, o A. viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social:
- de forma total, correspondendo a períodos de internamento e/ou de repouso absoluto, entre 08/05/2016 e 21/09/2016, sendo assim fixável num período de 137 dias ( Défice funcional temporário total);
- de forma parcial, correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização daqueles actos, ainda que com limitações, entre 22/09/2016 e 18/0672018, sendo assim fixável num período 635 dias ( défice funcional temporário parcial).
53.E - Em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade profissional habitual de forma total, entre 08/05/2016 e 18/06/2018, sendo assim fixável num período total de 772 dias (Repercussão Temporária na Actividade profissional).

4.9.2. Matéria relativa ao Relatório de avaliação do dano corporal pedido pela Ré
A Ré alegou nos artigos 34º, 37º e 45º da contestação que havia uma divergência entre os Relatórios apresentados pelo A. com o pedido de indemnização formulado a 05/07/2018 e o Relatório mandado elaborar pela Ré e recebido a 02/07/2018, que juntou sob doc. ..., quanto à questão de saber se o A. tinha ficado ou não totalmente incapaz para o exercício da profissão habitual, pelo que não se podia considerar que o dano do A. já fosse quantificável.

Tendo o A. apresentado pronúncia quanto á contestação (que foi mantida nos autos), o mesmo impugnou o alegado nos referidos artigos da contestação e o conteúdo do documento junto.

Vejamos

O documento n.º ... junto com a contestação constitui um Relatório Final de Avaliação do Dano Corporal elaborado por médico da Ré, que contem uma parte relativa à história do evento, com dados documentais, uma parte relativa ao estado actual, ao exame objectivo á discussão, com referência ao nexo de causalidade, data da consolidação, danos temporários e permanentes sofridos pelo A. e Conclusões.
No âmbito dos danos permanentes refere: “Repercussão permanente na Actividade Profissional: pode manter a sua actividade profissional habitual, mas com esforços acrescidos.”
E tem aposta a data de 02/07/2018.

Em audiência de julgamento a testemunha GG declarou que o Relatório médico feito pela seguradora foi feito a 02/07/2018.
 
Neste conspecto e tendo em consideração as várias soluções plausíveis de direito é possível dar como provado e, em consequência, determina-se o aditamento aos factos provados, sob o n.º 93. e 94., da seguinte factualidade:
93. A 02/07/2018 o médico da Ré elaborou o Relatório Final de Avaliação do Dano Corporal que constitui o documento n.º ... junto com a contestação, o qual  contem uma parte relativa à história do evento, com dados documentais, uma parte relativa ao estado actual, ao exame objectivo, á discussão, com referência ao nexo de causalidade, data da consolidação, danos temporários e permanentes sofridos pelo A. e Conclusões.
94. No âmbito dos danos permanentes o referido Relatório refere: “Repercussão permanente na Actividade Profissional: pode manter a sua actividade profissional habitual, mas com esforços acrescidos.”

4.10. Fundamentação de facto consolidada
Provaram-se os seguintes factos:
1. No passado dia 08 de Maio de 2016, cerca das 10 horas e 30 minutos, na Estrada Nacional n.º ...01, mais concretamente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., ocorreu um acidente de viação da forma no qual intervieram os seguintes veículos automóveis: um veículo ligeiro, de passageiros, de serviço particular, com o número de matrícula ..-..-JD, de propriedade e conduzido por CC, um motociclo, de serviço particular, com o número de matricula ..-..-RV, de propriedade e conduzido pelo aqui Autor AA, e um motociclo, de serviço particular, com o número de matricula ..-HL-.., de propriedade e conduzido por HH.
2. Entre aquele CC, nas qualidades de proprietário e/ou condutor habitual do veículo de matrícula ..-..-JD e a Ré seguradora “F... - Companhia de Seguros, S.A.” existia à data e aquando da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, um contrato de seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel, válido e eficaz, titulado pela apólice nº ...61, mediante o qual, havia transferido para aquela seguradora “F... - Companhia de Seguros, S.A.”, a respetiva responsabilidade civil automóvel emergente de acidente de viação/circulação rodoviária do mesmo veículo matricula ..-..-JD à data e aquando da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, pelos danos causados a terceiros, bem como a pessoas transportadas (onerosa ou gratuitamente), pela sua carga e emergentes da circulação rodoviária do mesmo veículo matricula ..-..-JD.
3. O Autor, à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 50 (cinquenta) anos de idade, já que nasceu em .../.../1966.
4. No dia, hora e local acima melhor mencionados, em 1., a via pública da Estrada Nacional n.º ...01, mais concretamente da Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., dispunha de uma faixa de rodagem única, com dois sentidos de trânsito contrários entre si, devidamente delimitados entre si por uma linha longitudinal contínua devidamente marcada no pavimento de cor ..., com marcação de vias e com bastante iluminação pública de carácter permanente.
5. No dia, hora e local acima melhor mencionados, no art.1º, desta P.I., o Autor AA conduzia o seu motociclo, de serviço particular, com o número de matricula ..-..-RV, o qual circulava na Estrada Nacional n.º ...01, mais concretamente da Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., no sentido de marcha .../Guimarães, isto atento o seu sentido de marcha (por referência ao ponto B) mencionado na participação policial do acidente).
6. O motociclo matricula ..-..-RV, conduzido pelo Autor AA, circulava a uma velocidade calculada entre os 30/40 Km/horários.
7. O motociclo matricula ..-..-RV, conduzido pelo Autor AA, circulava com as luzes de cruzamento (médios) e de nevoeiro da frente e traseira do seu motociclo acesas (ligadas) e o Autor tinha o capacete de proteção colocado na sua cabeça.
8. O motociclo matricula ..-..-RV, conduzido pelo Autor AA, circulava totalmente dentro da sua metade direita da faixa de rodagem (hemifaixa), bem junto à berma direita.
9. E o Autor AA conduzia o seu motociclo matricula ..-..-RV, perfeitamente atento às condições da via e demais trânsito, com a cuidado, atenção e prudência devidas e com a observância das demais regras estradais.
10. No mesmo sentido de marcha do Autor (.../Guimarães), na mesma hemifaixa de rodagem direita e na traseira do veículo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV, circulava o motociclo matricula ..-HL-.. conduzido por HH.
11. Na mesmo dia, hora e local acima melhor mencionados, no art.1º, desta P.I., mas em sentido de marcha contrário ao do motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV, isto é, Guimarães/..., circulava o veículo ligeiro, de passageiros, de serviço particular, com o número de matrícula ..-..-JD, segurado na Ré e conduzido por CC (por referência ao ponto A) mencionado na participação policial do acidente).
12. O condutor do veículo segurado na Ré com a matricula ..-..-JD (CC), atento o seu sentido de marcha (Guimarães/...), ao descrever uma curva, em patamar, para a sua esquerda atento o sentido de marcha Guimarães/....
13. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), conduzia e imprimia ao mesmo veículo, uma velocidade superior a 70/80 Km/horários.
14. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), conduzia o mesmo veículo com as luzes de cruzamento (médios) desligadas.
15. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), conduzia o mesmo veículo, dentro de uma localidade com grande tráfego de veículos automóveis.
16. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), conduzia o mesmo veículo sem assinalar atempadamente a sua presença.
17. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), conduzia o mesmo veículo sem prestar atenção à sua condução e ao trânsito existente na via/hemifaixa de rodagem em sentido contrário ao seu e por onde já previamente circulava o motociclo conduzido pelo Autor com a matricula ..-..-RV e na traseira deste o motociclo com o número de matricula ..-HL-.. conduzido por HH.
18. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), em acto continuo, perdeu por completo o domínio do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD por si conduzido, provocando que mesmo entrasse em “zigue zague”, se despistasse, se desviasse assim para a sua esquerda e saísse da sua meia faixa de rodagem (mão de trânsito), transpondo dessa forma o eixo da via e a linha longitudinal contínua, e dessa forma, em ato continuo, o veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, invadiu e passou a circular totalmente dentro da metade esquerda da faixa de rodagem contrária aquela que competia à sua mão de trânsito atento o seu sentido de marcha e por onde circulava previamente e em sentido oposto ao seu o motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV e na traseira deste o motociclo matricula ..-HL-.. conduzido por HH.
19. Dessa forma, o veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, repentinamente, invadiu e obstruiu por completo toda a meia faixa de rodagem contrária àquela que competia à sua mão de trânsito atento o seu sentido de marcha (Guimarães/...) e por onde já previamente circulava em sentido contrário ao seu o motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV e na traseira deste o motociclo matricula ..-HL-.. conduzido por HH.
20. O veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, cortou assim por completo a consequente passagem e todo o sentido de marcha (linha de trânsito) do motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV e do motociclo matricula ..-HL-.. conduzido por HH que circulava na traseira do Autor, e acabando o veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, por embater violentamente com toda a sua parte lateral esquerda do meio em toda a parte frontal do motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV.
21. O Autor que, na altura e local supra mencionados no artigo 1.º desta P.I., conduzia o seu motociclo matricula ..-..-RV nos moldes supra, ao avistar o veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, que de uma forma brusca, repentina e inesperada e em acto contínuo invadiu e passou a circular totalmente dentro da sua hemifaixa de rodagem, obstruindo dessa forma por completo toda a sua passagem e todo o seu sentido de marcha (.../Guimarães), não teve assim tempo nem espaço, para evitar a colisão e embate fronto/lateral com o mesmo, designadamente não teve tempo nem espaço sequer para diminuir a sua velocidade, para travar atempadamente ou para se desviar o mais possível para a sua direita junto à berma atento o seu sentido de marcha.
22. O veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, embateu com a sua parte lateral esquerda do meio na parte frontal do motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV, o qual seguia em sentido contrário ao seu e perfeitamente dentro da sua mão de trânsito (hemifaixa de rodagem direita) junto à berma.
23. O embate fronto/lateral entre ambos os veículos (..-..-JD e ..-..-RV), deuse assim totalmente dentro da metade esquerda da faixa de rodagem considerando o sentido de marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC (Guimarães/...) e contrária aquela que competia à sua mão de trânsito e por onde já previamente circulava em sentido contrário ao seu o motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV, mais concretamente a cerca de 1,00 metro de distância da berma esquerda e cerca 2,75 metros de distância do eixo da via, atento o sentido de marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC, a cerca de 6,50 metros de distância da berma direita, atento o sentido de marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC.
24. Ficando nessa mesma metade esquerda da faixa de rodagem atento o sentido de marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC (Guimarães/...), peças, estilhaços, plásticos e vidros partidos de ambos os veículos intervenientes.
25. O motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV, após o supra referido embate fronto/lateral, em acto continuo e mercê da violência do embate frontal que sofreu por parte do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD, foi projetado para a sua traseira numa distancia de cerca de 2,00 metros, ficando imobilizado totalmente dentro da sua hemifaixa de rodagem direita, atento o seu sentido de marcha (.../Guimarães), mais concretamente a uma distância de 1,25 metros da sua roda da frente em relação eixo da via (por referência ao ponto i) mencionado na participação policial do acidente), a uma distancia de 2,00 metros da sua roda da frente em relação ao local do embate (por referência ao ponto H) mencionado na participação policial do acidente) e a uma distancia de 1,80 metros da sua roda traseira em relação ao local do embate (por referência ao ponto G) mencionado na participação policial do acidente).
26. A Estrada Nacional n.º ...01, mais concretamente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., à data e no local onde ocorreu o embate descrito nos presentes autos, tinha uma faixa de rodagem, que em toda a sua largura media cerca de 7,50 metros, dispondo assim cada hemifaixa de rodagem de uma largura de cerca de 3,75 metros.
27. A Estrada Nacional n.º ...01, mais concretamente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., à data e no local onde ocorreu o embate descrito nos presentes autos, atento o sentido de marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD conduzido por CC (Guimarães/...) descrevia uma curva para a sua esquerda tendo o acidente de viação descrito nos presentes autos ocorrido logo a seguir ao fim da curva, dispondo assim o condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC) de reduzida visibilidade em relação ao motociclo conduzido pelo Autor matricula ..-..-RV.
28. À hora e no local onde ocorreu o acidente de viação descrito nos presentes autos, o piso da via da Estrada Nacional n.º ...01 mais concretamente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., encontravase bastante molhado e escorregadio em face da chuva (chuviscos) que na altura se fazia sentir.
29. A Estrada Nacional n.º ...01, na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., à data e no local onde ocorreu o acidente de viação descrito nos presentes autos, encontravase devidamente sinalizada, constituindo uma localidade densamente povoada, com grande tráfego de veículos automóveis e peões, ladeada e marginada de ambos os lados por edificações, com saídas diretas para a mesma, possuindo uma placa indicativa de que se trata de uma localidade.
30. Na Estrada Nacional n.º ...01 mais concretamente na Avenida ..., freguesia ..., concelho ..., distrito ..., à data e no local onde ocorreu o acidente de viação descrito nos presentes autos, a velocidade máxima permitida por lei à data do embate dos autos era de 50 km/hora conforme sinalização vertical existente no local antes do local do embate atento o sentido e marcha do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC) (Guimarães/...).
31. O condutor do veículo segurado na Ré matricula ..-..-JD (CC), devia regular a velocidade que imprimia ao mesmo veículo de modo a que, atendendo às características e estado da via e do veículo por si conduzido, à carga transportada, às condições atmosféricas (chuviscos), à intensidade do trafego e quaisquer outras circunstâncias relevantes, pudesse, em condições de segurança, executar manobras cuja necessidade fosse de prever e, especialmente, fazer parar o veículo no espaço livre e visível à sua frente, o que, não sucedeu.
32. Como consequência direta e necessária do supra descrito acidente de viação, o Autor sofreu múltiplos ferimentos e lesões traumáticas, tendo sido socorrido no local do acidente por uma viatura do INEM e transportado em plano duro e com colar cervical para o SERVIÇO DE URGÊNCIAS DO HOSPITAL DE ... - ESCALA SOCIEDADE GESTORA DO ESTABELECIMENTO, S.A., sito em Sete ..., ..., ... ..., no próprio dia 08052016, onde foi examinado, com o diagnóstico de politraumatizado, apresentando múltiplas lesões traumáticas, designadamente: traumatismo pélvico, traumatismo escrotal, equimose escrotal e hematoma perineal; fratura longitudinal da coluna da vertente paramediana esquerda do corpo e da asa esquerda do corpo e da asa esquerda da sacra, com afetação dos buracos de conjugação entre S1 e S3, com ligeiro afastamento dos bordos; fratura instável da bacia osteoataxia com fixador externo; traumatismo da coluna lombo sagrada; fratura de L1 e L2; 6) anterolistese de L5 (grau I), por lise ístmica bilateral desta vértebra, e fratura isquiopúbica esquerda.
33. O Autor durante o seu internamento no HOSPITAL DE ...- ESCALA SOCIEDADE GESTORA DO ESTABELECIMENTO, S.A., foi operado à bacia com osteotaxia tendolhe sido colocado um fixador externo (o qual manteve cerca de dois meses).
34. O Autor em 16/05/2016 foi transferido para o CENTRO HOSPITALAR ..., E.P.E. sito na Rua ..., ... ..., Guimarães, onde permaneceu até 28/6/2016.
35. O Autor em 28/6/2016 foi transferido para a unidade de convalescença do HOSPITAL ..., sito no Largo ..., ... ..., onde ficou internado até 04/07/2016.
36. O Autor em 04/07/2016 foi transferido para os UNIDADE DOS CUIDADOS CONTINUADOS EM ......, DENOMINADA ... – “ O P...”, FUNDAÇÃO ..., sita no Caminho ... s/n, ... ..., onde ficou internado até 26/07/2016.
37. O Autor em 26/07/2016 passou a ser acompanhado e assistido por conta e a expensas da Ré, tendo sido transferido para o HOSPITAL ..., sito na Alameda ..., ..., ... Guimarães, onde permaneceu até 21/09/2016, começando aí a locomoverse inicialmente com a ajuda uma cadeira de rodas durante cerca de 15 dias, de seguida com ajuda de andarilho durante cerca de uma semana e depois com a ajuda de duas muletas durante cerca de um mês. 51. O Autor em 11/08/2016 foi observado na Especialidade de Ortopedia no CENTRO HOSPITALAR ..., E.P.E. sito na Rua ..., ... ..., Guimarães, tendolhe sido dado alta com indicação de manutenção de fisioterapia.
38. O Autor após a sua alta hospitalar, por conta e a expensas da Ré, continuou a ser acompanhado no HOSPITAL ... em Medicina Física e de Reabilitação durante cerca de um mês e em consultas das Especialidades de Urologia pelo Dr. II, de Psiquiatria pelo Prof. JJ e de Psicologia pela Dra. Dra. KK.
39. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 06/02/2017, foi observado na Especialidade de Ortopedia pelo Dr. LL, o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou o seguinte: “O Senhor AA, sofreu em 08/05/2016 acidente de viação com politraumatismos. Do referido acidente resultou fratura luxação da bacia, de Malgaigne, com fratura da asa esquerda do sacro, fratura de ramos á esquerda e disjunção da sinfise púbica. Foi colocado fixador externo na bacia no HOSPITAL .... Foi posteriormente seguido no HOSPITAL ... em Guimarães, ao cuidado da seguradora. Nesta data apresenta como sequelas do foro Ortopédico, diastase da sínfise púbica e dores em toda a região pélvica. Apresenta também, na sequência do mesmo acidente, disfunção eréctil documentada por Urologia em relatório anexo. Estas sequelas conferemlhe uma incapacidade de 22 pontos, de acordo com a TNI. De considerar um Quantum Doloris de 5 em 7. Me 1105 10 pts, Mb 0501 12 pts.”.
40. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, nos dias 09/11/2017 e 09/03/2018, foi observado na Especialidade de Urologia pelo Dr. MM, com domicilio profissional na Alameda ..., 1º ... Guimarães, o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou o seguinte:
Traumatismo da bacia, pélvico, perineal e coluna sagrada com disfunção eréctil desde a data do acidente compatível com dano neurológico/vascular relacionado com o trauma sofrido.
41. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, em março de 2018, foi observado na Especialidade de Ortopedia pelo Dr. NN, com domicilio profissional na Rua ..., entrada ..., ... ..., o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou o seguinte: disfunção sexual importante e provavelmente irreversível.
42. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 20/03/2018, foi observado na Especialidade de Psiquiatria pelo Dr. OO, com domicilio profissional na Travessa ..., ..., ... – Urb. ..., ... ..., o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou o seguinte: “OO, médico psiquiatra com a cédula profissional nº ...91, atesta sob compromisso de honra que AA, de 51 anos de idade, Divorciado, com a profissão de Técnico de manutenção de maquinas industrias com Cartão de Cidadão nº ..., com validade até 15 de Julho de 2019, recorreu à sua consulta devido a queixas psiquiátricas que surgiram após acidente de viação ocorrido a 8 de Maio de 2016, do qual resultou fraturas múltiplas da bacia, sacro, ramo esquerdo ilíaco e cóccix tendo sido submetido a osteotaxia. O doente apresenta desde essa data Humor francamente depressivo, manifestando significativa baixa autoestima, com sentimentos de inferioridade, disfunção eréctil, queixas urinárias de esvaziamento e urgência, medo acentuado, ansiedade, dificuldade em adormecer ou em permanecer a dormir, sonhos assustadores, forte malestar psicológico com períodos de desesperança frequentes em que há irritabilidade e agressividade. Manifesta dificuldade para realizar tarefas quotidianas, e incapacidade em realiza r esforços a que a sua profissão obriga. Tratase de um quadro psiquiátrico em que há perturbações funcionais importantes, com acentuada modificação do nível da eficiência pessoal ou profissional do indivíduo. Na Tabela Nacional de Avaliação de Incapacidades permanentes corresponde ao Grau IV com a valorização de 0,50 pontos percentuais”.
43. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 10/05/2018, foi observado na Especialidade de Neurocirurgia pelo Dr. PP, com domicilio profissional no HOSPITAL ..., sito na Alameda ..., ..., ... Guimarães, o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou o seguinte: “O Sr. AA, sofreu um acidente de viação grave, há 2 anos, dia 8 de Maio de 2016, de que resultou fratura da bacia e do sacro à esquerda, atingindo os buracos de S1 e S3 esquerdos. Teve necessidade de ser feita fixação da bacia urgente e esteve em choque hipovolémico. Atualmente tem uma marcha claudicante à custa do membro inferior esquerdo, por alteração da estabilidade proximal. Refere uma dor diária, localizada à articulação sacroiliaca esquerda. Tem a sensação de instabilidade na bacia. Refere também alterações nos esfincteres, e sem ereção. Foi observado por Urologia. O exame objetivo mostrou uma marcha claudicante mecânica, e por dor centrada ao sacro à esquerda. Ponto doloroso no sacro à esquerda. Limitação motora na elevação da coxa esquerda, grau III em V, referindo dor na região inguinal e nádega esquerda. Limitação dolorosa ao testar a articulação coxofemural esquerda. Sem laségue. Reflexos presentes e simétricos exceto rotuliano esquerdo abolido. TC bacia (Maio de 2018) Fractura não consolidada da asa do sacro esquerda. Diástase da sinfise púbica. Presença de ismolisis em L5S1 com espondilolistesis grau 1. Neste momento sem clínica de L5. O doente apresenta sequelas nervosas do plexo sagrado que lhe condicionam alterações esfincterianas e sexuais importantes. Mantém sintomatologia de instabilidade do complexo da bacia e sacro à esquerda , com confirmação da não consolidação da fratura do sacro em TC. A alteração verificada na transição lombosagrada, liseistímica de L5, com espondilolistesis grau de L5S1, neste momento sem sinais de compressão radicular de L5. O doente, neste momento, não se encontra em condições físicas para o exercício da sua atividade profissional”.
44. A Ré em consequência das lesões sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, atribuiu alta clinica ao Autor em 06/02/2017, data a partir da qual deixou de proceder ao pagamento de adiantamentos salariais ao Autor.
45. As lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, atingiram a consolidação médicolegal em 18/06/2018, com Incapacidade Permanente Absoluta para a sua Profissão Habitual (IPAPH) de “Técnico Manutenção de 2ª”.
46. O Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas sofridas com o acidente de viação descrito nos presentes autos, no dia 04072018, foi observado e submetido a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil e a uma Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito do Trabalho realizada pelo Dr. FF, Médico Especialista em Medicina do Trabalho e Perito em Avaliação do Dano Corporal pós traumático pelo INML – ..., com domicílio profissional na clinica “C...-CENTRO MÉDICO DE ..., LDA”, sita na Rua ..., ..., ... ..., o qual em consequência do acidente de viação em discussão nos presentes autos lhe diagnosticou: A data da consolidação MédicoLegal das lesões é fixável em 8/2/2017; Período de Défice funcional Temporário Total fixável em 136 dias; Período de Défice Funcional Temporário Parcial fixável em 141 dias; Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total fixável em 277 dias; Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 35 pontos; Incapacidade permanente parcial fixável em 72.465 %; As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, incompatíveis com o exercício da actividade habitual; O sinistrado está Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH); Quantum Dolóris fixável no grau 6/7; Dano Estético Permanente fixável em grau 4/7; Repercussão nas actividades de Desporto e de Lazer/Prejuízo de Afirmação Pessoal fixável em grau 3/7; Prejuízo Sexual fixável em grau 6/7.
47. O Autor apesar dos vários internamentos hospitalares, das intervenções cirúrgicas, das várias consultas médicas nas especialidades de Ortopedia, Urologia, Psiquiatria, Psicologia, Fisiatria, Medicina Física e de Reabilitação, das várias sessões de Fisioterapia, da ajuda medicamentosa e dos vários tratamentos a que se submeteu, ficou a padecer definitivamente e em função das lesões politraumáticas sofridas com o acidente de viação melhor descrito nos autos, das seguintes queixas (a nível funcional e situacional), lesões e sequelas atuais, permanentes e irreversíveis: Queixas a nível funcional: a) Postura, deslocamentos e transferências: Não consegue ajoelharse; b) Sexualidade e procriação: Disfunção eréctil, não controlada com c) Controlo de esfíncteres: Incontinência urinária; Fenómenos dolorosos: Anca dolorosa; Dores na bacia; Lombalgias; Queixas a nível situacional: Actos da vida diária: Dificuldade a subir e descer escadas; Vida afectiva, social e familiar: Perturbação na vida íntima, pela disfunção eréctil; Sentese deprimido, pela alteração da sua vida de relação, e também revive penosamente o acidente; Perturbações do sono; (necessita de sedativos diariamente LORAZEPAM 2.5). Humor depressivo; Significativa baixa autoestima, com sentimentos de inferioridade, disfunção eréctil, queixas urinárias de esvaziamento e urgência, medo acentuado, ansiedade, dificuldade em adormecer ou em permanecer a dormir, sonhos assustadores, forte malestar psicológico com períodos de desesperança frequentes em que há irritabilidade e agressividade. c) Vida profissional ou de formação: Não voltou a trabalhar desde o acidente; A entidade patronal despediuo, aliás, por não conseguir aguentar o esforço indispensável à realização dos trabalhos inerentes à sua profissão; 3. Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento: O Examinando é dextro e apresenta marcha claudicante. Abdómen: Três cicatrizes, respectivamente de 3,3.1 e 2 cm na zona ilíaca direita e outra de 3 cm na zona ilíaca esquerda; Membro inferior esquerdo: Rigidez da anca esquerda, com flexão limitada a 90º; Limitação nos últimos graus da rotação externa, apenas possível com dor intensa; A instabilidade da marcha devese à instabilidade por diástase da sínfise púbica, conforme relatório de Ortopedia atrás citado.
48. (Eliminado)
49. O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
50. (Eliminado)
51. O autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, regularizador do sono, injeção intracavernosa com prostaglandina e analgésicos - para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
52. (Eliminado)
53. Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas atuais e permanentes causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor, padece atualmente de: Um Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 31 pontos; As sequelas supra descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, impeditivas e incompatíveis com o exercício da sua actividade profissional habitual; O Autor está Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH).
53.A -  Entre a data do evento – 08/05/2016 - e a data da consolidação das lesões – 18/06/2018 – o quantum doloris, ou seja, o sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo A. é fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.
53.B – O dano estético permanente na pessoa do A.  é fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a claudicação da marcha, a utilização de ajudas técnicas e as cicatrizes.
53.C – A Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer é fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta o abandono da prática de ciclismo de lazer e futsal com amigos.
53.D - Em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, o A. viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social:
- de forma total, correspondendo a períodos de internamento e/ou de repouso absoluto, entre 08/05/2016 e 21/09/2016, sendo assim fixável num período de 137 dias ( Défice funcional temporário total);
- de forma parcial, correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização daqueles actos, ainda que com limitações, entre 22/09/2016 e 18/0672018, sendo assim fixável num período 635 dias ( défice funcional temporário parcial).
53.E - Em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos inerentes à sua actividade profissional habitual de forma total, entre 08/05/2016 e 18/06/2018, sendo assim fixável num período total de 772 dias (Repercussão Temporária na Actividade profissional).
54. As sequelas supra descritas de que o Autor é portador, em termos de rebate profissional impedem, limitam e implicam incapacidade e esforços suplementares das suas tarefas diárias, sejam atividades domésticas, laborais (atualmente incompatíveis com o exercício da habitual atividade profissional do Autor à data do acidente de “Técnico Manutenção de 2ª”), recreativas, sociais ou sentimentais que exijam boa mobilidade, força, resistência ao esforço e velocidade dos membros inferiores e superiores e que sejam predominantemente efetuadas de pé, manualmente e sentado.
55. Na medida em que, o Autor, perdeu parcial ou totalmente tais qualidades físicas em consequência das queixas, lesões e sequelas físicas decorrentes dos ferimentos sofridos em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor atualmente e diariamente, necessita de forma irreversível de descansar por vários períodos de tempo já que não consegue manterse muito tempo de pé por períodos superiores a 30 minutos.
56. O Autor à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos exercia por conta de outrem, a categoria profissional de “Técnico Manutenção de 2ª” na firma denominada “X - COMPONENTES PARA INDUSTRIA AUTOMOVEL S.A.”, sita na ... à Rua ..., ... ..., concelho ....
57. O Autor à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, pelo exercício da sua categoria profissional de “Técnico Manutenção de 2ª” auferia uma retribuição mensal de €870,04 (oitocentos e setenta euros e quatro cêntimos) discriminado da seguinte forma: 1) 570,00€ x 14 meses/ano a titulo de vencimento base mensal, 2) ….7,60€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação lanche, 3) 125,02€ X11 meses/ano a titulo de hora extra, 4) ..93,94€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação (isento), 5) ..47,08€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação (sujeito), 6) ..26,40€ X11 meses/ano a titulo de horas noturnas.
58. O Autor à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, auferia assim uma retribuição anual ilíquida na ordem dos €11.280,44 (Onze Mil Duzentos e Oitenta Euros e Quarenta e Quatro Cêntimos) (€570,00 X 14 meses/ano + €7,60 X 11 meses/ano +€125,02 X 11 meses/ano + €93,94 X 11 meses/ano + €47,08 X 11 meses/ano + €26,40 X 11 meses/ano = €11.280,44).
59. O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, teve necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, a varias intervenções cirúrgicas, de recorrer a consultas médicas de várias especialidades, de se submeter a várias sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos, nas quais despendeu, até à presente data, a quantia de €1.955,22, tendo a Ré até à presente data procedido a um adiantamento no valor de €1.500,00.
60. ( Eliminado)
61. O Autor em consequência das supra referidas lesões traumáticas sofridas em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, sofreu múltiplas, frequentes e intensas dores durante todo o tempo que mediou entre o acidente de viação descrito nos presentes autos, os vários internamentos hospitalares, as várias intervenções cirúrgicas, os vários tratamentos médicos, os vários tratamentos clínicos, a recuperação funcional a que foi submetido, todos eles bastante dolorosos, o seu período de convalescença, a sua alta hospitalar e médica, os períodos de incapacidade temporária absoluta e parcial e a sua recuperação ainda que parcial.
62. O Autor na altura do acidente sofreu angústia de poder a vir a falecer.
63. O Autor esteve vários meses acamado nos vários hospitais em que esteve internado, com fixadores colocados na bacia durante cerca de dois meses, sem se poder locomover sozinho, necessitando de ajuda de terceira pessoa para satisfazer as suas necessidades básicas e fisiológicas mais elementares, tais como tomar banho, comer, beber e ir à casa de banho.
64. O Autor quando tomou conhecimento da sua situação clínica, enquanto estava internado, teve receio de nunca mais andar.
65. Embora não tão intensas, o Autor, em virtude das sequelas de que ficou a padecer atualmente, tem continuado e continuará a sofrer no futuro, de fortes dores físicas, incómodos e malestar durante o resto da sua vida, designadamente a nível da anca, bacia e região lombar.
66. As quais se exacerbam e agravam com as mudanças de temperatura e com os esforços e que o Autor até à data do acidente de viação descrito nos presentes autos não sentia.
67. O Autor por vezes tem dificuldades em dormir com as referidas dores a nível da anca, bacia e região lombar.
68. O Autor, antes e à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, sendo uma pessoa saudável, dinâmica, expedita, diligente e trabalhadora.
69. Era também uma pessoa alegre, confiante, cheia de projetos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade e alegria de viver, sendo uma pessoa calma, amante da vida, confiante, detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas.
70. O Autor, atualmente e desde a data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas atuais e permanentes de que a mesma padece tornouse uma pessoa triste, infeliz, introvertida, abalada psiquicamente, introvertida, fechada, deprimida, angustiada, sofredora, triste, insegura, muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore, desgostosa da vida e está constantemente a pensar nos seus problemas e limitações.
71. Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afetivas.
72. O Autor após o acidente ficou a padecer de várias queixas, lesões e sequelas, as quais o irão acompanhar e afectar o resto da sua vida.
73. O Autor está assim consciente das suas limitações, sentindose inibido e diminuído fisicamente e esteticamente.
74. Em consequência das lesões causadas pelo acidente de viação descrito nos autos, o A. ficou a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite relações sexuais naturais e espontâneas, só lhe sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, tudo com repercussão na actividade sexual do A. de 5 numa escala de 7.
75. O que causa um grande desgosto, sofrimento e revolta ao Autor.
76. O Autor antes do acidente tinha uma vida sexual normal e feliz com a sua companheira.
77. O que contribuía bastante para a estabilidade emocional do casal.
78. Agora, o Autor, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias relações sexuais naturais e espontâneas com a sua companheira, só podendo ter relações sexuais fazendo aquele injeção intracavernosa com prostaglandina.
79. A Autora BB e o Autor AA, à data da ocorrência do acidente de viação mortal descrito nos autos (08/05/2016) já viviam um com o outro em união de facto (condições análogas às dos cônjuges e como se fossem casados, partilhando cama mesa e habitação) de forma ininterrupta há cerca de 6 (seis) anos.
80. Agora o marido da Autora, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias relações sexuais naturais e espontâneas com a Autora, só podendo ter relações sexuais mediante injeção intracavernosa com prostaglandina.
81. Os AA casaram em ....
82. Devido ao facto de o A. ter ficado a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite ao mesmo ter relações sexuais naturais e espontâneas, só sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, o mesmo passou a ser acometido de um sentimento de ciúme em relação à sua mulher/companheira e aqui Autora, o que se traduz em discussões.
83.A Autora BB à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 49 (quarenta e nove) anos de idade, já que nasceu em .../.../1967.
84. A Autora BB no dia do acidente e nos dias que se seguiram à ocorrência do mesmo, sofreu um enorme susto e receou pela vida do seu marido AA.
85. A Autora BB, na sequência do acidente de viação de que foi vítima o seu marido AA, prestou-lhe toda a assistência possível e necessária, material e emocional.
86. A Autora BB a fê-lo quando acompanhou o seu marido AA, em todos os internamentos, consultas médicas, tratamentos e cirurgias a que foi submetido.
87. A Autora encontra-se angustiada com a situação do seu marido.
88. O facto de não poder ter relações sexuais naturais e espontâneas com o marido, causa-lhe um grande desgosto, sofrimento.
89. A 09/06/2016 a Ré enviou ao mandatário do A. o email junto com a PI sob o doc. ...0, cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido, nomeadamente com o seguinte teor:
“Informamos V. Exa que estamos a assumir a responsabilidade pelo sinistro, pelo que nesta fase é importante desde já acompanharmos a evolução da situação clínica do sinistrado, sendo imprescindível que nos faça chegar os relatórios médicos e a informação clínica acerca das lesões sofridas pelo sinistrado para análise da nossa Assessoria Clínica.
Por outro lado, solicitamos que V. Exa nos informe do local para onde o sinistrado irá ser reencaminhado pelo Hospital ... e em que data para que possamos marcar uma consulta domiciliária de avaliação do dano corporal.
Caso a alta não esteja para breve, solicitamos igualmente que nos informe em que cama do Serviço de Ortopedia se encontra o sinistrado para podermos marcar a consulta domiciliária.”
90. A 05/07/2018 o A., através do seu mandatário, enviou á Ré, que o recebeu, o e-mail junto com a petição inicial sob o doc. ...3, cujo teor, dada a sua extensão, se dá aqui por reproduzido, e-mail em que apresenta um pedido de indemnização civil pelos danos sofridos em consequência do embate dos autos, elencando os diversos danos sofridos, e-mail acompanhado de cópia dos Relatórios de Avaliação do dano Corporal em Direito Civil e em Direito do Trabalho que constituem os doc .s 21 e 22 juntos com a PI e do recibo de vencimento de Abril de 2016
91. Até á data da propositura da acção, a Ré nunca apresentou ao A. qualquer proposta de indemnização.
92. A F... - Companhia de Seguros já entregou ao autor, por conta da futura indemnização a pagar, a quantia de € 20.000,00 (vinte mil euros).
93. A 02/07/2018 o médico da Ré elaborou o Relatório Final de Avaliação do Dano Corporal que constitui o documento n.º ... junto com a contestação, o qual contem uma parte relativa à história do evento, com dados documentais, uma parte relativa ao estado actual, ao exame objectivo, á discussão, com referência ao nexo de causalidade, data da consolidação, danos temporários e permanentes sofridos pelo A. e Conclusões.
94. No âmbito dos danos permanentes o referido Relatório refere: “Repercussão permanente na Actividade Profissional: pode manter a sua actividade profissional habitual, mas com esforços acrescidos.”
*
Factos não Provados:

