Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães
Processo:
1420/11.0T3AVR-BT.G1
Relator: ANTÓNIO TEIXEIRA
Descritores: PERDÃO DE PENA
RECURSO
EFEITO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
CORRUPÇÃO
CONSTITUCIONALIDADE
Nº do Documento: RG
Data do Acordão: 02/20/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: IMPROCEDENTE
Indicações Eventuais: SECÇÃO PENAL
Sumário:
I - O recurso do despacho posterior à sentença que recusa a aplicação de um perdão de pena sobe imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo.

II- A circunstância de a Lei n.º 38-A/2023 apenas abranger crimes praticados por pessoas com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos tem uma reconhecida e notória explicação relacionada com a Jornada Mundial da Juventude e os seus destinatários.
Tal diploma legal, inelutavelmente, reveste carácter geral e abstracto, pois que se aplica a todos os arguidos que se encontrem na situação ali descrita, ou seja, em número indeterminado, e a delimitação do respectivo âmbito de aplicação está devidamente justificada, não se mostrando irrazoável, arbitrária e/ou violadora de qualquer princípio constitucional, maxime do princípio da igualdade, ínsito no Artº 13º, nºs. 1 e 2, da nossa lei fundamental.

III- A exclusão do perdão aos condenados por crime de corrupção não padece de qualquer inconstitucionalidade, nomeadamente por violação dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 13.º e 18.º, todos da CRP.
Como o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 42/02 salientou cabe na discricionariedade normativa do legislador ordinário eleger, quer a medida do perdão de penas – o quantum do perdão –, quer, em princípio, as espécies de crimes ou infracções a que diga respeito a pena aplicada e perdoada, quer a sujeição ou não a condições, desde que o faça de forma geral e abstracta, para todas as pessoas e situações nela enquadráveis”.

Não pode aceitar-se o entendimento de que “o crime de corrupção não tem gravidade suficiente no nosso ordenamento jurídico nem aos olhos da Constituição que permita ao Legislador ordinário excluir uma medida de clemência de um ano de perdão aos condenados por esse tipo de crime”.

Pelo contrário, “os fenómenos corruptivos, nas suas diferentes configurações, atentam contra princípios fundamentais do Estado de direito, enfraquecem a credibilidade e a confiança dos cidadãos nas instituições e comprometem o desenvolvimento social e económico, fomentando a desigualdade, reduzindo os níveis de investimento, dificultando o correto funcionamento da economia e fragilizando as finanças públicas. Esses fenómenos atingem o coração da democracia, ferindo-a nos seus princípios fundamentais, nomeadamente os da igualdade, transparência, integridade, livre iniciativa económica, imparcialidade, legalidade e justa redistribuição da riqueza” (“Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024”, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros nº 37/2021, de 18/03/2021, in DR 1ª Série, nº 66, de 06/04/2021).
Decisão Texto Integral:
Acordam, em audiência, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães

I. RELATÓRIO

1. No âmbito do Processo Comum Colectivo nº 1420/11...., do Juízo Central Cível e Criminal ..., Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., foram oportunamente submetidos a julgamento [conjuntamente com outros], os arguidos:
1.1. AA, casado, instrutor, filho de BB e de CC, natural da freguesia e concelho ..., nascido a ../../1965, residente na Rua ..., ..., ... ...;
1.2. DD, casado, empresário, filho de EE e de FF, natural da freguesia ..., concelho ..., nascido a ../../1975, residente na Rua ..., ... ..., ..., titular do cartão de cidadão nº ...; e
1.3. GG, casado, examinador, filho de HH e de II, natural de ..., ..., nascido a ../../1962, residente na Rua ..., ..., ..., titular do cartão de cidadão nº ....
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2. Em 13/12/2017 foi proferido o respectivo acórdão, em cujo âmbito tais arguidos foram condenados pelos crimes, nas penas e nas perdas a favor do Estado seguintes:
2.1. Arguido AA:
- Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 112 crimes de corrupção passiva, p. e p. pelo Artº 373º, nº 1, do Código Penal (por consequência da convolação da prática, em execução continuada, de um crime para concurso de crimes), na pena de 2 anos e 8 meses de prisão por cada um deles;
- Pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 103 crimes de falsificação de documento, p. e p. pelo Artº 256º, nº 1, als. c) e d), por referência ao Artº 255º, al. a), ambos do Código Penal (por consequência da convolação da prática, em execução continuada, de um crime para concurso de crimes), na pena de 6 meses de prisão por cada um deles;
- Pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo Artº 86º, n.º 1, als. c) e d), e n.º 2, por referência aos Artºs. 2º, nº 1, als. p) e q); 3º, n.º 3 (categ. B) e n.º 5, al. e) (categ. C); e Artº 2º, nº 3, al. p), todos da Lei n.º 5/2006, na redação dada pela Lei n.º 12/2011, de 27/0, na pena de 1 ano de prisão;
- Em cúmulo jurídico, na pena única de 8 anos e 6 meses de prisão;
- Tendo sido declarada a perda do valor incongruente apurado no montante de € 272.956,63, ao abrigo do disposto nos Artºs. 7º e ss. da Lei nº 5/2002, de 11 de Janeiro;
- E ainda a perda dos valores, veículos e demais objetos apreendidos, nos termos e para os efeitos do disposto nos Artºs. 109º e 111º do Código Penal.
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2.2. Arguido DD:
- Pela prática, em coautoria material e na forma consumada, de 26 crimes de corrupção passiva, p. e p. pelo Artº 373º, nº 1, do Código Penal (por consequência da convolação da prática, em execução continuada, de um crime para concurso de crimes), na pena de 2 anos e 6 meses de prisão por cada um deles;
- Em cúmulo jurídico, na pena única de 5 anos e 8 meses de prisão.
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2.3. Arguido GG:
- Pela prática, em coautoria material na forma consumada, de 53 crimes de corrupção passiva, p. e p. pelo Artº 373º, nº 1, do Código Penal (por consequência da convolação da prática, em execução continuada, de um crime para concurso de crimes), na pena de 3 anos de prisão por cada um deles;
- Em cúmulo jurídico, na pena única de 8 anos de prisão;
- Na pena acessória prevista no Artº 66º, nº 2, por referência ao nº 1, al. a), b), e c), do Código Penal, por referência ao Artº 11º do Dec.-Lei nº 175/91, de 11 de Maio, de proibição do exercício da atividade de examinador pelo período de 5 anos;
- Tendo sido declarada a perda do valor incongruente apurado no montante de € 276.849,44, ao abrigo do disposto nos Artºs. 7º e ss. da Lei nº 5/2002, de 11 de Janeiro;
- E ainda a perda dos valores, veículos e demais objetos apreendidos, nos termos e para os efeitos do disposto nos Artºs. 109º e 111º do Código Penal.
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3. Inconformados com tais condenações, delas interpuseram recurso  para este TRG os arguidos AA, DD e GG [para além de outros arguidos), visando, em síntese:
3.1. O arguido AA a revogação da decisão em causa, e a sua substituição por outra que o absolvesse da prática dos crimes pelos quais foi condenado ou, caso assim se não entendesse, que lhe fosse aplicada pena de prisão não superior a 5 anos, suspendendo-se a mesma na sua execução;
3.2. O arguido DD a revogação da decisão em causa, e a sua substituição por outra que o absolvesse da prática dos crimes pelos quais foi condenado ou, caso assim se não entendesse, que lhe fosse aplicada pena de prisão não superior a 5 anos, suspendendo-se a mesma na sua execução; e
3.3. O arguido GG a declaração de nulidade do acórdão recorrido e, em consequência, a sua absolvição ou, caso assim se não entendesse, que se considerasse apenas a prática de um crime continuado, reduzindo-se a pena para um máximo inferior a cinco anos de prisão, suspensa na sua execução.
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4. Apreciando tais recursos, este TRG, pelo acórdão de 30/09/2019:
4.1. Julgou parcialmente procedente o recurso do arguido AA e, em consequência, absolveu-o da prática de seis crimes que lhe eram imputados, tendo-lhe aplicada a pena única de 8 (oito) anos de prisão;
4.2. Julgou parcialmente procedente o recurso do arguido DD e, em consequência, absolveu-o da prática de dois crimes que lhe eram imputados, tendo-lhe aplicado a pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão;
4.3. Julgou parcialmente procedente o recurso do arguido GG e, em consequência, absolveu-o da prática de um crime que lhe era imputado, tendo-lhe aplicado a pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão;
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5. Em 31/08/2023 dirigiu o arguido AA aos autos [principais] requerimento [Ref. referência ...54] pugnando no sentido de dever “(…) o Tribunal de 1ª Instância, por força do art.º 3.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, aplicar um ano de perdão sobre a pena do arguido, considerando-se inconstitucional, nos moldes suscitados e subscritos pelo CSM, operando-se, após confirmação nos autos, aos descontos do tempo cumprido em prisão preventiva de 2 anos e 5 meses na pena concreta por ser mais favorável ao arguido e em consequência, uma vez que o resultado é inferior a 5 anos de prisão, ordenar-se a elaboração de relatórios sociais para ponderação e aplicação do art.º 50.º n.º 1 do Código Penal – suspensão da execução da pena de prisão.” [1]
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6. Outrossim, em 06/09/2023 dirigiu o arguido DD aos autos [principais] requerimento [Ref. ...05] pugnando no sentido de dever “(…) o Tribunal, por força do art.º 3.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, aplicar um ano de perdão sobre a pena do arguido, considerando-se inconstitucional em razão da idade e em razão do crime de corrupção, nos moldes suscitados e também subscritos pelo CSM/CSMP/Presidente da República (no que diz respeito à igualdade em razão da idade), operando-se, ao desconto de um ano de prisão na pena única aplicada ao arguido e em consequência, uma vez que o resultado é inferior a 5 anos de prisão, ordenar-se a elaboração de relatórios sociais para ponderação e aplicação do art.º 50.º n.º 1 do Código Penal – suspensão da execução da pena de prisão.”.
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7. E, finalmente, também no dia 06/09/2023 dirigiu o arguido GG aos autos [principais] requerimento [Ref. ...78], pugnando no sentido de dever “(…) o Tribunal, por força do art.º 3.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, aplicar um ano de perdão sobre a pena do arguido, considerando-se inconstitucional em razão da idade e em razão do crime de corrupção, nos moldes suscitados e também subscritos pelo CSM/CSMP/Presidente da República (no que diz respeito à igualdade em razão da idade), operando-se, ao desconto de um ano de prisão na pena única aplicada ao arguido e em consequência, no desconto de 2 anos e 5 meses na pena concreta relacionado com o tempo cumprido em prisão preventiva e uma vez que o resultado passa a ser inferior a 5 anos de prisão, ordenar-se a elaboração de relatórios sociais para ponderação e aplicação do art.º 50.º n.º 1 do Código Penal – suspensão da execução da pena de prisão.”.
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8. Exercendo o contraditório acerca de tais requerimentos, aludidos em 7., em 11/09/2023 pronunciou-se o Ministério Público nos seguintes termos (transcrição):
Requerimento de 31.08.2023, referência ...70, de fls. 43434:
Veio o arguido AA requerer a aplicação do perdão de 1 (um) ano na pena de prisão de 8 (oito) anos de prisão em que foi condenado.
Sucede, porém, que o requerido pelo arguido deve manifestamente improceder, por (entre o mais) duas ordens de razão:
i) em primeiro lugar, de forma manifesta, porquanto o acórdão proferido não transitou em julgado quanto ao referido arguido, pois que, note-se, o mesmo interpôs recurso que se mostra pendente, ainda que, veja-se, este requerimento agora apresentado denote, por si mesmo, a prática de um ato patentemente contrário ao recurso interposto, pois que revela uma clara conformação com a pena a que o arguido foi condenado. Assim, nesta parte, promovo se remeta certidão daquele requerimento, desta Promoção e do subsequente Despacho ao Tribunal superior onde se mostra pendente o recurso, para conhecimento do ato contrário praticado pelo arguido, revelador de uma falta de interesse em agir quanto ao recurso face à conformação da pena imposta pelo Tribunal recorrido;
ii) por outro lado, note-se, e sem atentar aos demais pressupostos legais (em especial quanto aos critérios de elegibilidade do perdão aplicado pela Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, por referência à idade do arguido e tipo de crime pelo qual foi condenado) o arguido nunca poderia beneficiar do perdão pelo facto objetivo de que a pena única a que foi condenado ascender a 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão e, como tal, superior ao limite indicado no artigo 3.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto.”
(...)
Requerimento de 06.09.2023, referência ...03, de fls. 43460:
Vem o condenado DD requerer a aplicação de perdão da pena a que foi condenado – correspondente a 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de prisão – imposta pelo douto acórdão já transitado em julgado, quanto a si, em 06.07.2020, estribando-se, para tanto, na seguinte argumentação que, muito singelamente se sumaria:
i) em primeiro lugar invocando a inconstitucionalidade do artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa na interpretação segundo a qual o perdão apenas pode ser concedido a arguido que tenham, até às 00h00m do dia 19.06.2023 idade entre os 16 e 30 anos;
ii) ainda que os crimes pelos quais foi o mesmo condenado se mostrem previstos no regime de exceção à aplicação do perdão de pena, constante no artigo 7.º da Lei n.º 38.º-A/2023, de 02 de agosto, também essa exceção “é inconstitucional por violação dos princípios do Estado de Direito Democrático, proporcionalidade, discricionariedade, arbitrariedade, dignidade da pessoa humana e da proteção e da igualdade e proibição do excesso, ínsitos nos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa”, designadamente ao impedir o perdão, no que ora releva, a condenados pela prática de crimes de corrupção previstos nos artigo 372.º a 374.º do Código Penal;
Concluiu, assim, o ora condenado, requerendo a aplicação do perdão considerando-se inconstitucional a sua não aplicação ao arguido, peticionando, pois, como consequência pela redução da pena em conformidade – passando a ser de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses de prisão – e, assim, requerendo a elaboração de relatórios sociais para ponderação e aplicação do artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, com a subsequente suspensão da execução da pena de prisão.

Cumpre apreciar e tomar posição:
i) da eventual inconstitucionalidade em razão da idade do arguido:
Estatui o artigo 2.º, n.º 1, da Li n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, que “[e]stão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.

