Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
3055/19.0T8BCL.G1
Relator: SANDRA MELO
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
CONDOMÍNIO AUTÓNOMO
LEGITIMIDADE
NULIDADE DA SENTENÇA
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
EQUIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 04/18/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
1- É de reconhecer a personalidade judiciária e a legitimidade passiva de um condomínio constituído para a administração de um dos blocos de um prédio constituído em propriedade horizontal, que o administra há mais de vinte anos, quando esse bloco tem estruturas independentes e autónomas e apenas estão em causa interesses que dizem respeito à administração das partes comuns que fazem parte desse bloco.
2- Justifica-se plenamente a atribuição de uma compensação por danos não patrimoniais àquele que sofreu uma quebra acentuada nas suas condições de vida por ter ficado privado de usufruir de forma normal a sua habitação, com infiltrações causadas pela incúria do condomínio em efetuar obras nas zonas comuns, atenta a importância que aquela tem como lugar retemperador de forças e centro da vida privada e familiar das pessoas.
3- Por razões de equidade, para a fixação dessa indemnização há que atentar no que tem sido atribuído em jurisprudência publicada em casos semelhantes.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

.I - Relatório

Autores e Apelados:  AA e BB
Réu e Apelante:  CONDOMÍNIO ...
Autos de: apelação em ação declarativa de condenação com processo comum

Os Autores na petição inicial pediram a condenação do Réu (solidariamente com a Ré seguradora, a qual foi absolvida da instância no despacho saneador) no seguinte:

.a) a efetuar todas as obras necessárias à reparação na fração autónoma propriedade dos Autores, nomeadamente substituição do teto em folha de madeira natural de carvalho, reparação das fissuras e pintura das paredes, tapar as rachadelas e pintar paredes nas divisões onde se instalaram as infiltrações e que se encontram deterioradas; ou
.b) a indemnizar os Autores pelos prejuízos que as referidas infiltrações de humidade lhe causaram no valor de 3.225,00 € + IVA, a título de danos patrimoniais;
E, em qualquer caso, a pagar aos Autores quantia não inferior a 15.000,00 € a título de danos não patrimoniais.
Na audiência final de julgamento, foi admitida a ampliação do pedido por referência à alteração do teor da alínea b) do pedido Final, nos seguintes termos: “Indemnizar os Autores pelos prejuízos que as referidas infiltrações de humidade lhe causaram no valor de 7.300,00 € + IVA, a título de danos patrimoniais”.

Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

Nos termos e pelos fundamentos supra-expostos, decide-se julgar a presente Ação parcialmente Procedente, por parcialmente provada, e, em consequência:
1) Condenar o Réu CONDOMÍNIO ..., sito na RUA ..., ... ..., nos pedidos formulados pelos Autores, nos seguintes termos:
A) Efetuar todas as obras necessárias à reparação da fração autónoma propriedade dos Autores, nomeadamente substituição do teto em folha de madeira natural de carvalho, reparação das fissuras e pintura das paredes, tapagem das rachadelas e pintura das paredes nas divisões onde se instalaram as infiltrações e que se encontram deterioradas;
OU B) Indemnizar os Autores pelos prejuízos que as referidas infiltrações de humidade lhes causaram, no valor de 7.300,00€ (Sete Mil e Trezentos Euros) + IVA, a título de danos patrimoniais;
E, em qualquer caso,
C) Pagar aos Autores a quantia de 5.000,00 € (Cinco Mil Euros) a título de danos não patrimoniais”

É desta decisão que o Réu apela, formulando, para tanto, as seguintes
conclusões:

“.I.    Nos presentes autos de ação declarativa comum, realizada a audiência final de julgamento, foi proferida sentença, que decidiu julgar a ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, nessa sequência, foi o Réu, aqui Recorrente, condenado: «A) Efetuar todas as obras necessárias à reparação da fração autónoma propriedade dos Autores, nomeadamente substituição do teto em folha de madeira natural de carvalho, reparação das fissuras e pintura das paredes, tapagem das rachadelas e pintura das paredes nas divisões onde se instalaram as infiltrações e que se encontram deterioradas; OU B) Indemnizar os Autores pelos prejuízos que as referidas infiltrações de humidade lhes causaram, no valor de 7.300,00€ (Sete Mil e Trezentos Euros) + IVA, a título de danos patrimoniais; E, em qualquer caso, C) Pagar aos Autores a quantia de 5.000,00 € (Cinco Mil Euros) a título de danos não patrimoniais; (…); 
II. O Réu, aqui Recorrente não se conforma com a decisão supra, motivo pelo qual impugna a sentença recorrida, recorrendo da mesma para o Tribunal da Relação, tendo o recurso por objeto, em parte, a impugnação da decisão relativa à matéria de facto dada como provada / não provada, mas, também, do direito concretamente aplicável à matéria sob decisão;
III. E relativamente às questões fundamentais a apreciar nos presentes autos e sobre a qual recaiu a decisão recorrida, entende o Recorrente que se impõe mova sindicância sobre o seguinte: - Da excepção dilatória de ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário passivo e do vício por omissão de pronúncia; - Da instalação na fração autónoma dos Recorridos de uma chaminé ilegal com recurso à perfuração da cobertura e do nexo de causalidade entre o equipamento e as infiltrações reclamadas nos autos; da impugnação da matéria de facto dada como provada e não provada; da alteração da subsunção jurídica atenta a impugnação da matéria de facto; dos vícios da sentença recorrida. - Da natureza, responsabilidade e quantificação dos danos patrimoniais dos Recorridos e dos vícios ínsitos à decisão recorrida por falta de fundamentação e excesso de pronúncia; - Do direito a indemnização pelos danos não patrimoniais, da responsabilidade do Recorrente e do valor da indemnização arbitrada a esse título e a favor dos Recorridos;
IV. Neste segmento a sentença em crise claudica na boa apreciação e aplicação do direito, não dando dar cumprimento aos normativos legais concretamente aplicáveis, violando, entre outros, o disposto nos artigos art. 33º do CPC e art. (s) 577º, e), 578º e 278º, nº1, d), do CPC, e, ainda, art.º 608º nº2 e 609º e 615º al. d), todos do CPC

- DA LEGITIMIDADE PASSIVA

V. O condomínio aqui Recorrente, pela configuração própria do edifício, está dividido em dois blocos, designados por bloco nascente e poente, blocos que gozam de autonomia entre si, motivo pelo qual há mais de vinte anos a esta data, existe um administrador (de condomínio) para o bloco poente e, outro, para o bloco nascente; 
VI. todavia, ambos pertencem ao mesmo edifício que está sujeito a um único título constitutivo da propriedade horizontal;
VII.    Não obstante o supra exposto, a cobertura do edifício, donde provêm as infiltrações reclamadas nos autos, é comum aos dois blocos. 
VIII. A presente ação foi intentada pelos Recorridos contra o “CONDOMÍNIO ..., SITO NA RUA ..., ... ..., LEGALMENTE REPRESENTADO POR CC E DD”, sendo que as pessoas ali identificadas eram à data os administradores do bloco nascente, exclusivamente deste bloco do edifício; 
IX. A título de legitimidade processual passiva, a presente ação está coartada adjectivamente e processualmente, pois que, tendo as infiltrações origem numa parte que é comum a ambos os blocos, impunha-se a representação do condomínio-Recorrente igualmente através do administrador do bloco poente, sob pena de ineficácia ou inexequibilidade de uma eventual decisão condenatória.
X. Estamos perante uma excepção dilatória por preterição de litisconsórcio necessário passivo, o que conduziria à absolvição do Réu/Recorrente da presente instância (cfr. art. 33º do CPCP e art. (s) 577º, e), 578º e 278º, nº1, d), do CPC).
XI. Por outro lado, verifica-se que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a matéria de excepção invocada, o que consubstancia um vício por omissão de pronúncia, sendo causa de nulidade de sentença, nos termos do artigo 615º al. d) do CPC. 
 - DO NEXO DE CAUSALIDADE ENTRE AS INFILTRAÇÕES RECLAMADAS E A PERFURAÇÃO DA COBERTURA PARA INSTALAÇÃO DE LAREIRA/CHAMINÉ NA FRAÇÃO AUTÓNOMA DOS RECORRIDOS

