Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1631/13.4TBVCT-D.G1
Relator: MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Descritores: PRESTAÇÃO DE CONTAS
TUTOR
NULIDADE DE SENTENÇA
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
CASO JULGADO
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 06/30/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: APELAÇÃO DOS A.A. PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÃO DOS R.R. PARCIALMENTE PROCEDENTE
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO CÍVEL
Sumário:
I - O processo especial de prestação de contas tem uma primeira fase onde pode ser colocada e decidida a questão de saber se o requerido tem ou não obrigação de prestar contas e, na afirmativa, tem uma segunda fase referente ao julgamento das contas prestadas.
II – No caso de prestação forçada de contas incumbe ao requerido o ónus da prova das despesas apresentadas, bem como das receitas acerca das quais o requerente não impugna expressamente, mas exprime dúvidas sobre a exactidão e exige que o requerido as justifique.
III – Na decisão que julga as contas o juiz deve valorar a prova trazida aos autos em termos bastante mais flexíveis do que o rigor e certeza da decisão judicial em processo comum, devendo recorrer ao seu prudente arbítrio e às regras da experiência.
Decisão Texto Integral:
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I – Relatório

R. C., residente na Rua …, ..., A. M., M. M., M. C., estas últimas três todas residentes em Place …, Bélgica, instauraram a presente acção especial para prestação de contas contra M. G., C. A. e D. C., todos residentes na Quelha …, n.º …, em …, Viana do Castelo, pedindo:

- a condenação dos réus a prestarem contas aos autores do período em que eram tutor e membros do conselho de família da interdita I. C., devendo a final os réus serem condenados a pagar aos autores, enquanto herdeiros da dita I. C., a importância que, da quantia de € 86.197,49 não vier a ser aprovada, quantia acrescida de juros legais a contar da citação, até integral e efectivo pagamento.
Para tanto, em síntese, alegam que, a partir de 22/07/2012, I. C. foi entregue aos cuidados da primeira ré, M. G.. Ao longo dos anos, a primeira ré gastou o dinheiro das pensões da interdita/beneficiária. Nos anos de 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019, a primeira Ré gastou respectivamente € 5.037,12, € 12.929,68, € 9.291,22, € 16.445,68, € 10.002,73, € 9.504,35, € 11.386,66, € 11.029,95 e € 569,98 da conta de I. C. e que terá de justificar.
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Os réus apresentaram contestação, sendo que, por excepção, invocaram a falta de legitimidade dos réus C. A. e D. C.. Impugnaram a obrigação de prestar contas fora do período compreendido entre a nomeação como tutora, em 12/03/2014, e a sua substituição, em 11/11/2019. Mais sustentaram que a ré não tem de prestar contas do dinheiro que o irmão da interdita, C. M., lhe entregou como gratificação pelos cuidados prestados, entendendo que apenas tem de prestar contas do dinheiro que recebeu e pertencente a I. C., no período em que exerceu as funções como tutora. Assim, as receitas, no aludido período temporal, ascenderam a € 46.218,51. Relativamente às despesas, sustenta que a ré suportou todas as despesas inerentes ao alojamento, alimentação, vestuário, higiene e cuidados de saúde, transportes, obras e impostos. Considerando que a receita total foi de € 46.218,51 e a despesa total foi de € 71.976,33, sustenta ter direito a receber dos autores € 25.757,82.
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Os autores apresentaram resposta às excepções invocadas pelos réus.
Os autores apresentaram contestação às contas apresentadas.
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Foi proferido despacho a convidar a ré a apresentar as contas com observância do estabelecido no artigo 944º, do C.P.C. (apresentação das contas em forma de conta-corrente, onde se especifique a proveniência das receitas, a aplicação das despesas e o respectivo saldo, instruídas com os documentos justificativos).
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A ré apresentou requerimento acompanhado de conta corrente.
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Foi proferido despacho saneador, no qual foram os réus C. A. e D. C. considerados partes ilegítimas e, consequentemente, absolvidos da instância.
Foi determinado que a obrigação de prestar contas por parte da ré abrangia o período temporal que se iniciou com a sua nomeação e terminou com a sua substituição.
Foi identificado o objecto do litígio e foram enunciados os temas da prova.
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Após audiência de julgamento, em 23/01/2022, foi proferida a seguinte sentença, cuja parte dispositiva se reproduz:
“Em face de todo o exposto, julga-se a presente acção parcialmente procedente, aprovando-se as contas nos termos acima expostos, aprovando-se receitas no valor global de € 57.048,68 (cinquenta e sete mil e quarenta e oito euros e sessenta e oito cêntimos) e despesas no valor global de € 57.376,24 (cinquenta e sete mil, trezentos e setenta e seis euros e vinte e quatro cêntimos). (…)”
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Não se conformando com esta decisão veio o autor, em 28/02/2022, dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“A- O presente recurso incide sobre a douta sentença proferida que julgou parcialmente procedente a ação, aprovando, no período compreendido entre 12 de março de 2014 e 15 de novembro de 2019, receitas no valor global de € 57.048,68 e despesas no valor global de € 57.376,24.
B- Discorda-se, porque incorretamente julgados, dos factos provados das alíneas 28), 33), 38), 42) e 50), assim como do entendimento feito no “Enquadramento jurídico” que entendeu aprovar despesas mensais do montante de € 550,00 a título de despesas não documentadas com ao alojamento, alimentação, vestuário e higiene da interdita.
C- Quantos aos factos provados das alíneas 28) e 42), consta dos extratos juntos aos autos que, no ano de 2016, o irmão da interdita fez 12 transferências de € 250,00 cada uma e uma de € 1.500,00, num total de € 4.500,00.
D- Pelo que o facto provado da alínea 28), deverá ficar a constar que no ano de 2016, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente quantias, num total de € 4.500,00.
E- Consequentemente deverá o facto provado da alínea 42) ficar a constar que entre o dia 12 de março de 2014 e o dia 15 de novembro de 2019, a interdita recebeu do seu irmão C. M. a quantia total de € 12.000,00.
F- Quanto ao facto provado da alínea 33), somados os valores recebidos pela Segurança social no ano de 2018 e que constam dos extratos bancários juntos aos autos, constata-se que nesse ano, a interdita recebeu da Segurança um total de € 7.731,10 e não somente € 7.467,10.
G- Pelo que, o facto provado da alínea 33) deverá ser retificado de modo a ficar a constar que, no ano de 2018, a interdita recebeu da segurança social a quantia global de € 7.731,10.
H- Quanto ao facto provado da alínea 38), a douta sentença recorrida julgou provado esse facto do confronto dos recibos de renda juntos aos autos com os depoimentos das testemunhas C. C. e A. P..
I- O Tribunal a quo entendeu que o depoimento da testemunha A. P. não foi convincente quanto ao montante da renda mensal paga e que competia aos autores provar que a renda recebida era superior àquela que constava do contrato de arrendamento.
J- No entanto e quanto a duração do arrendamento e montantes pagos nesse período ou eventual valores em divida, a douta sentença nada diz.
K- Ora, do confronto dos depoimentos das testemunhas C. C. e A. P., dúvidas não pode haver de que o contrato de arrendamento se iniciou em março de 2018 e cessou em finais de dezembro de 2019.
L- Tal como dúvidas não poderão haver da conjugação desses dois depoimentos que foram pagas a ré rendas até novembro de 2019, dizendo o pagamento feito em novembro de 2019 respeito à renda de dezembro de 2019.
M- Assim e pelos motivos expostos, deverá considerar-se que a interdita recebeu de A. P. rendas do montante de € 100,00 mensais, no período compreendido entre março de 2018 e novembro de 2019, num montante total de € 2.100,00.