a) É previsível que o Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica (DFPIFP) e a Incapacidade Permanente Parcial (IPP) se venham a agravar com o decurso dos anos, durante toda a sua vida tornando mais penoso o desempenho das suas tarefas diárias, sejam atividades domésticas, laborais, recreativas, sociais ou sentimentais.
b) O Autor, em data anterior a 1985, já tinha sofrido em acidente em virtude do qual teve a necessidade de realizar um enxerto ósseo no fémur esquerdo.
c) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de efetuar vários exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões, queixas e sequelas supra melhor descritas.
d) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Ortopedia, Consulta da Dor Crónica, Psiquiatria, Medicina Física e Reabilitação, Neurologia, Neurocirurgia, Neurocirurgia Funcional e Cirurgia Plástica para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
e) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de realizar tratamento fisiátrico (pelo menos duas vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões) para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
f) O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ansiolíticos e antiinflamatórios, para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
g) O Autor terá necessidade no futuro de se submeter a várias intervenções cirúrgicas e plásticas, a vários internamentos hospitalares, de efetuar várias despesas hospitalares, de efetuar a vários tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, de efetuar várias deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas melhor descritas.
h) Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas atuais e permanentes causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor, padece atualmente de uma Incapacidade Permanente Parcial (IPP) fixável em 72.465 %.
i) O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, tem e terá necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, a varias intervenções cirúrgicas, de recorrer a consultas médicas de várias especialidades, de se submeter a várias sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos.
j) O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, teve (e ainda tem e terá) necessidade de efetuar várias deslocações em táxi, transporte público e transporte próprio a hospitais e a clinicas, nas quais despendeu, até à presente data, uma quantia, ainda não paga pela Ré, em montante não concretamente apurado.

5. Direito

5.1. Pressupostos da responsabilidade por facto ilícito

Dispõe o artigo 483º do Código Civil que, "aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem...fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação".

Os pressupostos da responsabilidade civil extra contratual por factos ilícitos (que devem, ser alegados e provados pelo lesado como constitutivos do direito de que se arroga, conforme resulta do disposto no n.º 1 do art.º 342º do Código Civil) são ( segue-se a sistematização de Antunes Varela, in Das obrigações em geral, I, 6ª edição, pág. 494 e segs.):

a) Um facto voluntário do lesante, ou seja, um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana e que, em regra, consiste num acto, numa acção, mas que também pode ser uma omissão, não tendo de ser um acto predeterminado, uma acção ou omissão orientada para certo fim.
Face às regras de experiência comum, o acto de condução de viaturas é um acto voluntário, no sentido em que os actos em que se materializa essa condução são manifestações, expressão, resultado da vontade do condutor.
Só não será assim se intervier um facto anormal, excepcional, desligado dessa vontade ou, dito de outra forma, se se provar que no acto da condução se intrometeu algum evento fortuito ou caso de força maior, natural ou imputável a terceiro, ou súbita avaria mecânica, que conduz à conduta violadora - Ac. STJ, 20.12.90, BMJ, 402, 559.
b) A ilicitude desse facto ou sua antijuridicidade, sob a forma de violação de um direito subjectivo de outrem – nomeadamente, direitos de personalidade - ou de violação de disposição legal destinada a proteger interesses alheios, sem que existam causas exclusão ou de justificação para tal.
Na primeira modalidade de ilicitude do art.º 483º estão abrangidos os direitos sobre os bens jurídicos pessoais como a vida, corpo, saúde, liberdade, os direitos de personalidade em geral (art.º 70º n.º 2 do CC).
A ilicitude da violação de um direito sobre bens jurídicos pessoais pode ser afastada quando o facto do lesante é praticado no exercício regular de um direito, no cumprimento de um dever, em acção directa (art.º 336º do CC), em legitima defesa ( art.º 337º CC) ou com consentimento do lesado ( art.º 340º do CC).
c) O nexo de imputação (culposa) do facto ao lesante, ou seja, para que o facto ilícito gere responsabilidade, é necessário que o agente tenha agido com culpa.
Agir com culpa significa actuar em termos de a conduta do agente merecer a reprovação ou censura do direito. E a conduta do lesante é reprovável quando, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, se concluir que ele podia e devia ter agido de outro modo. É um juízo que assenta num nexo existente entre o facto e a vontade do agente e pode revestir duas formas: dolo ou negligência, a apreciar nos termos do artigo 487º do Código Civil;
d) O dano ou prejuízo que consiste em «toda a ofensa de bens ou interesses protegidos pela ordem jurídica; e,
e) Um nexo de causalidade (adequada) entre o facto ilícito e o dano, ou seja, o facto será causa adequada do dano, sempre que este constitua uma consequência normal ou típica daquele, ou seja, sempre que verificado o facto, se possa prever o dano como consequência natural ou como um efeito provável dessa verificação – é a formulação positiva da teoria da causalidade adequada.