XII. Sustentou o Recorrente a existência de nexo de causalidade entre as infiltrações existentes nas frações autónomas do quarto e último andar do edifício (como é o caso da fração autónoma dos aqui Recorridos) e as chaminés instaladas na cobertura, equipamentos que foram instalados ilegalmente, à revelia do Condomínio, e executados mediante perfuração da cobertura do edifício, que perdeu assim as suas qualidades de estanquicidade primitivas; 
XIII. Tese que não foi sufragada pela decisão recorrida, isto, apesar de, no entender do Recorrente, ter sido realizada prova que impunha diferente decisão;
XIV. Desde logo, a partir do momento em que é perfurada a cobertura do edifício, que foi concebida como uma estrutura una, é indubitável a conclusão que a mesma perde as suas características e capacidades originais, desde logo, ao nível de isolamento e impermeabilização, o que é um facto notório e de conhecimento geral do cidadão comum;
 XV. Depois, no quadro da prova testemunhal produzida, verificamos que o Tribunal a quo ouviu o depoimento de três testemunhas, conhecedoras da realidade do edifício, quer por ali residirem ou por já ali terem residido, que, de forma unânime, declararam expressamente ter conhecimento "que as infiltrações em diversas frações, a dos Autores incluída, se deveram à construção ilegal de chaminés com abertura da tela dos tetos", falando-se mesmo na sentença recorrida em depoimentos unânimes quanto a este concreto ponto, pelo que, atentas as próprias conclusões perfectibilizadas na decisão em crise e no que tange ao sentido dos depoimentos, de que o Recorrente perfilha, muito embora o Recorrente aqui impugne a decisão relativa à matéria de facto dada como provada / não provada, na verdade, não existe discrepância naquilo que é o sentido literal dos depoimentos e o sentido que lhes é conferido na sentença recorrida, o que desde logo dispensa o Recorrente do cumprimento do disposto na alínea a) do n.º 2 do art. 640º do CPC. 
XVI.  A questão das chaminés abertas clandestinamente e as infiltrações é matéria que há muito é discutida no edifício, estando plenamente assente a causa – efeito entre as infiltrações e os ditos equipamentos, sendo assim do conhecimento generalizado dos moradores;
XVII. Veja-se, com particular acuidade, que a testemunha EE é igualmente proprietária de uma fração no último andar do edifício, que tem igualmente uma chaminé instalada na sua fração autónoma, sofre igualmente de infiltrações e foi peremptória em asseverar o nexo de causalidade entre as infiltrações na sua fração autónoma e a chaminé que também instalou através da perfuração da cobertura;
XVIII. Mais a mais, a testemunha FF foi precisamente a pessoa que vendeu aos Recorridos a fração autónoma em crise nos autos, e, em Tribunal, sem margem de dúvidas, atestou igualmente a natureza clandestina da lareira / chaminé realizada através da perfuração da cobertura, reconhecendo igualmente, de forma liminar, que desde que foi perfurada a cobertura passou imediatamente a ter infiltrações no interior da fração; 
XIX. Indo mais longe, tal como resulta da motivação vertida na sentença em crise, também o legal representante do Réu Condomínio, Sr. CC, igualmente morador no edifício, "declarou nomeadamente que as infiltrações em diversas frações, a dos Autores incluída, se deveram à construção ilegal de chaminés com abertura da tela dos tetos";
XX. Não se consegue pois conceber como o Tribunal a quo faz quedar o testemunho de quatro pessoas, todos moradores ou ex-moradores do edifício, com conhecimento direto e pessoal dos factos em causa, todos com um depoimento absolutamente unânime no que respeita à natureza das infiltrações, 
XXI. dando-se especial enfoque ao depoimento de uma outra testemunha, no caso, o Sr. GG, que efetivamente negou que as infiltrações estivessem relacionadas com as chaminés; 
XXII. Ademais, não se consegue alcançar da sentença recorrida porque motivo o depoimento do Sr. GG fez quedar o depoimento de quatro outras testemunhas que atestaram precisamente o contrário; 
XXIII. De resto, bem coligida a matéria, não se pode olvidar que, conforme resulta igualmente dos autos, o Sr. GG, reside de forma habitual e permanente nos ..., pelo que não tem um conhecimento sobre a realidade do edifício comprável àqueles que ali residem ou residiram diariamente;
XXIV. Mais a mais, analisadas à luz das regras da experiência comum e da normalidade, também não se pode esquecer que o Sr. GG tem na fração de que é proprietário uma lareira e correspondente chaminé, igualmente executada de forma clandestina e mediante perfuração da cobertura, pelo que indagado sobre a matéria e temerário de responsabilidades a esse título, estava notoriamente comprometido, incapaz por essa razão de prestar um depoimento imparcial;
XXV. E dito isto desde logo se evidencia um manifesto vício de falta de fundamentação, pois que, sem razão aparente, ou, pelo menos, vertida na sentença, o douto julgador a quo desconsidera o depoimento de 4 testemunhas com discurso praticamente uniforme e no que respeita aos factos acima elencados, ficando assim prejudicada a hipótese de perceber como o Tribunal a quo formou a sua convicção;
XXVI. Destarte, a par do vício por falta de fundamentação, o trilho decisório seguido pelo julgador a quo redunda num evidente erro de julgamento da matéria de facto, fazendo-se tábua rasa da prova produzida, que, em nosso entender, é suficiente no sentido de alterar a resposta à matéria de facto constante dos pontos 8º 18º 19º 20º 25º 26º 31 º 36º 37º 41º 42º (dos factos dados como não provados), e, por conseguinte, desde logo, devem tais factos integrar o rol dos factos considerados como provados.
XXVII. Ainda que assim não se entenda, neste acervo e do cotejo de todos os depoimentos prestados em julgamento e aquilo que são as regras da experiência comum, é inegável a dúvida razoável que sempre subsistiria sobre o nexo de causalidade entre as infiltrações e a perfuração da cobertura, impondo-se ao Tribunal, perante uma dúvida não ultrapassável, socorrer-se de conhecimentos técnicos bastantes; 
XXVIII. O Tribunal não pode basear-se apenas nas regras de repartição do ónus probatório, pois que, ficando com dúvidas e sendo possível saná-las com a realização de outras diligências de prova, designadamente através de perícia, deve ordená-las oficiosamente, estando tal procedimento inserido nos amplos poderes-deveres conferidos ao juiz (cfr. artºs 6º e 411º do CPC). 
XXIX. Isto posto, por via da necessidade de alterar a resposta aos pontos acima enunciados e dados como não provados, impõe-se, naturalmente, refazer a subsunção jurídica dos factos ao direito;
XXX. Apesar da cobertura ser uma parte comum do Recorrente, demonstrado o especial nexo entre as sobreditas chaminés e os fenómenos de infiltrações, circunstância que é imputável aos Recorridos, não pode a decisão final marginalizar o contributo e/ou particularidades existentes na fração dos Recorridos, que manifestamente potenciam fenómenos infiltrativos; 
XXXI. Ainda que não seja de afastar completamente a responsabilidade do Recorrente, por se tratar de infiltrações com origem numa parte comum, existindo um especial nexo com a situação irregular supracitada e em que se encontra a fração autónoma dos Recorridos, não cabe ao Condomínio assumir exclusivamente as responsabilidades na reparação de defeitos, para os quais, também os Recorridos contribuíram;
XXXII. Na senda do supra exposto, cumpre ainda chamar aos presente autos o disposto no artigo 570º, n.º 1, do CCiv, onde se dispõe: «1. Quando um facto culposo do lesado tiver concorrido para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.», normativo que tem plena aplicação in casu; 
XXXIII. A responsabilidade do Recorrente sempre deveria ser reduzido por referência à própria "culpa do lesado", determinando-se igualmente a proporção da culpa dos Recorridos e Recorrente no evento lesante;
XXXIV. De resto, neste jaez, assacar responsabilidades ao Condomínio, sempre consubstancia igualmente uma situação de abuso de direito, na modalidade venire contra factum proprium, constituindo esse abuso de direito uma causa de exclusão da ilicitude (art. 334º CCiv);
XXXV. Sintetizando o exposto, bem consideradas as normas referidas, com aplicação in casu, tendo existido erro na determinação da norma aplicável, impõe-se nesta instância pacificar a boa aplicação do direito aos factos sob sindicância. A sentença em crise violou, entre outros, o disposto no nº 4 do art. 607º do CPC, 6º e 411º, todos do CPC, e, ainda os art. 493º, 483º, 1422º, n.º 1 do 570º e 334.º, todos do Código Civil.

DOS DANOS PATRIMONIAIS

XXXVI. Não obstante a natureza subsidiária do segmento condenatório a que se alude na alínea B) do dispositivo, verifica-se que o Recorrente segue condenado no pagamento de indemnização que se fixa em € 7.300,00 (sete mil e trezentos euros) + IVA, valor que deveria corresponder aos prejuízos sofridos pelos Recorridos e decorrentes das infiltrações; 
XXXVII. sendo que, segundo o que se julga perceber, tal valor segue quantificando tendo por base um mero orçamento apresentado pelos Recorridos já em audiência de julgamento (orçamento datado de Fev. de 2022, de fls…);
XXXVIII. orçamento último merecedor de sérias reservas, pois que, e, entre outros, o respetivo valor é manifestamente excessivo, não acompanhando minimamente os demais orçamentos igualmente juntos aos autos;
XXXIX. Apesar de ser do conhecimento público que houve um aumento dos preços no setor da construção civil, não parece razoável aceitar, sem mais, um orçamento apresentado em audiência de julgamento pelos Recorridos, na medida em que importa uma quase duplicação do valor e com referência ao orçamento inicial (junto com o articulado inicial, sob o documento n.º ...), cujo montante ascendia a 3.225,00€ (acrescido de IVA), importando secundar que ambos indiciem sobre as mesmas patologias; 
XL. Mais importante, não pode o Julgador a quo desvalorizar todos os demais orçamentos, sem justificar ou fundamentar na decisão impugnada os critérios que presidiram a sua decisão, melhor, a razão pelo qual aquele orçamento se sobrepõe e revoga os demais, 
XLI. tanto que, nos autos, inexiste um qualquer juízo ou parecer técnico especializado e independente no que tange ao concreto valor dos danos, o que, naturalmente, se impunha, mormente face à disparidade dos valores refletidos nos diferentes orçamentos juntos aos autos; 
XLII.  A sentença recorrida é assim omissa relativamente ao juízo que realizou para quantificar os danos em7.300,00€ (sete mil e trezentos euros) + IVA, enfermando de vício por falta de fundamentação, sendo a decisão, também, nesta parte, nula, por violação do disposto na al. b) do art. 615º do CPC;
XLIII. Sem prescindir, nos termos do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, que tinha por objeto a admissão da ampliação do pedido formulado pelos Autores/Recorridos, decidiu-se pela admissão da ampliação pretendida, no entanto, conforme igualmente resulta daquele aresto: «Ressalve-se, no entanto, que as alegadas novas patologias invocadas – no despacho recorrido é feita menção à patologia da electricidade –, por não terem sido alegadas nem peticionadas em termos de petição inicial, e por quanto a elas não ter sido deduzido o competente articulado superveniente, não poderão ser atendidas.», trecho decisório que o Recorrente não pode deixar de subscrever; 
XLIV. Ora, o orçamento sob sindicância contempla trabalhos adicionais que não foram reclamados no petitório inicial, designadamente os trabalhos de electricidade.
XLV. Neste conspecto, ainda que fosse de aquilatar pela condenação do Recorrente não poderia o Juiz a quo, sem mais, condená-lo nos termos em que o fez na alínea B) do dispositivo, já que o orçamento no valor global de € 7.300,00 (Sete Mil e Trezentos Euros) + IVA contempla trabalhos de electricidade, que não podem ser considerados, por não terem sido peticionados nesta ação, nem é possivel por mero calculo aritmético proceder ao desconto dos trabalhos de electricidade no valor global,
XLVI. na medida em que no orçamento seguem elencados os diferentes trabalhos a executar, todavia, não seguem discriminados os valores correspondentes a cada um dos procedimentos/trabalhos;
XLVII. Concluindo, nesta parte, o Tribunal a quo não está tem condições de saber qual o valor dos prejuízos efectivamente reclamados nesta ação, tendo acabado por condenar o Recorrente em montante superior ao peticionado, ofendendo os limites da causa de pedir e do pedido, sendo neste segmento nula a sentença por excesso de pronúncia nos termos do artigo 608º, n.º 2, 609º, 615º, n.º1, al. d), todos do CPC. 