N- Nessa medida, o facto provado da alínea 38) deverá ser corrigido de modo a ficar a constar que nos anos de 2018 e 2019, a interdita auferiu um total de € 2.100,00 a título de rendas.
O- Consequentemente, deverá ficar a constar que se apuraram receitas no valor global de € 60.412,68.
P- Passando para as despesas, dir-se-á que do que resulta do facto provado 46), as despesas apuradas no ano de 2014 não totalizam € 990,44 conforme erradamente se escreveu na douta sentença recorrida, mas sim um total de € 984,44.
Q- Quanto ao facto provado da alínea 50), consta da fundamentação que a douta sentença recorrida deu esse facto provado como verdadeiro pelo documento junto aos autos de fls. 314v dos autos.
R- Ora, em sede de contestação às contas apresentadas pela ré, o recorrente expressamente impugnou a despesa de € 1.600,00 a que se refere o dito documento 197 de fls 314v.
S- Pelo que, não poderia o Tribunal a quo ter dado tal documento como provado de per si porquanto deveria ter sido feito outra prova que viesse corroborar a versão trazida aos autos por esse documento.
T- E competia a ré o ónus da prova da veracidade dos factos constantes desse documento, o que não fez.
U- Assim, não poderá esse montante de € 1.600,00 de obras ser considerado.
V- Nessa medida, o facto provado da alínea 50) deverá ser retificado de modo a ficar a constar que no ano de 2018, a ré pagou € 192,07 em produtos adquiridos em farmácia, € 650,35 em cuidados específicos, € 14,56 em anuidade de cartão multibanco, € 134,80 em Energia ... e € 3.957,72 em pagamentos à Segurança Social.
W- Pelo que e nessa medida apuraram-se despesas que totalizam € 18.380,62.
X- Quanto as despesas não documentadas com o alojamento, alimentação, vestuário e higiene da interdita em valores não concretamente apurados, não se põe em causa que a interdita tivesse necessitado de alguma roupa, produtos de higiene, alimentação (para além das papas que constam das faturas de farmácia juntas aos autos) e tenha feito incorrer a ré em gastos com água e eletricidade.
Y- No entanto, tendo as contas sidas apresentadas por quem competia apresentar, entende-se que o Tribunal a quo só teria de julgar boas ou não as diversas rubricas das receitas e despesas apresentadas pela ré.
Z- Ora, no caso das despesas não documentadas, o Tribunal a quo não aprovou o montante mensal de € 700,00 apresentado pela ré e,simultaneamente, fixou o valor dessas despesas em € 550,00 mensais.
AA- Mas fê-lo sem qualquer suporte probatório que sustente o valor por si fixado.
BB- Na verdade, a Meritíssima Juíza não ordenou quaisquer diligências de prova para além das trazidas aos autos pelas partes.
CC- Para além disso, não justifica as verbas de despesas de € 550,00 mensais com o facto de não ser costume a exigência de documentos dessas verbas.
DD- Tão pouco justifica ou fundamenta, o porquê de chegar a esse valor e não a qualquer outro. Porquê € 550,00 mensais e não os € 700,00 reclamados pela ré? Porquê € 550,00 e não € 300,00? Ou € 100,00?
EE- Pelo que, pela total ausência de fundamentação, entende-se que a douta sentença é nula nessa parte.
FF- No entanto e mesmo que assim não se entenda sempre se dirá que essa norma não é de aplicabilidade ao caso concreto porquanto a ré foi nomeada tutora da interdita e nessa medida competia-lhe a apresentação das contas sem que tal lhe tivesse sido exigido, devendo no exercício desse seu cargo ter os documentos de todas as receitas e despesas feitas em nome da interdita e por conta desta.
GG- Dizer no final do cargo do exercício que não tem documentos comprovativos para com isso conseguir obter a fixação de um valor meramente estimado é fácil, demasiado fácil.
HH- Pois que seria simples a ré pagar todas as despesas da interdita com o multibanco da conta bancária desta.
II- A interdita alimentava-se com comida especifica, pelo que seria fácil comprovar a despesa com a sua alimentação.
JJ- Igualmente seria fácil comprovar despesas com água e luz da interdita bastando juntar aos autos as faturas da água e luz da ré e obter uma media por pessoa dividindo o valor dessas faturas pelo número de pessoas que moravam com a interdita.
KK- Entende-se, pois, que, no caso concreto, não era possível ao Tribunal a quo socorrer-se do estipulado no artigo 945º, n.º 5, do CPC, na medida em que não estamos perante um caso de despesas em que é costume não se exigir documentos probatórios.
LL- No entanto e mesmo que assim não se entenda, sempre se dirá que o Tribunal a quo não poderia ter-se socorrido do referido preceito porque não dispunha de qualquer elemento probatório para fixar o valor da despesa aqui em discussão.
MM- Na hipótese meramente académica de se entender que o Tribunal a quo poderia fixar um valor a título de despesas com o alojamento, alimentação, higiene e vestuário da interdita com recurso unicamente ao seu prudente arbitro e regras de experiência, sempre se dirá que o valor fixado de € 550,00 é exagerado.
NN- Esse valor contraria o caso julgado da decisão proferida por esta mesma Meritíssima Juíza a quo, no âmbito do apenso C, de autorização para a prática de atos, no qual não deu como provado que a interdita necessitava de € 500,00 mensais para as suas despesas.
OO- Agora, contrariando o que ela próprio julgou, vem determinar que a interdita necessitava de € 550,00 só com alojamento, alimentação, higiene e vestuário, acrescidos de cerca de € 190,00 mensais de despesas fixadas que resultaram provados nestes autos.
PP- A decisão proferida nestes autos deverá ser obviamente revogada por violar a força do caso julgado da decisão proferida naquela apenso C.
QQ- Esta decisão não se coadune com qualquer razoabilidade, nem prudência recomendada pelo referido artigo 945º, n.º 5, do CPC.
RR- A interdita nasceu com paralisia cerebral profunda, não falava, não andava, estava acamada e somente se alimentava de papas e, no entanto, apesar de não ter de fazer face às despesas normais que uma pessoa comum tem, o Tribunal a quo entendeu que uma pessoa nas condições da interdita necessitaria de mais dinheiro do que uma pessoa comum.
SS- A interdita não necessitava de cuidados de saúde elevadíssimos com medicação, tratamentos médicos ou fisioterapias.
TT- Pelo que não pode de todo ser considerado razoável, nem tão pouco prudente, considerar que para a agua e luz a serem divididos por mais pessoas, alimentação em papas, aquisição de pijamas e alguma roupa básica e produtos de higiene, a interdita necessitasse de € 550,00 mensais, acrescidos de € 190,00 com cuidados específicos e de farmácia, num total de € 740,00, quando o valor do ordenado mínimo nacional era de somente de € 505,00, nos anos de 2014 e 2015, € 530,00 no ano de 2016, € 557,00 no ano de 2017, € 580,00 no ano de 2018 e € 600,00 no ano de 2019.
UU- Ou seja, em todos os anos, a douta sentença recorrida entendeu que uma pessoa acamada, que não necessita de tratamentos médicos específicos elevados, precisa de mais dinheiro para sobreviver do que o valor que o próprio Estado entende ser o mínimo indispensável para a sobrevivência de uma pessoa, sem limitações e a trabalhar.
VV- O valor fixado é de tal forma exagerado e imprudente que ultrapassa em muito o valor das pensões recebidas pela interdita que rondavam os € 530,00 mensais.
WW- Assim, e a considerar-se que é possível fixar-se um valor a título de despesas com o alojamento (água e eletricidade), alimentação, higiene e vestuário da interdita, tal valor nunca poderá ser superior à € 150,00 mensais atendendo as especificidades da interdita, num total de € 10.200,00 entre 12 de março de 2014 e 15 de novembro de 2019 (€ 150,00 x 68 meses).
XX- Nessa medida e quanto muito deverão ser aprovadas despesas de € 28.580,62 (€ 18.380,62 + € 10.200,00).
YY- Consequentemente deverá determinar-se que, no período de 14 de março de 2014 a 15 de novembro de 2019, resultou um saldo positivo de € 31.882,06 (€ 60.462,68 de receitas - € 28.580,62 de despesas).
ZZ- Devendo nessa medida a douta sentença ser revogada e ser substituída por outro nesse sentido.”
Pugna pela revogação da sentença que deve ser substituída por outra no sentido referido.
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Não se conformando com esta decisão veio a ré, em 03/03/2022, dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