A propósito da apontada inconstitucionalidade, vejamos, pois, o que nos diz a Constituição da República Portuguesa no seu artigo 13.º:
Artigo 13.º
Princípio da igualdade
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
Com particular relevância, entre inúmeros outros arestos do mais Insigne Tribunal, pode ler-se o seguinte no Acórdão n.º 565/2018 do Tribunal Constitucional (disponível em www.tribunalconstitucional.pt):

O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objetivo, constitucionalmente relevantes.
Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe ainda a discriminação; ou seja: as diferenciações de tratamento fundadas em categorias meramente subjetivas, como são as indicadas, exemplificativamente, no n.º 2 do artigo 13º.
Respeitados estes limites, o legislador goza de inteira liberdade para estabelecer tratamentos diferenciados.
O princípio da igualdade, enquanto proibição do arbítrio e da discriminação, só é, assim, violado quando as medidas legislativas contendo diferenciações de tratamento se apresentem como arbitrárias, por carecerem de fundamento material bastante.”
Portanto, dúvidas inexistem de que a existência de distinções não é, per se, sinónimo de violação do princípio da igualdade, antes pelo contrário, a existência de distinções pode ser, de resto, necessária a evitar essa mesma violação, pois que o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa não significa, de todo, tratar tudo e todos de igual modo, mas antes tratar igual o que é igual e desigual o que é, pois, desigual.
A questão que muito pertinentemente se coloca nesta sede é a de saber se com a imposição de um limite máximo etário para que fosse concedido o perdão, fixado pelo Legislador nos 30 (trinta) anos à data dos factos ocorridos até às 00h00m do dia 19.06.2023 é, em si mesmo, justificado ou, ao invés, é resultado de arbítrio do legislador.
A justificação do Legislador para a consagração desta medida de graça é, sabemo-lo todos, a vinda de Sua Santidade o Papa a Portugal por ocasião das Jornadas Mundiais da Juventude e, por tal facto, considerando que nas Jornadas Mundiais de Juventude os seus participantes/público alvo são os jovens até aos 30(trinta) anos, então, caberia tal limite colhimento.
Do mesmo discorda o arguido, naturalmente maior de 30 (trinta) anos, invocando, entre o mais, o discurso de Sua Excelência do Presidente da República, bem como o texto do parecer do Conselho Superior da Magistratura, no qual são levantadas reservas à constitucionalidade do artigo 2.º, n.º 1 da dita Lei.
Lê-se naquele parecer, que por se secundar face ao acerto, aqui se transcreve:
Ora, a diferenciação de tratamento entre pessoas que praticaram idênticas infrações com base unicamente na idade que possuíam no momento da sua prática, ainda que amparada na faixa etária dos principais destinatários de um evento, suscita as maiores reservas quanto à sua conformidade constitucional. Na verdade, trata-se de uma discriminação (positiva) em função da idade, que não se mostra devidamente justificada. Segundo o ensinamento de Gomes Canotilho e Vital Moreira, as diferenciações só podem ser legítimas quando se baseiem numa distinção objetiva de situações, tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional e se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objetivo. A discriminação para ser legítima terá, pois, que ser proporcional, necessária e adequada, não podendo, de modo algum, ser arbitrária. As medidas das diferenças que estabelecem terão que ser proporcionais. As JMJ não são um valor constitucional que justifique a discriminação de pessoas, sendo, pois, duvidoso que esta discriminação se considere não arbitrária, considerando que a discriminação que é feita tem que se justificar para fins constitucionalmente legítimos. Por outras palavras: é necessário que a discriminação seja constitucionalmente legítima e que a diferença de tratamento estabelecida pelo legislador seja adequada e proporcional nessa perspetiva”.
Ademais, no douto parecer do Conselho Superior do Ministério Público, diz-se, a dado passo:
Há de assim questionar-se se a escolha do legislador encontra uma justificação razoável, segundo critérios de valor objetivo e constitucionalmente relevantes, se encontra uma justificação do ponto de vista dos fins do Estado de Direito capaz de justificar uma limitação, em razão da idade, para os cidadãos abrangidos na Proposta de Lei: - aqueles que tenham entre 16 e 30 anos de idade, à data da prática do facto.
Tal delimitação em razão da idade tem que ser feita em função de circunstâncias não arbitrárias e razoáveis do ponto de vista dos fins do Estado de direito.
Apontar-se-ia como justificável uma equiparação por recurso a um especial regime legal aplicável aos jovens, fazendo-se corresponder a delimitação de idade de abrangência do diploma em análise àquela que se encontre prevista em tal regime.
Já aqui se abordou o regime penal aplicável a jovens delinquentes, previsto no Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de setembro, aplicável a jovens com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos.
Não é no entanto esse o propósito do legislador, que fundamenta a idade de abrangência de aplicação da amnistia e do perdão com a idade de inscrição para a JMJ, fundamento que também não encontra um respaldo absoluto na informação que é divulgada pela organização do evento.
Anota-se, porém, que não existe uma definição universalmente aceite relativa ao grupo etário dos jovens. Apenas a título de exemplo, menciona-se que para fins estatísticos, as Nações Unidas definem a “juventude” pelo grupo etário composto por pessoas entre os 15 e os 24 anos”.
Também aqui se têm de perfilhar tais reservas, pois que, de facto, ainda que o conceito de “jovens” não seja estanque nem definido, pelo menos no ordenamento jurídico português, com especial destaque para a matéria criminal – da qual manifestamente nos ocupamos – o Legislador não teve dúvidas em definir, no artigo 1.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de setembro, que “[o] presente diploma aplica-se a jovens que tenham cometido um facto qualificado como crime. 2 – É considerado jovem para efeitos deste diploma o agente que, à data da prática do crime, tiver contemplado 16 anos sem ter atingido ainda os 21 anos”, determinando, pois, que jovem é aquele indivíduo que tenha entre 16 e 20 anos de idade, pois que, note-se, aos 21anos de idade já não é beneficiário do regime especial penal para jovens delinquentes.
Daqui que, visando este Diploma legal um regime penal especializado para os jovens arguidos perpetradores de ilícitos criminais, e visando a medida de clemência decorrente da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, compreender-se-ia que objetivamente o Legislador justificasse a discriminação em termos consentâneos com o ordenamento jurídico visto no seu todo, donde se poderia concluir, pois, ser justificada a existência de tratamento desigual.
Não é, porém, o sucedido, pois que o Legislador no uso do poder que lhe está atribuído – legislativo – e ao qual não se imiscui o Tribunal, sob pena de violação do princípio da separação de poderes, entendeu, arbitrariamente, associar-se a critérios meramente religiosos, num Estado que, de resto é laico, e, assim, adotar a mesma baliza temporal de 30(trinta) anos, o que, estamos em crer, poderá, pois, colidir com o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental.
Donde, nesta parte, entende-se que até poderia justificar-se, por parte do Tribunal, um pedido de fiscalização concreta da constitucionalidade da norma, naquela interpretação, de forma a aquilatar se deve o arguido – excluído em razão da idade – ser considerado para efeitos de beneficiar do perdão, sob pena de violação do principio da igualdade previsto no artigo 13.º da Lei Fundamental, ou, em alternativa, decidir o Tribunal, secundando um ou outro entendimento e, assim, aplicando ou desaplicando a norma.
Não obstante, em face do que de imediato se dirá, quanto aos demais pressupostos (a saber, o tipo de crime), considera-se ato inútil, pelo que à apreciação do mesmo passaremos.
ii) da eventual inconstitucionalidade em razão da exceção do tipo de crime pelo qual foi o arguido condenado:
A tal propósito, alegou o arguido que, ainda que se conclua que o regime em apreço se lhe é aplicável, pela circunstância de haver sido condenado por crime constante das exceções constantes do artigo 7.º, n.º 1, al. e), subalínea iv) da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto e, assim, objetivamente não se lhe ser aplicável o perdão, deve tal norma ser considerada inconstitucional, por violação dos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa.

Rezam aqueles preceitos que:
Artigo 1.º
República Portuguesa
Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Artigo 2.º
Estado de direito democrático
A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.
Artigo 3.º
Soberania e legalidade
1. A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na Constituição.
2. O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática.
3. A validade das leis e dos demais atos do Estado, das regiões autónomas, do poder local e de quaisquer outras entidades públicas depende da sua conformidade com a Constituição.
Artigo 13.º
Princípio da igualdade
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
Artigo 18.º
Força jurídica
1. Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são diretamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.
3. As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstrato e não podem ter efeito retroativo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.
Neste concreto consideramos não existir qualquer razão ao arguido, adiante-se.
Com efeito, a escolha de certos e determinados crimes que devem ser (e assim foram) excecionados da medida de clemência, consagrados no artigo 7.º da Lei n.º 38.º-A/2023, de 02 de agosto, trata-se de uma questão unicamente política para a qual tem o Legislador conformação máxima na amplitude, ancorado, desde logo, naqueles que são os objetivos de política criminal.
Não concretamente sobre essa questão, mas numa questão também de grande relevo sobre a recente medida de perdão concedida em decorrência das medidas excecionais contra a Sars-Cov2, quanto à inadmissibilidade de aplicação de perdão a condenados ainda não recluídos, sumariou-se nos termos seguintes no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 07.10.2020, proferido no processo n.º 719/16.4TXPRT-F.C1, relatado pelo Exmo. Sr. Juiz Desembargador Luís Teixeira (disponível em www.dgsi.pt):
I. O perdão de pena previsto no artigo 2º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, só pode ser concedido a reclusos, condenados por sentença transitada em julgado em data anterior à da sua entrada em vigor, excluindo os condenados que não tenham ainda ingressado fisicamente no estabelecimento prisional.
II. Todavia, o perdão do artigo 2.º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, verificados que sejam os demais requisitos substantivos legais, pode ser igualmente aplicado a condenados que, no decurso da vigência daquela Lei, venham a estar na situação de reclusão.”
O que demonstra, pois, que também nessa medida de graça em decorrência existiram desigualdades devidamente justificadas decorrentes de uma mera opção legislativa.
No caso dos autos foi o arguido condenado pela prática de crimes de corrupção passiva, previstos e punidos pelo artigo 373.º, n.º 1 do Código Penal, sendo que entendeu o Legislador, em decorrência do poder legislativo e em concordância com as opções de política criminal que toma, em execução das medidas de repressão criminal, que certos crimes, por atentarem contra bens jurídicos cuja tutela é mais expressiva, não poderiam ver os seus autores beneficiados com perdão de pena (nem com amnistia), nos termos do artigo 7.º, n.º 1, al. e), subal. iv) da Lei n.º 38-A/2003. E tal é, pois, o caso dos presentes autos, quanto ao indicado arguido DD, o qual cometeu crime que atenta contra o próprio Estado, sendo opção do Legislador.
Assim, nesta parte, somos do entendimento de que deve improceder a pretensão do arguido e, assim, indeferir-se à concessão do referido perdão de 1(um) ano na pena única de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses imposta ao mesmo.”.
(...)
Requerimento de 06.09.2023, referência ...32, de fls. 43481:
Vem o condenado GG requerer a aplicação de perdão da pena a que foi condenado – correspondente a 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão – imposta pelo douto acórdão já transitado em julgado, quanto a si, em 06.07.2020, estribando-se, para tanto, na seguinte argumentação que, muito singelamente se sumaria:
i) em primeiro lugar invocando a inconstitucionalidade do artigo 2.º, n.º 1, da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, por violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa na interpretação segundo a qual o perdão apenas pode ser concedido a arguido que tenham, até às 00h00m do dia 19.06.2023 idade entre os 16 e 30 anos;
ii) ainda que os crimes pelos quais foi o mesmo condenado se mostrem previstos no regime de exceção à aplicação do perdão de pena, constante no artigo 7.º da Lei n.º 38.º-A/2023, de 02 de agosto, também essa exceção “é inconstitucional por violação dos princípios do Estado de Direito Democrático, proporcionalidade, discricionariedade, arbitrariedade, dignidade da pessoa humana e da proteção e da igualdade e proibição do excesso, ínsitos nos artigos 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa”, designadamente ao impedir o perdão, no que ora releva, a condenados pela prática de crimes de corrupção previstos nos artigo 372.º a 374.º do Código Penal;
iii) por fim, considerando perdoada em 1(um) ano da pena imposta, descontando o período já cumprido desde que recluído preventivamente até à data, tal redundaria em que o remanescente da pena se fixasse em período inferior a 5 anos e, assim, requereu a reabertura da audiência para ponderação de eventual substituição da pena determinando-se a sua suspensão;
Concluiu, assim, o ora condenado, requerendo a aplicação do perdão considerando-se inconstitucional a sua não aplicação ao arguido, peticionando, pois, como consequência pela redução da pena em conformidade – passando a ser de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão.