DOS DANOS NÃO PATRIMONIAIS

XLVIII. Antecipe-se que é parca e abstracta a fundamentação consignada na sentença e que escora a condenação do Recorrente em danos não patrimoniais, sendo, inclusivamente, parte dos factos dados como provados, incongruentes com elementares regras da experiência.  
XLIX. E ainda que se entenda pela responsabilidade do Recorrente o valor fixado é manifestamente excessivo e será sempre merecedor de ampla censura, até porque e além do mais, melhor devia ser sopesado todo o contexto que ladeou a situação sub judice. 
L. Desde logo, conforme resulta dos factos provados e, bem assim, das atas juntas com a contestação do Recorrente, os Recorridos (melhor, a Recorrida-mulher), foi ela própria administradora do Recorrente durante o ano de 2016 e 2017, sendo que as obras de reabilitação da cobertura do edifício terminaram já no ano seguinte, pelo que não merece cabimento a narrativa dos Recorridos no sentido em que o Condomínio-Recorrente tenha actuado de forma tardia na cobertura, pois que, ainda que assim fosse, sempre seria por causa também imputável aos Recorridos, na medida em que também eles foram administradores do Recorrente (bloco nascente), tudo em momento que antecedeu a conclusão da obra de reabilitação,  
LI. tendo por isso especiais competências no quadro organizativo do Recorrente.  
LII. Numa outra perspectiva, nunca existiu, da parte do Recorrente e seus administradores, uma atuação ou, melhor, omissão ilícita geradora de responsabilidade, porquanto a obra de reabilitação da cobertura foi efetivamente executada, com sucesso, até porque, nas palavras da lavra dos Recorridos, as infiltrações cessaram.  
LIII. Por outro lado, como resulta do acervo fatual provado, a cobertura do prédio foi submetida a intervenção já no ano de 2018, tendo cessado as infiltrações no interior da fração autónoma dos Recorridos, pelo que mal se concebe que, cessadas as infiltrações, as condições de salubridade e higiene se tenham progressivamente deteriorado; 
LIV. Ainda que sejam inegáveis os efeitos estéticos das infiltrações, que não desaparecem sem a devida reparação, constitui uma enorme falácia dos Recorridos alegar danos e constrangimentos relacionados com humidades e bolores, pois que estas consequências típicas dos fenómenos infiltrativos cessaram com a reabilitação da cobertura.
LV. E a alegação de que o teto da habitação está ou estava em risco de ruir é exasperada, não podendo os Recorridos sofrer de angústia por algo que bem sabiam que estava longe de acontecer; LVI. Após a conclusão da empreitada, não é possível que a fração dos Recorridos tenha ficado prejudicada nas normais condições de "salubridade, higiene e segurança", muito menos se vislumbram quaisquer dados objetivos que permitam concluir que a saúde dos Recorridos saúde e respetivo agregado familiar tenha sido afetada. LVII.  E até se pode aceitar que a situação tenha gerado incómodo e aborrecimentos aos Recorridos, todavia, neste quadro, não é possível antever um cenário tão avassalador, que provoque medo ou angústia ou gere especial ansiedade ou nervosismo nos visados, passível de balizar uma compensação de tão avultado valor.  
LVIII. Ademais, considerando que os danos estão circunscritos à divisão de sala e a pontos pouco significativos nas divisões contíguas, atenta a sua concreta natureza e dimensão, não se consegue aquilatar incómodos e aborrecimentos provocados aos Recorridos e de molde a justificar tão elevada indemnização a título de danos patrimoniais, que ascende a € 5.000,00. 
LIX. Neste acervo, não houve repercussões na normalidade do dia a dia e bem estar dos Recorridos, nem os mesmos estiveram privados usar, gozar e tirar proveito da fração autónoma de que são proprietário.
LX. E se não querendo repisar matéria já profusamente explanada neste recurso, é inegável que a perfuração da cobertura para instalação de lareira na fração dos Recorridos, em muito contribuiu para as infiltrações e, por conseguinte, para os danos, nos quais se incluem dos danos não patrimoniais;
LXI. A concluir, tal como resulta da motivação inserta na sentença recorrida, "…no teor das declarações de parte prestadas pelo alegado legal representante do Réu Condomínio, CC Apesar da polémica origem das infiltrações, este “legal” representante do Réu ou “administrador de facto”/testemunha confirmou a existência de problemas/danos na fração pertença dos Autores, e a quantificação pecuniária desses danos com base em orçamento até 4.000,00 € (quatro mil euros) que o Réu Condomínio aceita pagar !!!". 
LXII. Com efeito, para evitar mais delongas e constrangimentos com a lide judicial, o Recorrente aceitou reparar a fração dos Recorridos, com base em orçamento que aquele próprio recolheu, no entanto, a execução da obra não foi possível por objeção dos Recorridos;
LXIII. Mais a mais, conforme resulta da reportagem fotográfica junta com a contestação do Recorrente (cfr. documento n.º ...), é fácil de perceber que todas as chaminés instaladas na cobertura foram revestidas igualmente com tela impermeabilizante durante a execução da obra na cobertura, 
LXIV. e também a chaminé que ser serve fração autónoma dos Recorrido foi impermeabilizada, tudo intervenções extraordinárias na cobertura, que implicaram recortes na tela e respetivos remates, que naturalmente aumentaram o custo da reabilitação geral da cobertura e que foram assumidos por todos os condóminos do Recorrente;
LXV. Aqui chegados, sempre com o devido respeito, tudo isto prefigura um erro notório na apreciação da prova e na aplicação do direito. Nessa medida, consideram-se incorrectamente julgados, pelo menos, os seguintes pontos: «45. Com o estado em que se encontra o teto da sua habitação, os Autores vivem angustiados pela constante iminência de ver o teto da sua casa ruir, acabando por causar ainda mais estragos, quer materiais quer imateriais. 46. Além de não terem reunidas as condições de salubridade, higiene e segurança, os Autores enfrentam também desconforto visual e de manobra dentro do espaço que habitam em consequência das aludidas infiltrações. (…) 49. Estas humidades afetam gravemente a saúde do agregado familiar dos Autores. 50. Os Autores são, hoje, pessoas ansiosas e nervosas, por não verem esta situação solucionada.», que deveriam assim ser dados como não provados na sentença recorrida.
LXVI. Independentemente da reformulação da matéria de facto dada como provada, sempre se impõe um juízo mais equilibrado e ponderado, no que diz respeito aos danos não patrimoniais, até porque, o douto julgador não deve afastar-se de critérios e padrões objectivos na aferição da medida do dano moral, enveredando por teses ou factores subjectivos, sucumbindo às sensibilidades particularmente embotadas ou especialmente requintadas das partes na narrativa ínsita ao tipo de dano em causa, o que, sempre com o devido respeito, nos parece ser o caso da decisão sob exame.
LXVII. Para além de chamar à colação critérios de equidade, sensibilidade que aqui especialmente se impõe na esteira das especificidades do caso concreto, a lei impõe que a indemnização se balize em outros factores como o grau de culpabilidade do agente e a situação económica deste e do lesado.
LXVIII. Ora, como vimos, o Recorrente é um condomínio destinado maioritariamente a habitação própria e permanente dos condóminos, sendo um prédio de construção antiga, que está nos últimos anos a ser reabilitado, o que tem implicado um colossal esforço financeiro para os condóminos. Está assim o Recorrente a atravessar um período de forte pressão económica face às despesas extraordinárias que a reabilitação do edifício vem acarretando. 
LXIX. Por seu turno, o grau de culpa do Recorrente é diminuto, e, concomitantemente, também não é de olvidar as particularidades da fração dos Recorridos/lesados, que inegavelmente contribuíram para as infiltrações sofridas.
LXX. Evidencie-se ainda que a inércia ou passividade alvitrada ao Recorrente não é indissociável da natureza do próprio Recorrente, que é um condomínio, que ao longo dos anos vem sendo administrado pelos moradores/condóminos, num sistema de rotatividade bi-anual, sempre num quadro de voluntarismo e amadorismo, pessoas que não tem os necessários conhecimentos, muito menos, domínio jurídico e legal sobre as questões condominiais.  LXXI. Tendo em consideração todas as circunstâncias do caso concreto, por aplicação de elementares critérios de equidade, impõe-se nesta parte revogar a sentença recorrida, substituindo-a por outra que determine que a obrigação de indemnizar titulada em danos não patrimoniais seja totalmente excluída, absolvendo o Recorrente, ou, pelo menos, determine uma redução substancial da indemnização, pois que os danos não patrimoniais não tem neste caso a gravidade e/ou intensidade que lhes é conferida na sentença impugnada,
LXXII.  sendo o valor fixado pelo Tribunal a quo manifestamente exorbitante e despudoradamente injustificado.
LXXIII. A sentença em crise, nesta parte e nos termos como decidiu, fez uma incorreta aplicação do direito, violando, entre outros, o disposto nos 496º nº 1 e 494º, ambos do CCiv. 
 Nestes termos e nos melhores doutamente supridos por V. Exas. deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando a decisão recorrida e, substituindo-se por outra que altere o julgamento da matéria de facto, nos moldes propostos, e, em consequência da correcta aplicação do Direito, julgue a ação improcedente, por não provada, e, nessa sequência, deve ainda ser reformulada a decisão impugnada no que respeita à tributação das partes a título de custas judicias,  assim se fazendo, a costumada JUSTIÇA!!!”

A parte contrária respondeu, apresentando as seguintes
conclusões:

I. Na sentença ora em crise, o meritíssimo juiz, baseou-se no teor das declarações das testemunhas, prova documental e pericial junto dos presentes autos. 
II. Desta feita, não se concebe os argumentos ora trazidos pelo recorrente, na medida em que coloca igualmente em causa, a prova testemunhal sem contudo, cumprir com o ónus que se mostra obrigada atento o estatuído no artigo 640 do Código Processo civil, 
III. Na verdade, o que a recorrente pretende, efetivamente, com a menção aos depoimentos supra indicados é apenas tentar que Tribunal ad quem proceda a uma nova valoração daqueles depoimentos.
IV. Isto porque o Tribunal a quo, na verdade, valorou devidamente os depoimentos prestados, 
V. Tendo-se provado efetivamente, o nexo de causalidade entre as patologias e as obras necessárias. 
VI. Aliás o reconhecimento das mesmas pelo condomínio, que aceita o orçamento apresentado para as obras necessárias.
VII. Dizendo de outro modo, os concretos depoimentos das testemunhas por si só ou concatenadas com a demais provas (testemunhal e/ou documental) presente nos autos, não é suficiente para impor ao Tribunal uma decisão diversa quanto à matéria de facto (nos termos do disposto no artigo 662º n.º 1 do CPC).
VIII. Sendo que, não cabe ao Tribunal ad quem, sindicar a idoneidade, veracidade e ou honorabilidade dos depoimentos prestados, nem sindicar a apreciação que o Tribunal a quo faz sobre a razão de ciência (ou falta dela) dos depoimentos prestados em audiência de julgamento, sob pena de violação do princípio de livre apreciação da prova, consagrado no artigo 607º n.º 5 do CPC. 
IX. Demais, e quanto à ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio passivo e do vício da omissão de pronúncia, que o recorrente alega, mais uma vez não poderá colher a versão apresentada por aquele na medida em que e tal como consta da prova documental, tal vício não se coloca tendo legitimidade para estar em juizo. 
X. Ao apuramento da legitimidade processual - pressuposto processual que se reporta à relação de interesse das partes com o objeto da ação e que, a verificar-se, conduz à absolvição da instância - releva, apenas, a consideração do concreto pedido e da respetiva causa de pedir, independentemente da prova dos factos que integram a última e do mérito da causa. 
XI. A legitimidade processual afere-se pela titularidade da relação material controvertida tal como é configurada pelo Autor, na petição inicial, e é nestes termos que tem de ser apreciada.
XII.  A legitimidade substancial ou substantiva respeita à efetividade da relação material. Prende-se com o concreto pedido e a causa de pedir que o fundamenta e, por isso, com o mérito da causa, sendo requisito da procedência do pedido. 
XIII. No recurso a que se responde, para além de não ter especificado os “concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados”, a recorrente não indicou a “decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas”.
XIV.  Por isso, não pode considerar-se que a recorrente tenha cumprido os ónus primários previstos no art.º 640.º, n.º 1, als. a) e c), do CPC.

Termos em que se requer a V.ªs Ex.ªs que se dignem julgar :
a) Rejeitar o recurso a que se responde por violação do disposto no art.º 40.º,n.º 1, als. a) e c), do CPC. n.º 1 e 7 do CPC na medida em que não, como objeto, a reapreciação da matéria de facto com base na prova gravada.
b) Improcedente, por inexistência de qualquer violação da legislação indicada em sede de conclusões, o recurso a que se responde, mantendo a douta decisão recorrida.”

II- Objeto do recurso

O objeto do recurso é definido pelas conclusões das alegações, mas esta limitação não abarca as questões de conhecimento oficioso, nem a qualificação jurídica dos factos (artigos 635º nº 4, 639º nº 1, 5º nº 3 do Código de Processo Civil).
Este tribunal também não pode decidir questões novas, exceto se estas forem de conhecimento oficioso ou se tornaram relevantes em função da solução jurídica encontrada no recurso e os autos contenham os elementos necessários para o efeito. - artigo 665º nº 2 do mesmo diploma.

Assim, são as seguintes as questões a apreciar:

.a- Se se verifica a exceção dilatória da ilegitimidade passiva;
.b- Se se verifica a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, por falta de fundamentação e por excesso de pronúncia;
.c- Se ocorreu erro na apreciação da matéria de facto e a sua influência na aplicação do Direito;
.d- Se o Recorrente é responsável pelos danos e se existem razões para afastar ou reduzir a responsabilidade do Recorrente;
.e- Da adequação da indemnização pelos danos patrimoniais e do valor fixado a título de compensação pelos danos não patrimoniais

III- Fundamentação de Facto

Segue o elenco da matéria de facto provada e não provada a considerar, indicando-se os factos selecionados na sentença, com a mesma numeração ali seguida e com indicação das alterações provenientes da decisão da impugnação da matéria de facto efetuada neste recurso:

A) Factos Provados:

A) da petição inicial sob a Refª ...33

1. Os autores são donos e legítimos proprietários da fração autónoma designada pela letra ..., habitação, ... andar, que faz parte integrante do prédio urbano, edifício de cave, ..., três andares e o ... andar recuado, constituído em regime de propriedade horizontal, denominado “Edifício ..., ..., da freguesia ..., concelho ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...16.
2. A cobertura do edifício em apreço vem evidenciando algumas patologias.
3. e 4. Com o decurso do tempo, sobretudo devido às intempéries, tais patologias foram-se agravando, pondo em causa o estado de conservação e impermeabilização da cobertura do edifício.
5. Por diversas vezes, os Autores interpelaram o Sr. Administrador do condomínio para que se procedesse às obras de reparação do mesmo.
6. Todavia, só recentemente o prédio foi submetido a intervenção, procedendo-se à reparação da cobertura.
7. Não obstante essa reparação, o hiato de tempo que mediou, até à reparação, ocasionou infiltrações e consequentes estragos, de diversa natureza, na fração autónoma que constitui propriedade dos autores.
8. Tendo em conta os prejuízos causados no interior da sua habitação, os Autores reportaram tal situação ao administrador do condomínio, para que o mesmo, por intermédio da companhia seguradora, procedesse à reparação dos referidos danos.
9. No âmbito da assembleia de condóminos, realizada em 19.01.2019, foi comunicado aos Autores que os defeitos/infiltrações já haviam sido reportados à entidade seguradora, Companhia de Seguros EMP01..., S.A., aqui primitiva corré.
10.   Após vários meses, a primitiva corré, Companhia de Seguros EMP01..., comunicou ao Condomínio, aqui 1º Réu, que declinava a sua responsabilidade na cobertura dos danos supraexpostos.
11. Também o Condomínio, aqui 1º Réu, não aceita a responsabilidade quanto à reparação dos danos supramencionados.
12. A tardia atuação do Condomínio, aqui 1º Réu, em proceder à reparação da cobertura do edifício originou infiltrações na fração propriedade dos Autores.
17. Por contrato de seguro celebrado com a Companhia de Seguros EMP01..., S.A., ora primitiva 2ª ré, o Condomínio, 1º Réu, transferiu a sua responsabilidade civil emergente de ocorrências relacionadas com o edifício em apreço.
23. e 24. Cabia ao Condomínio a realização de obras urgentes e indispensáveis, assim como o dever de zelar e conservar as partes comuns do edifício que, no caso concreto, constituem a cobertura do edifício.
25. Esse dever/obrigação não foi prontamente observado pelo Réu Condomínio.
26. A consequência natural da violação desse dever/obrigação foram os estragos causados na fração dos Autores.
32. A fração dos Autores encontra-se num ... andar recuado, sendo o último andar do referido edifício,
33. e 34. Comumente, o último andar é o mais afetado por este tipo de infiltrações que, em regra, são oriundas da cobertura.
35. Na fração propriedade dos Autores, as paredes mostram-se totalmente deterioradas.
36. e 37. Essa deterioração é causada por humidades e infiltrações de água, e inerente deterioração de argamassas, com empolamento e desprendimento de tinta, fissuras, manchas e bolores.
38. Essas paredes eram de cor ... e foram adquirindo uma cor alaranjada.
39. O teto que é revestido de folha de madeira, de carvalho natural, foi-se igualmente deteriorando em virtude das infiltrações e humidades.
40. As folhas de madeira foram empolando com a humidade, chegando muitas delas a desprender-se e a caírem ao chão. 
41. À degradação do teto e paredes seguiu-se, naturalmente, a deterioração das condições de higiene de toda a casa, tornando-a num local constantemente sujo e húmido e com maus odores, o qual os Autores procuram, como podem, manter limpo e habitável.
42. Perante este “cenário”, os Autores procuraram junto de uma empresa de construção civil obter um orçamento para a substituição do teto de madeira.
43. A empresa em causa apresentou um orçamento para a reparação em causa no valor de 3.225,00 € (acrescido de IVA).
44. Os Autores sofreram prejuízos vários na sua habitação cuja reparação passará por colocação de um novo teto em folha de madeira natural de carvalho, reparação das fissuras e pintura das paredes.
45. Com o estado em que se encontra o teto da sua habitação, os Autores vivem angustiados pela constante iminência de ver o teto da sua casa ruir, acabando por causar ainda mais estragos, quer materiais quer imateriais.
46. Além de não terem reunidas as condições de salubridade, higiene e segurança, os Autores enfrentam também desconforto visual e de manobra dentro do espaço que habitam em consequência das aludidas infiltrações.
47. Tal situação gerou incómodo e aborrecimento aos Autores, já que, por razões a que são alheios, veem a sua propriedade em situação de deterioração e degradação.
48. Os Autores sofrem também o transtorno derivado da necessidade constante de reclamar de quem julgam ter a responsabilidade de pôr cobro a tal situação.
49. Estas humidades afetam gravemente a saúde do agregado familiar dos Autores.
50. Os Autores são, hoje, pessoas ansiosas e nervosas, por não verem esta situação solucionada.

B) da contestação sob a refª ...97

1.º O Condomínio do edifício, aqui R., está sujeito ao regime da propriedade horizontal (PH), sob um único título constitutivo da PH; todavia, está dividido em blocos, no caso dois, designados por bloco nascente e bloco poente.
2.º Pela configuração própria do edifício, os blocos poente e nascente gozam de características que lhes conferem, entre eles, autonomia, motivo pelo qual há mais de vinte anos existe um administrador para o bloco poente e, outro, diferente, para o bloco nascente.
3.º Tanto a cave do edifício, destinada a garagens, como a cobertura são comuns e indissociáveis do conjunto dos dois blocos.
4.º e 5º As pessoas identificadas na petição inicial como representantes legais do Réu, a saber Sr.º CC e Sr.ª DD, para além de condóminos, estão(estavam) incumbidos, por deliberação (da assembleia), da administração do bloco nascente, mas só desta parcela/bloco do edifício, não gozando assim de mandato e, por conseguinte, de legitimidade para representar o bloco poente.
10.º O edifício em causa é de construção antiga, conta com mais de 30 anos, estando a respetiva estética prejudicada pela ação do tempo.
11.º e 12º Carecendo o prédio de intervenção geral, há muito tempo os condóminos do Réu pretendiam levar a efeito uma reabilitação integral do edifício, a qual se iniciou pela cobertura do edifício, estando atualmente em curso os procedimentos para a reabilitação das demais estruturas, nomeadamente, das fachadas e empenas, uma vez que a reabilitação geral de um edifício se inicia “de fora para dentro” e da “parte superior” do edifício “para a inferior”, para que a realização das obras futuras não afetem os trabalhos já executados.
21.º Na fração autónoma de que os AA. são proprietários foi construída, com uma configuração quadrangular com cerca de 40 cm de lado, uma chaminé.
26.º A construção de lareiras e correspondentes chaminés, carece, necessariamente, de coretes de extração.
41.º Os AA. adquiriram a sua fração autónoma em 2004.
52.º Os AA., para reparação dos danos, deram conhecimento aos administradores do Réu de dois orçamentos, ambos solicitados pelos AA. e da responsabilidade destes.
53.º No primeiro desses orçamentos, datado de Fevereiro de 2018, o alegado valor da reparação dos defeitos ascendia ao montante de € 1.070,00. No segundo desses orçamentos, datado de Novembro de 2018 (junto aos autos com a petição inicial), o alegado valor da reparação ascendia ao montante de € 3.225,00 (acrescido de IVA).
54.º Os administradores do Réu, acompanhados do perito da seguradora, estiveram na fração dos AA. e aí puderam verificar os defeitos.

 C) da resposta à contestação, sob a Refª ...57
17. Os documentos n.ºs ... e ... juntos com a Contestação do Réu, sob a refª ...97, traduzem atas de reunião de condomínio, datadas, respetivamente, de 15/01/2016 e 19/01/2017.
18. Faziam parte da anterior administração a aqui Autora e o proprietário da fração autónoma ..., Sr. HH.
19. Àquela data era sobre a aqui Autora e sobre o outro administrador que recaía o cumprimento do dever de manutenção e a observação regular da coisa.
21. Tal dever era escrupulosamente cumprido pelos então administradores do Condomínio.
23. No âmbito das Atas supra-aludidas é referida a necessidade de ponderação de obras na cobertura do prédio.
24. Não foi descurado o cumprimento do dever suprarreferido, no âmbito da anterior administração de condomínio.
28. O documento n.º ..., junto pelo Réu Condomínio com a sua Contestação sob a refª ...97, traduz um dos orçamentos obtidos pelos Autores para reparação dos danos devidamente comunicados.
29. Este orçamento junto pelo Réu com a sua Contestação é de data muito anterior à data do orçamento junto pelos Autores na petição inicial.
30. Os trabalhos abrangidos pelo orçamento apresentado pelos Autores são substancialmente diferentes dos trabalhos abrangidos pelo orçamento apresentado pelo Réu.
31. No orçamento datado de 05/02/2018 é considerada a colocação de teto em pladur,
32. Inversamente, no orçamento datado de 27/11/2018, é considerada a aplicação de teto novo em folha natural de madeira de carvalho, igual ao existente.
33. Por isso, os valores apresentados são diferentes.  

B) Factos Não Provados

B) Da contestação sob a refª ...97

8.º Há mais de uma década discute-se no prédio problemas relacionados com infiltrações, mas as deficiências na cobertura do edifício radicam em procedimentos que extravasam responsabilidades próprias e exigíveis ao Condomínio, quer ao nível dos atos de conservação, quer ao nível dos atos de manutenção.
14. À data da empreitada de reabilitação da cobertura, era a Sr.ª BB (aqui autora), quem estava incumbida do cargo de administradora do Réu Condomínio, sendo que a referida empreitada decorreu e terminou, ainda, durante o período da sua administração.
15.º Nos anos de 2016 e 2017, era a Autora Mulher quem, em conjunto com outro condómino, administrava o bloco nascente do edifício e, apenas, no ano de 2018 os atuais administradores, Sr.º CC e a Sr.ª DD, lhe vieram a suceder no cargo, em data em que a obra de reabilitação da cobertura já estava concluída.
18.º e 19º Vários proprietários do quarto e último andar, cujas frações autónomas se situam no nível imediatamente inferior à cobertura do edifício, aproveitando aquela localização privilegiada, mais concretamente o acesso direto a partir das suas frações, perfuraram a cobertura do edifício, para efeitos de instalação de lareiras e chaminés, equipamentos de uso exclusivo das respetivas frações autónomas.
20.º Essas lareiras e chaminés são omissas no projeto inicial do prédio, e não foram, prévia ou posteriormente, aprovadas pelas entidades camarárias, muito menos pelos demais condóminos, pelo que permanecem com natureza clandestina.
21.º Para a construção duma chaminé com uma configuração quadrangular, com cerca de 40 cm de lado, na fração autónoma de que os AA. são proprietários, foi criada a partir do seu interior uma abertura diretamente na cobertura, a qual atravessa verticalmente a cobertura do edifício desde a fração dos AA. e se estende pelo exterior.
22.º e 23º Com a aludida construção, realizada sem consentimento do Condomínio ou das autoridades camarárias, foi perfurada a placa e rasgada a tela original que integravam a cobertura, o que afetou toda a estrutura, a qual perdeu assim as suas qualidades primitivas, ficando irremediavelmente prejudicada, mormente ao nível da estanquicidade e da impermeabilização.
24.º A cobertura foi projetada como uma estrutura una e concebida sem a existência de quaisquer aberturas.
25.º Dos pareceres técnicos que foram sendo solicitados ao longo dos anos, a situação é irreversível, uma vez que, não se prevendo inicialmente a existência das aberturas em crise, a conceção da cobertura assentou em filamentos indivisíveis, que, quebrados ou perfurados, obstam à reposição das condições da cobertura sem perda das propriedades inicias.
26.º Os coretes de extração, instalados na construção de lareiras e correspondentes chaminés, são condutas autónomas que atravessam verticalmente todo o edifício e que são assim qualificadas como partes comuns do edifício.
27.º As chaminés, mais concretamente os taipais colocados na extremidade superior da conduta (vulgarmente designados de “bocas”), são, geralmente, pontos críticos de um prédio, estando, normalmente, associados a fenómenos de humidade e infiltrações.
28.º e 29º A respetiva instalação num prédio de configuração vertical é especialmente pensada para atenuar as mencionadas consequências, isto é, as condutas e chaminés são projetadas de modo a não ficarem sobrepostas sobre qualquer fração autónoma que integre o edifício, o que não foi minimamente acautelado na construção irregular existente na fração autónoma dos AA. .
30.º Por força do supra-exposto, as aberturas em crise põem em causa toda a segurança do edifício, e a extração de fumos e cheiros carece de uma conduta própria de ventilação integrada na estrutura global do edifício.
31.º É um dado plenamente assente e do conhecimento de todos os condóminos, inclusivamente dos AA., que aquelas aberturas afetam a impermeabilização da cobertura e a qualidade do revestimento, originando fenómenos de infiltrações.
32.º Depois de ampla discussão sobre o assunto, outros condóminos do Réu em situação idêntica à dos AA., acabaram por reconhecer o especial nexo entre a construção ilegal das chaminés e as infiltrações que se lhes seguiram, motivo pelo qual vêm assumindo como suas as responsabilidades relacionadas com infiltrações.
33.º e 34º Em face das demais aberturas ilegais existentes na cobertura, da responsabilidade dos diferentes proprietários das frações do quarto e último andar do edifício, não se descura a hipótese de eventuais episódios de infiltrações provirem de qualquer uma dessas aberturas, porquanto a água infiltrada, depois de instalada na placa, pode percorrer longos trilhos, escoando em diferentes pontos que podem (ou não) estar perto do local de origem do fenómeno infiltrativo.
35.º Na obra de reabilitação da cobertura, foi necessário proceder à colagem de tela impermeabilizante pelo exterior das chaminés (ilegais), fazendo-se os recortes e enchimentos na zona contígua às chaminés ali instaladas, procurando-se, com tal procedimento, vedar as fissuras existentes junto às aberturas, minimizando-se os efeitos da perfuração da tela única que aí deveria existir, não fosse a dita construção ilegal.
36.º Os AA. não são alheios à construção em crise, ainda que indiretamente, por intermédio dos anteproprietários ou antepossuidores da fração, sendo que na presente data mantêm o equipamento de lareira e a respetiva chaminé, utilizando-a em proveito próprio exclusivo.
37.º Toda a celeuma provocada pelas aberturas ilegais na cobertura é do perfeito conhecimento dos AA., na medida em que a matéria foi sistematicamente aflorada e discutida nas assembleias de condóminos, sendo que os AA. têm como seus vizinhos, no bloco nascente, familiares diretos, também eles há muito conhecedores da situação.
41.º Quando os AA. adquiriram a sua fração autónoma em 2004, já nessa altura, na sua fração, existiam os danos, reclamados nesta ação, provenientes da chaminé instalada ilicitamente na cobertura.
42.º Já o anterior proprietário da fração, Sr.º FF, havia sinalizado o problema, bem como a conexão entre a chaminé e as infiltrações, circunstância que era por todos os moradores bem conhecida, e era também do conhecimento dos aqui AA. à data da aquisição da fração em causa.
43.º Os danos/defeitos na fração autónoma dos AA. - agora reclamados na presente instância – são já antigos, remontam mesmo ao tempo em que os AA. adquiriram a sua fração.
46.º Desde 2004, ou, pelo menos, desde data situada muito tempo antes do prazo com início três anos antes da data da citação do Réu, os AA., querendo, podiam ter exercido o seu direito, uma vez que os danos na sua fração já existiam e daqueles eram bem conhecidos.
47.º Pelo menos desde o ano de 2016, ano em que era a própria Autora Mulher a administradora do Réu, foram iniciados os procedimentos prévios no fito da reabilitação da cobertura.
50.º O valor para a reparação dos defeitos, veiculado pelos AA., no montante de € 3.225,00 (acrescido de IVA), está inflacionado.
54.º Os defeitos na fração dos AA. circunscrevem-se ao teto da sala, sendo o montante apresentado pelos AA., de € 3.225,00 (acrescido de IVA), desfasado da realidade.
55.º Os defeitos da fração dos AA. estão circunscritos a uma parte do imóvel e tudo o mais é consequência do desgaste natural ou da ação do tempo, ou, ainda, resultado de fenómenos de condensação, aos quais o Réu é alheio.
57.º Os danos estruturais na fração dos AA. são consequência direta e necessária dos equipamentos que aqueles ilicitamente preservam na sua fração autónoma.
58.º Não é possível determinar qualquer infiltração da responsabilidade própria do Réu Condomínio.
59.º Nunca existiu, da parte do Réu e dos seus administradores, uma atuação ou, melhor, uma omissão ilícita geradora de responsabilidade.