“1-A recorrente não concorda integralmente com o teor da sentença proferida, entendendo que deve ser alterada quanto a alguns aspectos, o que implica a reapreciação da prova produzida e a alteração da matéria de facto provada e não provada.
2-A recorrente não aceita que se considerasse como receita da interdita a quantia de € 10.500,00 que foi transferida pelo irmão C. M..
3-A recorrente também não aceita que não se tenha considerado provada a despesa do valor de € 116,50, para fechaduras e cilindro (agosto de 2017), e
4-A recorrente também pugna para que seja reconhecida como despesas a entrega de € 3.627,91, no ano de 2017, à Segurança Social.
5-Finalmente, a recorrente não aceita o valor fixado para as despesas não documentadas de € 550,00 por mês, entendendo que se deveria manter o valor reclamado de € 700,00 por mês.
Assim,
6-A recorrente aceita ter recebido do irmão da interdita as quantias de € 2.500,00 (em 2014), 4.000,00 (em 2015), 3.000,00 (em 2016) e de € 1.000,00 (em 2017), num total de €10.500,00, mas não aceita que tais quantias se destinassem à interdita, mas sim a ela própria, recorrente.
7- O tribunal recorrido entendeu, como raciocínio legítimo e lógico, que tais quantias fossem consideradas receitas da interdita, pois eram transferidas para uma conta titulada em nome da interdita.
8-A recorrente entende que só faz sentido, até de acordo com as regras da experiência comum neste tipo de situações, que a quantia entregue pelo irmão da interdita se destinasse à pessoa que cuidava dela e para a compensar por tal “trabalho”.
9-O facto de a transferência ser efectuada para a conta bancária titulada em nome da requerida, não podia levar a que se concluísse que tal valor se destinava à interdita, pois a única pessoa que tinha acesso àquela conta era a ora recorrente.
10-A este respeito depôs com isenção a testemunha M. S. que asseverou que as quantias se destinavam à recorrente e não à interdita e que tal resultou até de um acordo com os irmãos de interdita.
11-Além do recurso às regras da experiência comum, o depoimento da testemunha M. S., devem fazer alterar tal matéria de facto, no sentido de se admitir os pagamentos, mas que tais pagamentos se destinaram à recorrente e não à interdita.
12- Assim, relativamente a este concreto ponto, entendemos que o valor de € 10.500,00 deverá ser retirado das “receitas” da interdita.
13-Esta alteração implica a alteração da matéria de facto no tocante aos pontos 24, 28 e 30, quando se diz que “… o irmão da interdita transferiu-lhe…”, devendo passar apenas a dizer que “… o irmão da interdita transferiu…”.
14-Quando ao ponto 22, aí já se diz apenas que “… o irmão da interdita transferiu mensalmente…”, não carecendo de alteração.
15-É verdade que o irmão da interdita transferiu tais montantes (e não outros), mas tais montantes devem ser considerados como sendo para a recorrente como compensação/gratificação pelo serviço de cuidar da irmã.
16- O tribunal a quo interpretou correctamente a prova produzida, dando por assentes as despesas alegadas pela recorrente, apenas merecendo a nossa discordância relativamente a três pontos que constam dos factos não provados: (i) o valor de uma fechadura e cilindro (€ 116,50) e (ii) o valor pago (restituído) à Segurança Social relativo ao ano de 2017 (3.627,91) e ainda (iii) ao valor fixado para as despesas não documentadas, de € 550,00 por mês.
17-A recorrente despendeu a quantia de €116,50 na aquisição de três fechaduras, cilindro e mão de obra, para a casa (imóvel) pertença da interdita.
18-Tal despesa feita na “Drogaria …, de A. V., Lda”, em ..., encontra-se devidamente documentada no doc. 88 junto aos autos com a contestação.
19-Assim, o facto “A Ré pagou € 116,50 em 27 de Agosto de 2015 (fechadura e ncilindro)”, deverá passar a constar do factos provados.
20-Esta alteração da matéria de facto de não provada para provada resulta, concretamente do documento nº 88 junto com a contestação.
21-Quanto às quantias entregues à Segurança Social, parece-nos não puderem subsistir dúvidas de que a recorrente entregou à Segurança Social, no ano de 2017, a quantia de € 3.627,91.
22-É verdade que a R. alegou ter pago à Segurança Social, nesse ano de 2017, a quantia de € 3.957,72, tendo-se provado apenas que entregou a quantia de € 3.627,91.
23-A informação da quantia paga pela R. à Segurança Social foi confirmada pela mesma (Seg. Social) na informação que trouxe aos autos por mail de 28/07/2021.
23-A não consideração de qualquer valor entregue pela recorrente à Segurança Social no ano de 2017, só a lapso se pode ter devido.
24-Na verdade, é a própria Segurança Social que confirma que a recorrente entregou a título de comparticipação, em 2017, a quantia de € 3.627,91.
25-Assim, o ponto da matéria de facto dado como não provado “A Ré pagou € 3.957,72 em 31 de Dezembro de 2017 à Segurança Social.”, deverá passar para o elenco dos factos provados, com a redação “A Ré pagou € 3.627,91, em 2017, à Segurança Social.”.
26-Esta alteração da matéria de facto resulta da própria informação trazida aos autos pela Segurança Social, no mail enviado em 27 de julho de 2021 e junto a fls…
27- Com o devido respeito que nos merece a decisão recorrida, e tendo por assente a necessidade de fixar uma quantia a título de despesas não documentadas relativas, nomeadamente, a alimentação, higiene e vestuário (entre outras), parece-nos mais adequada a quantia reclamada de € 700,00 ao invés da arbitrada pelo tribunal de recorrido de € 550,00.
28-A fixação de um montante a título de despesas não documentada, além de resultar da lei (artº 945º nº5 do CPC), resulta do “bom senso”, das “regras da experiência comum” e do “normal funcionamento das coisas”…
29-É verdade que o tribunal recorrido tem, neste aspecto, grande “margem de manobra” para fixar a quantia devida a título de despesas não documentadas, mas parece-nos que foi demasiado parcimonioso.
30-A quantia de € 700,00 parece-nos ser a quantia mais adequada a suportar as despesas não documentadas suportadas pela R.
31-Sobre este concreto ponto, referiu a testemunha S. C. (técnica da Segurança Social) que, de acordo com inquérito efectuado pela própria Segurança Social, o valor adequado para despesas por cada utente era (há vários anos atrás) de, pelo menos, €900,00 por mês.
32-Ainda sobre este aspecto, a recorrente tentou demonstrar qual o valor necessário para acautelar o bem-estar de uma pessoa interdita e permanentemente acamada (com paralisia cerebral), com cerca de 40 anos de idade e que incluísse, nomeadamente, alojamento, alimentação, higiene e vestuário.
33-Depois de várias tentativas, só uma instituição foi capaz de responder à solicitação do tribunal, tendo informado que “Os custos mensais por residente em Lar Residencial são de aproximadamente €1.645,81.” Tal informação foi trazida aos autos, depois de notificação do tribunal para o efeito, pela “... Residência Adaptada” – ver documento junto aos autos a 25/11/2021.
34-Além do “bom-senso”, da “experiência comum”, da “normalidade das coisas”, da “equidade” e da “justiça”, também a técnica da Segurança Social veio dizer que o montante julgado adequado era de € 900 por mês e o Lar da ... veio informar que o valor mensal necessário, para uma situação semelhante à dos autos, ronda os € 1.645,81.
35-Assim, entendemos que o valor de €700,00 por mês reclamado pela R. deveria ser mantido como montante adequado e ajustado para fazer face a despesas não documentadas.
Em síntese:
36-Entendemos que deverá acrescentar-se às despesas já provadas o valor de € 116,50 (2015) e o valor de €3.627,91 (2017), o que resulta expressamente de prova documental existente nos autos, considerando-se provada a despesa total de € 23.731,03 e não a fixada de € 19.986,62.
37-Deverá igualmente considerar-se como despesa o valor de € 700,00 por mês a título de despesas não documentadas, fixando-se, para este efeito, uma despesa total de €47.585,68 (€ 6.729,01 de 12/03/2014 a 31/12/2014; € 8.400,00 de 01/01/2015 a 31/12/2015; € 8.400,00 de 01/01/2016 a 31/12/2016; € 8.400,00 de 01/01/2017 a 31/12/2017; € 8.400,00 de 01/01/2018 a 31/12/2018; e € 7.256,67 de 01/01/2019 a 11/11/2019) e não a que foi arbitrada de € 37.389,62.
38-O que tudo resulta numa despesa total de € 71.316,71 e não a que foi fixada de € 57.376,24.
Por outro lado,
39-Deverá retirar-se da receita o valor de € 10.500,00 transferido pelo irmão da interdita para a recorrente, julgando-se que a receita total foi de € 46.548,68 e não a fixada de 57.048,68.”
Pugna pela revogação da sentença que deve ser substituída por outra no sentido referido.
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Por ambas as partes foram apresentadas contra-alegações.
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Os recursos foram admitidos como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
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Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre apreciar e decidir.
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Tendo em atenção que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (art. 635º nº 3 e 4 e 639º nº 1 e 3 do C.P.C.), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, observado que seja, se necessário, o disposto no art. 3º nº 3 do C.P.C., as questões a decidir são:

A) Apurar se a sentença é nula por falta de fundamentação;
B) Se ocorrer erro na apreciação da matéria de facto;
C) E/ou erro na subsunção jurídica.
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II – Fundamentação

Foram considerados provados os seguintes factos:

1- I. C. nasceu em - de Agosto de 1974 (fls. 26 e 27 dos autos) com paralisia cerebral, patologia que a incapacitou e determinou a sua dependência de terceiros para todas as suas atividades do quotidiano;
2- Estava acamada;
3- Era filha de Maria e de D. C. – documento n.º 1 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
4- Viveu aos cuidados da sua mãe, Maria, até à morte desta ocorrida em 17 de Maio de 2012 – documento n.º 2 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
5- I. C. faleceu em - de Fevereiro de 2020. – documento n.º 3 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
6- R. C. e C. M. eram irmãos de I. C.;
7- C. M. faleceu no dia - de Março de 2017 - documento n.º 4 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
8- I. C. foi entregue aos cuidados da primeira Ré, M. G., em 22 de Julho de 2012;
9- Por sentença proferida em 12 de Março de 2014, transitada em julgado (cfr. processo principal), foi declarada a interdição da referida I. C., por anomalia psíquica;
10- Fixou-se o início da incapacidade da interdita à nascença;
11- Nomeou-se a aqui primeira ré, M. G., como sua tutora;
12- Para o conselho de família C. A. e D. C. – documento nº 8 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
13- A interdita I. C. era dona e legítima possuidora de um prédio urbano composto por casa de habitação de dois pavimentos, sito no lugar de ..., freguesia de ..., da União de freguesias de ..., ... e ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ... – documento n.º 9 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
14- Era herdeira na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito dos avós maternos, M. A. e M. M.;
15- A tutora/acompanhante da interdita/beneficiária, por apenso ao processo de interdição, veio requerer autorização para a prática de actos (apenso C);
16- Foi proferida sentença, no apenso referido em 15-, em 6 de Novembro de 2017, já transitada em julgado, não se autorizando à requerente M. G. a prática dos actos enunciados a fls. 9, alíneas a), b) e c), assim improcedendo os pedidos formulados;
17- Por despacho proferido no processo principal, em 15 de Novembro de 2019, já transitado em julgado, foi nomeada como acompanhante da interdita/beneficiária, C. C., em substituição da primeira ré;
18- Como membros do conselho de família foram nomeados A. M. e R. C., em substituição dos anteriores;
19- Os valores da pensão de sobrevivência e do subsídio vitalício foram sendo actualizados anualmente – documento nº 16 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
20- A interdita recebia, ainda, um subsídio mensal de cerca de € 38,75, para apoio à compra de fraldas, a partir do ano de 2017;
21- A interdita recebia a pensão e o subsídio na conta bancária aberta em nome da I. C. na Caixa ..., com o número ..........8;
22- No ano de 2014, nos meses de Março a Dezembro, o irmão da interdita transferiu mensalmente a quantia de € 250,00, num total de € 2.500,00;
23- No ano de 2014, a partir de Março, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 5.295,62;
24- No ano de 2015, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente a quantia de € 250,00, num total de € 4.000,00;
25- No ano de 2015, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6337,88;
26- E recebeu, ainda, da Segurança Social, a quantia de € 5.457,18 (subsídio para aquisição de uma cadeira de rodas);
27- No ano de 2015, a interdita recebeu de tornas no processo de inventário respeitante aos seus avós, a quantia de € 664,27;
28- No ano de 2016, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente a quantias, num total de € 3.000,00;
29- No ano de 2016, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.354,76;
30- No ano de 2017, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe o montante total de € 1.000,00
31- No ano de 2017, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.626,33;
32- E recebeu da Unidade Local de Saúde a quantia de € 297,72, para subsídio de fraldas;
33- No ano de 2018, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 7.467,10;
34- E recebeu da Unidade Local de Saúde a quantia de € 381,25 para subsídio de fraldas;
35- Por contrato de arrendamento datado de 10 de Março de 2018, a 1ª ré, na qualidade de tutora da I. C., arrendou a A. P. a casa propriedade da interdita;
36- O contrato de arrendamento foi celebrado pelo preço de um ano, com início em 10 de Março de 2018;
37- Mediante o pagamento da renda mensal no valor de € 100,00;
38- No ano de 2018, a interdita auferiu € 500,00 a título de rendas;
39- No ano de 2019, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.757,17;
40- E recebeu da Unidade Local de Saúde € 409,40, para subsídio de fraldas;
41- Entre o dia 12 de Março de 2014 e o dia 15 de Novembro de 2019, a Ré recebeu para a interdita a quantia total de € 46.548,68;
42- Entre o dia 12 de Março de 2014 e o dia 15 de Novembro de 2019, a Ré recebeu, ainda, do irmão da interdita, a quantia total de € 10.500,00;
43- A Ré suportou as despesas inerentes ao alojamento, alimentação, vestuário, higiene, valores não concretamente apurados;
44- A Ré foi cuidadora uma dedicada da interdita, proporcionando-lhe os cuidados necessários ao seu bem-estar;
45- A interdita necessitava de cuidados permanentes e de vigilância permanente;
46- No ano de 2014, a Ré pagou € 360,76 em produtos adquiridos em farmácia, € 401,81 em cuidados específicos (fls. 225 a 229 dos autos), € 60,00 em transportes e € 161,87 (IMI);
47- No ano de 2015, a Ré pagou € 593,25 em produtos adquiridos em farmácia, € 530,14 em cuidados específicos (fls. 248 a 255 dos autos), € 8,84 (anuidade do cartão electrónico) € 4000,00 (cadeira ... -–fls. 255v dos autos), € 277,30 em transportes, € 20,40 (certidão Tribunal) e € 161,55 (IMI);
48- No ano de 2016, a Ré pagou € 382,98, em produtos adquiridos em farmácia, € 757,94 em cuidados específicos (fls. 271v a 281 dos autos), € 13,00 (anuidade de cartão electrónico), € 1.429,95 (acordo de pagamento da cadeira ...), € 65,84 em transportes, € 29,74 no Hospital de ..., € 161,55 (IMI);
49- No ano de 2017, a Ré pagou € 369,37, em produtos adquiridos em farmácia, € 1.779,39 em cuidados específicos (fls. 293v a 303 dos autos), € 14,56 (anuidade cartão multibanco), € 151,46 (IMI);
50- No ano de 2018, a Ré pagou € 192,07 em produtos adquiridos em farmácia, € 650,35 em cuidados específicos (fls. 309v a 312 dos autos), € 14,56 (anuidade de cartão multibanco), € 134,80 (Energia ... – fls. 314), € 1600,00 (obras – fls. 314v) e € 3.957,72 (pagamento à Segurança Social – fls. 315);
51- No ano de 2019, a Ré pagou € 214,19 em produtos adquiridos em farmácia, € 532,35 em cuidados específicos (fls. 323v a 328 dos autos), € 14,56 (anuidade do cartão de multibanco) e € 938,32 (pagamento à Segurança Social – fls. 328v).
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Não se provou:
- As quantias entregues pelo irmão da interdita, C. M., foram dados à Ré como gratificação pelos cuidados prestados.
- Os valores alegados pela ré a título de receitas distintos dos que se apuraram e constam dos factos provados.
- A Ré pagou € 116,50 em 27 de Agosto de 2015 (fechadura e cilindro).
- A Ré pagou em 31 de Dezembro de 2016 € 329,81 à Segurança Social.
- A Ré pagou € 3.957,72 em 31 de Dezembro de 2017 à Segurança Social.
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A) Da nulidade da sentença
Defende o autor que a sentença é nula por falta de fundamentação porquanto, no que concerne às despesas não documentadas, atribuiu-lhes um valor mensal de € 550,00 sem qualquer suporte probatório.
Vejamos.
As nulidades da sentença estão típica e taxativamente previstas no art. 615º do C.P.C., diploma a que pertencerão os preceitos sem menção de origem. Estas reconduzem-se a vícios formais da decisão decorrentes de erro de actividade ou de procedimento - error in procedendo - referente à disciplina legal e que impedem o pronunciamento de mérito.
Dispõe o art. 615º nº 1 b) do C.P.C.: “É nula a sentença quando: (…) b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; (…)”.
Nos termos do art. 154º as decisões são sempre fundamentadas sendo este dever constitucionalmente imposto (art. 205º nº 1 da C.R.P.).
Não pode, porém, confundir-se a falta absoluta de fundamentação com a fundamentação insuficiente, errada ou medíocre, sendo que só a primeira constitui a causa de nulidade prevista na al. b) do nº 1 do artigo 615º citado. Disso dão nota A. Varela, M. Bezerra e S. Nora, in Manual de Processo Civil, 2ª ed., 1985, p. 670/672, ao escreverem “Para que a sentença careça de fundamentação, não basta que a justificação da decisão seja deficiente, incompleta, não convincente; é preciso que haja falta absoluta, embora esta se possa referir só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito”.
No caso em apreço, entendemos que não ocorre falta absoluta de fundamentação de facto uma vez que o tribunal a quo cita o art. 945º nº 5 do C.P.C. que alude ao prudente arbítrio e às regras da experiência. Questão distinta é saber que o valor de € 550,00 é ou não razoável para fazer face às despesas de alojamento, vestuário, higiene e alimentação de uma pessoa com a condição de I. C..
Assim sendo, não se verifica a presente nulidade.
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B) Reapreciação da matéria de facto