A sentença recorrida considerou verificados os pressupostos da responsabilidade civil por facto ilícito e o dever da Ré F... - Companhia de Seguros de indemnizar, quer porque para ela, mediante um acordo de seguro, foi transferida a responsabilidade civil emergente de acidentes de viação em que fosse interveniente o veículo ligeiro de passageiros matrícula ..-..-JD, quer porque a mesma assumiu o dever de indemnizar, sem discutir a culpa do condutor do citado veículo na ocorrência do sinistro.

Em nenhum dos recursos interpostos vem colocada em crise a verificação de tais pressupostos ou o dever da Ré, em geral, de indemnizar, ainda que em concreto estejam questionados alguns valores da indemnização e o dever da Ré de indemnizar a A. BB.

5.2. Dos danos

As questões remanescentes são relativas aos danos.
No entanto e antes de apreciá-las, e a fim de evitar repetições, impõe-se um breve enquadramento jurídico.

O dano, em termos naturalísticos será a supressão e uma vantagem de que o sujeito beneficiava.
Mas para efeitos indemnizatórios apenas relevam as vantagens juridicamente tuteladas.          
Nesta medida, o conceito de dano não pode ser naturalístico, mas jurídico ou normativo.
E assim temos que o dano é a frustração de uma utilidade que era objecto de tutela jurídica (Luís Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, I, 12ª edição, pág. 297).

Depois são várias as classificações de dano.

Assim, distingue-se:

- danos directos – os efeitos imediatos do facto ilícito ou a perda directa causada nos bens ou valores juridicamente tutelados - dos danos indirectos – as consequências mediatas ou remotas do dano directo (Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, I, 6ª Edição, 1989, 567);
- danos em coisas e danos em pessoas (nos autos estão essencialmente em causa danos pessoais, pelo que os analisaremos, de forma detida, adiante);
- dano real e dano patrimonial (cfr. Antunes Varela, in Das Obrigações em Geral, I, 6ª Edição, 1989, 568 e Luís Menezes Leitão, in Direito das Obrigações, I, 12ª edição, pág. 297-298) - o dano real corresponde à avaliação em abstracto das utilidades que eram objecto de tutela jurídica o que implica a sua indemnização através da reparação do objecto lesado (restauração natural) ou da entrega de outro equivalente (indemnização especifica) e o dano patrimonial como o que corresponde à avaliação concreta da lesão no âmbito do património do lesado, em virtude da lesão é o reflexo do dano real sobre a situação patrimonial do lesado, corresponde á avaliação dos efeitos da lesão no âmbito do património do lesado;
- dano patrimonial e dano não patrimonial, que se distinguem pela possibilidade de no primeiro caso, ser e no segundo caso, não ser susceptível de avaliação pecuniária (como refere Carneiro da Frada in Direito Civil – Responsabilidade Civil – o Método do caso, pág. 91, a distinção entre danos patrimoniais e não patrimoniais não tem a ver com a natureza do bem ou do interesse primariamente atingido, mas sim com a possibilidade de avaliação pecuniária);
- no dano patrimonial cabe (art.º 564º n.º 1 do CC) não só o dano emergente – corresponde á frustração de uma utilidade que já se tinha adquirido - as despesas com médicos, internamentos, os custos de reconstituição ou recuperação – operações, próteses, tratamentos - como o lucro cessante – frustração de uma utilidade que o lesado iria adquirir se não fosse a lesão;
- danos presentes – já estão verificados - e danos futuros – têm uma vertente temporal – projectam-se no futuro, são efeitos do facto que só com o passar do tempo se revelarão – e uma vertente qualitativa – tanto são danos patrimoniais emergentes (por exemplo, uma futura operação cirúrgica) como lucros cessantes ( os ganhos que pudessem resultar da hipotética manutenção de uma situação produtora de ganhos durante um  tempo mais ou menos longo ).

Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior – art.º 564º n.º 2, 2ª parte do CC  e 661º n.º 2 do CPC.

No entanto, se se tratar de um dano futuro cujo valor seja insusceptível de ser determinado mediante decisão ulterior de liquidação, deve o mesmo ser fixado equitativamente, nos termos do disposto no art.º 566º n.º 3 do CC.

5.2.1. Dos danos na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa
Cabe agora enquadrar juridicamente os danos pessoais.
 
Um evento estradal, como seja o embate entre veículos ou de um veículo num peão, ou, como foi o caso, o embate de um veículo ligeiro de passageiros num motociclista, é susceptível de causar dano (entendido como dano real, primário, in natura) na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa.
A integridade moral e física das pessoas e, por inerência, a saúde (que é um estado de bem estar e equilíbrio físico-psíquico) é objecto de tutela constitucional (art.º 25º da CRP) e infra-constitucional, já que nos termos do art.º 70º n.º 1 do CC a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita á sua personalidade física ou moral e, estando em causa direitos absolutos, aquele que os violar, ficar obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação – art.º 483º do CC.

Esse dano (dano real, primário, in natura) na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa pode gerar consequências de diversa natureza:  patrimoniais e não patrimoniais, presentes e futuras, emergentes e lucros cessantes.

Só em função da concreta situação em apreciação é que se poderá afirmar que tipo de consequências se verificam.

Neste sentido o Ac. do STJ de 28/01/2016, proc. 7793/09.8T2SNT.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, considera que o dano biológico é um dano real, que não deve qualificar-se como patrimonial ou não patrimonial; as consequências que o mesmo produz é que podem ser de um ou de outro tipo.

E o Ac. do STJ de 02/06/2016 processo 2603/10.6TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, refere-se: “(…) a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais suscetíveis de avaliação pecuniária.”

E também o Ac. do STJ de 16/06/2016, proc. 1364/06.8TBBCL.G1.S2., consultável in www.dgsi.pt/jstj:
I. O dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis.

Os Relatórios do INML... decompõem essas consequências através de várias categorias, separando-as de acordo com a dicotomia temporário/ definitivo nos seguintes termos:

- do ponto de vista temporário consideram:
i) o défice funcional temporário (corresponde ao período durante o qual a vítima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos atos correntes da vida diária, familiar e social, excluindo-se aqui a repercussão na atividade profissional), o qual pode ser total ou parcial;
ii) a Repercussão Temporária na Atividade Profissional (correspondendo ao período durante o qual a vítima, em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, viu condicionada a sua autonomia na realização dos atos inerentes à sua atividade profissional habitual), que pode ser total ou parcial;
iii) o Quantum doloris (corresponde à valoração do sofrimento físico e psíquico vivenciado pela vítima durante o período de danos temporários, isto é, entre a data do evento e a cura ou consolidação das lesões);
- do ponto de vista definitivo consideram:
i) o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica (refere-se à afetação definitiva da integridade física elou psíquica da pessoa, com repercussão nas atividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, e sendo independente das atividades profissionais, corresponde ao dano que vinha sendo tradicionalmente designado por Incapacidade Permanente Geral - nomeadamente no Anexo II do Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro, e referido na Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, como dano biológico);
ii) a Repercussão Permanente na Atividade Profissional (corresponde ao rebate das sequelas no exercício da atividade profissional habitual da vítima - atividade à data do evento, isto é, na sua vida laboral, para utilizar a expressão usada na Portaria n.º 377/2008, de 26 de maio, tratando-se do parâmetro de dano anteriormente designado por Rebate profissional);
iii) Dano Estético Permanente (corresponde à repercussão das sequelas, numa perspetiva estática e dinâmica, envolvendo uma avaliação personalizada da afetação da imagem da vítima quer em relação a si próprio, quer perante os outros);
iv) Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer (corresponde à impossibilidade estrita e específica para a vítima de se dedicar a certas atividades lúdicas  de lazer e de convívio social, que exercia de forma regular e que para ela representavam um amplo e manifesto espaço de realização e gratificação pessoal, não estando aqui em causa intenções ou projetos futuros, mas sim atividades comprovadamente exercidas previamente ao evento traumático em causa e cuja prática e vivência assumia uma dimensão e dignidade suscetível de merecer a tutela do Direito, dentro do princípio da reparação integral dos danos; trata-se do dano anteriormente designado por Prejuízo de Afirmação Pessoal);
v) Repercussão Permanente na Atividade Sexual (correspondendo à limitação total ou parcial do nível de desempenho/gratificação de natureza sexual, decorrente das sequelas físicas e/ou psíquicas, não se incluindo aqui os aspetos relacionados com a capacidade de procriação; trata-se do dano anteriormente designado por Prejuízo Sexual) fixável no grau 4, com base no abandono da prática de relações sexuais pelo sentimento de fealdade em relação às cicatrizes e pelas dores constantes.
vi) Dependências Permanentes de Ajudas:
- Ajudas medicamentosas (correspondem à necessidade permanente de recurso a medicação regular - ex.: analgésicos, antiespasmódicos ou antiepiléticos, sem a qual a vítima não conseguirá ultrapassar as suas dificuldades em termos funcionais e nas situações da vida diária);
- Tratamentos médicos regulares (correspondem à necessidade de recurso regular a tratamentos médicos para evitar um retrocesso ou agravamento das sequelas - ex.: fisioterapia);
- Ajudas técnicas (referem-se à necessidade permanente de recurso a tecnologia para prevenir, compensar, atenuar ou neutralizar o dano pessoal - do ponto de vista anatómico, funcional e situacional com vista à obtenção da maior autonomia e independência possíveis nas atividades da vida diária; podem tratar-se de ajudas técnicas lesionais, funcionais ou situacionais);
- Ajuda de terceira pessoa (corresponde à ajuda humana apropriada à vítima que se tornou dependente, como complemento ou substituição na realização de uma determinada função ou situação de vida diária).

A Portaria n.º 377/08, de 26/05, alterada pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho, partindo da mesma realidade – existência de danos corporais – e distinguindo danos patrimoniais e não patrimoniais, refere-se a várias categorias.

Porém, o tribunal não está sujeito às qualificações legais, ou seja, o facto de a Portaria qualificar como dano patrimonial uma realidade, não significa que o tribunal esteja sujeito a essa qualificação.

Como foi referido, o dano in natura da integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa pode gerar diversos tipos de danos/consequência que, tendo em consideração as diversas categorias jurídicas de danos já supra referidas (danos patrimoniais e não patrimoniais; danos emergentes e lucros cessantes; danos presentes e futuros), podem ser agrupadas da seguinte forma:
a) danos patrimoniais presentes / lucros cessantes: as eventuais perdas salariais decorrentes do que no Relatório do INML... aparece referido como Repercussão Temporária na Atividade Profissional e que cessa com a consolidação das sequelas;
b) danos patrimoniais presentes / emergentes: despesas com medicamentos, tratamentos, consultas, meios complementares de diagnóstico, internamento hospitalar, transportes, ajuda de terceira pessoa;
c) danos patrimoniais futuros (lucros cessantes)

Impõe-se aqui algum desenvolvimento.

O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica pode ter como consequência, também, um dano patrimonial futuro, indemnizável de forma autónoma dos demais danos, mas prevenindo qualquer sobreposição, sob pena de enriquecimento, quando se verifique que as sequelas:

a) são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual do lesado e bem assim qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional;
b) são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual do lesado, mas são compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico-profissional, desde que devidamente identificadas;
c) não são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual do lesado, mas acarretam esforços suplementares para desenvolver a actividade profissional habitual.      

Assim:
- o Ac. do STJ de 10/10/2012, processo 632/2001.G1.S1 :” No caso dos autos, não oferece dúvida que a indemnização a arbitrar pelo dano biológico sofrido pela lesada - consubstanciado em limitações funcionais relevantes e sequelas psíquicas graves - deverá compensá-lo – para além da presumida perda de rendimentos, associada àquele grau de incapacidade permanente - também da inerente perda de capacidades, mesmo que esta não esteja imediata e totalmente reflectida no nível de rendimento auferido.
É que a compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou reconversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas.
Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais – mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades exercício profissional e de escolha e evolução na profissão , eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável - e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição, - erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos  lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais”

E no Ac. do STJ de 02/06/2016 processo 2603/10.6TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, refere-se: “(…) a lesão corporal sofrida em consequência de um acidente de viação constitui em si um dano real ou dano-evento, designado por dano biológico, na medida em que afeta a integridade físico-psíquica do lesado, traduzindo-se em ofensa do seu bem “saúde”. Trata-se de um “dano primário”, do qual podem derivar, além das incidências negativas não suscetíveis de avaliação pecuniária, a perda ou diminuição da capacidade do lesado para o exercício de atividades económicas, como tais suscetíveis de avaliação pecuniária.
Como é sabido, os nossos tribunais, com particular destaque para a jurisprudência do STJ, têm vindo a reconhecer o dano biológico como dano patrimonial, na vertente de lucros cessantes, na medida em que respeita a incapacidade funcional, ainda que esta não impeça o lesado de trabalhar e que dela não resulte perda de vencimento, uma vez que a força de trabalho humano sempre é fonte de rendimentos, sendo que tal incapacidade obriga a um maior esforço para manter o nível de rendimento anteriormente auferido. E que, em sede de rendimentos frustrados, a indemnização deverá ser arbitrada equitativamente, de modo a corresponder a um capital produtor do rendimento que o lesado não irá auferir, que se extinga no fim da sua vida provável e que é suscetível de garantir, durante essa vida, o rendimento frustrado.
(…)
Assim, a este propósito podem projetar-se em duas vertentes:   
- por um lado, a perda total ou parcial da capacidade do lesado para o exercício da sua atividade profissional habitual ou específica, durante o período previsível dessa atividade, e consequentemente dos rendimentos que dela poderia auferir;
- por outro lado, a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expetável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual.
Em suma, o dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas atividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis. “

- o Ac. do STJ de 29/10/2019 processo 683/11.6TBPDL.L1.S2 onde se afirma: ”O relevo indemnizatório d[a] “perda” [da capacidade de ganho]” (como dano patrimonial) tem sido tipicamente absorvido, (…), na autonomização (nomeadamente de responsabilidade jurisprudencial) do chamado “dano biológico” ou “corporal”, enquanto lesão da saúde e da integridade psico-somática da pessoa, imputável ao facto gerador de responsabilidade civil delitual e traduzida em incapacidade funcional limitativa e restritiva das suas qualidades físicas e intelectuais de vida. Como se tem feito entendimento neste STJ, não se trata de uma espécie de danos que se configure como um tertium genus na dicotomia danos patrimoniais vs danos não patrimoniais; antes permite delimitar e avaliar os efeitos dessa lesão – em função da sua natureza, conteúdo e consequências, tendo em conta os componentes de dano real – enquanto dano patrimonial (por terem por objecto um interesse privado susceptível de avaliação pecuniária), por um lado, ou dano moral ou não patrimonial (por incidirem sobre bem ou interesse insusceptível, em rigor, dessa avaliação pecuniária e plasmando-se, como utilidade essencial, na clarificação de danos “para além das dores e do sofrimento”

Quando a vertente patrimonial do dano biológico se convoca, tem a virtualidade de ressarcir não só (i) as perdas de rendimentos profissionais correspondentes à impossibilidade de exercício laboral e/ou económico-empresarial e as frustrações de proveitos existentes à data da lesão (ponderadas até um certo momento de vida activa), mas também (ii) a privação de futuras oportunidades profissionais e o esforço acrescido de reconversão (enquanto determinado pela incapacidade resultante da lesão) para o exercício profissional (…) – num caso e noutro, danos patrimoniais futuros previsíveis, na variante de “lucros cessantes” (arts. 562º, 564º, 1 e 2, CCiv.)”.
           
- no Ac. do STJ de 19/06/2019  processo 22392/16.0T8PRT.P1.S1 considerou-se (sublinhado nosso):  “É sobejamente reconhecido o melindre da fixação do valor indemnizatório pela perda da capacidade aquisitiva futura, na medida em que se funda em parâmetros de incerteza, quanto ao tempo de vida do lesado, quanto ao tempo de vida com capacidade de ganho, a par de outras circunstâncias atinentes à capacidade de trabalho poder vir a ser afectada por doença ou acidente, a própria evolução salarial, hoje mais do que nunca, de uma imprevisibilidade evidente, a manutenção do emprego, cada vez mais incerta, os próprios índices de inflação, entre outros.
Atendendo à delicadeza desta realidade, com a qual somos confrontados, deitamos mão da previsão legal contida no n.º 3, do art.º 566°, do Código Civil, daí que haja que recorrer à equidade ante a dificuldade de averiguar com exactidão a extensão dos danos.
Se não puder ser quantificado, em termos de exactidão, o montante desses danos, julgará o tribunal equitativamente, dentro dos limites que tiver por provados, de acordo com o disposto no art.º 566º n.º 3 do Código Civil.
Perante a constatação das dificuldades associadas à fixação do montante indemnizatório para reparação pela perda da capacidade aquisitiva futura, e perante a diversidade de resultados obtidos com o recurso a critérios tão diferentes que oscilaram entre o recurso às tabelas de cálculo das pensões por incapacidade laboral e sua remição, que depressa foi abandonado, o recurso às tabelas financeiras, às fórmulas matemáticas, de fraca adesão, além de outros critérios, há que trilhar caminho seguro na apreciação desta temática.
Aqueles enunciados critérios foram sucessivamente perfilhados por decisões do Supremo Tribunal de Justiça, que, todavia, não deixaram de lhes reconhecer, somente, a natureza de índices meramente informadores da fixação do cálculo, simples instrumentos auxiliares de orientação, não dispensando o recurso à equidade, que pressupõe uma solução em sintonia com a lógica e o bom senso, com apelo às regras da boa prudência, da criteriosa ponderação das realidades da vida, sem submissão, porém, a critérios subjectivos de ponderação, tendo sempre em devida conta a gravidade do dano.
A Jurisprudência tende a defender dever-se confiar no prudente arbítrio do tribunal, com recurso à equidade, todavia, seja qual for o critério norteador (já que todos os critérios seguidos não são vinculativos, são meramente indiciários), haverá que ter sempre presente a figura da equidade, a qual visa alcançar a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei, de forma que se tenha em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida.
Como calcular, então, o quantum indemnizatório, para reparação pela perda da capacidade aquisitiva futura?
Sublinhamos que o cálculo do quantum indemnizatório, fixado para reparação pela perda da capacidade aquisitiva futura, tem, necessariamente, por base, critérios de equidade que assenta numa ponderação prudencial e casuística, dentro de uma margem de discricionariedade que ao julgador é consentida, que, de todo, colida com critérios jurisprudenciais actualizados e generalizantes, de forma a não pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio de igualdade.
Na Jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, a atribuição de indemnização por perda de capacidade geral de ganho, segundo um juízo equitativo, tem variado, essencialmente, em função dos seguintes factores: a idade do lesado; o seu grau de incapacidade geral permanente; as suas potencialidades de aumento de ganho, antes da lesão, tanto na profissão habitual, ou previsível profissão habitual, como em profissão ou actividade económica alternativas, aferidas, em regra, pelas suas qualificações, a par de um outro factor que contende com a conexão entre as lesões físico-psíquicas sofridas e as exigências próprias da actividade profissional habitual do lesado, ou da previsível actividade profissional habitual do lesado, assim como de actividades profissionais ou económicas alternativas, tendo em consideração as competências do lesado (neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Maio de 2014 (Processo n.º 436/11.1TBRGR.L1.S1), Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2015 (Processo n.º 99/12.7TCGMR.G1.S1), Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 2015 (Processo n.º 1166/10.7TBVCD.P1.S1), Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7 de Abril de 2016 (Processo n.º 237/13.2TCGMR.G1.S1), e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2016 (Processo n.º 37/13.0TBMTR.G1.S1), in, www.dgsi.pt.)
           
Assim, a atribuição de uma indemnização, quando se verifique alguma das consequências supra enunciadas sob as alíneas a) a c) do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica, faz-se única e exclusivamente através da equidade, levando em conta as circunstâncias do caso concreto (art.º 566º n.º 3 do CC).

A equidade é, aqui, chamada, como instrumento de quantificação da indemnização.

A este propósito refere Menezes Cordeiro in Da boa fé no Direito Civil, 1997, pág. 1201:
“Quando a equidade seja chamada a fixar montantes indemnizatórios, não deve, de modo algum, pensar-se que tal operação fica ao livre-arbítrio do juiz, matizado embora por considerandos filosóficos, cuja concretização seria espinhosa. A interpretação dos diversos preceitos envolvidos mostra com clareza a presença de uma série de critérios a que o juiz deve atender.”