Cumpre apreciar e tomar posição:
i) da eventual inconstitucionalidade em razão da idade do arguido:
Neste segmento, em abono da economia processual, vale, mutatis mutandis tudo quanto antes referido na apreciação conferida para o arguido DD.
ii) da eventual inconstitucionalidade em razão da exceção do tipo de crime pelo qual foi o arguido condenado:
Também neste segmento, em respeito da economia processual, vale, mutatis mutandis tudo quanto antes referido na apreciação conferida para o arguido DD.
Assim, nesta parte, somos do entendimento de que deve improceder a pretensão do arguido e, assim, indeferir-se à concessão do referido perdão de 1 (um) ano na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses imposta ao mesmo.
***
iii) do desconto da pena já cumprida e da suspensão do remanescente:
Neste concreto, face ao antes indicado, considerando-se que deve improceder o pedido de desconto formulado, necessariamente é de improceder o pedido neste ponto também.
Sem prescindir, sempre se apraz dizer que o peticionado não apresenta razão de ser, pois que, e salvo o devido respeito por distintas opiniões, o pedido não encontra fundamento legal, pois que de outro modo todo e qualquer período de prisão que fosse descontado faria com que sempre que uma pena remanescente fosse igual ou inferior a 5 (cinco) anos se abrisse portas à violação do caso julgado com a necessidade de reponderação de eventual pena de substituição, no caso de suspensão da execução de uma pena que, note-se, já estava em execução.
Ora, a questão apreciada no acórdão citado pelo arguido, neste propósito, do Tribunal da Relação de Lisboa, no processo n.º 134/ 21.8JDLSB-A.l-3, é distinta, ainda que, de facto, aprecie o desconto do período cumprido em prisão preventiva, operação que é feita na liquidação da pena e tão só isso.
Em face do exposto, por manifesta falta de fundamento legal do requerido, posto que a possibilidade de suspensão de uma pena, enquanto pena substitutiva, se verifica aquando da sentença/acórdão, e não em momento posterior, sob pena de violação do princípio do esgotamento do poder jurisdicional, promove-se, também nesta parte, se indefira ao requerido.
(...)”.
9. Apreciando tais requerimentos, em 13/09/2023 o Mmª Juiz a quo exarou nos autos o(s) seguinte(s) despacho(s) (transcrição):
Ref.ª Citius ...70:
O arguido AA foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática, entre, em co-autoria material, na forma consumada, de 112 (cento e doze) crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal (penas parcelares de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão para cada um deles); de 103 (cento e três) crimes de falsificação de documentos, p.p. pelos art.ºs 256.º, n.º 1, als. c) e d), por referência ao art.º 255.º, al. a), do Código Penal (penas parcelares de 6 (seis) meses de prisão para cada um deles); e 1 (um) crime de detenção de arma proibida, p.p. pelo art.º 86.º, n.ºs 1, als. c) e d), e 2, por referência aos art.ºs 2.º, n.º 1, als. p) e q), 3.º, n.ºs 3 (cat. B) e 5, al. e) (cat. C), e ainda art.º 2.º, n.º 3, al. p), da Lei n.º 5/2006, na redacção dada pela Lei n.º 12/2011 (pena parcelar de 1 (um) ano de prisão).
Como bem refere o Ministério Público, o arguido interpôs para o Supremo Tribunal de Justiça recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20.03.2023 (ref.ª ...73).
Assim sendo, e face aos termos do requerimento identificado em epígrafe, determino que se cumpra como doutamente promovido, extraindo certidão do mesmo, da promoção com a ref.ª ...91 e do presente despacho e se remeta ao Supremo Tribunal de Justiça, a fim de ser ponderado para os efeitos do disposto no art.º 401.º, n.º 2, do C.P.P.
**
Ref.ªs Citius ...03 e ...32:
Os requerimentos identificados em epígrafe serão tratados em conjunto, atenta a similitude das situações. 
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (seis) meses de prisão, pela prática, entre 2004 e 2012, em co-autoria material, na forma consumada, de 26 (vinte e seis) crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal (penas parcelares de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão para cada um deles).
Este arguido nasceu em ../../1975.
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática, em co-autoria material, na forma consumada, de 53 (cinquenta e três) crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal (penas parcelares de 3 (três) anos de prisão para cada um deles).
O arguido nasceu em ../../1962.
A Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, veio estabelecer um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude.
Dispõe o art.º 2.º, n.º 1, do referido diploma que “(e)stão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.
O art.º 3.º da aludida lei refere que:
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos.
2. São ainda perdoadas:
a) As penas de multa até 120 dias a título principal ou em substituição de penas de prisão; b) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa;
c) A pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição; e
d) As demais penas de substituição, exceto a suspensão da execução da pena de prisão subordinada ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova.
3. O perdão previsto no n.º 1 pode ter lugar sendo revogada a suspensão da execução da pena. 
4. Em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única.
5. O disposto no n.º 1 abrange a execução da pena em regime de permanência na habitação”.
No caso vertente, está verificado o pressuposto temporal de aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, já que os factos em causa foram praticados antes das 00:00 do dia 19.06.2023, mas não o pressuposto subjectivo, pois, à data da prática dos factos, nenhum dos arguidos tinham 30 ou menos anos.
Acresce que os crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal, pelos quais foram condenados encontram-se exceptuados da aplicação do perdão, nos termos do art.º 7.º, n.º 1, al. e), iv), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Isto dito, passemos à apreciação das inconstitucionalidades suscitadas.
Invocam os arguidos que a discriminação veiculada na Lei n.º 38-A/2023, no tocante ao âmbito de aplicação subjectivo da amnistia e do perdão (a indivíduos com idade entre os 16 e os 30 anos à data da prática dos factos) e objectivo (excluindo determinadas categorias de crimes, nomeadamente o de corrupção) é violadora do princípio da igualdade, do Estado de Direito, da proporcionalidade, discricionariedade, “arbitrariedade” (sic.), e dignidade da pessoa humana.
Ora, sobre esta matéria já se pronunciou, precisamente a propósito de outras leis de amnistia e perdão, o Tribunal Constitucional.
Assim, o Ac. TC n.º 488/2008 [Proc.º n.º 35/08, relator Cons. Benjamim Rodrigues, em www.tribunalconstitucional.pt]: “Embora a concessão do perdão genérico – única figura que agora nos interessa – seja efeito de um acto político, que pode ter por causa as mais diversas motivações (cf., referindo-se à amnistia, os Acórdãos n.ºs 444/97 e 510/98, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt), como sejam a magnimidade por occasio publicae laetitia excepcional, razões de política geral de apaziguamento ou outras, de correcção de determinadas ponderações anteriores efectuadas pelo direito ou do modo da sua aplicação pela jurisprudência ou pela administração, ela expressa-se através de uma lei em sentido material.
Ora, cabendo a sua edição na competência do legislador ordinário, tomada no campo da política criminal, não pode deixar de se lhe reconhecer discricionariedade normativo-constitutiva na conformação do seu conteúdo. 
Referindo-se à circunstância de as Leis n.ºs 23/91, de 4 de Julho, 15/94, de 11 de Maio e 29/99 não terem contemplado, nos perdões genéricos concedidos, a medida de segurança de internamento, disse-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 42/02, disponível em www.tribunalconstitucional.pt:
“Neste domínio, o Tribunal Constitucional vem entendendo, com significativa reiteração, que, nos óbvios parâmetros do Estado de direito democrático, a liberdade de conformação legislativa goza de alargado espaço onde têm lugar preponderantes considerações não necessariamente restritas aos fins específicos do aparelho sancionatório do Estado, mas também outras ditadas pela conveniência pública que, em última instância, entroncam na raison d’Etat”.
Mas essa discricionariedade normativo-constitutiva não é ilimitada: ela tem de respeitar as normas e os princípios constitucionais.
Estas normas e princípios constitucionais surgem sempre como um limite à actividade legiferante do órgão constitucionalmente competente para dispor sobre a matéria.
Entre os princípios, cujo respeito se impõe ao legislador ordinário competente para dispor sobre o perdão genérico das penas, contam-se o invocado pela recorrente, o princípio da igualdade perante a lei e na lei (cf. além dos referidos Acórdãos, Pedro Duro, op. cit., p. 336, e Francisco Aguilar, op. cit, p. 209).
No que importa à primeira dimensão, importa reconhecer que o legislador do perdão genérico não o desrespeitou.
Na verdade, o perdão foi concedido a todos condenados que houvessem praticado os mesmos crimes pelos quais a recorrente foi condenada e se encontrassem na mesma situação.
O perdão abrange todas as pessoas que sejam condenadas pela prática, até ao momento considerado na lei, de todas as categorias de crime, à excepção das pessoas condenadas que se encontrem em determinada situação, nela definida de forma geral e abstracta (n.º 1 do art.º 2.º da Lei n.º 29/99), ou hajam praticado certas categorias de crimes (n.º 2 do mesmo artigo).
Por outro lado, o estabelecimento do pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização como condição resolutiva da concessão do perdão mostra-se também feito de forma geral e abstracta, colocando todos os condenados em penas de prisão que o tenham sido igualmente no pagamento de indemnizações aos lesados na mesmíssima situação quanto ao benefício da clemência.
Cabe na discricionariedade normativa do legislador ordinário eleger, quer a medida do perdão de penas – o quantum do perdão –, quer, em princípio, as espécies de crimes ou infracções a que diga respeito a pena aplicada e perdoada, quer a sujeição ou não a condições, desde que o faça de forma geral e abstracta, para todas as pessoas e situações nela enquadráveis. (…)
Mas igualdade não é igualitarismo.
O Tribunal Constitucional tem uma vasta jurisprudência sobre o princípio da igualdade.
Reflectindo o estado actual da compreensão do princípio da igualdade, tanto na jurisprudência como na doutrina, nacionais e estrangeiras, afirmou-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 232/2003 (publicado no Diário da República I Série-A, de 17 de Junho de 2003), assumindo em diversos passos da sua fundamentação abundante argumentação de jurisprudência anterior: (…)
“[...] O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que fundamentadas à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos nºs 39/88, 186/90, 187/90 e 188/90, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol. (1988), p. 233 e ss., e 16º vol. (1990), pp. 383 e ss., 395 e ss. e 411 e ss., respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, jorge miranda, Manual de Direito Constitucional, tomo IV, 2ª ed., 1993, p. 213 e ss., gomes canotilho, Direito Constitucional, 6ª ed., 1993, pp. 564-5, e gomes canotilho e vital moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 1993, p.125 e ss.]”.
Também o excelente Ac. TC n.º 444/97 [Proc.º n.º 784/96, relator Cons. Sousa e Brito, em www.tribunalconstitucional.pt] se debruça sobre esta questão: “Cumpre, contudo, reconhecer que a tese de que a lei de amnistia implica logicamente uma dispensa da lei punitiva, que há que sindicar constitucionalmente quanto à sua racionalidade ou razoabilidade, tendo em vista o princípio da igualdade, é compatível com a "autonomia" do poder de conceder amnistias (afirmada no acórdão nº 362 [p. 25] da Comissão Constitucional) relativamente ao poder de fazer leis, consagrados em separado nas alíneas d) e g) da Constituição como competências distintas da Assembleia da República, que em outras constituições são atribuídas a órgãos distintos (assim, por exemplo, a amnistia era segundo a redacção originária do artigo 79º da Constituição italiana, concedida pelo Presidente da República, através de uma lei de delegação das Câmaras legislativas - desde a lei constitucional de 6 de Março de 1992, nº 1 exige-se unicamente a maioria de dois terços dos componentes de cada uma das Câmaras -, e na Carta Constitucional competia ao Rei como poder moderador [artigo 74º, § 8]). Por outro lado, como se mostrará a seguir, embora o princípio da igualdade seja aplicável à lei de amnistia, é-o em termos compatíveis com a desigualdade de tratamento que ela implica relativamente aos casos que continuam a ser abrangidos pela lei punitiva geral amnistiada (ponto acentuado por outras palavras no Parecer nº 13/79, p.104 da Comissão Constitucional. Sobre amnistia na jurisprudência da Comissão Constitucional, cf. ainda o parecer nº 32/79 [Pareceres, 10, 1980), p. 107 ss.]; e os acórdãos nºs 186 de 26.3.1980 [Apêndice ao Diário da República de 3.7.1980], 259 [Apêndice ao Diário da República de 28.7.81], 309, 310, 311, 314, [Apêndice ao Diário da República de 22.12.1981]). Acresce que a norma de amnistia, mesmo geral, no sentido apontado, não deixa de ser uma medida política, que não põe em questão a continuada vigência da norma punitiva amnistiada, que continua a ser a regra geral incriminadora, nem dos princípios gerais do direito penal, medida relativamente à configuração da qual o legislador dispõe de uma liberdade de conformação legislativa, nomeadamente do ponto de vista do princípio da igualdade, superior à que caracteriza outras normas, que exprimam regras ou princípios jurídicos. Com este limitado conteúdo seria adequado falar de um "acto político plural", expressão que pode, contudo, equivocadamente ligar-se à tese da insindicabilidade constitucional das normas de amnistia.
Justifica‑se assim e precisa‑se a próxima tarefa: saber se a norma de amnistia questionada viola os princípios do Estado de direito e especialmente o princípio da igualdade, que fundamenta a generalidade da lei. Ora o princípio da igualdade não significa proibição de normas especiais ou excepcionais relativas a categorias de interessados, mesmo se já individualizáveis em concreto, como nas leis retroactivas, mas sim proibição de normas diversas para situações objectivamente iguais, com o corolário de que normas diversas regulam situações objectivamente diversas do ponto de vista da razão da norma (assim, os acórdãos nºs 44/84, 34/86, 12/88, 39/88, 191/88, 186/90, 330/93, 381/93, 516/93, 335/94, 468/96, 563/96 e 786/96, publicados nos Acórdãos, 3º vol., p. 133, 7º vol., t. I, p. 37, 11º vol., p. 135 e p. 233, 12º vol., p. 239, 16º vol., p. 383, 25º vol., p. 421 e p. 547, Diário da República, II Série, 19/1/1994, 30/8/1994, e 13/5/1996, e I Série A, 16/5/1996 e II Série, de 20/8/1996, respectivamente).
Assente a possibilidade de estabelecimento de diferenciações, tornar-se-á depois necessário proceder ao controlo das normas sub judicio, feito a partir do fim que visam alcançar, à luz do princípio da proibição do arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade”.
Por fim, o Ac. TC n.º 42/95 [Proc.º n.º 372/94, relator Cons. Messias Bento, em www.tribunalconstitucional.pt] explica que uma norma que, “ao definir o âmbito da exclusão do perdão, concedido pela alínea d) do nº 1 do artigo 8º, faz apelo à espécie de pena aplicada, ao tipo de crime por que os arguidos foram condenados e ao facto de eles já terem beneficiado de perdão anterior; e, por outro lado, ela aplica-se a todos os arguidos que se encontrem na situação por si descrita, que, assim, são em número indeterminado. (…)
A norma em causa também não viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição.
A ideia de igualdade, com efeito, só recusa o arbítrio, as soluções materialmente infundadas ou irrazoáveis”.
Ora, no caso vertente, não há dúvida de que a Lei n.º 38-A/2023 contém normas gerais e abstractas para os seus destinatários. É certo que há uma evidente opção no sentido de limitar o âmbito subjectivo dos beneficiários e o elenco de crimes que não poderão beneficiar de amnistia ou perdão, mas não se vislumbra que, na delimitação, o legislador tenha resvalado da discricionariedade normativa para a arbitrariedade. Com efeito, a opção de apenas abranger crimes praticados por pessoas com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos tem uma evidente conexão com o evento que justifica a própria lei – a Jornada Mundial da Juventude - e os destinatários da mesma. Acresce que, do ponto de vista axiológico, é a própria Constituição que, no seu art.º 70.º, dedica uma norma de protecção especial à juventude, sendo certo que o legislador ordinário, no D.L. n.º 401/82, de 23 de Setembro, sentiu necessidade de criar um regime penal mais favorável para os jovens delinquentes.
Nesta medida, não se vislumbra que a opção da Lei no tocante ao âmbito subjectivo seja materialmente desproporcionada ou injustificada.
E o mesmo se diga do âmbito dos crimes excluídos, já que, para além de estarem objectivamente definidos, de forma geral e abstracta, a opção encontra eco no sentimento ético-jurídico vigente, ao qual repugnaria amnistiar ou perdoar determinadas categorias de crimes (entre os quais, não poderá deixar de se sublinhar, o de corrupção).
Por todo o exposto, considera-se não padecerem as normas apontadas de qualquer inconstitucionalidade.
Consequentemente, indefere-se a requerida aplicação do perdão aos arguidos DD e GG.
(...)”.

10. Ainda nessa mesma data [13/09/2023], veio o arguido AA, através do requerimento com a Ref. ...79, insurgir-se, em síntese, contra a promoção do Ministério Público, supra aludida em 8., dando especial enfoque à “gravosa” “desatenção” do Exmo. Procurador da República, e bem assim à “gravidade” das conclusões ou ilações pelo mesmo proferidas, sublinhando, ainda, que não corresponde à realidade que tenha uma pena única de 8 anos e 6 meses de prisão, pois que, pelo acórdão deste TRG de 30/09/2019, foi condenado numa pena única de 8 anos de prisão, e reiterando dever ser-lhe declarado o perdão de um ano de prisão, em conformidade com a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, como solicitado.
*
11. Apreciando esse requerimento do arguido AA, mencionado em 10., em 25/09/2023 o Mmº Juiz a quo proferiu o seguinte despacho (transcrição):
Ref.ª Citius ...17:
Visto.
Nada a determinar, atendendo a que o Tribunal já se pronunciou sobre a questão suscitada (na parte que releva para o processo), estando já esgotado o poder jurisdicional relativamente à mesma.”.
*
12. Não se conformando com os despachos supra aludidos em 9. e 11. [este último apenas quanto ao arguido AA], deles interpuserem recurso para este TRG os arguidos AA, GG e DD [previamente defendendo que ao mesmo deve ser atribuído efeito suspensivo, nos termos das disposições conjugadas dos Artºs. 407º, nºs. 1, 2, al. a) e 408º, nº 3, do C.P.Penal, por se tratar de “decisões que puseram termo à causa”],  nos termos da peça conjunta que no dia 05/10/2023 dirigiram aos autos, cuja motivação rematam com a formulação das seguintes conclusões e petitório (transcrição):
“1.ª Vem o recorrente AA apresentar recurso aos despachos proferidos em 13.09.2023 e de 25.09.2023 por entender que os mesmos não se podem manter, na medida em que a sua pena de prisão é de 8 anos e como tal beneficiadora do perdão papal oriundo da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto.
2.ª Ao contrário do que é referido pelo Parecer do Ministério Público datado de 22.09.2023, e do próprio despacho de 13.09.2023 não é verdade que o arguido AA não possa beneficiar de um ano de perdão, porquanto os crimes de falsificação de documentos não foram excluídos do perdão, basta ler-se o art.º 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, sendo certo que quando o Ministério Público refere na promoção de 11.09.2023 que Não é, porém, o sucedido, pois que o Legislador no uso do poder que lhe está atribuído – legislativo – e ao qual não se imiscui o Tribunal, sob pena de violação do princípio da separação de poderes, entendeu, arbitrariamente, associar-se a critérios meramente religiosos, num Estado que, de resto é laico, e, assim, adotar a mesma baliza temporal de 30(trinta) anos, o que, estamos em crer, poderá, pois, colidir com o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental.”, entendemos que é no sentido de se considerar inconstitucional a não aplicação do perdão de 1 ano aos cidadãos que tenham cometido crimes com mais de 30 anos de idade à data dos factos.
           