Insurge-se o apelante autor contra os factos provados nº 28, 33, 38, 42, 50 e a apelante ré contra a matéria dada como não provada.
Nos termos do art. 662º nº 1 A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
O Tribunal da 1ª Instância, ao proferir sentença, deve, em sede de fundamentação “(…) declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas de factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção; o juiz toma ainda em consideração os factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência” (art. 607º nº 4) e “O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes” (art. 607º nº 5).
Sendo certo que o julgador aprecia a prova de acordo com a sua livre convicção, salvo algumas limitações, a análise crítica da prova é da maior importância do ponto de vista da fundamentação de facto da decisão. Com efeito, esta deve ser elaborada por forma a que, através da sua leitura, qualquer pessoa possa perceber quais os concretos meios de prova em que o Tribunal se baseou para considerar determinado facto provado ou não provado e a razão pela qual tais meios de prova foram considerados credíveis e idóneos para sustentar tal facto. Esta justificação terá de obedecer a critérios de racionalidade, de lógica, objectivos e assentes nas regras da experiência.
A exigência de análise crítica da prova nos termos supra referidos permite à parte não convencida quanto à bondade da decisão de facto tomada pelo tribunal da 1ª instância interpor recurso contrapondo os seus argumentos e justificar as razões da sua discordância.
Caso seja requerida a reapreciação da matéria de facto incumbe, desde logo, ao Tribunal da Relação verificar se os ónus previstos no acima art. 640º se mostram cumpridos, sob pena de rejeição do recurso.
Não havendo motivo de rejeição procede este tribunal à reapreciação da prova nos exactos termos requeridos. Incumbe a este Tribunal controlar a convicção do julgador da primeira instância verificando se esta se mostra contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos e sindicar a formação da sua convicção. i.e., o processo lógico. Não deixando de ter presente que o tribunal da 1ª instância, por força da imediação, é o tribunal melhor posicionado para proceder ao julgamento de facto, nada impede que, fundado no mesmo princípio da livre apreciação da prova, o tribunal superior conclua de forma diversa da do tribunal recorrido desde que tenha bases sólidas e objectivas. Contudo, não poderá deixar-se de ter presente que, por força da imediação, o tribunal da primeira instância é o que se encontra melhor colocado para apreciar a prova, designadamente a testemunhal.
No caso em apreço os apelantes deram cumprimento ao disposto no art. 640º nº 1 uma vez que indicaram os concretos pontos da matéria de facto que consideraram incorrectamente julgados, a decisão que deveria ter sido proferida e os concretos meios probatórios em que se baseou.
Vejamos.
- Factos provados nº 28 e 42
É de manter estes factos provados uma vez que, da descrição da transferência de € 1.500,00, creditada na conta bancária de I. C. em 15/04/2016 e constante do extracto de fls. 133 – “TRANF SEPA – BANK …” - não resulta que a mesma tenha sido efectuada por C. M.. Com efeito, se atentarmos nas muitas transferências mensais por este efectuadas no valor de € 250,00 as mesmas têm como descrição “TRANSF SEPA – …” ou “Tranf. do Exterior”. Acresce que, contrariamente à maioria dessas transferências, não se mostra junto qualquer “ticket virement européen” emitido por um banco belga. Também não é alegado qualquer motivo para uma transferência de valor muito superior e tão próxima da de € 250,00 efectuada dias depois.
Assim sendo, é de manter estes factos provados.
- Facto provado nº 33
Por consubstanciar um erro de cálculo corrige-se o valor dos recebimentos da Segurança Social referentes ao ano de 2018 para € 7.731,10, correspondente à soma das entradas a tal título no extracto bancário.
Consequentemente terá que ser corrigido o valor constante do facto provado nº 41, o que se fará infra.
- Facto provado nº 38 e 41
Da conjugação dos documentos de fls. 35 a 35V (certidão matricial), 187 a 187V (contrato de arrendamento), fls. 212 a 214 (recibos de renda) com os depoimentos das testemunhas A. P. (arrendatária) e C. C. (filha do autor e última tutora de I. C.) resulta, quanto a nós, que o contrato em causa se iniciou em 10/03/2018 e terminou em Dezembro de 2019/inícios de Janeiro de 2020 sendo que a renda mensal acordada e paga em numerário directamente à 1ª ré foi de € 100,00. É um facto que a arrendatária referiu que a renda foi de € 200,00, mas não nos mereceu credibilidade nesta parte porque desacompanhada de outra prova que o comprovasse. Mas, já nos mereceu credibilidade na parte em que pagou aquele valor sempre (apenas não no último mês, mas este estava pago com o valor da caução) e que nunca recebeu os respectivos recibos. O facto de apenas constar a emissão dos 5 primeiros recibos no Portal das Finanças não invalida que a renda não tenha sido paga. A testemunha C. C. também nos mereceu credibilidade quando referiu que após ter sido nomeada tutora (15/11/2019) contactou a anterior testemunha que lhe comunicou o acima referido e que iria sair no fim desse ano. Como referiu esta última testemunha não é crível que, se a arrendatária não tivesse pago alguma renda, a ré a tivesse deixado continuar no locado.
Pelo exposto, o facto nº 38 passa a ter a seguinte redacção:
“38- Nos anos de 2018 e 2019, a interdita auferiu € 2.100,00 a título de rendas;”
E o facto nº 41 a seguinte:
”41- Entre o dia 12 de Março de 2014 e o dia 15 de Novembro de 2019, a Ré recebeu para a interdita a quantia total de € 48.412,68;”
Sendo este valor a soma de € 44.560,04 (Segurança Social), € 664,27 (tornas), € 1.088,37 (subsídio de fraldas) e € 2.100,00 (rendas).
- Facto provado nº 49
Em sede de contra-alegações veio o autor pedir a correcção da redacção deste facto com o fundamento aí referido.
Ora, nos termos do art. 653º nº 3 e 4 e 639º nº 1 e 3 o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões dos recorrentes pelo que, não constando das conclusões das apelações de autor e ré qualquer referência ao referido (logo, não há pedido) e não sendo essa matéria de conhecimento oficioso, não pode este Tribunal apreciar o presente eventual erro na apreciação da matéria de facto.
- Facto provado nº 50
É de manter este facto como provado.
Com efeito, da conjugação do doc. de fls. 314V (cuja data é de Março de 2018, mês do início do arrendamento, e onde foi aposta a menção “Pago”) com o depoimento da arrendatária A. P. resulta que, para o locado ser habitável, foi necessário, no que concerne à electricidade, fazer uma baixada e montar um contador. Questionada se este trabalho tinha sido pago esta testemunha apenas disse que achava que não… Quando afirmou que pediu obras e que estas não foram feitas pela ré não se referia a este tipo de obras, mas a outras como a fechadura da porta, a própria porta e uma persiana. Do mesmo modo, afigura-se-nos que, quando as testemunhas C. C. e N. disseram que a casa não teve obras referiam-se a outro tipo de obras.
- Primeiro facto não provado
É de manter este facto como não provado uma vez que acompanhamos o tribunal recorrido quando refere que a ré não logrou provar que as transferências de dinheiro por parte de C. M., as quais foram creditadas na conta da interdita (sendo que, atenta a incapacidade desta, tinha naturalmente a ré como movimentadora), consistissem numa gratificação a esta e não eram para fazer face às despesas da interdita. Se fosse uma gratificação, segundo as regras da experiência, tais quantias teriam sido depositadas numa conta titulada pela ré (onde certamente recebia a remuneração que lhe era paga pela Segurança Social para tomar conta da interdita). Admite-se que tenha havido um acordo no sentido desta quantia ser paga, mas em benefício da interdita e não da ré.
Entendemos que outra conclusão não resulta do depoimento da testemunha M. S., irmã da ré, na medida em que tratou de um depoimento muito, muito tendencioso. Veja-se, por exemplo, a expressão usada: “gastou o que tinha e o que não tinha” – ora não nos merece credibilidade que a ré continuasse a ocupar-se da interdita caso lhe fosse causasse prejuízo financeiro. As declarações desta testemunha revelaram forte animosidade contra as testemunhas C. C., N. e R. C.. Não merece igualmente credibilidade a afirmação de que a ré nunca pediu dinheiro ao falecido C. M. e a testemunha entrou em contradição ao afirmar, por um lado que o dinheiro da I. C. não chegava para fazer face às despesas desta e, por outro que as quantias transferidas eram para a ré.
- Terceiro facto não provado
É de manter este facto como não provado uma vez que nenhuma prova documental se mostra junta. A apelante alude ao doc. nº 88 junto com a contestação, contudo o mesmo não se mostra legível sendo que a responsabilidade por este facto é a si imputável. Da prova testemunhal também não resulta a prova de tal facto (além de que a testemunha A. P. referiu ter sido ela a pagar a fechadura…).
- Quinto facto não provado
Da conjugação das informações da Segurança Social de 21/07/2017 juntas a fls. 215V, de 11/01/2019 junta a fls. 315, de 09/01/2020 junta a fls. 328V e email desta de 28/07/2021 junto a fls. 395 a 395V resulta que, com efeito, a quantia de € 3.627,91, referente ao ano de 2017, foi paga à Segurança Social. Do documento H junto com a contestação a fls. 215V – informação da Segurança Social -, onde se lê que “(...) desde 01/07/2017 tem vindo a ser pago mensalmente à Segurança social uma comparticipação no valor de € 329,81”, não resulta, de modo algum, que essa quantia apenas tenha sido paga entre Julho e Dezembro de 2017, tanto mais que tal informação mostra-se datada de 21/07/2017…
Assim sendo, é de eliminar este facto não provado e é de aditar um facto provado com a seguinte numeração e redacção:
“52 – No ano de 2017 a Ré pagou à Segurança Social a quantia de € 3.627,91 a título de comparticipações.”
- Quantia referente as despesas não documentadas com o alojamento, alimentação, vestuário, higiene
A apelante ré também se insurge contra o valor de € 550,00 fixado a este título na sentença recorrida contrapondo o valor de € 700,00. O autor refere que o valor fixado contraria o caso julgado do apenso C. Pugna pela não fixação de qualquer quantia a este título ou, a fixar-se, tal valor não exceder a quantia mensal de € 150,00.
Quid iuris?
No que diz respeito à apreciação das contas apresentadas pelo réu dispõe o art. 945º nº 5 O juiz ordena a realização de todas as diligências indispensáveis, decidindo segundo o seu prudente arbítrio e as regras da experiência, podendo considerar justificadas sem documentos as verbas de receita ou de despesas em que não é costume exigi-los.
Ocorre, assim, um desvio à regra da apreciação estrita da prova permitindo-se a valoração desta em termos mais flexíveis de molde a garantir que o processo termine com a liquidação de um saldo.