E na pág. 1203:
“A decisão de equidade implica uma margem lata de indeterminação. Intervêm, nela, argumentos mais vastos do que os integrantes de modelos de decisão intra-sistemáticos, acrescidos por certo espaço de subjectivismo de quem julgue. Tais argumentos prendem-se com o caso concreto, mas devem ter um mínimo de objectividade jussocial que permita considerá-los como integrando a regulação da vida em sociedade. Na sua seriação, há-de observar-se o esquema valorativo dominante nas representações comuns, sob pena de arbítrio. “

E ainda na mesma obra, pág. 1204 observa (sublinhado nosso):
“ (…) sendo, como se depreende do art.º 4º, a equidade, um modo de resolver questões estranho ao Direito estrito, ela não se fundamenta, de forma expressa, no estalão argumentativo subjacente á lei e fontes complementares: tem de se legitimar no processo e no mérito dos próprios pontos de vista para que apele”.

E finalmente pondera-se:
“ Conclui-se que a equidade, no Direito actual, corresponde a um modo de decidir extra-sistemático, porquanto prescinde da autoridade particular das proposições juspositivas. Mas porque não arbitrário, o modelo de decisão, por ela propiciado, respeita o sentido material do jurídico….(…) o extra-sistematismo da equidade é formal; materialmente a decisão équa integra-se no sistema apreendido por quem decida.”

Julgar segundo a equidade implica, de acordo com a especificidade do caso concreto, suprir a parcial falta de factos com princípios gerais de justiça e os ditames da consciência do julgador, sem que se chegue a um livre arbítrio – Ac. do STJ, de 10.07.97. in BMJ, 469, 524.

A equidade, a par da intuição e dos sentimentos de justiça, situam-se, no dizer de Antunes Varela, in RLJ, 129, 210, no leito (mais ou menos caudaloso) do rio que corre entre as margens da matéria de facto e da matéria de direito, sendo aquelas que devem definir o sentido dessa corrente em direcção à justiça do caso concreto.

Quando a equidade seja chamada a fixar montantes indemnizatórios, tal operação não fica ao livre-arbítrio do juiz, antes deve orientar-se por critérios emergentes do caso concreto, critérios esse verificáveis e controláveis.

Não tem assim qualquer fundamento a pretensão do A. expressa na sua conclusão 28, de aplicação da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, diploma que Regulamenta o Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais e concretamente da alínea b) do n.º 3 do art.º 48º, que estabelece a prestação a que o trabalhador tem direito quando do acidente de trabalho resultar incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual - pensão anual e vitalícia compreendida entre 50 % e 70 % da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível.

Por outro lado, como manda o n.º 3 do art.º 8º do CC, deverão ter-se em consideração os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, por forma a dar cumprimento ao principio da igualdade plasmado no art.º 13º n.º 1 da CRP.

Mas importa atentar no afirmado no Ac. do STJ de 06/12/2017, proc. 1509/13.1TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj:
VIII. A comparação com os diversos casos já tratados na jurisprudência nem sempre se mostra fácil, dada a multiplicidade de fatores variáveis e as singularidades de cada caso, relevando, em especial, o impacto concreto que determinado grau de défice funcional genérico é suscetível de provocar no contexto da atividade económica que estava ao alcance da iniciativa do sinistrado com a inerente perda de oportunidade de ganho.

E que voltou a ser afirmado no recente Ac. do STJ de 02/02/2023, processo 2501/10.3TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj
I - A comparação da situação da A. com as demais referenciadas nos diversos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça que se pronunciaram sobre o valor da indemnização por danos patrimoniais futuros e danos não patrimoniais é particularmente difícil, não só pela multiplicidade de variáveis atinentes a cada indemnização, mas também por a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça estar fortemente condicionada pelo objecto do recurso podendo mover-se apenas dentro dos limites dele e não numa avaliação global e incondicionada do referido dano.
II - Os valores até agora fixados para avaliação do referido dano são pontos de partida para a fixação de indemnização, meros referenciais do que se pretende seja uma visão jurisprudencial tanto quanto possível uniforme de situações muito diversas e particulares de modo que se não atinja um valor desproporcional à gravidade dos danos ou violador do princípio da igualdade de tratamento a que têm constitucional direito todos os cidadãos.

Significa-se que nem sempre se mostra tarefa fácil estabelecer comparações entre os diversos casos já tratados na jurisprudência, ante a multiplicidade e variabilidade de fatores e as singularidades de cada caso, em especial, o impacto concreto que determinado grau de défice funcional genérico é susceptível de provocar no contexto da atividade económica que estava ao alcance da iniciativa do sinistrado com a inerente perda de oportunidade de ganho.

Assim e para fixar o montante indemnizatório, o Juiz está obrigado a atender sempre à multiplicidade e à especificidade das circunstâncias que concorrem no caso concreto.

Também tem sido objecto de entendimento pacifico no STJ que “na determinação dos montantes indemnizatórios aos lesados em acidentes de viação, os tribunais não estão obrigados a aplicar as tabelas contidas na Portaria nº377/2008, alterada pela Portaria nº 679/2009, de 25 de Junho, ali apenas se estabelecendo padrões mínimos, a cumprir pelas seguradoras, na apresentação aos lesados de propostas sérias e razoáveis de regularização dos sinistros, indemnizando o dano corporal” (cfr.  Ac. do STJ de 13/04/2021, proc.  448/19.7T8PNF.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj.

Finalmente e como referido no já citado Ac do STJ de 07/03/2019, há que considerar a expetativa da vida ativa e não a idade da reforma.

d) danos patrimoniais futuros (emergentes): as despesas que a vitima vai ter de realizar em medicamentos, operações, ajudas técnicas, ajuda de terceira pessoa
e) danos morais:
i) refere-se á repercussão da afetação definitiva da integridade física elou psíquica da pessoa nas atividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, sendo independente das atividades profissionais, pelo que nos afastamos do disposto no art.º 4º da Portaria n.º 377/2008, que considera dano moral Quando resulte para o lesado uma incapacidade permanente absoluta para a prática de toda e qualquer profissão ou da sua profissão habitual, que consideramos tratar-se de um dano patrimonial.
ii) o quantum doloris;
iii) o dano estético;
iv) a Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer;
v) a Repercussão Permanente na Atividade Sexual

5.2.2.1. Do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica – Repercussão permanente na actividade profissional

O A. na petição inicial formulou o seguinte pedido:
A - “uma Indemnização correspondente a todos os danos patrimoniais e não  patrimoniais pelo mesmo sofridos em virtude do acidente de viação melhor descrito nos autos aqui devidamente descriminados e já quantificados, de montante nunca inferior a € 478.000,00”.

No entanto, na petição inicial, o A. distinguiu a perda de capacidade de ganho (entendendo que a mesma deve ser indemnizada em quantia não inferior a € 200.000,00) e o dano biológico (entendendo que deve ser indemnizado em € 125.000,00).

O ponto 1 do decisório tem o seguinte teor:
1 – Condenar a Ré a pagar ao autor a título indemnização por danos patrimoniais a quantia de € 100 455, 22 (cem mil, quatrocentos e cinquenta e cinco euros e vinte e dois cêntimos);

Afirmou-se na fundamentação de Direito o seguinte:
Aqui chegados, importará determinar o conceito de dano patrimonial futuro e se, no caso em apreço, for seguro esse dano, como deverá ser fixada a correspondente indemnização.
Considerando que:
– a idade do autor à data do acidente (50 anos de idade);
– a sua incapacidade para o exercício da sua profissão habitual;
- Uma Incapacidade Permanente Parcial (IPP) fixável em 72.465 %;
– que era saudável e fisicamente bem constituído;
– o seu rendimento líquido anual de 11.280,44€, com tendência para aumentar substancialmente durante a sua esperança de vida;
- a esperança de vida do lesado (80 anos), ou seja, durante 30 anos;
Assim, se o demandante, com 49 anos de idade à data do acidente, era saudável, fisicamente bem constituído, dinâmico e trabalhador e, em consequência do acidente dos autos, ficou a padecer das sequelas descritas supra e ficou afectado de forma permanente se projecta quer na sua vida profissional, quer na generalidade das suas actividades diárias, obrigando-o, em qualquer dos casos, a esforços acrescidos.
Por isso, e tendo em consideração o referido fixa-se em 50.000,00 € a quantia devida a título de dano patrimonial sofrido nas suas vertentes perda futura de ganho e dano biológico stricto senso, computando-se para efeitos de perda futura de ganho a quantia de 50.000,00€ e o restante a título de dano biológico.
São ainda ressarcíveis as despesas alegadas pelo autor e descritas no nº 79 e 80 dos factos assentes, pois correspondem a gastos que o autor não teria tido se não tivesse ocorrido o acidente:
- € 455,22 a título de consultas médicas de várias especialidades, sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, exames clínicos, não ressarcidos pela ré;

Destarte, o ponto 1 do decisório abrange uma indemnização de € 50.000,00 a titulo de perda de capacidade de ganho, uma indemnização de € 50.000,00, a titulo de dano biológico e uma indemnização € 455,22 a título de consultas médicas de várias especialidades, sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, exames clínicos, não ressarcidos pela ré.

A indemnização € 455,22 não está questionado em nenhum dos recursos interpostos, pelo que nesta parte a sentença recorrida transitou em julgado.

O A. no seu recurso entende que:
- o valor da indemnização atribuída a título de “perda de capacidade de ganho” deve ser fixado em € 250.000,00;
- o valor da indemnização atribuída a título de “dano biológico” deve ser fixada em € 50.000,00.

Por sua vez a Ré entende que a indemnização relativa ao dano biológico/dano patrimonial futuro não deverá ser fixada em valor superior € 75.000,00.

Como já ficou dito, o dano biológico é o dano real, primário, in natura na integridade físico e/ou psíquica de uma pessoa e que do ponto de vista médico legal se traduz no Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica.

Esse défice traduz a afetação definitiva da integridade física elou psíquica da pessoa para a vida em geral, ou seja, pondera-se a repercussão das sequelas nas actividades da vida diária e, por isso, é avaliado relativamente à capacidade integral do indivíduo (100 pontos).

Este dano primário pode ter consequências suscetíveis de avaliação pecuniária, ainda que mediante recurso à equidade, como a repercussão permanente na actividade profissional ou perda de capacidade geral de ganho e que dá lugar a uma indemnização por danos patrimoniais futuros (a repercussão do défice funcional temporário total ou parcial na actividade profissional poderá dar lugar a uma indemnização por danos patrimoniais emergentes) e consequências que não são suscetíveis de avaliação pecuniária – as repercussões na vida diária, o dano estético, a repercussão nas actividades desportivas e de lazer, na actividade sexual - e que dá lugar a uma indemnização por danos morais (onde também cabem o défice funcional temporário total e parcial e o quantum doloris).

Aqui apenas cabe apreciar uma das consequências do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica que é a Repercussão permanente na actividade profissional ou, seja, aquele dano visto numa perspectiva patrimonial futura, a perda de capacidade geral de ganho, não tendo aqui autonomia o que foi denominado de “dano biológico” e que por isso, desde já determina a improcedência do recurso do A. na parte em que pede uma indemnização a titulo de dano biológico no valor de € 50.000,00.

Resulta da factualidade provada que:
i - O embate ocorreu a 08 de Maio de 2016 (ponto 1 dos factos provados)

ii - Em consequência do embate o A. ficou com um Défice Funcional Permanente de Integridade Fisico-Psiquica fixável em 31 pontos ( ponto 53 dos factos provados)

iii - As sequelas supra descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, impeditivas e incompatíveis com o exercício da sua actividade profissional habitual; O Autor está Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH) (ponto 53 dos factos provados);

Estamos perante uma situação em que a diminuição da capacidade funcional impede a A. de exercer a actividade profissional específica ao tempo do acidente.

A factualidade provada nada diz quanto à possibilidade de o A. exercer ou não outras concretas actividades compatíveis com a sua preparação técnico profissional.

No Relatório pericial afirma-se – pág. 7 - que as sequelas de que o A. padece são impeditivas do exercício da actividade profissional do A., mas são compatíveis com outras profissões da área da sua preparação técnico-profissional.

Porém, não as identifica.

Em sede de esclarecimentos escritos o Sr. Perito consignou que “ não é viável (nem faz parte da avaliação pericial) que o perito refira exemplos de profissões que cada sinistrado possa vir a desempenhar no futuro, em virtude das sequelas que padece; mas sim, quando são apresentadas ao perito funções específicas de cada profissão, esta poder-se-á pronunciar sobre a capacidade (ou não) de cada sinistrado  a desempenhar, sempre de acordo com as limitações inter-individuais e com os restantes fatores que influenciam determinada função ou capacidade. A designação “capaz para outras profissões dentro da sua área de preparação técnico-profissional” corresponde a uma denominação genérica que pretende transmitir que, no abstrato, o sinistrado não se encontra incapaz para toda e qualquer profissão em virtude das sequelas que padece.”

Salvo melhor opinião, mas afirmar-se que as sequelas de que o A. padece são compatíveis com outras profissões da área da preparação técnico-profissional do A. é uma abstracção insusceptível de ser juridicamente relevada, quando é generalizada a dificuldade de mobilidade entre funções e actividades dos trabalhadores portugueses e o A. já tinha, à data do embate, 50 anos, o que torna ainda mais dificil essa mobilidade.

A possibilidade de o A. vir a exercer profissão ou actividade económica alternativa, à luz suas qualificações, carecia de concretização, o que não ocorre.
Não tendo sido alegada e provada tal possibilidade - e cabia à Ré fazê-lo, porque se trata de matéria com interferência na fixação do montante da indemnização -, tudo se passa como se ela não existisse.

iv - O Autor à data da ocorrência do acidente de viação dos autos, pelo exercício da sua categoria profissional de “Técnico Manutenção de 2ª” auferia uma retribuição mensal de €870,04 (oitocentos e setenta euros e quatro cêntimos) discriminado da seguinte forma: 1) 570,00€ x 14 meses/ano a titulo de vencimento base mensal, 2) ….7,60€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação lanche, 3) 125,02€ X11 meses/ano a titulo de hora extra, 4) ..93,94€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação (isento), 5) ..47,08€ X11 meses/ano a titulo de subsidio de alimentação (sujeito), 6) ..26,40€ X11 meses/ano a titulo de horas noturnas ( ponto 57 dos factos provados);

v - O Autor, nasceu em .../.../1966 (ponto 3 dos factos provados).
O A. tinha a data do embate 50 anos.
De acordo com a publicação do INE “Tábuas de Mortalidade em Portugal – NUTS (2019-2021)”, a esperança de vida à nascença em Portugal foi estimada, neste período, em 77,67 anos para os homens e em 83,37 anos para as mulheres,
 Daqui decorre que a perspectiva de vida a considerar é de, pelo menos, 27 anos.

A Ré entende que a indemnização a arbitrar deve ter apenas em conta a idade do Autor à data da consolidação médico-legal, uma vez que durante o período em que duraram os tratamentos, o Autor foi indemnizado pelas retribuições que deixou de auferir.

Em primeiro lugar está provado – ponto 45 - que as lesões sofridas pelo A. atingiram a consolidação médico–legal a 18/06/2018.
Em segundo a factualidade provada não permite considerar – nem a Ré o alega - que a Ré pagou os salários ao A. até à data da consolidação médico-legal.
O que resulta da factualidade provada – ponto 44 – é que a Ré atribuiu alta clinica ao A. a 06/02/2017, data a partir da qual deixou de proceder ao pagamento de adiantamentos salariais ao A.
Neste conspecto não pode ser tida em consideração a data da consolidação médico-legal.

vi - Finalmente e uma vez que têm que ser ponderados os critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, para efeitos comparativos, reportam-se indemnizações atribuídas tendo em consideração dois critérios essenciais: a similitude do grau do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica com o dos autos - 31 pontos - e o facto de as sequelas do sinistro serem impeditivas do exercício da actividade profissional habitual da vitima.

Assim ( todos os Ac.s são do STJ e são consultáveis in www.dgsi.pt/jstj):
- Ac. do STJ de 10/03/2016, proc. 1602/10.2TBVFR.P1.S1: défice funcional permanente da Integridade Físico-Psíquica de 37 pontos, as sequelas do sinistro são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual da vitima, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, 50 anos, salário de  1.368,00: € 60.000,00 pela repercussão permanente na actividade profissional e € 20.000,00 pela necessidade de vigilância de terceira pessoa.

Importa ter em consideração que o processo em que este Ac. foi proferido se iniciou em 2010 – desde então e até agora decorreram 13 anos – e o Ac. foi proferido  em 2016 – sobre ele passaram 7 anos.
Mas cita-se o mesmo para tornar impressiva a evolução dos montantes indemnizatórios.

- Ac. do STJ de 09/01/2018, proc. 275/13.5TBTVR.E1.S1: défice funcional permanente da Integridade Físico-Psíquica de 30 pontos, ficou amputado de uma perna, as sequelas do sinistro são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual da vitima, 41 anos, salário de € 750,00: € 250.000,00.

- Ac. do STJ de 19/09/2019, proc. 2706/17.6T8BRG.G1.S1: défice funcional permanente da Integridade Físico-Psíquica de 32 pontos, as sequelas do sinistro são impeditivas do exercício da actividade profissional habitual da vitima, bem como de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional, 45 anos á data do acidente, salário de € 788,00 acrescido de subsídio de alimentação de € 80,00: € 200.000,00.

Importa ter em consideração que como refere o Ac. do STJ de de 19/04/2018, consultável in www.dgsi.pt/jstj pelo processo 196/11.6TCGMR.G2.S1. “o recebimento de uma só vez do montante indemnizatório não releva actualmente como em tempos não muito recuados já revelou, tendo em conta [que] a taxa de juro remuneratório dos depósitos pago pelas entidades bancárias é muito reduzido (…) o que implica, por si só, a elevação do capital necessário para garantir o mesmo nível de rendimento.”

Tal beneficio fica consumido pela inflação provável ao longo do extenso período a que se reporta o computo da indemnização.

Nestas circunstâncias, sopesando todos referidos elementos de facto, os valores atribuídos na jurisprudência mais recente para casos similares, tendo em consideração o disposto no n.º 2 do art.º 566º do CC e aplicando o disposto no n.º 3 do mesmo normativo, tem-se como equitativa a indemnização pela Repercussão do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica na actividade profissional/perda da capacidade geral de ganho do A. de €200.000,00, actualizada à presente data.

Assim e nesta parte, o recurso do A. (que pretendia uma indemnização por perda de capacidade geral de ganho de € 250.000,00) deve ser julgado parcialmente procedente e o recurso da Ré (que pretendia que a indemnização relativa ao dano biológico/dano patrimonial futuro fosse fixada em valor não superior € 75.000,00) deve ser julgado totalmente improcedente.

5.2.2.2. Imputação da quantia de € 20.000,00
Está provado – ponto 92 – que a Ré já entregou ao A., por conta da indemnização a pagar, a quantia de € 20.000,00.

Uma vez que não foi feita a designação do segmento indemnizatório que a referida quantia se destinava a pagar e uma vez que o montante indemnizatório em referência será sempre o mais oneroso, aquela quantia deverá ser imputado a este segmento indemnizatório (cfr. art.º 784º n.º 1 do CC).

Destarte, deve a Ré ao A. a quantia de € 180.000,00 a titulo de indemnização pela Repercussão do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica na actividade profissional/perda da capacidade geral de ganho.

E assim impõe-se revogar parcialmente o ponto 1 do decisório da sentença recorrida, na parte em que condena a Ré a pagar ao A. a quantia de € 100.000,00 (a parte relativa aos € 455,22 não foi objecto de recurso, pelo que se mantêm), que se substitui por outro que condena a Ré a pagar ao A. a quantia de € 180.000,00 a titulo de indemnização pela Repercussão do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica na actividade profissional/perda da capacidade geral de ganho.

5.2.2.3. Da alteração da redacção do ponto 2 do decisório.
O ponto 2 do decisório tem o seguinte teor:
2 – Condenar a Ré a pagar ao autor, quantia, cujo cômputo se relega para posterior liquidação em sede de incidente de liquidação (artigo 358.º do C.P.Civil) ou execução de sentença, a titulo de indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais futuros decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de efetuar vários exames médicos de diagnóstico e de aferição da consolidação das lesões, queixas e sequelas descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Ortopedia, Consulta da Dor Crónica, Urologia, Psiquiatria, Psicologia, Medicina Física e Reabilitação, Neurologia, Neurocirurgia, Neurocirurgia Funcional e Cirurgia Plástica para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de realizar tratamento fisiátrico (pelo menos duas vezes por ano, sendo que cada tratamento deverá ter a duração mínima de 20 sessões) para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, ansiolíticos, antiinflamatórios e analgésicos para superar as consequências físicas das lesões e sequelas descritas; decorrentes da necessidade atual e futura, por parte do Autor, de se submeter a várias intervenções cirúrgicas e plásticas, a vários internamentos hospitalares, de efetuar várias despesas hospitalares, de efetuar a vários tratamentos médicos e clínicos, de ajudas técnicas, de efetuar várias deslocações a hospitais e clínicas para tratamento e correção das lesões e sequelas descritas;

A ré impugnou a decisão de facto com êxito, tendo ficado provado, apenas que:
49. O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
(…)
51. O autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, regularizador do sono, prostaglandina ou injeção intracavernosa e analgésicos - para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
(…)

Toda as restantes realidades contempladas no ponto 2 do decisório foram julgadas não provadas como decorre das alíneas c), d), e), f)), g) e i) dos factos não provados.