INCONSTITUCIONALIDADE EM RAZÃO DA IDADE

3.ª A norma do art.º 2.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, na interpretação segundo a qual não se aplica o perdão de um ano a arguidos/condenados com idade superior a 30 anos à data da prática dos factos é inconstitucional por violação do princípio da igualdade ínsito no art.º 13.º n.ºs 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade que expressamente se invoca para todos os devidos efeitos legais.

Ou, por razões de mero ajustamento criterial dos pressupostos do Tribunal Constitucional, diz-se a mesma coisa noutra leitura:

A norma do art.º 2.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, ao não permitir a abrangência no perdão de penas a pessoas com mais de 30 anos de idade é inconstitucional por violação do princípio da igualdade ínsito no art.º 13.º n.º 1 e 2 da Constituição da República Portuguesa.
4.ª As Jornadas Mundiais da Juventude não são um critério para provocar tamanha desigualdade no âmbito criminal, em que a uns se aplicam perdões e a outros não, nem podem ser critérios religiosos, num estado laico, a poder permitir ou convencer o legislador a criar uma baliza temporal, onde até se excluíram, vejam só, os idosos, que também merecem uma protecção acrescida do legislador, em razão do fim de vida, face à idade. Em jeito de reparo, todos assistimos, uns ao vivo outros pelos meios de comunicação social: as jornadas mundiais da Juventude abarcaram jovens, bebés, crianças, idosos, adultos ou quase adultos, sem se fazer qualquer distinção. Todos tiveram direito a ver a Sua Santidade, ninguém pagou mais por ser mais velho.
5.ª Quer o Conselho Superior da Magistratura, quer o Conselho Superior do Ministério Público e o Sr. Presidente da República consideraram tal norma inconstitucional. De salientar que o Sr. Presidente da República deixou bem claro que apenas não suscitou a inconstitucionalidade do referido artigo e número de tal diploma para não prejudicar os beneficiários já contemplados no diploma, mas segundo nota publicada no site oficial da Presidência da República, o Sr. Presidente irá avançar com esse pedido de inconstitucionalidade em razão da idade, o que se compreende, pois a suscitação de inconstitucionalidade naquele momento traria dois problemas: afinal o perdão não estaria publicado em Diário da República quando Sua Santidade estivesse em território português e todos aqueles 480 reclusos que foram libertados dos Estabelecimentos Prisionais bem como todos os cidadãos que já beneficiaram dos perdões/amnistias nos processos pendentes estariam sem beneficiar, ainda hoje, desse mesmo diploma, motivo pelo qual temos que considerar que a prudência e cautela do Sr. Presidente foi positiva para não prejudicar desde logo todos aqueles que, com um ano de perdão, regressariam, como regressaram à liberdade em Setembro de 2023. Nenhuma censura nos merece a posição adoptada pelo P.R., apenas nos merecendo censura, claro está, os despachos judiciais de 13.09.2023 e de 25.09.2023.
6.ª O próprio Ministério Público fez uma importante chamada de atenção para a disparidade do critério de “jovens” utilizado pelo legislador no âmbito do perdão papal, pois não coincide com os mesmos “jovens” referidos no Código Penal pelo Decreto-Lei n.º 401/82, de 23 de Setembro, em que se prevê jovens dos 16 aos 21, sendo que nesta Lei n.º 38-A/2023 os jovens abarcam cidadãos até aos 30 anos de idade.
7.ª O arguido AA pode, assim, beneficiar do perdão de um ano de prisão oriundo da lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, na medida em que a sua pena é de 8 anos (e não mais), e os crimes de falsificação encontram-se abrangidos pela aplicação do perdão, restando apenas a questão limitação em razão da idade que, como se viu e detalhou nas Motivações do recurso e nas conclusões supra referidas, é inconstitucional – o que deve ser declarado pelo Tribunal da Relação, sob pena dos arguidos levarem as questões ao mais alto tribunal dos direitos fundamentais, o Tribunal Constitucional.
8.ª A inconstitucionalidade em razão da idade, e tudo o mais quanto foi invocado e a invocar, por razões de economia processual, vale também para os recorrentes GG e DD, nos exactos termos suscitados para o arguido AA, já que se trata do mesmo despacho, do mesmo processo e do mesmo recurso.
9.ª Já quanto ao despacho de 25.09.2023, provocado pela existência da promoção de 22.09.2023, que nasceu da resposta apresentada pelo arguido em 13.09.2023 (dia em que saiu o despacho de 13.09.2023 de que se recorre também), considerou-se que o poder jurisdicional se encontrava já esgotado, mas o Tribunal tinha o poder dever de corrigir o grave erro material que se encontrava no despacho de 13.09.2023 e não o fez, sendo certo que é a própria lei que permite ao Tribunal, quer pelo art. 380.º do C.P.P. quer pelo art.º 613.º n.º 2 do Código Processo Civil, aplicável por força do art.º 4.º do C.P.P. “é licíto, porém, ao juiz retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença, nos termos dos artigos seguintes.”
10.ª Uma vez que o Tribunal não o fez, violou o disposto no art.º 613º nº 2 do C.P.C. aplicável ex vi art.º 4.º do C.P.P. – que expressamente se invoca quanto ao despacho de 25.09.2023, sendo certo que o Tribunal tinha o dever, senão mesmo obrigação de, apercebendo-se do erro dos 8 anos e 6 meses (e que afinal eram 8) reparar imediatamente o despacho de 13.09.2023, notificando o arguido de uma nova decisão, que fosse fundamentada, o que não fez, sendo que o despacho de 13.09.2023 no que diz respeito ao arguido AA nem sequer é minimamente fundamentado, para além de nem sequer estar de acordo com o resultado do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães proferido em 30.09.2019, que reduziu a pena do arguido para os já conhecidos e apregoados 8 anos de prisão.
11.ª Não se pode deixar de salientar que ao perdoar-se 1 ano de prisão não se está a inocentar ninguém, perdoar um ano de prisão não é absolver alguém. É apenas e só isso, reduzir 1 ano da pena. Não se compreende, portanto, a resistência em perdoar-se meramente um ano.

QUANTO À MATÉRIA RESPEITANTE APENAS AOS ARGUIDOS RECORRENTES GG E DD – que foi indeferida por terem sido condenados apenas por crimes de corrupção. 

12.ª O despacho recorrido de 13.09.2023, no que a esta parte diz respeito, depois de transcrever os acórdãos n.ºs 42/95, 444/97 e 488/2008 do Tribunal Constitucional, refere o seguinte:
“ Ora, no caso vertente, não há dúvida de que a Lei n.º 38-A/2023 contém normas gerais e abstractas para os seus destinatários. É certo que há uma evidente opção no sentido de limitar o âmbito subjectivo dos beneficiários e o elenco de crimes que não poderão beneficiar de amnistia ou perdão, mas não se vislumbra que, na delimitação, o legislador tenha resvalado da discricionariedade normativa para a arbitrariedade. Com efeito, a opção de apenas abranger crimes praticados por pessoas com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos tem uma evidente conexão com o evento que justifica a própria lei – a Jornada Mundial da Juventude - e os destinatários da mesma. Acresce que, do ponto de vista axiológico, é a própria Constituição que, no seu art.º 70.º, dedica uma norma de protecção especial à juventude, sendo certo que o legislador ordinário, no D.L. n.º 401/82, de 23 de Setembro, sentiu necessidade de criar um regime penal mais favorável para os jovens delinquentes.
Nesta medida, não se vislumbra que a opção da Lei no tocante ao âmbito subjectivo seja materialmente desproporcionada ou injustificada.
E o mesmo se diga do âmbito dos crimes excluídos, já que, para além de estarem objectivamente definidos, de forma geral e abstracta, a opção encontra eco no sentimento ético-jurídico vigente, ao qual repugnaria amnistiar ou perdoar determinadas categorias de crimes (entre os quais, não poderá deixar de se sublinhar, o de corrupção).
Por todo o exposto, considera-se não padecerem as normas apontadas de qualquer inconstitucionalidade.
Consequentemente, indefere-se a requerida aplicação do perdão aos arguidos DD e GG.
13.ª Portanto, entendeu o Tribunal, no despacho de 13.09.2023 que o “sentimento ético-jurídico vigente” repugnaria amnistiar ou perdoar determinadas categorias de crimes, entre os quais o crime de corrupção.
14.ª Com o devido respeito, não se trata aqui de amnistiar ou perdoar os crimes de corrupção. O perdão/amnistia perdoa todos os crimes puníveis até 1 ano de prisão.
são amnistiadas as infrações penais cuja a pena aplicável não seja superior a 1 ano de prisão ou a 120 dias de multa” – art.º 4º da Lei n.º 38-A/2023, de 1 de Agosto.
15.ª Quanto aos demais crimes, perdoa 1 ano na pena de prisão e não perdoa o crime. Não é o crime que é perdoado nem amnistiado. A pena de prisão, isso sim, é que é meramente reduzida. Se o cidadão tinha 5 anos de prisão, desce para 4, se tinha 8, desce para 7.
16.ª Não estamos perante um perdão total ou amnistia, mas sim perante, apenas e só, uma redução, um indulto muito parcial, uma simples atenuação da pena de prisão aplicada.
17.ª São várias as razões por que não faz sentido jurídico-constitucional excluir-se o crime de corrupção.
18.ª Por exemplo, os Tribunais de Execução de Penas aplicam nos termos do artigo 61.º e 62.º do Código Penal as liberdades condicionais ao meio da pena ou antecipação do meio da pena a condenados por crimes de corrupção.
19.ª Os próprios Tribunais Judiciais também aplicam penas de prisão suspensas na sua execução a crimes de corrupção.
20.ª O crime de corrupção não é um crime contra a vida humana ou contra a liberdade sexual.
21.ª O crime de corrupção não tem gravidade suficiente no nosso ordenamento jurídico nem aos olhos da Constituição que permita ao Legislador ordinário excluir uma medida de clemência de um ano de perdão a quem tiver sido condenado por crimes de corrupção, porque como se disse, o perdão incide na pena de prisão aplicada e não no crime em si mesmo, tornando-se mais injusto quando, no presente caso, o arguido GG até pagou mais de € 220.000,00 ao Estado.
22.ª A condenação permanece na ordem jurídica, no certificado de registo criminal do arguido também constará, com as demais consequências legais.
23.ª Logo não faz qualquer sentido constitucional, em termos de proporcionalidade, razoabilidade e da necessidade, excluir-se o perdão de 1 ano de prisão em penas até 8 anos quanto a condenados por crimes de corrupção.
24.ª Não há, diga-se, uma única justificação legal que nos permita dizer que se compreende a não aplicação de um ano de perdão a um cidadão que tenha 7 anos de prisão relativos a condenações por crimes de corrupção.
25.ª A pena desce de 7 para 6 anos. Logo justifica-se, aos olhos do princípio da igualdade, que a redução de um ano de prisão se aplique aos condenados por crimes de corrupção. 
26.ª Se atendermos ao Perdão/Amnistia emitido por Portugal em 1994, os crimes excluídos do perdão, constantes do art.º 9.º da Lei n.º 15/94, de 11 de Maio, não contemplam os crimes de corrupção.
27.ª A repulsa ou incompreensão da sociedade civil, em geral, não está em ver perdoado um ano de prisão seja a quem for, muito menos em crimes que não são contra a vida humana. A repulsa e ondas de contestação surgem quando temos pessoas da classe política, banca ou classe alta que escapam às malhas da Justiça, que enriquecem com as negociatas políticas e ficam impunes ou que, pura e simplesmente vêem os grandes processos prescrever. A repulsa “ético-jurídica” prende-se com isso, não com um ano de perdão em penas de prisão
28.ª Dir-se-á, então, que mesmo declarando-se inconstitucional em razão da idade, os aqui arguidos GG e DD ficariam prejudicados na aplicação do perdão/amnistia por força do regime de exclusão previsto no art.º 7.º n.º 1 alínea e), subalínea iv) da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de Agosto, que refere que os condenados dos crimes contra o Estado por crimes de corrupção previstos nos art.ºs 372.º a 374.º do Código Penal “não beneficiam do perdão e da amnistia previstos na presente lei.”.
29.ª Sucede que, tal normativo é inconstitucional pelos motivos que explicitaremos.
30.ª O Estado, quando emite um perdão/amnistia, tem que respeitar os princípios da proporcionalidade, razoabilidade, adequabilidade, dignidade da pessoa humana e evitar a arbitrariedade do legislador.
31.ª O que significa que, uma norma, como é o art.º 7.º da referida lei, ao incluir uns crimes em detrimento de outros considerados até bem mais graves do que parte daqueles ali referidos, padece de inconstitucionalidade por ser irrazoável e arbitrária.
32.ª Se é certo que a Assembleia da República tem uma larga margem de conformação legislativa na escolha dos casos a que se aplica a amnistia e o perdão, tal margem não lhe permite, injustificadamente ou sem critérios de proporcionalidade e de razoabilidade, abranger uns crimes e excluir outros de menor gravidade.
33.ª Trata-se, portanto, de se aferir o equilíbrio/desequilíbrio do regime de excepções, pois só dessa forma se consegue aferir como a excepção ao crime de corrupção é inconstitucional.
34.ª Por um lado, um diploma que prevê a exclusão de perdão/amnistia por crimes de corrupção/branqueamento de capitais a jovens até aos 30 anos é uma redacção da lei muito infeliz.
35.ª Contamos pelos dedos de uma só mão os jovens até aos 30 anos condenados por crimes de corrupção, mas não serão muitos mais arguidos condenados a penas de prisão efectiva por crimes de corrupção. Diremos que, em Portugal, estarão condenados a penas de prisão efectiva, nos últimos 10 anos (uma década), umas 500 pessoas por crimes de corrupção.
36.ª Este tipo de crimes, em regra, pela sua logística e complexidade, é cometido por pessoas já com alguma idade, que já tiveram um caminho empresarial que os levou aquele tipo de crimes.
37.ª Quantos serão os jovens deste país condenados por crimes de corrupção? Serão assim tantos? Consultada a base de dados do site da Direcção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, a mesma não faculta quantos condenados existem por cada tipo de crimes. Ficamos assim ser poder saber, com rigor, quantos cidadãos a nível nacional foram condenados por crimes de corrupção.
38.ª Certo é que, o Estado emite um perdão/amnistia em que concede a amnistia/perdão a crimes como burla qualificada, fraude fiscal, abuso de poder, denegação de justiça e prevaricação, sendo que alguns dos crimes que permitem a aplicação do perdão são crimes inseridos no capítulo de crimes “contra a realização da justiça”.
39.ª Ora, como se pode permitir que, crimes contra a realização da justiça admitam perdão/amnistia, e um crime contra o Estado, como é o crime de corrupção, não admite um ano de perdão?
40.ª Atente-se que, por um lado, ao perdoar-se um ano de pena de prisão não se está a inocentar nem a absolver o condenado por corrupção.
41.ª Logo não há alarme social no que diz respeito à contemplação de perdão a alguém condenado por corrupção, porque o perdão de um ano só provoca uma redução, por força do perdão, na pena daquele cidadão.
42.ª Por outro lado, tão ou mais importante, um crime de corrupção (cometido contra o Estado) é um crime ressarcível, pois o Estado, como é o caso dos autos, decretou o arresto a todo o património do delinquente, decretou o pagamento a favor do Estado do enriquecimento ilegítimo para, com essa reposição, estar reposta a ordem jurídica dos montantes em causa – arguido que pagou integralmente tudo o quanto ficou descrito na condenação.
43.ª Um crime de denegação de justiça ou de abuso de poder não tem reparação monetária possível, uma manipulação dos resultados de sentenças ou de processos atenta contra o mais elementar pilar da democracia: a realização de justiça.
44.ª Ao contrário do crime de corrupção, enquanto este permite a devolução ao Estado dos “lucros” indevidos, no crime de denegação de justiça ou abuso de poder não existe forma de se remendar o mal causado.
45.ª Quando o Estado elaborou este perdão, ao perdoar-se um ano de pena a alguém condenado por burla qualificada, por acaso questionou as vítimas das burlas se concordariam com esse perdão a quem as burlou? É que, pese embora o crime de burla esteja tipificado como “crime contra o património”, relembremos as palavras de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Dezembro de 2013 e que aqui têm total aplicação: “O crime de burla não pode ser desvalorizado com o rótulo de “crime contra o património”, como se não afetasse também as pessoas, como se não fossem elas as vítimas do crime. O comportamento da arguida constitui um muito censurável aproveitamento das dificuldades vividas pelas vítimas, agravando a sua situação.”
46.ª Certo é que, os crimes de burla, que afectam pessoas e provocam vítimas, estão contemplados com o perdão/amnistia, os crimes de denegação de justiça e de abuso de poder permitem a aplicação do perdão/amnistia, e em contraposição, os crimes contra o Estado, nomeadamente o crime de corrupção, está no regime de excepções para não aplicação do perdão.
47.ª O que nos leva a concluir pela desproporcionalidade, desigualdade, excessividade e arbitrariedade do legislador no que a esta matéria diz respeito.
48.ª Como refere o Acórdão n.º 348/00, no processo n.º 533/99, da 1.ª Secção, do Tribunal Constitucional, pese embora “na amnistia e/ou no perdão genérico avulta ampla margem de manobra do legislador quanto à delimitação do campo de aplicação das medidas de clemência a tomar, margem de manobra que acresce àquela que assiste ao Estado na opção por punir, não punir ou deixar de punir e, em consequência, por tipificar penalmente determinados ilícitos (…) será de censurar o arbítrio em que não se vislumbra um mínimo de racionalidade”.
49.ª Ocorre assim, no caso desta lei, uma distinção e discriminação arbitrária por parte do legislador da Lei n.º 38-A/2023, uma vez que, permite aplicação do perdão a um conjunto diversificado de crimes contra a realização da Justiça e excluiu, por via do regime de excepções, a aplicação do perdão aos crimes de corrupção, mesmo até aos arguidos com arresto que têm garantido o valor dos pagamentos ao Estado.