A este propósito lê-se no Ac. da R.C. de 17/12/2015 (Sílvia Pires), in www.dgsi.pt, endereço a que pertencerão os acórdãos a citar sem menção de origem:
“(…) VI - Não admitindo este tipo de acção que o apuramento das receitas e das despesas em causa seja feito em incidente de liquidação de sentença, pois tal esvaziaria o processo do seu conteúdo específico, a lei determina que o apuramento desse saldo seja feito, na ausência de prova consistente, pelo juiz com recurso ao seu prudente arbítrio e às regras da experiência, conforme decorre do nº 5 do art.º 945º do C. P. Civil, poder este que lhe é cometido com vista a que as contas sejam julgadas com base em elementos dotados de um mínimo de consistência.
VII - Na economia da acção especial de prestação de contas o prudente arbítrio inscreve-se na apreciação das provas pelo juiz, devendo este utilizar dados da experiência comum, permitindo-lhe valorar a prova trazida para os autos em termos bastante mais flexíveis do que numa mera análise estrita da prova, segundo os critérios de certeza judicial.
VIII - Na concretização desse raciocínio há-de o juiz atender à verosimilhança do facto em apreciação, sendo verosímil o que corresponde ao funcionamento normal das coisas, às regras da experiência e ao senso comum, numa apreciação sensata e prudente. (…)”

No que concerne as “regras da experiência” lê-se no Ac. do S.T.J. de 06/07/2011 (Hélder Roque):
“(…) III - As regras da experiência não são meios de prova, mas antes raciocínios, juízos hipotéticos do conteúdo genérico, assentes na experiência comum, independentes dos casos individuais em que se alicerçam, com validade, muitas vezes, para além do caso a que respeitem, adquiridas, em parte, mediante observação do mundo exterior e da conduta humana, e, noutra parte, mediante investigação ou exercício científico de uma profissão ou indústria, permitindo fundar as presunções naturais, mas sem abdicar da explicitação de um processo cognitivo, lógico, sem espaços ocos e vazios, conduzindo à extracção de facto desconhecido do facto conhecido, porque conformes à realidade reiterada, de verificação muito frequente e, por isso, verosímil.
IV - O uso, pelas instâncias, em processo civil, de regras de experiência comum é um critério de julgamento, aplicável na resolução de questões de facto, não na interpretação e aplicação de normas legais, que fortalece o princípio da livre apreciação da prova, como meio de descoberta da verdade, apenas subordinado à razão e à lógica, que, consequentemente, não pode ser sindicado pelo STJ, a menos que, excepcionalmente, através da necessária objectivação e motivação, se alcance, inequivocamente, que foi usado para além do que é consentido pelas regras da experiência comum de vida, fundando, assim, uma conclusão inaceitável. (…)”.
Ainda que com recurso a estas regras próprias de valoração da prova o julgador deve, em sede de motivação da matéria de facto, explicitar os concretos meios de prova em que se baseou para considerar determinado facto provado ou não provado e a razão pela qual tais meios de prova foram considerados credíveis e idóneos, justificação esta que terá de obedecer a critérios objectivos, de racionalidade e de lógica.
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Antes de mais, importa apurar se o tribunal recorrido estava impedido de fixar a quantia de € 550,00 por violar o caso julgado formado pela sentença proferida nos autos de autorização judicial sob o Apenso C.
Quando a decisão proferida não é objecto de recurso ou reclamação transita em julgado (art. 628º), i.e., torna-se definitiva passando a ser obrigatória para os respectivos destinatários.
Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa terá força obrigatória, dentro do processo e fora dele - caso julgado material (art. 619º nº 1). A sentença ou despacho que haja recaído unicamente sobre a relação processual terá força obrigatória apenas dentro do processo - caso julgado formal (art. 620º nº 1). Neste último caso, se no mesmo processo vem posteriormente a ser proferida uma nova decisão sobre a mesma concreta questão da relação processual que também transite em julgado cumpre-se a que transitou em primeiro lugar (art. 625º, nº 1 e nº 2).
Nos termos do art. 621º o alcance do caso julgado material formado por sentença anterior tem como extensão os “precisos limites e termos em que julga”. Já se entendeu que este alcance se circunscrevia apenas à parte decisória da sentença, contudo a evolução doutrinária e jurisprudencial foi no sentido de abraçar um critério ecléctico, nos termos do qual não estende a eficácia do caso julgado a todos os fundamentos de facto e de direito da sentença, mas apenas às questões que tenham sido um antecedente lógico necessário e indispensável à emissão da parte dispositiva, assim respeitando a economia processual, o prestígio das instituições judiciárias quanto à coerência das decisões que proferem e a estabilidade e certeza das relações jurídicas.
Consoante a primeira decisão seja de procedência ou improcedência do pedido teremos um caso julgado positivo ou negativo. O caso julgado não apresenta a mesma extensão nos dois casos.
Nas considerações gerais que faremos de seguida acompanharemos de perto o estudo do Prof. Rui Pinto, in Exceção e Autoridade de Caso Julgado – Algumas Notas Provisórias, Julgar Online, Novembro de 2018.
A força obrigatória de uma sentença desdobra-se numa dupla eficácia:
- o efeito negativo do caso julgado ou excepção de caso julgado (art. 577º i) segunda parte, 580º e 581º) que consiste na proibição de repetição de nova acção sobre a mesma pretensão ou questão (non bis in idem) e que pressupõe a “tríplice identidade” (identidade de sujeitos, pedidos e causa de pedir); e
- o efeito positivo ou autoridade de caso julgado que consiste na vinculação das partes e do tribunal a uma decisão anterior (judicata pro veritate habetur) cujo objecto se inscreva no objecto de uma acção posterior, ainda que não integralmente idêntico, de modo a obstar a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa.

O mesmo autor distingue:
- o efeito positivo interno – a vinculação refere-se ao objecto processual (parte dispositiva da decisão, mas nos termos dos seus fundamentos de facto ou de direito) e aos sujeitos/destinatários da própria decisão (parte do ponto de vista da sua qualidade jurídica, os que puderam exercer o contraditório); e
- o efeito positivo externo ou caso julgado stricto sensu – a vinculação refere-se a objectos processuais que estejam em relação conexa com o objecto da decisão. As duas condições objectivas são, por um lado, não se verificar a excepção de caso julgado e, por outro, ocorrer uma relação de prejudicialidade (no domínio da mesma relação jurídica ou relação jurídica conexa); de concurso material entre objectos processuais (concurso entre causas no caso julgado positivo ou negativo) ou uma relação entre os efeitos do caso julgado prévio e os efeitos da causa posterior quanto ao mesmo bem jurídico ou quanto a bens jurídicos conexos (ou como melhor refere este autor “existência de uma relação entre os objectos processuais de dois processos de tal ordem que a desconsideração do teor da primeira decisão redundaria na prolação de efeitos que seriam lógica ou juridicamente incompatíveis com esse“). Este efeito apenas pode ser oposto a quem seja parte do ponto de vista da sua qualidade jurídica e não a terceiro.
Revertendo ao caso em apreço admitimos que, considerar nestes autos que a interdita necessita para fazer face apenas a despesas não documentadas referente à habitação, alimentação, vestuário e higiene da quantia de € 550,00, pode colidir com a autoridade de caso julgado formada pela decisão proferida no Apenso C, segundo a qual não se autorizou a venda de um imóvel da interdita por esta não necessitar do produto dessa venda, sendo que aí não se provou que a mesma necessitasse para assegurar o seu bem estar global (despesas documentadas e não documentadas) da quantia mensal de € 500,00.
Contudo, tal não invalida que possa ser fixada uma quantia inferior a título de despesas não documentadas.
No caso em apreço não foi possível quantificar as despesas da interdita com o alojamento e alimentação uma vez que, quanto a estas, é da normalidade da vida não ser possível apresentar documentos justificativos do seu valor exacto uma vez que a mesma vivia com outras pessoas. Assim, há que recorrer às presunções naturais.
No que concerne ao alojamento resulta dos autos que aquela viveu na casa da ré juntamente com mais duas pessoas aí colocadas pela Segurança Social, bem como com a família desta (pelo menos, com o marido). Estando a interdita acamada necessitou de um colchão anti-escaras ligado permanentemente à electricidade pelo que há que considerar que suas despesas a este título serão superiores às normais de qualquer pessoa (a este propósito a testemunha S. C., assistente social que acompanhou desde 2016 esta situação, referiu que a ré, também por este facto, teria uma factura de electricidade de € 100,00/€ 150,00). Em contrapartida os gastos da interdita com a água terão sido os normais.
A alimentação durante alguns anos terá sido uma alimentação normal (ainda que com uma dieta própria), mas passada face aos problemas de saúde da interdita, e nos últimos tempos uma comida própria “tipo papa”.
Os gastos com vestuário não poderão ter sido significativos, pois os mesmos reconduziam-se necessariamente a vários pijamas de inverno e verão e a uma ou outra roupa, como calças, camisola, casaco e eventualmente gorro ou chapéu, usadas em deslocações ao médico, junta médica, um ou outro passeio em cadeira de rodas.
Já os gastos com produtos de higiene foram contínuos, pois, estando a interdita acamada e com fraldas, precisou de resguardos, de cremes próprios para a pele (também de molde a evitar o aparecimento de escaras), toalhetes, babetes, entre outros. Contudo, estes não podem ser aqui considerados, sob pena de duplicação, uma vez que corresponderão a “produtos adquiridos em farmácia” e “cuidados específicos” já previstos nos pontos nº 45 a 51 dos factos provados. Os produtos remanescentes traduzem-se essencialmente em desodorizantes, e eventualmente sabonete/gel duche e champô (ainda que este esteja incluído numa factura emitida por … de 15/12/2015 junta a fls. 258, bem como aí estão as esponjas de banho – fls. 272, 274, 278V).
Afigura-se-nos que os valores que são usualmente pagos por pessoas nas condições da interdita em instituições não podem ser usados como referência. Com efeito, os valores mínimos de € 900,00/€ 1.000,00 para um lar “básico”, “fraco” (sendo o remanescente das despesas de saúde assegurado pela família) reportam-se à remuneração pelos serviços prestados e ao lucro que uma actividade empresarial desta natureza necessariamente procura obter. No caso em apreço, a remuneração da ré estava assegurada pela Segurança Social e era de cerca de € 600,00/€ 700,00 (vide fls. 37).
Feitas estas considerações, segundo as regras da experiência e senso comum, afigura-se-nos ser de arbitrar a quantia de € 350,00 a título de valor médio das despesas mensais não documentadas.
Pelo exposto, e por se tratar de uma questão de facto, o facto provado nº 43 deve passar a ter a seguinte redacção:
“43- A Ré suportou as despesas inerentes ao alojamento, alimentação, vestuário, higiene, valores não concretamente apurados, mas que se fixam no valor de € 350,00 mensais.”
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Por uma questão metodológica passa-se a transcrever a matéria de facto dada como provada e não provada nesta instância:

Factos provados:
1-I. C. nasceu em - de Agosto de 1974 (fls. 26 e 27 dos autos) com paralisia cerebral, patologia que a incapacitou e determinou a sua dependência de terceiros para todas as suas atividades do quotidiano;
2- Estava acamada;
3- Era filha de Maria e de D. C. – documento n.º 1 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
4- Viveu aos cuidados da sua mãe, Maria, até à morte desta ocorrida em 17 de Maio de 2012 – documento n.º 2 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
5- I. C. faleceu em - de Fevereiro de 2020. – documento n.º 3 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
6- R. C. e C. M. eram irmãos de I. C.;
7- C. M. faleceu no dia - de Março de 2017 - documento n.º 4 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
8- I. C. foi entregue aos cuidados da primeira Ré, M. G., em 22 de Julho de 2012;
9- Por sentença proferida em 12 de Março de 2014, transitada em julgado (cfr. processo principal), foi declarada a interdição da referida I. C., por anomalia psíquica;
10- Fixou-se o início da incapacidade da interdita à nascença;
11- Nomeou-se a aqui primeira ré, M. G., como sua tutora;
12- Para o conselho de família C. A. e D. C. – documento nº 8 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
13- A interdita I. C. era dona e legítima possuidora de um prédio urbano composto por casa de habitação de dois pavimentos, sito no lugar de ..., freguesia de ..., da União de freguesias de ..., ... e ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ... sob o artigo ... – documento n.º 9 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
14- Era herdeira na herança ilíquida e indivisa aberta por óbito dos avós maternos, M. A. e M. M.;
15- A tutora/acompanhante da interdita/beneficiária, por apenso ao processo de interdição, veio requerer autorização para a prática de actos (apenso C);
16- Foi proferida sentença, no apenso referido em 15-, em 6 de Novembro de 2017, já transitada em julgado, não se autorizando à requerente M. G. a prática dos actos enunciados a fls. 9, alíneas a), b) e c), assim improcedendo os pedidos formulados;
17- Por despacho proferido no processo principal, em 15 de Novembro de 2019, já transitado em julgado, foi nomeada como acompanhante da interdita/beneficiária, C. C., em substituição da primeira ré;
18- Como membros do conselho de família foram nomeados A. M. e R. C., em substituição dos anteriores;
19- Os valores da pensão de sobrevivência e do subsídio vitalício foram sendo actualizados anualmente – documento nº 16 junto com a petição inicial e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
20- A interdita recebia, ainda, um subsídio mensal de cerca de € 38,75, para apoio à compra de fraldas, a partir do ano de 2017;
21- A interdita recebia a pensão e o subsídio na conta bancária aberta em nome da I. C. na Caixa ..., com o número ..........8;
22- No ano de 2014, nos meses de Março a Dezembro, o irmão da interdita transferiu mensalmente a quantia de € 250,00, num total de € 2.500,00;
23- No ano de 2014, a partir de Março, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 5.295,62;
24- No ano de 2015, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente a quantia de € 250,00, num total de € 4.000,00;
25- No ano de 2015, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.337,88;
26- E recebeu, ainda, da Segurança Social, a quantia de € 5.457,18 (subsídio para aquisição de uma cadeira de rodas);
27- No ano de 2015, a interdita recebeu de tornas no processo de inventário respeitante aos seus avós, a quantia de € 664,27;
28- No ano de 2016, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe mensalmente a quantias, num total de € 3.000,00;
29- No ano de 2016, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.354,76;
30- No ano de 2017, o irmão da interdita, C. M., transferiu-lhe o montante total de € 1.000,00
31- No ano de 2017, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.626,33;
32- E recebeu da Unidade Local de Saúde a quantia de € 297,72, para subsídio de fraldas;
33- No ano de 2018, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 7.731,10;
34- E recebeu da Unidade Local de Saúde a quantia de € 381,25 para subsídio de fraldas;
35- Por contrato de arrendamento datado de 10 de Março de 2018, a 1ª ré, na qualidade de tutora da I. C., arrendou a A. P. a casa propriedade da interdita;
36- O contrato de arrendamento foi celebrado pelo preço de um ano, com início em 10 de Março de 2018;
37- Mediante o pagamento da renda mensal no valor de € 100,00;
38- Nos anos de 2018 e 2019, a interdita auferiu € 2.100,00 a título de rendas;
39- No ano de 2019, a interdita recebeu da Segurança Social a quantia global de € 6.757,17;
40- E recebeu da Unidade Local de Saúde € 409,40, para subsídio de fraldas;
41- Entre o dia 12 de Março de 2014 e o dia 15 de Novembro de 2019, a Ré recebeu para a interdita a quantia total de € 48.412,68;
42- Entre o dia 12 de Março de 2014 e o dia 15 de Novembro de 2019, a Ré recebeu, ainda, do irmão da interdita, a quantia total de € 10.500,00;
43- A Ré suportou as despesas inerentes ao alojamento, alimentação, vestuário, higiene, valores não concretamente apurados, mas que se fixam no valor de € 350,00 mensais.
44- A Ré foi cuidadora uma dedicada da interdita, proporcionando-lhe os cuidados necessários ao seu bem-estar;
45- A interdita necessitava de cuidados permanentes e de vigilância permanente;
46- No ano de 2014, a Ré pagou € 360,76 em produtos adquiridos em farmácia, € 401,81 em cuidados específicos (fls. 225 a 229 dos autos), € 60,00 em transportes e € 161,87 (IMI);
47- No ano de 2015, a Ré pagou € 593,25 em produtos adquiridos em farmácia, € 530,14 em cuidados específicos (fls. 248 a 255 dos autos), € 8,84 (anuidade do cartão electrónico), € 4.000,00 (cadeira ... -–fls. 255v dos autos), € 277,30 em transportes, € 20,40 (certidão Tribunal) e € 161,55 (IMI);
48- No ano de 2016, a Ré pagou € 382,98 em produtos adquiridos em farmácia, € 757,94 em cuidados específicos (fls. 271v a 281 dos autos), € 13,00 (anuidade de cartão electrónico), € 1.429,95 (acordo de pagamento da cadeira ...), € 65,84 em transportes, € 29,74 no Hospital de ..., € 161,55 (IMI);
49- No ano de 2017, a Ré pagou € 369,37, em produtos adquiridos em farmácia, € 1.779,39 em cuidados específicos (fls. 293v a 303 dos autos), € 14,56 (anuidade cartão multibanco), € 151,46 (IMI);
50- No ano de 2018, a Ré pagou € 192,07 em produtos adquiridos em farmácia, € 650,35 em cuidados específicos (fls. 309v a 312 dos autos), € 14,56 (anuidade de cartão multibanco), € 134,80 (Energia ... – fls. 314), € 1.600,00 (obras – fls. 314v) e € 3.957,72 (pagamento à Segurança Social – fls. 315);
51- No ano de 2019, a Ré pagou € 214,19 em produtos adquiridos em farmácia, € 532,35 em cuidados específicos (fls. 323v a 328 dos autos), € 14,56 (anuidade do cartão de multibanco) e € 938,32 (pagamento à Segurança Social – fls. 328v).
52 – No ano de 2017 a Ré pagou à Segurança Social a quantia de € 3.627,91 a título de comparticipações.
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Factos não provados:
- As quantias entregues pelo irmão da interdita, C. M., foram dados à Ré como gratificação pelos cuidados prestados.
- Os valores alegados pela ré a título de receitas distintos dos que se apuraram e constam dos factos provados.
- A Ré pagou € 116,50 em 27 de Agosto de 2015 (fechadura e cilindro).
- A Ré pagou em 31 de Dezembro de 2016 € 329,81 à Segurança Social.
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C) Subsunção jurídica
A acção de prestação de contas é um processo especial cuja regulamentação está prevista nos art. 941º a 947º para as contas em geral.
Dispõe o art. 941º: “A acção de prestação de contas pode ser proposta por quem tenha o direito de exigi-las ou por quem tenha o dever de prestá-las e tem por objecto o apuramento e aprovação das receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administra bens alheios e a eventual condenação no pagamento do saldo que venha a apurar-se”.
“A obrigação de prestação de contas é estruturalmente uma obrigação de informação de quem administra bens alheios, designadamente o cônjuge, cujo fim é o de estabelecer o montante das receitas cobradas e das despesas efectuadas, de modo a obter-se a definição de um saldo e a determinar a situação de crédito ou de débito.” (Ac. do S.T.J. de 03/02/2005 (Salvador da Costa)).
A regra geral nos termos da qual quem administra bens alheios tem obrigação de prestar conta resulta, em certos casos, da lei (ex. 1161º d), 2093º do C.C., 263º do C.S.C., 760º nº 1), de negócios jurídicos e do princípio da boa-fé.
Na petição “há-de o autor dizer a razão por que se julga no direito de exigir a prestação de contas e por que entende que sobre o réu impede a obrigação de prestar contas” (Alberto dos Reis, Processos Especiais, Vol. II – Reimp., Coimbra Ed., 1982, p. 314).
Numa primeira fase deste processo pode ser colocada como questão prévia de direito substantivo saber se o réu tem ou não obrigação de prestar contas, questão essa que o julgador, em princípio, decide sumariamente nos termos do art. 942º nº 3 do C.P.C..
Caso o réu não conteste a obrigação de prestar contas ou, contestando, tenha sido decidido que está obrigado a prestá-las, é aquele notificado para as prestar (942º nº 5 do C.P.C.).
A segunda fase deste processo consiste na prestação de contas propriamente dita.
No caso de prestação forçada de contas pelo réu, nos termos do art. 944º nº 1 e 3, estas devem ser apresentadas sob a forma de conta-corrente especificando-se as receitas, as despesas e o respectivo saldo e devem ser instruídas com os documentos justificativos.
Na contestação das contas, pode o requerente impugnar as verbas da receita, alegando que esta foi ou devia ter sido superior à inscrita, alegar que há receitas não incluídas nas contas, ou impugnar as verbas de despesa apresentadas pelo requerido; pode também limitar-se a exigir que o requerido justifique as verbas da receita ou da despesa que indicar (art. 945º nº 2).
No caso de não contestação a lei não prevê que o juiz considere admitidas por acordo as verbas das receitas e despesas. Nos termos do nº 3 deste preceito é notificado o requerido para oferecer as provas que entender e, produzidas estas e outras que o juiz considere indispensáveis, este decide.