Impõe-se assim e nesta parte julgar procedente o recurso da Ré, revogando parcialmente o ponto 2 do decisório, o qual se substitui por outro com a seguinte redacção:
2 – Condenar a Ré a pagar ao autor o que o mesmo despender em acompanhamento médico nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, ajudas técnicas e medicamentosas antidepressivos, regularizador do sono, prostaglandina ou injeção intracavernosa e analgésicos -, tudo tendo em vista superar as consequências físicas e psicológicas do acidente dos autos, a liquidar em incidente de liquidação.

5.2.2.4. Dos danos morais.
Finalmente há que considerar os danos morais – aqueles que não sendo susceptíveis de avaliação pecuniária, não deixam de ser indemnizáveis no sentido de lhes corresponder uma compensação pecuniária.

Resulta do disposto no art.º 496º n.º 1 do CC, que são de ressarcir os danos morais que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito.

Já acima deixámos dito que os danos morais integram a repercussão da afetação definitiva da integridade física e/ou psíquica da pessoa nas atividades da vida diária, incluindo as familiares e sociais, sendo independente das atividades profissionais - aqui cabendo quer o défice funcional temporário, quer o défice funcional permanente - o quantum doloris, o dano estético, a Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer e a Repercussão Permanente na Atividade Sexual.

A medida da satisfação pecuniária dos danos morais deve ser fixada de forma equitativa, nos termos do artigo 496º, n.º 3, do Código Civil, que manda atender às circunstâncias referidas no art.º 494º do mesmo Código (o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica e a situação económica do lesado, entre outras).

O seu montante «deve ser proporcionado à gravidade do dano, devendo ter-se em conta na sua fixação todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida».

A indemnização a fixar não deverá traduzir-se num montante meramente simbólico ou miserabilista, mas antes representar a quantia adequada a viabilizar uma compensação ao lesado pelos padecimentos que sofreu em consequência do sinistro (cfr. acórdão do STJ de 7/06/2011, proc. 160/2002, consultável in www.dgsi.pt/jstj).

Impõe-se referir que a ponderação de critérios jurisprudenciais vigentes e aplicáveis a situações semelhantes, para efeitos comparativos, como se fez para o DFP, é muito mais difícil e complexa no campo dos danos morais, pois, desde logo, em abstracto existe um conjunto diverso de realidades susceptíveis de integrar os danos morais (só para referir os que normalmente constam dos Relatórios do INML...: - data da consolidação médico-legal das lesões; - Período de Défice Funcional Temporário Total; - Período de Défice Funcional Temporário Parcial; - Quantum Doloris; - Dano Estético Permanente; Repercussão Permanente nas atividades desportivas e de lazer; Repercussão permanente na atividade sexual ) e, em concreto, cada caso é único, ou seja, as realidades que em determinada situação integram os danos morais são únicas, seja pela substância, seja pelo “peso relativo” dessas realidades.
Destarte a recensão que se segue foi em parte efectuada no Ac. desta RG de 21/10/2021, proc. 5405/19.0T8GMR.G1, consultável in www.dgsi.pt/jtrg, em que o aqui Relator foi 1º adjunto e o aqui 2º Adjunto foi também 2º Adjunto, sendo, salvo indicação em contrário, todos os Acs. do STJ consultáveis in www.dgsi.pt/jstj e os da RG consultáveis in www.dgsi.pt/jtrg e é meramente indicativa:
- no Ac. do STJ de 28/01/2016, proc. 7793/09.8T2SNT.L1.S1 - «lesado de 17 anos de idade; foi submetido a quatro operações, padeceu de dores intensas, antes e após as intervenções cirúrgicas a que foi submetido, esteve internado por longos períodos, teve de efectuar tratamentos de reabilitação e que terá ainda de se submeter a mais duas operações, tendo ficado com uma cicatriz com 50cm de comprimento - o que lhe determinou a atribuição de um quantum doloris de grau 5 numa escala de 7 e de um dano estético de grau 4 numa escala de 7» - € 40.000,00 de indemnização;
- Ac. do STJ de 07/04/2016, proc. 237/13.2TCGMR.G1.S1 - «lesada de 22 anos de idade; na sequência do acidente de viação, ocorrido em 08-10-2011, que a vitimou: (i) esteve internada durante três semanas, tendo mantido o repouso após a alta hospitalar; (ii) passou a ter incontinência urinária; (iii) as suas lesões estabilizaram em 13-04-2012; (iv) o quantum doloris foi fixado em 4 numa escala de 1 a 7; (v) o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica foi fixado em 8%; (vi) as sequelas são compatíveis com o exercício da actividade habitual mas implicam esforços suplementares; (vii) o dano estético foi fixado em 3 numa escala de 1 a 7; (viii) a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer foi fixada em 1 numa escala de 1 a 7; (ix) sofreu angústia de poder vir a falecer e tornou-se uma pessoa triste, introvertida, deprimida, angustiada, sofredora, insegura, nervosa, desgostosa da vida e inibida e diminuída física e esteticamente, quando antes era uma pessoa dinâmica, expedita, diligente, trabalhadora, alegre e confiante» -  € 50.000,00 de  indemnização;
- Ac. do STJ de 16/06/2016, proc. 1364/06.8TBBCL.G1.S2 - «lesada de 39 anos de idade; tendo em conta a idade da A., a natureza das lesões sofridas, os períodos de internamento e de convalescença, os tratamentos a que teve, sucessivamente, de se submeter, as sequelas com que ficou e a repercussão na sua vida quotidiana, o grau de quantum doloris fixado em 4 pontos numa escala crescente de 1 a 7, o sofrimento que, segundo as regras da experiência, tudo isso implica com tendência a agravar-se com a idade, o facto de o acidente se ter devido a culpa exclusiva e grave do condutor do veículo atropelante sem qualquer parcela de responsabilidade da A., o longo tempo decorrido entre a data da propositura da ação (24/03/2006) e a data da sentença final (28/05/2014)» - € 20.000,00 de  indemnização;
- Ac. do STJ de 25/05/2017, processo 868/10.2TBALR.E1.S1: “ III. No caso de um jovem com 19 anos de idade à data do acidente, sujeito a quatro cirurgias e 125 sessões de fisioterapia, com alta cerca de dois anos e meio depois do acidente, ficando afectado de sequelas que implicaram a perda do seu posto de trabalho e incapacidade permanente para a sua profissão habitual, com um quantum doloris de grau 4 (numa escala de 1 a 7), dano estético de grau 4, défice permanente de integridade físico-psíquica de 7 pontos, sendo de admitir danos futuros, repercussão nas actividades desportivas e de lazer de grau 3 e na actividade sexual de grau 2, sentimentos de tristeza, com isolamento e depressão, carecendo de apoio psicológico, justifica-se que a indemnização por danos não patrimoniais, de acordo com uma jurisprudência actualista, seja fixada em € 50.000,00.
- Ac. do STJ de 13/07/2017, proc. 3214/11.4TBVIS.C1.S1 - «Em consequência das lesões sofridas e com vista à realização de exames, tratamentos e cirurgias, o A. esteve internado pelo menos 112 dias; O dano estético situa-se no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente; O prejuízo de afirmação pessoal situa-se, no mínimo, no grau 4, numa escala de cinco graus de gravidade crescente; Andou 2/3 meses de cadeira de rodas, e alguns meses de canadianas; Era uma pessoa saudável e com muita alegria de viver; gostava muito de andar de bicicleta, ir à pesca e dar passeios pela natureza, o que fazia com regularidade; Das lesões sofridas no acidente resultou para o A. ereções mais lentas e não tão rígidas como as que tinha antes do acidente, ficando portador de uma repercussão permanente na actividade sexual fixável no grau 3, numa escala de 7 graus de gravidade crescente; O sofrimento físico e psíquico por ele vivido, durante o período de incapacidade temporária, corresponde a um quantum doloris de grau 7, também numa escala de sete graus de gravidade crescente» - € 60.000,00 de indemnização;
- Ac. do STJ de 09/01/2018, proc. 275/13.5TBTVR.E1.S1: II - Tendo o lesado sofrido, e para além da amputação do membro e da respetiva intervenção cirúrgica, uma outra intervenção cirúrgica, internamento hospitalar, dano estético permanente de grau 6 (numa escala de 7), quantum doloris de grau 6 (numa escala de 7), e vários outros graves danos somáticos e psíquicos (nomeadamente stress pós-traumático crónico e quadro depressivo, inclusivamente com ideação suicida), justifica-se o arbitramento de uma indemnização de €125.000,00 a título de dano não patrimonial.
- Ac. do STJ de 19/04/2018, proc. 196/11.6TCGMR.G2.S1 - «as circunstâncias em que ocorreu o acidente (sem qualquer culpa da Autora), a extrema gravidade das lesões sofridas por esta, os dolorosos tratamentos a que foi sujeita, com destaque para as duas intervenções cirúrgicas, com anestesia geral, o longo período de clausura hospitalar e de tratamentos, as deslocações que teve que realizar para curativos e consultas, quer ao ... quer a ..., a enorme incomodidade daí resultante, as graves e extensas sequelas anátomo-funcionais decorrentes do acidente, que se traduzem num deficit funcional permanente de elevado grau (26 pontos), correspondente a uma IPP de 49,2495% e a um dano estético de grau 4, numa escala de 1 a 7, as intensas dores sofridas (de grau 5, numa escala de 1 a 7), o desgosto e amargura de, com 43 anos de idade, se ver fisicamente limitada e sem perspectivas futuras, em termos laborais» - € 45.000,00 de indemnização;
- Ac. do STJ de 12/07/2018, proc. 1842/15.8T8STR.E1.S1 - «lesado de 45 anos que é portador, como sequela das lesões sofridas: perturbação persistente do humor; Quantum Doloris no grau 6/7; dano estético no grau 3/7; a repercussão permanente nas actividade desportivas e de lazer é de 3/7; a repercussão permanente na actividade Sexual no grau 3/7; precisa de ajudas medicamentosas, ajudas técnicas e tratamentos médicos regulares; e dependências permanentes que incluem os produtos de apoio pela necessidade de uso diário de meia e contenção elástica grau II na perna esquerda e uso de cinta de contensão lombar» - € 60.000,00 de indemnização;
- Ac. do STJ de 19/09/2019, proc. 2706/17.6T8BRG.G1.S1: IV - Resultando dos factos provados que: (i) o recorrente foi sujeito a exames médicos e vários ciclos de fisioterapia, bem como uma intervenção cirúrgica; (ii) ficou afetado com um défice funcional permanente de 32 pontos; (iii) sofreu dores quantificáveis em 5 numa escala de 7 pontos; (iv) sofreu um dano estético quantificado em 3 numa escala de 7 pontos; (v) a repercussão das sequelas sofridas nas atividades desportivas e de lazer é quantificada em 3 numa escala de 7 pontos; (vi) o recorrente sofreu um rebate em termos psicológicos, em virtude das lesões e sequelas permanentes, designadamente por não poder voltar a exercer a sua profissão habitual e/ou outra no âmbito da sua formação profissional; revela-se ajustado o montante de € 50 000,00 para compensar os danos não patrimoniais por aquele sofridos.

- Ac. da RG de 10/07/2019, proc. 3335/17.0T8VCT.G1 – «lesado que à data do acidente tinha 21 anos de idade, que, em consequência do acidente, sofreu traumatismo crânio encefálico, com cegueira do olho esquerdo, traumatismo de costelas, com perfuração dos pulmões, e traumatismo dos ombros e braços, que esteve internado e em coma durante oito dias, que sofreu um quantum doloris de grau 5 e um dano estético permanente de grau 3, bem como que ficou a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 30 pontos» - € 50.000,00. 
- Ac. da RG de 18/06/2020, proc. 5334/17.2T8GMR.G1 - «lesada com 32 anos que foi vítima de um acidente quando se encontrava de férias em Portugal, o qual implicou a necessidade de realização de exames e cirurgia, tendo ficado afetada numa perna com uma incapacidade de 9 pontos, que lhe condiciona o caminhar, agachar, sentar e levantar, sofreu um quantum doloris de 5 numa escala de 1 a 7, esteve condicionada a uma cama durante 4 meses, ficou em situação de incapacidade funcional durante 366 dias, período durante o qual deixou de poder realizar as suas actividades pessoais e domésticas, tendo de socorrer-se do auxílio de terceiro inclusivamente para se lavar e vestir, continua a ter necessidade de tratamentos no futuro, continua a ter dores, ficou abatida e frustrada por não poder desempenhar as suas actividades e acompanhar os seus filhos, situação que afetou o seu seio familiar» - € 25.000,00 de indemnização;
- Ac. da RG de 04/03/2021, proc. 1490/17.8T8BRG.G1 - «lesado de 27 anos e saudável, que, em virtude do acidente, esteve em repouso 56 dias com impossibilidade absoluta de trabalho, foi sujeito a uma cirurgia, teve um quantum doloris de 4/7, ficou com um dano estético de 3/7, uma repercussão na actividade desportiva de 2/7, um défice funcional de 6%» - € 17.500,00 de indemnização;
- Ac. da RG de 27/05/2021, proc. 5911/18.4T8BRG.G1 - «lesado de 53 anos; sofreu traumatismo nos membros superior e inferior esquerdos, traumatismo dentário, escoriações cutâneas, foi assistido no hospital tendo tido alta no mesmo dia, tomou medicação analgésica, efectuou fisioterapia, sofreu um quantum doloris de grau 3 numa escala de 7, apresenta reacção dolorosa moderada ao nível do membro superior esquerdo e lesão meniscal interna ao nível do membro inferior esquerdo e que devido ao défice funcional da integridade físico-psíquica de 2 pontos que passou a padecer tem de fazer esforços suplementares no exercício da sua actividade profissional» - € 7.500,00 de indemnização;
- Ac. da RG de 13/07/2021, proc. 1880/17.6T8VRL.G1 - «lesada de 34 anos de idade, com um défice funcional permanente de 3 pontos, período de baixa médica de 9 meses, quantum doloris de grau 4, sujeita a vários tratamentos e exames, com muitas sessões de fisioterapia e osteopatia e que ficou a padecer de cervicalgia crónica, que interfere com a sua vida profissional e social e com necessidade de medicação analgésica e/ou anti-inflamatória em momentos de crise» - € 20.000,00 de indemnização;
- Ac. desta RG de 21/10/2021, proc. 5405/19.0T8GMR.G1 - o Autor sofreu uma lesão/factura de um membro superior, esteve internado 8 dias e foi sujeito a uma intervenção cirúrgica, e esteve em tratamento durante cerca de 6 meses e meio, pelo que o período de “doença” foi de quase 7 meses; apesar dos tratamentos, o Autor ficou a padecer de um dano estético permanente de grau 3, uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 2; o Autor teve dores físicas intensas, tanto no momento do acidente, como no decurso dos tratamentos, que configuram um quantum doloris de grau 4, sendo que continuam a provocar-lhe incómodo e mal-estar, que o vão acompanhar durante toda a vida, a qual se presume que será ainda longa atenta a idade de 21 anos; e o Autor ficou profundamente abalado e constrangido com a exclusão do concurso de ingresso na GNR - € 22.000,00 de indemnização.