INCONSTITUCIONALIDADE EM RAZÃO DA DESPROPORCIONALIDADE E ARBITRARIEDADE PELA EXCEPÇÃO DA NÃO APLICAÇÃO DE PERDÃO/AMNISTIA AO CRIME DE CORRUPÇÃO

50.ª O artigo 7.º n.º 1 alínea e), subalínea iv) da Lei n.º 38-A/2023 de 2 de Agosto, ao contemplar como excluído da aplicação de perdão de um ano de prisão em penas de prisão até 8 anos os crimes de corrupção previstos nos artigos 372.º a 374.º do Código Penal é inconstitucional por violação dos princípios do Estado de Direito, proporcionalidade, discricionariedade, arbitrariedade, dignidade da pessoa humana e da protecção e da igualdade e proibição do excesso, ínsitos nos artigos 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa.
51.ª A nota de admissibilidade da proposta de lei n.º 97/XV/1ª, fazia essa chamada de atenção para a “certa categoria de crimes” e que deve ser aferida à luz dos princípios da igualdade e da proporcionalidade.
52.ª O Tribunal Constitucional reconhece que o legislador tem larga margem para decidir, mas quando se constata que há arbitrariedade, então aí cabe aos Tribunais estancar, por via da declaração de inconformidade constitucional, a exclusão de uns em detrimento de outros.
53.ª Não é constitucionalmente admissível que sejam abrangidos pelo perdão de um ano de prisão crimes contra a realização da justiça e por contraposição se tenha vedado a aplicação de um ano de perdão a crimes contra o Estado, quando é o próprio Estado a conceder esse mesmo perdão.
54.ª Repetimos, o perdão de um ano de prisão numa determinada pena de prisão não é uma absolvição nem uma decisão absolutória, antes sim uma mera redução, por via da clemência, em 1 ano de prisão.
55.ª Logo, não existe nenhum princípio constitucional que justifique, à luz das razões expendidas, a exclusão da aplicação de um ano de perdão a condenados por crimes de corrupção, porque o crime de corrupção é, apesar de tudo, ressarcível ao Estado nos lucros/dividendos ilegítimos que são retirados aos arguidos e proibidos de exercer tais funções, minimizando-se os danos colaterais daquela conduta delituosa do cidadão.
56.ª Compreende-se que os crimes de homicídio e outros de gravidade idêntica não beneficiem de qualquer clemência, uma vez que, a vida humana e a dignidade do ser humano, quando nos reportamos a crimes como violações, homicídios, praticados contra crianças, não merecerão, à partida, clemência, por terem feridos os mais altos valores humanistas e o mínimo respeito pelo próximo.
57.ª Agora no que diz respeito a crimes como “fraude na obtenção de subsídio”; “intolerância nos espectáculos desportivos”; “crimes lei do cibercrime”; “crimes contra a correcção da competição e do seu resultado na actividade desportiva” são exemplos destes, também eles excluídos da aplicação de um ano de perdão, que fragilizam, por completo, a arbitrariedade do diploma de perdão e amnistia.
58.ª Por todas estas razões, a derrogação ao princípio da igualdade não se encontra materialmente justificada quando crimes contra a realização da justiça estão abrangidos pela aplicação de um ano de perdão e o crime de corrupção, inserido no capítulo de crimes contra o Estado já não.
59.ª Foram violados os artigos 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa, na medida em que, cabia ao Tribunal de 1.ª Instância declarar inconstitucional a norma do art.º 7.º n.º 1 alínea e) subalínea iv) da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, considerando-se que a exclusão do perdão de um ano de prisão aos arguidos GG e DD não tem justificação legal e constitucional na medida em que, a mera redução de um ano de prisão, ao não ser igual para todos, viola princípios da igualdade, proporcionalidade, razoabilidade mostrando-se irrazoável e desadequada tal norma – o que se invoca.
60.ª As melhores e mais correctas interpretações deveriam ter sido, e por isso se pugna neste recurso, as seguintes:
a) A Lei do perdão/amnistia estabelece um perdão “por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude” – mas o legislador não pode balizar a idade do perdão por referência aos 30 anos por ser essa a idade de referência das JMJ, quer porque as JMJ não são um valor constitucional bem como porque, num Estado Laico, como é Portugal, não se podem usar critérios religiosos para definir quem pode ou não pode beneficiar do perdão e até que idade. Por tais motivos, é inconstitucional a não aplicação do perdão em razão da idade superior a 30 anos;
b) Os crimes de falsificação de documentos pelo art.º 256.º n.º 1 do Código Penal estão abrangidos pela aplicação do perdão, não constando do cardápio de crimes excluídos nos termos do art.º 7.º da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto;
c) Por sua vez, a exclusão do perdão aos crimes de corrupção é inconstitucional porquanto a redução em 1 ano de perdão numa pena de prisão até 8 anos em nada belisca os princípios da igualdade, proporcionalidade, razoabilidade, entre outros, uma vez que a exclusão desse perdão de um ano é que fere, de forma grave e inaceitável, aqueles princípios constitucionais;
d) Por fim, e porque se sabe que o arguido AA tem que beneficiar do perdão de 1 ano, pensemos nisto: os co-arguidos do AA irão ver aquele arguido a ser perdoado 1 ano na sua pena de 8 (que passará para 7 anos na procedência do recurso), e os arguidos com menos crimes, menos pena de prisão, mas condenados pelos mesmos factos ficam excluídos do perdão? Quer dizer, como o arguido AA tem mais crimes para além dos de corrupção, pode beneficiar do perdão, mas os que têm menos crimes, porque estão limitados às condenações por crimes de corrupção, ficarão sem qualquer perdão?
e) Pensemos neste exemplo: o arguido AA, com a aplicação do perdão, ficará com uma pena de 7 anos (desce dos 8 para 7), num total de 200 crimes pelos quais foi condenado, e em contraposição os arguidos GG e DD, cada um deles condenado por 50 crimes e 23 crimes, respectivamente, com penas de 7 anos e 6 meses e 5 anos e 3 meses respectivamente, ficarão sem qualquer redução meramente de 1 ano? Que sentido fará, em termos objectivos e constitucionais o arguido GG, com 50 crimes (menos ¾ do que o AA) não ser perdoado e ficar com uma pena de prisão mais alta do que o arguido que foi condenado por 200 crimes?

TERMOS EM QUE, FACE ÀS MOTIVAÇÕES E CONCLUSÕES APRESENTADAS E TUDO O MAIS QUE FAVOREÇA OS RECORRENTES, DEVE O PRESENTE RECURSO SER PROCEDENTE E, EM CONSEQUÊNCIA, SEREM REVOGADOS OS DESPACHOS DE 13.09.2023 E DE 25.09.2023, DETERMINANDO-SE O SEGUINTE:

I) QUANTO AO ARGUIDO AA: A PENA DE PRISÃO É DE 8 ANOS E NÃO DE 8 ANOS E 6 MESES, REVOGANDO-SE, DESDE LOGO O DESPACHO DE 13.09.2023 NO QUE A ESTE ARGUIDO DIZ RESPEITO;
II) CONSIDERANDO-SE QUE, NESSE MESMO DESPACHO DE 13.09.2023 O TRIBUNAL A QUO CONSIDEROU NÃO INCONSTITUCIONAL O LIMITE DA IDADE (30 ANOS), CONCLUIR-SE PELA INCONSTITUCIONALIDADE EM RAZÃO DA IDADE E, EM CONSEQUÊNCIA, O ARGUIDO AA PODER BENENFICAR DO PERDÃO;
III) CONSIDERAR-SE QUE OS CRIMES DE FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTOS NOS TERMOS DO ART.º 256.º N.º 1 DO CÓDIGO PENAL NÃO FORAM EXCLUÍDOS DA APLICAÇÃO DO PERDÃO, PODENDO CONCLUIR-SE QUE, O ARGUIDO AA PODE BENENFICAR DO PERDÃO DE 1 ANO DE PRISÃO NA SUA PENA DE 8 ANOS, REDUZINDO-SE A PENA PARA 7 ANOS;
IV) O DESPACHO DE 25.09.2023 AO TER DECLARADO QUE NÃO HAVIA NADA A DETERMINAR, MESMO DEPOIS DO MINISTÉRIO PÚBLICO TER RECONHECIDO O ERRO DA PENA NA PROMOÇÃO ANTECEDENTE DATADA DE 11.09.2023, TAL DESPACHO DEVIA TER SIDO RECTIFICADOR DO DESPACHO DE 13.09.2023 POR SER EVIDENTE O ERRO MATERIAL;
V) OS ARGUIDOS GG E DD, CONDENADOS POR CRIMES DE CORRUPÇÃO, DEVEM SER BENEFICIADOS DO PERDÃO DE 1 ANO NAS SUAS PENAS ÚNICAS, CONSIDERANDO-SE INCONSTITUCIONAL A EXCLUSÃO DE PERDÃO AOS CRIMES DE CORRUPÇÃO UMA VEZ QUE A REDUÇÃO DE UM ANO DE PERDÃO EM QUALQUER PENA NÃO CONSISTE NUMA ABSOLVIÇÃO OU IMPUNIDADE/IMUNIDADE CRIMINAL.