IV -Fundamentação de Facto e de Direito

.1- - do vício por omissão de pronúncia e

Da exceção dilatória de ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário passivo

O Recorrente alegou a nulidade da sentença por omissão de pronúncia, invocando que defendeu a questão da ilegitimidade passiva por preterição de litisconsórcio necessário passivo que não foi conhecida.
Compulsados os autos, verifica-se que na contestação não invocou esta questão desta forma, limitando-se a apontar uma nota prévia, a qual termina mencionando que “as pessoas identificadas no douto articulado inicial como representantes legais do R… estão incumbidos por deliberação (da assembleia) da administração do bloco nascente, porém, só desta parcela/bloco do edifício, não gozando assim de mandato e, por conseguinte, de legitimidade para representar o bloco poente.”
No entanto, uma leitura mais atenta pode configurar esta alegação como a invocação de uma exceção dilatória, a qual não foi de forma alguma apreciada na sentença.
As causas de nulidade da sentença estão taxativamente previstas no artigo 615º nº 1 do Código de Processo Civil e são de caráter formal, dizendo respeito a desvios no procedimento ocorridos na sentença que impedem que se percecione uma decisão de mérito do concreto litígio: não se confundem com todas as situações que podem inquinar uma sentença ou despacho e conduzir à sua revogação.
Não abarcam todas e quaisquer falhas de que uma sentença ou um despacho podem padecer: têm que traduzir-se na  falta de assinatura do juiz, na omissão total dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; ininteligibilidade da decisão por oposição entre esta e os fundamentos, ambiguidade ou obscuridade; omissão de pronúncia sobre pedidos, causas de pedir ou exceções que devessem ser apreciadas ou conhecimento de questões de que não se podia tomar conhecimento; condenação em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido. Atingem as decisões por razões de natureza mais formal, sem averiguar da sua razão, legalidade ou bondade.
Assim, não constituem nulidade da sentença os erros de direito, os casos que se incluem nas questões relativas à modificabilidade da matéria de facto, como a deficiente seleção dos factos ou imperfeita valoração dos meios de prova, nem tão pouco os erros de raciocínio, omissão de pronúncia sobre todos os argumentos levados aos autos e violação de caso julgado.
É efetivamente causa de nulidade da sentença a omissão de pronúncia sobre questões que a exigiam, como dispõe a alínea d) do artigo 615º do Código de Processo Civil.
Essas questões, cuja omissão de pronúncia determina a nulidade da sentença, são aquelas a que se refere o artigo 608º nº 2 do Código de Processo Civil e não são os simples argumentos, razões ou elementos parciais trazidos à liça: identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir e com as exceções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio.
Por outro lado, porquanto se estipula no artigo 665º nº 1 do Código de Processo Civil que ainda que declare nula a decisão que põe termo ao processo, o tribunal de recurso deve conhecer do objeto da apelação, a sua consequência resume-se, em regra, à substituição da decisão proferida pela solução que venha a ser obtida no tribunal de apelação, com resultado semelhante ao que se obtém com a normal apreciação da decisão impugnada objeto do recurso.
Não há dúvida que a questão da ilegitimidade de uma parte é uma exceção dilatória fulcral para a decisão da causa, por determinar, caso proceda e não seja passível de sanação, a absolvição da instância e por, sendo sanável, determinar o chamamento à lide de todos os interessados para que a decisão obtenha o efeito sobre todos aqueles que legalmente afeta diretamente.
A questão da ilegitimidade (dos representantes do condomínio) foi invocada na contestação (embora de forma algo transversa) e não foi apreciada em lado algum.
Verifica-se, pois, a invocada nulidade, não obstante no despacho que admitiu o recurso se ter afirmado, sem fundamentar, que a mesma era manifestamente improcedente.

Há, em consequência, que conhecer da invocada ilegitimidade do condomínio.

Como se diz na sentença, a propósito da ilegitimidade de outra parte, que veio a ser absolvida: “O artigo 30.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC) define a legitimidade passiva em função do interesse direto em contradizer, o qual se exprime pelo prejuízo que da procedência da ação advenha para o demandado (cfr. n.º 2 do artigo 30.º do CPC). A lei esclarece ainda melhor este conceito de legitimidade afirmando que tal interesse deverá aferir-se em face da relação material controvertida tal como o autor a apresenta, independentemente dessa relação existir ou ser verdadeira (cfr. artigo 30.º, n.º 3 o mesmo diploma legal).
Assim, a legitimidade tem que ser apreciada e determinada pela utilidade (ou prejuízo) que da procedência (ou improcedência) da ação possa advir para as partes, face aos termos em que o autor configura o direito invocado e a posição que as partes, perante o pedido formulado e a causa de pedir, têm na relação jurídica material controvertida, tal como a apresenta o autor.
É perante esta relação material, integrada, antes de mais, pelos factos que constituem a causa de pedir da ação, que se impõe apreciar do interesse do demandado em contestar essa ação     advir para as partes, face aos termos em que o autor configura o direito invocado e a posição que as partes, perante o pedido formulado e a causa de pedir, têm na relação jurídica material controvertida, tal como a apresenta o autor.
É perante esta relação material, integrada, antes de mais, pelos factos que constituem a causa de pedir da ação, que se impõe apreciar do interesse do demandado em contestar essa ação”.
É certo que neste caso, em que se coloca em causa a possibilidade de existir um condomínio relativo a apenas parte de  um prédio, o vício em questão poderia ser caraterizado mais como a falta de personalidade judiciária (cf artigo 12.º, alínea e) do Código de Processo Civil), caso se considerasse que o condomínio não estava validamente constituído, mas invocada a ilegitimidade do condomínio com o fundamento de que o mesmo não poderia deliberar sobre a matéria em causa, há também que analisar a questão por tal prisma, sem fugir à primeira questão.
O Recorrente afirmou que, pela configuração própria do edifício, os blocos poente e nascente gozam de características que lhes conferem autonomia, e, por esse motivo, há mais de vinte anos a esta data, existe um administrador (de condomínio) para o bloco poente e outro para o bloco nascente, não existindo administrador geral. 
Deu-se como assente que tanto a cave do edifício, destinada a garagens, como a cobertura, são comuns e indissociáveis do conjunto dos dois blocos, mas também está provado que há mais de vinte anos que o prédio tem sido gerido tendo em conta os dois blocos diferenciados em que se constitui, com dois condomínios, por gozarem de autonomia, por administradores diferentes,  resultando da matéria de facto provada que a cobertura do bloco que ora tratamos, tem sido gerido unicamente pelo seu condomínio, como resulta dos pontos da matéria de facto provada que a sentença indicou sob o título “da petição inicial sob a Refª ...33 “, com os números 23, 24; dos pontos indicados sob o título “Da contestação sob a refª ...97” com os números 1º, 2º, 11º e 12º; dos pontos que a sentença intitulou “Da resposta à Contestação, sob a Refª ...57” com o número 23º.
Ora, como já foi escrito por este tribunal no processo 3428/16...., no acórdão de 17/12/2018, entendemos que “Não há imposição legal para que a cada prédio urbano constituído em propriedade horizontal corresponda um condomínio; podem ser constituídos condomínios autónomos dentro de cada prédio sempre que estes correspondam a edifícios ou estruturas independentes. 2. Assim, é de reconhecer a legitimidade passiva de um condomínio constituído relativo às partes comuns de um bloco de um prédio constituído em propriedade horizontal, quando aquele se molda a um bloco do edifício com estruturas independentes, autónomo, que se administra há mais de vinte anos e quando estão em causa interesses que apenas dizem respeito às partes comuns que fazem parte desse bloco.”
Esta posição também foi seguida no acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 02/21/2022, no processo 575/21...., face a título de constituição de propriedade horizontal que autonomizava cada uma das partes independentes: “Ainda que se trate de um só edifício, mas cuja configuração integre uma estrutura que se possa autonomizar em relação às demais estruturas, é possível constituírem-se condomínios autónomos, tendo cada uma deles personalidade judiciária para intervir nos assuntos que respeitam às partes comuns das frações que os integram.”
No presente caso resulta da matéria de facto provada que há vinte anos que a cobertura do bloco em questão tem sido zelada e administrada unicamente pelo condomínio do respetivo bloco, pelo que o mesmo tem personalidade judiciária. Nestes autos discutem-se as consequências dessa administração, imputando-se-lhe negligência por não ter zelado pelas partes comuns de forma a evitar infiltrações, pelo que o mesmo tem interesse em contradizer. É, pois, parte legítima passiva nesta ação em que se discute a sua deficiente administração.
Assim, embora se julgue procedente a arguida nulidade da sentença por omissão de pronúncia, sana-se a mesma, conhecendo-se da questão e julga-se improcedente a arguida exceção dilatória de ilegitimidade passiva.