Resulta da factualidade provada
32. [O Autor foi] socorrido no local do acidente por uma viatura do INEM e transportado em plano duro e com colar cervical para o SERVIÇO DE URGÊNCIAS DO HOSPITAL ... (…) onde foi examinado, com o diagnóstico de politraumatizado, apresentando múltiplas lesões traumáticas, designadamente: traumatismo pélvico, traumatismo escrotal, equimose escrotal e hematoma perineal; fratura longitudinal da coluna da vertente paramediana esquerda do corpo e da asa esquerda do corpo e da asa esquerda da sacra, com afetação dos buracos de conjugação entre S1 e S3, com ligeiro afastamento dos bordos; fratura instável da bacia osteoataxia com fixador externo; traumatismo da coluna lombo sagrada; fratura de L1 e L2; 6) anterolistese de L5 (grau I), por lise ístmica bilateral desta vértebra, e fratura isquiopúbica esquerda.
33. O Autor durante o seu internamento no HOSPITAL DE ...- ESCALA SOCIEDADE GESTORA DO ESTABELECIMENTO, S.A., foi operado à bacia com osteotaxia tendolhe sido colocado um fixador externo (o qual manteve cerca de dois meses).
34. O Autor em 16/05/2016 foi transferido para o CENTRO HOSPITALAR ..., E.P.E. (…) onde permaneceu até 28/6/2016.
35. O Autor em 28/6/2016 foi transferido para a unidade de convalescença do HOSPITAL ..., (…) onde ficou internado até 04/07/2016.
36. O Autor em 04/07/2016 foi transferido para os UNIDADE DOS CUIDADOS CONTINUADOS EM ......, DENOMINADA ... – “ O P...”, FUNDAÇÃO ..., (…) onde ficou internado até 26/07/2016.
37. O Autor em 26/07/2016 [foi] transferido para o HOSPITAL ..., (…) Guimarães, onde permaneceu até 21/09/2016, começando aí a locomoverse inicialmente com a ajuda uma cadeira de rodas durante cerca de 15 dias, de seguida com ajuda de andarilho durante cerca de uma semana e depois com a ajuda de duas muletas durante cerca de um mês. (…)
38. O Autor após a sua alta hospitalar, (…) continuou a ser acompanhado no HOSPITAL ... em Medicina Física e de Reabilitação durante cerca de um mês e em consultas das Especialidades de Urologia (…), de Psiquiatria (…) e de Psicologia (…)
(…)
45. As lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, atingiram a consolidação médicolegal em 18/06/2018 (…)
(…)
47. O Autor apesar dos vários internamentos hospitalares, das intervenções cirúrgicas, das várias consultas médicas nas especialidades de Ortopedia, Urologia, Psiquiatria, Psicologia, Fisiatria, Medicina Física e de Reabilitação, das várias sessões de Fisioterapia, da ajuda medicamentosa e dos vários tratamentos a que se submeteu, ficou a padecer definitivamente e em função das lesões politraumáticas sofridas com o acidente de viação melhor descrito nos autos, das seguintes queixas (a nível funcional e situacional), lesões e sequelas atuais, permanentes e irreversíveis: Queixas a nível funcional: a) Postura, deslocamentos e transferências: Não consegue ajoelharse; b) Sexualidade e procriação: Disfunção eréctil, não controlada com c) Controlo de esfíncteres: Incontinência urinária; Fenómenos dolorosos: Anca dolorosa; Dores na bacia; Lombalgias; Queixas a nível situacional: Actos da vida diária: Dificuldade a subir e descer escadas; Vida afectiva, social e familiar: Perturbação na vida íntima, pela disfunção eréctil; Sentese deprimido, pela alteração da sua vida de relação, e também revive penosamente o acidente; Perturbações do sono; (necessita de sedativos diariamente LORAZEPAM 2.5). Humor depressivo; Significativa baixa autoestima, com sentimentos de inferioridade, disfunção eréctil, queixas urinárias de esvaziamento e urgência, medo acentuado, ansiedade, dificuldade em adormecer ou em permanecer a dormir, sonhos assustadores, forte malestar psicológico com períodos de desesperança frequentes em que há irritabilidade e agressividade. c) Vida profissional ou de formação: Não voltou a trabalhar desde o acidente; A entidade patronal despediuo, aliás, por não conseguir aguentar o esforço indispensável à realização dos trabalhos inerentes à sua profissão; 3. Lesões e/ou sequelas relacionáveis com o evento: O Examinando é dextro e apresenta marcha claudicante. Abdómen: Três cicatrizes, respectivamente de 3,3.1 e 2 cm na zona ilíaca direita e outra de 3 cm na zona ilíaca esquerda; Membro inferior esquerdo: Rigidez da anca esquerda, com flexão limitada a 90º; Limitação nos últimos graus da rotação externa, apenas possível com dor intensa; A instabilidade da marcha devese à instabilidade por diástase da sínfise púbica, conforme relatório de Ortopedia atrás citado.
(…)
49. O Autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de acompanhamento médico periódico regular nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, para superar as consequências físicas e psíquicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
(…)
51. O autor necessita atualmente e necessitará no futuro, de ajudas técnicas e medicamentosas de forma regular antidepressivos, regularizador do sono, injeção intracavernosa com prostaglandina e analgésicos - para superar as consequências físicas das lesões e sequelas supra melhor descritas.
 (…)
53. Em virtude das lesões sofridas e da irreversibilidade das sequelas atuais e permanentes causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor, padece atualmente de: Um Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 31 pontos; (…)
53.A -  Entre a data do evento – 08/05/2016 - e a data da consolidação das lesões – 18/06/2018 – o quantum doloris, ou seja, o sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo A. é fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta as lesões resultantes, o período de recuperação funcional, o tipo de traumatismo e os tratamentos efectuados.
53.B – O dano estético permanente na pessoa do A.  é fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta a claudicação da marcha, a utilização de ajudas técnicas e as cicatrizes.
53.C – A Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer é fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente, tendo em conta o abandono da prática de ciclismo de lazer e futsal com amigos.
53.D - Em virtude do processo evolutivo das lesões no sentido da cura ou da consolidação, o A. viu condicionada a sua autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social:
- de forma total, correspondendo a períodos de internamento e/ou de repouso absoluto, entre 08/05/2016 e 21/09/2016, sendo assim fixável num período de 137 dias ( Défice funcional temporário total);
- de forma parcial, correspondendo ao período que se iniciou logo que a evolução das lesões passou a consentir algum grau de autonomia na realização daqueles actos, ainda que com limitações, entre 22/09/2016 e 18/0672018, sendo assim fixável num período 635 dias (défice funcional temporário parcial).
(…)
54. As sequelas supra descritas de que o Autor é portador, [implicam com actividades] que exijam boa mobilidade, força, resistência ao esforço e velocidade dos membros inferiores e superiores e que sejam predominantemente efetuadas de pé, manualmente e sentado.
55. (…) em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, o Autor atualmente e diariamente, necessita de forma irreversível de descansar por vários períodos de tempo já que não consegue manterse muito tempo de pé por períodos superiores a 30 minutos.
(…)
59. O Autor por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, teve necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, a varias intervenções cirúrgicas, de recorrer a consultas médicas de várias especialidades, de se submeter a várias sessões de fisioterapia e hidroterapia de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos (…)
(…)
61. O Autor em consequência das supra referidas lesões traumáticas sofridas em consequência do acidente de viação descrito nos presentes autos, sofreu múltiplas, frequentes e intensas dores durante todo o tempo que mediou entre o acidente de viação descrito nos presentes autos, os vários internamentos hospitalares, as várias intervenções cirúrgicas, os vários tratamentos médicos, os vários tratamentos clínicos, a recuperação funcional a que foi submetido, todos eles bastante dolorosos, o seu período de convalescença, a sua alta hospitalar e médica, os períodos de incapacidade temporária absoluta e parcial e a sua recuperação ainda que parcial.
62. O Autor na altura do acidente sofreu angústia de poder a vir a falecer.
63. O Autor esteve vários meses acamado nos vários hospitais em que esteve internado, com fixadores colocados na bacia durante cerca de dois meses, sem se poder locomover sozinho, necessitando de ajuda de terceira pessoa para satisfazer as suas necessidades básicas e fisiológicas mais elementares, tais como tomar banho, comer, beber e ir à casa de banho.
64. O Autor quando tomou conhecimento da sua situação clínica, enquanto estava internado, teve receio de nunca mais andar.
65. Embora não tão intensas, o Autor, em virtude das sequelas de que ficou a padecer atualmente, tem continuado e continuará a sofrer no futuro, de fortes dores físicas, incómodos e malestar durante o resto da sua vida, designadamente a nível da anca, bacia e região lombar.
66. As quais se exacerbam e agravam com as mudanças de temperatura e com os esforços e que o Autor até à data do acidente de viação descrito nos presentes autos não sentia.
67. O Autor por vezes tem dificuldades em dormir com as referidas dores a nível da anca, bacia e região lombar.
68. O Autor, antes e à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, sendo uma pessoa saudável, dinâmica, expedita, diligente e trabalhadora.
69. Era também uma pessoa alegre, confiante, cheia de projetos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade e alegria de viver, sendo uma pessoa calma, amante da vida, confiante, detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas.
70. O Autor, atualmente e desde a data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas atuais e permanentes de que a mesma padece tornouse uma pessoa triste, infeliz, introvertida, abalada psiquicamente, introvertida, fechada, deprimida, angustiada, sofredora, triste, insegura, muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore, desgostosa da vida e está constantemente a pensar nos seus problemas e limitações.
71. Em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afetivas.
72. O Autor após o acidente ficou a padecer de várias queixas, lesões e sequelas, as quais o irão acompanhar e afectar o resto da sua vida.
73. O Autor está assim consciente das suas limitações, sentindose inibido e diminuído fisicamente e esteticamente.
74. Em consequência das lesões causadas pelo acidente de viação descrito nos autos, o A. ficou a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite relações sexuais naturais e espontâneas, só lhe sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, tudo com repercussão na actividade sexual do A. de 5 numa escala de 7.
75. O que causa um grande desgosto, sofrimento e revolta ao Autor.
76. O Autor antes do acidente tinha uma vida sexual normal e feliz com a sua companheira.
77. O que contribuía bastante para a estabilidade emocional do casal.
(…)
3. O Autor, à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 50 (cinquenta) anos de idade, já que nasceu em .../.../1966.

Em essência e valorizável para efeitos de atribuição de indemnização por danos morais, temos a considerar:
a) do ponto de vista temporário:
-  o quantum doloris, ou seja, o sofrimento físico e psíquico vivenciado pelo A. entre a data do evento – 08/05/2016 - e a data da consolidação das lesões – 18/06/2018 – fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- o condicionamento da autonomia na realização dos actos correntes da vida diária, familiar e social de forma total fixável num período de 137 dias (cerca de 4,5 meses) e de forma parcial num período 635 dias (mais de ano e meio)
b) do ponto de vista permanente:
-  o A. ficou com um Défice Funcional Permanente da Integridade FísicoPsíquica fixável em 31 pontos;
- o dano estético permanente na pessoa do A.  é fixável no grau 4, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- a Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de lazer é fixável no grau 3, numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- o Autor em consequência das lesões, queixas e sequelas causadas pelo acidente de viação descrito nos presentes autos actualmente padece de Repercussão Permanente na Actividade Sexual fixável no grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente;
- embora não tão intensas, o Autor, em virtude das sequelas de que ficou a padecer atualmente, tem continuado e continuará a sofrer no futuro, de fortes dores físicas, incómodos e malestar durante o resto da sua vida, designadamente a nível da anca, bacia e região lombar, as quais se exacerbam e agravam com as mudanças de temperatura e com os esforços, gerando dificuldades em dormir e que o Autor até à data do acidente de viação descrito nos presentes autos não sentia.
- o Autor, atualmente e desde a data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, devido às lesões traumáticas sofridas e às sequelas atuais e permanentes de que a mesma padece tornouse uma pessoa triste, infeliz, introvertida, abalada psiquicamente, introvertida, fechada, deprimida, angustiada, sofredora, triste, insegura, muito nervosa, receosa de que o seu estado de saúde piore, desgostosa da vida e está constantemente a pensar nos seus problemas e limitações.
- em consequência das lesões e sequelas supra referidas, o Autor, padece atualmente de alterações de humor, do sono e alterações afetivas.
- o Autor está assim consciente das suas limitações, sentindose inibido e diminuído fisicamente e esteticamente.
- a Repercussão Permanente na Actividade Sexual causa um grande desgosto, sofrimento e revolta ao Autor.
- o Autor antes do acidente tinha uma vida sexual normal e feliz com a sua companheira.
- o Autor, antes e à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos presentes autos, era uma pessoa sem qualquer incapacidade física que lhe dificultasse a sua normal vida pessoal e profissional, sendo uma pessoa saudável, dinâmica, expedita, diligente e trabalhadora.
- era também uma pessoa alegre, confiante, cheia de projetos para o futuro, cheia de vida, possuidora de uma enorme vontade e alegria de viver, sendo uma pessoa calma, amante da vida, confiante, detentora de um temperamento afável e generoso que lhe permitia bons relacionamentos com as outras pessoas.
- o Autor, à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 50 (cinquenta) anos de idade, já que nasceu em .../.../1966.

Quanto á culpa do acidente dos autos, flui dos pontos 8, 11, 12, 13, 15, 18, 20, 28, 29 dos factos provados, que o mesmo ocorre por culpa exclusiva do condutor do veículo seguro na Ré, que ao descrever uma curva, em patamar, para a sua esquerda atento o sentido de marcha Guimarães/..., a uma velocidade superior a 70/80 Km/horários, perdeu o domínio do veículo, que invadiu a faixa de rodagem em que circulava o A. e foi embater com a parte lateral esquerda do meio, na parte frontal do motociclo conduzido pelo Autor.
A decisão recorrida atribuiu a titulo de danos morais a indemnização de € 100.000,00.

O A. pretende que a indemnização por danos morais seja fixada em € 175.000,00.

A Ré por sua vez defende que a indemnização por danos morais deve ser fixada em montante não superior a € 70.000,00.

Sopesando todos os elementos de facto elencados, os valores atribuídos na jurisprudência mais recente para casos similares, tendo em consideração o disposto no n.º 2 do art.º 566º do CC e aplicando o disposto no n.º 3 do mesmo normativo, tem-se como equitativa a indemnização a titulo de danos morais, atribuída pelo tribunal recorrido, no montante de € 100.000,00, actualizada á data da sentença.

Improcedem assim e nesta parte, quer o recurso do A., quer o recurso da Ré.

5.3. Dos juros de mora
Importa recordar que em sede de apreciação das nulidades da sentença, o ponto 3 foi considerado nulo in totum.

Mas, pese embora tal nulidade, importa ter em consideração o disposto no art.º 665º n.º 1 do CPC:
“ Ainda que se declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objecto da apelação”.

O que significa apurar, agora, de facto e de direito, se sobre as indemnizações a que o A. tem direito, incidem, ou não, juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável, como pretende o A. no seu recurso e, caso assim seja, fixar a data desde que os mesmos são devidos.

Destarte, impõe-se apreciar se sobre as indemnizações a que o A. tem direito - de € 445,22 a titulo de danos patrimoniais emergentes, € 200.000,00 a titulo de indemnização por perda de capacidade de ganho e € 100.000,00 a título de danos morais -, incidem, ou não, juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável, e, caso assim seja, fixar a data a partir da qual os mesmos são devidos.

São, portanto, duas questões distintas: a taxa de juro e a data a partir do qual são devidos.

Vejamos

O DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto, que aprova  o regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel e transpõe parcialmente para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2005/14/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de Maio, que altera as Directivas n.os 72/166/CEE, 84/5/CEE, 88/357/CEE e 90/232/CEE, do Conselho, e a Directiva n.º 2000/26/CE, relativas ao seguro de responsabilidade civil resultante da circulação de veículos automóveis ( cfr. art.º 1º do citado diploma), veio estabelecer no seu Capitulo III, que abrange os artigos 31º a 46º, as regras e os procedimentos a observar pelas empresas de seguros com vista a garantir, de forma pronta e diligente, a assunção da sua responsabilidade e o pagamento das indemnizações devidas em caso de sinistro no âmbito do seguro de responsabilidade civil automóvel ( cfr. art.º 31º do citado diploma).

Neste sentido, o art.º 37.º, cuja epígrafe é “Diligência e prontidão da empresa de seguros na regularização dos sinistros que envolvam danos corporais”, estabelece no n.º 1 um conjunto de obrigações para a seguradora, nomeadamente, sempre que lhe seja comunicada pelo tomador do seguro, pelo segurado ou pelo terceiro lesado a ocorrência de um sinistro automóvel coberto por um contrato de seguro e que envolva danos corporais, a empresa de seguros deve, relativamente à regularização dos danos corporais: (…) c) Comunicar a assunção, ou a não assunção, da responsabilidade no prazo de 45 dias, a contar da data do pedido de indemnização, caso tenha entretanto sido emitido o relatório de alta clínica e o dano seja totalmente quantificável, informando daquele facto o tomador do seguro ou o segurado e o terceiro lesado, por escrito ou por documento electrónico.

Como decorre do normativo citado, o legislador utilizou a apresentação de um pedido de indemnização por parte do lesado, como elemento desencadeador da contagem do prazo para a regularização dos danos corporais.

Por outro lado, o prazo de 45 dias conta-se da data do pedido de indemnização, desde que tenha entretanto sido emitido o relatório de alta clínica e o dano seja totalmente quantificável.

Se assim não suceder estabelece o n.º 2 do mesmo normativo que, caso no referido prazo de 45 dias, a contar da data do pedido de indemnização, não seja emitido o relatório de alta clínica ou o dano não seja totalmente quantificável:
a) A assunção da responsabilidade aí prevista assume a forma de «proposta provisória», em que nomeia especificamente os montantes relativos a despesas já havidas e ao prejuízo resultante de períodos de incapacidade temporária já decorridos;
b) se a proposta prevista na alínea anterior tiver sido aceite, a empresa de seguros deve efectuar a assunção da responsabilidade consolidada no prazo de 15 dias a contar da data do conhecimento pela empresa de seguros do relatório de alta clínica, ou da data a partir da qual o dano deva considerar-se como totalmente quantificável, se posterior.

E dispõe o n.º 1 do art.º 39º do mesmo diploma, cuja epígrafe é “Proposta razoável para regularização dos sinistros que envolvam danos corporais”, que a posição prevista na alínea c) do n.º 1 ou na alínea b) do n.º 2 do artigo 37.º consubstancia-se numa proposta razoável de indemnização, no caso de a responsabilidade não ser contestada e de o dano sofrido ser quantificável, no todo ou em parte.

Em caso de incumprimento dos deveres fixados nas alíneas c) do n.º 1 ou b) do n.º 2 do art.º 37º, o n.º 2 do art.º 39º manda aplicar o n.º 2 do art.º 38º, donde resulta que são devidos juros no dobro da taxa legal prevista na lei aplicável ao caso sobre o montante da indemnização fixado pelo tribunal ou, em alternativa, sobre o montante da indemnização proposto para além do prazo pela empresa de seguros, que seja aceite pelo lesado, e a partir do fim desse prazo.

Em concreto verifica-se o seguinte.

Resulta do ponto 89 dos factos provados que a 09/06/2016, a Ré declarou ao A. que assumia a responsabilidade pelo sinistro.

A referida assunção de responsabilidade foi efectuada antes de o A. formular qualquer pedido de indemnização.

Como resulta do ponto 90 dos factos provados, tal pedido só foi apresentado a 05/07/2018, pedido esse que elenca os diversos danos sofridos e é acompanhado de cópia dos Relatórios de Avaliação do dano Corporal em Direito Civil e em Direito do Trabalho que constituem os doc .s 21 e 22 juntos com a PI e do recibo de vencimento de Abril de 2016.

Como já ficou referido supra, nos termos conjugados dos art.ºs 37º n.º 1, alínea c) e 39º n.º 1, a contar da data do pedido de indemnização e desde que tivesse sido emitido relatório de alta clínica e o dano fosse totalmente quantificável, a Ré tinha 45 dias para apresentar uma proposta razoável de indemnização, ou seja, até 20 de Agosto.

Está provado – ponto 44 – que a Ré atribuiu alta clinica ao Autor em 06/02/2017.

Porém, a factualidade nada nos diz quanto à emissão de um Relatório de alta clinica.

No entanto está provado – ponto 93 – que a 02/07/2018 o médico da Ré elaborou um Relatório Final de Avaliação do Dano Corporal que constitui o documento n.º ... junto com a contestação, o qual contem uma parte relativa à história do evento, com dados documentais, uma parte relativa ao estado actual, ao exame objectivo, á discussão, com referência ao nexo de causalidade, data da consolidação, danos temporários e permanentes sofridos pelo A. e Conclusões.

Ou seja: mais do que um Relatório de alta clinica, na referida data a Ré teve acesso a um Relatório que continha todos os elementos relativos aos danos corporais, temporários e permanentes.

O que o legislador pretende é que a seguradora tenha elementos que lhe permitam formular uma proposta de indemnização razoável.

E esse elemento existia na forma do citado relatório.

Mas a ré defende-se dizendo que dada a divergência entre o Relatório elaborado pelo seu médico e o Relatório de Avaliação do dano Corporal apresentado pelo A. no que diz respeito à “Repercussão permanente na Actividade Profissional”, o dano não era quantificável e entretanto o A. propôs a acção.

Está provado – ponto 93 dos factos provados - que o Relatório Final de Avaliação do dano Corporal elaborado pelo médico da Ré, no âmbito dos danos permanentes, refere: “Repercussão permanente na Actividade Profissional: pode manter a sua actividade profissional habitual, mas com esforços acrescidos.”

Está também provado – ponto 46 dos factos provados - que o Relatório de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil que acompanhava o pedido de indemnização do A. considerava que as sequelas de que o A. tinha ficado a padecer eram, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, incompatíveis com o exercício da actividade habitual; O sinistrado está Incapacitado de forma permanente e absoluta para a sua actividade profissional habitual (IPATH).

Porém, nada permite afirmar que a referida divergência impedia a Ré de quantificar o dano. Pelo contrário. O que a referida divergência tornava aceitável era apenas e tão só uma quantificação inferior à do A. Mas não impossibilitava a quantificação.

Assim sendo, a 05/07/2018, a Ré tinha todos os elementos para no prazo de 45 dias – até 20 de Agosto - apresentar uma proposta razoável de indemnização, ou seja, tinha um Relatório de Avaliação do Dano Corporal e o dano era quantificável.

Como resulta do ponto 91 dos factos provados, até á data da propositura da acção – 02/10/2018 -, a Ré nunca apresentou ao A. qualquer proposta de indemnização.

Neste conspecto e á luz do disposto no n.º 2 do art.º 38º, aplicável ex vi o n.º 2 do art.º 39º e por incumprimento do dever previsto na alínea c) do n.º 1 do art.º 37º, do DL n.º 291/2007, de 21 de Agosto,  sobre as indemnizações a que o A. tem direito -  € 445,22 a titulo de danos patrimoniais emergentes, € 200.000,00 a titulo de indemnização por perda de capacidade de ganho e € 100.000,00 a título de danos morais -, incidem juros de mora calculados ao dobro da taxa aplicável.

Nas obrigações pecuniárias os juros devidos são os legais ( juros civis) – art.º 806º n.º 2 do CC – juros esses que são á taxa de 4% -  Portaria n.º 291/03, de 08.04..
Destarte e sobre os referidos montantes incidem juros de mora á taxa de 8%.

Resta saber desde quando são devidos tais juros.

O DL. 291/2007 nada dispõe quanto a esta matéria. Tal diploma legal só regula a taxa a que são calculados os juros.

A data desde quando são devidos é regulada pela lei civil.

Nos termos do n.º 1 do art.º 805º do CC o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.

Mas o n.º 2, alínea b) dispõe que há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação, seja ela judicial ou extra-judicial, se a obrigação provier de facto ilícito.

Como referem Pires de Lima e Antunes Varela, in CC Anotado, anotação ao art.º 805º (antes da alteração introduzida no n.º 3) “[t]rata-se de excepção admitida sem reserva pelos autores, e que se harmoniza com a regra geral expressa, entre nós, no artigo 483º: aquele que viola ilicitamente o direito de outrem fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. Por consequência, deve indemnizar o lesado de todo o prejuízo por ele sofrido desde o momento da violação – e não desde a data de qualquer acto posterior.”

Mas o n.º 2 pressupõe que o crédito é liquido.

Sucede que no domínio da responsabilidade civil por facto ilícito, o crédito indemnizatório só vem a ser liquidado definitivamente na sentença ou, havendo recurso de apelação da mesma, no acordão da Relação ou, sendo interposto recurso de revista, no acórdão do STJ.

E assim dispõe o n.º 3 do art.º 805º do CC:
3 - Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número.

Ou seja: resulta da 2ª parte do n.º 3 do art.º 805º do CC que se o crédito for ilíquido e se tratar de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número, ou seja, se no momento da citação o crédito já se tiver tornado liquido ou a falta de liquidez for imputável ao devedor.

O A. pediu a  condenação da Ré a pagar juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes que forem fixados ao Autor na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais, contados desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016), ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018), ou desde a data da citação da Ré, ou desde a data que vier a ser estabelecida na decisão judicial e até efetivo e integral pagamento, os quais o Autor desde já peticiona da Ré.

Não há qualquer fundamento legal para condenar a Ré a pagar juros de mora desde 22/02/2016 (15 dias após a alta clinica atribuída pelos serviços clínicos da Ré em 06/02/2016) ou desde 18/08/2018 (45 dias a contar da data da formulação do pedido de indemnização formulado pelo Autor à Ré em 05/07/2018).