DECIDINDO-SE ASSIM, NO SENTIDO DEFENDIDO E INVOCADO PELA DEFESA ALCANCAR-SE-Á JUSTIÇA!”.
*
13. Tal recurso foi admitido pelo tribunal a quo, através do despacho de 10/10/2023, nos seguintes termos (transcrição):
“Por estar em tempo, ser legal e ter sido interposto por quem para tal tem legitimidade, admito o recurso dos arguidos AA, GG e DD para o Tribunal da Relação de Guimarães, o qual sobre imediatamente, em separado e com efeito devolutivo.
Notifique – artº 411º, nº 6, e 413º, nº 1, do C.P.P.
(...)”.
*
14. Na 1ª instância apresentou-se a responder o Ministério Público, nos termos da peça processual apresentada no dia 13/10/2023 [Ref. ...58], a qual o Exmo. Procurador da República subscritor remata com a formulação das seguintes conclusões (transcrição):

“1.º Pretende o recorrente a impugnação dos Despachos de 13.09.2023 e 25.09.2023, com as referências, respetivamente, ...80 e ...04, alegando, para tanto que aquele Despacho de 13.09.2023 deve ser revogado por padecer de enfermidades na indicação das penas a que foram os arguidos condenados.
2.º Mais referem aos arguidos ora recorrentes que deve ser concedido o perdão de 1(um) ano nas penas a que cada um foi condenado, previsto nos termos da Lei n.º 38-A/2023, de 02 de agosto, sob pena de, a assim não suceder por força dos artigos 2.º e 7.º da indicada Lei, alegando serem aqueles preceitos inconstitucionais por violação, o primeiro, do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa e o segundo por violação dos princípios do Estado de Direito Democrático, proporcionalidade, discricionariedade, arbitrariedade, dignidade da pessoa humana e da proteção e da igualdade e proibição do excesso, ínsitos nos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa.
3.º São as seguintes as questões aduzidas, em jeito de súmula:
3.1. saber se deve o douto Despacho de 13.09.2023 (e, consequentemente, o douto Despacho de 25.09.2023 que referiu esgotado estar o poder jurisdicional) ser revogado porquanto enferma de lapso na medida em que fez constar que o arguido AA foi condenado na pena de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses quando se mostra condenado na pena de 8 (oito) anos;
3.2. saber se devem aqueles doutos Despachos ser revogados e conceder-se perdão de 1(um) ano a cada um dos arguidos ora recorrentes porquanto entendimento diferente viola a Constituição da República Portuguesa, concretamente, por serem violadores dos princípios do Estado de Direito Democrático, proporcionalidade, discricionariedade, arbitrariedade, dignidade da pessoa humana, igualdade e da proteção e da igualdade e proibição do excesso, ínsitos nos artigos 1.º, 2.º, 3.º, 13.º e 18.º da Constituição da República Portuguesa os normativos 2.º, n.º 1, e 7.º da Lei n.º 38- A/2023, de 02 de agosto.
3.3. saber se, no limite, com o perdão que venha a ser concedido ao arguido DD, por resultar o remanescente em pena inferior a 5 (cinco) anos deve ser a mesma suspensa na sua execução ao abrigo do artigo 50.º do Código Penal;
4.º Entende o MINISTÉRIO PÚBLICO, nos termos das alegações de resposta que antecedem e se dão por reproduzidas, que deve ser julgado parcialmente procedente o recurso (quanto à questão por nós indicada em 3.1), determinando-se a retificação do Despacho de 13.09.2023, fazendo-se constar que os arguidos AA, GG e DD foram respetivamente condenados nas penas de 8 (oito) anos de prisão, 7 (sete) anos e 6  (seis) meses de prisão e 5(cinco) anos e 3 (três) meses de prisão.
5.º Em tudo o mais, deve improceder o recurso interposto, porquanto quanto ao arguido recorrente AA mostra-se, ainda, por estabilizar a sua situação jurídico processual e, em decorrência, não deve ser aplicado perdão porquanto não existe, ainda, uma pena concreta imposta sobre a qual possa incidir o dito perdão.
6.º E, quanto aos demais arguidos GG e DD deve também o recurso improceder porquanto independentemente da eventual inconstitucionalidade que pudesse verificar-se por pretensa violação do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, certo é que os crimes pelos quais foram os mesmos condenados são subsumíveis à exceção constante do artigo 7.º, n.º 1, al. e), subal. iv) da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de agosto, considerando o MINISTÉRIO PÚBLICO que tal artigo 7.º é conforme a Lei Fundamental, conforme, de resto, tão exaustivamente consta dito no douto Despacho recorrido e ao qual se adere em jeito de adição ao teor da Promoção de 11.09.2023 (referência ...91).
7.º Por fim, ainda que se conceba, em mera hipótese de raciocínio, a aplicação de perdão ao arguido DD, passando a sua pena de prisão à medida de 4 (quatro) anos e 3 (três) meses, deve a mesma manter-se em cumprimento efetivo, sem possibilidade de ser suspensa nos termos do artigo 50.º do Código Penal, pois que a pena imposta não fica alterada, mantendo-se, na génese, a pena primitiva e, em conformidade, não é suscetível de ser suspensa na sua execução.
8.º Neste sentido se pronunciou, entre outros, e muito recentemente a propósito da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, o Tribunal da Relação de Coimbra de 10.03.2021, proferido no processo n.º 496/11.5TXCBR-M.C1, relatado pela Exma. Senhora Juíza Desembargadora Maria Alexandra Guinés, disponível em www.dgsi.pt, no qual se escreveu: “[…] III – Perante o disposto no artigo [leia-se, número] 7.º, segunda parte, do artigo 2.º da Lei n.º 9/2020, de 10-04, o remanescente da pena perdoada não pode ser comutado por qualquer uma das penas de substituição legalmente previstas. IV – Sendo assim, além do cumprimento da nova pena que lhe foi imposta, o condenado terá de cumprir o remanescente da pena de prisão objecto da referida medida de graça”.
9.º Assim, nesta parte, deve, também, improceder o recurso interposto.
10.º Porém, V. Exas. decidindo farão, pois, e como sempre, a tão acostumada  JUSTIÇA.”.
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15. Subidos as autos a este TRG, no momento processual a que alude o Artº 416º, nº 1, do C.P.Penal [2], em 29/10/2023 emitiu a Exma. Procuradora-Geral Adjunta o seu douto parecer, o qual sintetizamos nos seguintes moldes:

- Deve ser mantido o efeito atribuído aos recursos, não tendo fundamento legal a pretensão dos recorrentes no sentido da atribuição do efeito suspensivo;
- Devem ser corrigidos os lapsos manifestos constantes do despacho de 13/09/2023, no que tange às penas em que foram condenados os recorrentes. Pois que, na sequência dos recursos por eles apresentados, por acórdão deste TRG de 30/09/2019, o AA viria a ser condenado na pena de 8 anos de prisão (e não 8 anos e 6 meses de prisão, como se consignou no despacho ), o GG, na pena de 7 anos e 6 meses de prisão ( e não 8 anos) e o arguido DD na pena de 5 anos e 6 meses de prisão (e não 5 anos e 8 meses); trata-se de erros materiais evidentes, tendo o Mmº Juiz referido no despacho em causa as penas do acórdão da 1ª Instância, de 13/12/2017, e não, como deveria, as do acórdão deste Tribunal da Relação de 30/09/2019, devendo o mesmo ser corrigido em conformidade, conforme o disposto nos Artºs. 380º, nºs. 1, al. b), 2 e 3, do C.P.Penal;
- Face a tais correcções, torna-se inútil o recurso do arguido AA relativamente ao despacho de 25/09/2019;
- No que concerne à pretendida aplicação do perdão da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, às penas em que foram condenados os recorrentes AA, DD e GG, há que sublinhar que, de acordo com o despacho de 13/09/2023, quanto ao arguido AA, o tribunal recorrido não tomou posição concreta sobre a sua pretensão, ordenando a extracção de certidão para o Supremo Tribunal de Justiça, ante o recurso pelo mesmo apresentado do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 20/03/2023; e, no que que diz respeito aos arguidos DD e GG, não se verificam as inconstitucionalidades suscitadas, devendo manter-se a decisão recorrida, dessa forma improcedendo o recurso.
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16. Cumprido o disposto no Artº 417º, nº 2, vieram responder os recorrentes, nos termos da peça processual que no dia 20/11/2023 dirigiram ao processo [Ref. ...35], a qual terminam com a formulação das seguintes conclusões (transcrição):
“Face a todo o exposto, devem os recursos proceder, consideram-se, então, o seguinte:
a) O recurso é de efeito suspensivo e deve ser alterado no exame preliminar do Relator, nos termos do art.º 417.º do C.P.P.;
b) Os despachos recorridos não contêm meros lapsos de escrita, antes sim decidiram expressamente não conceder a aplicação do perdão de um ano ao arguido AA porque entendeu que este arguido tinha uma pena de 8 anos e 6 meses, quando na verdade a pena é de 8 anos de prisão;
c) Sendo a pena de 8 anos de prisão, com crimes de falsificação de documentos, é-lhe aplicável o perdão papal uma vez que os crimes de falsificação de documentos não fazem parte do elenco de crimes excluídos;
d) A norma descrita no art.º 2.º n.º 1 da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto ao declarar como limite de idade os 30 anos, é inconstitucional por ofensa ao estatuído no art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa;
e) A aplicação de um ano de perdão a qualquer cidadão não absolve o arguido nem o declara inocente, ficando apenas reduzida a pena única em 1 ano;
f) Os crimes de corrupção que se encontram excluídos da aplicação do perdão estão mal excluídos, porquanto nenhum princípio constitucional justifica esta exclusão, não estamos perante crimes contra a vida humana ou liberdade sexual, antes sim crimes que, de algum modo, são ressarcíveis, e se até os crimes contra a realização da justiça como denegação de justiça e abuso de poder se encontram abrangidos pelo perdão, está demonstrada a arbitrariedade nos critérios subjacentes aos crimes excluídos na referida lei;
g) A concessão do perdão em um ano de prisão levará a que os arguidos condenados por corrupção sejam obrigados, em 90 dias, a pagar ao Estado as indemnizações a que foram condenados, sendo benéfico para o Estado que os arguidos tenham uma motivação a devolver essas quantias (grande parte das vezes em nome de terceiros e portanto, impossíveis de serem arrecadadas) sendo que com a concessão do perdão associado à condição resolutiva do pagamento, ficam asseguradas as questões relacionadas com a sociedade em geral quanto ao perdão, na medida em que, um condenado a, por exemplo, 7 anos de prisão, para ver a sua pena reduzida em um ano por via do perdão papal, terá que pagar os montantes indemnizatórios, aliás, sendo esse, em bom rigor, o maior desejo de toda uma nação, que os arguidos devolvam/paguem os valores contemplados nas sentenças.
h) Nestes termos, não há nenhum princípio constitucional que justifique a não concessão do perdão em um ano de prisão a condenados por crimes de corrupção desde que estes, nos termos da condição resolutiva, paguem as indemnizações pelas quais foram condenados – o que se invoca;
i) A exclusão da aplicação do perdão ao crime de corrupção é inconstitucional nos termos suscitados no recurso, que se renovam.
(...)”.
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17. Entretanto, em requerimento autónomo, na mesma data [20/11/2023], veio o arguido e recorrente GG deduzir incidente de recusa do ora relator, nos “termos dos artºs. 40º alínea c) e/ou 43º nºs 1, 2 e 3 do C.P.P.”, por, em síntese, contra o mesmo ter apresentado queixa disciplinar no Conselho Superior da Magistratura por virtude da sua intervenção no Proc. nº 523/17.2T9BGC.G2, incidente esse que veio a ser recusado pelo Supremo Tribunal de Justiça, pelo douto acórdão de 06/12/2023, por manifestamente infundado.
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18. Nessa sequência, impondo-se o prosseguimento dos autos, pelo despacho do relator de 15/01/2024, proferido ao abrigo do disposto no Artº 417º, nº 7, al. a), foi mantido o efeito devolutivo atribuído ao recurso.
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19. Notificados desse despacho, dele vieram os recorrentes reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no Artº 417º, nº 8, nos termos da peça processual de 16/01/2024 [Ref. ...42], visando a alteração do mesmo, e insistindo pela atribuição do efeito suspensivo ao recurso, nos termos do disposto no Artº 408º, nº 3.
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20. A Exma. PGA pronunciou-se sobre tal reclamação, conforme requerimento de 28/01/2024 [Ref. ...95], aduzindo, em síntese, inexistir qualquer fundamento legal para se alterar o assim decidido, e renovando, quanto a essa questão, a posição assumida em 29/10/2023, supra aludida em 15.
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21. Colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, cumprindo, pois conhecer e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO

1. É hoje pacífico o entendimento de que o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente dos vícios indicados no Artº 410º, nº 2, do C.P.Penal [3].
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1.1. Todavia, na situação em apreço, impõe-se apreciar, antes de mais, da viabilidade da reclamação dos recorrentes que teve por alvo o despacho do relator de 15/01/2024, supra mencionado em I.18., despacho esse que manteve o efeito devolutivo atribuído ao recurso, e bem assim, como questões prévias, da existência de manifestos erros ou lapsos de escrita de que padece o despacho recorrido, de 13/09/2023, mencionado em I.9., relativamente às penas em que foram condenados os recorrentes, da [eventual] inutilidade do recurso do arguido AA quanto ao segundo despacho recorrido, de 25/09/2023, mencionado em I.11., e bem assim da (in)admissibilidade do recurso interposto pelo mesmo arguido AA quanto à questão de aplicabilidade, ou não, do perdão de um ano de prisão a que alude o Artº 3º, nº 1, da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Vejamos, pois.
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1.1.1.   Da reclamação dos recorrentes visando o despacho do relator de 15/01/2024
Como se refere em I.18, em 15/01/2024, o relator, ao abrigo do disposto no Artº 417º, nº 7, al. a), manteve o efeito devolutivo atribuído ao presente recurso, o que justificou nos seguintes termos (transcrição):

“O recurso interposto pelos arguidos AA, GG e DD é adequado e tempestivo, tendo os recorrentes legitimidade e interesse em agir.
Conforme se alcança do despacho proferido na 1ª instância no dia 10/10/2023, o recurso foi recebido para subir imediatamente, em separado, e com efeito devolutivo.
No requerimento de interposição do recurso defendem os [três] recorrentes que ao mesmo seja atribuído efeito suspensivo, nos termos das disposições conjugadas dos Artºs. 407º, nºs. 1 e 2, al. a), e 408º, nº 3, do C.P.Penal, pretensão reafirmada pelo recorrente DD através do seu requerimento de 24/10/2023.
A Exma. Procuradora-Geral Adjunta pugna pela manutenção do efeito devolutivo fixado pela 1ª instância.
E com inteira razão o faz.
Na verdade, atendendo ao objecto do recurso [que, na sua essência, tem em vista apurar se cada um dos três arguidos / recorrentes pode beneficiar de um ano de perdão nas penas em que foram condenados, em consonância com a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto], a situação, manifestamente, não se enquadra na previsão dos preceitos legais invocados pelos recorrentes, maxime em qualquer das situações previstas no Artº 408º, nº 3, do C.P.Penal, “(…) sendo certo que a decisão que vier a ser proferida não “(…) se repercutirá na validade ou eficácia dos actos subsequentes podendo, quando muito, conduzir à diminuição das penas de prisão que aos arguidos cumpre efectivamente cumprir.”.
Consequentemente, ao abrigo do disposto no Artº 417º, nº 7, al. a), do C.P.Penal, mantenho o efeito que foi atribuído ao recurso.
(...)”.
Os recorrentes insistem na atribuição do efeito suspensivo ao recurso, nos termos do Artº 408º, nº 3, sustentando, em síntese, que o despacho reclamado não equacionou uma multiplicidade de situações que, devidamente ponderadas, justificariam posição inversa daquela, assim como não levou em linha de conta que a diminuição das penas, caso os arguidos já estejam presos, poderá perder a utilidade que o legislador quis atribuir.
Porém, salvo o devido respeito, a argumentação que os recorrentes aduzem na sua reclamação não infirma, minimamente, a conclusão ínsita no despacho reclamado.
Na verdade, convém não olvidar, desde logo, que, contrariamente ao que sustentaram os recorrentes no seu requerimento de interposição do recurso, os despachos recorridos, manifestamente, não consubstanciam “decisões que puseram termo à causa”, pelo que, em bom rigor, a subida imediata do recurso é determinada pelo Artº 407º, nº 2, al. b), e não pelo Artº 407º, nºs. 1,  e 2, al. a), como expressamente invocaram.
Seja como for, reitera-se que, em face ao objecto do recurso [que, como se disse no despacho reclamado, na sua essência, tem em vista apurar se cada um dos três arguidos / recorrentes pode beneficiar de um ano de perdão nas penas em que foram condenados, em consonância com a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto], a situação não se enquadra em qualquer das situações previstas no Artº 408º, nº 3, do C.P.Penal, sendo certo que a decisão que vier a ser proferida não se repercutirá na validade ou eficácia dos actos subsequentes podendo, quando muito, conduzir à diminuição das penas de prisão que aos arguidos cumpre efectivamente cumprir.
Ademais, subscrevemos inteiramente as considerações expendidas pela Exma. PGA na sua douta resposta à reclamação quando a este propósito aduz (transcrição):
“(...)
Os argumentos dos reclamantes não poderão, no entanto, quanto a nós, ser atendidos, em nada alterando os fundamentos do aludido despacho.
Em primeiro lugar, impõe-se salientar que os reclamantes trazem à reclamação uma questão que, com o devido respeito, é completamente despropositada, qual seja, a relacionada com a intervenção nos presentes autos do Exmº Sr. Desembargador Dr. JJ e o seu conhecimento, enquanto Juiz de Direito no Tribunal de Execução de Penas ..., da situação do que se passou em determinados processos (processos n.ºs 39/08.... e 1508/09.... ), que nada têm a ver com o caso dos autos.
Em segundo lugar, anunciam os recorrentes que tencionam recorrer ao Tribunal Constitucional para suscitar inconstitucionalidades, o que poderá levar a cerca de dois anos de pendência do recurso no T.C., pelo que os arguidos ficarão prejudicados nas antecipações das liberdades condicionais a que fazem referência os artigos 61º e 62º do Código Penal e 188º n.º 1 do Código de Execução de Penas… assim como argumentam, após procederem a cálculos das penas e sua repercussão nessa liberdade condicional meramente hipotéticos e sem qualquer suporte factual, que as contagens do tempo de prisão e a medida da pena concreta podem ser modificadas pela procedência do recurso, importando, por isso, em nome da prudência judicial, decretar o efeito suspensivo.
Ora, tais argumentos e “ liquidações das penas “, para além de especulativos, não afectam o que determinou o douto despacho de 15 de Janeiro de 2023, o qual se debruçou sobre os pressupostos legais para ser atribuído aos recursos o efeito suspensivo, concluindo que, no caso, ante o disposto no art.º 408.º do C.P.Penal e as concretas questões a apreciar, se não verificam.
(...)”.
Nestas circunstâncias, e sem necessidade de outras considerações, por despiciendas, indefere-se a reclamação dos recorrentes, mantendo-se o efeito devolutivo atribuído ao recurso.
*
1.1.2. Dos erros ou lapsos de escrita de que padece o despacho recorrido, de 13/09/2023
Como se alcança do despacho de 13/09/2023, impugnado pelos recorrentes, nele é referido que, nos presentes autos, o arguido AA foi condenado, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, que o arguido DD foi condenado, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (seis) meses de prisão, e que o arguido GG foi condenado, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 8 (oito) anos de prisão.
Ora, como claramente resulta dos autos, tal não corresponde à realidade processual adquirida.
Pois, na sequência dos recursos por eles apresentados, pelo acórdão deste TRG de 30/09/2019, o arguido AA viria a ser condenado na pena de 8 (oito) anos de prisão, o arguido DD na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, e o arguido GG na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Trata-se, em nosso entender [4], de lapsos ou de erros de escrita manifestos e evidentes [5], os quais são oficiosamente rectificáveis, mesmo em sede de recurso, nos termos das disposições conjugadas dos Artºs. 249º do Código Civil e  380º, nºs. 1, al. b) e 2, do C.P.Penal.
Nessas circunstâncias, impõe-se proceder à correcção de tais lapsos, determinando-se que, no aludido despacho recorrido, de 13/09/2023, onde consta:
“O arguido AA foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática (...)”;