.2- Da nulidade da sentença por falta de fundamentação e excesso de pronúncia

.a) - por falta de fundamentação

Em primeiro lugar, o Recorrente afirmou que a sentença padece de falta de fundamentação, porquanto três testemunhas que arrolou depuseram no sentido invocado pelo Recorrente quanto à causa das infiltrações e a sentença não deu como provada essa posição, com base no depoimento de uma só outra testemunha, afirmando que esta foi imparcial, mas sem explicar porquê.
Ora, as nulidades da decisão são apenas as que estão taxativamente previstas no artigo 615º do Código de Processo Civil - cf., entre muitos, quanto à taxatividade, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/20/2021, no processo 1544/16.8T8ALM.L1.S1.
Quanto a este vício de falta de alicerçagem da decisão, é de relevância primordial salientar que, quer as sentenças, quer os despachos, têm que ser fundamentados, divergindo, no entanto, o grau de exigência de fundamentação em função da complexidade da situação.
Este dever de fundamentação das decisões judiciais tem em vista um conjunto de objetivos que são fundamentais no nosso Estado de Direito: contribui para a eficácia das decisões, conseguindo-se o seu respeito, não pela força da autoridade, mas pela razão com que convencem; sendo, pois, um fator de legitimação do poder judicial; permite o controlo da decisão, possibilitando a sindicância do processo lógico e racional que lhe esteve na base, impedindo, desta forma, decisões arbitrárias e garantindo a transparência do processo decisório e o respeito da independência e da imparcialidade das decisões. Processualmente tem ampla utilidade, quer na fase decisória, obrigando o tribunal que a profere a verificar e controlar a sua própria decisão, quer posteriormente, permitindo a sua reapreciação através de recurso.
Assim, a fundamentação visa garantir a inexistência de decisões arbitrárias, além de garantir implicitamente o direito a um processo justo e equitativo.
É por isso que o dever de fundamentação das decisões incorpora uma garantia integrante do próprio conceito de Estado de direito democrático. Assim, este princípio tem tutela no artigo 6º da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem das Liberdades Fundamentais, no artigo 10º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 205º nº 1 da Constituição da República Portuguesa e é especificada no artigo 154º do Código de Processo Civil.
A omissão do dever de fundamentação é causa de nulidade da decisão nos termos da alínea b) do artigo 615º do Código de Processo Civil, que se reporta às sentenças, mas que é extensivo aos despachos nos termos do artigo 613º, nº 3, do Código de Processo Civil.
É pacífico, no entanto, citando-se Alberto dos Reis, em Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2.º, Coimbra Editora, 1945, págs. 172-173, demonstrando a segura consolidação desta posição, que “O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos”. A nulidade por falta de fundamentação, prevista no art. 615º, nº 1, al. b), do Código de Processo Civil, não se verifica quando apenas tenha havido uma justificação incompleta, deficiente ou pouco persuasiva, apenas tendo lugar se for a omissão de substruções for completa e total.
Por outro lado, o Recorrente, no fundo, o que apontou à sentença foi o vício especificamente previsto no artigo 662.º, n.º 2, alínea d), do Código de Processo Civil, “não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa”, integrado nos casos da modificabilidade da decisão e facto e seguindo o especial previsto para tal falha, não o artigo 615º do Código de Processo Civil.
Ao imputarem-se erros na apreciação da matéria de facto provada e não provada está-se a levantar questão alheia à nulidade prevista no artigo 615º do Código de Processo Civil. Entra-se, caso caiba razão ao Recorrente, numa situação de erro na apreciação da matéria de facto, por deficiente avaliação da prova, sujeita a um regime diferente do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
No entanto, a sentença explicou porque razão entendeu que este depoimento era importante para colocar em causa a tese que as três testemunhas que menciona anteriormente pretendiam fazer passar: porque a entendeu imparcial (depôs contra os seus interesses na ação, porque é condómino) e a posição daquelas não tinha qualquer outro suporte. Assim, também trouxe outros motivos para não sufragar a tese da Recorrente, para além de apontar as incongruências internas do depoimento de uma das testemunhas: a inexistência de prova pericial ou documental que a suportasse. O que se compreende, por se estar a discutir matéria com carater técnico, relativa à origem de infiltrações, área que as testemunhas não se mostraram particularmente conhecedoras.
Termos em que conclui que a sentença não padece da invocada nulidade e que não existiu deficiente fundamentação da matéria de facto, nem erro na sua apreciação.

.b) - por excesso de pronúncia

O Recorrente defendeu que a sentença é nula por excesso de pronúncia, porque o tribunal não estava em condições de saber qual o valor dos prejuízos efetivamente reclamados nesta ação, tendo acabado por condenar o Recorrente em montante superior ao peticionado, ofendendo os limites da causa de pedir e do pedido.
Ocorre excesso de pronúncia quando o tribunal conhece de questões que, não sendo de conhecimento oficioso, não foram colocadas pelas partes.
Ora, os Autores ampliaram o pedido no sentido de o Réu ser condenado a pagar-lhes a quantia de 7.300,00 €, alegando, em síntese, que a reparação dos vícios causados pelas infiltrações orçava, naquele momento, esse valor.
Visto que o Tribunal respeitou esse montante e condenou a Ré a pagá-lo, não foi para além do pedido. Visto que preservou o fundamento da condenação no pagamento desse valor dentro do que havia sido invocado para sustentar o respetivo pedido, também não ocorreu qualquer excesso de pronúncia.
Questão diferente é saber se a condenação no pagamento deste valor não teve em conta a matéria de facto provada e não provada e não resulta de uma correta aplicação do direito aos factos apurados, traduzindo-se num erro na sentença (questão que infra se analisará). Mas não se traduz na sua nulidade.
Termos em que improcede a nulidade da sentença também com fundamento no excesso de pronúncia.

.3- Da impugnação da matéria de facto não provada

A Recorrida põe em causa a admissibilidade da impugnação da matéria de facto provada por, no seu entender, o Recorrido não cumprir os ónus impostos pelo artigo 640º do Código de Processo Civil.
Nos termos deste artigo existem requisitos específicos para a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto com base em diversa valoração da prova, os quais, se não observados, conduzem à sua rejeição.
Assim, impõe esta norma ao recorrente o ónus de:
a) especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) especificar os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação ne­le realizada, que impunham diferente decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados. (sendo a exigência da indicação exata das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados, a que se refere o nº 2, alínea a), deste artigo, considerado um ónus secundário, por instrumental, não obstante a expressa letra da norma).
c) especificar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
É patente, numa primeira linha, que no novo regime foi rejeitada a admissibilidade de recursos que se insurgem em abstrato contra a decisão da matéria de facto: o Recorrente tem que especificar os exatos pontos que foram, no seu entender, erroneamente decididos e indicar também com precisão o que entende que se dê como provado.
 Pretende-se, com a imposição destas indicações precisas ao recorrente, impedir “recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, restringindo-se a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente.” cfr Recursos no Novo Código de Processo Civil, António Santos Abrantes Geraldes, 2017, p.153.
Por estes motivos, o recorrente, tem também que especificar os meios de prova constantes do processo que determinam decisão diversa quanto a cada um dos factos, evitando-se que sejam apresentados recursos inconsequentes, não motivados, com meras expressões de discordância, sem fundamentação que possa ser percetível, apreciada e analisada.
Quanto a cada um dos factos que pretende que obtenha diferente decisão da tomada na sentença, tem o recorrente que, com detalhe, indicar os meios de prova deficientemente valorados, criticar os mesmos e, também discriminadamente e explicadamente, concluir pela resposta que deveria ter sido dada.
Relativamente ao ónus de especificar os concretos meios probatórios, particulariza o nº 2 deste preceito: “Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes”.
É comum verificar-se que há a tendência, nas alegações, no discorrer da pena, de misturar a impugnação do facto e do direito, trazendo opiniões sobre o que foi dado como provado, afirmando ter opinião diversa, mas conformando-se ainda assim com tal parte da decisão tomada. Desta forma, impõe-se que nas conclusões o Recorrente indique concretamente quais os pontos da matéria de facto que impugna, de forma a poder-se, com clareza, separar a mera exposição da sua apreciação sobre a prova da reivindicação fundamentada quanto à alteração da matéria de facto.
O que se pretende, com a exigência ao recorrente de assinalar "com exatidão as passagens da gra­vação em que se funda o seu recurso", é onerá-lo com o esforço de se assegurar que existem, na prova gra­vada em que se pretende fundar, declarações que efetivamente justificam a sua discordância. Da mesma for­ma, permite-se ao tribunal que verifique diretamente, pelo acesso aos elementos objetivos do processo, apon­tadas pelo recorrente de forma definida e concretizada, da existência de alguns indícios nesse sentido, a exi­gir posterior análise.
Tem sido também opinião praticamente pacífica, e que se perfilha, que no âmbito da impugnação da matéria de facto não há lugar ao convite ao aperfeiçoamento da alegação, ao contrário do que se verifica quanto às alegações de direito. A tal convite se opõe, por um lado, a intenção da lei em não permitir impugnações vagas, sem bases consistentes, genéricas e injustificadas da decisão da matéria de facto, sendo aqui mais exigente no princípio da autorresponsabilização das partes. Veja-se que essa maior responsabilização é premiada com um alargamento do prazo processual para a apresentação das alegações quando ao recurso se funda também na impugnação da matéria de facto.  Por outro lado, a leitura das normas que regem esta matéria não permite outro entendimento, como resulta da análise do teor taxativo do artigo 640º e da previsão dos casos que justificam o convite constante do artigo 639º, ambos do Código de Processo Civil.
Cumpre ainda salientar que a apreciação das questões  pelo Tribunal da Relação deverá versar  sobre as questões levantadas pelo Recorrente, sendo, por isso,  do interesse deste o cumprimento com rigor dos ónus expressos no normativo que se discute, por conduzir a um maior aprofundamento da análise que pretende que seja efetuada num sentido divergente ao obtido na sentença, o que será potenciado com a especificação dos factos e a mais aprofundada concatenação de cada facto com a prova produzida, criticando o raciocínio efetuado na sentença. Com efeito, a maior parte das vezes, haverá alguma proporção entre a profundidade com que a parte apresenta as suas questões sobre a fixação da matéria de facto pelo tribunal recorrido e o calibre e a densidade que toma a apreciação das questões suscitadas.
No 17 de outubro de 2023 prolatado o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência, n.º 12/2023, publicado no Diário da República n.º 220/2023, Série I de 2023-11-14, páginas 44 – 65, com a seguinte  síntese : “Nos termos da alínea c), do n.º 1 do artigo 640.º do Código de Processo Civil, o Recorrente que impugna a decisão sobre a matéria de facto não está vinculado a indicar nas conclusões a decisão alternativa pretendida, desde que a mesma resulte, de forma inequívoca, das alegações”, procurando “a interpretação que se configure mais adequada no atendimento do estado atual do nosso ordenamento jurídico”, “num crescendo da preocupação da verdade material em detrimento da observação de formalidades, de menor relevância, ainda que algumas tenham resultado das inovações técnicas ocorridas, sem contudo deixar de manter a exigência, no que à impugnação da decisão da matéria respeita do cumprimento dos ónus enunciados”. Ali se é perentório a afirmar que:
Da articulação dos vários elementos interpretativos, com cabimento na letra da lei, resulta que em termos de ónus a cumprir pelo recorrente quando pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto, sempre terá de ser alegada e levada para as conclusões, a indicação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, na definição do objeto do recurso.  [salientando embora que a mesma não precisa de ser indicada pela respetiva numeração.]
Quando aos dois outros itens (leia-se alíneas b) e c) do nº do artigo 640º do Código de Processo Civil), caso da decisão alternativa proposta, não podendo deixar de ser vertida no corpo das alegações, se o for de forma inequívoca, isto é, de maneira a que não haja dúvidas quanto ao seu sentido, para não ser só exercido cabalmente o contraditório, mas também apreendidos em termos claros pelo julgador, chamando à colação os princípios da proporcionalidade e razoabilidade instrumentais em relação a cada situação concreta, a sua não inclusão nas conclusões não determina a rejeição do recurso”.
Assim, na posição deste acórdão uniformizador tais ónus têm que ser cumpridos pelo menos nas alegações, mas podem não ser vertidos para as conclusões, com exceção da identificação dos concretos pontos facto que considera incorretamente julgados, que ali devem têm necessariamente de constar, sob pena de rejeição do recurso nessa parte.
Entende-se que as razões que legitimariam posição diferente, aliás retratadas nos votos de vencido, não justificam postergar os interesses na segurança e certeza do direito trazida pelos tais acórdãos.