Apenas haverá fundamento legal para condenar a Ré a pagar juros de mora vencidos e vincendos calculados no dobro da taxa prevista na lei aplicável ao caso, sobre os montantes fixados na decisão judicial a titulo de danos patrimoniais e não patrimoniais desde a data do facto ilícito – 08/05/2016 – ( art.º 805º, n.º 2, alínea b) do CC) - ou desde a data da interpelação judicial para pagar com a citação – 805º n.º 1 do CC.

Não tendo sido pedida a condenação da Ré a pagar juros de mora desde a data do facto ilícito, apenas pode ser considerada a data da citação da Ré que ocorreu a 08/10/2018, como resulta do AR junto aos autos a 12/10/2018.

Mas se isto é assim para a quantia de € 445,22, já não o é para as quantias atribuídas a titulo de perda da capacidade de ganho e danos não patrimoniais.

Como se deixou dito supra, as referidas quantias são atribuídas de forma actualizada, ou seja, tendo em consideração o momento da sua atribuição.

E, sendo assim, tem aplicação o Acórdão Uniformizador n.º 4/2002, de 27.06.2002, publicado no D.R., 1.ª Série A, n.º 146, o qual fixou jurisprudência no seguinte sentido:
Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação.

Neste conspecto e sintetizando:
- sobre a quantia de € 445, 22, há lugar a juros de mora vencidos desde a citação – 08/10/2018 – até à data deste acordão, calculados á taxa de 8% e vincendos desde a data deste acordão até integral pagamento, ao dobro da taxa de juros civis que vigorar;
- sobre a quantia de € 180.000,00, há lugar a juros de mora vincendos desde a data deste acórdão até integral pagamento, calculados ao dobro da taxa de juros civis que vigorar;
- sobre a quantia de € 100.000,00, há lugar a juros de mora vencidos desde a data da sentença da 1ª instância até à presente data, á taxa de 8% e vincendos desde a data deste acordão até integral pagamento, calculados ao dobro da taxa de juros civis que vigorar.

Em consequência o recurso do A. deve ser julgado parcialmente e em consequência deve ser revogada 2ª parte do ponto 4 do decisório, que tem o seguinte teor: “… a que acrescem juros vencidos e vincendos (actualmente, à taxa de 4%, desde 1 de Maio de 2003, cfr. Portª nº 291/2003, de 8-4) calculados a partir da data da prolação da sentença, até efectivo pagamento.”
           
5.4. Da indemnização da A. BB
O art.º 496º n.º 1 do CC dispõe que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

E o n.º 2 dispõe que por morte da vitima, o direito á indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes , e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem.

Não havendo dúvida quanto á indemnização dos danos não patrimoniais dos familiares identificados no citado n.º 2, em caso de morte da vitima, a jurisprudência dividiu-se quanto á questão de saber se o art.º 496º n.º 1 do CC abrangia os danos morais sofridos pelo cônjuge da vitima sobrevivente.
           
Encurtando caminho e razões, a 16/01/2014 o Supremo Tribunal de Justiça proferiu o Acordão Uniformizador de Jurisprudência n.º 6/2014, publicado no DR 1ª Série, de 22 de maio de 2014 e que uniformizou jurisprudência no seguinte sentido:

“ Os artigos 483º n.º 1 e 496º n.º 1 do Código Civil devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais, particularmente graves, sofridos por cônjuge de vitima sobrevivente, atingida de forma particularmente grave”.
           
Uniformizada que está a jurisprudência e não havendo razões para dela divergir, a questão que se coloca é a do preenchimento da expressão utilizada na fórmula uniformizadora “danos não patrimoniais, particularmente graves” e apurar os valores atribuídos na jurisprudência mais recente para casos similares.
           
Quanto á primeira questão, refere-se no citado AUJ:
“ (…)
Noutro prisma, repare-se que, no caso dos danos como o que aqui está em apreciação, estamos a lidar com sofrimentos intensíssimos, arrastando toda uma alteração de vida, com perda quase total de momentos positivos e de liberdade pessoal.
(…)”

No caso apreciado pelo AUJ ficou provado, nomeadamente, que:
“ (…)
23. Mercê do embate e decorrentes lesões, o autor ficou a padecer de incapacidade total para a sua profissão e para outras que envolvam a locomoção permanente ou carga e esforço – resp. 51º da BI.
24. Apesar da medicação que faz com ansiolíticos, indutores de sono e anti-depressivos mantém manifestações de ansiedade, flutuações de humor e do estado de ânimo e instabilidade emocional – resp. 52º da BI.
25. As sequelas de que ficou a padecer determinam-lhe uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 80% – resp. 53º da BI.
26. Na data do embate, o autor não tinha qualquer doença ou deformidade e era dinâmico e trabalhador – resp. 54º da BI.
27. A A passou a viver para o marido que não é capaz de sair de casa sozinho – resp. 58º da BI.
28. A autora sente-se triste e confrangida por ver que o marido, que era pessoa alegre e bem disposta, dinâmica e trabalhadora, está um homem triste e desanimado, sente-se amargurada, com desesperança, sem qualquer esperança de que esta situação possa melhorar – resp. 59º e 60º da BI.
(…)
30. Desde a data do choque esteve completamente impossibilitado de trabalhar até hoje – resp. 66º da BI.
31. O autor precisa de ajuda permanente de uma terceira pessoa que o ajude a vestir, a tomar banho, a barbear, a acompanhá-lo para ir tomar um café – resp. 68º da BI.
32. Após a alta hospitalar em 04.03.2005 foi a esposa que passou a cuidar dele – resp. 69º da BI.
34. O A vai precisar de efectuar fisioterapia de manutenção durante toda a vida mas de forma não continuada – resp. 73º da BI.
35. A A continua a cuidar do autor, pois não tem possibilidades financeiras para contratar uma terceira pessoa – resp. 82º da BI.
(…)”

Ainda no referido AUJ, ponto 26, escreveu-se:
“ (…)
26 . Assim como não podemos abrir a compensabilidade a todo um “coro de chorosos”, também não a podemos abrir a todo o dano não patrimonial que, no caso do lesado, justificaria a tutela do direito.
Toda a argumentação que justifica a interpretação atualista que vimos assumindo tem como pressuposto que os danos do lesado sejam particularmente graves e que tenham determinado no outro sofrimento muito relevante. Já Vaz Serra, no apontado texto da RLJ, justificava a sua posição com o caso dum filho que é atingido tão gravemente que os pais têm sofrimento não inferior ao que teria lugar se tivesse falecido. Do mesmo modo os textos internacionais citados supra são especialmente limitadores.
A interpretação atualista arrasta consigo, limitando-a, a sua própria justificação.
Que inexiste no caso em que as lesões não são graves e/ou o chegado ao lesado não tem sofrimento intenso. Repare-se que lesões ligeiras, demandando, por regra, compensação por danos não patrimoniais, demandam também, principalmente no caso de crianças ou outros dependentes, danos não patrimoniais aos ligados afetivamente àqueles. Por isso, não podemos interpretar o artigo 496.º, n.º 1 equiparando a vítima ao que lhe está afetivamente ligado. Passaria a ser regra a “pulverização” indemnizatória, em dissintonia com o princípio-base de que é àquela que assiste o direito à compensação.
Temos de ter sempre presente que estamos a abrir uma brecha na dogmática geral de que é a vítima, se sobreviver, a pessoa a indemnizar. Não podemos interpretar o preceito acabado de referir como se dissesse “Na fixação das indemnizações…”.
Por isso, entendemos dever reservar a extensão compensatória apenas para os casos de particular gravidade.
Decerto que, com esta posição, fica uma linha delimitadora algo incerta. Nalguns casos a subsunção é evidente, mas noutros será sempre exigido esforço jurisprudencial. Contudo, cremos não poder, nem dever ir mais além na tentativa, que seria vã, de procurar nitidez. O que cremos dever ser precisada é a exigência de particular gravidade em duas vertentes: uma, quanto aos ferimentos da vítima sobrevivente e outra quanto ao sofrimento do cônjuge.
Geralmente uma determina a outra mas pode assim não ser e a argumentação no sentido da interpretação atualista só se concebe, verificadas as duas.
E aqui, ao contrário do referido no número anterior, não se coloca a questão da invasão do poder legislativo, porquanto a alusão à “particular gravidade”, não deixa de fora, quanto aos limites objetivos, o que quer que seja que careça de estatuição.”

Antes de avançar há que abordar a questão suscitada pela Ré: à data do acidente o A. e a A. viviam em união de facto, só tendo casado posteriormente.

É efectivamente assim, pois o acidente dos autos ocorreu a 08 de Maio de 2016 (ponto 1 dos factos provados) e os AA. casaram entre si a ... ( ponto 81 dos factos provados).

Porém, tal facto, por si só, não exclui o direito da A. de ser indemnizada.

É um facto que o AUJ 6/2014 teve na base uma situação em que estava um cônjuge, ou seja, a A. era casada com o lesado.

Porém, esse facto não é, em si mesmo determinante, pois a jurisprudência tem vindo a aplicar a doutrina do AUJ a outras situações, como seja a dos pais.

E, nos seus termos fundamentais, nada obsta a que seja aplicada aos pais ou a um unido de facto, tendo-se afirmado no Ac. do STJ de 15/12/2022, proc.550/14.1T8PVZ.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj (em que se apreciava os danos morais dos pais de uma menor atacada por um cão) ( sublinhados nossos): “O AUJ n.º 6/2014, (…) assumiu uma leitura atualista do disposto nos artigos 483.º, n.º 1, e 496.º, n.º 1, do Código Civil, de modo a que a dor e o sofrimento, particularmente graves, das pessoas com uma relação afetiva de grande proximidade com o lesado fosse indemnizável em situações em que este, apesar de sobrevivente, tivesse sofrido lesões, também elas particularmente graves.
É esta a orientação que deve ser seguida, procurando verificar-se, no caso concreto, se estas exigências se encontram preenchidas, justificando-se ou não reconhecer a esses terceiros um direito de indemnização […].
Nesta operação a realizar num campo em que o traçado das margens é ténue e irregular na determinação do que é “particularmente grave” há que valorar, por um lado, as caraterísticas das lesões sofridas e das suas sequelas, e por outro lado, o grau de sofrimento das pessoas mais próximas do lesado assistirem ao padecimento de um ente querido, além da privação da qualidade do relacionamento com este e ainda o custo existencial do acréscimo das necessidades de acompanhamento.

A união de facto é definida pelo art.º 1º n.º 2 da Lei n.º 7/2011, de 11 de maio, como “a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos.”
Ou seja: materialmente estamos perante uma situação em que duas pessoas, independentemente do sexo, vivem em condições análogas às dos cônjuges.
E o reconhecimento da mesma depende dessa vivência à mais de dois anos.

Por outro lado, nos termos do n.º 1 do art.º 3º da citada Lei, as pessoas que vivem em união de facto nas condições previstas na presente lei têm os direitos ali definidos, nomeadamente:

e) Protecção social na eventualidade de morte do beneficiário, por aplicação do regime geral ou de regimes especiais de segurança social e da presente lei;
f) Prestações por morte resultante de acidente de trabalho ou doença profissional, por aplicação dos regimes jurídicos respectivos e da presente lei;
g) Pensão de preço de sangue e por serviços excepcionais e relevantes prestados ao País, por aplicação dos regimes jurídicos respectivos e da presente lei.

Além disso, nos termos do n.º 2, estão ressalvadas outras disposições legais tendentes à protecção jurídica de uniões de facto ou de situações de economia comum.

A protecção jurídica das uniões de facto traduz uma expansão do sistema jurídico que “é natural; ela não é mais do que uma consequência da própria expansão do principio da igualdade e dos direitos fundamentais dos cidadãos. Onde há sujeitos de direito há direitos fundamentais. Sobretudo quando dois sujeitos entram numa relação de convivência intima e intensa – que se apresenta comoanáloga à dos cônjuges…” ( cfr. Guilherme de Oliveira, Manual de Direito da Família, Almedina, 2ª edição, 2022, pág. 385).

A união de facto tem sido considerada uma relação para familiar, por preencher o critério da similitude mínima com as relações familiares (Jorge Duarte Pinheiro, O Direito da Família Contemporâneo, 4ª edição, AAFDL, 2013, pág. 689)

Finalmente e da mesma forma que o casamento tem na sua base uma relação afetiva de grande proximidade, o mesmo sucede com a união de facto.
Como refere Guilherme de Oliveira, Manual de Direito da Família, Almedina, 2ª edição, 2022, pág. 385 “união de facto” quer dizer apenas união que não é formalmente celebrada, nem formalmente registada”.

Neste contexto, desde que alguém demonstre que: i) vivia com a vitima de um facto ilícito em condições análogas às dos cônjuges, há mais de dois anos, tendo em consideração a data do facto ilícito; ii) que mantinha com a mesma uma relação afetiva de grande proximidade; iii) que a vida de relação, nomeadamente, mas não só, a vida sexual ficou gravemente prejudicada em virtude das sequelas emergentes do facto ilícito; iv) e que tal prejuízo lhe causa um sofrimento particularmente grave, estão verificadas as condições para o unido de facto ter direito a indemnização por danos morais ( a graduar, naturalmente, em função do caso concreto) á luz da doutrina do AUJ 6/2014.

O facto de a A. viver em união de facto com o A. à data do acidente e entretanto ter casado com o mesmo, traduz uma mera formalização do que já existia materialmente: vivia em condições análogas às dos cônjuges com o A..

Muito embora não seja relevante para o caso, já que o que releva é a data do facto ilícito, pois é esse facto que é fonte do dever de indemnizar, concede-se que tendo o casamento ocorrido muito depois do facto  ilícito e também depois da consolidação médico-legal das sequelas de que o A. ficou a padecer, não pode a A. invocar que a incapacidade do A. compromete gravemente os direitos de coabitação (no qual se inclui o débito conjugal), cooperação e assistência de que o 2ª Autora é titular, conforme o disposto no art. 1672.º do CC, porque a mesma já sabia a situação em que o A. se encontrava e ainda assim casou.

Improcede, portanto e in totum, toda a argumentação da Ré no sentido da exclusão do direito á indemnização à A. QQ.

Quanto á segunda questão, ou seja, verificar os valores atribuídos na jurisprudência mais recente para casos similares, tendo em consideração que a união de facto é “a situação jurídica de duas pessoas que, independentemente do sexo, vivam em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos”, há que ter em consideração a jurisprudência relativa a pessoas casadas entre si.

Assim:
- no Ac. da RC de 01.04.2014., proc. 498/12.4TBNV.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc, manteve-se a decisão de atribuir a indemnização ao cônjuge, mas alterou o respectivo valor de € 40.000,00 para € 25.000,00.
O referido acórdão não transcreve a matéria de facto, mas nos seus fundamentos refere:
Mostram os autos que, na sequência do embate descrito e das lesões sofridas por P…, este ficou paraplégico, com total insensibilidade dos membros inferiores; ficou incontinente, passou a sofrer de impotência pós-vascular traumática; os seus intestinos deixaram de funcionar de forma natural; ficou obrigado a mudar de posição de duas em duas horas, para não se ferir e criar escaras.
Mais, na sequência do embate descrito e das lesões sofridas, P… apresenta um quadro neuromotor de paraplegia ASIA A, com nível neurológico D11, encontra-se algaliado em drenagem contínua para sistema fechado; necessita de treino intestinal, com medicação em dias alternados; apresenta tónus muscular nos membros inferiores; e encontra-se dependente em AVD’s; e apresenta uma incapacidade permanente parcial de 75%. − P… necessita de reeducação vesico-esfinteriana intestinal e sexual. − Necessita de assistência médica permanente. − Necessita de substituição permanente dos mecanismos ligados à incontinência. − Por virtude do acidente em causa e das lesões de que P… ficou portador, a Autora sente profundo desgosto por vê-lo incapacitado e sente-se traumatizada pela sua incapacidade.
A partir da data do embate, até hoje e futuramente, P… ficará na dependência da Autora.
A Autora deixou de ter vida autónoma, pois P… não se lava, não se veste, não se deita sozinho, nem consegue ultrapassar sem ajuda as barreiras arquitectónicas que enfrenta na cadeira de rodas que necessita para se movimentar.
A vida sexual normal da Autora e de P… jamais é possível, pois este ficou impotente, e impossibilitado de ter relações sexuais, erecção e ejaculação.
A Autora sente desânimo perante a vida, podendo vir a desenvolver quadro clínico do foro psiquiátrico.
Na gestão da casa, designadamente compra de géneros alimentícios e limpezas, ou na orientação dos filhos menores, P… deixou de poder dar o mais elementar apoio.
Poderemos concluir, que estas lesões são muitíssimo relevantes, em termos pessoais, sociais e económicos.”
                                               
- no Ac. do STJ de 01.07.2014., proc. 6607/09.3TVLSB.L1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, foi confirmada a decisão de atribuir indemnização ao cônjuge, fixada em € 50.000,00 considerando a seguinte factualidade:
- O 1º A. passou a ter necessidade de acompanhamento das especialidades de psicologia e psicoterapia a partir de Junho de 2008, tendo recorrido aos serviços da Dra. M C, e a partir de Janeiro de 2009 de uma psiquiatra (resp. ao nº 49);
- Devido ao acidente, o 1º A. ficou com uma incapacidade permanente e absoluta para todo e qualquer trabalho, com necessidade de assistência permanente de 3ª pessoa a tempo inteiro (resp. ao nº 52);
- Devido ao traumatismo craniano, e para além do que consta do n.º 39, o A teve dificuldades em adormecer (resp. ao nº 54);
- O 1.º A. passou a estar em constante estado de depressão, tristeza, apatia e ausência (resp. ao nº 56);
- Deixou de ser uma pessoa sociável e de fácil relacionamento, incluindo com a sua mulher (resp. ao nº 57);
- Deixou de poder ter vida social e de realizar actividades de lazer e de carácter lúdico tais como ir ao cinema, espectáculos ou viajar (resp. ao nº 59);
- Devido às lesões sofridas no acidente, o A. sofreu dores e tomou medicação (resp. ao nº 60);
- O A sofreu desgaste emocional e físico devido ao período de tempo que passou entre hospitais, tratamentos diversos e exames médicos (resp. ao nº 61);
- A 2ª A deixou de poder realizar actividades de lazer com o 1º A., tais como ir cinema, espectáculos, jantar fora ou viajar (resp. ao nº 64);
- As diversas deslocações aos hospitais, aos tratamentos, ao Tribunal e o presenciamento do agravamento do estado de saúde do 1º A. causaram à 2ª A. desgaste emocional e físico (resp. ao nº 67);
- A 2ª A. sente-se triste, angustiada, frustrada, revoltada e deprimida (resp. ao nº 68);
- O facto de o 1º A. depender da 2ª A implica uma responsabilidade que assusta a 2ª A. (resp. ao nº 69);
- A 2ª A. nasceu no dia .../.../1987, conforme certidão de fls.396 a 399;
- O 1º A e a 2ª A. celebraram entre si casamento no dia 30.08.2003, conforme certidão de fls. 479 e 480;
- Deixou (o 1.º A.) de ter capacidade sexual (resp. ao nº 58).
- O que impede a existência de vida sexual entre o 1º e a 2ª AA. (resp. ao 65).
- E impede a realização do desejo da 2ª A. de ter filhos da relação que mantém com o 1º A. (resp. ao nº 66).