No que concerne ao ónus da prova das receitas e despesas mantém-se actual o ensinamento de Alberto dos Reis, ob. cit., p. 320, onde se lê:
“a) Quanto às despesas, o princípio de que o ónus da prova recai sobre o réu não sofre excepção. O réu há-de juntar logo, com as contas, os documentos justificativos das despesas, excepto no tocante àquelas de que não é costume cobrar recibo. Mesmo estas há-de o réu comprová-las por testemunhas, se o autor as impugnar.
b) Quanto às receitas, não carece o réu de juntar logo os documentos justificativos. A inscrição das verbas de receita faz prova contra o réu; quer dizer, entende-se que ele, inscrevendo as verbas de receita, confessa que recebeu as quantias, os bens ou os valores indicados por essas verbas.

Mas, o autor pode tomar, perante as verbas de receita, alguma destas atitudes:

1) Não diz nada;
2) Impugna-as, alegando que a receita foi ou devia ser superior à inscrita;
3) Não as impugna expressamente, mas exprime dúvidas sobre a exactidão e exige que o réu as justifique.

No 1º caso consideram-se exactas as verbas, sem mais averiguações.
No segundo, cumpre ao impugnante fazer a prova da sua alegação.
No terceiro, o ónus da prova incide sobre o réu.”
Por fim, havendo ou não contestação das contas, nos termos do nº 5 do art. 945: O juiz ordena a realização de todas as diligências indispensáveis, decidindo segundo o seu prudente arbítrio e as regras da experiência, podendo considerar justificadas sem documentos as verbas de receita ou de despesa em que não é costume exigi-los.
Como vimos supra o “prudente arbítrio” não se confunde com poder discricionário pelo que esta sentença é susceptível de recurso.
Voltando aos ensinamentos de Alberto dos Reis, ob. cit., p. 323, a lei “(…) dá ao juiz um poder latitudinário, mas não um poder discricionário”. E acrescenta “No julgamento das contas o juiz move-se com grande liberdade e largueza, mas não pode emitir decisão que lhe apetecer; há-de lavrar a sentença que, em seu prudente arbítrio, corresponder ao estado dos autos; e a sentença fica sujeita, mediante recurso, à censura da Relação, que, usando por sua vez de prudente arbítrio, pode revogá-la ou alterá-la.”
Feitos estes considerandos importa reverter ao caso em apreço.
Nestes autos os autores pedem que a ré, enquanto cuidadora de I. C., preste contas da administração que fez dos rendimentos desta.
A requerida contestou a obrigação de prestar contas quanto ao período anterior à sua nomeação como tutora no âmbito dos autos de interdição e acerca do dinheiro que lhe foi entregue como gratificação pelo irmão da interdita.
Foi proferida decisão que determinou que a ré estava obrigada a prestar contas no período compreendido entre 12/03/2014 (data da nomeação da ré como tutora da interdita) e 15/11/2015 (data da cessação), o que aquela fez nos termos do art. 944º nº 1 e 3 do C.P.C., i.e..

Tendo os autores contestado as contas apresentadas foi produzida prova tendo-se apurado as seguintes receitas e despesas:
- receitas no valor global de € 58.912,68 (€ 10.500,00 - entregas de dinheiro do irmão) + € 44.560,04 - Segurança Social + € 664,27 – tornas + € 1.088,37 - subsídio de fraldas e € 2.100,00 – rendas) e
- despesas no valor global de € 47.738,34 (€ 23.938,34 – despesas documentadas + € 23.800,00 (€ 350,00 x 68 meses) – despesas não documentadas).
Assim sendo, conclui-se por um saldo a favor dos autores no valor de € 11,174,34 (€ 58.912,68 - € 47.738,34).
Deste modo, procedem parcialmente as apelações do autor e ré.
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As custas da acção e apelações são na proporção dos respectivos decaimentos (art. 527º, nº 1 e 2).
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Sumário – 663º nº 7 do C.P.C.:
I - O processo especial de prestação de contas tem uma primeira fase onde pode ser colocada e decidida a questão de saber se o requerido tem ou não obrigação de prestar contas e, na afirmativa, tem uma segunda fase referente ao julgamento das contas prestadas.
II – No caso de prestação forçada de contas incumbe ao requerido o ónus da prova das despesas apresentadas, bem como das receitas acerca das quais o requerente não impugna expressamente, mas exprime dúvidas sobre a exactidão e exige que o requerido as justifique.
III – Na decisão que julga as contas o juiz deve valorar a prova trazida aos autos em termos bastante mais flexíveis do que o rigor e certeza da decisão judicial em processo comum, devendo recorrer ao seu prudente arbítrio e às regras da experiência.
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III – Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedentes as apelações do autor e da ré e, consequentemente:
Aprovam as receitas no valor global de € 58.912,68 e as despesas no valor global de € 47.738,34 e condenam a ré no pagamento aos autores da quantia de € 11,174,34.
Custas da acção e das apelações em função dos decaimentos.
A presente decisão é elaborada conforme grafia anterior ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa salvaguardando-se, nas transcrições efectuadas, a grafia do texto original.
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Guimarães, 30/06/2022

Relatora: Margarida Almeida Fernandes
Adjuntos: Afonso Cabral de Andrade
Alcides Rodrigues