Assim, há que verificar, para admitir o recurso quanto à impugnação da matéria de facto se:

1) consta das conclusões a indicação dos concretos pontos que o Recorrente considera incorretamente julgados?
2) constam das alegações os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação ne­le realizada, que impunham diversa decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados?
3) vem especificada nas alegações, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas?
Ora, tendo em conta que as conclusões e alegações da Recorrente quanto a determinados pontos da matéria de facto provada cumprem estes requisitos, ainda que sofrivelmente, mas já não quanto a outros, iremos analisando o cumprimento destes requisitos à medida que analisamos os factos que não são aceites pelo Recorrente.

Concretização

A) dos factos nº  8.º, 18.º, 19.º , 20.º, 25.º, 26., 31.º , 36.º , 37.º ,41.º , 42.º da contestação sob a refª ...97
O Recorrente insurgiu-se contra o facto de terem sido consideradas como não provadas as seguintes alegações da “contestação sob a refª ...97”: «8.º Há mais de uma década discute-se no prédio problemas relacionados com infiltrações, mas as deficiências na cobertura do edifício radicam em procedimentos que extravasam responsabilidades próprias e exigíveis ao Condomínio, quer ao nível dos atos de conservação, quer ao nível dos atos de manutenção. (…) 18.º e 19º Vários proprietários do quarto e último andar, cujas frações autónomas se situam no nível imediatamente inferior à cobertura do edifício, aproveitando aquela localização privilegiada, mais concretamente o acesso direto a partir das suas frações, perfuraram a cobertura do edifício, para efeitos de instalação de lareiras e chaminés, equipamentos de uso exclusivo das respetivas frações autónomas. (…) 20.º Essas lareiras e chaminés são omissas no projeto inicial do prédio, e não foram, prévia ou posteriormente, aprovadas pelas entidades camarárias, muito menos pelos demais condóminos, pelo que permanecem com natureza clandestina. (…) 25.º Dos pareceres técnicos que foram sendo solicitados ao longo dos anos, a situação é irreversível, uma vez que, não se prevendo inicialmente a existência das aberturas em crise, a conceção da cobertura assentou em filamentos indivisíveis, que, quebrados ou perfurados, obstam à reposição das condições da cobertura sem perda das propriedades inicias. 26.º Os coretes de extração, instalados na construção de lareiras e correspondentes chaminés, são condutas autónomas que atravessam verticalmente todo o edifício e que são assim qualificadas como partes comuns do edifício. (…) 31.º É um dado plenamente assente e do conhecimento de todos os condóminos, inclusivamente dos AA., que aquelas aberturas afetam a impermeabilização da cobertura e a qualidade do revestimento, originando fenómenos de infiltrações. (…) 36.º Os AA. não são alheios à construção em crise, ainda que indiretamente, por intermédio dos anteproprietários ou antepossuidores da fração, sendo que na presente data mantêm o equipamento de lareira e a respetiva chaminé, utilizando-a em proveito próprio exclusivo. (…) 37.º Toda a celeuma provocada pelas aberturas ilegais na cobertura é do perfeito conhecimento dos AA., na medida em que a matéria foi sistematicamente aflorada e discutida nas assembleias de condóminos, sendo que os AA. têm como seus vizinhos, no bloco nascente, familiares diretos, também eles há muito conhecedores da situação. (…) 41.º Quando os AA. adquiriram a sua fração autónoma em 2004, já nessa altura, na sua fração, existiam os danos, reclamados nesta ação, provenientes da chaminé instalada ilicitamente na cobertura. 42.º Já o anterior proprietário da fração, Sr.º FF, havia sinalizado o problema, bem como a conexão entre a chaminé e as infiltrações, circunstância que era por todos os moradores bem conhecida, e era também do conhecimento dos aqui AA. à data da aquisição da fração em causa.»
Afirmou que foram instaladas chaminés que perfuraram a cobertura, a qual, por isso, perdeu qualidades originais, o que ocorreu também na fração autónoma dos Autores e que é facto notório que há uma especial ligação entre a perfuração da cobertura e as infiltrações que daí provêm para a fração autónoma dos Recorridos.  Mais referiu que não existe discrepância naquilo que é o sentido literal dos depoimentos e o sentido que lhes é conferido na sentença recorrida no que toca aos depoimentos de II, EE que “declarou com especial relevo que os Autores reclamaram dos defeitos desde que foram viver para o prédio em causa, o que significa que os defeitos alegados pelos Autores, nesta ação, sempre existiram e o Réu Condomínio não os reparou” e FF que “declararam unanimemente que as infiltrações em diversas frações, a dos Autores incluída, se deveram à construção ilegal de chaminés.”
Apesar de não termos por claro que a aceitação da descrição que a sentença faz destes depoimentos exonere o Recorrente de explanar as passagens da gravação que entende que fundam a sua posição, não se entra nessa discussão, por se entender que existem razões de fundo que se sobrepõem a tal discussão formal: existe contraprova suficiente que coloca em causa tais depoimentos.
A ideia que o Recorrente retira destes depoimentos é desconstruída ou pelo menos posta em causa pelo relatório apresentado pela companhia de seguros chamada a intervir, que refere o “desgaste da tela asfáltica da cobertura do prédio” e que a cobertura do prédio já havia sido reparada. Remete para facto ocorrido pelo ano de 2017, imputando as situações de humidades a quase todo o prédio, as quais teriam terminado cerca do ano de 2018 com a colocação de telas asfálticas.
Assim, o depoimento daquelas testemunhas, que não são peritas na matéria e são parte interessada por fazerem parte do condomínio, mais a mais contraditadas por perícia externa ao próprio condomínio e o depoimento de outro condómino do prédio, não é suficiente para considerar provado que as infiltrações se deram por força de outras obras efetuadas na fração autónoma, que nem sequer são imputadas a ação dos Autores.
Deste modo, concorda-se com a sentença quando entendeu que a tese da Recorrente não obteve elementos de prova que com segurança suficiente a demonstrassem.
Visto que tais obras já foram objeto de correção, como afirma o referido relatório, conclui-se que uma perícia dificilmente poderia trazer resultados sobre o que se encontrava anteriormente a tal reparação, mostrando-se por isso impertinente e desnecessária.
Por outro lado, não há razões para auxiliar a Recorrente na prova da sua tese, tanto mais que o tribunal não tem dúvidas razoáveis quanto ao nexo de causalidade entre as infiltrações e a falta de cuidados com a cobertura, face ao relatório apresentado de onde resulta o envelhecimento das telas asfálticas e ao facto das infiltrações terem desaparecido com a intervenção na cobertura.
O Recorrente impugnou também os seguintes factos, por entender que deveriam ser dados como não provados:
“45. Com o estado em que se encontra o teto da sua habitação, os Autores vivem angustiados pela constante iminência de ver o teto da sua casa ruir, acabando por causar ainda mais estragos, quer materiais quer imateriais.
46. Além de não terem reunidas as condições de salubridade, higiene e segurança, os Autores enfrentam também desconforto visual e de manobra dentro do espaço que habitam em consequência das aludidas infiltrações. (…)
49. Estas humidades afetam gravemente a saúde do agregado familiar dos Autores.
50. Os Autores são, hoje, pessoas ansiosas e nervosas, por não verem esta situação solucionada.”
Invoca para tanto que estão em desacordo com as regras da experiência comum.
Afirmou, em síntese, que a cobertura do prédio foi submetida a intervenção já no ano de 2018, tendo cessado as infiltrações no interior da fração autónoma dos Recorridos, pelo que mal se concebe que, cessadas as infiltrações, as condições de higiene se tenham progressivamente deteriorado,  que a fração dos Recorridos se tenha mantido insalubre, sujo e húmido, com um maus odores, mesmo após as sobreditas obras,   pois que, são os próprios que reconhecem expressamente não terem sofridos mais infiltrações após a intervenção na cobertura. 
Ora, é normal que a água ou humidade proveniente de infiltrações se mantivesse no local onde se veio a instalar (no teto revestido a folha de madeira de carvalho natural e nas paredes), demorando tempo a secar, mesmo depois das infiltrações cessarem e da mesma forma que um excesso de água, deteriorando a madeira, crie o risco desta se soltar, tudo prejudicando as normais condições de humidade dentro da fração e a criação de um ambiente propício a bolores e problemas de saúde das pessoas, diminuindo a "salubridade, higiene e segurança" da fração e criando ansiedade e angústia a quem nela reside. Também por aqui não se lhe pode dar razão.
Assim, improcede nesta parte a impugnação da matéria de facto.

.4- Da aplicação do Direito aos factos apurados

.a- Da responsabilidade do Recorrente: inexistência de razões para o seu afastamento ou redução

Quanto ao fundamento da responsabilidade basta recorrer às afirmações do próprio Recorrente: “É certo que a cobertura é uma parte comum do Recorrente, que, como tal, está sob a sua administração. E ao abrigo do disposto no artigo 493º do CCiv, quem tiver em seu poder coisa, móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar, responde pelos danos que a coisa causar. Por seu turno, o incumprimento dos referidos deveres impõe ao incumpridor a obrigação de reparar os danos causados a terceiros, obrigação essa que radica no instituto da responsabilidade civil extracontratual (artigo 483º do CCiv)”
No entanto, o Recorrente também afirma que não se verifica omissão do Condomínio de proceder à reparação da cobertura, tanto mais que, como resulta do dos factos provados, a obra foi efetivamente realizada.
Todavia, resulta da matéria de facto provada que a obra foi tardiamente executada, visto que “o hiato de tempo que mediou, até à reparação, ocasionou infiltrações e consequentes estragos, de diversa natureza, na fração autónoma que constitui propriedade dos autores.”
Assim, não há dúvidas que o Condomínio devia ter procedido à administração do condomínio de forma a zelar para que a cobertura estivesse sempre em condições, procedendo a todos os cuidados necessários para tal, nomeadamente substituindo os materiais que com o tempo se estragam e que o não o fez tempestivamente, de forma a impedir que ocorressem infiltrações que interferissem com o estado das frações autónomas.
Nada nos autos foi apresentado no sentido de que alguma coisa impediu o tempestivo exercício deste dever de manutenção da cobertura, não só a sua reparação.
Assim, há que concluir pela responsabilidade do Recorrente pelos danos apurados.
Afirmou também que a cobertura do prédio foi submetida a intervenção já no ano de 2018, tendo cessado as infiltrações no interior da fração autónoma dos Recorridos, pelo que mal se concebe que, cessadas as infiltrações, as condições de higiene se tenham progressivamente deteriorado.  Como vimos, é expectável que a entrada de água pelos tetos e a sua fixação na madeira a venha a estragar e que possa demorar a secar, criando um ambiente pouco são e inerente desgaste psicológico.
Assim, como se decidiu supra, analisada toda a prova, com particular enfâse nos elementos em que o Recorrente funda a sua impugnação, este tribunal formou uma convicção quanto à matéria de facto semelhante á expressa na sentença: não se provou que a colocação de uma chaminé tenha tido alguma influência no aparecimento das infiltrações, que a Autora tenha mandado realizar tal chaminé, nem que nos anos que antecederam a intervenção era a Recorrida-mulher quem exercia as funções de administradora do Condomínio Recorrente, nem que foi a mesma que mercê da sua omissão não logrou que o condomínio exercesse esse dever. Por isso, improcede também a refutação da aplicação do direito na parte em que se funda na alteração da matéria de facto provada, onde se incluiu a invocação do especial nexo entre as sobreditas chaminés e os fenómenos de infiltrações, o venire contra factum proprium, qualquer outra modalidade do abuso do direito ou a ideia da "culpa do lesado".
Visto que o Recorrente retoma esta invocação em sede de discussão dos danos não patrimoniais, cumpre aprofundá-la no que toca à culpa do lesado, que, como é sabido, é um dos elementos cuja verificação é necessária para que se conclua pela responsabilidade civil extra-contratual, nos termos do artigo 483º do Código Civil.
No caso aplica-se ainda o disposto no artigo 493º, n.º 1 do Código Civil, porquanto o condomínio está vinculado ao dever de manter, conservar e reparar as zonas comuns do edifício, pelo que nos termos desta norma responde pelos danos causados pelas partes comuns, “salvo se provar que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua”.
O Recorrente invoca que a Recorrida-mulher, foi ela própria administradora do Recorrente durante o ano de 2016 e 2017, sendo que as obras de reabilitação da cobertura do edifício terminaram no ano seguinte. De relevante, há que atentar que resulta do alegado pelo Recorrente que a Recorrida logrou resolver o assunto, logrando que as obras de reabilitação terminassem no ano seguinte ao seu mandato, o que não põe de forma alguma em causa a anterior omissão de agir do condomínio e os danos que assim se apuraram. Afastada está a sua concorrência para os danos.
Também por aqui não se lhe pode dar razão.