- no Ac. da RC de 26.01.2016., proc. 6707/08.7TBLRA.C1, consultável in www.dgsi.pt/jtrc, foi revogada a decisão da 1ª instância de atribuir indemnização.
Neste acórdão a factualidade relevante era:
65) B... temeu pela perda da vida de A... , sua esposa de quem muito gosta e estima (resposta ao art. 52.º da base instrutória).
66) Sentiu-se triste, desgostoso e angustiado por causa do sucedido a A... e ao seu agregado familiar (resposta ao art. 53.º da base instrutória).
67) As lesões sofridas pela Autora em consequência do embate e a diminuição do seu desejo sexual decorrente dessas lesões e das dores inerentes originaram uma situação de abstinência sexual por período não concretamente apurado (resposta aos arts. 54.º e 55.º da base instrutória).
(…)
69) Também os filhos do casal, que ficaram sem o apoio materno durante o internamento de A... , temeram pela perda da vida da mãe (resposta ao art. 57.º da base instrutória).
70) Andaram tristes e angustiados, nervosos e ansiosos, pela ausência da sua companhia e carinho durante os meses de internamento (resposta ao art. 58.º da base instrutória).
71) Pois temeram perder a sua mãe, bem como estiveram privados, durante largos meses, da convivência, companhia, cuidados e carinho maternos, tendo passado a época festiva do Natal e Ano Novo de 2005 sem a sua companhia, sentido muito a sua falta, o que os deixou tristes e angustiados.
72) A D... , após o sinistro, foi acompanhada por psicólogo (resposta ao art. 59.º da base instrutória).
73) Teve medo de estar sozinha em casa e de adormecer sem a mãe, vivendo em estado de ansiedade até que esta a fosse buscar à escola ou surgisse em casa (resposta ao art. ...0.º da base instrutória).
74) O acidente da progenitora deixou marcas profundas na vida da D... (que a partir dessa altura, desenvolveu angústias maciças de perda, originando um sofrimento colossal, não querendo deixar a mãe sozinha, tendo dificuldade em ver a mãe numa cama de hospital e ainda fantasiando permanentemente situações de ameaça e perigo iminente), que do ponto de vista psico-afectivo, em muito contribuíram para o agravamento das suas angústias, ansiedade e consequentemente da sua situação social e individual, contribuindo para um aumento substancial da sua insegurança emocional.
75) No ano escolar de 2005/2006, e nos que se seguiram, os filhos do casal viram diminuído o seu aproveitamento escolar por falta de empenho e zelo, o que não sucedia antes do sinistro (resposta aos arts. 61.º e 62.º da base instrutória).
76) Depois do sinistro, C... passou a ser uma criança fechada e triste, antipática, irritadiça, revoltada (resposta ao art. 63.º da base instrutória).
77) Com as limitações físicas da Autora, os menores deixaram de ter a sua companhia e colaboração nas mais variadas brincadeiras, como saltar à corda, jogo da macaca, e práticas desportivas, que com ela mantinham, dada a grande cumplicidade existente no agregado familiar, o que se projectou na formação da sua personalidade; Os menores sentiram-se sozinhos e abandonados, perante uma situação para a qual em nada contribuíram e que resultou directamente do acidente em causa nos presentes autos, sofrido pela sua mãe.
78) Ainda hoje se sentem revoltados tristes e amargurados ao ver a sua mãe a chorar e a ver o constante sofrimento físico e emocional, vendo que ela não pode fazer muitas das coisas que gostava de fazer, nomeadamente nas brincadeiras e actividades com os seus filhos.
79) Ainda hoje os filhos sofrem por causa das limitações físicas da mãe e do seu sofrimento emocional (resposta ao art. 65.º da base instrutória).

Neste acórdão entendeu-se que:
“ (…)
Ora, no caso sub judice, a gravidade das lesões sofridas pela Autora, A... , e a gravidade dos danos sofridos pelos demais Autores fica muito aquém, porquanto, não obstante as dores que sente e a dificuldade de execução de alguns movimentos, a Autora não ficou privada de nenhuma parte do seu corpo, não ficou privada da sua liberdade e autonomia e não ficou dependente de terceira pessoa para todas as tarefas básicas do seu dia-a-dia (ressalvando, naturalmente, o período de internamento hospitalar e sem prejuízo de necessitar ainda de alguma ajuda na execução de algumas tarefas que lhe exijam mais esforço); por outro lado, essas lesões e sequelas não têm aptidão para causar aos demais Autores um desgosto e sofrimento de particular e extrema gravidade e tão pouco são idóneas para lhes determinar uma alteração significativa no seu quotidiano e na sua liberdade pessoal. Note-se, por outro lado, que não decorre da matéria de facto provada que a situação de abstinência sexual originada pelo acidente tenha ultrapassado o período correspondente ao internamento e à recuperação das lesões sofridas – período em que ela surge como uma situação normal e comum a todos os acidentes que provoquem lesões e internamento – e nada de concreto se provou que permita concluir que essa situação tenha carácter permanente ou prolongado e que, nessa medida, possa afectar, em termos especialmente graves, a qualidade da relação afectiva e matrimonial ou a realização pessoal do Autor.
(…)”

- no Ac. do STJ, de 02/06/2016, proc. 3987/10.1TBVFR.P1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, ficou provado que Em consequência das lesões originadas pelo acidente ou da medicação que teve de tomar, o A. ficou sexualmente impotente – resposta ao art.º 24.º da base instrutória; “A A. sofre com o desgosto de estar impedida de, para sempre, se relacionar sexualmente com o A. – resposta ao art.º 29.º da base instrutória correspondente ao ponto 1.28. “ considerou que “É, pois, inquestionável, nem as partes disso dissentem, que estamos perante uma situação particularmente grave merecedora de tutela nos termos dos artigos 483.º, n.º 1, e 496.º, n.º 1, do CPC.” e manteve a indemnização de € 15.000,00 atribuída ao cônjuge.

- no Ac. do STJ de 08/03/2018, proc. 3310/11.6TBALM.L1.S1, consultável in wwww.dgsi.pt/jstj, consta do sumário:
V. Sendo o Autor casado, ao tempo do acidente com 37 anos, tendo ficado irreversivelmente impotente, e em função das lesões físicas sofridas a sua mulher sofreu, por esse facto, um dano não patrimonial grave ao projecto de vida, préjudice d’affection, que o casamento contempla, pelo que a impotência do marido, por causa das sequelas do acidente, constitui para si um importantíssimo dano moral, a que se atribui a compensação de € 17.000,00 tendo em conta a percentagem de conculpabilidade antes afirmada.

E na sua fundamentação consta:
“As partes não dissentem que é devida compensação por danos não patrimoniais ao Autor, nascido em ….1970, e à sua mulher, esta pelo facto de as lesões do marido serem determinantes da impossibilidade de manter relações sexuais com o seu marido, privando-a de ter filhos, o que lhe causa uma enorme infelicidade.
Como se provou - Em virtude das lesões causadas pelo acidente, o autor ficou com dificuldades na erecção e na ejaculação, que era de curta duração e desprovida de sensação de prazer, sendo essa repercussão permanente na sua actividade sexual qualificável como de grau cinco numa escala de sete graus de gravidade crescente.

Posteriormente, devido à cirurgia à bexiga causada pela neoplasia, o mesmo deixou de ter qualquer erecção, não mais podendo ter relações sexuais com a sua mulher, nem com o recurso a medicamentos ou outros tratamentos para o efeito, o que o impede de ter mais filhos e lhe causa uma profunda tristeza e frustração.

Os autores são casados entre si desde 6 de Novembro de 1999.” 
O Supremo Tribunal de Justiça, por Acórdão de 16 de Janeiro, AUJ nº 6/2014, Processo 6430/07.0TBBRG.S1, in Diário da República n.º 98/2014, Série I de 2014-05-22, uniformizou jurisprudência no sentido seguinte;
“Os artigos 483.°, n.°1 e 496.°, n.°1 do Código Civil devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais, particularmente graves, sofridos por cônjuge de vítima sobrevivente, atingida de modo particularmente grave.”
Muito embora aqui não se trate de vítima mortal e da compensação por danos não patrimoniais ao cônjuge sobrevivo, a decisão reflecte a protecção que é devida quando uma circunstância física de um dos cônjuges afecta, préjudice d’affection, o projecto de vida que o casamento contempla, mormente a procriação, a actividade sexual, pelo que a impotência e impossibilidade de procriar por causa das sequelas do acidente constitui um importantíssimo dano moral, não só para o cônjuge afectado directamente pelas lesões físicas, como para o seu cônjuge.
A compensação do dano não patrimonial da Autora, atenta, a divisão de culpas a que se procedeu e que se repercute no montante a atribuir, é de € 17 000,00, tal como sentenciado na sentença apelada, assim se revogando, nesta parte, o Acórdão recorrido.”

- no Ac. do STJ de 11/04/2019, proc. 5686/15.9T8VIS.C1.S1, consultável in www.dgsi.pt/jstj, manteve a decisão da Relação de atribuir uma indemnização ao cônjuge de € 50.000,00 à luz da seguinte factualidade:
41 Também a Autora tinha o gosto de viajar e, nomeadamente acompanhada pelo marido, fazia, em regra, pelo menos uma viagem por ano, tendo viajado, nomeadamente para o ..., ..., ..., ..., ..., ..., ... e outros.
49 A A formava com o marido e filho uma família unida, alegre, feliz, com constantes projectos para o futuro.
51 Até à data do acidente, o A levava com a sua esposa uma vida sexual activa, satisfatória para ambos e que os unia e proporcíonava-lhes uma existência feliz sendo que a A ficou impossibilitada de ter relações sexuais.
52 A A tinha-se reformado antecipadamente havia poucos anos e aufere actualmente a pensão líquida de 1.256,84 euros.
53 O marido da A também se havia reformado antecipadamente (…).
59 O Autor sente desgosto por ver a A incapacitada e sente-se traumatizado por esta incapacidade e impotência em alterar o rumo das coisas.
60 Toda a clausura hospitalar a que a A foi sujeita perturbam o cônjuge A, emocional e psiquicamente, vendo a A totalmente dependente para todas e quaisquer actividades.
63 Foi intentada acção de interdição que correu termos nesta Comarca ... (...)
64 Nesta acção foi decretada "a interdição provisória [da A.] anomalia psíquica" fixando-se «o início da incapacidade na data do acidente, isto é, em 20.02.2014" na qual foi nomeado tutor provisório da A o seu cônjuge o ora A (…). "
           
Resulta ainda da factualidade provada que a A. mulher vitima do acidente ficou em “estado vegetativo persistente”.
           
E na fundamentação do Ac. escreveu-se:
No tocante ao dano da privação de relações sexuais, fazendo apelo ao Acórdão Uniformizador do STJ n.º 6/2014, de 16/01/2014, proferido no processo n.º 6430/07. 0TBBRG.S1, publicado no Diário da República, I Série, de 22/05/2014, que decidiu que:
Os artigos 483.º, n.º 1, e 496.º, n.º 1, do Código Civil devem ser interpretados no sentido de abrangerem os danos não patrimoniais particularmente graves, sofridos por cônjuge de vítima sobrevivente, atingida de modo particularmente grave.
E considerando que no caso versado AUJ acima indicado foi arbitrada a quantia de €15.000,00 pelo dano da privação de relações sexuais, a Relação entendeu por bem fixar esse valor para a compensação daquele dano e tal decisão não merece qualquer censura porquanto se mostra dentro dos parâmetros jurisprudenciais[..].

Quantos aos demais danos sofridos pelo A. marido, o Tribunal “ a quo”  considerou que eram bem mais graves que aquele porquanto:
«…o autor sente desgosto por ver a autora incapacitada e sente-se traumatizado por esta incapacidade e impotência em alterar o rumo das coisas; a clausura a que a autora foi sujeita perturbam-no emocional e psiquicamente, vendo a autora totalmente dependente para todas e quaisquer actividades. E estes danos são tanto mais graves quanto é certo que o autor formava com a mulher e com o filho uma família unida e feliz».
A própria R. reconhece que estes danos são graves e permanentes e merecem a tutela do direito e nós acrescentamos que essa tutela não pode passar por compensações meramente simbólicas como pretende a R.. A compensação deve reflectir a gravidade dos danos e no caso é indiscutível que os danos não patrimoniais sofridos pelo marido da vítima são particularmente graves, como são incomensuravelmente graves os sofridos por aquela. Assim não merece censura o valor de €50.000,00 fixado para a compensação arbitrada a favor do autor marido, pelos danos não patrimoniais sofridos.”

- no Ac. desta RG de 11/03/2021, proc. 1852/17.0T8GMR.G3, consultável in www.dgsi.pt/jtrg, ficou provado que em consequência do acidente o A. ficou com uma repercussão permanente na actividade sexual fixável no grau 5 numa escala de 1/7, com  disfunção erétil total e quanto à A. ficou provado:
46. A Autora é casada com o Autor desde - de Dezembro 1992.
47. Tomavam as refeições em conjunto preparados por ambos, o Autor auxiliava a Autora nas lidas domésticas da casa, nomeadamente nas limpezas da mesma, dormiam juntos, partilhando o leito, a responsabilidade de educação dos seus dois filhos, acompanhavam-se mutuamente no dia-a-dia com manifestações de carinho, solidariedade, amizade e boa e sã convivência.
48. Depois do acidente o autor deixou de interagir com a Autora e de colaborar nas lides domésticas, afastou-se da Autora, Vive para si mesmo, com vergonha do seu estado. deixou de procurar e Rejeita a Autora para manterem relações ou qualquer contacto sexual e não responde aos seus estímulos.
49. A Autora tem de auxiliar o Autor a realizar a sua higiene pessoal, a subir e descer escadas, a ampará-lo quando este vai a casa de banho.
E foi alterada a decisão da 1ª instância que havia fixado a indemnização em € 50.000,00 para € 40.000,00.
           
- no Ac. da RP de 04/04/2022, proc. 1408/14.0TBGDM.P1, consultável in www.dgsi.pt/jtrp, foi atribuída a indemnização de € 20.000,00 à  A. com base na seguinte factualidade:
 “- Os autores casaram entre si em ..., vivendo juntos desde então, sempre tendo uma relação normalmente saudável e feliz.
– Por força das sequelas de que o autor ficou a padecer, não mais tiveram os autores a vida afetiva e sexual que tinham antes do acidente, sendo agora a vida conjugal caracterizada pela frustração, pelo afastamento e pelas discussões constantes.
– A frustração sentida levou ao afastamento do casal, que praticamente já não se relaciona ao nível sexual, facto que muito deixa desgostosa a autora mulher.
– A autora passou a ser uma pessoa facilmente irritável e intolerante, chegando a casa mais tarde, para não estar muito tempo com o marido” (cfr. pontos 24. a 27. Da fundamentação factual).”

Vejamos agora a factualidade provada com relevância para a fixação da indemnização, ordenada logicamente:
79. A Autora BB e o Autor AA, à data da ocorrência do acidente de viação mortal descrito nos autos (08/05/2016) já viviam um com o outro em união de facto (condições análogas às dos cônjuges e como se fossem casados, partilhando cama mesa e habitação) de forma ininterrupta há cerca de 6 (seis) anos.
76. O Autor antes do acidente tinha uma vida sexual normal e feliz com a sua companheira.
77. O que contribuía bastante para a estabilidade emocional do casal.
74. Em consequência das lesões causadas pelo acidente de viação descrito nos autos, o A. ficou a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite ao mesmo ter relações sexuais naturais e espontâneas, só sendo possível ao mesmo ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, tudo com repercussão na actividade sexual do A. de 5 numa escala de 7.
78. Agora, o Autor, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias, relações sexuais naturais e espontâneas com a sua companheira, as quais só são possíveis fazendo aquele injeção intracavernosa com prostaglandina.
80. Agora o marido da Autora, não pode, nem poderá ter, até ao final dos seus dias relações sexuais naturais e espontâneas com a Autora, só podendo ter relações sexuais mediante injeção intracavernosa com prostaglandina.
82. Devido ao facto de o A. ter ficado a padecer de disfunção erétil de causa neurológica, a qual não permite ao mesmo ter relações sexuais naturais e espontâneas, só sendo possível ter relações sexuais fazendo o mesmo injeção intracavernosa com prostaglandina, o mesmo passou a ser acometido de um sentimento de ciúme em relação à sua mulher/companheira e aqui Autora, o que se traduz em discussões.
83.A Autora BB à data da ocorrência do acidente de viação descrito nos autos, tinha 49 (quarenta e nove) anos de idade, já que nasceu em .../.../1967.
84. A Autora BB no dia do acidente e nos dias que se seguiram à ocorrência do mesmo, sofreu um enorme susto e receou pela vida do seu marido AA.
85. A Autora BB, na sequência do acidente de viação de que foi vítima o seu marido AA, prestou-lhe toda a assistência possível e necessária, material e emocional.
86. A Autora BB a fê-lo quando acompanhou o seu marido AA, em todos os internamentos, consultas médicas, tratamentos e cirurgias a que foi submetido.
87. A Autora encontra-se angustiada com a situação do seu marido.
88. O facto de não poder ter relações sexuais naturais e espontâneas com o marido, causa-lhe um grande desgosto, sofrimento.

Tendo em consideração os elementos de facto elencados, os valores atribuídos na jurisprudência mais recente para casos similares, tendo em consideração o disposto no n.º 2 do art.º 566º do CC e aplicando o disposto no n.º 3 do mesmo normativo, tem-se como equitativa a indemnização de € 40.000,00 a titulo de danos morais devida à A. mulher, actualizada á presente data.

Quanto aos juros de mora, tem aplicação o Acórdão Uniformizador n.º 4/2002, de 27.06.2002, pelo que sobre a referida quantia incidem juros de mora vincendos desde a data do presente Acordão até integral pagamento, calculados á taxa de juros civis.

Neste conspecto, impõe-se a revogação do ponto 5 do decisório da sentença recorrida e a sua substituição por outro que condene a Ré F... - Companhia de Seguros a pagar à A. BB a quantia de € 40.000,00 acrescida de juros de mora vincendos desde a data do presente Acordão até integral pagamento, calculados á taxa de juros civis.

Neste contexto, o recurso subordinado da A. deve ser julgado totalmente improcedente e o recurso da Ré parcialmente procedente.

6. Decisão

Termos em que acordam os Juízes que compõem a 1ª Secção da Relação de Guimarães em:

a) - julgar parcialmente procedente o recurso do A. AA e totalmente improcedente o recurso da Ré F... - Companhia de Seguros, SA e em consequência revogar o ponto 1 do decisório da sentença recorrida, na parte em que condena a Ré a pagar ao A. a quantia de € 100.000,00 (a parte relativa aos € 455,22 não foi objecto de recurso, tendo já transitado em julgado), que se substitui por outro que condena a Ré a pagar ao A. a quantia de € 180.000,00 a titulo de indemnização pela Repercussão do Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica na actividade profissional/perda da capacidade geral de ganho;
b) - julgar procedente o recurso da Ré F... - Companhia de Seguros, SA e em consequência revogar o ponto 2 do decisório da sentença recorrida, o qual se substitui por outro com o seguinte teor:
2 – Condenar a Ré a pagar ao autor o que o mesmo despender em acompanhamento médico nas especialidades médicas de Urologia e Psicologia, ajudas técnicas e medicamentosas antidepressivos, regularizador do sono, prostaglandina ou injeção intracavernosa e analgésicos -, tudo tendo em vista superar as consequências físicas e psicológicas do acidente dos autos, a liquidar em incidente de liquidação.
c) - julgar totalmente improcedentes o recurso do A. AA e da Ré F... - Companhia de Seguros, SA e manter o ponto 4 do decisório da sentença recorrida, na parte em que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 100.000,00, actualizada á data da sentença, a titulo de danos morais;
d) - julgar procedente o recurso da Ré e em consequência declara-se a nulidade do ponto 3 do decisório da sentença recorrida e julgar parcialmente procedente o recurso do A. e em consequência revoga-se a 2ª parte do ponto 4 do decisório, passando a decisão quanto a juros de mora a ter o seguinte teor:
Condena-se a Ré a pagar ao A.:
i) - sobre a quantia de € 445, 22, juros de mora vencidos desde a citação – 08/10/2018 – até à data deste acordão, calculados á taxa de 8% e vincendos desde a data deste acordão até integral pagamento, ao dobro da taxa de juros civis que vigorar;
ii) - sobre a quantia de € 180.000,00, juros de mora vincendos desde a data deste acórdão até integral pagamento, calculados ao dobro da taxa de juros civis que vigorar;
iii) - sobre a quantia de € 100.000,00, juros de mora vencidos desde a data da sentença da 1ª instância até à presente data, á taxa de 8% e vincendos desde a data deste acordão até integral pagamento, calculados ao dobro da taxa de juros civis que vigorar.
e) julgar parcialmente procedente o recurso da Ré F... - Companhia de Seguros e totalmente improcedente o recurso subordinado da A. BB e em consequência revoga-se o ponto 5 do decisório, o qual se substitui por outro que condena a Ré a pagar á A. BB a indemnização de € 40.000,00 a titulo de danos morais, actualizada á presente data, acrescida de juros de mora vincendos desde a data do presente Acordão até integral pagamento, calculados á taxa dos juros civis que vigorar.
*
Custas:
- recurso do A. – pelo A. e pela R. F... - Companhia de Seguros na proporção do decaimento que se fixa em 35% e 65%, respetivamente;
- recurso da Ré F... - Companhia de Seguros:
a) relativamente ao A. AA – pela Ré e pelo A. na proporção do decaimento que se fixa em 90% e 10%, respetivamente;
b) relativamente à A. BB - pela Ré e pela A. na proporção do decaimento que se fixa em 80% e 20%, respetivamente;
- recurso da A. BB – pela A.
*
Notifique-se
Guimarães, 16/03/2023
(O presente acórdão é assinado electronicamente)
 
Relator: José Carlos Pereira Duarte
Adjuntos:  Maria Gorete Roxo Pinto Baldaia de Morais
José Fernando Cardoso Amaral