Passe a constar
“O arguido AA foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática (...);
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) de prisão, pela prática (...)”.
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1.1.3. Da inutilidade superveniente da lide quanto ao recurso do despacho de 25/09/2023
Como se viu, o arguido AA recorre do despacho de 25/09/2023, em virtude de o tribunal a quo não o ter corrigido, na parte do lapso cometido quanto à menção da pena em que fora condenado, mau grado o Ministério Público o ter salientado na promoção de 22/09/2023.
Ora, em face da correcção que antecede [que abrange não só a pena do recorrente AA, mas também as penas dos restantes arguidos recorrentes]), mostra-se claramente inviabilizado o prosseguimento da instância recursiva, no que tange ao aludido despacho de 25/09/2023, ocorrendo uma clara situação de “inutilidade superveniente da lide”, nos termos do disposto no Artº 277º, al. e), do C.P.Civil, aqui aplicável ex-vi Artº 4º do C.P.Penal, o que cumpre decretar, subsistindo apenas o recurso do despacho de 13/09/2023 [sem prejuízo do que, quanto a esse aspecto, de seguida se decidirá quanto ao mencionado recorrente AA].
*
1.1.4. Da (in)admissibilidade do recurso do arguido AA quanto ao despacho de 13/09/2023
Como emana das respectivas conclusões recursória, os três recorrentes [AA, DD, e GG] insurgem-se contra o despacho recorrido, de 13/09/2023, que não aplicou um ano de perdão às penas em que foram condenados, nos termos da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Sucede que, como certeiramente assinala a Exma. PGA no seu douto parecer, no aludido despacho de 13/09/20213 o tribunal a quo não tomou posição concreta acerca dessa pretensão do arguido AA [a qual havia manifestado no requerimento que em 31/09/2023 dirigiu aos autos, a que se alude em I.5.], tendo-se limitado a ordenar a extracção de certidão de tal requerimento, da promoção do Ministério Público acerca desse requerimento do arguido, e do despacho em causa, e a sua remessa ao Supremo Tribunal de Justiça, “(...) a fim de ser ponderado para os efeitos do disposto no artº 401º, nº 2, do C.P.P.”, apenas tendo conhecido de tal questão [tratada em conjunto] em relação aos arguidos e recorrentes DD e GG.
Basta ler e analisar com o mínimo de atenção o(s) despacho(s) em causa, devidamente transcritos em I.9., para se concluir que assim é.
Pelo que, em face desse circunstancialismo, e não tendo o recorrente AA posto minimamente em causa  [dela recorrendo, obviamente] aquela decisão do tribunal a quo, quando determinou a extracção da aludida certidão, e o seu envio ao Supremo Tribunal de Justiça, torna-se manifesto e evidente que o recurso do mesmo arguido AA, visando, em síntese, a revogação do despacho de 13/09/2023 e, concomitantemente, a aplicação do perdão de um ano de prisão a que alude a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, não deveria ter sido admitido.
Não obstante, tendo-o sido, mas não vinculando este tribunal o despacho que o admitiu, deve agora ser rejeitado, tudo em conformidade com as disposições conjugadas dos Artºs. 414º, nºs. 2, e 3, e 420º, nº 1, al. b), do C.P.Penal.
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1.2. Posto isto
Em face da inadmissibilidade do recurso do arguido AA, acabada de decidir, e restando, como se disse, a apreciação do recurso dos arguidos DD e GG, atenta a conformação das conclusões pelos mesmos formuladas, a questão que basicamente importa dirimi é a de saber se, contrariamente ao decidido pelo tribunal a quo, aos mesmos deve ser aplicado o perdão de um ano de prisão às penas em que foram condenados, em consonância com a Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Vejamos.
Recordando-se o que a propósito expendeu o tribunal a quo no despacho recorrido, datado de 13/09/2023 (transcrição):
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (seis) meses de prisão, pela prática, entre 2004 e 2012, em co-autoria material, na forma consumada, de 26 (vinte e seis) crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal (penas parcelares de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão para cada um deles).
Este arguido nasceu em ../../1975.
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática, em co-autoria material, na forma consumada, de 53 (cinquenta e três) crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal (penas parcelares de 3 (três) anos de prisão para cada um deles).
O arguido nasceu em ../../1962.
A Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, veio estabelecer um perdão de penas e uma amnistia de infrações por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude.

Dispõe o art.º 2.º, n.º 1, do referido diploma que “(e)stão abrangidas pela presente lei as sanções penais relativas aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19 de junho de 2023, por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto, nos termos definidos nos artigos 3.º e 4.º”.