.b- Do valor dos danos patrimoniais

Pretende o Recorrente que a sentença é nula por excesso de pronúncia por não ter elementos para a condenação do Recorrente, mas, como vimos supra, essa não é uma das causas da nulidade da sentença, mas de erro na aplicação do Direito.
Não coloca em causa a condenação alternativa que foi peticionada e foi aceite na sentença, mas sim o seu montante, pelo que se dá como válida a possibilidade de existir uma condenação alternativa como matéria decidida entre as partes. O Recorrente afirmou que não existem elementos na sentença que justifiquem tal condenação. Embora dissesse, no que o não seguimos, que tal consistia em nulidade da sentença, importa verificar se o mesmo tem razão quanto à matéria de fundo.
Os Autores peticionaram a condenação do Réu a efetuar as reparações ou a pagar o seu valor, tendo no decurso dos autos ampliado o seu valor para 7.300,00 €.
Efetuado o julgamento apuraram-se os danos da fração autónoma dos Autores causados pelas infiltrações e condenou-se o Réu na sua reparação.
Mas, em alternativa, condenou-se o mesmo a pagar o valor de 7.300,00 €, que se fixaram a título de danos patrimoniais (como se fosse este o custo dessas obras). No entanto, nada na matéria de facto provada ou na fundamentação da sentença explica como foi encontrado esse valor.
Observada a matéria de facto provada efetivamente não se encontra qualquer elemento que permita que se conclua que caso os Autores ou o Réu contratem alguém para efetivar tais obras terão, segundo as regras atuais do mercado, que lhes pagar tal valor, ou seja, que as obras objeto da condenação têm esse custo.
Face ao teor do artigo 609º nº 1 e 2 do Código de Processo Civil, vê-se que o nosso processo civil entende como natural a relegação para incidente posterior a determinação do valor concreto do crédito, mesmo que tenha sido efetuado um pedido líquido: “A sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir. Se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, sem prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.”
Caso não fosse possível ao tribunal relegar para liquidação o montante do crédito quando o pedido efetuado fosse líquido, estando o tribunal limitado a fazê-lo quando a parte o pedisse, não teria qualquer sentido a existência do nº 2 deste preceito, porque sempre se estaria no âmbito do nº 1.
No entanto, há que ter em atenção que esta liquidação só pode ocorrer quando se prove, previamente, a existência de um crédito, mas cujo montante ainda não foi possível apurar e que o seu valor nunca poderá ir para além do valor peticionado.
Assim, como se diz no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 07/04/2019, no processo 5071/12.4TBVNG.1.P1.S1 “I. A liquidação é um incidente da instância com estreita ligação à ação que reconheceu a existência de um crédito, que não foi quantificado, quer por não ter sido possível, quer por o autor ter formulado um pedido ilíquido ou genérico.”
No presente caso provou-se que o decurso do tempo  pôs em causa o estado de conservação e impermeabilização da cobertura do edifício, por diversas vezes, os Autores interpelaram o Sr. Administrador do condomínio para que se procedesse às obras de reparação do mesmo, o hiato de tempo que mediou, até à reparação, ocasionou infiltrações e consequentes estragos, de diversa natureza, na fração autónoma que constitui propriedade dos autores: as paredes mostram-se totalmente deterioradas, causada por humidades e infiltrações de água, e inerente deterioração de argamassas, com empolamento e desprendimento de tinta, fissuras, manchas e bolores; O teto que é revestido de folha de madeira, de carvalho natural, foi-se igualmente deteriorando em virtude das infiltrações e humidades, empolando com a humidade, chegando muitas delas a desprender-se.
Mas não se provou o custo da reparação.
Assim, nos termos do citado normativo, dando parcialmente razão ao Réu, há que revogar essa condenação e em sua substituição condenar no que se vier a apurar em incidente de liquidação, embora com o limite do pedido e da condenação.

.c- do valor dos danos não patrimoniais

O Recorrente para não se conformar com o valor arbitrado a favor dos Recorridos pelos danos não patrimoniais invoca que a fundamentação consignada na sentença é parca e abstrata, mas refere também que parte dos factos dados como provados são incongruentes com elementares regras da experiência.
Não logrou a alteração da matéria de facto provada nos termos em que aflorou, mas importa verificar se os fundamentos de direito que invoca em abstrato podem levar à redução da indemnização para compensar os danos não patrimoniais, como pretende.
 “Quanto aos danos não patrimoniais, diz-nos o art.º 496º nº 1 do Código Civil que deve atender-se àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Acrescenta depois o n.º 4 do mesmo artigo que: «O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º(…)».
Para se conceder uma satisfação de ordem pecuniária tem que se apurar um dano com alguma gravidade, mas há que afastar os simples incómodos, porque não são ofensivos de um bem com dignidade suficiente para merecer a tutela indemnizatória.
 Os factos descritos na matéria de facto provada sob os nºs 45, 46, 49 e 50 constituem danos não patrimoniais dignos da tutela do Direito: danos na saúde, situações de ansiedade e privação das condições de habitabilidade da sua habitação, com redução da sua salubridade, higiene, segurança e conforto. Com efeito, é pacífico que se justifica plenamente a atribuição de uma indemnização àquele que ficou privado de usufruir de forma normal a sua habitação, atenta a importância que a mesma tem como lugar retemperador de forças e centro da vida privada e familiar das pessoas, direito que pela sua importância até tem consagração constitucional (artigo 65º, nº 1, da CRP).
Para se fixar a compensação justa, há que atender à equidade, ao grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem (citado artigo 494º do Código Civil, ex vi artigo 496.º, n.º 4 do mesmo diploma.
 Não se apurou a situação económica do condomínio e dos seus condóminos, mas é claro que o mesmo teve despesas extraordinárias com a sua reabilitação. Não se pode afirmar que o grau de culpa do Recorrente é diminuto, visto que resulta da matéria de facto provada que o mesmo foi alertado para a necessidade de realização de obras e que o não fez, embora seja compreensível que os condomínios tenham um quadro organizativo que dificulta a agilização de procedimentos.
Os danos já apresentam alguma monta, embora não se saiba quanto tempo durou esta situação de decremento das aptidões normais da habitação que os Autores tiveram que suportar.
Por razões de equidade, vejamos o que tem sido atribuído em jurisprudência publicada em casos semelhantes:
Do Tribunal da Relação de Lisboa, no processo 1069/14.6TBOER.L1-7, em 02/28/2023: um caso em que os Autores foram “obrigados a viver em ambiente de humidade, sem parte do soalho e sem poder utilizar parte da casa, em que se considerou as angustias e o período temporal pelo qual duraram, entende-se ser adequada a atribuição da quantia de €5.000,00.
Do Tribunal da Relação do Porto, no processo 3421/21.1T8VNG.P1, em 03/22/2022: com danos num dos quartos da sua fração, sala, cozinha e varanda, referindo-se insónias, desgaste psicológico e grande ansiedade, chegando ao ponto de querer vender a casa, sendo o seu filho uma pessoa doente, padecendo de bronquite asmática, condição que se agrava com a exposição à humidade, foi condenado pagar à autora a quantia de 1.500,00 € (mil e quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais sofridos.
Do Tribunal da Relação de Guimarães, em 01/10/2019, no processo 2049/17.5T8GMR-G1, num caso em que nos dias de chuva, os autores têm tinham colocar baldes em alguns pontos da sala para apanhar parte da água que escorre de um buraco existente no teto, foi proferida a condenação do condomínio a pagar aos Autores a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta   euros), a título de danos morais.
Do Tribunal da Relação de Guimarães, em 09/14/2023, no processo 287/18.2T8PRG.G1, “O tribunal a quo atribuiu aos AA. a quantia de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais e que corresponde ao que foi peticionado. E, perante a factualidade provada, não temos quaisquer dúvidas em confirmar o referido valor, que em nada peca por excesso, tendo em consideração que está em causa uma casa de habitação, lugar que, à medida das possibilidades de cada um, sem interferências de terceiros, se procura seja saudável, física e psicologicamente, se procura seja acolhedor, tranquilo e de descanso, o que tudo foi negado aos AA., como, de forma patente e manifesta, flui da factualidade provada, obrigando, por um lado, a um conjunto de ações, para evitar prejuízos maiores, como colher a água, arrastar móveis e colocar coberturas de plástico, tornando, por outro, penosa a permanência na casa, impossibilitando dormir em alguma partes da mesma e gerando receio justificado pela saúde, devido à manifesta falta de salubridade em virtude da humidade e do cheiro nauseabundo, tudo gerando noites mal dormidas, nervosismo, angústia, e desassossego e sobressalto face à possibilidade de novos episódios de precipitação e dos danos associados.”
Ora, no caso, são os seguintes os factos a considerar:
As paredes da fração apresentam deterioração de argamassas, com empolamento e desprendimento de tinta, fissuras, manchas e bolores; eram de cor ... e foram adquirindo uma cor alaranjada. As folhas de madeira que revestem o teto foram empolando com a humidade, chegando muitas delas a desprender-se e a caírem ao chão.  À degradação do teto e paredes seguiu-se a deterioração das condições de higiene de toda a casa, tornando-a num local constantemente sujo e húmido e com maus odores, o qual os Autores procuram, como podem, manter limpo e habitável. Além de não terem reunidas as condições de salubridade, higiene e segurança, os Autores enfrentam também desconforto visual e de manobra dentro do espaço que habitam em consequência das aludidas infiltrações. Estas humidades afetam gravemente a saúde do agregado familiar dos Autores. Os Autores são, hoje, pessoas ansiosas e nervosas, por não verem esta situação solucionada.
Ora, tendo em conta o tipo de dano em causa, referente ao local onde as pessoas devem poder descansar em condições de salubridade, há que considerar profundo o dano que os Autores sofreram, percebendo-se o efeito que a sua situação habitacional lhes causa na saúde física e mental.
No entanto, não se demonstrou quanto tempo sofreram os Autores este dano na sua qualidade de vida, tornando mais difícil balizar a compensação devida.
Por outro lado, a entidade responsável é um condomínio habitacional, formado por pessoas a quem não é exigível que conheçam todos os procedimentos para zelar por um prédio de habitação e que já resolveram a causa das infiltrações, cabendo-lhes, em última instância, suportar a indemnização da responsabilidade de todos.
Verificando a bitola que encontrámos na jurisprudência, entendemos que o valor apurado se encontra algo empolado: a única situação em que foi atribuído montante semelhante ao encontrado na sentença implicava uma situação muito mais gravosa que a presente, em que deixou de ser utilizada parte da casa e o próprio fez primeiro as obras a suas expensas. Nas situações jurisprudenciais com danos mais próximos dos destes autos os valores compensatórios encontrados foram muito mais baixos.
Assim, julgando também qui parcialmente procedente o recurso, reduz-se a indemnização para 2.500,00 €.

V- Decisão

Por todo o exposto, julga-se parcialmente procedente a apelação   e em consequência, mantendo-se a primeira condenação do Réu e revoga-se a sentença proferida quanto aos dois últimos segmentos, pelo que o mesmo fica condenado a:

a) -- a efetuar todas as obras necessárias à reparação da fração autónoma propriedade dos Autores, nomeadamente substituição do teto em folha de madeira natural de carvalho, reparação das fissuras e pintura das paredes, tapagem das rachadelas e pintura das paredes nas divisões onde se instalaram as infiltrações e que se encontram deterioradas ou
-- a indemnizar os Autores pelos custos desta reparação a apurar em incidente de liquidação (com a limitação do pedido);
b) -- e a pagar aos Autores a quantia de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) a título de danos não patrimoniais;
 Custas pelos Autores e pelos Réu, quer na sentença, quer no recurso, na proporção de 27% para os Réus e Recorrentes e o restante para o Autores e Apelados (artigo 527º, nº 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Guimarães, 24 de abril de 2024

Sandra Melo
José Manuel Flores
Fernanda Proença Fernandes