O art.º 3.º da aludida lei refere que:
1. Sem prejuízo do disposto no artigo 4.º, é perdoado 1 ano de prisão a todas as penas de prisão até 8 anos.
2. São ainda perdoadas:
a) As penas de multa até 120 dias a título principal ou em substituição de penas de prisão; b) A prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa;
c) A pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição; e
d) As demais penas de substituição, exceto a suspensão da execução da pena de prisão subordinada ao cumprimento de deveres ou de regras de conduta ou acompanhada de regime de prova.
3. O perdão previsto no n.º 1 pode ter lugar sendo revogada a suspensão da execução da pena. 
4. Em caso de condenação em cúmulo jurídico, o perdão incide sobre a pena única.
5. O disposto no n.º 1 abrange a execução da pena em regime de permanência na habitação”.
No caso vertente, está verificado o pressuposto temporal de aplicação da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto, já que os factos em causa foram praticados antes das 00:00 do dia 19.06.2023, mas não o pressuposto subjectivo, pois, à data da prática dos factos, nenhum dos arguidos tinham 30 ou menos anos.
Acresce que os crimes de corrupção passiva, p.p. pelo art.º 373.º, n.º 1, do Código Penal, pelos quais foram condenados encontram-se exceptuados da aplicação do perdão, nos termos do art.º 7.º, n.º 1, al. e), iv), da Lei n.º 38-A/2023, de 2 de Agosto.
Isto dito, passemos à apreciação das inconstitucionalidades suscitadas.
Invocam os arguidos que a discriminação veiculada na Lei n.º 38-A/2023, no tocante ao âmbito de aplicação subjectivo da amnistia e do perdão (a indivíduos com idade entre os 16 e os 30 anos à data da prática dos factos) e objectivo (excluindo determinadas categorias de crimes, nomeadamente o de corrupção) é violadora do princípio da igualdade, do Estado de Direito, da proporcionalidade, discricionariedade, “arbitrariedade” (sic.), e dignidade da pessoa humana.
Ora, sobre esta matéria já se pronunciou, precisamente a propósito de outras leis de amnistia e perdão, o Tribunal Constitucional.
Assim, o Ac. TC n.º 488/2008 [Proc.º n.º 35/08, relator Cons. Benjamim Rodrigues, em www.tribunalconstitucional.pt]: “Embora a concessão do perdão genérico – única figura que agora nos interessa – seja efeito de um acto político, que pode ter por causa as mais diversas motivações (cf., referindo-se à amnistia, os Acórdãos n.ºs 444/97 e 510/98, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt), como sejam a magnimidade por occasio publicae laetitia excepcional, razões de política geral de apaziguamento ou outras, de correcção de determinadas ponderações anteriores efectuadas pelo direito ou do modo da sua aplicação pela jurisprudência ou pela administração, ela expressa-se através de uma lei em sentido material.
Ora, cabendo a sua edição na competência do legislador ordinário, tomada no campo da política criminal, não pode deixar de se lhe reconhecer discricionariedade normativo-constitutiva na conformação do seu conteúdo. 
Referindo-se à circunstância de as Leis n.ºs 23/91, de 4 de Julho, 15/94, de 11 de Maio e 29/99 não terem contemplado, nos perdões genéricos concedidos, a medida de segurança de internamento, disse-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 42/02, disponível em www.tribunalconstitucional.pt:
“Neste domínio, o Tribunal Constitucional vem entendendo, com significativa reiteração, que, nos óbvios parâmetros do Estado de direito democrático, a liberdade de conformação legislativa goza de alargado espaço onde têm lugar preponderantes considerações não necessariamente restritas aos fins específicos do aparelho sancionatório do Estado, mas também outras ditadas pela conveniência pública que, em última instância, entroncam na raison d’Etat”.
Mas essa discricionariedade normativo-constitutiva não é ilimitada: ela tem de respeitar as normas e os princípios constitucionais.
Estas normas e princípios constitucionais surgem sempre como um limite à actividade legiferante do órgão constitucionalmente competente para dispor sobre a matéria.
Entre os princípios, cujo respeito se impõe ao legislador ordinário competente para dispor sobre o perdão genérico das penas, contam-se o invocado pela recorrente, o princípio da igualdade perante a lei e na lei (cf. além dos referidos Acórdãos, Pedro Duro, op. cit., p. 336, e Francisco Aguilar, op. cit, p. 209).
No que importa à primeira dimensão, importa reconhecer que o legislador do perdão genérico não o desrespeitou.
Na verdade, o perdão foi concedido a todos condenados que houvessem praticado os mesmos crimes pelos quais a recorrente foi condenada e se encontrassem na mesma situação.
O perdão abrange todas as pessoas que sejam condenadas pela prática, até ao momento considerado na lei, de todas as categorias de crime, à excepção das pessoas condenadas que se encontrem em determinada situação, nela definida de forma geral e abstracta (n.º 1 do art.º 2.º da Lei n.º 29/99), ou hajam praticado certas categorias de crimes (n.º 2 do mesmo artigo).
Por outro lado, o estabelecimento do pagamento, dentro de certo prazo, da indemnização como condição resolutiva da concessão do perdão mostra-se também feito de forma geral e abstracta, colocando todos os condenados em penas de prisão que o tenham sido igualmente no pagamento de indemnizações aos lesados na mesmíssima situação quanto ao benefício da clemência.
Cabe na discricionariedade normativa do legislador ordinário eleger, quer a medida do perdão de penas – o quantum do perdão –, quer, em princípio, as espécies de crimes ou infracções a que diga respeito a pena aplicada e perdoada, quer a sujeição ou não a condições, desde que o faça de forma geral e abstracta, para todas as pessoas e situações nela enquadráveis. (…)
Mas igualdade não é igualitarismo.
O Tribunal Constitucional tem uma vasta jurisprudência sobre o princípio da igualdade.
Reflectindo o estado actual da compreensão do princípio da igualdade, tanto na jurisprudência como na doutrina, nacionais e estrangeiras, afirmou-se no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 232/2003 (publicado no Diário da República I Série-A, de 17 de Junho de 2003), assumindo em diversos passos da sua fundamentação abundante argumentação de jurisprudência anterior: (…)
“[...] O Tribunal Constitucional tem considerado que o princípio da igualdade impõe que situações da mesma categoria essencial sejam tratadas da mesma maneira e que situações pertencentes a categorias essencialmente diferentes tenham tratamento também diferente. Admitem-se, por conseguinte, diferenciações de tratamento, desde que fundamentadas à luz dos próprios critérios axiológicos constitucionais. A igualdade só proíbe discriminações quando estas se afiguram destituídas de fundamento racional [cf., nomeadamente, os Acórdãos nºs 39/88, 186/90, 187/90 e 188/90, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º vol. (1988), p. 233 e ss., e 16º vol. (1990), pp. 383 e ss., 395 e ss. e 411 e ss., respectivamente; cf., igualmente, na doutrina, jorge miranda, Manual de Direito Constitucional, tomo IV, 2ª ed., 1993, p. 213 e ss., gomes canotilho, Direito Constitucional, 6ª ed., 1993, pp. 564-5, e gomes canotilho e vital moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 1993, p.125 e ss.]”.
Também o excelente Ac. TC n.º 444/97 [Proc.º n.º 784/96, relator Cons. Sousa e Brito, em www.tribunalconstitucional.pt] se debruça sobre esta questão: “Cumpre, contudo, reconhecer que a tese de que a lei de amnistia implica logicamente uma dispensa da lei punitiva, que há que sindicar constitucionalmente quanto à sua racionalidade ou razoabilidade, tendo em vista o princípio da igualdade, é compatível com a "autonomia" do poder de conceder amnistias (afirmada no acórdão nº 362 [p. 25] da Comissão Constitucional) relativamente ao poder de fazer leis, consagrados em separado nas alíneas d) e g) da Constituição como competências distintas da Assembleia da República, que em outras constituições são atribuídas a órgãos distintos (assim, por exemplo, a amnistia era segundo a redacção originária do artigo 79º da Constituição italiana, concedida pelo Presidente da República, através de uma lei de delegação das Câmaras legislativas - desde a lei constitucional de 6 de Março de 1992, nº 1 exige-se unicamente a maioria de dois terços dos componentes de cada uma das Câmaras -, e na Carta Constitucional competia ao Rei como poder moderador [artigo 74º, § 8]). Por outro lado, como se mostrará a seguir, embora o princípio da igualdade seja aplicável à lei de amnistia, é-o em termos compatíveis com a desigualdade de tratamento que ela implica relativamente aos casos que continuam a ser abrangidos pela lei punitiva geral amnistiada (ponto acentuado por outras palavras no Parecer nº 13/79, p.104 da Comissão Constitucional. Sobre amnistia na jurisprudência da Comissão Constitucional, cf. ainda o parecer nº 32/79 [Pareceres, 10, 1980), p. 107 ss.]; e os acórdãos nºs 186 de 26.3.1980 [Apêndice ao Diário da República de 3.7.1980], 259 [Apêndice ao Diário da República de 28.7.81], 309, 310, 311, 314, [Apêndice ao Diário da República de 22.12.1981]). Acresce que a norma de amnistia, mesmo geral, no sentido apontado, não deixa de ser uma medida política, que não põe em questão a continuada vigência da norma punitiva amnistiada, que continua a ser a regra geral incriminadora, nem dos princípios gerais do direito penal, medida relativamente à configuração da qual o legislador dispõe de uma liberdade de conformação legislativa, nomeadamente do ponto de vista do princípio da igualdade, superior à que caracteriza outras normas, que exprimam regras ou princípios jurídicos. Com este limitado conteúdo seria adequado falar de um "acto político plural", expressão que pode, contudo, equivocadamente ligar-se à tese da insindicabilidade constitucional das normas de amnistia.
Justifica‑se assim e precisa‑se a próxima tarefa: saber se a norma de amnistia questionada viola os princípios do Estado de direito e especialmente o princípio da igualdade, que fundamenta a generalidade da lei. Ora o princípio da igualdade não significa proibição de normas especiais ou excepcionais relativas a categorias de interessados, mesmo se já individualizáveis em concreto, como nas leis retroactivas, mas sim proibição de normas diversas para situações objectivamente iguais, com o corolário de que normas diversas regulam situações objectivamente diversas do ponto de vista da razão da norma (assim, os acórdãos nºs 44/84, 34/86, 12/88, 39/88, 191/88, 186/90, 330/93, 381/93, 516/93, 335/94, 468/96, 563/96 e 786/96, publicados nos Acórdãos, 3º vol., p. 133, 7º vol., t. I, p. 37, 11º vol., p. 135 e p. 233, 12º vol., p. 239, 16º vol., p. 383, 25º vol., p. 421 e p. 547, Diário da República, II Série, 19/1/1994, 30/8/1994, e 13/5/1996, e I Série A, 16/5/1996 e II Série, de 20/8/1996, respectivamente).
Assente a possibilidade de estabelecimento de diferenciações, tornar-se-á depois necessário proceder ao controlo das normas sub judicio, feito a partir do fim que visam alcançar, à luz do princípio da proibição do arbítrio (Willkürverbot) e, bem assim, de um critério de razoabilidade”.
Por fim, o Ac. TC n.º 42/95 [Proc.º n.º 372/94, relator Cons. Messias Bento, em www.tribunalconstitucional.pt] explica que uma norma que, “ao definir o âmbito da exclusão do perdão, concedido pela alínea d) do nº 1 do artigo 8º, faz apelo à espécie de pena aplicada, ao tipo de crime por que os arguidos foram condenados e ao facto de eles já terem beneficiado de perdão anterior; e, por outro lado, ela aplica-se a todos os arguidos que se encontrem na situação por si descrita, que, assim, são em número indeterminado. (…)
A norma em causa também não viola o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da Constituição.
A ideia de igualdade, com efeito, só recusa o arbítrio, as soluções materialmente infundadas ou irrazoáveis”.
Ora, no caso vertente, não há dúvida de que a Lei n.º 38-A/2023 contém normas gerais e abstractas para os seus destinatários. É certo que há uma evidente opção no sentido de limitar o âmbito subjectivo dos beneficiários e o elenco de crimes que não poderão beneficiar de amnistia ou perdão, mas não se vislumbra que, na delimitação, o legislador tenha resvalado da discricionariedade normativa para a arbitrariedade. Com efeito, a opção de apenas abranger crimes praticados por pessoas com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos tem uma evidente conexão com o evento que justifica a própria lei – a Jornada Mundial da Juventude - e os destinatários da mesma. Acresce que, do ponto de vista axiológico, é a própria Constituição que, no seu art.º 70.º, dedica uma norma de protecção especial à juventude, sendo certo que o legislador ordinário, no D.L. n.º 401/82, de 23 de Setembro, sentiu necessidade de criar um regime penal mais favorável para os jovens delinquentes.
Nesta medida, não se vislumbra que a opção da Lei no tocante ao âmbito subjectivo seja materialmente desproporcionada ou injustificada.
E o mesmo se diga do âmbito dos crimes excluídos, já que, para além de estarem objectivamente definidos, de forma geral e abstracta, a opção encontra eco no sentimento ético-jurídico vigente, ao qual repugnaria amnistiar ou perdoar determinadas categorias de crimes (entre os quais, não poderá deixar de se sublinhar, o de corrupção).
Por todo o exposto, considera-se não padecerem as normas apontadas de qualquer inconstitucionalidade.
Consequentemente, indefere-se a requerida aplicação do perdão aos arguidos DD e GG.
(...)”.
Ressalvando a questão das penas concretas aplicadas aos mencionados arguidos [questão já abordada anteriormente, com a correcção dos lapsos ou erros de estrita ocorridos], concordamos com as considerações expendidas pelo tribunal a quo, sobre esta matéria, as quais subscrevemos.
Na verdade, como resulta dos Artºs. 1º, 2º, nº 1, 3º e 4º, da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, o perdão de penas e a amnistia de infrações estabelecida por ocasião da realização em Portugal da Jornada Mundial da Juventude só se aplica “(...) aos ilícitos praticados até às 00:00 horas de 19-6-2023 por pessoas que tenham entre 16 e 30 anos de idade à data da prática do facto”, o que não é o caso dos recorrentes DD e GG.
Em nosso entender, tal diploma legal, inelutavelmente, reveste carácter geral e abstracto, pois que se aplica a todos os arguidos que se encontrem na situação ali descrita, ou seja, em número indeterminado, e a delimitação do respectivo âmbito de aplicação está devidamente justificada, não se mostrando irrazoável, arbitrária e/ou violadora de qualquer princípio constitucional, maxime do princípio da igualdade, ínsito no Artº 13º, nºs. 1 e 2, da nossa lei fundamental.
Sendo certo que, como bem sublinha a Exma. PGA no seu douto parecer, “(...) A opção de apenas abranger crimes praticados por pessoas com idade compreendida entre os 16 e os 30 anos tem uma reconhecida e notória explicação relacionada com a Jornada Mundial da Juventude e os seus destinatários.”.
Igualmente se acolhendo a posição da Distinta Magistrada do Ministério Público no que tange à exclusão do perdão e da amnistia dos crimes objectivamente definidos de forma geral e abstracta na citada Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, designadamente dos crimes de corrupção pelos quais foram condenados os arguidos e ora recorrentes DD e GG.
Pois, “(...) tal opção de política criminal não é arbitrária ou irrazoável, tendo igualmente implícito o sentimento ético-jurídico actual, apenas prevendo amnistiar ou perdoar penas de determinadas categorias de crimes mais graves, excepcionando os ilícitos que, por atentarem contra bens jurídicos cuja tutela é mais significativa, não devem merecer medidas de clemência.”.
Não correspondendo à percepção da nossa comunidade a afirmação que os recorrentes trazem à liça na conclusão 21ª do seu recurso, quando sustentam que “O crime de corrupção não tem gravidade suficiente no nosso ordenamento jurídico nem aos olhos da Constituição que permita ao Legislador ordinário excluir uma medida de clemência de um ano de perdão” aos condenados por esse tipo de crime.
Bastando, para tanto, constatar o que a esse propósito se expendeu na Resolução do Conselho de Ministros nº 37/2021, de 18/03/2021, in DR 1ª Série, nº 66, de 06/04/2021, que aprovou a “Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024”, quando ali assertivamente se refere:
“(...)
Os fenómenos corruptivos, nas suas diferentes configurações, atentam contra princípios fundamentais do Estado de direito, enfraquecem a credibilidade e a confiança dos cidadãos nas instituições e comprometem o desenvolvimento social e económico, fomentando a desigualdade, reduzindo os níveis de investimento, dificultando o correto funcionamento da economia e fragilizando as finanças públicas.
Esses fenómenos atingem o coração da democracia, ferindo-a nos seus princípios fundamentais, nomeadamente os da igualdade, transparência, integridade, livre iniciativa económica, imparcialidade, legalidade e justa redistribuição da riqueza.
Têm efeitos económicos profundamente nocivos, como o aumento da despesa pública, por realização de intervenções desprovidas de real interesse, em benefício de privados, a retração dos investidores ou a distorção das regras da concorrência.
Ao traírem as normas do correto funcionamento do Estado os fenómenos corruptivos provocam a erosão das regras de boa governança e degradam inevitavelmente a relação entre governantes e governados.
A perceção da existência de fenómenos de corrupção fez nascer e crescer na opinião pública — alimentada por sentimentos de frustração ou por pulsões antidemocráticas — a ideia de que todo o exercício de atividade política pressupõe a intenção de aproveitamento da coisa pública para fins privados. Em suma, a ausência de compromisso com o bem comum.
Esta perceção favorece a perda de confiança nos valores da democracia e fragiliza as instituições representativas dos poderes do Estado.
A prevenção, a deteção e a repressão da corrupção têm sido erigidos por diferentes instâncias internacionais como objetivos nucleares da sua intervenção, considerando a dimensão global do fenómeno e os seus reflexos no plano do desenvolvimento sustentado.
(...)”.
Em suma, sem necessidade de outras considerações, por desnecessárias, concluímos, na esteira da decisão recorrida, que não foi violada nenhuma das normas e/ou princípios legais e/ou constitucionais invocados pelos recorrentes GG e DD, nem quaisquer outros.
Pelo que, nenhuma censura nos merecendo o despacho recorrido, de 13/09/2023, que lhes indeferiu sua pretensão no sentido de lhes ser aplicado o perdão de um ano de prisão, nos termos da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, que se confirma, improcede, in totum o presente recurso.

III. DISPOSITIVO

Por tudo o exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Guimarães em:

A) Indeferir a reclamação dos recorrentes visando o despacho de relator, de 15/01/2024, confirmando-se e mantendo-se o efeito devolutivo atribuído ao recurso.
B) Determinar a rectificação do primeiro despacho recorrido, datado de 13/09/2023, mencionado em I.9., no sentido de, na parte em que se refere às penas em que foram condenados os recorrentes, onde consta:
“O arguido AA foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 8 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática (...)”;
Passe a constar
“O arguido AA foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 26.04.2022, na pena única de 8 (oito) anos de prisão, pela prática (...);
O arguido DD foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado em 06.07.2020, na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão, pela prática (...);
O arguido GG foi condenado, nos presentes autos, por acórdão transitado em julgado na mesma data supra referida, na pena única de 7 (sete) anos e 6 (seis) de prisão, pela prática (...)”.
C) Em face de tal correcção, julgar extinta a instância recursiva do arguido AA, que teve por alvo o despacho recorrido, datado de 25/09/2023, por inutilidade superveniente da lide.
D) Rejeitar o recurso do arguido AA na parte em que visa(va) a aplicação da Lei nº 38-A/2023, de 2 de Agosto, com o perdão de um ano de prisão à pena que lhe foi cominada nos autos.
E) Negar provimento ao recurso interposto pelos arguidos DD e GG, confirmando, consequentemente, o despacho recorrido, de 13/09/2023, no que aos mesmos concerne.
*
Custas pelos arguidos/recorrentes, fixando-se em 4 (quatro) UC a taxa de justiça a suportar por cada um deles (Artºs. 513º e 514º do C.P.Penal, 1º, 2º, 3º, 8º, nº 9, do Reg. Custas Processuais, e Tabela III anexa ao mesmo), a que acrescem 4 (quatro) UC, nos termos do disposto no Artº 420º, nº 3, do C.P.Penal, em relação ao arguido e recorrente AA.

(Acórdão elaborado pelo relator, e por ele integralmente revisto, com recurso a meios informáticos, contendo na primeira página as assinaturas electrónicas certificadas dos signatários – Artºs. 94º, nº 2, do C.P.Penal, e 19º, da Portaria nº 280/2013, de 26 de Agosto).
*
Guimarães, 20 de Fevereiro de 2024

António Teixeira (Juiz Desembargador Relator)
Ana Teixeira (Juíza Desembargadora Adjunta)
Carlos da Cunha Coutinho (Juiz Desembargador Adjunto)


[1] Todas as transcrições efectuadas estão em conformidade com o texto original, ressalvando-se a correcção de erros ou lapsos de escrita manifestos, da formatação do texto e da ortografia utilizada, da responsabilidade do relator.
[2] Diploma ao qual pertencem todas as disposições legais a seguir citadas, sem menção da respectiva origem.
[3] Cfr., neste sentido, Germano Marques da Silva, in “Direito Processual Penal Português - Do Procedimento (Marcha do Processo) ”, Vol. 3, Universidade Católica Editora, 2015, pág. 334 e sgts., e o Acórdão de fixação de jurisprudência do S.T.J. nº 7/95 de 19/10/1995, publicado no DR, Série I-A, de 28/12/1995, em interpretação que ainda hoje mantém actualidade.
[4] Posição perfilhada pela Exma. PGA e, até, pelos próprios recorrentes, como emana da conclusão 9ª do seu recurso.
[5] Como lapidarmente se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14/03/2006, proferido no âmbito do Proc. nº 05B3878, disponível in www.dgsi.pt, “Lapso manifesto é, em princípio, aquele que de imediato resulta do próprio teor da decisão ou, no caso de elementos ou documentos inconsiderados, que de modo flagrante e sem necessidade de elaboradas demonstrações, logo revelem que só por si a decisão teria de ser diferente da que foi proferida”.
No mesmo sentido se pronunciando a doutrina mais avalizada, como é o caso do Prof. Castro Mendes, que a propósito sabiamente expendia nas suas lições de “Direito Processual Civil”, Volume III, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1982, na pág. 303: “Erro material ou lapso é a inexactidão ou omissão verificada em circunstâncias tais que é patente, através dos outros elementos da sentença ou até do processo, a discrepância com os dados verdadeiros e se pode presumir por isso uma divergência entre a vontade real do juiz e o que ficou escrito”.